CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NILS WAHL

apresentadas em 21 de abril de 2016 ( 1 )

Processos apensos C‑8/15 P a C‑10/15 P

Ledra Advertising Ltd (C‑8/15 P)

Andreas Eleftheriou e o. (C‑9/15 P)

e

Christos Theophilou e

Eleni Theophilou (C‑10/15 P)

contra

Comissão Europeia

Banco Central Europeu

«Recursos de decisões do Tribunal Geral — Mecanismo Europeu de Estabilidade — Programa de apoio à estabilidade de Chipre — Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica, celebrado entre a República de Chipre e o Banco Central Europeu (BCE), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Comissão Europeia — Recurso de anulação com pedido de indemnização — Obrigações da Comissão»

1. 

A principal questão jurídica suscitada nestes recursos prende‑se com o papel da Comissão Europeia e, em certa medida, do Banco Central Europeu (BCE), na negociação e na assinatura do Memorando de Entendimento celebrado entre a República de Chipre e o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) durante a crise financeira dos anos de 2012‑2013 (a seguir «Memorando de Entendimento»). O exame desta matéria também suscita questões sobre as obrigações jurídicas da Comissão no âmbito das suas atividades ao abrigo do Tratado MEE ( 2 ), especialmente à luz do acórdão Pringle, proferido pelo Tribunal de Justiça (Tribunal Pleno) em 27 de novembro de 2012 (a seguir «acórdão Pringle») ( 3 ) .

2. 

Estes recursos têm por objeto três pedidos de indemnização deduzidos contra a Comissão e o BCE por depositantes de dois grandes bancos cipriotas: o Banco de Chipre (a seguir «BoC») e o Cyprus Popular Bank (a seguir «CPB»). Os depositantes alegam que, na sequência do pedido de assistência financeira apresentado pela República de Chipre ao MEE e da reestruturação dos bancos em questão, sofreram prejuízos num montante compreendido entre 480000 euros e 1600000 euros. Os recorrentes pedem ainda a anulação parcial do Memorando de Entendimento com fundamento na alegada violação do seu direito de propriedade.

I – Quadro jurídico

A – Tratado MEE

3.

O considerando 1 do Tratado MEE tem a seguinte redação:

«Em 17 de dezembro de 2010, o Conselho Europeu chegou a acordo sobre a necessidade de os Estados‑Membros da área do euro criarem um mecanismo permanente de estabilidade. O [MEE] assumirá as atribuições atualmente cometidas ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (‘FEEF’) e ao Mecanismo Europeu de Estabilização Financeira (‘MEEF’) para a prestação, quando necessário, de assistência financeira aos Estados‑Membros da área do euro.»

4.

O artigo 3.o do Tratado MEE dispõe:

«O MEE tem como missão reunir fundos e prestar apoio de estabilidade, sob rigorosa condicionalidade, adequada ao instrumento financeiro escolhido, em benefício de membros do MEE que estejam a ser afetados ou ameaçados por graves problemas de financiamento, se tal for indispensável para salvaguardar a estabilidade financeira da área do euro no seu todo e dos seus Estados‑Membros. Para o efeito, o MEE fica autorizado a reunir fundos através da emissão de instrumentos financeiros ou da celebração de acordos ou convénios financeiros ou de outra natureza com os membros do MEE, instituições financeiras ou terceiros.»

5.

O artigo 4.o, n.o 1, do Tratado MEE estabelece:

«O MEE é constituído por um Conselho de Governadores e um Conselho de Administração, bem como por um Diretor Executivo e pelo restante pessoal próprio que for necessário.»

6.

O artigo 5.o, n.o 3, do Tratado MEE dispõe:

«O membro da Comissão Europeia responsável pelos assuntos económicos e monetários e o Presidente do BCE, bem como o Presidente do Eurogrupo se não for Presidente do Conselho de Governadores ou um dos governadores, podem participar nas reuniões do Conselho de Governadores [do MEE] na qualidade de observadores».

7.

Nos termos do artigo 6.o, n.o 2, do Tratado MEE:

«O membro da Comissão Europeia responsável pelos assuntos económicos e monetários e o Presidente do BCE podem cada um deles nomear um observador [para o Conselho de Administração do MEE]».

8.

O artigo 12.o, n.o 1, do Tratado MEE tem a seguinte redação:

«Caso seja indispensável para salvaguardar a estabilidade financeira da área do euro no seu todo e dos seus Estados‑Membros, o MEE pode prestar apoio de estabilidade a membros do MEE, sujeito a rigorosa condicionalidade, adequada ao instrumento de assistência financeira escolhido. Essa condicionalidade pode variar entre um programa de ajustamento macroeconómico e o cumprimento continuado de condições de elegibilidade preestabelecidas.»

9.

O artigo 13.o do Tratado MEE (com a epígrafe «Procedimento para a concessão de apoio de estabilidade») estabelece o seguinte:

«1.   Um membro do MEE dirige um pedido de apoio de estabilidade ao Presidente do Conselho de Governadores. Esse pedido deve indicar o instrumento ou os instrumentos de assistência financeira a considerar. Após receção do pedido, o Presidente do Conselho de Governadores incumbe a Comissão Europeia, em articulação com o BCE:

a)

Da avaliação da existência de um risco para a estabilidade financeira da área do euro no seu todo ou dos seus Estados‑Membros, salvo se o BCE já tiver apresentado uma análise nos termos do artigo 18.o, n.o 2;

b)

Da avaliação da sustentabilidade da dívida pública. Sempre que adequado e possível, essa avaliação deveria ser realizada em conjunto com o FMI;

c)

Da avaliação das necessidades reais ou potenciais de financiamento do membro do MEE em causa.

2.   Com base no pedido do membro do MEE e na avaliação referida no n.o 1, o Conselho de Governadores pode decidir, em princípio, conceder apoio de estabilidade ao membro do MEE em causa, sob forma de um instrumento de assistência financeira.

3.   Se for adotada uma decisão nos termos do n.o 2, o Conselho de Governadores deve incumbir a Comissão Europeia de — em articulação com o BCE e, sempre que possível, em conjunto com o FMI — negociar com o membro do MEE em causa um memorando de entendimento (‘Memorando de Entendimento’) que especifique a condicionalidade que acompanha o instrumento de assistência financeira. O conteúdo do Memorando de Entendimento deve refletir a gravidade dos problemas a abordar e o instrumento de assistência financeira escolhido. Paralelamente, o Diretor Executivo do MEE deve preparar uma proposta de acordo relativo ao instrumento de assistência financeira, incluindo os termos financeiros e as condições, assim como a escolha de instrumentos, a adotar pelo Conselho de Governadores.

O Memorando de Entendimento deve ser integralmente compatível com as medidas de coordenação de política económica previstas no TFUE, nomeadamente com qualquer ato de direito da União Europeia, incluindo eventuais pareceres, advertências, recomendações ou decisões dirigidas ao membro do MEE em causa.

4.   A Comissão Europeia assina o Memorando de Entendimento em nome do MEE, sob reserva do prévio cumprimento das condições fixadas no n.o 3 e aprovação pelo Conselho de Governadores.

5.   O Conselho de Administração aprova o acordo relativo ao instrumento de assistência financeira especificando os aspetos financeiros do apoio de estabilidade a conceder e, se for caso disso, a disponibilização da primeira parcela da assistência.

[…]

7.   A Comissão Europeia — em articulação com o BCE e, sempre que possível, em conjunto com o FMI — fica incumbida de monitorizar a observância da condicionalidade que acompanha o instrumento de assistência financeira.»

B – Memorando de Entendimento entre a República de Chipre e a Comissão

10.

Os pontos 1.23 a 1.27 do Memorando de Entendimento (com a epígrafe «Reestruturação e resolução do [CPB] e do [BoC]») têm a seguinte redação:

«1.23

O referido exame do valor financeiro e contabilístico revelou que os dois maiores bancos de Chipre estavam insolventes. A fim de corrigir esta situação, o Governo implementou um amplo plano de resolução e de reestruturação. Para evitar a acumulação de futuros desequilíbrios e restabelecer a viabilidade do setor, preservando a concorrência, foi adotada uma estratégia que abrange quatro vertentes que não implicam a utilização de dinheiro dos contribuintes.

1.24

Em primeiro lugar, foram cedidos todos os ativos (incluindo os empréstimos no domínio do transporte marítimo) e os passivos relacionados com a Grécia, estimados, no pior dos cenários, respetivamente, em 16,4 e 15 mil milhões de EUR. Os ativos e os passivos gregos foram adquiridos pelo Piraeus Bank, cuja reestruturação será assumida pelas autoridades helénicas. A cessão foi efetuada ao abrigo de um acordo assinado em 26 de março de 2013. Uma vez que o valor contabilístico dos ativos ascendia a 19,2 mil milhões de EUR, esta cessão permitiu reduzir substancialmente a exposição mútua entre a Grécia e Chipre.

1.25

No que respeita à sucursal do [CPB] no Reino Unido, todos os depósitos foram transferidos para a filial britânica do [BoC]. Os ativos associados foram integrados no [BoC].

1.26

Em segundo lugar, o [BoC] adquire — mediante um processo de compra e absorção — os ativos cipriotas do [CPB], pelo seu justo valor, bem como os seus depósitos garantidos e a sua exposição ao apoio de emergência à liquidez, pelo seu valor nominal. Os depósitos não garantidos do [CPB] são mantidos na anterior entidade. O objetivo é que o valor dos ativos cedidos seja superior ao dos passivos cedidos, de modo a que a diferença corresponda à recapitalização do [BoC] pelo [CPB], que deve ascender a 9% dos ativos ponderados em função dos riscos cedidos. O [BoC] foi objeto de uma recapitalização de maneira a poder atingir, no final do programa, um rácio mínimo de fundos próprios (core tier one ratio) de 9%, no pior dos cenários do teste de resistência, o que deve contribuir para restabelecer a confiança e normalizar as condições de financiamento. A conversão de 37,5% dos depósitos não garantidos detidos pelo [BoC] em ações da classe A, com plenos direitos de voto e a dividendos, cobre a maior parte das necessidades em capital, com uma entrada suplementar de capitais próprios da anterior entidade do [CPB]. Uma parte dos restantes depósitos não garantidos do [BoC] será temporariamente bloqueada.

1.27

Em terceiro lugar, a fim de assegurar que os objetivos da capitalização sejam atingidos, será levada a cabo no fim de junho de 2013 uma avaliação independente mais detalhada e atualizada dos ativos do [BoC] e do [CPB], em conformidade com as exigências do quadro para a resolução de atividades bancárias. Para o efeito, os termos de referência do exercício de avaliação independente serão acordados o mais tardar em meados de abril de 2013, uma vez consultados a [Comissão], o BCE e o FMI. Após esta avaliação, proceder‑se‑á, se necessário, a uma conversão adicional de depósitos não garantidos em ações de classe A, de modo a garantir que no final do programa se atinja um nível mínimo de capitais próprios de 9% em condições de crise. Se o [BoC] tiver de ser sobrecapitalizado tendo em vista este objetivo, proceder‑se‑á a uma compra de ações com o fim de reembolsar os depositantes do montante correspondente à sobrecapitalização.»

C – Direito cipriota

1. Lei de 22 de março de 2013

11.

Nos termos dos artigos 3.°, n.o 1, e 5.°, n.o 1, da O peri exiyiansis pistotikon kai allon idrimaton nomos (Lei sobre a resolução das instituições de crédito e de outras instituições), de 22 de março de 2013 (a seguir «Lei de 22 de março de 2013») ( 4 ), o Banco Central de Chipre (BCC) foi encarregado, juntamente com o Ministério das Finanças, da resolução das instituições visadas pela referida lei.

12.

Para tal, o artigo 12.o, n.o 1, da Lei de 22 de março de 2013 estabelece que o BCC pode, mediante decreto, reestruturar as dívidas e as obrigações de uma instituição sujeita a um procedimento de resolução, incluindo mediante redução, alteração, reescalonamento ou novação do capital nominal ou do saldo de qualquer tipo de créditos existentes ou futuros sobre essa instituição ou mediante a conversão de títulos de dívida em fundos próprios. Esse artigo prevê igualmente que os «depósitos garantidos», na aceção do artigo 2.o, quinto parágrafo, da Lei de 22 de março de 2013, estão excluídos dessas medidas. É pacífico entre as partes que, em geral, se trata de depósitos inferiores a 100000 euros.

2. Decretos n.os 103 e 104

13.

Em 29 de março de 2013, foram adotados os Decretos n.os 103 e 104 com base na Lei de 22 de março de 2013 ( 5 ).

14.

O to peri diasosis me idia mesa tis Trapezas Kyprou Dimosias Etaireias Ltd Diatagma tou 2013, Kanonistiki Dioikitiki Praxi No. 103 (Decreto de 2013 sobre o resgate interno do BoC, ato administrativo regulamentar n.o 103, a seguir «Decreto n.o 103») previa a recapitalização do BoC, nomeadamente a cargo dos seus depositantes não garantidos, dos seus acionistas e dos seus credores obrigacionistas, a fim de poder continuar a prestar serviços bancários. Assim, cada depósito não garantido foi convertido em três conjuntos de instrumentos: ações do BoC (37,5% de cada depósito não garantido), títulos convertíveis em ações ou em depósitos pelo BoC (22,5% de cada depósito não garantido) e títulos convertíveis em depósitos pelo BCC (40% de cada depósito não garantido) ( 6 ). Nos termos do seu artigo 10.o, o Decreto n.o 103 entrou em vigor em 29 de março de 2013, às 6 horas.

15.

O to Peri tis Polisis Orismenon Ergasion tis Cyprus Popular Bank Public Co Ltd Diatagma tou 2013, Kanonistiki Dioikitiki Praxi No. 104 (Decreto de 2013 sobre a venda de determinadas atividades do CPB, ato administrativo regulamentar n.o 104, a seguir «Decreto n.o 104») previa, nos termos dos seus artigos 2.° e 5.°, a transferência de certos elementos do ativo e do passivo do CPB para o BoC, incluindo os depósitos inferiores a 100000 euros. Os depósitos superiores a 100000 euros foram mantidos no CPB, aguardando a sua liquidação.

II – Antecedentes do litígio

16.

Durante os primeiros meses de 2012, alguns bancos estabelecidos em Chipre, entre os quais o CPB e o BoC, tiveram dificuldades financeiras. A República de Chipre considerou necessária a sua recapitalização e, para o efeito, apresentou ao presidente do Eurogrupo um pedido de assistência financeira por parte do FEEF ou do MEE.

17.

Por declaração de 27 de junho de 2012, o Eurogrupo indicou que a assistência financeira requerida seria prestada pelo FEEF ou pelo MEE, no âmbito de um programa de ajustamento macroeconómico que devia concretizar‑se num Memorando de Entendimento cuja negociação seria efetuada, por um lado, pela Comissão Europeia, em conjunto com o BCE e o FMI, e, por outro, pelas autoridades cipriotas.

18.

A República de Chipre e os outros Estados‑Membros cuja moeda é o euro chegaram a um acordo político sobre um projeto de Memorando de Entendimento em março de 2013. Por declaração de 16 de março de 2013, o Eurogrupo acolheu favoravelmente este Memorando de Entendimento e invocou certas medidas de ajustamento previstas, entre as quais a criação de um imposto sobre os depósitos bancários. O Eurogrupo referiu que, tendo em conta esse contexto, considerava, em princípio, justificada a concessão de uma assistência financeira suscetível de garantir a estabilidade financeira da República de Chipre e da área do euro e instou as partes interessadas a acelerarem as negociações em curso.

19.

Em 18 de março de 2013, a República de Chipre ordenou o encerramento dos bancos nos dias 19 e 20 de março de 2013. As autoridades cipriotas decidiram prolongar o encerramento dos bancos até 28 de março de 2013, a fim de evitar uma corrida aos balcões.

20.

Em 19 de março de 2013, o Parlamento cipriota rejeitou o projeto de lei do Governo cipriota relativo à criação de um imposto sobre todos os depósitos bancários em Chipre.

21.

Em 22 de março de 2013, o Parlamento cipriota adotou a Lei de 22 de março de 2013.

22.

Por declaração de 25 de março de 2013, o Eurogrupo comunicou que tinha chegado a um acordo com as autoridades cipriotas sobre os elementos essenciais de um futuro programa macroeconómico de ajustamento com o apoio de todos os Estados‑Membros cuja moeda é o euro, bem como da Comissão, do BCE e do FMI. Além disso, o Eurogrupo acolheu favoravelmente os planos de reestruturação do setor financeiro mencionados em anexo à referida declaração. No mesmo dia, o Governador do BCC deu início ao processo de resolução do BoC e do CPB. Os Decretos n.os 103 e 104 foram publicados em 29 de março de 2013.

23.

Na sua reunião de 24 de abril de 2013, o Conselho de Governadores do MEE tomou as seguintes decisões:

conceder um apoio à estabilidade da República de Chipre sob a forma de um instrumento de assistência financeira (a seguir «IAF»), em conformidade com a proposta do diretor‑geral do MEE;

aprovar o projeto de Memorando de Entendimento negociado pela Comissão (em colaboração com o BCE e o FMI) e a República de Chipre;

encarregar a Comissão de assinar esse memorando em nome do MEE.

24.

O Memorando de Entendimento foi assinado em 26 de abril de 2013 pelo Ministro das Finanças da República de Chipre, pelo Governador do BCC e, em nome da Comissão, pelo seu vice‑presidente, Olli Rehn.

25.

Por fim, em 8 de maio de 2013, o Conselho de Administração do MEE aprovou o memorando relativo ao IAF e uma proposta relativa às modalidades de pagamento de uma primeira fração de ajuda à República de Chipre. Esta fração foi dividida em dois pagamentos efetuados, respetivamente, em 13 de maio de 2013 (dois mil milhões de euros) e 26 de junho de 2013 (mil milhões de euros).

III – Tramitação do processo no Tribunal Geral e despachos recorridos

26.

Mediante três petições separadas apresentadas em 24 de maio de 2013 i) a Ledra Advertising Ltd (a seguir «Ledra») ii) Andreas Eleftheriou, Eleni Eleftheriou e Lilia Papachristofi (a seguir «Eleftheriou e o.»), e iii) Christos Theophilou e Eleni Theophilou (a seguir «Theophilou e o.») (a seguir, em conjunto, «recorrentes») interpuseram no Tribunal Geral recurso de anulação dos pontos 1.23 a 1.27 do Memorando de Entendimento, deduzindo ainda um pedido de indemnização pelos danos alegadamente sofridos em virtude da inclusão desses pontos no memorando.

27.

Mediante três despachos proferidos em 10 de novembro de 2014 nos processos T‑289/13, Ledra Advertising/Comissão e BCE ( 7 ) , T‑291/13, Eleftheriou e Papachristofi/Comissão e BCE ( 8 ), e T‑293/13, Theophilou/Comissão e BCE ( 9 ) (a seguir «despachos recorridos»), o Tribunal Geral negou provimento aos recursos por serem em parte inadmissíveis e em parte desprovidos de fundamento jurídico.

IV – Tramitação do processo no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

28.

Através dos recursos interpostos em 9 de janeiro de 2015, os recorrentes pedem essencialmente ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular os despachos recorridos no que respeita aos dois primeiros pedidos, ou seja, os pedidos de indemnização, e/ou anular as passagens controvertidas do Memorando de Entendimento;

remeter os processos ao Tribunal Geral;

reservar para final a decisão quanto às despesas.

29.

Nos três recursos, a Comissão e o BCE pedem que o Tribunal de Justiça se digne:

negar provimento aos recursos;

condenar os recorrentes nas despesas.

30.

Por decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 27 de julho de 2015, os processos C‑8/15 P a C‑10/15 P foram apensados para efeitos da fase oral e do acórdão.

31.

Os recorrentes, a Comissão e o BCE apresentaram observações orais na audiência que teve lugar em 2 de fevereiro de 2016.

V – Apreciação dos fundamentos de recurso

32.

Os recorrentes interpuseram recursos praticamente idênticos, invocando quatro fundamentos. Três desses fundamentos têm por objeto a decisão do Tribunal Geral de julgar improcedente o seu primeiro pedido: o pedido de indemnização. Um dos fundamentos de recurso diz respeito à parte dos despachos em que o Tribunal Geral rejeitou o segundo pedido: pedido de anulação dos pontos 1.23 a 1.27 do Memorando de Entendimento.

33.

Porém, antes de analisar sucessivamente cada um desses fundamentos, apreciarei a admissibilidade dos recursos.

A – Quanto à admissibilidade dos recursos

1. Argumentos das partes

34.

A Comissão e o BCE suscitam a exceção de inadmissibilidade dos recursos. A Comissão alega que os recursos não são suficientemente claros, precisos e compreensíveis para cumprirem os requisitos estabelecidos no Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça. Por seu turno, o BCE sustenta que os recursos se limitam a repetir ou reproduzir os argumentos anteriormente invocados perante o Tribunal Geral, sem aduzirem quaisquer argumentos jurídicos novos ou específicos contra o despacho recorrido.

2. Apreciação

35.

Segundo jurisprudência constante, resulta do artigo 256.o, n.o 1, segundo parágrafo, TFUE, do artigo 58.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 168.o, n.o 1, alínea d), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça que o recurso deve indicar de modo preciso os elementos contestados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos em que se apoia especificamente esse pedido. A este propósito, o artigo 169.o, n.o 2, do mesmo Regulamento de Processo especifica que os fundamentos e argumentos jurídicos invocados devem identificar com precisão os pontos da fundamentação da decisão do Tribunal Geral que são contestados ( 10 ). Além disso, os recursos devem apresentar uma estrutura coerente ( 11 ) e expor os fundamentos de recurso e os pedidos das partes com suficiente clareza e precisão ( 12 ).

36.

Estes requisitos não são, de modo algum, produto de um mero formalismo; pelo contrário, são cruciais para garantir princípios de importância fundamental, como a segurança jurídica, a boa administração da justiça e a proteção dos direitos de defesa das outras partes no processo ( 13 ). Esta afirmação afigura‑se ainda mais verdadeira se tivermos em conta que o Tribunal de Justiça é chamado a dirimir litígios nas 24 línguas oficiais da União Europeia e tem de lidar diariamente com órgãos jurisdicionais, autoridades públicas e advogados de diferentes sistemas jurídicos nacionais, cada um com as suas próprias regras, conceitos, tradições e culturas.

37.

Neste contexto, sou forçado a reconhecer que os argumentos aduzidos pela Comissão e pelo BCE quanto à admissibilidade dos presentes recursos não são totalmente desprovidos de mérito. Além da falta generalizada de cuidado e precisão na sua redação e apresentação, os recursos expõem a matéria de facto e de direito de forma algo confusa. Em virtude das deficiências ao nível da estrutura e da inexistência de títulos, de um índice ou de um sumário, o leitor é obrigado a um esforço acrescido para identificar a lógica subjacente às diversas passagens dos recursos,

38.

Tal dificulta a identificação inequívoca do número e do tipo de fundamentos de recurso invocados e dos argumentos aduzidos pelas partes. Esta constatação revela‑se particularmente verdadeira em relação a certos aspetos factuais e jurídicos fundamentais dos recursos: por exemplo, a identificação do comportamento que causou o alegado prejuízo financeiro.

39.

Em face do exposto, entendo que o Tribunal de Justiça deveria ponderar seriamente a possibilidade de os recursos não cumprirem, no todo ou em parte, os requisitos estabelecidos nas supramencionadas disposições do Regulamento de Processo e do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

40.

Se, não obstante a falta de diligência dos recorrentes, o Tribunal de Justiça entender que os recursos não podem ser julgados inadmissíveis na sua totalidade, considero que é necessário analisar quatro fundamentos de recurso. Contrariamente ao que alega o BCE, esses fundamentos não reproduzem simplesmente os argumentos aduzidos em primeira instância, incluindo igualmente uma série de críticas aos despachos recorridos.

41.

No meu entender, é inquestionável que as críticas adicionais aos despachos recorridos que constam dos recursos não foram expostas de forma suficientemente clara e estruturada para que sejam consideradas um fundamento de recurso genuíno e autónomo. Os recursos também contêm algumas afirmações em que os recorrentes criticam decisões do Tribunal Geral quanto à matéria de facto apurada ( 14 ). Porém, segundo jurisprudência constante, o apuramento dos factos não é, com exceção dos casos de desvirtuação dos elementos de prova produzidos perante o Tribunal Geral, uma questão de direito sujeita, enquanto tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça ( 15 ). Assim, ainda que se considerasse que as referidas afirmações constituíam um ou mais fundamentos de recurso adicionais, estes seriam, em qualquer caso, inadmissíveis.

B – Quanto ao primeiro fundamento de recurso

1. Argumentos das partes

42.

No seu primeiro fundamento de recurso, que tem por objeto os n.os 45 e 46 dos despachos recorridos, os recorrentes alegam que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao concluir que nem a Comissão nem o BCE tinham estado na origem da adoção do Memorando de Entendimento. Em especial, alegam que o Tribunal Geral não teve em conta o dever da Comissão — referido no n.o 164 do acórdão Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756) — de velar pela compatibilidade dos memorandos de entendimento celebrados pelo MEE com o direito da União.

43.

A Comissão alega que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao concluir que o Memorando de Entendimento é um ato de direito internacional público celebrado entre o MEE e a República de Chipre. O Tratado MEE atribuiu à Comissão poderes para assinar o Memorando de Entendimento em nome do MEE, mas essa instituição não é parte no acordo. Por conseguinte, as obrigações eventualmente decorrentes do acórdão Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756) para a Comissão não alteram a natureza jurídica do Memorando de Entendimento, que os recorrentes alegam ser a causa dos prejuízos por eles sofridos.

44.

O BCE considera que este fundamento é inadmissível e, de qualquer modo, improcedente. Alega que o Tribunal Geral estava correto ao considerar que a adoção do Memorando de Entendimento não podia ter tido origem na Comissão ou no BCE. Como tal, era plenamente justificada a decisão de julgar inadmissíveis os pedidos de indemnização nos despachos recorridos.

2. Apreciação

45.

Este fundamento de recurso suscita, no essencial, a questão de saber se, por força dos artigos 268.° e 340.° TFUE, a União está sujeita ao dever de indemnizar os danos causados, direta ou indiretamente, por um Memorando de Entendimento celebrado pelo MEE e um membro do MEE que pediu assistência financeira nos termos do artigo 13.o do Tratado MEE.

46.

Nesta matéria, recordo que, de acordo com essa disposição, o Memorando de Entendimento — que especifica a condicionalidade que acompanha o instrumento da assistência financeira a conceder pelo MEE — é negociado pela Comissão, em articulação com o BCE e, sempre que possível, em conjunto com o FMI. O Memorando de Entendimento é assinado pela Comissão em nome do MEE, estando sujeito à aprovação do Conselho de Governadores do MEE.

47.

Afigura‑se desde já importante salientar que, segundo jurisprudência constante, as ações de indemnização contra a União têm como objeto a reparação de um prejuízo decorrente de um ato ou de um comportamento ilícito imputável a uma instituição ( 16 ). Nos termos do artigo 340.o TFUE, qualquer ato praticado por uma instituição (ou pelos seus agentes) no exercício das suas funções pode, em princípio, gerar a responsabilidade da União.

48.

No processo perante o Tribunal Geral, os recorrentes desenvolveram duas linhas de argumentação em apoio da tese de que o comportamento causador dos alegados danos era imputável às instituições da União.

a) Primeira linha de argumentação

49.

Pelo que me foi dado a entender, a principal linha de argumentação aduzida pelos recorrentes em primeira instância consistia na alegação de que os danos supostamente sofridos tinham sido causados pela assinatura do Memorando de Entendimento, ato que consideravam imputável à Comissão e ao BCE.

50.

Nos n.os 40 a 47 dos despachos recorridos, o Tribunal Geral referiu que, segundo jurisprudência constante, só era competente para conhecer dos litígios relativos à reparação dos prejuízos causados pelas instituições da União ou pelos seus agentes no exercício das suas funções. Consequentemente, um pedido de indemnização apresentado contra a União e baseado na simples ilegalidade de um ato ou de um comportamento que não tivesse sido adotado por uma instituição da União ou pelos seus agentes devia ser considerado inadmissível. O Tribunal Geral acrescentou que, mesmo que o Tratado MEE confiasse à Comissão e ao BCE certas tarefas ligadas à execução dos objetivos desse tratado, resultava do acórdão Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756) que as funções confiadas à Comissão e ao BCE no âmbito do Tratado MEE não comportavam um poder de decisão próprio e, além disso, que as atividades exercidas por essas duas instituições no âmbito do mesmo tratado só vinculavam o MEE. Consequentemente, o Tribunal Geral concluiu que a Comissão e o BCE não tinham estado na origem da adoção do Memorando de Entendimento e que, como tal, não era competente para apreciar um pedido de indemnização baseado na ilegalidade de certas disposições do Memorando de Entendimento.

51.

No meu entender, a argumentação do Tribunal Geral é irrepreensível. É pacífico que, não obstante a sua forte ligação com os Tratados da União, o Tratado MEE é um acordo internacional que foi assinado fora do quadro jurídico da União. Tendo entrado em vigor após a conclusão dos procedimentos de ratificação nos Estados contratantes, esse tratado criou uma nova organização internacional com as suas próprias regras, missão, instituições e pessoal.

52.

Com a autorização de todos os Estados‑Membros da União ( 17 ), o Tratado MEE confiou certas atribuições a algumas instituições da União (Comissão, BCE, Conselho da União Europeia e Tribunal de Justiça). Com efeito, mesmo antes da assinatura do Tratado MEE, o Tribunal de Justiça tinha sustentado que, em certas condições, os Estados‑Membros podem confiar às instituições, fora do quadro da União, missões em domínios não abrangidos pela competência exclusiva da União ( 18 ).

53.

Não obstante, o facto de uma ou mais instituições da União poderem desempenhar determinadas funções no quadro jurídico do MEE não altera a natureza dos atos do MEE. Esses atos são alheios à ordem jurídica da União: são decididos pelas próprias instituições do MEE e vinculam apenas este ( 19 ). A União não é parte no Tratado MEE (nem o são todos os seus Estados‑Membros). Do artigo 216.o, n.o 2, TFUE resulta que, em regra, a União só está vinculada pelos acordos internacionais de que seja parte ( 20 ).

54.

Escusado será dizer que, neste contexto, não se pode considerar que, após a entrada em vigor do Tratado MEE, a União assumiu (e que, portanto, foram transferidas para ela) as competências anteriormente exercidas pelos Estados‑Membros no âmbito desse tratado ( 21 ). O Tratado MEE é um instrumento de política económica que, segundo o artigo 6.o TFUE, não é um domínio da competência exclusiva da União. Tão‑pouco o setor específico a que o Tratado MEE respeita se tornou um domínio de competência exclusiva por força de legislação aprovada pela União. Conforme observou o Tribunal de Justiça no acórdão Pringle, nada no Tratado FUE indica que só a União é competente para conceder ajuda financeira a um Estado‑Membro que esteja a ser afetado ou ameaçado por graves problemas de financiamento ( 22 ) .

55.

O facto de certos atos de direito da União fazerem referência a disposições do MEE (e vice‑versa) não justifica uma conclusão diferente. Decorre de jurisprudência constante que o facto de um ou vários atos jurídicos da União poderem ter por objeto ou por efeito a incorporação no direito da União de determinadas disposições constantes de um acordo internacional que a própria União não aprovou não basta para que esse acordo fique abrangido pelo âmbito de aplicação do direito da União ( 23 ).

56.

Além disso, recordo que, recentemente, o Tribunal de Justiça confirmou que não há lugar na ordem jurídica da União para atos híbridos, que não estejam previstos nos Tratados e que sejam adotados ao abrigo de processos que comportem indistintamente elementos abrangidos pelo processo decisório específico da União e elementos de natureza intergovernamental ( 24 ).

57.

Por último, importa salientar que as consequências financeiras desses atos deverão ser suportadas unicamente pelo orçamento do MEE ( 25 ). Em contrapartida, a aceitação dos argumentos avançados pelos recorrentes significaria — como refere o BCE — que o orçamento da União seria, em última análise, afetado por decisões tomadas no seio de uma organização internacional, na qual nem todos os Estados‑Membros da União são parte.

58.

Por conseguinte, o facto de acordos internacionais celebrados entre o MEE e um dos seus membros (neste caso, República de Chipre) serem negociados pela Comissão e pelo BCE, e assinados pela Comissão em nome do MEE, não altera a natureza jurídica desses acordos ( 26 ): são atos do MEE.

59.

Consequentemente, o Tribunal Geral estava correto ao afirmar que o Memorando de Entendimento não pode ser imputado à Comissão ou ao BCE.

b) Segunda linha de argumentação

60.

A análise da linha de argumentação apresentada a título subsidiário pelos recorrentes sobre este ponto não me permite chegar a uma conclusão diferente quanto à responsabilidade da União no presente caso.

61.

Os recorrentes entendem que os danos por eles alegadamente sofridos foram causados pelo incumprimento do dever que incumbia à Comissão de velar pela plena conformidade do Memorando de Entendimento com o direito da União. Nesse contexto, os recorrentes remetem para os n.os 164 e 174 do acórdão Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756), em que o Tribunal de Justiça afirmou: i) «[a]través do seu envolvimento no Tratado MEE, a Comissão promove o interesse geral da União. Por outro lado, as incumbências atribuídas à Comissão pelo Tratado MEE permitem‑lhe […] velar pela compatibilidade com o direito da União dos memorandos de entendimento celebrados pelo MEE»; e ii) «o memorando de entendimento que é negociado com o Estado‑Membro que pede um apoio de estabilidade deve ser integralmente compatível com o direito da União».

62.

Tendo dúvidas quanto à admissibilidade deste argumento, o Tribunal Geral abordou‑o apenas de forma sucinta, limitando‑se a observar que, em qualquer caso, os alegados danos ter‑se‑ão produzido antes da assinatura do Memorando de Entendimento, o que significa que não era possível estabelecer um nexo de causalidade entre o comportamento da Comissão e esses danos ( 27 ).

63.

Independentemente da questão da admissibilidade e do mérito do raciocínio do Tribunal Geral, entendo que a segunda de linha argumentação dos recorrentes também é pouco convincente.

64.

Para explicar porquê, analisarei sucessivamente duas questões. Em primeiro lugar, abordarei a premissa em que assenta essa argumentação: a sujeição da Comissão a uma obrigação jurídica de velar por que os atos adotados pelos organismos ou organizações em nome dos quais atua fora do quadro da União respeitem o direito da União, cuja violação pode gerar a responsabilidade financeira da União. Em segundo lugar, examinarei se, durante as negociações que culminaram na assinatura do Memorando de Entendimento, poderia ter existido uma violação do direito da União que a Comissão estivesse obrigada a evitar.

i) Quanto às obrigações da Comissão quando atua fora do quadro da União e responsabilidade conexa da União

65.

Antes de mais, importa referir que, à primeira vista, o n.o 164 do acórdão Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756) não menciona expressamente qualquer obrigação específica da Comissão. A redação desse excerto do acórdão parece sugerir que, ao intervir nas negociações de um memorando de entendimento, a Comissão pode assegurar a sua compatibilidade com o direito da União. Porém, creio que, para compreender o verdadeiro significado desse excerto, é necessário contextualizá‑lo.

66.

Nessa parte do acórdão Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756), que dizia respeito aos papéis assumidos pela Comissão e pelo BCE, o Tribunal de Justiça estava a examinar a compatibilidade com os Tratados da União das incumbências atribuídas pelo Tratado MEE a certas instituições da União. Uma das condições que, segundo a jurisprudência, deve estar preenchida para assegurar a compatibilidade é a de que essas incumbências adicionais «não desvirtuem as atribuições que os [Tratados da União] conferem a essas instituições» ( 28 ). No que respeita à Comissão, o Tribunal de Justiça recordou, no n.o 163 do acórdão, que, nos termos do artigo 17.o, n.o 1, TUE, essa instituição «promove o interesse geral da União» e «controla a aplicação do direito da União».

67.

Por conseguinte, a afirmação constante do n.o 164 do acórdão Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756) deve ser lida no contexto do artigo 17.o, n.o 1, TUE. Na sequência da sua análise do Tratado MEE, o Tribunal de Justiça concluiu que, aparentemente, nenhuma disposição desse tratado exigia que a Comissão desempenhasse funções suscetíveis de colidir com a sua missão constitucional de promover os interesses da União e de atuar como «guardiã dos Tratados». Pelo contrário, o papel da Comissão no Tratado MEE afigurava‑se perfeitamente compatível com essa missão.

68.

Quais são as implicações de tudo isto para o presente processo?

69.

Tal como os recorrentes, também considero que, mesmo quando atuam fora do quadro da União, as instituições da União têm de cumprir escrupulosamente o direito da União. Assim, mesmo quando atua em nome do MEE, a Comissão não está autorizada a violar deliberadamente as regras da União. Além disso, a Comissão não pode contribuir, através do seu comportamento, para uma infração às regras da União cometida por outras entidades ou organismos ( 29 ).

70.

No entanto, não concordo com os recorrentes quanto ao alcance dessa obrigação, na medida em que defendem que a Comissão está sujeita a uma obrigação de resultado, que se traduz em evitar qualquer possível conflito ou tensão entre as disposições de um ato adotado por outras entidades e qualquer regra da União suscetível de ser aplicada à situação. Na melhor das hipóteses, admitiria que a Comissão está sujeita à obrigação de empregar os seus melhores esforços para evitar tal conflito.

71.

A obrigação de resultado com o alcance defendido pelos recorrentes não resulta nem do texto do Tratado MEE nem (o que é mais importante) do próprio artigo 17.o, n.o 1, TUE.

72.

Quanto ao Tratado MEE, devo salientar que o seu artigo 13.o, n.o 3, dispõe que o Memorando de Entendimento deve ser «integralmente compatível com as medidas de coordenação de política económica previstas no TFUE» ( 30 ). Nem o Tratado MEE nem o Tribunal de Justiça — na sua interpretação desse tratado no acórdão Pringle ( 31 ) — mencionam a exigência de pleno cumprimento de todas as disposições de direito da União por parte do Memorando de Entendimento.

73.

Por um lado, o termo «cumprimento» não deve ser confundido com «compatibilidade». Com efeito, do ponto de vista jurídico, designam dois conceitos muito diferentes: o primeiro exige obediência e conformidade absoluta entre dois textos, ao passo que o segundo se satisfaz com a mera compatibilidade e não contradição entre eles.

74.

Por outro lado, apenas são mencionadas expressamente as medidas da União de coordenação da política económica. Há um motivo para isto: se as medidas da União de coordenação de política económica não forem compatíveis com o Memorando de Entendimento, existe o risco de comprometer a eficácia das primeiras e, consequentemente, de toda a ação da União nesse domínio. Considerou‑se que não seria necessário impor uma conformidade absoluta entre o Memorando de Entendimento e todos os aspetos do direito da União, uma vez que o sistema do MEE não faz parte da ordem jurídica da União.

75.

Seguidamente, no que respeita ao artigo 17.o, n.o 1, TUE, entendo que os deveres da Comissão quando atua fora do quadro dos Tratados da União não podem ser, em regra, diferentes ou mais exigentes do que quando atua dentro desse quadro. Passo a explicar.

76.

No seu papel de «guardiã dos Tratados», a Comissão não está obrigada a agir contra uma possível violação do direito da União de que venha a ter conhecimento, sob pena de infringir o disposto no artigo 17.o TUE. Conforme sublinhou o Tribunal Geral em diversas decisões anteriores, o artigo 17.o TUE visa fornecer uma definição geral dos poderes da Comissão: consequentemente, é uma disposição de natureza constitucional e não uma regra destinada a conferir direitos aos particulares, cujo cumprimento esteja sujeito a fiscalização jurisdicional ( 32 ). Não se pode alegar que, sempre que a Comissão viola uma disposição específica do Tratado, ou não impede que essa disposição seja violada por outra entidade, essa violação constitua uma infração da disposição geral do artigo 17.o TUE ( 33 ).

77.

Talvez um paralelo ajude a elucidar este ponto. Nos termos do regime estabelecido pelos artigos 258.° a 260.° TFUE (uma das principais formas de ação em que a Comissão exerce o seu papel de «guardiã dos Tratados»), a Comissão goza de poderes discricionários quando decide se deve ou não (e, em caso afirmativo, quando) instaurar um processo contra um Estado‑Membro com fundamento na suspeita de violação do direito da União. Possui a mesma margem de apreciação para decidir quais os atos ou omissões imputáveis aos Estados‑Membros contra os quais devem ser instaurados esses processos ( 34 ).

78.

Importa referir que, no âmbito desses processos, a Comissão atua exclusivamente no interesse geral da União ( 35 ), ainda que o resultado desses processos também sirva indiretamente os interesses de particulares ( 36 ). Com efeito, os artigos 258.° a 260.° TFUE não conferem expressamente qualquer direito aos particulares. Por conseguinte, estes não podem pôr em causa o comportamento da Comissão no contexto desses processos ( 37 ). Em especial, os particulares, em princípio, não têm legitimidade para instaurar contra a União uma ação de indemnização por danos que tenham sofrido devido a atos ou omissões da Comissão nos termos dos artigos 258.° a 260.° TFUE. O único comportamento que poderão pôr em causa como «fonte dos danos» é o comportamento do Estado‑Membro responsável pela violação das regras da União ( 38 ). No entanto, a Comissão responde pelo modo como desempenha esse papel perante o Parlamento Europeu, que poderá, se assim o entender, aprovar uma moção de censura ao abrigo do artigo 234.o TFUE, forçando a demissão coletiva dos membros da Comissão.

79.

No meu entender, estes princípios serão aplicáveis a fortiori quando a Comissão atua como «guardiã dos Tratados» fora do quadro jurídico da União.

80.

Assim sendo, concluo que, à luz do artigo 17.o, n.o 1, TUE, e tendo em conta o acórdão Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756), a Comissão não está sujeita a uma obrigação de resultado, que se traduza em evitar qualquer possível conflito ou tensão entre as disposições de um ato adotado por outras entidades e qualquer regra da União suscetível de ser aplicada à situação. Além disso, os particulares não têm o direito de pedir à União uma indemnização pelos danos alegadamente sofridos devido a atos ou omissões da Comissão no exercício do seu papel de «guardiã dos Tratados».

81.

Por uma questão de exaustividade, examinarei também a possibilidade de a assinatura do Memorando de Entendimento ter conduzido efetivamente à violação do direito da União alegada pelos recorrentes.

ii) Quanto à aplicabilidade da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia ( 39 )

82.

Ainda que o Tribunal considerasse que os deveres que incumbem à Comissão, na qualidade de «guardiã dos Tratados», quando atua fora do quadro jurídico da União, são mais vastos do que aqueles que resultam da tese acima defendida, e que a violação desses deveres pode, de facto, dar origem a responsabilidade financeira da União, seria necessário abordar uma outra questão. Essa questão é, no fundo, se a assinatura do Memorando de Entendimento resultou numa possível violação do direito da União que a Comissão deveria ter evitado.

83.

No processo em primeira instância, os recorrentes alegaram que a inclusão dos pontos 1.23 a 1.27 no Memorando de Entendimento violava o seu direito fundamental de propriedade, consagrado no artigo 17.o da Carta. Contudo, além de não terem explicado de que modo as passagens controvertidas do Memorando de Entendimento infringiam o artigo 17.o da Carta ( 40 ), os recorrentes também não justificaram a aplicabilidade da Carta ao Memorando de Entendimento.

84.

Nos termos do artigo 51.o, n.o 1, da Carta, «[a]s disposições da presente Carta têm por destinatários as instituições, órgãos e organismos da União […], bem como os Estados‑Membros, apenas quando apliquem o direito da União. Assim sendo, devem respeitar os direitos, observar os princípios e promover a sua aplicação, de acordo com as respetivas competências e observando os limites das competências conferidas à União pelos Tratados.»

85.

Pelos motivos acima expostos, não tenho dúvidas de que a Comissão deve respeitar as regras da União, especialmente a Carta, quando atua fora do quadro jurídico da União. Com efeito, o artigo 51.o, n.o 1, da Carta não estabelece qualquer limite à aplicabilidade da Carta em relação às instituições da União, como faz para os Estados‑Membros ( 41 ). Além disso, essa disposição apela igualmente às instituições da União para promoverem a aplicação da Carta.

86.

Isso não significa, porém, que a Comissão seja obrigada a impor as normas da Carta aos atos adotados por outras entidades ou organismos que atuem fora do quadro da União. Devo salientar, mais uma vez, que, ao celebrarem o Tratado MEE, alguns Estados‑Membros exerceram a competência que tinham conservado no domínio da política económica.

87.

Segundo jurisprudência constante, os direitos fundamentais garantidos pela ordem jurídica da União são aplicáveis em todas as situações reguladas pelo direito da União, mas não fora dessas situações ( 42 ). Nos termos do artigo 51.o, n.o 1, da Carta, as suas disposições só têm por destinatários os Estados‑Membros quando estes apliquem direito da União. Importa ter em conta que o conceito de «aplicação do direito da União», na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da Carta, impõe a existência de um nexo de ligação de um certo grau, que ultrapassa a mera proximidade das matérias em causa ou as incidências indiretas de uma matéria na outra ( 43 ). Outro dos elementos a ter em conta é a eventual existência de outra disposição substantiva de direito da União (além da disposição da Carta invocada) que, sendo aplicável à situação, imponha uma obrigação aos Estados‑Membros em causa ( 44 ).

88.

No acórdão Pringle o Tribunal de Justiça sustentou que os Estados‑Membros não aplicaram o direito da União quando criaram o MEE e, por conseguinte, a Carta não era aplicável ao Tratado MEE ( 45 ). Nesse contexto, seria de esperar que os recorrentes tivessem explicado, no presente processo, por que motivo essa conclusão não seria válida relativamente ao Memorando de Entendimento. Porém, mesmo quanto lhes foi solicitado que desenvolvessem este ponto na audiência, os recorrentes não forneceram qualquer explicação, limitando‑se a presumir que a Carta era aplicável ao Memorando de Entendimento. Em especial, os recorrentes não invocaram qualquer disposição de direito da União que, sendo aplicável ao Memorando de Entendimento, teria como consequência a integração desse ato no âmbito de aplicação do direito da União para os efeitos da Carta.

89.

Consequentemente, entendo que os recorrentes não provaram que o Memorando de Entendimento constitui uma aplicação do direito da União e que, como tal, as disposições da Carta lhe são aplicáveis.

90.

Nessa matéria, tal como previsto no artigo 51.o, n.o 1, da Carta, as instituições devem aplicar a Carta de acordo com as respetivas competências e observando os limites das competências da União. Por conseguinte, a alegação de que a Comissão estava obrigada a aplicar as normas da Carta ao Memorando de Entendimento não tem qualquer fundamento. Seria legítimo alegar que a Comissão, ao invés de evitar uma violação do direito da União, estaria, desse modo, a alargar a aplicabilidade da Carta a um domínio que não se destina a ser regulado por esse instrumento.

91.

A conclusão a que chego é consentânea com diversas decisões proferidas recentemente pelo Tribunal de Justiça em processos que diziam respeito à impugnação, por particulares, de várias medidas de reestruturação adotadas pelas autoridades nacionais durante a recente crise económica. Na falta de qualquer explicação sobre a aplicabilidade da Carta às medidas dos Estados‑Membros em questão, o Tribunal de Justiça declarou‑se incompetente para decidir da compatibilidade dessas medidas com a Carta ( 46 ).

c) Observações finais

92.

Tendo concluído pela improcedência das alegações dos recorrentes, limitar‑me‑ei a acrescentar o seguinte.

93.

A leitura que faço do artigo 17.o, n.o 1, TUE e do acórdão Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756) não significa que o quadro jurídico do MEE seja um vácuo jurídico, que não admite a impugnação de atos que violem os direitos dos particulares. Significa simplesmente que, em regra, a Carta não constitui um instrumento jurídico à luz do qual deva ser apreciada a legalidade dos atos adotados pelo MEE ou das ações das suas instituições ou dos seus agentes. Com efeito, os particulares que se considerarem prejudicados por possíveis violações dos seus direitos numa situação como a dos recorrentes têm ao seu dispor outros meios de recurso.

94.

Por um lado, poderão ser aplicáveis à sua situação outras declarações nacionais e internacionais de direitos fundamentais ( 47 ) e, consequentemente, é provável que existam outros órgãos jurisdicionais nacionais e internacionais com competência para apreciar os seus pedidos com base nesses instrumentos jurídicos.

95.

Por outro lado, a ordem jurídica da União prevê vias judiciais para resolver litígios respeitantes a possíveis violações do direito da União cometidas no contexto do MEE, caso efetivamente ocorram. Porém, nesses casos, o processo judicial não deve, em regra, ser instaurado contra as instituições, caso estas atuem em nome do MEE e não tenham competência para tomar decisões com autonomia.

96.

Além das razões acima expostas, considero que existem outros fatores que também corroboram esta posição.

97.

O artigo 340.o TFUE dispõe que, «[e]m matéria de responsabilidade extracontratual, a União deve indemnizar, de acordo com os princípios gerais comuns aos direitos dos Estados‑Membros, os danos causados pelas suas instituições ou pelos seus agentes no exercício das suas funções» ( 48 ).

98.

Uma vez que estavam a exercer funções fora do quadro da União, o comportamento das instituições criticado pelos recorrentes nos presentes processos deve ser analisado principalmente à luz do direito internacional público. Na verdade, essas instituições estavam a atuar em nome de uma organização internacional (o MEE), cujos membros são Estados soberanos, tendo em vista a celebração de um acordo internacional (o Memorando de Entendimento) entre essa organização e um dos seus Estados contratantes (República de Chipre). De acordo com as regras de direito internacional público (cuja validade e mérito — escusado será dizer — são aceites e reconhecidos por todos os Estados‑Membros da União e pela própria União), o comportamento dos agentes das organizações internacionais é geralmente imputável à própria organização.

99.

Por exemplo, o artigo 6.o, n.o 1, do Projeto de artigos sobre a responsabilidade das organizações internacionais (a seguir «projeto de artigos») ( 49 ) dispõe que o comportamento de um órgão ou agente de uma organização internacional no exercício das suas funções será considerado um ato dessa organização ao abrigo do direito internacional, independentemente do cargo que esse órgão ou agente ocupe na organização. No entanto, importa referir que o artigo 7.o do projeto de artigos acrescenta que o comportamento de um órgão de um Estado ou de um agente de uma organização internacional que seja colocado à disposição de outra organização internacional será considerado, para efeitos do direito internacional, um ato desta última organização, caso esta exerça um controlo efetivo sobre o referido comportamento.

100.

Creio que essas disposições podem ser vistas como uma fonte de inspiração no presente caso. Não há dúvida de que a Comissão e o BCE são instituições de uma organização internacional (a União) que foram colocadas à disposição de outra organização (o MEE). Quando negociaram e/ou assinaram o Memorando de Entendimento, atuaram em nome, e sob o controlo efetivo, do Conselho de Governadores do MEE. Consequentemente, parecem enquadrar‑se na situação prevista no artigo 7.o do projeto de artigos: atuaram como «agentes» ( 50 ) do MEE.

101.

Tendo em conta os princípios patentes no projeto de artigos, entendo que o comportamento da Comissão e do BCE aquando da negociação e/ou assinatura do Memorando de Entendimento deveria, em princípio, ser imputado à organização em nome da qual desempenharam essas funções (o MEE) e não à organização internacional de origem (a União). Porém, a situação poderá ser diferente se se demonstrar que uma instituição da União, atuando fora do quadro da União, cometeu uma violação suficientemente caracterizada de uma norma de direito suscetível de lhe causar um prejuízo. Por exemplo, é o que aconteceria se a Comissão ou o BCE ilegalmente divulgassem ao público informações confidenciais ou incorretas suscetíveis de causar prejuízos a determinadas pessoas singulares ou coletivas ( 51 ). Esses atos poderiam ser imputados à própria Comissão ou ao próprio BCE. No presente processo, porém, afigura‑se que o contexto jurídico e factual é diferente.

102.

Na verdade, nos casos em apreço, ao alegarem uma omissão por parte da Comissão, os recorrentes pretendiam contornar o facto de que a responsabilidade pelos atos adotados nos termos do Tratado MEE cabe ao MEE, e apenas ao MEE.

103.

Assim, existindo verdadeiras violações do direito da União por parte do MEE, em regra podem ser intentadas ações contra os Estados‑Membros responsáveis, em última análise, por essas violações. Quando atuem fora do quadro da União, os Estados‑Membros não podem violar as disposições de direito da União eventualmente aplicáveis nem comprometer a eficácia de qualquer ato da União suscetível de ser afetado pelo seu comportamento ( 52 ).

104.

Por conseguinte, os Estados‑Membros que tomam decisões na qualidade de membros do MEE podem ser responsabilizados, no quadro da ordem jurídica da União, por possíveis violações do direito da União cometidas naquele contexto. Consequentemente, um cidadão que se considere afetado por tais violações tem o direito de intentar uma ação nos órgãos jurisdicionais nacionais competentes, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de responsabilidade do Estado por violações do direito da União ( 53 ).

105.

Estes princípios não são, de modo algum, característicos apenas do direito internacional público, aplicando‑se igualmente às relações entre mandantes e mandatários em muitos sistemas jurídicos nacionais civis, comerciais e administrativos, tanto na União como fora dela. Normalmente, o mandante é responsável (externamente) pelos atos ilícitos praticados pelos mandatários nos negócios jurídicos celebrados com terceiros em seu nome. No entanto, se o mandatário praticar atos para os quais não dispõe da necessária autorização, pode ser posteriormente (internamente) responsabilizado pelos danos sofridos pelo mandante ( 54 ).

106.

Afigura‑se que a minha conclusão é ainda corroborada pela linha jurisprudencial do Tribunal de Justiça, nos termos da qual, em caso de responsabilidade extracontratual solidária da União e de um Estado‑Membro, os particulares que sofreram os alegados danos são obrigados a intentar primeiro a ação nos órgãos jurisdicionais nacionais competentes, caso as principais responsáveis pelas alegadas violações sejam, principal ou predominantemente, as autoridades desse Estado‑Membro ( 55 ). Creio que este princípio é aplicável a fortiori no presente processo, na medida em que os recorrentes não provaram que as instituições da União eram juridicamente responsáveis, ainda que apenas em parte ( 56 ), pelo ato que alegadamente causou os danos em questão.

107.

À luz do exposto, considero que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao concluir que nem a Comissão nem o BCE estiveram na origem do Memorando de Entendimento e que, nesse caso, não podia ser imputada responsabilidade à União, nos termos dos artigos 268.° e 340.° TFUE, pela inclusão nesse memorando de determinadas passagens que alegadamente violavam a Carta. Nessa conformidade, o primeiro fundamento de recurso deve ser julgado improcedente.

C – Quanto ao segundo fundamento de recurso

1. Argumentos das partes

108.

Com o seu segundo fundamento de recurso, que incide diretamente sobre o n.o 43 dos despachos recorridos, os recorrentes criticam o Tribunal Geral por não ter tomado em consideração certas declarações feitas por Jörg Asmussen, que era, na data pertinente, membro do conselho executivo do BCE. Os recorrentes alegam que, durante uma reunião que teve lugar em 15 de março de 2013, J. Asmussen disse ao Presidente da República de Chipre que, «a menos que Chipre concordasse com as exigências que lhe tinham sido feitas em relação à redução do hiato de sustentabilidade da dívida, o BCE cortaria imediatamente a linha de liquidez disponibilizada aos bancos de Chipre» ( 57 ). Assim, o Tribunal Geral ignorou um elemento factual determinante quando concluiu que o Memorando de Entendimento era um ato imputável ao MEE (e não à Comissão e ao BCE) e, como tal, não podia gerar responsabilidade da União.

109.

A Comissão alega que este fundamento de recurso é um argumento factual e jurídico novo, que foi suscitado pela primeira vez nas réplicas dos recorrentes em primeira instância. Possivelmente, não será nem uma matéria de que os recorrentes só tiveram conhecimento durante o processo nem uma ampliação do fundamento de recurso. Por conseguinte, o Tribunal Geral agiu corretamente ao julgar improcedentes as alegações dos recorrentes sobre este ponto. Em qualquer caso, o alegado «ultimato» de J. Asmussen não altera o facto de o MEE vincular apenas o MEE, não a União.

2. Apreciação

110.

Creio que a alegada declaração de J. Asmussen constitui um elemento de prova produzido pelos recorrentes em apoio da tese de que a Comissão e o BCE estiveram na origem do Memorando de Entendimento e que, por esse motivo, a União deveria ser responsabilizada pelos alegados danos dele decorrentes.

111.

Com este fundamento de recurso, os recorrentes criticam, assim, a apreciação da prova por parte do Tribunal Geral.

112.

Por esse motivo, independentemente de este elemento ter sido produzido perante o Tribunal Geral em tempo útil, o presente fundamento de recurso é, no meu entender, inadmissível. O Tribunal de Justiça não pode reapreciar os elementos de prova produzidos ou apresentados em primeira instância, salvo nos casos em que o Tribunal Geral os tenha desvirtuado.

113.

Porém, no presente processo, os recorrentes limitam‑se a pôr em causa o facto de o Tribunal Geral não ter tomado em consideração um elemento de prova, sem invocarem qualquer distorção do mesmo.

114.

Seja como for, a Comissão e o BCE têm toda a razão quando afirmam que as declarações eventualmente feitas por J. Asmussen, a título oficial ou pessoal, na sua reunião com o Presidente da República de Chipre não afetam a natureza jurídica do Memorando de Entendimento. O responsável pelo conteúdo desse ato é, em última análise, o MEE.

115.

O segundo fundamento de recurso é, assim, inadmissível e, de qualquer modo, improcedente.

D – Quanto ao terceiro fundamento de recurso

1. Argumentos das partes

116.

Com o seu terceiro fundamento de recurso, que tem por objeto o n.o 54 dos despachos recorridos, os recorrentes põem em causa a conclusão do Tribunal Geral de que não existia um nexo causalidade entre os danos por eles alegadamente sofridos e a alegada omissão da Comissão. O Tribunal Geral concluiu que a alegada redução do valor dos depósitos dos recorrentes tinha sido causada pela entrada em vigor do Decreto n.o 103, que ocorrera antes da assinatura do Memorando de Entendimento. Concretamente, no entender dos recorrentes, o Tribunal Geral tinha interpretado incorretamente o conceito de «condicionalidade»: o Memorando de Entendimento descrevia não só certas condições que a República de Chipre teria de cumprir no futuro mas também certas condições que esta última já tinha cumprido.

117.

A Comissão rejeita as alegações de erros de direito feitas pelos recorrentes, em especial a alegação de que a recapitalização do BoC e do CPB através de medidas de resgate interno fazia parte da condicionalidade imposta pelo artigo 13.o do Tratado MEE. No seu entender, a decisão das autoridades cipriotas de adotar essas medidas tinha sido tomada com total autonomia.

118.

O BCE, por seu turno, alega que os recorrentes pedem, no fundo, uma reapreciação da prova, sem aduzirem qualquer argumento baseado num alegado erro de direito, o que não é admissível em sede de recurso.

2. Apreciação

119.

Considero que o presente fundamento de recurso é inoperante. Com efeito, independentemente de o Tribunal Geral ter ou não cometido um erro de direito na interpretação e aplicação do conceito de nexo de causalidade, esse erro não justificaria a anulação dos despachos recorridos.

120.

Tal como explicado no contexto do primeiro fundamento de recurso, o comportamento alegadamente causador dos danos não pode ser imputado às instituições da União. Nesse caso, portanto, não é necessário determinar se as três condições necessárias para desencadear a responsabilidade extracontratual da União ( 58 ) estão preenchidas.

E – Quanto ao quarto fundamento de recurso

1. Argumentos das partes

121.

No seu quarto fundamento de recurso, que tem por objeto o n.o 54 dos despachos recorridos, os recorrentes alegam que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar inadmissível o pedido de anulação parcial do Memorando de Entendimento. Segundo os recorrentes, se o Tribunal de Justiça aceitar os argumentos aduzidos a propósito dos três primeiros fundamentos de recurso, o quarto fundamento de recurso terá também de ser considerado necessariamente procedente.

122.

Tanto a Comissão como o BCE consideram que, à luz dos argumentos expostos no contexto dos outros fundamentos de recurso, este fundamento também deve ser rejeitado.

2. Apreciação

123.

Nos articulados apresentados ao Tribunal de Justiça, ser conciso é uma grande virtude, mas ser demasiado sucinto é um erro capital. O presente fundamento de recurso — exposto resumidamente num único ponto dos recursos — encontra‑se a meio caminho entre estes dois conceitos.

124.

Com efeito, é natural que se duvide que um erro de direito alegadamente cometido pelo Tribunal Geral possa ser identificado, explicado e demonstrado com a necessária clareza e exaustividade num único ponto de um articulado.

125.

Em qualquer caso, talvez não seja necessário analisar a admissibilidade deste fundamento de recurso, dado que, no meu entender, o mesmo é manifestamente improcedente.

126.

É jurisprudência constante que, num recurso de anulação interposto ao abrigo do artigo 263.o TFUE, o juiz da União só tem competência para fiscalizar a legalidade de atos das instituições, órgãos e organismos da União ( 59 ).

127.

O Memorando de Entendimento foi celebrado entre a República de Chipre e o MEE, dos quais nenhum é uma instituição da União. O MEE foi criado por Estados‑Membros cuja moeda é o euro. No acórdão Pringle, o Tribunal de Justiça sustentou que os Estados‑Membros são competentes para celebrar entre eles um acordo sobre a criação de um mecanismo de estabilidade ( 60 ). De acordo com jurisprudência constante, em princípio, o Tribunal de Justiça não é competente para fiscalizar os atos praticados pelos Estados‑Membros quando exercem coletivamente o seu poder como Estados‑Membros, e não como membros do Conselho ( 61 ).

128.

É certo que, em alguns casos excecionais, o Tribunal de Justiça se reservou o poder de fiscalizar atos que, não obstante terem sido formalmente adotados como atos dos Estados‑Membros reunidos no Conselho, devam ser considerados, face ao seu conteúdo e às circunstâncias em que foram adotados, atos do Conselho ( 62 ). Porém, é evidente que não é esse o caso no presente processo: o ato impugnado foi adotado nos termos das regras de um acordo internacional no qual a União não é parte, e que criou uma organização internacional com uma personalidade jurídica distinta e independente da personalidade jurídica da União.

129.

Por conseguinte, uma vez que o Memorando de Entendimento não pode ser objeto de um recurso de anulação nos termos do artigo 263.o TFUE, o quarto fundamento de recurso também deve ser julgado improcedente e, consequentemente, deve ser negado provimento aos recursos na sua totalidade.

VI – Quanto às despesas

130.

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

131.

Se o Tribunal de Justiça concordar com a minha apreciação do presente recurso, nos termos dos artigos 137.°, 138.°, e 184.° do Regulamento de Processo, os recorrentes devem ser condenados nas despesas incorridas, tanto em primeira instância como em sede de recurso.

VII – Conclusão

132.

Tendo em conta as considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça se digne:

negar provimento aos recursos;

condenar a Ledra Advertising Ltd nas despesas relativas ao processo C‑8/15 P, tanto em primeira instância como em sede de recurso;

condenar Andreas Eleftheriou, Eleni Eleftheriou e Lilia Papachristofi nas despesas relativas ao processo C‑9/15 P, tanto em primeira instância como em sede de recurso; e

condenar Christos Theophilou e Eleni Theophilou nas despesas relativas ao processo C‑10/15 P, tanto em primeira instância como em sede de recurso.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) Tratado que institui o Mecanismo Europeu de Estabilidade, assinado pelos Estados‑Membros da área do euro em 2 de fevereiro de 2012, que entrou em vigor em 27 de setembro de 2012 para os primeiros 16 Estados‑Membros que o tinham ratificado.

( 3 ) Acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756).

( 4 ) EE, anexo I(I), n.o 4379, 22 de março de 2013.

( 5 ) EE, anexo III(I), n.o 4645, 29 de março de 2013, pp. 769 a 780 e 781 a 788.

( 6 ) Estes números não prejudicam a redução no valor dos depósitos não garantidos que acabou por ser acordada.

( 7 ) EU:T:2014:981.

( 8 ) EU:T:2014:978.

( 9 ) EU:T:2014:979.

( 10 ) V., também, entre muitos outros, acórdão de 3 de dezembro de 2015, Itália/Comissão (C‑280/14 P, EU:C:2015:792, n.o 42 e jurisprudência aí referida).

( 11 ) V., entre outros, despacho de 29 de novembro de 2007, Weber/Comissão (C‑107/07 P, EU:C:2007:741, n.os 26 a 28).

( 12 ) Acórdão de 10 de julho de 2014, Telefónica e Telefónica de España/Comissão (C‑295/12 P, EU:C:2014:2062, n.os 29, 30 e jurisprudência aí referida).

( 13 ) Acórdão de 11 de setembro de 2014, MasterCard e o./Comissão (C‑382/12 P, EU:C:2014:2201, n.o 41 e jurisprudência aí referida).

( 14 ) V., por exemplo, ponto 8 de cada um dos recursos.

( 15 ) Acórdão de 1 de outubro de 2014, Conselho/Alumina (C‑393/13 P, EU:C:2014:2245, n.o 16 e jurisprudência aí referida).

( 16 ) V. acórdão de 23 de março de 2004, Provedor de Justiça/Lamberts (C‑234/02 P, EU:C:2004:174, n.o 59 e jurisprudência aí referida).

( 17 ) V. considerando 10 do Tratado MEE.

( 18 ) V., em especial, acórdãos de 30 de junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão (C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1993:271, n.o 16, 20 e 22), e de 2 de março de 1994, Parlamento/Conselho (C‑316/91, EU:C:1994:76, n.os 26, 34 e 41); v., também, parecer 1/92, de 10 de abril de 1992 (EU:C:1992:189, n.os 32 e 41), e parecer 1/09, de 8 de março de 2011 (EU:C:2011:123, n.o 75).

( 19 ) Acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756, n.o 161).

( 20 ) V., a este respeito, acórdão de 21 de dezembro de 2011, Air Transport Association of America e o. (C‑366/10, EU:C:2011:864, n.os 50, 52, 60 a 62 e jurisprudência aí referida).

( 21 ) V. acórdão de 21 de dezembro de 2011, Air Transport Association of America e o. (C‑366/10, EU:C:2011:864, n.o 63 e jurisprudência aí referida).

( 22 ) Acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756, especialmente n.o 120).

( 23 ) V., a este respeito, acórdão de 21 de dezembro de 2011, Air Transport Association of America e o. (C‑366/10, EU:C:2011:864, n.o 63 e jurisprudência aí referida).

( 24 ) V., a este respeito, acórdão de 28 de abril de 2015, Comissão/Conselho (C‑28/12, EU:C:2015:282, n.o 51).

( 25 ) V. capítulo 4 do Tratado MEE.

( 26 ) Não é necessário determinar se um memorando de entendimento assinado pelo MEE e por um dos seus membros é um acordo juridicamente vinculativo ou um mero ato de valor político.

( 27 ) N.o 54 dos despachos recorridos.

( 28 ) V. jurisprudência referida no acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756, n.o 158).

( 29 ) V. acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756, n.o 112).

( 30 ) O sublinhado é meu.

( 31 ) V., em especial, n.os 164 e 174 do acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756), referidos pelos recorrentes.

( 32 ) V., em especial, despacho de 27 de outubro de 2008, no processo Pellegrini/Comissão (T‑375/07, não publicado, EU:T:2008:466, n.o 19 e jurisprudência aí referida).

( 33 ) V., a este respeito, acórdão de 25 de junho de 1998, British Airways e o./Comissão (T‑371/94 e T‑394/94, EU:T:1998:140, n.o 453).

( 34 ) V., entre outros, acórdãos de 5 de novembro de 2002, Comissão/Luxemburgo (C‑472/98, EU:C:2002:629, n.os 34 a 38), e de 28 de outubro de 2010, Comissão/Lituânia (C‑350/08, EU:C:2010:642, n.o 33).

( 35 ) V. acórdão de 11 de agosto de 1995, Comissão/Alemanha (C‑431/92, EU:C:1995:260, n.o 21 e jurisprudência aí referida).

( 36 ) V., a este respeito, acórdão de 24 de março de 2009, Danske Slagterier (C‑445/06, EU:C:2009:178, n.o 67).

( 37 ) V., entre muitos outros, acórdãos de 14 de fevereiro de 1989, Star Fruit/Comissão (247/87, EU:C:1989:58, n.os 10 a 14), e de 17 de maio de 1990, Sonito e o./Comissão (C‑87/89, EU:C:1990:213, n.os 6 e 7).

( 38 ) V., em especial, despacho de 23 de maio de 1990, Asia Motor France/Comissão (C‑72/90, EU:C:1990:230, n.os 13 a 15). V., também, despacho de 14 de janeiro de 2004, Makedoniko Metro e Michaniki/Comissão (T‑202/02, EU:T:2004:5, n.o 43).

( 39 ) A seguir «Carta».

( 40 ) As petições limitavam‑se a discutir uma possível violação do artigo 1.o do Primeiro Protocolo adicional à Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, sem estabelecerem qualquer ligação entre essas duas disposições.

( 41 ) V. Peers, S., Towards a New Form of EU law? The Use of EU Institutions Outside the EU Legal Framework,, European Constitutional Law Review, 2013, pp. 51 a 53.

( 42 ) V., entre outros, acórdão de 26 de fevereiro de 2013, Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.o 19).

( 43 ) V., a este respeito, acórdão de 6 de março de 2014, Siragusa (C‑206/13, EU:C:2014:126, n.o 24 e jurisprudência aí referida).

( 44 ) V., a este respeito, acórdão de 27 de março de 2014, Torralbo Marcos (C‑265/13, EU:C:2014:187, n.o 33 e jurisprudência aí referida).

( 45 ) V. n.os 178181 do acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756).

( 46 ) Despachos de 14 de dezembro de 2011, Cozman (C‑462/11, EU:C:2011:831); de 14 de dezembro de 2011, Corpul Naţional al Poliţiştilor (C‑434/11, não publicado, EU:C:2011:830; de 7 de março de 2013, Sindicato dos Bancários do Norte e o. (C‑128/12, não publicado, EU:C:2013:149); de 26 de junho de 2014, Sindicato Nacional dos Profissionais de Seguros e Afins (C‑264/12, EU:C:2014:2036); e de 21 de outubro de 2014, Sindicato Nacional dos Profissionais de Seguros e Afins (C‑665/13, EU:C:2014:2327).

( 47 ) Como a Constituição da República de Chipre e a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais.

( 48 ) O sublinhado é meu.

( 49 ) Adotado pela Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas na sua 63.a sessão, em 2011, e apresentado à Assembleia‑Geral como parte do relatório da Comissão sobre os trabalhos dessa sessão (A/66/10) (Yearbook of the International Law Commission, 2011, vol. II, parte II).

( 50 ) O artigo 2.o, alínea d), do projeto de artigos contém uma definição muito ampla de conceito de «agente de uma organização internacional», que abrange qualquer funcionário ou outra pessoa ou entidade, exceto um órgão, que tenha sido encarregado pela organização de desempenhar, ou de ajudar a desempenhar, uma das suas funções e, portanto, através do qual essa organização atua.

( 51 ) V., a este respeito, acórdão de 18 de dezembro de 2009, Arizmendi e o./Conselho e Comissão (T‑440/03, T‑121/04, T‑171/04, T‑208/04, T‑365/04 e T‑484/04, EU:T:2009:530, n.os 61 a 71).

( 52 ) Esse princípio decorre sobretudo do artigo 4.o, n.o 3, TUE. V., a este respeito, acórdãos de 31 de março de 1971, Comissão/Conselho, dito AETR, (22/70, EU:C:1971:32, n.os 21 e 22); e de 5 de novembro de 2002, Comissão/Luxemburgo (C‑472/98, EU:C:2002:629, n.o 85).

( 53 ) Jurisprudência que teve origem com os acórdãos de 19 de novembro de 1991, Francovich e o., (C‑6/90 e C‑9/90, EU:C:1991:428), e de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame (C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79).

( 54 ) Para uma perspetiva histórica e comparativa, v. Müller‑Freienfels, W., «Agency — Law», in Encyclopædia Britannica, 2016, extraído de http://www.britannica.com/topic/agency‑law.

( 55 ) É esta a minha leitura dos acórdãos de 14 de julho de 1967, Kampffmeyer e o./Comissão (5/66, 7/66, 13/66 a 16/66 e 18/66 a 24/66, EU:C:1967:31), e de 12 de abril de 1984, Unifrex/Comissão e Conselho (281/82, EU:C:1984:165).

( 56 ) Porém, o facto de uma instituição da União se limitar a prestar aconselhamento ou a fornecer orientações não vinculativas às autoridades nacionais não pode dar origem a responsabilidade solidária da União. V., a este rspeito, acórdãos de 26 de fevereiro de 1986, Krohn Import‑Export/Comissão (175/84, EU:C:1986:85), e de 10 de maio de 1978, Société pour l’exportation des sucres/Comissão (132/77, EU:C:1978:99).

( 57 ) Os recorrentes consideram que esta afirmação corresponde a um «ultimato».

( 58 ) No que respeita a essas condições, v., entre muitos outros, acórdão de 25 de março de 2010, Sviluppo Italia Basilicata/Comissão (C‑414/08 P, EU:C:2010:165, n.o 138).

( 59 ) V. acórdãos de 31 de março de 1971, Comissão/Conselho (22/70, EU:C:1971:32, n.o 42); de 30 de junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão (C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1993:271, n.o 13); e de 13 de julho de 2004, Comissão/Conselho (C‑27/04, EU:C:2004:436, n.o 44).

( 60 ) Acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756, n.o 68).

( 61 ) V. a este respeito, acórdãos de 30 de junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão (C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1993:271, n.o 12), e de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho (C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.os 38 a 41).

( 62 ) Acórdão de 30 de junho de 1993, Parlamento/Conselho e Comissão (C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1993:271, n.o 14), e conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs apresentadas em 16 de dezembro de 1992 nos processos apensos Parlamento/Conselho e Comissão (C‑181/91 e C‑248/91, EU:C:1992:520, n.os 20 a 22).