YVES BOT
apresentadas em 12 de maio de 2016 ( 1 )
Processos apensos C‑78/16 e C‑79/16
Giovanni Pesce e o. (C‑78/16),
Cesare Serinelli e o. (C‑79/16)
contra
Presidenza del Consiglio dei Ministri (C‑79/16),
Presidenza del Consiglio dei Ministri — Dipartimento della Protezione Civile,
Commissario Delegato per Fronteggiare il Rischio Fitosanitario connesso alla Diffusione della Xylella nel Territorio della Regione Puglia,
Ministero delle Politiche Agricole Alimentari e Forestali,
Regione Puglia
[pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal administrativo regional para o Lácio, Itália)]
«Reenvio prejudicial — Diretiva 2000/29/CE — Proteção sanitária dos vegetais contra a introdução na União Europeia de organismos prejudiciais — Decisão de Execução 2015/789/UE para impedir a introdução e a propagação da Xylella fastidiosa — Remoção dos vegetais hospedeiros, independentemente do seu estatuto sanitário — Proporcionalidade — Direito a indemnização»
I – Introdução
1. |
A Xylella fastidiosa é uma bactéria fitopatogénica que ataca os vasos condutores ( 2 ) de numerosas plantas cultivadas ou silvestres, podendo implicar a sua morte por secagem ( 3 ). |
2. |
Endémica na América do Norte e do Sul ( 4 ), foi observada pela primeira vez na Europa em outubro de 2013, na região da Apúlia (Itália), em oliveiras, antes de a sua presença ser observada, em julho de 2015, na Córsega (França), em arbustos ornamentais exóticos, bem como em Espanha, em giestas, depois, em outubro do mesmo ano, no departamento dos Alpes‑Maritimes (França), nos mesmos arbustos que na Córsega. |
3. |
Geneticamente diversa, a bactéria comporta várias subespécies que atacam, cada uma, plantas diferentes ( 5 ). O seu modo de disseminação natural é o transporte por pequenos insetos que se alimentam da seiva das plantas infetadas. |
4. |
Na Itália, a Xylella fastidiosa atacou principalmente a oliveira, árvore que apresenta uma importância económica ( 6 ), cultural ( 7 ) e ambiental considerável nos países da bacia mediterrânica. Enquanto as medidas profiláticas, incluindo o abate de árvores, suscitaram consternação nas regiões onde a bactéria já atacou, o risco de proliferação provocou grande preocupação nas que foram, até agora, poupadas. |
5. |
Para erradicar a bactéria, a Comissão Europeia adotou uma estratégia que se caracteriza pelo endurecimento progressivo do dispositivo criado. |
6. |
Entre fevereiro de 2014 e dezembro de 2015, foram sucessivamente adotadas quatro decisões de execução com base na Diretiva 2000/29/CE do Conselho, de 8 de maio de 2000, relativa às medidas de proteção contra a introdução na Comunidade de organismos prejudiciais aos vegetais e produtos vegetais e contra a sua propagação no interior da Comunidade ( 8 ), mais particularmente no seu artigo 16.o, n.o 3, terceira frase, que autoriza a Comissão a adotar as «medidas necessárias» quando, nomeadamente, se tenha constatado a presença de organismos prejudiciais enumerados no anexo I, parte A, secção I, desta diretiva, entre os quais figura a bactéria Xylella fastidiosa (Well e Raju). |
7. |
Através da sua primeira Decisão de Execução 2014/87/UE, de 13 de fevereiro de 2014 ( 9 ), a Comissão proibiu o transporte de vegetais para plantação para fora da província de Lecce (Itália), determinou a realização de prospeções oficiais anuais para detetar a presença da Xylella fastidiosa e obrigou os Estados‑Membros a assegurar que, sempre que uma pessoa tiver conhecimento da presença da bactéria ou tiver motivos para suspeitar dessa presença, essa pessoa deve notificar a autoridade competente no prazo de dez dias. |
8. |
Através da sua segunda Decisão de Execução 2014/497/UE, de 23 de julho de 2014 ( 10 ), a Comissão restringiu a circulação dos vegetais que sejam hospedeiros da Xylella fastidiosa e sujeitou a sua introdução na União a várias condições, quando sejam provenientes de países terceiros onde seja conhecida a presença da bactéria. Para erradicar a bactéria e impedir a sua propagação, a Comissão, impôs, além disso, aos Estados‑Membros que criassem, quando necessário, «áreas demarcadas» compostas por uma «zona infetada» e por uma «zona‑tampão» em que os Estados‑Membros devem, nomeadamente, remover todos os vegetais infetados ou com sintomas de eventual infeção bem como todos os vegetais suscetíveis de estar infetados. |
9. |
Através da sua terceira Decisão de Execução (UE) 2015/789, de 18 de maio de 2015 ( 11 ), a Comissão, baseando‑se no parecer científico sobre o risco fitossanitário causado pela Xylella fastidiosa (Wells et al.), publicado em 6 de janeiro de 2015 pela AESA, começou por alargar a lista das espécies vegetais suscetíveis e, atendendo à situação no sul da Itália, determinou que a zona infetada abrangia a totalidade da província de Lecce, devendo a zona‑tampão ter pelo menos 10 km de largura, circundando a zona infetada. Seguidamente, a Comissão precisou a natureza das «medidas de erradicação» que deviam ser tomadas na área demarcada, impondo ao Estado‑Membro a obrigação de, num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados, proceder à remoção imediata não só dos vegetais que se saiba estarem infetados e dos que têm sintomas de possível infeção ou de que se suspeite estarem infetados, como também, independentemente do seu estatuto sanitário, dos «vegetais hospedeiros», definidos como os vegetais suscetíveis aos isolados europeus da bactéria ( 12 ). |
10. |
Constatando que já não era possível a erradicação da bactéria na província de Lecce, a Comissão previu que a entidade oficial responsável podia decidir aplicar meras «medidas de confinamento», em vez de medidas de erradicação, com o objetivo de «minimizar a quantidade de inóculo bacteriano [...] e manter a população de vetores no nível mais baixo possível» ( 13 ). Estas medidas consistiam, principalmente, na remoção imediata de, pelo menos, todos os vegetais cuja infeção pela bactéria tivesse sido constatada se estivessem situados na proximidade de locais indemnes de qualquer infeção, de locais em que se encontram vegetais com especial valor científico, social ou cultural ou a uma distância de 20 km da fronteira da área de confinamento com o restante território da União. |
11. |
Por fim, através da sua quarta Decisão de Execução (UE) 2015/2417, de 17 de dezembro de 2015 ( 14 ), a Comissão alterou a Decisão de Execução 2015/789 a fim de tomar em conta a evolução dos conhecimentos científicos e criou planos de emergência a nível de cada Estado‑Membro a fim de melhorar a luta contra a bactéria. |
12. |
Em execução das decisões da Comissão, as autoridades italianas adotaram diversas medidas. |
13. |
Através da deliberazione della Giunta Regionale della Puglia n.o 2023 — recante misure di emergenza per la prevenzione, il controllo e la eradicazione del batterio da quarantena Xylella fastidiosa associato al «Complesso del disseccamento rapido dell’olivo» (decisão n.o 2023 do Conselho Regional da Apúlia, relativa a medidas de emergência para a prevenção, o controlo e erradicação da bactéria de quarentena Xylella fastidiosa, associada ao «complexo da secagem rápida da oliveira»), de 29 de outubro de 2013, a Regione Puglia (Região da Apúlia) tomou medidas de emergência destinadas à prevenção e à erradicação da bactéria, em conformidade com o artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2000/29. |
14. |
O decreto del Ministro delle Politiche Agricola Alimentari e Forestali (decreto do Ministro das Políticas Agrícolas, Alimentares e Florestais), de 26 de setembro de 2014 ( 15 ), implementou as medidas previstas pela Decisão de Execução 2014/497. |
15. |
Em 10 de fevereiro de 2015, na sequência da deliberazione della Giunta Regionale della Puglia n.o 1842 — di richiesta di dichiarazione dello stato di emergenza fitosanitaira straordinaria (decisão n.o 1842 do Conselho Regional da Apúlia, relativa ao pedido de declaração do estado de emergência fitossanitária extraordinária), de 5 de setembro de 2014, a Presidenza del Consiglio dei Ministri (Presidência do Conselho de Ministros) adotou uma decisão que declarava o estado de emergência em razão da propagação no território da Região da Apúlia da bactéria patogénica de quarentena Xylella fastidiosa. |
16. |
Através da ordinanza della Presidenza del Consiglio dei Ministri — Dipartimento della Protezione Civile n.o 225 (despacho n.o 225 da Presidência do Conselho de Ministros — Departamento da Proteção Civil), de 11 de fevereiro de 2015, o comandante del Corpo Forestale dello Stato (comandante regional da administração florestal) da Região da Apúlia foi nomeado para o cargo de comissário delegado. |
17. |
Em 16 de março de 2015, o comissário delegado adotou um plano para a execução mais rápida das medidas previstas no decreto do Ministro das Políticas Agrícolas, Alimentares e Florestais de 26 de setembro de 2014. Este plano tinha como objetivo criar uma zona de proteção para impedir a bactéria de se propagar para o norte da província de Lecce e gerir a zona mais afetada, para proteger a cultura das oliveiras no Salento (Itália). |
18. |
O decreto del Ministro delle Politiche Agricole Alimentari e Forestali — recante misure di emergenza per la prevenzione, il controllo e l’eradicazione di Xylella fastidiosa (Wells e Raju) nel territorio della Repubblica italiana [Decreto do Ministro das Políticas Agrícolas, Alimentares e Florestais, relativo a medidas de emergência para a prevenção, o controlo e a erradicação da Xylella fastidiosa (Wells e Raju) no território da República Italiana], de 19 de junho de 2015 ( 16 ), implementou a Decisão de Execução 2015/789. |
19. |
Os artigos 8.° e 9.° deste decreto retomam, em substância, o conteúdo, respetivamente, do artigo 6.o desta decisão de execução, relativo às medidas de erradicação, e do seu artigo 7.o, relativo às medidas de confinamento. |
20. |
Além disso, o referido decreto impõe aos proprietários dos terrenos em causa a execução das medidas de erradicação, ficando a Agenzia Regionale per le Attività Irrigue e Forestali (Agência Regional para as Atividades de Irrigação e Florestais) autorizada a substituir‑se àqueles que se recusem a cumprir, intervindo a expensas dos mesmos. |
21. |
Através de uma decisão de 31 de julho de 2015, o Conselho de Ministros prolongou a duração do estado de emergência por mais 180 dias. |
22. |
Em 30 de setembro de 2015, o comissário delegado, que tinha apresentado, em 3 de julho de 2015, um plano provisório relativo às intervenções de emergência a realizar no município de Oria (Itália), adotou um novo plano de intervenção que retomava, em substância, as medidas previstas pelo Decreto de 19 de junho de 2015. |
23. |
Em 1 de outubro de 2015, o dirigente del Servicio Agricultura della Regione Puglia (diretor do Serviço de Agricultura da Região da Apúlia) ordenou aos proprietários de terrenos agrícolas onde se encontrassem oliveiras infetadas que abatessem as árvores infetadas bem como todos os vegetais hospedeiros que se encontrassem num raio de 100 metros em torno dos vegetais infetados. Estas decisões de remoção, notificadas aos recorrentes nos processos principais em 3 e 4 de outubro de 2015, previam igualmente que, em caso de recusa de cumprimento por parte destes, podiam ser‑lhes aplicadas sanções adicionais, que consistiam em obrigá‑los a suportar os custos associados à erradicação da Xylella fastidiosa e em aplicar‑lhes uma sanção administrativa. |
24. |
Através de um recurso interposto perante o Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal administrativo regional para o Lácio, Itália) contra a Presidenza del Consiglio dei Ministri (Presidência do Conselho de Ministros) (processo C‑79/16), a Presidenza del Consiglio dei Ministri — Dipartimento della Protezione Civile (Presidência do Conselho de Ministros — Departamento da Proteção Civil), o Commissario Delegato per Fronteggiare il Rischio Fitosanitario connesso alla Diffusione della Xylella nel Territorio della Regione Puglia (Comissário Delegado para a Luta contra o Risco Fitossanitário associado à propagação da Xylella no território da Região da Apúlia), o Ministro delle Politiche Agricole Alimentari e Forestali (Ministro das Políticas Agrícolas, Alimentares e Florestais) bem como a Regione Puglia (Região da Apúlia), Giovanni Pesce (processo C‑78/16) e Cesare Serinelli (processo C‑79/16), bem como outros recorrentes em cada um destes processos, todos proprietários de terrenos agrícolas situados no território do município de Torchiarolo (Itália), pediram a anulação das decisões de remoção bem como de qualquer ato prévio, associado ou subsequente. |
25. |
Tendo dúvidas quanto à validade da Decisão de Execução 2015/789, com base na qual foram adotadas as medidas nacionais impugnadas pelos recorrentes nos processos principais, o Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal administrativo regional para o Lácio) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
|
26. |
Ao colocar em causa a validade da Decisão de Execução 2015/789, o presente pedido de decisão prejudicial suscita a questão subjacente de saber se, ao adotar esta decisão, a Comissão conseguiu obter um justo equilíbrio entre, por um lado, as preocupações de proteção das zonas ainda não afetadas pela bactéria e, por outro, a salvaguarda dos interesses dos proprietários ou dos agricultores que exploram terrenos situados nas zonas já infetadas. |
27. |
Nas presentes conclusões, indicarei que a medida de remoção dos vegetais estabelecida no artigo 6.o, n.o 2, da Decisão de Execução 2015/789 deve ser executada pelo Estado‑Membro em causa após a realização dos tratamentos fitossanitários previstos no artigo 6.o, n.o 4, desta decisão e que não existe contradição entre as diferentes medidas previstas por esta última disposição, que respeita o dever de fundamentação. |
28. |
Defenderei, igualmente, que a Comissão não ultrapassou os poderes de execução que lhe são conferidos pelo artigo 16.o, n.o 3, da Diretiva 2000/29 nem violou o princípio da precaução ou o da proporcionalidade ao prever a remoção imediata dos vegetais hospedeiros, independentemente do seu estatuto sanitário, num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados. |
29. |
Sustentarei que decorre do artigo 17.o da Carta um direito, para os proprietários dos vegetais destruídos, a receber uma indemnização razoavelmente proporcional ao valor desses bens e que o silêncio da Diretiva 2000/29 e da Decisão de Execução 2015/789 a este respeito não pode ser interpretado no sentido de excluir tal direito. Daí decorre, na minha opinião, que os Estados‑Membros, os quais, ao adotarem medidas de aplicação da Decisão de Execução 2015/789, aplicam o direito da União, na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da Carta, são obrigados a instituir um regime de indemnização. |
30. |
Concluirei que a análise das questões submetidas não revelou nenhum elemento suscetível de afetar a validade da Decisão de Execução 2015/789. |
II – Quadro jurídico
A – Diretiva 2000/29
31. |
Em 8 de maio de 2000, o Conselho da União Europeia adotou a Diretiva 2000/29, que codifica a Diretiva 77/93/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1976, relativa às medidas de proteção contra a introdução na Comunidade de organismos prejudiciais às plantas e produtos vegetais e contra a sua propagação no interior da Comunidade ( 18 ), que tinha sido alterada por várias vezes ( 19 ). |
32. |
Nos termos do artigo 16.o da Diretiva 2000/29: «1. Cada Estado‑Membro notificará imediatamente por escrito a Comissão e os outros Estados‑Membros de qualquer presença, no seu território, de organismos prejudiciais enumerados no anexo I, parte A, secção I ou no anexo II, parte A, secção II, ou de qualquer aparecimento numa parte do seu território em que a sua presença não era até então conhecida, de organismos prejudiciais enumerados no anexo I, parte A, secção II ou no anexo I, parte B ou no anexo II, parte A, secção II ou no anexo II, parte B. O Estado‑Membro tomará todas as medidas necessárias com vista à erradicação ou, se esta não for possível, ao confinamento dos organismos prejudiciais. Das medidas tomadas informará a Comissão e os outros Estados‑Membros. 2. Cada Estado‑Membro notificará imediatamente por escrito a Comissão e os outros Estados‑Membros do aparecimento real ou suspeitado de organismos prejudiciais não enumerados no anexo I ou no anexo II e cuja presença era até então desconhecida no seu território; informará igualmente a Comissão e os outros Estados‑Membros das medidas de proteção que tiver tomado ou tenha a intenção de tomar. Entre outros aspetos, essas medidas devem ser de molde a evitar os riscos de propagação dos referidos organismos prejudiciais ao território dos outros Estados‑Membros. Em relação às remessas de vegetais, produtos vegetais ou outros objetos provenientes de países terceiros que se considere representarem um perigo iminente de introdução ou de propagação de organismos prejudiciais referidos no n.o 1 e no primeiro parágrafo do presente número, o Estado‑Membro em causa tomará imediatamente as medidas necessárias para proteger o território da Comunidade e desse facto informará a Comissão e os outros Estados‑Membros. Quando um Estado‑Membro considerar que existe um perigo iminente que não seja o referido no segundo parágrafo, notificará imediatamente a Comissão e os outros Estados‑Membros das medidas que deseja que sejam tomadas. Se considerar que essas medidas não são tomadas num prazo suficiente para evitar a introdução ou a propagação de um organismo prejudicial no seu território, pode tomar provisoriamente as disposições complementares que considerar necessárias, enquanto a Comissão não tiver adotado medidas em aplicação do n.o 3. A Comissão fará um relatório ao Conselho sobre a aplicação da presente disposição, juntamente com propostas adequadas, até 31 de dezembro de 1992. 3. Nos casos referidos nos n.os 1 e 2 a Comissão analisará a situação, logo que possível, com o Comité Fitossanitário Permanente. Podem efetuar‑se inquéritos in loco sob a autoridade da Comissão e em conformidade com as disposições adequadas do artigo 21.o As medidas necessárias baseadas numa análise do risco fitossanitário, ou numa análise preliminar do risco fitossanitário, para os casos referidos no n.o 2, incluindo as destinadas a decidir se as medidas tomadas pelos Estados‑Membros deverão ser revogadas ou alteradas, poderão ser adotadas em conformidade com o procedimento previsto no n.o 2 do artigo 18.o A Comissão acompanhará a evolução da situação e, em conformidade com esse mesmo procedimento, alterará ou revogará as medidas em causa consoante a evolução da situação. Enquanto nenhuma medida tiver sido adotada de acordo com o procedimento citado, o Estado‑Membro pode manter as medidas que tiver tomado. 4. As disposições de aplicação dos n.os 1 e 2, serão adotadas, se necessário, nos termos do procedimento previsto no n.o 2 do artigo 18.o 5. Se não tiver sido informada das medidas tomadas nos termos dos n.os 1 ou 2 ou se considerar que estas não são adequadas, a Comissão pode, enquanto se aguarda a reunião do Comité Fitossanitário Permanente, tomar medidas de proteção provisórias baseadas numa análise preliminar do risco fitossanitário, para erradicar ou, se isso não for possível, impedir a propagação do organismo prejudicial em causa. Essas medidas devem ser submetidas ao Comité Fitossanitário Permanente o mais rapidamente possível com vista à sua confirmação, alteração ou supressão de acordo com o procedimento previsto no n.o 2 do artigo 18.o» |
33. |
O artigo 18.o da Diretiva 2000/29 dispõe: «1. A Comissão é assistida pelo Comité Fitossanitário Permanente, instituído pela Decisão 76/894/CEE do Conselho [ ( 20 )] [...] 2. Sempre que se faça referência ao presente número, são aplicáveis os artigos 5.° e 7.° da Decisão 1999/468/CE [ ( 21 )]. O prazo previsto no n.o 6 do artigo 5.o da Decisão 1999/468[...] é de três meses. [...]» |
34. |
O anexo I, parte A, secção I, alínea b), da Diretiva 2000/29 menciona a bactéria Xylella fastidiosa (Well et Raju) entre os organismos prejudiciais cujas introdução e propagação nos Estados‑Membros devem ser proibidas. |
B – Decisão de Execução 2015/789
35. |
O artigo 1.o da Decisão de Execução 2015/789 define o conceito de «organismo especificado», no sentido de abranger todos os isolados europeus e não europeus de Xylella fastidiosa (Wells et al.). Este artigo distingue, além disso, os «vegetais especificados», enumerados no anexo I desta decisão de execução e os «vegetais hospedeiros», enumerados no anexo II da mesma, sendo os primeiros todos os vegetais conhecidos como suscetíveis aos isolados europeus e não europeus do organismo especificado, ao passo que os vegetais hospedeiros são os que são conhecidos como suscetíveis aos isolados europeus da bactéria. |
36. |
O artigo 4.o da Decisão de Execução 2015/789, intitulado «Estabelecimento de áreas demarcadas», dispõe: «1. Se a presença do organismo especificado for confirmada, o Estado‑Membro em causa deve imediatamente demarcar uma área em conformidade com o n.o 2 [...] 2. A área demarcada deve compreender a zona infetada e uma zona‑tampão. A zona infetada deve incluir todos os vegetais que se sabe estarem infetados pelo organismo especificado, todos os vegetais com sintomas de possível infeção por aquele organismo e todos os outros vegetais suscetíveis de estar infetados por aquele organismo, devido à sua proximidade imediata com vegetais infetados, ou a uma origem comum de produção, se esta for conhecida, com vegetais infetados ou com vegetais derivados de vegetais infetados. No que diz respeito à presença do organismo especificado na província de Lecce, a zona infetada deve incluir, pelo menos, toda essa província. A zona‑tampão deve ter pelo menos 10 km de largura, circundando a zona infetada. A delimitação exata das zonas deve basear‑se em princípios científicos sólidos, na biologia do organismo especificado e seus vetores, no nível de infeção, na presença dos vetores e na distribuição de vegetais especificados na área em causa. 3. Se se confirmar a presença do organismo especificado na zona‑tampão, a delimitação da zona infetada e da zona‑tampão deve ser imediatamente revista e alterada em conformidade. 4. Com base nas notificações efetuadas pelos Estados‑Membros em conformidade com a Decisão 2014/917/UE [ ( 22 )], a Comissão deve estabelecer e manter atualizada uma lista das áreas demarcadas e comunicar essa lista aos Estados‑Membros. 5. Sempre que, com base nas prospeções referidas no artigo 3.o e na monitorização referida no artigo 6.o, n.o 7, o organismo especificado não for detetado numa área demarcada durante um período de cinco anos, essa demarcação pode ser retirada. Nesses casos, o Estado‑Membro em causa deve notificar a Comissão e os outros Estados‑Membros. [...]» |
37. |
Nos termos do artigo 6.o da Decisão de Execução 2015/789, intitulado «Medidas de erradicação»: «1. Um Estado‑Membro que estabeleça a área demarcada a que se refere o artigo 4.o deve adotar nessa área as medidas definidas nos n.os 2 a 11. 2. O Estado‑Membro em causa deve, num raio de 100 m em redor dos vegetais que foram analisados e considerados infetados pelo organismo especificado, remover imediatamente:
3. O Estado‑Membro em causa deve proceder à amostragem e análise dos vegetais especificados num raio de 100 m em redor de cada vegetal infetado, em conformidade com a Norma Internacional para as Medidas Fitossanitárias ISPM n.o 31 [...] 4. O Estado‑Membro em causa deve, antes da remoção dos vegetais referidos no n.o 2, realizar tratamentos fitossanitários adequados contra os vetores do organismo especificado e os vegetais que possam ser hospedeiros desses vetores. Esses tratamentos podem incluir, se for caso disso, a remoção de vegetais. 5. O Estado‑Membro em causa deve destruir os vegetais e partes de vegetais referidos no n.o 2, in situ ou num local próximo designado para o efeito dentro da zona infetada, de uma forma que impeça a propagação do organismo especificado. [...] 9. O Estado‑Membro em causa deve, sempre que necessário, adotar medidas para obviar a qualquer particularidade ou dificuldade que se possa razoavelmente esperar e seja suscetível de impedir, prejudicar ou atrasar a erradicação, em especial em matéria de acessibilidade e adequada destruição de todos os vegetais infetados ou suspeitos de infeção, independentemente da sua localização, de se tratar de propriedade pública ou privada, ou da pessoa ou entidade responsável por esses vegetais. 10. O Estado‑Membro em causa deve adotar qualquer outra medida que possa contribuir para a erradicação do organismo especificado, em conformidade com a norma ISPM n.o 9 [...] e aplicando uma abordagem integrada em conformidade com os princípios estabelecidos na norma ISPM n.o 14 [...] [...]» |
38. |
O artigo 7.o da Decisão de Execução 2015/789, intitulado «Medidas de confinamento», dispõe: «1. Em derrogação do disposto no artigo 6.o, e apenas na província de Lecce, a entidade oficial responsável do Estado‑Membro em causa pode decidir aplicar medidas de confinamento, como definidas nos n.os 2 a 6 [...] 2. O Estado‑Membro em causa deve remover imediatamente pelo menos todos os vegetais que se verifique estarem infetados pelo organismo especificado, se estiverem situados em qualquer dos seguintes locais:
Devem ser tomadas todas as precauções necessárias para evitar a propagação do organismo especificado durante e após a remoção. 3. O Estado‑Membro em causa deve, num raio de 100 m em redor dos vegetais referidos no n.o 2 e que se verifique estarem infetados pelo organismo especificado, proceder à amostragem e análise dos vegetais hospedeiros, em conformidade com a Norma Internacional para as Medidas Fitossanitárias ISPM n.o 31. Essas análises devem ser efetuadas a intervalos regulares e, pelo menos, duas vezes por ano. 4. O Estado‑Membro em causa deve, antes da remoção de vegetais referidos no n.o 2, aplicar tratamentos fitossanitários adequados contra os vetores do organismo especificado e os vegetais que possam ser hospedeiros desses vetores. Esses tratamentos podem incluir, se for caso disso, a remoção de vegetais. 5. O Estado‑Membro em causa deve destruir os vegetais e partes de vegetais referidos no n.o 2, in situ ou num local próximo designado para o efeito dentro da área de confinamento, de uma forma que impeça a propagação do organismo especificado. 6. O Estado‑Membro em causa deve aplicar práticas agrícolas adequadas para a gestão do organismo especificado e dos seus vetores.» |
39. |
O artigo 8.o da Decisão de Execução 2015/789 prevê o estabelecimento de uma zona de vigilância na Itália, com uma largura de, pelo menos, 30 km. |
III – Apreciação
A – Quanto à admissibilidade das questões
40. |
Através das suas seis questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se a Decisão de Execução 2015/789 viola, por diferentes razões, o artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE, o artigo 41.o da Carta, o artigo 11.o, n.o 3, o artigo 13.o C, n.o 7, e o artigo 16.o, n.os 1 a 3 e 5, da Diretiva 2000/29 bem como os princípios da adequação e da proporcionalidade. |
41. |
Tendo a validade da Decisão de Execução 2015/789 sido contestada, a título acessório, pelos recorrentes nos processos principais por ocasião de um recurso interposto perante o órgão jurisdicional contra, nomeadamente, o Decreto de 19 de junho de 2015 adotado diretamente em aplicação desta Decisão de Execução, cujos termos retoma em substância, há que verificar previamente a admissibilidade das questões suscitadas nesta configuração particular. |
42. |
Resulta, com efeito, de jurisprudência constante que o Tribunal de Justiça subordina o direito de uma parte de invocar a exceção da invalidade de um ato da União à condição de essa parte não ter disposto do direito de pedir diretamente a sua anulação ao juiz da União, nos termos do artigo 263.o TFUE ( 23 ). |
43. |
Contudo, na medida em que a solução assenta no risco de poder ser contornado o caráter definitivo de um ato da União, só se aplica relativamente a uma parte que invoque em seu benefício a ilegalidade de um ato da União perante um órgão jurisdicional nacional, embora — sem qualquer dúvida — tivesse podido interpor um recurso de anulação desse ato, mas não o tenha feito no prazo estabelecido ( 24 ). Uma parte relativamente à qual não se afigure que tivesse, manifestamente, a possibilidade de interpor um recurso direto de anulação contra a decisão conserva, portanto, a faculdade de impugnar indiretamente a sua legalidade. |
44. |
Nos termos do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, «[q]ualquer pessoa singular ou coletiva pode interpor, nas condições previstas nos primeiro e segundo parágrafos, recursos contra os atos de que seja destinatária ou que lhe digam direta e individualmente respeito, bem como contra os atos regulamentares que lhe digam diretamente respeito e não necessitem de medidas de execução». |
45. |
No caso em apreço, uma vez que é pacífico que os recorrentes nos processos principais não são destinatários da Decisão de Execução 2015/789, dado que esta é dirigida aos Estados‑Membros, importa examinar se a mesma lhes diz direta e individualmente respeito, na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, ou se esta Decisão de Execução pode ser qualificada como ato regulamentar que não necessita de medidas de execução, na aceção desta disposição, e diz diretamente respeito aos recorrentes nos processos principais, sendo que me parece que o exame da natureza regulamentar ou não do ato deve ser efetuado antes do da questão de saber se diz direta e individualmente respeito aos recorrentes. |
46. |
Em primeiro lugar, afigura‑se que a Decisão de Execução 2015/789 constitui um ato regulamentar que necessita de medidas de execução. |
47. |
A este respeito, importa, antes de mais, observar que o conceito de «atos regulamentares», previsto no artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, abrange os atos de alcance geral, com exceção dos atos legislativos ( 25 ). |
48. |
Embora o conceito de «decisão» seja geralmente definido como um ato de alcance individual que apenas vincula as pessoas à qual é dirigido ( 26 ), pode, todavia, apresentar um caráter normativo quando não for aplicável a destinatários limitados mas a categorias de pessoas consideradas de forma geral e abstrata ( 27 ). De resto, desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, a potencialidade normativa de uma decisão pode ser mais facilmente reconhecida, na medida em que o artigo 288.o TFUE dispõe expressamente que um ato pode constituir uma decisão apesar de não designar destinatários. |
49. |
O conceito de «decisão regulamentar» não constitui, portanto, um oximoro jurídico e, além disso, a apreciação da natureza jurídica de um ato emitido pelo Conselho ou pela Comissão não depende apenas da sua designação oficial, devendo ser tido em conta, em primeiro lugar, o seu objeto e o seu conteúdo ( 28 ). Importa, assim, para qualificar a Decisão de Execução 2015/789, apurar se esta tem alcance geral. |
50. |
Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, um ato tem alcance geral se se aplicar a situações determinadas objetivamente e se produzir os seus efeitos jurídicos em relação a categorias de pessoas visadas de forma geral e abstrata ( 29 ). |
51. |
Nos termos de uma jurisprudência igualmente constante, o alcance geral e, portanto, a natureza normativa de um ato não são postos em causa pela possibilidade de se determinar, com maior ou menor precisão, o número, ou mesmo a identidade, dos sujeitos de direito a que ele se aplica num dado momento, desde que se comprove que essa aplicação se efetua em virtude de uma situação objetiva, de direito ou de facto, definida pelo ato relativamente à sua finalidade ( 30 ). |
52. |
No caso em apreço, há que constatar, por um lado, que a Decisão de Execução 2015/789 não foi adotada segundo o processo legislativo e, por outro, que as obrigações estabelecidas nesta Decisão de Execução são redigidas em termos gerais e abstratos e se dirigem a todos os Estados‑Membros, como se prevê explicitamente no artigo 21.o da referida decisão de execução. Não obstante a circunstância de a República Italiana ser mais afetada do que outros Estados‑Membros e de o artigo 7.o da Decisão de Execução 2015/789 respeitar apenas a uma região geograficamente determinada, a saber, a província de Lecce, esta Decisão de Execução não é dirigida a destinatários limitados, designados ou identificáveis, mas aplica‑se de modo abstrato a áreas geográficas demarcadas objetivamente em função da presença da bactéria ( 31 ). Além disso, a referida Decisão de Execução produz efeitos jurídicos imediatos, em todos os Estados‑Membros, relativamente a categorias de pessoas consideradas de modo geral e abstrato. |
53. |
Seguidamente, há que salientar que a Decisão de Execução 2015/789 necessita de medidas de execução. |
54. |
Para apreciar se um ato regulamentar necessita de medidas de execução, há que considerar a posição da pessoa que invoca o direito de recurso nos termos do último membro de frase do quarto parágrafo do artigo 263.o TFUE ( 32 ) e fazer referência exclusivamente ao objeto do recurso ( 33 ). |
55. |
Além disso, no âmbito desta apreciação, não é relevante determinar se as referidas medidas têm ou não caráter mecânico ( 34 ). |
56. |
No caso em apreço, para determinar se a Decisão de Execução 2015/789 necessita de medidas de execução, importa verificar se esta Decisão de Execução determina, ela própria, as medidas de profilaxia necessárias para lutar contra a bactéria ou se é necessária, para esse efeito, uma decisão das autoridades nacionais. |
57. |
Bastará constatar que a Decisão de Execução 2015/789 obriga os Estados‑Membros a adotar medidas que consistem, em particular, na demarcação no seu território, em conformidade com o estabelecido no seu artigo 4.o, de zonas infetadas e zonas‑tampão bem como na erradicação ou, apenas quanto à província de Lecce, no confinamento eventual dos vegetais infetados e dos vegetais hospedeiros. Esta Decisão de Execução deve, portanto, ser implementada por medidas nacionais que são suscetíveis de ser objeto de recurso por parte dos seus destinatários. |
58. |
Em segundo lugar, importa constatar que a Decisão de Execução 2015/789 não diz individualmente respeito aos recorrentes nos processos principais. |
59. |
Parece‑me que a inexistência de afetação individual decorre necessariamente da constatação da natureza regulamentar desta decisão, não só formalmente como também materialmente, dado que o critério adotado para determinar a aptidão normativa deste ato — respeitante à sua dimensão abstrata e à objetividade das situações que visa reger — exclui, na minha opinião, que o referido ato possa atingir os recorrentes nos processos principais em razão das suas qualidades particulares ou de uma situação de facto que os caracterize relativamente a qualquer outra pessoa e, como tal, os individualize à semelhança de um destinatário. |
60. |
Uma vez que as condições associadas ao facto de ser afetado tanto diretamente como individualmente pelo ato da União são cumulativas, não é necessário verificar se, no caso em apreço, a Decisão de Execução 2015/789 diz ou não diretamente respeito aos recorrentes nos processos principais. |
61. |
Atendendo a todas as considerações precedentes, não se afigura que os recorrentes nos processos principais tivessem podido interpor um recurso de anulação contra a Decisão de Execução 2015/789. Há que concluir que os mesmos têm o direito de invocar a exceção de invalidade desta decisão de execução perante o órgão jurisdicional de reenvio, pelo que as questões suscitadas são admissíveis. |
B – Quanto à validade da Decisão de Execução 2015/789
1. Quanto às primeira e terceira questões
62. |
Através das suas primeira que terceira questões, que convém examinar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, por um lado, se o artigo 6.o, n.os 2 e 4, da Decisão de Execução 2015/789 é inválido, na medida em que viola o artigo 13.o, n.o 3, o artigo 13.o C, n.o 7, e o artigo 16.o, n.os 1 a 3 e 5, da Diretiva 2000/29, dado que impõe a remoção imediata dos vegetais hospedeiros, independentemente do seu estatuto sanitário, num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados, prevendo simultaneamente que, antes da remoção dos vegetais, o Estado‑Membro em causa realiza os tratamentos fitossanitários adequados contra os vetores do organismo especificado aos vegetais que possam ser hospedeiros desses vetores, podendo tais tratamentos incluir, se for caso disso, a remoção de vegetais e, por outro, se esta disposição dever ser interpretada no sentido de que a medida de erradicação prevista no n.o 2 poderia ser imposta antes e independentemente da aplicação preventiva das medidas previstas nos n.os 3 e 4, se a referida disposição é inválida à luz do artigo 16.o, n.os 1 a 3 e 5, da Diretiva 2000/29, dos princípios da proporcionalidade e da lógica bem como do princípio do respeito das regras processuais. |
63. |
Resulta da fundamentação da decisão de reenvio (C‑79/16) e da formulação das questões submetidas que o órgão jurisdicional de reenvio se interroga sobre a articulação entre as disposições do artigo 6.o, n.o 2, da Decisão de Execução 2015/789, que impõe a remoção «imediata» dos vegetais infetados e dos vegetais hospedeiros, independentemente do seu estatuto sanitário, e as do seu artigo 6.o, n.os 3 e 4, que preveem a amostragem e a realização prévia de tratamentos fitossanitários adequados contra os vetores da bactéria. |
64. |
Mais precisamente, o órgão jurisdicional de reenvio suscita a questão de saber se as medidas de erradicação podem ser ordenadas sem realização prévia de tratamentos fitossanitários e se estas duas sérias de disposições não enfermam de uma contradição interna suscetível de afetar a sua validade. |
65. |
Não vislumbro qualquer incerteza quanto à interpretação das disposições em questão nem qualquer contradição que as torne inaplicáveis. |
66. |
Os n.os 2, 3 e 4 do artigo 6.o da Decisão de Execução 2015/789 preveem, respetivamente, que o Estado‑Membro em causa «deve [...] remover imediatamente» os vegetais hospedeiros, os vegetais infetados, bem como os vegetais com sintomas de possível infeção ou de que se suspeite estarem infetados, «deve proceder à amostragem e análise dos vegetais especificados num raio de 100 metros em redor de cada vegetal infetado» e que, «[o] Estado‑Membro em causa deve, antes da remoção dos vegetais referidos no n.o 2, realizar tratamentos fitossanitários adequados contra os vetores de [Xylella fastidiosa] e os vegetais que possam ser hospedeiros desses vetores», podendo estes tratamentos incluir, se for caso disso, «a remoção de vegetais». |
67. |
A leitura destas disposições demonstra que o Estado‑Membro em causa deve, antes de proceder à remoção dos vegetais hospedeiros e dos vegetais infetados, realizar um tratamento fitossanitário destinado a combater os vetores da doença, ou seja, os insetos sugadores que se alimentam dos líquidos do xilema das plantas, erradicando estes insetos ou removendo os vegetais que os hospedam. Este tratamento fitossanitário prévio responde à lógica dos processos de erradicação sugeridos pelo parecer da AESA adotado em 30 de dezembro de 2014 ( 35 ), que indica que, embora a primeira medida a adotar nas áreas demarcadas seja a remoção, o mais rapidamente possível, dos vegetais infetados, importa realizar previamente um tratamento inseticida na medida em que os insetos vetores se podem deslocar dos vegetais infetados para outros vegetais ( 36 ). |
68. |
Por força do artigo 6.o, n.o 3, da Decisão de Execução 2015/789, o Estado‑Membro em causa deve, além disso, proceder, sem especificação cronológica, à amostragem e à análise de todos os vegetais especificados, precisando‑se que esta categoria de vegetais é mais ampla do que a dos vegetais hospedeiros, dado que corresponde a todos os vegetais suscetíveis aos isolados europeus e não europeus da bactéria. |
69. |
A realização prévia dos tratamentos fitossanitários destinados a combater os vetores da doença, que podem incluir a remoção dos vegetais que os hospedam, e a realização de amostragens e de análises relativamente a todos os vegetais especificados não encerram qualquer contradição com a remoção dos vegetais hospedeiros e dos vegetais infetados, suspeitos de estarem infetados ou com sintomas de infeção. Em suma, as medidas previstas no artigo 6.o, n.os 2 a 4, da Decisão de Execução 2015/789 são de natureza e de alcance diferentes e, no que respeita às previstas no seu artigo 6.o, n.os 2 e 4, são aplicáveis sucessivamente. Não são, portanto, de modo algum, inconciliáveis. |
70. |
Resulta das considerações precedentes, por um lado, que o artigo 6.o da Decisão de Execução 2015/789 deve ser interpretado no sentido de que a medida de remoção prevista no seu n.o 2 deve ser aplicada pelo Estado‑Membro em causa após a realização dos tratamentos fitossanitários previstos no seu n.o 4 e, por outro, que o exame das primeira e terceira questões não revelou nenhum elemento suscetível de afetar a validade do artigo 6.o, n.os 2 a 4, da Decisão de Execução 2015/789. |
2. Quanto à quinta questão
71. |
Através da sua quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 6.o, n.o 2, da Decisão de Execução 2015/789 é inválido por a medida de remoção imediata dos vegetais hospedeiros, independentemente do seu estatuto sanitário, num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados, não respeitar o dever de fundamentação. |
72. |
Segundo o Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal administrativo regional para o Lácio), a fundamentação da Decisão de Execução 2015/789 afigura‑se incompleta na medida em que não contém qualquer indicação relativa ao facto de a Comissão ter verificado a proporcionalidade das medidas impostas aos Estados‑Membros. |
73. |
Importa recordar que, embora a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deva ser adequada à natureza do ato em questão e revelar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio seguido pela instituição da União, autora do ato, de modo a permitir aos interessados conhecer as razões que justificaram a medida adotada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização, não se exige, porém, que essa fundamentação especifique todos os elementos de facto ou de direito pertinentes ( 37 ). |
74. |
Além disso, o respeito do dever de fundamentação deve ser apreciado tendo em conta não só a redação do ato impugnado mas também o seu contexto bem como o conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em questão. Quando se trata, como nos processos principais, de um ato destinado a aplicação geral, a fundamentação pode limitar‑se a indicar, por um lado, a situação global que conduziu à sua adoção e, por outro, os objetivos gerais que se propõe alcançar. Se o ato contestado revelar o essencial do objetivo prosseguido pela instituição, é inútil exigir uma fundamentação específica para cada uma das escolhas técnicas efetuadas ( 38 ). |
75. |
No caso em apreço, os considerandos 1 a 3 da Decisão de Execução 2015/789 permitem compreender as razões pelas quais as medidas de erradicação adotadas foram alargadas a todos os vegetais hospedeiros situados num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados. Estas medidas respondem, com efeito, ao objetivo geral, expresso nos seus considerandos 1 e 3, de reforçar as medidas de erradicação na sequência da descoberta de novos focos e de evitar a propagação da Xylella fastidiosa no resto da União e à preocupação de tomar em conta os novos pareceres científicos adotados pela AESA em 30 de dezembro de 2014 e em 20 de março de 2015, que alargaram a lista das espécies vegetais suscetíveis à bactéria, limitando, simultaneamente, certas medidas apenas aos vegetais hospedeiros «a fim de garantir a proporcionalidade». |
76. |
Resulta destas considerações que a Decisão de Execução 2015/789 respeita o dever de fundamentação previsto no artigo 296.o TFUE. |
3. Quanto à segunda questão
77. |
Através da sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 6.o, n.o 2, da Decisão de Execução 2015/789 é inválido, na medida em que viola as disposições da Diretiva 2000/29, em particular o seu artigo 16.o, n.o 1, ao prever a remoção imediata dos vegetais hospedeiros, independentemente do seu estatuto sanitário, num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados. |
78. |
Após o exame dos seus considerandos 11 e 37, do seu artigo 1.o, n.o 2, do seu artigo 11.o, n.o 3, do seu artigo 16.o, n.os 1 e 5, do seu artigo 22.o e do seu artigo 23.o, n.o 2, bem como do seu anexo IV, parte A, secção I, pontos 17, 20, 23.1 e 37, o órgão jurisdicional de reenvio considera que a Diretiva 2000/29 não prevê disposições que permitam a destruição de vegetais sãos, mesmo com fins preventivos para evitar uma eventual propagação de um organismo patogénico reconhecido e classificado e que, pelo contrário, visa, no seu conjunto, a proteção dos organismos ainda não infetados. Segundo o sistema estabelecido por esta diretiva, só podem ser destruídos ou removidos os vegetais que, depois de serem objeto de uma inspeção, se tenham revelado já infetados ou que, pelo menos, manifestem sintomas objetivos e percetíveis que permitam suspeitar, de modo não arbitrário, que podem estar infetados. Ora, a Decisão de Execução 2015/789 impõe a eliminação de vegetais que não apresentem sintomas de infeção. |
79. |
Nas suas observações escritas e na audiência, os recorrentes nos processos principais sustentaram, no mesmo sentido, que o conceito de erradicação não é sinónimo de abate e que a erradicação prevista no artigo 16.o da Diretiva 2000/29 se refere exclusivamente aos organismos prejudiciais, pelo que só os vegetais infetados poderiam ser abatidos. |
80. |
Tendo a Decisão de Execução 2015/789 sido adotada ao abrigo apenas da Diretiva 2000/29, nomeadamente do seu artigo 16.o, n.o 3, quarta frase, a questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio reduz‑se à de saber se esta diretiva permite à Comissão impor aos Estados‑Membros a adoção de medidas de erradicação que incidam sobre vegetais sãos ou se, pelo contrário, ao adotar tais medidas, esta instituição ultrapassou os poderes que a referida diretiva lhe conferiu para a execução das regras que estabeleceu. |
81. |
Esta questão não respeita, portanto, à legalidade da decisão do legislador da União de conferir, ao abrigo do artigo 202.o, terceiro travessão, CE, um poder de execução à Comissão, mas à legalidade do ato de execução, a saber, a Decisão de Execução 2015/789, baseada no artigo 16.o, n.o 3, da Diretiva 2000/29, por esta instituição ter ultrapassado os seus poderes de execução. |
82. |
Antes da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, a expressão «competências de execução», contida no artigo 202.o, terceiro travessão, CE, abrangia a competência para dar execução, ao nível da União, a um ato legislativo desta última ou a algumas das suas disposições, bem como, em determinadas circunstâncias, a competência para adotar atos normativos que completassem ou alterassem elementos não essenciais de um ato legislativo. |
83. |
O Tratado de Lisboa introduziu uma distinção entre os poderes de execução e os poderes delegados. Quando um poder de execução é conferido à Comissão com base no artigo 291.o, n.o 2, TFUE, esta é chamada a precisar o conteúdo do ato legislativo, a fim de assegurar a sua execução em condições uniformes em todos os Estados‑Membros. Quando um poder delegado é conferido a esta instituição nos termos do artigo 290.o, n.o 1, TFUE, a Comissão tem o poder de adotar atos não legislativos de alcance geral que completem ou alterem certos elementos não essenciais do ato legislativo. |
84. |
Parece‑me claro que a competência conferida à Comissão pelo artigo 16.o, n.o 3, da Diretiva 2000/29 para adotar as «medidas necessárias» nos casos previstos nos n.os 1 e 2 deste artigo se enquadra no poder de execução, na aceção desta nova distinção. Constato, de resto, que, em conformidade com o previsto no artigo 291.o, n.o 4, TFUE, o ato foi qualificado como decisão de «execução». |
85. |
Resulta da conjugação do artigo 290.o, n.o 1, e do artigo 291.o, n.o 2, TFUE, que a Comissão, quando exerce um poder de execução, não pode alterar nem completar o ato legislativo, mesmo nos seus elementos não essenciais ( 39 ). |
86. |
Resulta, além disso, de jurisprudência constante que o poder de execução da Comissão é marcado pela importante margem de apreciação deixada a esta instituição que é livre de determinar, sujeita à fiscalização do erro manifesto de apreciação e do desvio de poder, o que é necessário e adequado à luz dos objetivos prosseguidos pela regulamentação de base. Segundo a fórmula regularmente utilizada pelo Tribunal de Justiça, tanto antes como depois da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, «no quadro do seu poder de execução, cujos limites devem ser apreciados, nomeadamente, em função dos objetivos gerais essenciais do ato legislativo em causa, a Comissão está autorizada a adotar todas as medidas de aplicação necessárias ou úteis para a implementação do referido ato, desde que não sejam contrárias a este» ( 40 ). |
87. |
Importa, além disso, salientar que o poder de execução da Comissão foi exercido, no caso em apreço, no domínio particular da apreciação das medidas a tomar para combater um risco fitossanitário. Ora, segundo jurisprudência igualmente constante, quando se trata de um domínio em que o legislador da União é chamado a proceder a apreciações complexas, em função de elementos técnicos e científicos suscetíveis de evoluírem rapidamente, a fiscalização jurisdicional do exercício da sua competência só pode ser restrita. Deve limitar‑se a examinar se não enferma de erro manifesto de apreciação ou de desvio de poder, ou se o legislador da União não ultrapassou manifestamente os limites do seu poder de apreciação ( 41 ). O Tribunal de Justiça inferiu daí que só o caráter manifestamente inadequado de uma medida adotada nesses domínios, em relação ao objetivo que a instituição competente pretende prosseguir, pode afetar a legalidade de tal medida ( 42 ). |
88. |
Examinarei a legalidade da Decisão de Execução 2015/789, à luz da habilitação conferida à Comissão, tomando em conta esta margem de apreciação e a fiscalização jurisdicional restrita que dela decorre. |
89. |
Resulta dos considerandos 4 a 6 e do artigo 1.o da Diretiva 2000/29 que esta visa, principalmente, assegurar um elevado nível de proteção fitossanitária contra a introdução na União de organismos prejudiciais em produtos importados de países terceiros ( 43 ). |
90. |
Além das regras relativas à introdução de vegetais provenientes de países terceiros e à circulação dos vegetais no interior da União, diversas medidas destinam‑se a lutar contra a presença e a propagação dos organismos prejudiciais que tenham entrado no território da União. Assim, o artigo 16.o, n.o 1, desta diretiva prevê, designadamente, que cada Estado‑Membro Membro notificará a Comissão e os outros Estados‑Membros da presença, no seu território, dos organismos prejudiciais que, tal como a bactéria Xylella fastidiosa, são enumerados no anexo I, parte A, secção I, da referida diretiva. |
91. |
Depois desta notificação, a Diretiva 2000/29 encarrega simultaneamente os Estados‑Membros e a Comissão de tomarem as medidas que se impõem. Aos Estados‑Membros, o artigo 16.o, n.o 1, desta diretiva impõe a adoção das medidas necessárias destinadas com vista à erradicação ou ao confinamento dos organismos prejudiciais, ao passo que, à Comissão, o artigo 16.o, n.o 3, da referida diretiva confere o poder de adotar todas as «medidas necessárias», incluindo explicitamente neste poder, que constitui igualmente uma obrigação, o de revogar ou de alterar as decisões tomadas pelos Estados‑Membros. |
92. |
Os termos do artigo 16.o, n.o 3, da Diretiva 2000/29 são formulados de modo geral, não permitindo inferir uma eventual limitação do âmbito de aplicação das medidas que podem ser tomadas apenas aos vegetais já infetados. Esta disposição autoriza, pelo contrário, indistintamente, todas as medidas para erradicar ou confinar os organismos prejudiciais, pelo que se a erradicação ou o confinamento de tais organismos requerer não só a destruição dos vegetais infetados como também a dos vegetais sãos situados na proximidade, esta medida enquadra‑se igualmente nos poderes conferidos à Comissão. |
93. |
A leitura restritiva sugerida pelos recorrentes nos processos principais não é, portanto, de modo algum, suportada pela letra do 16.°, n.o 3, da Diretiva 2000/29. Também não pode ser corroborada pelo artigo 11.o, n.o 3, e pelo artigo 13.o C, n.o 7, desta diretiva, que não são pertinentes para apreciar o alcance do poder de execução da Comissão, dado que este se baseia exclusivamente no artigo 16.o, n.o 3, da referida diretiva. Em qualquer caso, não resulta da leitura destas duas disposições que as mesmas impliquem qualquer limitação quanto aos vegetais que podem ser afetados pelas medidas de destruição. |
94. |
Daqui decorre que, ao adotar a Decisão de Execução 2015/789, a Comissão não ultrapassou os poderes que lhe são conferidos pela Diretiva 2000/29 com vista à erradicação ou ao confinamento dos organismos prejudiciais. |
4. Quanto à quarta questão
95. |
Através da sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 6.o, n.os 2 a 4, da Decisão de Execução 2015/789 é inválido, na medida em que viola os princípios da precaução, da adequação e da proporcionalidade. |
96. |
As dúvidas expressas a este respeito pelo órgão jurisdicional de reenvio provêm do facto de a Decisão de Execução 2015/789 ter imposto medidas de erradicação relativas não só aos vegetais infetados, como também a todos os vegetais sãos situados num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados, apesar de não existir certeza científica nem quanto ao nexo de causalidade entre a bactéria e a secagem rápida das oliveiras nem quanto ao seu caráter patogénico para as plantas hospedeiras. |
97. |
Além disso, nenhum elemento objetivo permitiria considerar que um raio de exatamente 100 metros — e não um raio menor — seria suficiente para atingir o objetivo visado, dado que, se esta distância parece ter sido adotada por os insetos vetores da bactéria não serem capazes de voar de um vegetal para outro a uma distância superior, a AESA salientou, todavia, no seu parecer de 26 de novembro de 2013, que os insetos vetores podem ser transportados pelo vento a longas distâncias e, no seu parecer der 6 de janeiro de 2015, que os dados que permitem determinar a distância até à qual os insetos vetores podem voar são insuficientes. |
98. |
Assim, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a Decisão de Execução 2015/789 não assenta em dados científicos que tenham caráter certo e sejam adequados para suportar as escolhas feitas pela Comissão e não comporta uma avaliação do risco e das consequências potenciais em caso de falta de intervenção. Não expõe de que modo as medidas adotadas são adequadas nem aprecia a existência de medidas alternativas menos radicais. |
a) Observações preliminares
99. |
Importa, a título preliminar, avaliar corretamente os dados de facto em função dos quais deve ser fiscalizada a legalidade das medidas em questão nos processos principais, que foram adotadas com base nos dados científicos desse momento. |
100. |
Recordo que, em princípio, a legalidade de um ato da União deve ser apreciada em função dos elementos de facto e de direito existentes à data em que esse ato foi adotado ( 44 ). Creio, porém, poder detetar, em vários acórdãos recentes do Tribunal de Justiça, um esboço de uma corrente jurisprudencial que atenua o rigor deste princípio admitindo, em certas circunstâncias particulares, a tomada em consideração de elementos de facto posteriores. |
101. |
O acórdão de 6 de outubro de 2015, Schrems ( 45 ), fornece uma ilustração recente e particularmente pertinente desta jurisprudência, dado que o Tribunal de Justiça considerou que, ao examinar a validade de uma decisão da Comissão que constata que um país terceiro assegura um nível de proteção adequado aos dados pessoais transferidos, «devem igualmente ser tomadas em conta as circunstâncias que ocorram posteriormente à adoção dessa decisão» ( 46 ). Esta solução justifica‑se pela natureza particular da decisão de adequação, que deve ser objeto de reexame regular por parte da Comissão, em função do contexto factual e jurídico existente nos países terceiros. |
102. |
Pela mesma ordem de ideias, o Tribunal de Justiça considerou, no seu acórdão de 23 de dezembro de 2015, Scotch Whisky Association e o. ( 47 ), que, no âmbito da fiscalização da legalidade de uma regulamentação nacional que ainda não tenha entrado em vigor, o órgão jurisdicional nacional, que deve apreciar a conformidade dessa regulamentação com o direito da União na data em que se pronuncia ( 48 ), deve tomar em consideração todos os elementos de que tenha conhecimento, «tanto mais numa situação [...] em que parece haver incertezas científicas quanto aos efeitos efetivos das medidas previstas [por essa] regulamentação» ( 49 ). O Tribunal de Justiça baseou esta solução no princípio, estabelecido no seu acórdão de 9 de fevereiro de 1999, Seymour‑Smith e Perez ( 50 ), segundo o qual as exigências do direito da União devem ser respeitadas «em qualquer momento pertinente, tanto quando da adoção, como da entrada em vigor ou da aplicação ao caso concreto de uma medida» ( 51 ). |
103. |
Anteriormente, o Tribunal de Justiça tinha declarado que, quando um Estado‑Membro adota uma regulamentação nacional que se insere no âmbito de uma política de proteção da saúde humana e animal, deve rever essa regulamentação se se afigurar que as razões que levaram à sua adoção se alteraram, na sequência, nomeadamente, da evolução dos dados disponíveis resultantes da investigação científica ( 52 ). |
104. |
No que respeita ao princípio da precaução, o Tribunal de Justiça declarou que, quando novos elementos alterem a perceção de um risco ou demonstrem que esse risco pode ser circunscrito por medidas menos rigorosas do que as existentes, cabe às instituições da União, e designadamente à Comissão, que tem o poder de iniciativa, providenciar a adaptação da regulamentação aos novos dados ( 53 ). |
105. |
Por fim, é interessante salientar que, no seu acórdão de 8 de setembro de 2011, Monsanto e o. ( 54 ), o Tribunal de Justiça declarou que, embora os órgãos jurisdicionais nacionais aos quais foram dirigidos recursos contra as medidas de emergência tomadas pelos Estados‑Membros, nos termos do artigo 34.o do Regulamento (CE) n.o 1829/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de setembro de 2003, relativo a géneros alimentícios e alimentos para animais geneticamente modificados ( 55 ), sejam competentes para, enquanto não for adotada uma decisão a nível da União, apreciar a legalidade de tais medidas à luz, nomeadamente, dos requisitos materiais estabelecidos por esse regulamento, pelo contrário, quando uma decisão tiver sido adotada num caso particular, as apreciações de facto e de direito constantes dessa decisão impõem‑se se aos órgãos jurisdicionais chamados a apreciar a legalidade das medidas provisórias adotadas a nível nacional ( 56 ). Justificado pelas exigências do primado e da uniformidade do direito da União, este acórdão impõe, portanto, a tomada em consideração de apreciações de facto e de direito contidas em decisões adotadas a nível da União, ainda que posteriores às medidas nacionais cuja legalidade é contestada. |
106. |
Proponho que se adote uma solução intermédia entre a corrente jurisprudencial tradicional e esta nova corrente, favorável à tomada em consideração de elementos posteriores. Esta solução consiste em considerar que as novas circunstâncias posteriores à adoção de um ato não podem justificar a sua invalidação retroativa, mas podem, sendo caso disso, opor‑se a que as medidas tomadas em aplicação de tal ato sejam legalmente executadas. |
107. |
Se, na minha opinião, novos dados científicos que venham a excluir a existência de qualquer risco fitossanitário associados à Xylella fastidiosa podem justificar que a Decisão de Execução 2015/789 e as decisões nacionais subsequentes deixem de poder ser aplicadas, considero que também se pode tomar em conta, para corroborar a posteriori as escolhas feitas pela Comissão, a melhoria dos conhecimentos científicos que venham, pelo contrário, tornar certo o risco identificado como potencial no momento em que as medidas de erradicação foram estabelecidas. |
108. |
Atendendo às considerações precedentes, não me limitarei, para responder às questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, apenas aos dados científicos conhecidos à data da adoção da Decisão de Execução 2015/789. |
b) Respeito do princípio da precaução
109. |
Resulta de jurisprudência constante que o legislador da União deve tomar em consideração o princípio da precaução, de acordo com o qual, quando subsistam incertezas quanto à existência ou ao alcance de riscos, podem ser adotadas medidas de proteção sem ser necessário esperar que a realidade e gravidade de tais riscos sejam plenamente demonstradas ( 57 ). |
110. |
Além disso, quando seja impossível determinar com certeza a existência ou o alcance do risco alegado, devido à natureza não conclusiva dos resultados dos estudos levados a cabo, mas persista a probabilidade de um prejuízo real para a saúde pública na hipótese de o risco se realizar, o princípio da precaução justifica que sejam adotadas medidas restritivas ( 58 ). |
111. |
O princípio da precaução corrobora, portanto, a ação do legislador da União em caso de incerteza quanto à existência de um risco para o ambiente ou para a saúde humana, animal ou vegetal, quando tal incerteza não resulte de uma falta total de conhecimentos, mas de elementos pormenorizados que sejam fruto de uma avaliação científica. |
112. |
A Comissão violou este princípio ao impor aos Estados‑Membros medidas de erradicação dos vegetais hospedeiros num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados? |
113. |
Não o creio. |
114. |
Os recorrentes nos processos principais contestam, essencialmente, o facto de uma medida de tal gravidade ter sido ordenada sem existir uma certeza científica quanto ao nexo de causalidade entre a bactéria e a secagem das oliveiras. |
115. |
Importa constatar que este fundamento se baseia numa interpretação incorreta do princípio da precaução que, longe de proibir todas as medidas na falta de certeza científica, legitima, pelo contrário, a ação das instituições da União, apesar de estas se encontrarem perante uma situação de incerteza científica. Segundo a fórmula clássica, este princípio não é um princípio de abstenção, mas um princípio de ação numa situação de incerteza. |
116. |
Ora, embora a existência de um nexo de causalidade entre a Xylella fastidiosa e o complexo da secagem rápida das oliveiras não tenha sido demonstrada no parecer de 6 de janeiro de 2015, este parecer destacou, todavia, uma correlação significativa entre a bactéria e a ocorrência de tal patologia. A existência de um risco potencial resultante da propagação da bactéria podia, portanto, ser considerada suficientemente sustentada, no estado em que se encontravam os conhecimentos científicos, para justificar a aplicação do princípio da precaução. |
117. |
Acresce que, de meramente potencial, o risco passou a certo a partir do parecer da AESA adotado em 17 de março de 2016 ( 59 ), onde se indica que os resultados de experiências recentes demonstram que o isolado «De Donno» da Xylella fastidiosa provoca os sintomas do complexo da secagem rápida das oliveiras, e que se trata, portanto, do agente responsável pela doença ( 60 ). |
118. |
Resta determinar se as medidas estabelecidas na Decisão de Execução 2015/789 são proporcionadas. |
c) Respeito do princípio da proporcionalidade
119. |
Para verificar se a Comissão respeitou o princípio da proporcionalidade no exercício dos poderes que lhe são reconhecidos pelo artigo 16.o, n.o 3, da Diretiva 2000/29, importa verificar se os meios que utilizou na sua Decisão de Execução 2015/789 eram aptos para realizar o objetivo visado e não iam além do que era necessário para o atingir. |
120. |
No que respeita, em primeiro lugar, à aptidão da medida em causa nos processos principais para atingir o objetivo prosseguido, importa salientar que, no seu parecer de 6 de janeiro de 2015, a AESA indicou que vegetais hospedeiros assintomáticos e infeções assintomáticas ou ligeiras podiam escapar a exames baseados exclusivamente numa inspeção visual, ou até a testes de laboratório, devido à eventual precocidade da infeção ou a uma repartição heterogénea da bactéria na planta. Partindo da constatação de que a doença se propaga de uma planta para outra através dos insetos vetores e que existe um período de latência entre a inoculação da bactéria por esses vetores e o aparecimento dos sintomas, ou até a possibilidade de detetar a bactéria na planta, a AESA considerou essencial, ao erradicar os vegetais reconhecidos como infetados, destruir também todos os outros vegetais que se encontrassem na proximidade. |
121. |
No que respeita à escolha de fixar o raio em redor dos vegetais infetados em 100 metros, há que salientar que, embora referindo as incertezas que persistiam quanto ao papel da contaminação resultante das intervenções humanas e quanto aos mecanismos de propagação pelo vento, bem como a insuficiência dos dados relativos à distância de voo dos insetos vetores, que são a única via natural da bactéria, a AESA constatou, todavia, que estes insetos voam geralmente distâncias curtas, até 100 metros, ainda que possam provavelmente ser transportados pelo vento a distâncias maiores. |
122. |
Parece‑me que esta dupla constatação da AESA justifica a escolha feita pela Comissão de erradicar não só os vegetais infetados, como também os vegetais hospedeiros, independentemente do seu estatuto sanitário, situados na zona onde a probabilidade de difusão da doença de uma árvore infetada para uma árvore sã é mais elevada. Embora não seja certo, evidentemente, que pode impedir definitiva e completamente a dispersão da bactéria, a medida estabelecida pela Comissão afigura‑se, todavia, suscetível de limitar eficazmente os riscos de propagação. |
123. |
Para responder à objeção levantada na audiência pelos recorrentes nos processos principais, relativa ao paradoxo que existiria entre a adoção de medidas de erradicação mas zonas menos infetadas e o facto de ser poupada a província de Lecce, a mais afetada, onde poderiam ser aplicadas meras medidas de confinamento, acrescento que esta diferença de tratamento se afigura, na realidade, justificada. Com efeito, como a Comissão salientou no considerando 7 da Decisão de Execução 2015/789, a erradicação da bactéria na província de Lecce já não se afigura possível, por aí estar tão amplamente estabelecida. Acresce que, como o Governo italiano alegou na audiência, essa diferença explica‑se pela situação geográfica da província de Lecce, situada no extremo sul da Itália e rodeada pelo mar, com exceção da sua fronteira norte. |
124. |
No que respeita, em segundo lugar, à questão de saber se a medida em questão nos processos principais não vai além do que é necessário para atingir o objetivo prosseguido, importa salientar que, à data da adoção da Decisão de Execução 2015/789, não se afigurava que existissem medidas menos restritivas que permitissem erradicar a bactéria. Com efeito, no seu parecer de 6 de janeiro de 2015, a AESA indicou que não existia nenhum tratamento que permitisse curar os vegetais doentes em campo e que, embora fosse possível que alterações introduzidas nos sistemas de cultura, tais como a poda, a fertilização ou a irrigação, tivessem alguma influência sobre a doença, não podiam bastar para curar os vegetais. Seguidamente, examinando mais em particular a eficácia da poda das oliveiras, a AESA salientou que «na Apúlia, uma poda radical das oliveiras infetadas levou ao nascimento de novos rebentos na base da árvore [...], mas não foi demonstrado, até este momento, que este método seja eficaz para curar os vegetais e impedir a sua morte» ( 61 ). |
125. |
Nestas condições, não se demonstrou que a Comissão tenha cometido um erro manifesto de apreciação ao impor a erradicação dos vegetais hospedeiros, independentemente do seu estatuto sanitário, situados num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados. |
C – Quanto à sexta questão
126. |
Através da sua sexta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a Decisão de Execução 2015/789 é inválida, na medida em que viola os princípios da adequação e da proporcionalidade, dado que prevê medidas de remoção dos vegetais hospedeiros, independentemente do seu estatuto sanitário, dos vegetais que se saiba estarem infetados pela Xylella fastidiosa e dos vegetais com sintomas de possível infeção ou de que se suspeite estarem infetados, sem prever nenhuma forma de indemnização a favor dos proprietários não responsáveis pela propagação da bactéria. |
127. |
O Tribunal de Justiça teve já a oportunidade de se pronunciar, por várias vezes, sobre a indemnização dos danos causados a proprietários por medidas nacionais tomadas em execução do direito da União. |
128. |
Segundo o acórdão de 6 de abril de 1995, Flip e Verdegem ( 62 ), proferido a respeito da regulamentação da União relativa à peste suína clássica, ao adotar medidas de luta contra esta doença o legislador da União não decidiu regulamentar os aspetos financeiros que comporta a execução dessas medidas pelos proprietários dos animais em causa e, em especial, impor medidas para a indemnização desses proprietários ( 63 ). Na ausência de disposições do direito da União quanto a este aspeto, a indemnização dos proprietários cujos porcos foram abatidos por ordem das autoridades nacionais no quadro das medidas de luta contra a referida doença releva da competência de cada Estado‑Membro ( 64 ). |
129. |
O Tribunal de Justiça confirmou a sua jurisprudência no acórdão de 10 de julho de 2003, Booker Aquaculture e Hydro Seafood ( 65 ), proferido a respeito da regulamentação da União que estabelece medidas mínimas de luta contra certas doenças dos peixes. Depois de declarar que o legislador da União pode considerar, no âmbito do amplo poder de apreciação de que dispõe em matéria de política agrícola, que é conveniente indemnizar, parcial ou totalmente, os proprietários das explorações em que sejam destruídos e abatidos animais, concluiu que não se podia deduzir desta constatação a existência, no direito da União, de um princípio geral que imponha a atribuição de uma indemnização em quaisquer circunstâncias ( 66 ). |
130. |
O Tribunal de Justiça retomou novamente esta jurisprudência no seu acórdão de 22 de maio de 2014, Érsekcsanádi Mezőgazdasági ( 67 ), que respeitava à regulamentação da União que estabelecia medidas de luta contra a gripe aviária, precisando que a mesma era igualmente aplicável no processo que deu origem a esse acórdão, «tendo particularmente em conta o facto de que as medidas nacionais em causa [...] são de menor gravidade do que as medidas de destruição e de abate no processo que deu origem ao acórdão [de 10 de julho de 2003,] Booker Aquaculture e Hydro Seafood [ ( 68 ) ]» ( 69 ). |
131. |
Contudo, o ambiente jurídico sofreu profundas alterações desde os acórdãos de 6 de abril de 1995, Flip e Verdegem (C‑315/93, EU:C:1995:102), bem como de 10 de julho de 2003, Booker Aquaculture e Hydro Seafood (C‑20/00 e C‑64/00, EU:C:2003:397). |
132. |
Desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, importa, quando se trata de direitos fundamentais, aplicar a Carta, que consagra o direito de propriedade bem como o direito a uma justa indemnização em caso da sua privação. Nos termos do artigo 17.o, n.o 1, da Carta, «[n]inguém pode ser privado da sua propriedade, exceto por razões de utilidade pública, nos casos e condições previstos por lei e mediante justa indemnização pela respetiva perda, em tempo útil. A utilização dos bens pode ser regulamentada por lei na medida do necessário ao interesse geral». |
133. |
Segundo as anotações relativas ao artigo 17.o da Carta ( 70 ) que, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, terceiro parágrafo, TUE e com o artigo 52.o, n.o 7, da mesma Carta, devem ser tomadas em consideração para a sua interpretação, este artigo 17.o corresponde ao artigo 1.o do Protocolo Adicional à Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de novembro de 1950. |
134. |
Segundo jurisprudência constante do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, o artigo 1.o do Protocolo Adicional à Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais contém três normas «distintas», mas «complementares». A primeira, expressa na primeira frase do primeiro parágrafo, enuncia o princípio do respeito da propriedade, que reveste caráter geral, ao passo que as duas outras normas visam casos específicos de violação do direito de propriedade. A segunda norma, que consta da segunda frase do mesmo parágrafo, respeita à privação da propriedade e subordina‑a a certas condições. Por fim, a terceira norma, prevista no segundo parágrafo, reconhece aos Estados contratantes o direito de pôr em vigor as leis que julguem necessárias para a regulamentação do uso dos bens ( 71 ). |
135. |
Em qualquer caso, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem impõe o respeito de um requisito de proporcionalidade concretizado no princípio do «justo equilíbrio» que deve ser encontrado entre as exigências do interesse geral e os imperativos da proteção do direito de propriedade ( 72 ). |
136. |
No caso de uma medida que priva uma pessoa da sua propriedade, o justo equilíbrio implica necessariamente, salvo em caso de «circunstâncias excecionais», o pagamento de uma indemnização fixada num nível «razoável». Nas situações abrangidas pela regulamentação do uso dos bens ou nas que não possam ser classificadas numa categoria precisa, a preocupação de assegurar um «justo equilíbrio» entre as exigências do interesse geral e os imperativos da proteção dos direitos fundamentais dos particulares é resolvida de outro modo, dado que a indemnização do proprietário constitui então apenas um dos elementos que devem ser tomados em consideração no âmbito do exame global do «justo equilíbrio» entre os interesses em causa. O «justo equilíbrio» é rompido quando uma pessoa é sujeita a um encargo «especial e exorbitante» ( 73 ), desproporcionado relativamente ao objetivo do interesse público prosseguido, sem que tal encargo seja compensado por uma indemnização adequada. |
137. |
Sem que seja necessário apurar se a erradicação dos vegetais, independentemente do seu estatuto sanitário, situados num raio de 100 metros em redor dos vegetais infetados implica uma privação da propriedade, por ser equiparável a uma verdadeira medida de expropriação de facto, basta constatar que esta medida constitui, manifestamente, uma ingerência no direito de propriedade dos recorrentes nos processos principais. Atendendo às consequências particularmente danosas que daí resultam para os proprietários em causa, a referida medida só se afigura suscetível de atingir um justo equilíbrio entre as exigências do interesse geral e as da proteção do direito de propriedade sob condição de o proprietário do terreno em questão poder receber uma indemnização. Resulta, portanto, do artigo 17.o da Carta que, para assegurar um justo equilíbrio entre os interesses em causa, os proprietários dos vegetais abatidos gozam de um direito a receber uma indemnização razoavelmente proporcional ao valor desses bens. |
138. |
Resultando o direito à indemnização diretamente do artigo 17.o da Carta, o silêncio mantido a este respeito pela Diretiva 2000/29 e pela Decisão de Execução 2015/789 não pode ser interpretado no sentido de excluir tal direito. Consequentemente, os recorrentes nos processos principais não podem acusar o legislador da União de ter violado os princípios da adequação e da proporcionalidade por não ter previsto um regime de indemnização. |
139. |
Nos termos do artigo 51.o, n.o 1, da Carta, as suas disposições têm por destinatários os Estados‑Membros quando apliquem o direito da União. Ora, há que salientar que os Estados‑Membros aplicam o direito da União, na aceção desta disposição, quando instituem medidas de erradicação ou de confinamento em aplicação da Decisão de Execução 2015/789, adotada, por sua vez, em aplicação da Diretiva 2000/29 ( 74 ). Consequentemente, são obrigados, em aplicação do artigo 17.o da Carta, a instituir um regime que conceda aos proprietários dos terrenos em causa uma indemnização razoavelmente proporcional ao valor dos vegetais destruídos. |
140. |
Constato, de resto, que, como a Comissão salienta, os regimes de indemnização previstos pelos Estados‑Membros a fim de reparar a violação do direito de propriedade suportada no interesse geral poderiam beneficiar de um cofinanciamento pela União no âmbito do Regulamento (UE) n.o 652/2014 ( 75 ). |
141. |
Resulta de todas as considerações precedentes que o exame das questões submetidas não revelou nenhum elemento suscetível de afetar a validade do artigo 6.o da Decisão de Execução 2015/789. |
IV – Conclusão
142. |
Atendendo às considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda do seguinte modo às questões submetidas pelo Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal administrativo regional para o Lácio, Itália): O artigo 6.o da Decisão de Execução (UE) 2015/789 da Comissão, de 18 de maio de 2015, relativa às medidas para impedir a introdução e a propagação na União de Xylella fastidiosa (Wells et al.), deve ser interpretado no sentido de que a medida de remoção dos vegetais estabelecida no seu n.o 2 deve ser aplicada pelo Estado‑Membro em causa após a realização dos tratamentos fitossanitários contra os vetores da bactéria previstos no seu n.o 4. O exame das questões submetidas não revelou nenhum elemento suscetível de afetar a validade do artigo 6.o da Decisão de Execução 2015/789. |
( 1 ) Língua original: francês.
( 2 ) A bactéria desenvolve‑se no xilema das plantas onde forma agregados que acabam por obstruir os vasos e limitar a circulação da seiva.
( 3 ) Nesta fase, não discutirei a questão do nexo de causalidade entre a bactéria e a secagem, à qual voltarei mais adiante.
( 4 ) A bactéria, que afetou fortemente as vinhas californianas no fim do século XIX, foi descrita pela primeira vez em 1892 pelo fitopatologista Newton B. Pierce (v. Pierce, N. B., «The California vine disease», U.S. Department of Agriculture, Division of Vegetable Pathology, Bulletin n.o 2), razão pela qual foi dado o nome «doença de Pierce» à síndrome de secagem rápida da vinha.
( 5 ) A lista atualizada pela Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (AESA) é composta por 359 espécies de plantas suscetíveis à bactéria (v. atualização da base de dados das plantas hospedeiras da Xylella fastidiosa, de 20 de novembro de 2015, disponível, à data da redação das presentes conclusões, no sítio da AESA no endereço http://www.efsa.europa.eu/fr/efsajournal/pub/4378).
( 6 ) Atendendo à importância da produção oleícola nas regiões em questão. A União Europeia produz, com efeito, mais de 75% da produção mundial de azeite, representando o Reino de Espanha, primeiro produtor mundial, por si só, 45% dessa produção. A República Italiana é o segundo produtor mundial.
( 7 ) A oliveira é tradicionalmente considerada, nos países mediterrânicos, uma árvore fortemente simbólica, com numerosas virtudes. Como escreveu Gabriele D’Annunzio (D’Annunzio, G., «Aux Oliviers», Poésies, 1878 a 1893, traduzidas do italiano por Hérelle, G., Lévy, Paris, 1912):
«Oliviers, arbres sacrés, ô vous qui, dans la terrible ardeur méridienne, attentifs, écoutez la mer [...],
[...] versez la paix dont vous rayonnez, votre paix glorieuse, versez‑là bénignement dans mon cœur,
[...] vous qui, dans l’azur immense, êtes graves d’une telle majesté que je songe à l’antique déesse Pallas Athéna!»
( 8 ) JO 2000, L 169, p. 1. Diretiva conforme alterada pela Diretiva 2002/89/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2002 (JO 2002, L 355, p. 45, a seguir «Diretiva 2000/29»).
( 9 ) Decisão de Execução relativa a medidas para impedir a propagação na União de Xylella fastidiosa (Well e Raju) (JO 2014, L 45, p. 29).
( 10 ) Decisão de Execução relativa às medidas para impedir a introdução e a propagação na União de Xylella fastidiosa (Well e Raju) (JO 2014, L 219, p. 56).
( 11 ) Decisão de Execução relativa às medidas para impedir a introdução e a propagação na União de Xylella fastidiosa (Wells et al.) (JO 2015, L 125, p. 36).
( 12 ) V. artigo 1.o, alínea c), da Decisão de Execução 2015/789.
( 13 ) Considerando 7 da Decisão de Execução 2015/789.
( 14 ) Decisão de Execução que altera a Decisão de Execução 2015/789 (JO 2015, L 333, p. 143).
( 15 ) GURI n.o 239, de 14 de outubro de 2014.
( 16 ) GURI n.o 148, de 29 de junho de 2015, a seguir «Decreto de 19 de junho de 2015».
( 17 ) A seguir «Carta».
( 18 ) JO 1977, L 26, p. 20; EE 03 F11 p. 121).
( 19 ) Diretiva conforme alterada, em último lugar, pela Diretiva 1999/53/CE da Comissão, de 26 de maio de 1999 (JO 1999, L 142, p. 29).
( 20 ) Decisão de 23 de novembro de 1976, que institui um Comité Fitossanitário Permanente (JO 1976, L 340, p. 25; EE 03 F11 p. 83).
( 21 ) Decisão do Conselho de 28 de junho de 1999, que fixa as regras de exercício das competências de execução atribuídas à Comissão (JO 1999, L 184, p. 23).
( 22 ) Decisão de Execução de 15 de dezembro de 2014, que estabelece normas pormenorizadas de execução da Diretiva 2000/29/CE do Conselho relativamente à notificação da presença de organismos prejudiciais e de medidas adotadas, ou a adotar, pelos Estados‑Membros (JO 2014, L 360, p. 59).
( 23 ) V., nomeadamente, acórdão de 9 de março de 1994, TWD Textilwerke Deggendorf (C‑188/92, EU:C:1994:90, n.o 17).
( 24 ) V., nomeadamente, acórdão de 5 de março de 2015, Banco Privado Português e Massa Insolvente do Banco Privado Português (C‑667/13, EU:C:2015:151, n.o 30).
( 25 ) V., neste sentido, acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.os 58, 60 e 61).
( 26 ) V. jurisprudência constante segundo a qual «[o] critério de distinção entre um regulamento e uma decisão deve ser encontrado na existência ou inexistência de âmbito geral do ato em questão» (v., nomeadamente, acórdão de 17 de março de 2011, AJD Tuna, C‑221/09, EU:C:2011:153, n.o 51 e jurisprudência referida).
( 27 ) V., neste sentido, Kovar, R., «L’identification des actes normatifs en droit communautaire», em Dony, M., e de Walsche, A., Mélanges en hommage à Michel Waelbroeck, Bruylant, Bruxelas, 1999, p. 387, que observa que «a aplicação do princípio da ‘superação da aparência’ é igualmente válida para as decisões dirigidas aos Estados‑Membros que são suscetíveis de ter alcance normativo [...] quando tais decisões se apliquem a um conjunto de pessoas por referência a uma situação objetiva de facto ou de direito definida em relação à finalidade de tais atos» (p. 395) (tradução livre).
( 28 ) V., neste sentido, acórdão de 14 de dezembro de 1962, Confédération nationale des producteurs de fruits et légumes e o./Conselho (16/62 e 17/62, EU:C:1962:47, p. 918).
( 29 ) V. acórdãos de 18 de janeiro de 2007, PKK e KNK/Conselho (C‑229/05 P, EU:C:2007:32, n.o 51 e jurisprudência referida), bem como de 17 de março de 2011, AJD Tuna (C‑221/09, EU:C:2011:153, n.o 51).
( 30 ) V., nomeadamente, despacho de 28 de junho de 2001, Eridania e o./Conselho (C‑352/99 P, EU:C:2001:364, n.o 19 e jurisprudência referida).
( 31 ) Decorre da jurisprudência que as limitações ou exceções de natureza temporária ou de alcance territorial contidas num texto legislativo fazem parte integrante do conjunto de disposições em que se inserem e participam, salvo desvio de poder, da sua característica de generalidade (v., neste sentido, acórdão de 29 de junho de 1993, Gibraltar/Conselho, C‑298/89, EU:C:1993:267, n.o 18).
( 32 ) V. acórdãos de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852, n.o 30), e de 10 de dezembro de 2015, Kyocera Mita Europe/Comissão (C‑553/14 P, EU:C:2015:805, n.o 44).
( 33 ) V. acórdãos de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852, n.o 31), e de 10 de dezembro de 2015, Kyocera Mita Europe/Comissão (C‑553/14 P, EU:C:2015:805, n.o 45).
( 34 ) V. acórdãos de 28 de abril de 2015, T & L Sugars e Sidul Açúcares/Comissão (C‑456/13 P, EU:C:2015:284, n.os 41 e 42), bem como de 10 de dezembro de 2015, Kyocera Mita Europe/Comissão (C‑553/14 P, EU:C:2015:805, n.o 46).
( 35 ) V. «Scientific Opinion on the risk to plant health posed by Xylella fastidiosa in the EU territory, with the identification and evaluation of risk reduction options», disponível no sítio Internet da AESA.
( 36 ) V. n.o 4.6.8 deste parecer.
( 37 ) V., neste sentido, acórdão de 18 de junho de 2015, Estónia/Parlamento e Conselho (C‑508/13, EU:C:2015:403, n.o 58 e jurisprudência referida).
( 38 ) V., neste sentido, acórdão de 18 de junho de 2015, Estónia/Parlamento e Conselho (C‑508/13, EU:C:2015:403, n.o 60 e jurisprudência referida).
( 39 ) V. acórdão de 15 de outubro de 2014, Parlamento/Comissão (C‑65/13, EU:C:2014:2289, n.o 45).
( 40 ) V., nomeadamente, acórdão de 15 de outubro de 2014, Parlamento/Comissão (C‑65/13, EU:C:2014:2289, n.o 44 e jurisprudência referida).
( 41 ) V. acórdão de 22 de maio de 2014, Glatzel (C‑356/12, EU:C:2014:350, n.o 52 e jurisprudência referida).
( 42 ) V., por analogia, acórdão de 1 de março de 2016, National Iranian Oil Company/Conselho (C‑440/14 P, EU:C:2016:128, n.o 77 e jurisprudência referida).
( 43 ) Era já esse o objeto da Diretiva 77/93, que foi substituída pela Diretiva 2000/29 (v., neste sentido, acórdão de 30 de setembro de 2003, Anastasiou e o., C‑140/02, EU:C:2003:520, n.o 45).
( 44 ) V. nomeadamente, neste sentido, acórdão de 23 de dezembro de 2015, Parlamento/Conselho (C‑595/14, EU:C:2015:847, n.o 41 e jurisprudência referida).
( 45 ) C‑362/14, EU:C:2015:650.
( 46 ) N.o 77.
( 47 ) C‑333/14, EU:C:2015:845.
( 48 ) N.o 63.
( 49 ) N.o 64.
( 50 ) C‑167/97, EU:C:1999:60.
( 51 ) N.o 45.
( 52 ) V., neste sentido, acórdãos de 19 de setembro de 1984, Heijn (94/83, EU:C:1984:285, n.o 18), e de 13 de março de 1986, Mirepoix (54/85, EU:C:1986:123, n.o 16).
( 53 ) V. acórdão de 11 de julho de 2013, França/Comissão (C‑601/11 P, EU:C:2013:465, n.o 110 e jurisprudência referida).
( 54 ) C‑58/10 a C‑68/10, EU:C:2011:553.
( 55 ) JO 2003, L 268, p. 1.
( 56 ) Acórdão de 8 de setembro de 2011, Monsanto e o. (C‑58/10 a C‑68/10, EU:C:2011:553, n.os 78 a 80).
( 57 ) V., nomeadamente, acórdão de 17 de dezembro de 2015, Neptune Distribution (C‑157/14, EU:C:2015:823, n.o 81 e jurisprudência referida).
( 58 ) V., nomeadamente, acórdão de 17 de dezembro de 2015, Neptune Distribution (C‑157/14, EU:C:2015:823, n.o 82 e jurisprudência referida).
( 59 ) V. «Scientific opinion on four statements questioning the EU control strategy against Xylella fastidiosa», disponível no sítio Internet da AESA.
( 60 ) V. pp. 10 e 11 deste parecer.
( 61 ) V. p. 97 deste parecer.
( 62 ) C‑315/93, EU:C:1995:102.
( 63 ) N.o 25.
( 64 ) N.o 30.
( 65 ) C‑20/00 e C‑64/00, EU:C:2003:397.
( 66 ) N.o 85.
( 67 ) C‑56/13, EU:C:2014:352.
( 68 ) C‑20/00 e C‑64/00, EU:C:2003:397.
( 69 ) Acórdão de 22 de maio de 2014, Érsekcsanádi Mezőgazdasági (C‑56/13, EU:C:2014:352, n.o 49).
( 70 ) V. Anotações relativas à Carta dos Direitos Fundamentais (JO 2007, C 303, p. 17).
( 71 ) Tribunal EDH, 23 de setembro de 1982, Sporrong e Lönnroth c. Suécia, CE:ECHR:1982:0923JUD000715175, § 61.
( 72 ) Tribunal EDH, 23 de setembro de 1982, Sporrong e Lönnroth c. Suécia, CE:ECHR:1982:0923JUD000715175, § 69.
( 73 ) Tribunal EDH, 23 de setembro de 1982, Sporrong e Lönnroth c. Suécia, CE:ECHR:1982:0923JUD000715175, § 73.
( 74 ) Quanto a este aspeto, discordo da solução adotada no n.o 55 do acórdão de 22 de maio de 2014, Érsekcsanádi Mezőgazdasági (C‑56/13, EU:C:2014:352).
( 75 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece disposições para a gestão das despesas relacionadas com a cadeia alimentar, a saúde e o bem‑estar animal, a fitossanidade e o material de reprodução vegetal, que altera as Diretivas 98/56/CE, 2000/29/CE e 2008/90/CE do Conselho, os Regulamentos (CE) n.o 178/2002 (CE) n.o 882/2004 e (CE) n.o 396/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho, a Diretiva 2009/128/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e o Regulamento (CE) n.o 1107/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho e que revoga as Decisões 66/399/CEE, 76/894/CEE e 2009/470/CE do Conselho (JO 2014, L 189, p. 1).