ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

10 de novembro de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 2.o, n.o 1, alínea c) — Conceito de ‘prestação de serviço a título oneroso’ — Disponibilização de um cavalo por um sujeito passivo a um organizador de corridas de cavalos — Avaliação da contrapartida — Direito de dedução dos custos ligados à preparação dos cavalos do sujeito passivo para as corridas — Custos gerais ligados ao conjunto da atividade económica — Anexo III, ponto 14 — Taxa reduzida de IVA aplicável ao direito de utilização de instalações desportivas — Aplicabilidade à exploração de um centro equestre de cavalos de corrida — Operação constituída por uma prestação única ou por várias prestações independentes»

No processo C‑432/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo, República Checa), por decisão de 23 de julho de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 7 de agosto de 2015, no processo

Odvolací finanční ředitelství

contra

Pavlína Baštová,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: T. von Danwitz, presidente de secção, E. Juhász, C. Vajda, K. Jürimäe (relatora) e C. Lycourgos, juízes,

advogado‑geral: N. Wahl,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação do Governo checo, por M. Smolek, J. Vláčil e T. Müller, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por Z. Malůšková e M. Owsiany‑Hornung, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 14 de junho de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), do artigo 98.o e do anexo III, ponto 14, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1, a seguir «diretiva IVA»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre a Odvolací finanční ředitelství (Direção de Recursos Fiscais, República Checa) e Pavlína Baštová a respeito da sujeição da atividade de exploração de um centro equestre para cavalos de corrida a imposto sobre o valor acrescentado (IVA).

Quadro jurídico

Direito da União

3

O artigo 1.o, n.o 2, segundo parágrafo, da diretiva IVA dispõe:

«Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.»

4

O artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da diretiva IVA dispõe:

«Estão sujeitas ao IVA as seguintes operações:

[…]

c)

As prestações de serviços efetuadas a título oneroso no território de um Estado‑Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade;

[…]»

5

Nos termos do artigo 9.o, n.o 1, da diretiva IVA:

«Entende‑se por ‘sujeito passivo’ qualquer pessoa que exerça, de modo independente e em qualquer lugar, uma atividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa atividade.

Entende‑se por ‘atividade económica’ qualquer atividade de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as atividades extrativas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. É em especial considerada atividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com caráter de permanência.»

6

O artigo 73.o da diretiva IVA enuncia:

«Nas entregas de bens e às prestações de serviços, que não sejam as referidas nos artigos 74.o a 77.o, o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções diretamente relacionadas com o preço de tais operações.»

7

Nos termos do artigo 98.o, n.os 1 e 2, da diretiva IVA:

«1.   Os Estados‑Membros podem aplicar uma ou duas taxas reduzidas.

2.   As taxas reduzidas aplicam‑se apenas às entregas de bens e às prestações de serviços das categorias constantes do anexo III.

[…]»

8

Nos termos do artigo 167.o da diretiva IVA:

«O direito à dedução surge no momento em que o imposto dedutível se torna exigível.»

9

O artigo 168.o da diretiva IVA dispõe:

«Quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, o sujeito passivo tem direito, no Estado‑Membro em que efetua essas operações, a deduzir do montante do imposto de que é devedor os montantes seguintes:a)

O

IVA devido ou pago nesse Estado‑Membro em relação aos bens que lhe tenham sido ou venham a ser entregues e em relação aos serviços que lhe tenham sido ou venham a ser prestados por outro sujeito passivo;

[…]»

10

O artigo 173.o, n.o 1, da diretiva IVA tem a seguinte redação:

«No que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo para efetuar tanto operações com direito à dedução, referidas nos artigos 168.o, 169.o e 170.o, como operações sem direito à dedução, a dedução só é admitida relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações.

O pro rata de dedução é determinado, em conformidade com os artigos 174.o e 175.o, para o conjunto das operações efetuadas pelo sujeito passivo.»

11

A lista das entregas de bens e de prestações de serviços que podem ser objeto de taxas reduzidas referidas no artigo 98.o da diretiva IVA consta do anexo III desta diretiva. O ponto 14 do mesmo anexo menciona «o direito de utilização de instalações desportivas».

Direito checo

12

Nos termos do artigo 47.o, n.o 4, do zákon č. 235/2004 Sb. o dani z přidané hodnoty (Lei n.o 235/2004 sobre o IVA):

«Os serviços são sujeitos à taxa normal, salvo disposição da lei. Os serviços enumerados no anexo n.o 2 ficam sujeitos a uma taxa reduzida do imposto.»

13

O anexo n.o 2 da mesma lei inclui uma lista dos serviços sujeitos à taxa reduzida do imposto, em que se inclui «a utilização de instalações cobertas e não cobertas para o exercício de atividades desportivas».

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

14

P. Baštová é sujeito passivo do IVA por uma atividade económica que consiste na exploração de um centro equestre para cavalos de corrida com uma capacidade para 25 lugares, no qual cria e treina os seus próprios cavalos e também os de terceiros, que lhe são confiados para serem preparados para as corridas. Além dos cavalos de corrida, P. Baštová tinha nos seu centro cavalos que utiliza em agroturismo e no âmbito do treino de cavalos, e ainda éguas e poldros, com os quais espera poder obter rendimentos no futuro com a sua participação em corridas ou com a sua venda.

15

No âmbito desta atividade, P. Baštová obtém dois tipos de rendimentos que são objeto do litígio do processo principal. O primeiro tipo consiste em prémios obtidos pela classificação dos seus próprios cavalos nas corridas e em percentagens de prémios ganhos como treinadora pela classificação de cavalos de terceiros obtidas em corridas. O segundo tipo de rendimentos resulta da exploração de um centro equestre de cavalos de corridas e consiste nos pagamentos efetuados pelos donos dos cavalos referentes a treino para a participação nas corridas mas referentes também a despesas de estabulação e penso.

16

Na sua declaração fiscal relativa ao quarto trimestre de 2010, P. Baštová exerceu o seu direito a dedução da totalidade do IVA pago a montante referente aos pagamentos e despesas seguintes: direitos de inscrição e de participação e despesas referentes à assistência prestada por auxiliares nas corridas, aquisição de consumíveis para os cavalos, a sua alimentação e o equipamento dos cavaleiros, despesas veterinárias e compra de medicamentos para os cavalos, consumo de eletricidade no centro hípico, consumo de combustíveis com os veículos, compra de uma ceifeira para corte de feno e forragens e compra de equipamentos para o trator e serviços de consulta ligados ao funcionamento do centro equestre. Estes pagamentos realizados a montante diziam respeito quer aos cavalos de P. Baštová quer aos dos terceiros.

17

Além disso, nessa mesma declaração, P. Baštová declarou o IVA a jusante à taxa reduzida de 10% a título do serviço de «exploração de um centro equestre para cavalos de corrida» prestado aos donos dos cavalos.

18

No seu aviso de liquidação de 26 de setembro de 2011, o Finanční úřad d’Ostrov (Serviço de Finanças de Ostrov, República Checa) não reconheceu a P. Baštová o direito de deduzir a integralidade do IVA pelo facto de a mesma ter utilizado uma parte das operações tributáveis adquiridas a montante com vista à participação dos cavalos em corridas, o que, para o Serviço de Finanças de Ostrov, não constitui uma operação tributável que dê o direito a dedução. Além disso, aquele serviço não aprovou a sujeição do serviço «exploração de um centro equestre para cavalos de corrida» à taxa reduzida de IVA.

19

Decidindo o recurso interposto por P. Baštová, o Finanční ředitelství v Plzni (Direção de Finanças de Plzeň, República Checa), por decisão de 6 de junho de 2012, revogou a decisão do Serviço de Finanças de Ostrov, considerando que P. Baštová tinha o direito de deduzir o IVA relativo à venda dos seus próprios cavalos, pelos serviços de publicidade e pelo agroturismo. A Direção de Finanças reconheceu‑lhe igualmente o direito de deduzir o IVA referente às percentagens, recebidas na qualidade de treinadora, dos prémios ganhos pela classificação dos cavalos de terceiros nas corridas. Contudo, tal como o Serviço de Finanças de Ostrov, a Direção de Finanças de Plzeň não reconheceu a P. Baštová o direito de deduzir o IVA cobrado por operações a montante relativamente aos seus próprios cavalos que participaram em corridas.

20

Visto que P. Baštová exerceu no período de tributação em causa atividades económicas que só em parte davam direito a dedução, só teria direito a uma dedução parcial. No restante, a Direção de Finanças de Plzeň seguir o parecer do Serviço de Finanças de Ostrov, de que a atividade de «exploração de um centro equestre de cavalos de corrida» devia ser sujeita à taxa normal de IVA.

21

P. Baštová interpôs desta decisão um recurso para o Krajský soud v Plzni (Tribunal Regional de Plzeň, República Checa), o qual, por sentença de 6 de novembro de 2013, considerou que, no tocante aos prémios recebidos pela classificação de um cavalo numa corrida, o dono de um cavalo presta ao organizador da corrida um serviço a título oneroso, tratando‑se portanto de uma operação tributável. O seu direito de dedução não devia por isso ter sido reduzido.

22

A Direção de Recursos das Finanças interpôs recurso de cassação para o tribunal de reenvio.

23

Esse tribunal considera, por um lado, que, para determinar se P. Baštová tinha o direito de deduzir a totalidade do IVA, é indispensável saber se a disponibilização de um cavalo pelo seu proprietário ao organizador de uma corrida deve ser considerado um serviço a título oneroso, no sentido do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da diretiva IVA. Em caso de resposta negativa, colocar‑se‑ia a questão de saber se esse facto justifica a redução oficiosa da redução da dedução do IVA pago a montante ou se os custos referentes a esses serviços fazem parte dos custos gerais da atividade económica do sujeito passivo. Se o Tribunal de Justiça responder que a preparação dos cavalos para as corridas e a sua participação nas corridas é um elemento do conjunto da atividade de P. Baštová, resta decidir como tratar o montante que os proprietários dos cavalos recebem a título de preço em função da classificação dos cavalos nas corridas. O tribunal de reenvio pretende saber se esta soma deve ser incluída na base de tributação do IVA a jusante ou se constituiu um rendimento desprovido de qualquer relevância para aquela base de tributação.

24

Por outro lado, o tribunal de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se o serviço de «exploração de um centro equestre para cavalos de corrida» deve ser submetido no seu conjunto à taxa normal de IVA ou se se enquadra no conceito de «utilização de instalações desportivas» que pode beneficiar de uma taxa reduzida nos termos do ponto 14 do anexo III da diretiva IVA. Neste quadro, convinha verificar se os serviços relativos à exploração de um centro equestre para cavalos de corrida, em especial o treino dos cavalos, a utilização das instalações desportivas, a estabulação dos cavalos e sua alimentação e outros cuidados prestados aos cavalos devem ser considerados como uma operação única para efeitos de IVA e sujeitos a um regime fiscal comum. Considerando indubitável o caráter único destes serviços, o tribunal de reenvio procura saber com base em que critérios poderia determinar se os elementos de um serviço são equivalentes uns aos outros ou se estão antes numa relação de prestação principal e prestação acessória.

25

Foi nestas circunstâncias que o Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo, República Checa) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

a)

Constitui a entrega de um cavalo pelo seu proprietário (que é um sujeito passivo) ao organizador de uma corrida, para que o cavalo participe numa corrida, uma prestação de serviços efetuada a título oneroso na aceção do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da [diretiva IVA] e, consequentemente, uma operação sujeita a IVA?

b)

Em caso de resposta afirmativa, devem o prémio monetário obtido na corrida (que, no entanto, nem todos os cavalos que participam na corrida conquistam), a aquisição do serviço, que consiste na oportunidade de o cavalo participar na corrida, que o organizador da mesma presta ao proprietário do cavalo ou qualquer outro tipo de contrapartida, ser considerados uma contraprestação?

c)

Em caso de resposta negativa, essa circunstância justifica, por si só, que seja reduzida a dedução do IVA pago a montante sobre os bens e serviços tributáveis adquiridos e destinados à preparação dos cavalos que são propriedade do próprio criador/treinador de cavalos de corrida, ou deve considerar‑se a participação de um cavalo numa corrida uma componente da atividade económica de uma pessoa que se dedica à criação e ao treino dos seus próprios cavalos de corrida e de cavalos de corrida de terceiros, e as despesas incorridas com a criação dos seus próprios cavalos e com a participação destes em corridas ser incluídas nas despesas gerais da atividade económica dessa pessoa? Se a resposta a essa parte da questão for afirmativa, deve o prémio monetário ser incluído no valor tributável e o IVA pago a jusante contabilizado, ou este rendimento não afeta, de modo algum, o valor tributável para efeitos de IVA?

2)

a)

Se for necessário, para efeitos de IVA, considerar vários serviços parciais como uma operação única, quais são os critérios a aplicar para qualificar a sua relação mútua, ou seja, para determinar se se trata de prestações com importância idêntica ou se existe entre elas uma relação de serviço principal e serviço acessório? Existe alguma hierarquia entre esses critérios em termos da ordem pela qual devem ser aplicados e da sua ponderação?

b)

Deve o artigo 98.o da [diretiva IVA], lido em conjugação com o anexo III dessa diretiva, ser interpretado no sentido de obstar à classificação de um serviço numa categoria sujeita à taxa reduzida se este for constituído por duas prestações parciais que devam ser consideradas, para efeitos de IVA, como uma prestação única, e essas prestações tiverem importância idêntica e uma delas não puder ser classificada em nenhuma das categorias estabelecidas no anexo III da referida diretiva?

c)

Se a resposta à alínea b) da [segunda questão] for afirmativa, a combinação do serviço parcial que consiste em conceder o direito de utilização de instalações desportivas e do serviço parcial prestado pelo treinador de cavalos de corrida, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, obsta à classificação desse serviço como um todo na categoria sujeita a taxa reduzida de IVA mencionada no ponto 14 do anexo III da [diretiva IVA]?

d)

Caso a aplicação da taxa reduzida não seja excluída com base na resposta à alínea c) da [segunda questão], que influência tem sobre a classificação numa categoria sujeita à taxa relevante do IVA o facto de o sujeito passivo prestar, além do serviço de utilização de instalações desportivas e do serviço prestado por um treinador, guarida, alimentação e outros cuidados aos cavalos? Todas essas prestações parciais devem ser consideradas, para efeitos de IVA, como uma prestação única sujeita ao mesmo tratamento fiscal?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão, alíneas a) e b)

26

Com as alíneas a) e b) da sua primeira questão, o tribunal de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que a disponibilização de um cavalo pelo seu proprietário, sujeito passivo de IVA, ao organizador de uma corrida de cavalos para participação do cavalo nessa corrida constitui uma prestação de serviços efetuada a título oneroso, no sentido dessa disposição. Aquele tribunal interroga‑se, em especial, sobre a questão de saber se o prémio recebido pela classificação do cavalo na prova hípica ou o serviço obtido que consiste em possibilitar a participação na corrida constituem uma contrapartida dessa prestação de serviços.

27

Há que recordar, desde logo, que, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da diretiva IVA, que define o âmbito de aplicação do IVA, estão sujeitas a este imposto «as prestações de serviços efetuadas a título oneroso».

28

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a possibilidade de qualificar uma prestação de serviços de «operação a título oneroso» pressupõe unicamente a existência de um nexo direto entre essa prestação e uma contrapartida realmente recebida pelo sujeito passivo. Tal ligação direta é demonstrada quando exista entre o prestador e o beneficiário uma relação jurídica no quadro da qual se trocam prestações recíprocas, constituindo a retribuição recebida pelo prestador o contravalor efetivo do serviço fornecido ao beneficiário (v., designadamente, acórdãos de 3 de março de 1994, Tolsma, C‑16/93, EU:C:1994:80, n.os 13 e 14, e de 29 de outubro de 2015, Saudaçor, C‑174/14, EU:C:2015:733, n.o 32)

29

Em segundo lugar, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a incerteza da retribuição quebra o nexo direto entre o serviço prestado ao beneficiário e a retribuição eventualmente recebida (v., por analogia, acórdãos de 3 de março de 1994, Tolsma, C‑16/93, EU:C:1994:80, n.o 19, e de 27 de setembro de 2001, Cibo Participations, C‑16/00, EU:C:2001:495, n.o 43).

30

Tendo em conta a natureza da análise a efetuar e conforme o Tribunal de Justiça já declarou, compete ao juiz nacional qualificar as atividades em causa com base nos critérios enunciados pelo Tribunal de Justiça (v. acórdão de 29 de outubro de 2015, Saudaçor, C‑174/14, EU:C:2015:733, n.o 33 e jurisprudência aí referida).

31

Por último, como salientado pelo advogado‑geral no n.o 32 das suas conclusões, as atividades desportivas e, concretamente, a participação em competições desportivas podem implicar a prestação de vários serviços distintos, mas estritamente imbricados (v., neste sentido, acórdão de 11 de abril de 2000, Deliège, C‑51/96 e C‑191/97, EU:C:2000:199, n.o 56).

32

Resulta da decisão de reenvio que, ao permitir aos proprietários dos cavalos pô‑los a correr nas corridas, o organizador de uma prova hípica lhes presta um serviço que dá lugar ao pagamento de direitos de inscrição e de participação.

33

Coloca‑se, em contrapartida, a questão de saber se a «disponibilização» de um cavalo pelo seu proprietário sujeito passivo de IVA ao organizador de corridas constitui igualmente uma prestação de serviços a título oneroso cuja contrapartida possa ser constituída pelo prémio ganho pela classificação do cavalo na corrida ou pelo serviço prestado pelo organizador da corrida que consiste na participação do cavalo ou por outra retribuição.

34

Há que salientar que, segundo as indicações constantes dos autos remetidos ao Tribunal de Justiça, essa «disponibilização» corresponde, de facto, à participação do cavalo numa corrida para a qual o dono do cavalo paga direitos de inscrição e de participação, como resulta do n.o 32 do presente acórdão.

35

A este respeito, há que considerar em primeiro lugar que, em princípio, a disponibilização de um cavalo pelo seu proprietário ao organizador de corridas não pode ter a sua contrapartida efetiva no serviço prestado pelo organizador da corrida que consiste em permitir ao proprietário participar na corrida com o seu cavalo. Com efeito, esse serviço é remunerado pelo pagamento, pelo proprietário do cavalo, de direitos de inscrição e de participação que refletem o contravalor efetivo da participação na corrida. Por outro lado, mesmo que o proprietário do cavalo pudesse eventualmente obter um benefício dessa participação graças ao aumento do valor do cavalo em caso de classificação qualificada ou à publicidade que lhe confere a participação, esse benefício é dificilmente quantificável e incerto, uma vez que depende essencialmente do resultado da corrida. O benefício não pode portanto ser considerado para determinar o contravalor efetivo da referida disponibilização, em virtude da jurisprudência referida no n.o 28 do presente acórdão.

36

Em segundo lugar, num caso em que a disponibilização de um cavalo para efeitos da sua participação numa corrida não dá lugar ao pagamento de nenhum valor de participação nem de qualquer outra remuneração direta e em que apenas os proprietários de cavalos com classificações qualificadas recebem um prémio, não se pode considerar que a disponibilização do cavalo dê lugar a uma contrapartida efetiva.

37

Com efeito, nesse caso, não é a disponibilização do cavalo pelo seu proprietário ao organizador da corrida que dá lugar ao pagamento de um prémio, mas a obtenção de determinado resultado na corrida, ou seja, a classificação qualificada do cavalo. E mesmo que o organizador da corrida se tivesse obrigado a conceder um prémio cujo montante fosse fixado e conhecido previamente, não deixa de ser verdade que o prémio está subordinado à realização de uma prova e tem portanto caráter aleatório. Ora, esse caráter aleatório exclui, segundo a jurisprudência referida no n.o 28 do presente acórdão, a existência de um nexo direto entre a disponibilização do cavalo e a obtenção de um prémio.

38

Por outro lado, a solução contrária que consistisse em qualificar o prémio ganho de contrapartida efetiva da disponibilização do cavalo pelo seu proprietário ao organizador da corrida redundaria em fazer depender a qualificação dessa disponibilização como operação tributável do resultado obtido pelo cavalo na corrida, contrariamente à jurisprudência constante do Tribunal de Justiça segundo a qual o conceito de «prestação de serviços» tem caráter objetivo e se aplica independentemente dos objetivos e dos resultados das operações (v. acórdão de 20 de junho de 2013, Newey, C‑653/11, EU:C:2013:409, n.o 41 e jurisprudência aí referida).

39

Em terceiro lugar, no entanto, no caso de a simples participação do cavalo na corrida dar lugar a uma contrapartida direta devido ao pagamento pelo organizador da corrida de um prémio de participação, independentemente da classificação do cavalo na corrida, a disponibilização do cavalo pelo seu proprietário pode ser qualificada de «prestação de serviços efetuada a título oneroso» no sentido do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da diretiva IVA. Com efeito, nesse caso, como salientou o advogado‑geral no n.o 35 das suas conclusões, a retribuição paga pelo organizador da corrida ao dono do cavalo constitui a contrapartida direta do serviço que lhe é prestado pela participação do cavalo na corrida.

40

Tendo em conta as considerações que precedem, há que responder às alíneas a) e b) da primeira questão que o artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que a disponibilização de um cavalo pelo seu proprietário, sujeito passivo de IVA, ao organizador de uma corrida de cavalos para efeitos de participação do cavalo nessa corrida não constitui uma prestação de serviços efetuada a título oneroso, no caso de não dar origem ao pagamento de um prémio de participação ou outra remuneração direta e em que apenas os proprietários dos cavalos que se classifiquem na corrida recebem um prémio, mesmo se determinado previamente. Em contrapartida, a disponibilização de um cavalo constitui uma prestação de serviços a título oneroso no caso de dar origem ao pagamento, pelo organizador, de uma remuneração independente da classificação do cavalo na corrida.

Quanto à primeira questão, alínea c)

41

Com a sua primeira questão, alínea c), o tribunal de reenvio pretende saber, em substância, se, no caso de a disponibilização de um cavalo pelo seu proprietário, sujeito passivo de IVA, ao organizador de uma corrida de cavalos não constituir uma prestação de serviços efetuada a título oneroso, no sentido do artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da diretiva IVA, esta diretiva deve ser interpretada no sentido de que existe o direito de dedução do IVA pago a montante no âmbito das operações relativas à preparação e à participação dos cavalos nas corridas de cavalos que pertencem ao sujeito passivo, o qual treina os seus próprios cavalos de corridas e cavalos de terceiros, pelo facto de os custos dessas operações fazerem parte dos custos gerais da sua atividade económica. O tribunal de reenvio questiona‑se ainda sobre se esse direito conduz à inclusão do prémio que seja ganho pelo sujeito passivo pela classificação de um dos seus cavalos na corrida na base de imposição do IVA.

42

Há que recordar, a título preliminar, que o regime das deduções estabelecido na diretiva IVA visa libertar inteiramente o empresário do peso do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, por conseguinte, a perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as referidas atividades estarem, elas próprias, sujeitas ao IVA (v., designadamente, acórdãos de 14 de fevereiro de 1985, Rompelman, 268/83, EU:C:1985:74, n.o 19, e de 8 de fevereiro de 2007, Investrand, C‑435/05, EU:C:2007:87, n.o 22).

43

A este respeito, a existência de uma relação direta e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução é, em princípio, necessária para que o direito à dedução do IVA pago a montante seja reconhecido ao sujeito passivo e para determinar a extensão de tal direito (acórdãos de 8 de junho de 2000, Midland Bank, C‑98/98, EU:C:2000:300, n.o 24, e de 21 de fevereiro de 2013, Becker, C‑104/12, EU:C:2013:99, n.o 19). O direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efetuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito a dedução (acórdãos de 8 de junho de 2000, Midland Bank, C‑98/98, EU:C:2000:300, n.o 30, e de 21 de fevereiro de 2013, Becker, C‑104/12, EU:C:2013:99, n.o 19).

44

Porém, admite‑se igualmente o direito à dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de uma relação direta e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução, quando os custos dos serviços em causa fizerem parte das despesas gerais do sujeito passivo e forem, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que ele fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo (v., neste sentido, designadamente, acórdãos de 8 de junho de 2000, Midland Bank, C‑98/98, EU:C:2000:300, n.o 31, e de 21 de fevereiro de 2013, Becker, C‑104/12, EU:C:2013:99, n.o 20).

45

Além disso, o facto de a relação direta e imediata existente entre uma prestação de serviços e o conjunto da atividade económica tributável dever ser determinada tendo em conta o conteúdo objetivo desta prestação de serviços não impede que a causa exclusiva da operação em causa possa também ser tida em conta, devendo esta ser considerada como um critério de determinação do conteúdo objetivo. Uma vez demonstrado que uma operação não foi efetuada para corresponder às necessidades das atividades tributáveis de um sujeito passivo, esta operação não pode ser considerada como tendo uma relação direta e imediata com essas atividades na aceção da jurisprudência do Tribunal de Justiça, ainda que essa operação seja, tendo em conta o seu conteúdo objetivo, tributável a título de IVA (acórdão de 21 de fevereiro de 2013, Becker, C‑104/12, EU:C:2013:99, n.o 19).

46

No quadro da apreciação do critério da relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo, que incumbe às Administrações Fiscais e aos órgãos jurisdicionais nacionais, cabe a estes ter em conta todas as circunstâncias em que se desenrolaram as operações em causa (v., neste sentido, acórdão de 8 de junho de 2000, Midland Bank, C‑98/98, EU:C:2000:300, n.o 25) e ter em conta apenas as operações que têm relação objetiva com a atividade tributável do sujeito passivo (acórdão de 21 de fevereiro de 2013, Becker, C‑104/12, EU:C:2013:99, n.o 22).

47

Resulta do pedido de decisão prejudicial que a atividade económica de P. Baštová consiste na exploração de um centro equestre para cavalos de corrida no qual ela cria e treina os seus próprios cavalos e cavalos de terceiros. Os seus cavalos são destinados a venda e/ou têm um papel no treino ou no agroturismo e participam também nas corridas.

48

É certo que a criação e o treino de cavalos que pertencem a uma pessoa que explora um centro equestre para cavalos de corrida são, enquanto tais, suscetíveis de ter uma ligação com essa atividade económica. Porém, tendo em conta a jurisprudência citada no n.o 44 do presente acórdão, esta constatação não é suficiente para dar o direito a dedução, o qual exige a existência de uma ligação direta e imediata dos custos de cada uma das operações ligadas à preparação dos cavalos e à sua participação nas corridas com o conjunto dessa atividade económica.

49

Para se apreciar a existência dessa ligação, cabe ao tribunal de reenvio verificar, em especial, se os cavalos que pertencem ao proprietário do centro equestre de cavalos de corrida são efetivamente destinados a venda ou se a sua participação em corridas é, de um ponto de vista objetivo, um meio de promover a atividade económica desse centro equestre. Se for esse o caso, os custos com a preparação e a participação desses cavalos em corridas têm uma ligação direta e imediata com o conjunto da atividade económica que consiste na exploração do centro equestre. Com efeito, é sabido que o preço de um cavalo de corrida é função da preparação nas corridas, da experiência e até da fama que o cavalo obteve nas corridas. Por outro lado, os êxitos obtidos pelos seus cavalos nas corridas podem dar fama, publicidade ou visibilidade ao proprietário do centro equestre que podem influenciar os preços dos seus serviços de treino de cavalos de terceiros, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar.

50

Em contrapartida, para esta apreciação, não é pertinente o facto de as operações ligadas à preparação e à participação nas corridas dos cavalos que pertencem ao proprietário do centro equestre lhe permitirem melhorar e desenvolver métodos de treino, a alimentação e os cuidados dispensados aos cavalos e, dessa forma, também aos serviços prestados a terceiros. Com efeito, esse facto só reflete uma ligação indireta entre essas operações e a atividade económica em causa no processo principal descrita no n.o 47 supra.

51

Além disso, embora as operações ligadas à preparação e à participação em corridas dos cavalos que pertencem ao proprietário do centro equestre tenham como objetivo promover os interesses privados do proprietário, não se pode considerar que essas operações têm uma ligação direta e imediata com o conjunto da atividade económica que consiste na exploração do centro equestre.

52

Daqui decorre que, nos termos dos artigos 167.o e 168.o, alínea a), da diretiva IVA, uma pessoa que esteja na situação de P. Baštová tem o direito de deduzir a integralidade do IVA que onerou as despesas realizadas com a preparação e a participação dos seus cavalos nas corridas quando esses cavalos sejam efetivamente destinados a venda ou quando essa participação, de um ponto de vista objetivo, for um meio de promover a atividade económica do centro equestre. Em contrapartida, não existirá direito a dedução do IVA que onerou as despesas realizadas com a preparação e a participação dos seus cavalos nas corridas se os cavalos não forem efetivamente destinados a venda, se a participação nas corridas não for uma forma de promover a atividade económica do centro equestre e se essas despesas não servirem para nenhuma outra atividade do sujeito passivo ligada à sua atividade económica, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar.

53

Com efeito, é pacífico que, se um sujeito passivo efetuar ao mesmo tempo operações com direito a dedução e operações sem direito a dedução, apenas pode, nos termos do artigo 173.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da diretiva IVA, deduzir a parte do IVA proporcional ao montante respeitante às primeiras operações (v., neste sentido, acórdãos de 22 de fevereiro de 2001, Abbey National, C‑408/98, EU:C:2001:110, n.o 37, e de 26 de maio de 2005, Kretztechnik, C‑465/03, EU:C:2005:320, n.o 37).

54

Por último, há que indicar que as conclusões baseadas na apreciação exposta nos n.os 44 a 52 do presente acórdão são irrelevantes para a questão, que é diferente, da inclusão do prémio ganho pelo proprietário do cavalo, sujeito passivo de IVA, na base da tributação, o que depende da qualificação desse prémio de «contrapartida de uma prestação de serviços». Com efeito, resulta do artigo 73.o da diretiva IVA que, para prestações de serviços como as que estão em causa no processo principal, o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções diretamente relacionadas com o preço de tais operações. Ora, resulta das considerações constantes dos n.os 36 a 38 do presente acórdão que o prémio ganho por um cavalo do sujeito passivo não pode ser qualificado de contrapartida efetiva da disponibilização do cavalo ao organizador de corridas.

55

Atendendo ao conjunto das considerações precedentes, há que responder à primeira questão, alínea c), que:

A diretiva IVA deve ser interpretada no sentido de que existe o direito de deduzir a integralidade do IVA pago a montante no âmbito das operações relativas à preparação e à participação em corridas dos cavalos que pertencem ao sujeito passivo, que cria e treina os seus próprios cavalos de corrida assim como cavalos de terceiros, pelo facto de os custos relativos a essas operações fazerem parte dos custos gerais ligados à sua atividade económica, desde que as despesas efetuadas para cada uma das operações em causa tenham uma ligação direta e imediata com o conjunto dessa atividade. Poderá ser esse o caso se os custos gerados disserem respeito a cavalos de corrida efetivamente destinados a venda ou se a participação dos cavalos nas corridas for, de um ponto de vista objetivo, uma forma de promover a atividade económica, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar.

Se o direito a dedução existir, o prémio eventualmente ganho pelo sujeito passivo pela classificação de um dos seus cavalos numa corrida não deve ser incluído na base de tributação do IVA.

Quanto à segunda questão

56

Com a sua segunda questão, o tribunal de reenvio pretende saber, em substância, se o artigo 98.o da diretiva IVA, lido em conjugação com o ponto 14 do anexo III da mesma diretiva, deve ser interpretado no sentido de que uma prestação de serviços complexa única, composta por vários elementos, e que consiste no treino dos cavalos, na utilização de instalações desportivas, na estabulação dos cavalos, na sua alimentação e noutros cuidados prestados aos cavalos, pode ser sujeita a uma taxa reduzida de IVA.

57

Em primeiro lugar, há que precisar o âmbito do artigo 98.o da diretiva IVA e do ponto 14 do anexo III desta diretiva.

58

A este respeito, resulta do artigo 98.o da diretiva IVA que a aplicação de uma ou de duas taxas reduzidas é uma possibilidade reconhecida aos Estados‑Membros por derrogação do princípio segundo o qual é aplicável a taxa normal. Além disso, segundo esta disposição, as taxas reduzidas de IVA só podem ser aplicadas às entregas de bens e às prestações de serviços mencionadas no anexo III desta diretiva.

59

No que se refere à interpretação desse anexo, importa recordar, por um lado, que as disposições que têm natureza derrogatória de um princípio são de interpretação estrita (v., neste sentido, acórdãos de 12 de dezembro de 1995, Oude Luttikhuis e o., C‑399/93, EU:C:1995:434, n.o 23, e de 17 de junho de 2010, Comissão/França, C‑492/08, EU:C:2010:348, n.o 35).

60

Por outro lado, os conceitos utilizados no anexo III da diretiva IVA devem ser interpretados de acordo com o sentido habitual dos termos em causa (acórdão de 4 de junho de 2015, Comissão/Polónia, C‑678/13, não publicado, EU:C:2015:358, n.o 46).

61

No caso em apreço, resulta dos termos do ponto 14 do anexo III da diretiva IVA que este autoriza os Estados‑Membros a aplicar uma taxa reduzida de IVA ao «direito de utilização de instalações desportivas».

62

Resulta dos termos «direito de utilização» que a aplicação de uma taxa reduzida é possível se a utilização for feita por um terceiro e não pelo sujeito passivo que explora a instalação desportiva para os seus próprios fins.

63

O conceito de utilização de «instalações desportivas» está ligado a prestações relativas à prática do desporto e da educação física, as quais devem, na medida do possível, ser consideradas no seu conjunto (v., neste sentido, acórdãos de 18 de janeiro de 2001, Stockholm Lindöpark, C‑150/99, EU:C:2001:34, n.o 26, e de 22 de janeiro de 2015, Régie communale autonome du stade Luc Varenne, C‑55/14, EU:C:2015:29 , n.o 25).

64

Ora, como salientado pelo advogado‑geral nos n.os 56 a 59 das suas conclusões, a possibilidade de sujeitar o direito de utilização das instalações desportivas a uma taxa reduzida tem o objetivo de promover a prática de atividades desportivas e a torná‑las mais acessíveis aos particulares.

65

Por conseguinte, o conceito de «direito de utilização de instalações desportivas» deve ser entendido como visando o direito de utilizar instalações destinadas à prática do desporto e da educação física, bem como a sua utilização para esse fim.

66

Donde se conclui que, embora as prestações de serviços ligadas à utilização das instalações necessárias à prática de desportos equestres possam enquadrar‑se no ponto 14 do anexo III da diretiva IVA, não seria o caso das prestações ligadas à utilização de instalações destinadas à estabulação dos cavalos no centro equestre, à sua alimentação ou aos cuidados que lhes são prestados, nem dos espaços de lazer ou de armazenamento.

67

Cabe ao tribunal de reenvio apreciar se o elemento que consiste na utilização de instalações desportivas da prestação de serviços que está em causa no processo principal, no sentido que lhe conferem os contratos celebrados entre P. Baštová e os proprietários dos cavalos, corresponde a esta definição. Não existindo coincidência entre o sentido conferido a este elemento pelos contratos e o «direito de utilização de instalações desportivas», no sentido do ponto 14 do anexo III da diretiva IVA, a referida prestação não pode, em qualquer caso, ser abrangida pela taxa reduzida de IVA ao abrigo do referido ponto 14.

68

Em segundo lugar, e no caso de o tribunal de reenvio considerar no final desta apreciação que esse elemento de utilização de instalações desportivas podia ser abrangido por uma taxa reduzida de IVA, importa recordar, para responder à questão colocada, que, para efeitos do IVA, cada uma das prestações deve ser considerada distinta e independente, como decorre do artigo 1.o, n.o 2, segundo parágrafo, da diretiva IVA (v., neste sentido, acórdãos de 27 de outubro de 2005, Levob Verzekeringen e OV Bank, C‑41/04, EU:C:2005:649, n.o 20, e de 27 de setembro de 2012, Field Fisher Waterhouse, C‑392/11, EU:C:2012:597, n.o 14).

69

Contudo, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, em determinadas circunstâncias, várias prestações formalmente distintas, suscetíveis de serem realizadas separadamente e de dar assim lugar, em cada caso, a tributação ou a isenção, devem ser consideradas uma operação única quando não sejam independentes (v. acórdão de 2 de dezembro de 2010, Everything Everywhere, C‑276/09, EU:C:2010:730, n.o 23 e jurisprudência aí referida).

70

Está em causa uma operação única, nomeadamente, quando dois ou vários elementos ou atos fornecidos pelo sujeito passivo ao cliente estiverem tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica indissociável, cuja decomposição revestiria um caráter artificial (acórdãos de 27 de outubro de 2005, Levob Verzekeringen e OV Bank, C‑41/04, EU:C:2005:649, n.o 22, e de 29 de março de 2007, Aktiebolaget NN, C‑111/05, EU:C:2007:195, n.o 23).

71

É também o que sucede nos casos em que se deva considerar que um ou mais elementos constituem a prestação principal, ao passo que, inversamente, um ou vários elementos devem ser vistos como uma ou várias prestações acessórias que partilham o destino fiscal da prestação principal. Em particular, uma prestação deve ser considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si mesmo, mas um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador (acórdãos de 25 de fevereiro de 1999, CPP, C‑349/96, EU:C:1999:93, n.o 30, e de 21 de fevereiro de 2008, Part Service, C‑425/06, EU:C:2008:108, n.o 52).

72

Se entre os elementos que compõem a prestação complexa única não for possível determinar um elemento principal e um ou mais elementos acessórios, os elementos que compõem essa prestação devem ser considerados equivalentes.

73

No quadro da cooperação instituída por força do artigo 267.o TFUE, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se é isso o que concretamente se verifica, tendo em conta, no quadro de uma apreciação de conjunto, a importância qualitativa e não simplesmente quantitativa dos elementos pertinentes. Todavia, o Tribunal de Justiça pode fornecer‑lhe todos os elementos de interpretação do direito da União que lhe possam ser úteis (v., neste sentido, acórdãos de 27 de outubro de 2005, Levob Verzekeringen e OV Bank, C‑41/04, EU:C:2005:649, n.o 23, e de 17 de janeiro de 2013, BGŻ Leasing, C‑224/11, EU:C:2013:15, n.o 33).

74

No caso em apreço, o tribunal de reenvio indica claramente que a prestação de serviços em causa no processo principal, como resulta dos contratos celebrados entre P. Baštová e os proprietários dos cavalos e que é composta por três elementos, a saber, o treino dos cavalos, a utilização de instalações desportivas e a estabulação dos cavalos, a sua alimentação e outros cuidados prestados aos cavalos, é uma prestação complexa única. Tal conclusão impõe‑se no caso em que os contraentes procuram na realidade uma combinação dos três elementos dessa prestação, em que a utilização das instalações desportivas é objetivamente necessária para o treino dos cavalos de corrida e em que as prestações ligadas à estabulação, à alimentação e aos cuidados dos cavalos são principalmente destinadas a acompanhar e a facilitar o treino dos cavalos e a utilização das instalações desportivas.

75

Assim, sob reserva de verificação pelo tribunal de reenvio, parece resultar dos elementos constantes da decisão de reenvio que os serviços de treino e a utilização das instalações desportivas constituem dois elementos desta prestação complexa que têm, para a finalidade da prestação, uma importância equivalente, ao passo que as prestações ligadas à estabulação, à alimentação e aos cuidados prestados aos cavalos têm um caráter acessório relativamente a esses dois elementos. Na medida em que só a utilização das instalações desportivas é abrangida pela taxa reduzida prevista no artigo 98.o desta diretiva, lido em conjugação com o ponto 14 do anexo III da diretiva IVA, essa taxa reduzida não pode ser aplicada à prestação complexa única em causa no processo principal (v., por analogia, acórdão de 19 de julho de 2012, Deutsche Bank, C‑44/11, EU:C:2012:484, n.os 41 a 43).

76

Se, pelo contrário, o tribunal de reenvio chegar à conclusão, com base nos factos em causa no processo principal, e nomeadamente atendendo aos contratos celebrados entre P. Baštová e os proprietários dos cavalos, de que o treino dos cavalos constitui o elemento principal da prestação complexa única, a mesma conclusão se imporá e a referida prestação não pode igualmente ser sujeita à taxa reduzida prevista no artigo 98.o da diretiva IVA, lido em conjugação com o ponto 14 do anexo III desta diretiva.

77

À luz das considerações que precedem, há que responder à segunda questão que o artigo 98.o da diretiva IVA, lido cm conjugação com o ponto 14 do anexo III da mesma diretiva, deve ser interpretado no sentido de que uma prestação de serviços complexa única, composta por vários elementos, que consistem, designadamente, no treino dos cavalos, na utilização de instalações desportivas e na estabulação dos cavalos, na sua alimentação e nos outros cuidados prestados aos cavalos, não pode ser sujeita à taxa reduzida de IVA quando a utilização das instalações desportivas no sentido do ponto 14 do anexo III desta diretiva e o treino dos cavalos constituam dois elementos equivalentes dessa prestação complexa ou quando o treino dos cavalos constitua o elemento principal da referida prestação, o que cabe ao tribunal de reenvio apreciar.

Quanto às despesas

78

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

1)

O artigo 2.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que a disponibilização de um cavalo pelo seu proprietário, sujeito passivo de imposto sobre o valor acrescentado, ao organizador de uma corrida de cavalos para efeitos de participação do cavalo nessa corrida não constitui uma prestação de serviços efetuada a título oneroso, no caso de não dar origem ao pagamento de um prémio de participação ou outra remuneração direta e em que apenas os proprietários dos cavalos que se classifiquem na corrida recebem um prémio, mesmo se determinado previamente. Em contrapartida, a disponibilização de um cavalo constitui uma prestação de serviços a título oneroso no caso de dar origem ao pagamento, pelo organizador, de uma remuneração independente da classificação do cavalo na corrida.

 

2)

A Diretiva 2006/112 deve ser interpretada no sentido no sentido de que existe o direito de deduzir a integralidade do imposto sobre o valor acrescentado pago a montante no âmbito das operações relativas à preparação e à participação em corridas dos cavalos que pertencem ao sujeito passivo, que cria e treina os seus próprios cavalos de corrida assim como cavalos de terceiros, pelo facto de os custos relativos a essas operações fazerem parte dos custos gerais ligados à sua atividade económica, desde que as despesas efetuadas para cada uma das operações em causa tenham uma ligação direta e imediata com o conjunto dessa atividade. Poderá ser esse o caso se os custos gerados disserem respeito a cavalos de corrida efetivamente destinados a venda ou se a participação dos cavalos nas corridas for, de um ponto de vista objetivo, uma forma de promover a atividade económica, o que cabe ao tribunal de reenvio verificar.

Se o direito a dedução existir, o prémio eventualmente ganho pelo sujeito passivo pela classificação de um dos seus cavalos numa corrida não deve ser incluído na base de tributação do imposto sobre o valor acrescentado.

 

3)

O artigo 98.o da Diretiva 2006/112, lido em conjugação com o ponto 14 do anexo III da mesma diretiva, deve ser interpretado no sentido de que uma prestação de serviços complexa única, composta por vários elementos, que consistem, designadamente, no treino dos cavalos, na utilização de instalações desportivas e na estabulação dos cavalos, na sua alimentação e nos outros cuidados prestados aos cavalos, não pode ser sujeita à taxa reduzida de imposto sobre o valor acrescentado quando a utilização das instalações desportivas no sentido do ponto 14 do anexo III desta diretiva e o treino dos cavalos constituam dois elementos equivalentes dessa prestação complexa ou quando o treino dos cavalos constitua o elemento principal da referida prestação, o que cabe ao tribunal de reenvio apreciar.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: checo.