ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

13 de julho de 2017 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Direito de acesso aos documentos na posse das instituições da União Europeia — Regulamento (CE) n.o 1049/2001 — Exceções ao direito de acesso — Artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo — Proteção do processo decisório dessas instituições — Ambiente — Convenção de Aarhus — Regulamento (CE) n.o 1367/2006 — Artigo 6.o, n.o 1 — Interesse público da divulgação de informações sobre ambiente — Informações, transmitidas pelas autoridades alemãs à Comissão Europeia, que visam instalações situadas em território alemão abrangidas pela legislação da União relativa ao regime de comércio de licenças de emissão de gás com efeito de estufa — Recusa parcial de acesso»

No processo C‑60/15 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral, nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 11 de fevereiro de 2015,

Saint‑Gobain Glass Deutschland GmbH, com sede em Stolberg (Alemanha), representada por S. Altenschmidt e P.‑A. Schütter, Rechtsanwälte,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por M. H. Krämer, F. Clotuche‑Duvieusart e P. Mihaylova, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: J. L. da Cruz Vilaça, presidente de secção, A. Tizzano (relator), vice‑presidente do Tribunal de Justiça, A. Borg Barthet, E. Levits e F. Biltgen, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: M. Aleksejev, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 6 de julho de 2016,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 19 de outubro de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

Com o presente recurso, a Saint‑Gobain Glass Deutschland GmbH (a seguir «Saint‑Gobain») pede a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 11 de dezembro de 2014, Saint‑Gobain Glass Deutschland/Comissão (T‑476/12, não publicado, EU:T:2014:1059; a seguir «acórdão recorrido»), pelo qual este negou provimento ao seu recurso de anulação da decisão da Comissão de 17 de janeiro de 2013 que recusa o acesso integral à lista transmitida pela República Federal da Alemanha à Comissão, no âmbito do procedimento previsto no artigo 15.o, n.o 1, da Decisão 2011/278/UE da Comissão, de 27 de abril de 2011, sobre a determinação das regras transitórias da União relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos do artigo 10.o‑A da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2011, L 130, p. 1), na medida em que esse documento contém informações sobre determinadas instalações da Saint‑Gobain situadas em território alemão, relativas às atribuições provisórias bem como às atividades e aos níveis de capacidade em termos de emissões de dióxido de carbono (CO2) durante o período de 2005 a 2010, à eficácia das instalações e às licenças de emissão anuais atribuídas provisoriamente para o período compreendido entre 2013 e 2020 (a seguir «decisão controvertida»).

Quadro jurídico

Direito internacional

2

O artigo 4.o da Convenção sobre o acesso à informação, participação do público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria de ambiente, assinada em Aarhus, em 25 de junho de 1998, e aprovada, em nome da Comunidade Europeia, pela Decisão 2005/370/CE do Conselho, de 17 de fevereiro de 2005 (JO 2005, L 124, p. 1, a seguir «Convenção de Aarhus»), enuncia o seguinte:

«1.   Cada parte assegurará que, em resposta a um pedido de informação ambiental, as autoridades públicas coloquem à disposição do público tal informação, de acordo com o disposto no presente artigo e em conformidade com o disposto na legislação nacional […]:

a)

Sem que seja necessário declarar um interesse na questão;

[…]

4.   Pode ser recusado um pedido de informações se a divulgação das mesmas afetar negativamente:

a)

A confidencialidade dos procedimentos das autoridades públicas, nos casos em que tal confidencialidade esteja prevista no direito interno;

[…]

Os fundamentos de recusa acima referidos devem ser objeto de uma interpretação restritiva, tendo em conta o interesse público defendido pela divulgação e o facto de a informação solicitada ser relativa a emissões para o ambiente.

[…]»

Direito da União

3

Os considerandos 1, 2, 4, 6 e 11 do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43), estão redigidos como segue:

«(1)

O Tratado da União Europeia consagra a noção de abertura no segundo parágrafo do artigo 1.o, nos termos do qual o Tratado assinala uma nova etapa no processo de criação de uma união cada vez mais estreita entre os povos da Europa, em que as decisões serão tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais próximo possível dos cidadãos.

(2)

Esta abertura permite assegurar uma melhor participação dos cidadãos no processo de decisão e garantir uma maior legitimidade, eficácia e responsabilidade da Administração perante os cidadãos num sistema democrático. A abertura contribui para o reforço dos princípios da democracia e do respeito dos direitos fundamentais consagrados no artigo 6.o do Tratado UE e na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

[…]

(4)

O presente regulamento destina‑se a permitir o mais amplo efeito possível do direito de acesso do público aos documentos e a estabelecer os respetivos princípios gerais e limites, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 255.o do Tratado CE.

[…]

(6)

Deverá ser concedido maior acesso aos documentos nos casos em que as instituições ajam no exercício dos seus poderes legislativos, incluindo por delegação, embora simultaneamente, preservando a eficácia do processo decisório institucional. O acesso direto a estes documentos deverá ser tão amplo quanto possível.

[…]

(11)

Em princípio, todos os documentos das instituições deverão ser acessíveis ao público. No entanto, determinados interesses públicos e privados devem ser protegidos através de exceções. É igualmente necessário que as instituições possam proteger as suas consultas e deliberações internas, se tal for necessário para salvaguardar a sua capacidade de desempenharem as suas funções. Ao avaliar as exceções, as instituições deverão ter em conta os princípios estabelecidos na legislação comunitária relativos à proteção de dados pessoais em todos os domínios de atividade da União.»

4

O artigo 1.o deste regulamento, intitulado «Objeto», dispõe:

«O presente regulamento visa:

a)

Definir os princípios, as condições e os limites que, por razões de interesse público ou privado, regem o direito de acesso aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (adiante designados “instituições”), previsto no artigo 255.o do Tratado CE, de modo a que o acesso aos documentos seja o mais amplo possível;

b)

Estabelecer normas que garantam que o exercício deste direito seja o mais fácil possível; e

c)

Promover boas práticas administrativas em matéria de acesso aos documentos.»

5

O artigo 2.o do referido regulamento, intitulado «Beneficiários e âmbito de aplicação», dispõe, no seu n.o 3:

«O presente regulamento é aplicável a todos os documentos na posse de uma instituição, ou seja, aos documentos por ela elaborados ou recebidos que se encontrem na sua posse, em todos os domínios de atividade da União Europeia.»

6

O artigo 4.o do mesmo regulamento, intitulado «Exceções», enuncia:

«[…]

2.   As instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a proteção de:

interesses comerciais das pessoas singulares ou coletivas, incluindo a propriedade intelectual,

[…]

objetivos de atividades de inspeção, inquérito e auditoria,

exceto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

3.   O acesso a documentos, elaborados por uma instituição para uso interno ou por ela recebidos, relacionados com uma matéria sobre a qual a instituição não tenha decidido, será recusado, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, exceto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

[…]

5.   Qualquer Estado‑Membro pode solicitar à instituição que esta não divulgue um documento emanado desse Estado‑Membro sem o seu prévio acordo.

[…]»

7

O artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 2003/4/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro de 2003, relativa ao acesso do público às informações sobre ambiente e que revoga a Diretiva 90/313/CEE do Conselho (JO 2003, L 41, p. 26), prevê:

«Os Estados‑Membros podem prever o indeferimento de um pedido de informação sobre ambiente se a divulgação dessa informação prejudicar:

a)

A confidencialidade dos procedimentos das autoridades públicas, quando tal confidencialidade esteja prevista por lei;

[…]»

8

O considerando 2 do Regulamento (CE) n.o 1367/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de setembro de 2006, relativo à aplicação das disposições da Convenção de Aarhus sobre o acesso à informação, participação do público no processo de tomada de decisão e acesso à justiça em matéria de ambiente às instituições e órgãos comunitários (JO 2006, L 264, p. 13), enuncia o seguinte:

«O sexto programa comunitário de ação em matéria de ambiente […] salienta a importância de fornecer ao público informações adequadas sobre o ambiente e de lhe oferecer a oportunidade efetiva de participar nos processos de tomada de decisões, aumentando assim a responsabilidade e a transparência desses processos e contribuindo para sensibilizar e angariar o apoio do público às decisões tomadas. À semelhança dos seus predecessores […], o programa encoraja também uma transposição e aplicação mais eficazes da legislação comunitária relativa à proteção do ambiente, nomeadamente a execução das regras comunitárias e a tomada de medidas em caso de violação da legislação comunitária relativa ao ambiente.»

9

O artigo 1.o desse regulamento prevê:

«O presente regulamento tem por objetivo contribuir para a aplicação das obrigações decorrentes da [Convenção de Aarhus], estabelecendo regras destinadas a aplicar as disposições da Convenção às instituições e órgãos comunitários, nomeadamente:

a)

Garantindo ao público o direito de acesso à informação sobre ambiente recebida ou produzida por instituições ou órgãos comunitários e mantida por estes, e estabelecendo os termos e condições de base e as modalidades práticas para o exercício desse direito;

b)

Garantindo que a informação sobre ambiente seja progressivamente disponibilizada e divulgada ao público, a fim de atingir a mais vasta e sistemática disponibilização e divulgação possível. Para o efeito, haverá que promover, em especial, a utilização de tecnologias telemáticas e/ou eletrónicas, quando disponíveis;

c)

Prevendo a participação do público em planos e programas relativos ao ambiente;

d)

Concedendo acesso à justiça em matéria de ambiente a nível comunitário nas condições estabelecidas no presente regulamento.

2.   Ao aplicarem o disposto no presente regulamento, as instituições e órgãos comunitários devem envidar esforços para ajudar e aconselhar o público relativamente ao acesso à informação, à sua participação no processo de tomada de decisões e ao acesso à justiça em matéria de ambiente.»

10

O artigo 2.o, n.o 1, do referido regulamento dispõe:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

d)

“Informação sobre ambiente”, qualquer informação sob forma escrita, visual, sonora, eletrónica ou qualquer outra forma material relativa:

[…]

iii)

a medidas (incluindo as administrativas) como as políticas, a legislação, os planos, os programas, os acordos ambientais e as ações que afetem ou possam afetar os elementos e fatores referidos nos pontos i) e ii), bem como as medidas ou ações destinadas a proteger esses elementos,

[…]»

11

O artigo 3.o, primeiro parágrafo, do mesmo regulamento tem a seguinte redação:

«O Regulamento (CE) n.o 1049/2001 aplica‑se a todos os pedidos de acesso a informação sobre ambiente detida por instituições e órgãos comunitários, sem qualquer discriminação em razão da cidadania, nacionalidade ou domicílio do requerente e, no caso das pessoas coletivas, sem discriminação em razão do local da sua sede social ou centro efetivo de atividades.»

12

O artigo 6.o do Regulamento n.o 1367/2006, intitulado «Aplicação das exceções relativas a pedidos de acesso a informação sobre [o] ambiente», enuncia, no seu n.o 1:

«No que se refere ao primeiro e terceiro travessões do n.o 2 do artigo 4.o do Regulamento (CE) n.o 1049/2001, com exceção dos inquéritos, em especial os relacionados com possíveis incumprimentos do direito comunitário, considera‑se que existe um interesse público superior na divulgação quando a informação solicitada estiver relacionada com emissões para o ambiente. No que se refere às outras exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento (CE) n.o 1049/2001, os motivos de recusa de acesso devem ser interpretados restritivamente, atendendo ao interesse público servido pela divulgação e à questão de saber se a informação solicitada está relacionada com emissões para o ambiente.»

13

Nos termos do artigo 15.o, n.o 1, da Decisão 2011/278:

«Em conformidade com o disposto no artigo 11.o, n.o 1, da Diretiva 2003/87/CE, os Estados‑Membros devem apresentar à Comissão, até 30 de setembro de 2011, uma lista de instalações abrangidas pela Diretiva 2003/87/CE no seu território, incluindo as instalações identificadas nos termos do artigo 5.o, utilizando o modelo eletrónico fornecido pela Comissão.»

Antecedentes do litígio

14

A Saint‑Gobain, sociedade que exerce a sua atividade no mercado mundial do vidro, explora instalações abrangidas pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (JO 2003, L 275, p. 32).

15

Baseando‑se na Decisão 2011/278, a Saint‑Gobain solicitou às autoridades alemãs competentes a concessão a título gratuito de licenças de emissão para o terceiro período previsto no quadro do regime de comércio de licenças de emissão estabelecido por aquela diretiva, a saber, o período de 2013 a 2020.

16

Essa decisão prevê, em substância, que os Estados‑Membros devem calcular o número provisório de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a cada uma das instalações existentes, com base nos valores de referência determinados pela Comissão Europeia. A referida decisão dispõe, em especial, no seu artigo 15.o, n.o 1, que os resultados desses cálculos são inscritos na lista das instalações abrangidas pela Diretiva 2003/87 que se situam no território de cada Estado‑Membro, sendo essa lista comunicada por cada Estado‑Membro à Comissão, para efeitos de verificação.

17

Por carta de 3 de julho de 2012, a Saint‑Gobain pediu à Comissão, com fundamento no Regulamento n.o 1049/2001 e no Regulamento n.o 1367/2006, acesso ao quadro Excel que havia sido transmitido pela República Federal da Alemanha à Comissão no âmbito do procedimento previsto no referido artigo 15.o, n.o 1. Esse quadro continha informações relativas a certas instalações da Saint‑Gobain situadas em território alemão. Em especial, a Saint‑Gobain pediu acesso a dados relativos às «capacidades iniciais instaladas», transmitidos por cada subinstalação, e ao número anual provisório de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a cada uma dessas subinstalações para o período de 2013 a 2020.

18

Por carta de 23 de julho de 2012, A Direção‑Geral da Ação Climática da Comissão indeferiu o pedido da Saint‑Gobain, baseando‑se no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001.

19

Seguidamente, as autoridades alemãs tornaram pública a lista das instalações em causa e o número anual provisório de licenças de emissão atribuídas a cada instalação.

20

Em 7 de agosto de 2012, a Saint‑Gobain apresentou um pedido confirmativo de acesso aos documentos, na aceção do Regulamento n.o 1049/2001.

21

Por carta de 4 de setembro de 2012, a Comissão prorrogou o prazo de resposta por quinze dias úteis, ou seja, até 25 de setembro de 2012.

22

Todavia, por carta de 25 de setembro de 2012, a Comissão informou a Saint‑Gobain de que não lhe poderia comunicar uma decisão definitiva no prazo fixado, pois as autoridades alemãs, que tinham sido consultadas como autores das informações solicitadas, ainda não tinham enviado nenhuma resposta.

23

Em 28 de setembro de 2012, a Saint‑Gobain pediu à Comissão que decidisse sobre o seu pedido de decisão confirmativa até 15 de outubro de 2012.

24

Em 17 de janeiro de 2013, a Comissão, através da decisão controvertida, concedeu acesso parcial às informações solicitadas, a saber, as informações tornadas públicas pelas autoridades alemãs, e às informações não essenciais contidas no quadro Excel, negando acesso às restantes informações.

25

A Comissão baseou a sua decisão de recusa no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, por considerar que a divulgação integral das informações solicitadas prejudicaria gravemente o seu processo decisório em curso, respeitante a numerosas instalações em vários Estados‑Membros. Segundo aquela instituição, a comunicação integral das referidas informações permitiria ao público e, em especial, às empresas em causa levantar questões ou formular críticas acerca das informações transmitidas pelos Estados‑Membros, o que poderia interferir no processo decisório. Essas interferências, por seu turno, comportavam o risco de atrasar significativamente esse processo e afetar o diálogo entre a Comissão e os Estados‑Membros.

26

Uma vez que as informações solicitadas tinham sido produzidas pela República Federal da Alemanha, a Comissão consultou este Estado‑Membro, com base no artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento n.o 1049/2001, que se opôs à sua divulgação. Tal como a Comissão, o referido Estado‑Membro justificou a oposição com base na exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, desse regulamento. Em especial, afirmou que a Comissão ainda não tinha adotado uma decisão relativa a essas informações e que essa decisão era aguardada nos prazos fixados. A Comissão considerou que estes motivos eram prima facie pertinentes.

27

Na decisão controvertida, a Comissão começou por referir que não existia um interesse público superior, na aceção do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, daquele regulamento, que justificasse a divulgação integral das informações solicitadas, precisando que os interesses evocados pela Saint‑Gobain no seu pedido eram de natureza puramente privada. Seguidamente, considerou que, no caso vertente, os interesses prioritários consistiam em assegurar a tomada de decisão livre de interferências exteriores e preservar o clima de confiança entre a Comissão e as autoridades alemãs. Além disso, a Comissão recordou que uma parte importante das informações solicitadas já tinha sido tornada pública por aquelas autoridades e afirmou que o público tinha, portanto, tido acesso aos principais elementos do projeto de concessão harmonizada de licenças de emissão a título gratuito.

28

Por fim, a Comissão referiu na dita decisão que, mesmo admitindo que as informações solicitadas pela Saint‑Gobain tivessem constituído informações sobre ambiente, o artigo 6.o do Regulamento n.o 1367/2006 não continha nenhuma disposição que permitisse excluir a aplicação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, diversamente das exceções previstas no artigo 4.o, n.o 2, primeiro e terceiro parágrafos, deste regulamento.

Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

29

Em 31 de outubro de 2012, a Saint‑Gobain interpôs recurso de anulação das decisões implícitas da Comissão de 4 e 25 de setembro de 2012. Na sequência da adoção, em 17 de janeiro de 2013, da decisão controvertida, a Saint‑Gobain solicitou autorização para adaptar o seu pedido. Ao deferir esse pedido, o Tribunal Geral considerou que o recurso passava a ter por objeto a anulação desta última decisão.

30

Através do acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou improcedentes os dois fundamentos invocados pela Saint‑Gobain.

Pedidos das partes

31

A Saint‑Gobain conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido e a decisão controvertida;

a título subsidiário, anular o acórdão recorrido e remeter o processo ao Tribunal Geral;

condenar a Comissão nas despesas.

32

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal de Justiça negue provimento ao presente recurso e condene a Saint‑Gobain nas despesas.

Quanto ao presente recurso

33

A Saint‑Gobain invoca, em substância, dois fundamentos de recurso. O primeiro fundamento, dividido em duas partes, respeita a uma interpretação errada do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, conjugado com o artigo 6.o, n.o 1, segundo período, do Regulamento n.o 1367/2006, na medida em que o Tribunal Geral, por um lado, procedeu a uma interpretação extensiva destas disposições e, por outro, não reconheceu a existência, no caso vertente, de um interesse público que justificasse a divulgação das informações sobre ambiente solicitadas. O segundo fundamento respeita a uma aplicação errada do artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento n.o 1049/2001.

Argumentos das partes

34

Com o primeiro fundamento, a Saint‑Gobain alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao ignorar as exigências decorrentes do Regulamento n.o 1367/2006, em particular do seu artigo 6.o, n.o 1, segundo período, quanto à necessidade de interpretar de forma «restritiva» as exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 — nomeadamente, as previstas no n.o 3, primeiro parágrafo, que visam proteger o processo decisório das instituições —, a fim de recusar o acesso a informações sobre ambiente.

35

Após sublinhar que o Tribunal Geral constatou que as informações às quais foi pedido acesso são «informações sobre ambiente» na aceção do artigo 2.o, n.o 1, alínea d), do Regulamento n.o 1367/2006, a Saint‑Gobain refere que, na presença de informações dessa natureza, as instituições da União estão obrigadas a respeitar as disposições deste regulamento, que se destina a aplicar‑lhes a Convenção de Aarhus, a qual faz parte integrante da ordem jurídica da União e que o Tribunal Geral deveria ter tido em conta.

36

Ora, esta Convenção não contém nenhuma disposição de caráter geral comparável à do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1049/2001, que prevê que o acesso às informações sobre ambiente será recusado no caso de a sua divulgação prejudicar gravemente o processo decisório das autoridades públicas em causa. Pelo contrário, segundo o artigo 4.o, n.o 4, alínea a), da referida Convenção, numa situação como a do caso vertente, um pedido de acesso a informações sobre ambiente só pode ser indeferido se a divulgação dessas informações afetar negativamente a confidencialidade dos «procedimentos das autoridades públicas», nos casos em que tal confidencialidade esteja prevista no direito interno.

37

Este motivo de recusa é, além disso, idêntico ao previsto no artigo 4.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2003/4, a qual tem por objetivo aplicar a Convenção de Aarhus nas ordens jurídicas dos Estados‑Membros.

38

Assim, tanto na aceção do Regulamento n.o 1049/2001 como daquela diretiva e tal como decorre da jurisprudência alemã, o motivo de recusa em causa deve ser entendido no sentido de que visa apenas procedimentos internos respeitantes à tomada de decisão e não os elementos anteriores a esses procedimentos, como as informações em que estes se baseiam.

39

Em contrapartida, o Tribunal Geral procedeu a uma interpretação extensiva da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, do referido regulamento. Com efeito, considerou que a recusa de acesso às informações solicitadas se justificava neste caso a fim de evitar as influências externas suscetíveis de perturbar o desenrolar normal do processo decisório em curso, em particular provocando atrasos significativos na verificação das informações transmitidas à Comissão no âmbito do processo em causa e originando fricções com os Estados‑Membros que comunicaram as referidas informações, suscetíveis de prejudicar o diálogo entre eles e a Comissão.

40

Ora, na opinião da Saint‑Gobain, a mera possibilidade de a divulgação de informações sobre ambiente, como as que estão em causa, suscitar críticas não pode justificar o seu caráter confidencial, uma vez que tais críticas por parte do público, resultantes da transparência dos procedimentos administrativos, são a consequência desejada da regulamentação em questão. Com efeito, essas críticas servem precisamente os objetivos prosseguidos pela referida regulamentação, entre os quais, nomeadamente, tomar melhores decisões em matéria ambiental com base em informações submetidas ao escrutínio do público. Além disso, a Saint‑Gobain precisa que nem o Regulamento n.o 1367/2006 nem a Diretiva 2003/4 preveem motivos de recusa de acesso relativos à proteção das relações entre a Comissão e os Estados‑Membros.

41

Por último, a Saint‑Gobain sustenta que, nos n.os 80 a 82 e 87 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral se baseou várias vezes em jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao Regulamento n.o 1049/2001 que não trata do acesso a informações sobre ambiente no âmbito de um procedimento administrativo em curso da Comissão.

42

A Comissão riposta invocando liminarmente a inadmissibilidade do primeiro fundamento de recurso. Com efeito, segundo ela, antes de mais, se interpretado no sentido de que se destina a pôr em causa a legalidade do Regulamento n.o 1367/2006 à luz das disposições da Convenção de Aarhus, esse fundamento modifica o objeto do litígio submetido ao Tribunal Geral. Seguidamente, na medida em que pode ser entendido no sentido de que se destina a criticar o Tribunal Geral por ter ignorado a exigência de a exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 ser interpretada à luz do conceito de «procedimentos das autoridades públicas» que figura no artigo 4.o, n.o 4, alínea a), da Convenção de Aarhus, esse primeiro fundamento assenta numa argumentação que não foi apresentada nem debatida perante o Tribunal Geral. Por fim, o referido fundamento não identifica com precisão os pontos impugnados da motivação do acórdão recorrido.

43

Em qualquer caso, segundo a Comissão, o primeiro fundamento de recurso não procede. Com efeito, em primeiro lugar, nem o enunciado do artigo 4.o, n.o 4, alínea a), da Convenção de Aarhus nem o do artigo 4.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2003/4 se referem aos «procedimentos internos das autoridades públicas», mas apenas aos «procedimentos». Ora, tendo em conta que todos os Estados‑Membros são partes na Convenção de Aarhus, tal como a União, há razões para pensar que através da Diretiva 2003/4 o legislador da União não pretendeu impor aos Estados‑Membros obrigações materiais diferentes das impostas aos órgãos da União pelos Regulamentos n.o 1049/2001 e n.o 1367/2006.

44

Em segundo lugar, uma interpretação do conceito de «procedimentos» de acordo com a qual este só abrange as operações internas de uma autoridade pública é apenas uma das interpretações possíveis deste conceito em conformidade com as indicações do «Guia de aplicação da Convenção de Aarhus», que o Tribunal de Justiça podia tomar em consideração para efeitos de interpretar o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001.

45

Em terceiro lugar, o critério seguido pelo artigo 4.o, n.o 4, alínea a), da Convenção de Aarhus assim como pelo artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do referido regulamento não é o conteúdo do documento, mas as «incidências negativas» da divulgação desse conteúdo. Consequentemente, mesmo que um documento não reproduza os procedimentos internos de uma autoridade pública, mas apenas os elementos que serviram de fundamento à adoção da sua decisão, o acesso a esse documento pode ser recusado em aplicação desta última disposição.

Apreciação do Tribunal de Justiça

Quanto à admissibilidade

46

A Comissão começa por contestar a admissibilidade do primeiro fundamento no caso de este ser entendido no sentido de que visa pôr em causa a validade do Regulamento n.o 1367/2006 à luz das disposições da Convenção de Aarhus.

47

Todavia, uma vez que a Saint‑Gobain afirmou expressamente, na réplica, que, com esse fundamento, não pretendia de modo algum pôr em causa a validade do referido regulamento e dado que a Comissão registou essa afirmação na tréplica, não há que decidir sobre este argumento da Comissão.

48

Seguidamente, a Comissão sustenta, em substância, que o primeiro fundamento de recurso é inadmissível porque assenta numa argumentação que não foi nem invocada nem debatida perante o Tribunal Geral.

49

A este respeito, cabe recordar que, nos termos do artigo 170.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, o recurso de uma decisão do Tribunal Geral não pode modificar o objeto do litígio perante o Tribunal Geral.

50

Assim, de acordo com jurisprudência constante, a competência do Tribunal de Justiça em sede de recurso de segunda instância está limitada à apreciação da solução jurídica que foi dada aos fundamentos debatidos em primeira instância. Uma parte não pode, assim, invocar pela primeira vez no Tribunal de Justiça um fundamento que não invocou no Tribunal Geral, uma vez que isso equivaleria a permitir‑lhe submeter ao Tribunal de Justiça, cuja competência para julgar recursos do Tribunal Geral é limitada, um litígio com um objeto mais lato do que o submetido ao Tribunal Geral (despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 7 de julho de 2016, Fapricela/Comissão, C‑510/15 P, não publicado, EU:C:2016:547, n.o 20 e jurisprudência aí referida).

51

Contudo, um argumento não invocado em primeira instância não pode ser considerado um fundamento novo, inadmissível em segunda instância, se apenas constituir a ampliação de uma argumentação já desenvolvida no âmbito de um fundamento apresentado na petição inicial no Tribunal Geral (acórdão de 10 de abril de 2014, Areva e o./Comissão, C‑247/11 P e C‑253/11 P, EU:C:2014:257, n.o 114 e jurisprudência aí referida).

52

No caso vertente, como salientou o advogado‑geral no n.o 31 das suas conclusões, a Saint‑Gobain invocou perante o Tribunal Geral uma violação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, conjugado com o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1367/2006, tendo sustentado que os motivos de recusa de acesso devem ser interpretados de forma restritiva. Para este feito, a Saint‑Gobain referiu expressamente a finalidade deste último regulamento, a saber, aplicar a Convenção de Aarhus.

53

Ora, com a primeira parte do primeiro fundamento de recurso, a Saint‑Gobain critica o Tribunal Geral por ter cometido um erro de direito ao decidir que a exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 se aplica tanto aos documentos elaborados no âmbito do processo decisório como aos documentos diretamente relacionados com as questões tratadas nesse processo. A Saint‑Gobain sustenta que esta interpretação é contrária ao artigo 6.o, n.o 1, segundo período, do Regulamento n.o 1367/2006, lido à luz da Convenção de Aarhus, que este regulamento se destina a aplicar, nomeadamente do artigo 4.o, n.o 4, alínea a), desta Convenção.

54

É verdade que, na sua petição inicial em primeira instância, a Saint‑Gobain não mencionou expressamente o artigo 4.o, n.o 4, alínea a), da Convenção de Aarhus. Todavia, sustentou que a interpretação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 adotada pela Comissão não era conforme com o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1367/2006.

55

Assim, visto que a primeira parte do primeiro fundamento de recurso diz respeito a uma violação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, a argumentação da Saint‑Gobain não é mais do que a ampliação de uma argumentação já desenvolvida no âmbito de um fundamento apresentado na petição inicial em primeira instância e não pode, portanto, ser considerada inadmissível.

56

Por último, a Comissão alega que o presente recurso não identifica com precisão os pontos impugnados do acórdão recorrido.

57

A este respeito, importa recordar que, de acordo com o artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, os fundamentos e argumentos jurídicos invocados devem identificar com precisão os pontos da fundamentação da decisão do Tribunal Geral que são contestados. É inadmissível um recurso de uma decisão do Tribunal Geral que não identifique os pontos criticados do acórdão recorrido e o erro de direito que o Tribunal Geral cometeu (v., neste sentido, acórdão de 22 de setembro de 2016, NIOC e o./Conselho, C‑595/15 P, não publicado, EU:C:2016:721, n.os 95 e 96).

58

Ora, no caso vertente, com a primeira parte do primeiro fundamento, a Saint‑Gobain visa expressamente os n.os 80 a 82 e 87 do acórdão recorrido. Além disso, na medida em que critica o Tribunal Geral por não ter tido em conta a Convenção de Aarhus na sua interpretação do artigo 6.o do Regulamento n.o 1367/2006, era‑lhe manifestamente impossível identificar os pontos precisos desse acórdão. Por conseguinte, o presente recurso responde às exigências do artigo 169.o, n.o 2, do Regulamento de Processo.

59

Atendendo às considerações anteriores, a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão deve ser julgada improcedente.

Quanto ao mérito

60

A título preliminar, cabe lembrar que, em conformidade com o seu considerando 1, o Regulamento n.o 1049/2001 se inscreve na vontade expressa no artigo 1.o, segundo parágrafo, do Tratado UE, introduzido pelo Tratado de Amesterdão, de assinalar uma nova etapa no processo de criação de uma união cada vez mais estreita entre os povos da Europa, em que as decisões sejam tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais próximo possível dos cidadãos. Como recorda o considerando 2 do referido regulamento, o direito de acesso do público aos documentos das instituições está associado ao caráter democrático destas últimas (acórdão de 1 de julho de 2008, Suécia e Turco/Conselho, C‑39/05 P e C‑52/05 P, EU:C:2008:374, n.o 34).

61

Para este efeito, o mesmo regulamento tem por objetivo, como é indicado no seu considerando 4 e no seu artigo 1.o, conferir ao público um direito de acesso o mais amplo possível aos documentos das instituições (acórdão de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.o 40 e jurisprudência aí referida).

62

É verdade que este direito de acesso está sujeito a determinados limites baseados em razões de interesse público ou privado. Em particular, em conformidade com o seu considerando 11, o Regulamento n.o 1049/2001 prevê, no seu artigo 4.o, um regime de exceções que autoriza as instituições a recusar o acesso a um documento no caso de a sua divulgação poder prejudicar um dos interesses protegidos por este artigo (acórdão de 21 de setembro de 2010, Suécia e o./API e Comissão, C‑514/07 P, C‑528/07 P e C‑532/07 P, EU:C:2010:541, n.os 70 e 71 e jurisprudência aí referida).

63

Não obstante, uma vez que estas exceções derrogam o princípio do acesso o mais amplo possível do público aos documentos, devem ser interpretadas e aplicadas de forma restritiva (acórdãos de 18 de dezembro de 2007, Suécia/Comissão, C‑64/05, EU:C:2007:802, n.o 66, e de 21 de julho de 2011, Suécia/My Travel e Comissão, C‑506/08 P, EU:C:2011:496, n.o 75).

64

Quanto às informações sobre ambiente na posse das instituições e dos órgãos da União, nos termos do seu artigo 1.o, o Regulamento n.o 1367/2006 prossegue o objetivo de garantir a sua disponibilização e difusão sistemáticas tão amplas quanto possível (v., neste sentido, acórdão de 23 de novembro de 2016, Comissão/Stichting Greenpeace Nederland e PAN Europe, C‑673/13 P, EU:C:2016:889, n.o 52).

65

Embora, nos termos do artigo 3.o do Regulamento n.o 1367/2006, o Regulamento n.o 1049/2001, designadamente o seu artigo 4.o, se aplique em princípio a todos os pedidos de acesso a informações sobre ambiente detidas por instituições da União, o artigo 6.o do Regulamento n.o 1367/2006 acrescenta regras mais específicas relativas a esses pedidos, que em parte favorecem e em parte restringem o acesso aos documentos (acórdão de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.o 53).

66

Em particular, decorre do artigo 6.o, n.o 1, segundo período, do Regulamento n.o 1367/2006 que, no que se refere à exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, o motivo de recusa de acesso deve ser interpretado de forma restritiva, atendendo ao interesse público servido pela divulgação e à questão de saber se as informações solicitadas estão relacionadas com emissões para o ambiente (v., neste sentido, acórdão de 14 de novembro de 2013, LPN e Finlândia/Comissão, C‑514/11 P e C‑605/11 P, EU:C:2013:738, n.o 83).

67

É à luz destas disposições e destes princípios que deve ser examinada a primeira parte do primeiro fundamento de recurso.

68

Nos n.os 79 a 82 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou, em primeiro lugar, que o processo decisório em causa no caso vertente era um procedimento administrativo destinado a atribuir de forma harmonizada licenças de emissão a título gratuito e que, à data de adoção da decisão controvertida, esse procedimento ainda não tinha terminado.

69

Em segundo lugar, o Tribunal Geral salientou que o referido procedimento administrativo «merecia uma proteção reforçada». Com efeito, existe um risco acrescido de que o acesso a documentos internos que fazem parte do procedimento em causa tenha repercussões negativas no processo decisório. Essas informações poderiam ser utilizadas pelos interessados para tentar exercer uma influência intencional, o que poderia afetar, em especial, a qualidade da decisão definitiva.

70

Em terceiro lugar, sublinhou que os procedimentos administrativos estão sujeitos a prazos rigorosos cujo respeito seria ameaçado se a Comissão tivesse de examinar e responder, ao longo do procedimento, a reações aos debates realizados no seu seio.

71

Em quarto lugar, considerou que a atividade administrativa da Comissão não exige um acesso aos documentos tão alargado como o acesso à atividade legislativa de uma instituição da União, que deve ser mais amplo em aplicação do considerando 6 do Regulamento n.o 1049/2001.

72

Seguidamente, nos n.os 86 a 90 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou improcedente o argumento da Saint‑Gobain segundo o qual as informações solicitadas não dizem respeito à verificação pela Comissão da informação transmitida pelos Estados‑Membros em conformidade com o artigo 15.o, n.o 1, da Decisão 2011/278, mas sim ao quadro transmitido pelas autoridades alemãs à Comissão, e, portanto, não se pode considerar que respeitam ao processo decisório em si mesmo.

73

Para chegar a essa conclusão, o Tribunal Geral entendeu que, com a utilização da expressão «relacionados com uma matéria», o legislador não quis limitar o alcance das informações abrangidas pela exceção do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 apenas aos documentos elaborados no âmbito do processo decisório em causa e que a utilização desta expressão permite igualmente aplicar esta disposição aos documentos diretamente relacionados com as matérias tratadas nesse processo.

74

Assim, segundo o Tribunal Geral, visto que se trata de informações diretamente relacionadas com a matéria examinada no âmbito do processo decisório em curso no momento em que a decisão controvertida foi adotada, as informações a que a Saint‑Gobain pediu acesso estavam «relacionad[a]s com uma matéria sobre a qual a instituição não [tinha] decidido».

75

Cabe referir que, ao confundir os conceitos de processo decisório e de procedimento administrativo, a interpretação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 efetuada pelo Tribunal Geral leva a estender o âmbito de aplicação da exceção ao direito de acesso previsto por esta disposição a ponto de permitir que uma instituição da União possa recusar o acesso a todos os documentos na sua posse, incluindo os que contenham informações sobre ambiente, na medida em que esses documentos estejam diretamente relacionados com as matérias tratadas no âmbito de um procedimento administrativo pendente nessa instituição.

76

Ora, o conceito de «processo decisório» visado por esta disposição deve ser entendido no sentido de que diz respeito à tomada de decisão, sem cobrir todo o procedimento administrativo que conduziu a ela.

77

Esta interpretação decorre, desde logo, do próprio enunciado da referida disposição, que se refere aos documentos «relacionados com uma matéria sobre a qual a instituição [da União] não tenha decidido».

78

Seguidamente, esta interpretação responde à exigência de interpretar de forma restritiva o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, exigência que ainda é mais forte quando os documentos cuja comunicação é solicitada contêm informações sobre ambiente.

79

Por fim, estando em causa documentos dessa natureza, a referida interpretação impõe‑se igualmente à luz da finalidade do Regulamento n.o 1367/2006, que, de acordo com o seu título, é aplicar às instituições e aos órgãos da União as disposições da Convenção de Aarhus.

80

É verdade que o artigo 6.o desse regulamento se limita a indicar que a exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 deve ser interpretada de forma restritiva, sem precisar o conceito de «processo decisório» na aceção desta disposição.

81

Todavia, como sublinhou o advogado‑geral no n.o 76 das suas conclusões, a Convenção de Aarhus apenas dispõe no seu artigo 4.o, n.o 4, alínea a), que um pedido de informações sobre ambiente pode ser recusado se a divulgação dessas informações afetar negativamente a confidencialidade do processo deliberativo das autoridades públicas, nos casos em que tal confidencialidade esteja prevista no direito interno, e não a confidencialidade de todo o procedimento administrativo no termo do qual essas autoridades deliberam.

82

Neste contexto, deve considerar‑se, desde logo, que a circunstância recordada pelo Tribunal Geral no n.o 79 do acórdão recorrido, segundo a qual o procedimento administrativo em causa ainda não tinha terminado à data da adoção da decisão controvertida, não permite, por si só, demonstrar que a divulgação dos documentos solicitados teria afetado negativamente o processo decisório da Comissão.

83

Seguidamente, ao invés da afirmação contida no n.o 80 do acórdão recorrido, segundo a qual o procedimento administrativo em causa merece proteção reforçada, é, na realidade, a obrigação de interpretar de forma restritiva a exceção prevista no artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001 que deve prevalecer, como o próprio Tribunal Geral sublinhou, acertadamente, no n.o 63 do acórdão recorrido. Assim, a simples referência a um risco de repercussões negativas associado ao acesso a documentos internos e à possibilidade de os interessados influenciarem o processo decisório não pode ser suficiente para provar que a divulgação dos referidos documentos afetaria negativamente o processo decisório da instituição em causa.

84

Além disso, embora, segundo o considerando 2 do Regulamento n.o 1367/2006, seja necessário fornecer ao público oportunidades efetivas de participar no processo decisório em matéria de ambiente, de modo a reforçar a responsabilidade e a transparência no âmbito da tomada de decisão, o referido regulamento não exige, de modo algum, contrariamente ao que o Tribunal Geral considerou no n.o 81 do acórdão recorrido, que a Comissão examine ou responda às reações do público à divulgação de documentos que contêm informações sobre ambiente, relativos a um procedimento administrativo em curso, e que revelem os debates realizados no seio da Comissão. Nestas condições, não se pode considerar que essa divulgação põe em risco a observância dos prazos dos procedimentos administrativos levados a cabo pela Comissão.

85

Por último, cabe recordar que, embora a atividade administrativa da Comissão não exija um acesso aos documentos tão alargado como o acesso à atividade legislativa de uma instituição da União, isso não significa de modo algum que escape ao âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1049/2001, aplicando‑se este, em conformidade com o seu artigo 2.o, n.o 3, a todos os documentos detidos pelas instituições, isto é, elaborados ou recebidos por ela e na sua posse, em todos os domínios de atividade da União (v., neste sentido, acórdão de 21 de julho de 2011, Suécia/My Travel e Comissão, C‑506/08 P, EU:C:2011:496, n.os 87 e 88 e jurisprudência aí referida).

86

Tendo em conta as considerações anteriores, deve concluir‑se que, ao não ter interpretado de forma restritiva o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do referido regulamento, como exige o artigo 6.o, n.o 1, segundo período, do Regulamento n.o 1367/2006, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito.

87

Consequentemente, visto que a primeira parte do primeiro fundamento de recurso é procedente, há que anular o acórdão recorrido, sem ser necessário examinar a sua segunda parte e o segundo fundamento.

Quanto às consequências da anulação do acórdão recorrido

88

Nos termos do artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, este pode, em caso de anulação da decisão do Tribunal Geral, remeter o processo ao Tribunal Geral para julgamento ou decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado.

89

No presente caso, o Tribunal de Justiça pode decidir definitivamente o litígio, que está em condições de ser julgado.

90

Na sua petição de anulação, a Saint‑Gobain aduziu dois fundamentos, sendo o primeiro relativo à violação do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, conjugado com o artigo 2.o, n.o 1, alínea d), iii), e o artigo 6.o, n.o 1, segundo período, do Regulamento n.o 1367/2006.

91

Como foi recordado nos n.os 25 a 28 do presente acórdão, a Comissão entendeu, na decisão controvertida, que uma comunicação integral das informações em causa permitiria ao público e, em especial, às empresas em causa levantar questões ou formular críticas acerca das informações transmitidas pelos Estados‑Membros, o que poderia interferir no processo decisório tanto na Comissão como nos Estados‑Membros. Essas interferências, por seu turno, comportavam o risco de atrasar significativamente o referido processo de decisão e afetar o diálogo entre a Comissão e os Estados‑Membros. A Comissão também considerou pertinente a circunstância de que ainda não tinha adotado uma decisão relativa a essas informações e que a adoção dessa decisão era aguardada nos prazos fixados. Esta instituição acrescentou que, no caso vertente, é essencial garantir que a decisão em causa possa ser tomada sem interferências exteriores e que o clima de confiança entre ela e as autoridades alemãs seja preservado.

92

Ora, tendo em conta os argumentos que figuram nos n.os 75 a 81 do presente acórdão, essas considerações não são suscetíveis de provar que a divulgação das informações sobre ambiente teriam afetado negativamente o processo decisório da Comissão, na aceção do artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1049/2001, lido à luz do artigo 6.o, n.o 1, segundo período, do Regulamento n.o 1367/2006.

93

Consequentemente, há que julgar procedente o primeiro fundamento do recurso de anulação e anular a decisão controvertida, sem que seja necessário examinar o segundo fundamento de recurso.

Quanto às despesas

94

Nos termos do disposto no artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, desse regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

95

Improcedendo os fundamentos da Comissão e tendo a Saint‑Gobain pedido a sua condenação nas despesas, há que condená‑la nas despesas efetuadas pela Saint‑Gobain em primeira instância e no presente recurso.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) decide:

 

1)

O acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 11 de dezembro de 2014, Saint‑Gobain Glass Deutschland/Comissão (T‑476/12, não publicado, EU:T:2014:1059), é anulado.

 

2)

A decisão da Comissão de 17 de janeiro de 2013 que recusa o acesso integral à lista transmitida pela República Federal da Alemanha à Comissão, no âmbito do processo previsto no artigo 15.o, n.o 1, da Decisão 2011/278/UE da Comissão, de 27 de abril de 2011, sobre a determinação das regras transitórias da União relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos do artigo 10.o‑A da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, na medida em que esse documento contém informações sobre determinadas instalações da Saint‑Gobain Glass Deutschland GmbH situadas em território alemão, relativas às atribuições provisórias bem como às atividades e aos níveis de capacidade em termos de emissões de dióxido de carbono (CO2) durante o período de 2005 a 2010, à eficácia das instalações e às licenças de emissão anuais atribuídas provisoriamente para o período compreendido entre 2013 e 2020, é anulada.

 

3)

A Comissão Europeia é condenada nas despesas efetuadas pela Saint‑Gobain Glass Deutschland GmbH em primeira instância e no presente recurso.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.