ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

25 de janeiro de 2017 ( 1 )

«Reenvio prejudicial — União aduaneira — Constituição de uma dívida aduaneira na sequência da introdução irregular de mercadorias — Conceito de ‘devedor’ — Empregado de uma pessoa coletiva que está na origem da introdução irregular — Determinação de uma prática fraudulenta ou de uma negligência manifesta»

No processo C‑679/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Finanzgericht Baden‑Württemberg (Tribunal Tributário do Bade‑Vurtemberga, Alemanha), por decisão de 1 de dezembro de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 17 de dezembro de 2015, no processo

Ultra‑Brag AG

contra

Hauptzollamt Lörrach,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: L. Bay Larsen, presidente de secção, M. Vilaras (relator), J. Malenovský, M. Safjan e D. Šváby, juízes,

advogado‑geral: N. Wahl,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Comissão Europeia, por L. Grønfeldt e M. Wasmeier, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 26 de outubro de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 202.o, n.o 3, primeiro e segundo parágrafos, e do artigo 212.o‑A do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1992, L 302, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1791/2006 do Conselho, de 20 de novembro de 2006 (JO 2006, L 363, p. 1) (a seguir «código aduaneiro»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Ultra‑Brag AG, empresa de logística que, entre outras atividades, oferece serviços de transporte nas águas interiores europeias, ao Hauptzollamt Lörrach (Estância Aduaneira Principal de Lörrach, Alemanha), relativamente ao pagamento de uma dívida aduaneira resultante da introdução irregular de mercadorias no território aduaneiro da União Europeia.

Quadro jurídico

3

O código aduaneiro foi revogado pelo Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013, que estabelece o Código Aduaneiro da União (JO 2013, L 269, p. 1).

4

O artigo 38.o, n.o 1, do código aduaneiro previa:

«As mercadorias introduzidas no território aduaneiro da Comunidade devem ser conduzidas, no mais curto prazo, pela pessoa que procedeu a essa introdução, utilizando, se for caso disso, a via determinada pelas autoridades aduaneiras e com conformidade com as regras fixadas por essas autoridades:

a)

Quer à estância aduaneira designada pelas autoridades aduaneiras ou a qualquer outro local designado ou autorizado por essas autoridades;

[…]»

5

O artigo 40.o do referido código previa:

«As mercadorias introduzidas no território aduaneiro da Comunidade devem ser apresentadas à alfândega pela pessoa que as introduziu nesse território ou, se for caso disso, pela pessoa que assume a responsabilidade pelo seu transporte após terem entrado nesse território, com exceção das mercadorias transportadas em meios de transporte que atravessem as águas territoriais ou o espaço aéreo do território aduaneiro da Comunidade sem nele fazerem escala. A pessoa que apresenta as mercadorias deve fazer uma referência à declaração sumária ou à declaração aduaneira anteriormente apresentada no que respeita às mercadorias.»

6

Nos termos do artigo 185.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do código aduaneiro:

«As mercadorias comunitárias que depois de exportadas do território aduaneiro da Comunidade nele sejam reintroduzidas e colocadas em livre prática num prazo de três anos serão, mediante pedido do interessado, isentas de direitos de importação.»

7

O artigo 202.o do mesmo código dispunha:

«1.   É facto constitutivo da dívida aduaneira na importação:

a)

A introdução irregular no território aduaneiro da Comunidade de uma mercadoria sujeita a direitos de importação

[…]

Na aceção do presente artigo, entende‑se por introdução irregular qualquer introdução com violação das disposições dos artigos 38.o a 41.o e do segundo travessão do artigo 177.o

2.   A dívida aduaneira considera‑se constituída no momento da introdução irregular.

3.   Os devedores são:

a pessoa que introduziu irregularmente a mercadoria,

as pessoas que tenham participado nessa introdução, tendo ou devendo ter razoavelmente conhecimento do seu caráter irregular,

bem como as que tenham adquirido ou detido a mercadoria em causa, tendo ou devendo ter razoavelmente conhecimento, no momento em que adquiriram ou receberam a mercadoria, de que se tratava de uma mercadoria introduzida irregularmente.»

8

O artigo 212.o‑A do código aduaneiro tinha a seguinte redação:

«Sempre que a regulamentação aduaneira preveja um tratamento pautal favorável de uma mercadoria devido à sua natureza ou ao seu destino especial, uma franquia ou uma isenção total ou parcial de direitos de importação ou de direitos de exportação nos termos dos artigos 21.o, 82.o, 145.o ou 184.o a 187.o, esse tratamento favorável, essa franquia ou essa isenção serão também aplicáveis nos casos de constituição de uma dívida aduaneira nos termos dos artigos 202.o a 205.o, 210.o ou 211.o, sempre que o comportamento do interessado não implique prática fraudulenta nem negligência manifesta e que este último apresente a prova de que se encontram reunidas as outras condições necessárias à aplicação do tratamento favorável, da franquia ou da isenção.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

9

Em 25 de maio de 2010, a Ultra‑Brag exportou, por via fluvial, do território aduaneiro da União para Birsfelden (Suíça), dois transformadores assim como dois lotes de duas bobinas.

10

Informado nesse mesmo dia da avaria do navio que no dia seguinte devia proceder ao carregamento de uma turbina em Estrasburgo (França) com destino a Antuérpia (Bélgica), um empregado da Ultra‑Brag, especialista no transporte de mercadorias pesadas e que ocupava o posto de responsável pelas exportações, ponderou enviar para lá o navio que tinha transportado os dois transformadores e os dois lotes de duas bobinas sem que um dos transformadores e as respetivas bobinas tivessem sido descarregados. Para o efeito, informou‑se, em primeiro lugar, junto das autoridades aduaneiras suíças, sobre as formalidades a que seria necessário proceder para o levar a cabo. Essas autoridades informaram‑no de que uma reexportação na União por um curto período não suscitava nenhum problema, mas que era necessário informar as autoridades aduaneiras alemãs desse facto. Na sequência de uma avaria no automóvel, esse empregado não pôde informar essas autoridades antes do encerramento da estância aduaneira alemã competente.

11

Para cumprir o horário de carregamento da turbina em Estrasburgo, o referido empregado, na noite de 25 de maio de 2010, informou o capitão do navio que devia zarpar para Estrasburgo com o transformador e as duas bobinas. Essas mercadorias não foram apresentadas às autoridades aduaneiras alemãs quando atravessaram a fronteira.

12

Em 26 de maio de 2010, o empregado contactou as autoridades aduaneiras alemãs.

13

Em 27 de maio de 2010, o navio chegou ao porto de Basileia (Suíça) para aí descarregar o transformador e as duas bobinas, permanecendo a turbina a bordo para ser transportada até Antuérpia. As autoridades aduaneiras alemãs detetaram então a presença do transformador e das duas bobinas no navio.

14

Por aviso de liquidação de direitos de importação de 9 de agosto de 2010, a Estância Aduaneira Principal de Lörrach reclamou à Ultra‑Brag direitos aduaneiros no montante de 122470,07 euros sem identificar outro devedor para além dessa sociedade.

15

Na sequência do indeferimento da sua reclamação, a Ultra‑Brag interpôs um recurso no Finanzgericht Baden‑Württemberg (Tribunal Tributário do Bade‑Vurtemberga, Alemanha). Alegou que não havia lugar a aplicar direitos de importação uma vez que estavam reunidas as condições de isenção previstas no artigo 212.o‑A do código aduaneiro. Afirmou não ter agido com negligência manifesta, ao ter confiado a execução das formalidades aduaneiras a um colaborador qualificado, nem ter incumprido as obrigações de vigilância que lhe incumbiam.

16

O órgão jurisdicional de reenvio considera que uma entidade patronal pode ser considerada devedor de uma dívida aduaneira, na aceção do artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do referido código, se se puder considerar como tendo estado, devido ao seu comportamento, na origem da introdução irregular da mercadoria, desde que esse comportamento possa ser equiparado a uma introdução irregular que lhe seja imputável. Salienta que a questão de saber em que bases o comportamento de uma entidade patronal, pessoa coletiva, pode ser apreciado ainda não está determinada nomeadamente no que se refere a saber se se deve ter em conta apenas o comportamento dos órgãos da pessoa coletiva ou se se deve ter também em conta o comportamento de um dos seus colaboradores que é a causa direta da introdução irregular, na medida em que esse colaborador é responsável pelo transporte das mercadorias no âmbito da pessoa coletiva.

17

O órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se também sobre a participação da Ultra‑Brag na introdução irregular das mercadorias, na aceção do artigo 202.o, n.o 3, segundo travessão, do código aduaneiro, mais precisamente à luz do elemento subjetivo exigido por esta disposição como resulta da utilização dos termos «tendo ou devendo ter razoavelmente conhecimento [de que a introdução era] irregular». Na sua opinião, para apreciar esse elemento subjetivo, é necessário determinar se há que atender à perspetiva do empregado da Ultra‑Brag ou dos seus órgãos.

18

Por último, o órgão jurisdicional de reenvio considera que há que apreciar se está preenchida a condição relativa à inexistência de negligência manifesta, para beneficiar da isenção dos direitos de importação prevista no artigo 212.o‑A do referido código, apreciação essa que deve ser efetuada tendo em conta o comportamento do empregado que interveio efetivamente na operação em causa no processo principal.

19

Nestas condições, o Finanzgericht Baden‑Württemberg (Tribunal Tributário do Bade‑Vurtemberga) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do [código aduaneiro] ser interpretado no sentido de que uma pessoa coletiva, nos termos desta disposição, é devedora da dívida aduaneira, enquanto pessoa que introduziu irregularmente a mercadoria, quando foi um dos seus trabalhadores, que não é seu representante legal, quem, no exercício das suas funções, deu origem à introdução irregular?

2)

Em caso de resposta negativa à primeira questão:

Deve o artigo 202.o, n.o 3, [segundo] travessão, do [código aduaneiro] ser interpretado no sentido de que:

a)

uma pessoa coletiva (também) participou na introdução irregular quando um dos seus trabalhadores, que não é seu representante legal, colaborou nesta introdução no exercício das suas funções e

b)

no caso das pessoas coletivas que participam na introdução irregular, deve entender‑se que a circunstância subjetiva ‘tendo ou devendo ter razoavelmente conhecimento do seu caráter irregular’ se refere à pessoa singular incumbida por essa pessoa coletiva [de levar a cabo essa operação], mesmo que não seja o seu representante legal?

3)

Em caso de resposta afirmativa à primeira ou […] segunda questões:

Deve o artigo 212.o‑A do [código aduaneiro] ser interpretado no sentido de que, ao avaliar se o comportamento do interessado implicou prática fraudulenta ou negligência manifesta, tratando‑se de pessoas coletivas, apenas há que considerar o comportamento da pessoa coletiva ou dos seus órgãos, ou deve ser‑lhe imputado o comportamento de uma pessoa singular que trabalha [para ela e que estava encarregada de levar a cabo a operação em causa], no exercício das suas funções?»

Quanto às questões prejudiciais

Observações preliminares

20

Há que salientar que, em conformidade com o artigo 202.o, n.o 1, alínea a), do código aduaneiro, é facto constitutivo de uma dívida aduaneira a introdução irregular de mercadorias. Segundo esta mesma disposição, uma introdução de mercadorias considera‑se irregular sempre que não tenha sido apresentada na alfândega em conformidade com as disposições dos artigos 38.o a 41.o do referido código.

21

Além disso, as disposições do artigo 202.o, n.o 3, do mesmo código têm por objeto definir os devedores da dívida aduaneira constituída pela introdução irregular das mercadorias no território da União, e isso no interesse geral de proteção dos interesses financeiros da União.

22

Para o efeito, os três travessões do artigo 202.o, n.o 3, do referido código descrevem a implicação da pessoa que deve ser reconhecida como devedora devido à sua participação na introdução irregular de mercadorias. O primeiro travessão designa assim como devedor a pessoa que procedeu à introdução irregular, isto é, quem deveria normalmente ter levado a cabo as operações de desalfandegamento e cumprido as obrigações do declarante na alfândega. O segundo e terceiro travessões referem‑se às pessoas que, apesar de não estarem obrigadas a proceder às operações de desalfandegamento nos termos das disposições desse código, estiveram, no entanto, implicadas na introdução irregular, antes ou imediatamente depois da mesma.

23

É à luz destas considerações que se deve responder às questões submetidas.

Quanto à primeira questão

24

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do código aduaneiro deve ser interpretado no sentido de que uma pessoa coletiva, em que um dos seus trabalhadores, que não é seu representante legal, está na origem da introdução irregular de uma mercadoria no território aduaneiro da União, pode ser considerada devedora da dívida aduaneira constituída pela referida introdução.

25

Antes de mais, decorre do texto do artigo 202.o, n.o 3, do referido código que o legislador da União quis definir em termos amplos as pessoas suscetíveis de serem consideradas devedoras de uma dívida aduaneira, em caso de introdução irregular de mercadorias tributáveis em direitos de importação e que pretendeu também fixar de forma completa as condições de determinação das pessoas devedoras da dívida aduaneira (v. acórdãos de 23 de setembro de 2004, Spedition Ulustrans, C‑414/02, EU:C:2004:551, n.os 25 e 39; de 3 de março de 2005, Papismedov e o., C‑195/03, EU:C:2005:131, n.o 38; e de 17 de novembro de 2011, Jestel, C‑454/10, EU:C:2011:752, n.os 12 e 13).

26

Além disso, o Tribunal de Justiça já declarou que o artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do referido código visa a «pessoa» que procedeu à introdução irregular, sem especificar se se trata de uma pessoa singular ou de uma pessoa coletiva. Assim, pode ser considerada devedora da dívida aduaneira qualquer «pessoa» na aceção da referida disposição, isto é, aquela que possa ser considerada, pelo seu comportamento, na origem da introdução irregular da mercadoria (v. acórdãos de 23 de setembro de 2004, Spedition Ulustrans, C‑414/02, EU:C:2004:551, n.o 26, e de 3 de março de 2005, Papismedov e o., C‑195/03, EU:C:2005:131, n.o 39).

27

No caso em apreço, segundo as informações contidas no pedido de decisão prejudicial, a introdução de mercadorias no território da União foi efetuada pelo capitão do navio que as transportava para um porto fluvial situado nesse território, por ordem da pessoa responsável pelas exportações na empresa para a qual os dois trabalham. O capitão é a pessoa que, em conformidade com o artigo 40.o do código aduaneiro, deveria ter apresentado as mercadorias à alfândega, fazendo referência à declaração sumária ou à declaração aduaneira prevista no referido artigo.

28

Ao não ter procedido desta forma, o capitão do navio efetuou uma introdução irregular de mercadorias no território aduaneiro da União, o que, com base no artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do referido código, o torna devedor da dívida aduaneira a que deu origem.

29

Assim, o facto de um trabalhador introduzir irregularmente mercadorias no território aduaneiro da União não basta para excluir que a pessoa singular ou coletiva que o emprega não possa ser considerada devedora da dívida aduaneira originada por essa introdução irregular nos termos do artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do mesmo código.

30

A este respeito, há que salientar que, quando, numa situação como a que está em causa no processo principal, um trabalhador efetua uma introdução irregular respeitando o âmbito da missão que lhe foi confiada pelo seu empregador e executando as ordens que lhe foram dadas, para esse fim, por outro trabalhador dessa empresa, habilitado para tal no âmbito das suas próprias funções, o primeiro trabalhador limita‑se a agir no âmbito das suas atribuições, em nome e por conta do seu empregador.

31

Ora, quando a introdução irregular de mercadorias no território aduaneiro da União é efetuada por um trabalhador em nome e por conta do empregador, este último deve ser considerado como a pessoa que, pela sua atuação, está na origem dessa introdução irregular (v., neste sentido, acórdão de 23 de setembro de 2004, Spedition Ulustrans, C‑414/02, EU:C:2004:551, n.o 29).

32

Por conseguinte, na situação como a que está em causa no processo principal, o empregador é suscetível de ser considerado devedor da dívida aduaneira originada pela introdução irregular de mercadorias, nos termos do artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do código aduaneiro.

33

Por outro lado, o facto de nem o trabalhador que origina a introdução irregular de mercadorias nem o trabalhador ao qual está subordinado e às ordens do qual agiu serem representantes legais da pessoa coletiva para a qual trabalham não afeta esta conclusão, dado que a aplicação do artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do referido código ao empregador do trabalhador que está na origem da introdução irregular não exige outra condição para além da que esse empregador deve ter a qualidade de «pessoa» na aceção da referida disposição.

34

À luz das considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do código aduaneiro deve ser interpretado no sentido de que uma pessoa coletiva, cujo trabalhador, que não é seu representante legal, está na origem da introdução irregular de uma mercadoria no território aduaneiro da União, pode ser considerada devedora da dívida aduaneira constituída por essa introdução, quando esse trabalhador introduziu a mercadoria em causa respeitando o âmbito da missão que lhe foi confiada pelo seu empregador e executando as ordens dadas, para esse fim, por outro trabalhador desse empregador, habilitado para o efeito no âmbito das suas próprias funções, e agiu assim no âmbito das suas atribuições, em nome e por conta do seu empregador.

35

Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda questão.

Quanto à terceira questão

36

Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 212.o‑A do código aduaneiro deve ser interpretado no sentido de que, para caracterizar a respeito de um empregador, pessoa coletiva, uma prática fraudulenta ou uma negligência manifesta na aceção do referido artigo, há que atender não só ao próprio empregador mas também imputar a este o comportamento do ou dos trabalhadores dessa pessoa coletiva, que estavam encarregados da introdução da mercadoria em causa no território aduaneiro da União no âmbito das respetivas funções.

37

Nos termos do artigo 212.o‑A do código aduaneiro, o tratamento pautal favorável, a franquia ou a isenção total ou parcial de direitos de importação ou de direitos de exportação previstos na regulamentação aduaneira são igualmente aplicáveis nos casos de constituição de uma dívida aduaneira nos termos dos artigos 202.o a 205.o do mesmo código sempre que o comportamento do interessado não implique prática fraudulenta nem negligência manifesta e que este último apresente a prova de que se encontram reunidas «as outras condições necessárias à aplicação» do tratamento favorável, da franquia ou da isenção.

38

O conceito de «interessado», na aceção do artigo 212.o‑A do código aduaneiro, deve ser entendido, tendo em conta a redação desta disposição, no sentido de que se refere a qualquer pessoa, singular ou coletiva, que é considerada devedora de uma dívida aduaneira por força de um dos artigos 202.o a 205.o do referido código, nomeadamente pelo facto de essa pessoa, devido ao seu comportamento, ter dado origem à introdução irregular de mercadorias no território aduaneiro da União.

39

Em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, para apreciar a existência de prática fraudulenta ou de negligência manifesta por parte do empregador, pessoa coletiva, há que atender não só ao próprio empregador mas também ter em conta o comportamento do ou dos trabalhadores que, respeitando o âmbito da missão confiada pelo empregador de modo que agiram no âmbito das respetivas atribuições em nome e por conta do seu empregador, estiveram na origem da introdução irregular de mercadorias.

40

Deve também salientar‑se que o facto de os trabalhadores em causa não serem órgãos ou representantes legais da pessoa coletiva para que trabalham não afeta a conclusão segundo a qual, nas circunstâncias referidas no número anterior do presente acórdão, a existência de prática fraudulenta ou de negligência manifesta de um empregador, pessoa coletiva, aprecia‑se tendo também em conta o comportamento dos seus trabalhadores.

41

Em face das considerações precedentes, há que responder à terceira questão que o artigo 212.o‑A do código aduaneiro deve ser interpretado no sentido de que, para caracterizar, no que se refere a um empregador, pessoa coletiva, uma prática fraudulenta ou uma negligência manifesta na aceção desse artigo, há que atender não só ao próprio empregador mas também imputar‑lhe o comportamento do seu ou seus trabalhadores que, respeitando o âmbito da missão confiada pelo seu empregador de modo que agiram no âmbito das respetivas atribuições em nome e por conta do seu empregador, estiveram na origem da introdução irregular de mercadorias.

Quanto às despesas

42

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

1)

O artigo 202.o, n.o 3, primeiro travessão, do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1791/2006 do Conselho, de 20 de novembro de 2006, deve ser interpretado no sentido de que uma pessoa coletiva, cujo trabalhador, que não é seu representante legal, está na origem da introdução irregular de uma mercadoria no território aduaneiro da União, pode ser considerada devedora da dívida aduaneira constituída por essa introdução, quando esse trabalhador introduziu a mercadoria em causa respeitando o âmbito da missão que lhe foi confiada pelo seu empregador e executando as ordens dadas, para esse fim, por outro trabalhador desse empregador habilitado para o efeito no âmbito das suas próprias funções, e agiu assim no âmbito das suas atribuições, em nome e por conta do seu empregador.

 

2)

O artigo 212.o‑A do Regulamento n.o 2913/92, conforme alterado pelo Regulamento n.o 1791/2006, deve ser interpretado no sentido de que, para caracterizar, no que se refere a um empregador, pessoa coletiva, uma prática fraudulenta ou uma negligência manifesta na aceção desse artigo, há que atender não só ao próprio empregador mas também imputar‑lhe o comportamento do seu ou seus trabalhadores que, respeitando o âmbito da missão confiada pelo seu empregador de modo que agiram no âmbito das respetivas atribuições em nome e por conta do seu empregador, estiveram na origem da introdução irregular de mercadorias.

 

Assinaturas


( 1 ) * Língua do processo: alemão.