ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

14 de setembro de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Política social — Diretiva 1999/70/CE — Acordo‑Quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo — Artigo 4.o — Princípio da não discriminação — Conceito de ‘condições de emprego’ — Compensação por cessação de um contrato de trabalho — Compensação não prevista pela regulamentação nacional para os contratos de trabalho temporários — Diferença de tratamento em relação aos trabalhadores por tempo indeterminado»

No processo C‑596/14,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tribunal Superior de Justicia de Madrid (Tribunal Superior de Justiça de Madrid, Espanha), por decisão de 9 de dezembro de 2014, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 22 de dezembro de 2014, no processo

Ana de Diego Porras

contra

Ministerio de Defensa,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: F. Biltgen (relator), presidente de secção, A. Borg Barthet e M. Berger, juízes,

advogado‑geral: M. Bobek,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação de A. de Diego Porras, por J. Rello Ochayta, abogado,

em representação do Governo espanhol, por L. Banciella Rodríguez‑Miñón, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por S. Pardo Quintillán e M. van Beek, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 4.o do Acordo‑Quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de março de 1999 (a seguir «acordo‑quadro»), que figura em anexo à Diretiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de junho de 1999, respeitante ao Acordo‑Quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo (JO 1999, L 175, p. 43).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe Ana de Diego Porras ao Ministerio de Defensa (Ministério da Defesa, Espanha) a respeito da qualificação da relação contratual existente entre as partes e do pagamento de uma compensação na sequência da cessação dessa relação.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Resulta do considerando 14 da Diretiva 1999/70 que «partes signatárias pretenderam celebrar um acordo‑quadro relativo a contratos de trabalho a termo enunciando os princípios gerais e as prescrições mínimas em matéria de contratos e relações de trabalho a termo. Manifestaram a sua vontade de melhorar a qualidade do trabalho com contrato a termo, garantindo a aplicação do princípio da não discriminação, e de estabelecer um quadro para impedir os abusos decorrentes da utilização de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo».

4

Nos termos do seu artigo 1.o, a Diretiva 1999/70 «tem como objetivo a aplicação do acordo‑quadro […], que figura em anexo, celebrado […] entre as organizações interprofissionais de vocação geral (CES, UNICE e CEEP)».

5

O preâmbulo do acordo‑quadro precisa, no seu terceiro parágrafo, que «[o] presente acordo estabelece os princípios gerais e os requisitos mínimos relativos aos contratos de trabalho a termo, reconhecendo que a sua aplicação pormenorizada deve ter em conta a realidade e especificidades das situações nacionais, setoriais e sazonais. Afirma ainda a vontade dos parceiros sociais em estabelecerem um quadro geral que garanta a igualdade de tratamento em relação aos trabalhadores contratados a termo, protegendo‑os contra discriminações e a utilização dos contratos de trabalho a termo numa base aceitável tanto para empregadores como para trabalhadores».

6

Por força do seu artigo 1.o, o acordo‑quadro tem por objeto, por um lado, melhorar a qualidade do trabalho sujeito a contrato a termo garantindo a aplicação do princípio da não discriminação e, por outro, estabelecer um quadro para evitar os abusos decorrentes da utilização de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo.

7

O artigo 3.o do acordo‑quadro, sob a epígrafe «Definições», dispõe:

«1.

Para efeitos do presente acordo, entende‑se por ‘trabalhador contratado a termo’ o trabalhador titular de um contrato de trabalho ou de uma relação laboral concluído diretamente entre um empregador e um trabalhador cuja finalidade seja determinada por condições objetivas, tais como a definição de uma data concreta, de uma tarefa específica ou de um certo acontecimento.

2.

Para efeitos do presente acordo, entende‑se por ‘trabalhador permanente em situação comparável’ um trabalhador titular de um contrato de trabalho ou relação laboral sem termo que, na mesma empresa realize um trabalho ou uma atividade idêntico ou similar, tendo em conta as qualificações ou competências [...]»

8

O artigo 4.o do acordo‑quadro, sob a epígrafe «Princípio da não discriminação», prevê, no seu n.o 1:

«No que diz respeito às condições de emprego, não poderão os trabalhadores contratados a termo receber tratamento menos favorável do que os trabalhadores permanentes numa situação comparável pelo simples motivo de os primeiros terem um contrato ou uma relação laboral a termo, salvo se razões objetivas justificarem um tratamento diferente».

Direito espanhol

9

Nos termos do artigo 15.o, n.o 1, do Texto Refundido de la Ley del Estatuto de los Trabajadores, aprobado por el Real Decreto Legislativo 1/1995 (Texto Consolidado da Lei do Estatuto dos Trabalhadores, resultante do Real Decreto Legislativo 1/1995), de 24 de março de 1995 (BOE n.o 75, de 29 de março de 1995, p. 9654, a seguir «Estatuto dos Trabalhadores»), na versão aplicável à data dos factos no processo principal, o contrato de trabalho pode ser celebrado com duração indeterminada ou a termo. Celebram‑se contratos a termo nos seguintes casos:

«a)

quando o trabalhador é contratado para a realização de uma tarefa determinada, autónoma e separável da atividade da empresa, cuja execução, ainda que limitada no tempo, é em princípio de duração incerta. […]

b)

quando as circunstâncias do mercado, uma acumulação de trabalho ou um excesso de encomendas o exigem, mesmo no âmbito da atividade normal da empresa. […]

c)

em caso de substituição de trabalhadores que tenham direito à manutenção do seu posto de trabalho, desde que o contrato de trabalho especifique o nome do trabalhador substituído e o motivo da substituição.»

10

Nos termos do artigo 15.o, n.o 3, do Estatuto dos Trabalhadores, «os contratos a termo celebrados em violação da lei presumem‑se celebrados por tempo indeterminado».

11

O Real Decreto 2720/1998 por el que se desarrolla el artículo 15 del Estatuto de los Trabajadores en materia de contratos de duración determinada (Real Decreto n.o 2720/1998, de execução do artigo 15.o do Estatuto dos Trabalhadores em matéria de contratos de duração determinada), de 18 de dezembro de 1998 (BOE n.o 7, de 8 de janeiro de 1999, p. 568), define, no seu artigo 4.o, n.o 1, o contrato de interinidad (temporário) como o contrato celebrado para substituir um trabalhador da empresa com direito à manutenção do seu posto de trabalho, nos termos da regulamentação, de uma convenção coletiva ou de um acordo de empresa. Nos termos do artigo 4.o, n.o 2, desse Decreto Real, o contrato deve identificar o trabalhador substituído e o motivo da substituição. A duração do contrato de interinidad é a do tempo que durar a ausência do trabalhador substituído com direito à manutenção do seu posto de trabalho.

12

Resulta do artigo 15.o, n.o 5, do Estatuto dos Trabalhadores que os trabalhadores contratados, com ou sem interrupção, por um período superior a 24 meses num período de 30 meses, adquirem o estatuto de trabalhadores permanentes. Contudo, estas disposições não se aplicam em caso de recurso a contratos de formação, de contratos de substituição de trabalhadores em pré‑reforma, de contratos de trabalho de interinidad, nem a contratos de trabalho temporários celebrados no âmbito de programas públicos de emprego‑formação.

13

O artigo 49.o, n.o 1, alínea c), do Estatuto dos Trabalhadores prevê que, em caso de cessação do contrato, com exceção dos casos dos contratos de interinidad e dos contratos de formação, o trabalhador tem direito a receber uma compensação equivalente a 12 dias de retribuição por cada ano de serviço.

14

Nos termos do artigo 53.o, n.o 1, alínea b), do Estatuto dos Trabalhadores, a cessação do contrato de trabalho por razões objetivas determina «o pagamento ao trabalhador, no momento da notificação escrita, de uma compensação de vinte dias de salário por ano de antiguidade, compensação que, para os períodos inferiores a um ano, é calculada proporcionalmente, com o limite de doze mensalidades».

Factos do litígio no processo principal e questões prejudiciais

15

A. de Diego Porras foi contratada, desde o mês de fevereiro de 2003, ao abrigo de vários contratos de trabalho de interinidad, como secretária em diferentes subdireções do Ministério da Defesa. O último contrato de trabalho de interinidad, celebrado em 17 de agosto de 2005, visava substituir Mayoral Fernández, dispensada a tempo inteiro das suas obrigações profissionais para o exercício de um mandato sindical.

16

Em aplicação do Real Decreto‑ley 20/2012 de medidas para garantizar la estabilidad presupuestaria y de fomento de la competitividad (Real Decreto‑Lei 20/2012, relativo a medidas destinadas a garantir a estabilidade orçamental e a promover a competitividade), de 13 de julho de 2012 (BOE n.o 168, de 14 de julho de 2012, p. 50428), a dispensa de trabalho de Mayoral Fernández foi revogada.

17

Por carta de 13 de setembro de 2012, A. de Diego Porras foi convocada para assinar a cessação do seu contrato de trabalho, com efeito a 30 de setembro de 2012, a fim de permitir a reintegração de Mayoral Fernández no seu posto de trabalho a partir de 1 de outubro de 2012.

18

Em 19 de novembro de 2012, A. de Diego Porras intentou uma ação no Juzgado de lo Social n.o 1 de Madrid (Tribunal do Trabalho n.o 1 de Madrid, Espanha) em que contestava tanto a legalidade do seu contrato de trabalho como as condições da sua cessação.

19

Tendo a ação sido julgada improcedente, por decisão de 10 de setembro de 2013, a interessada interpôs recurso daquela no Tribunal Superior de Justicia de Madrid (Tribunal Superior de Justiça de Madrid, Espanha), no qual alegou que os contratos de trabalho de interinidad, no âmbito dos quais havia sido contratada, tinham sido celebrados em violação da lei pelo que deviam ser requalificados como «contratos de trabalho por tempo indeterminado». Consequentemente, a cessação de um tal contrato implica o pagamento de uma compensação.

20

O Tribunal Superior de Justicia de Madrid (Tribunal Superior de Justiça de Madrid) observa, por um lado, que a contratação de A. de Diego Porras mediante um contrato de trabalho de interinidad cumpre os requisitos decorrentes das disposições nacionais em vigor e, por outro, que a cessação do referido contrato de trabalho é baseada num motivo objetivo.

21

Contudo, o órgão jurisdicional de reenvio suscita a questão relativa ao direito de A. de Diego Porras reclamar uma compensação pela cessação do seu contrato de trabalho. Com efeito, existe, no direito espanhol, uma diferença de tratamento quanto às condições de emprego entre os trabalhadores permanentes e os trabalhadores contratados a termo, na medida em que a compensação paga em caso de cessação lícita do contrato de trabalho é de 20 dias de salário por ano de antiguidade para os primeiros, enquanto para os segundos é de apenas 12 dias de salário por ano de serviço. Esta desigualdade é ainda mais evidente no que se refere aos trabalhadores contratados ao abrigo de um contrato de trabalho de interinidad, aos quais a legislação nacional não reconhece qualquer indemnização em caso de cessação lícita do contrato.

22

Tendo em consideração que nenhuma razão objetiva parece justificar a referida diferença de tratamento, o órgão jurisdicional de reenvio manifesta dúvidas quanto à compatibilidade das disposições nacionais em causa com o princípio da não discriminação entre trabalhadores contratados a termo e trabalhadores por tempo indeterminado, enunciada no artigo 4.o do acordo‑quadro, conforme interpretado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.

23

Foi nestas circunstâncias que o Tribunal Superior de Justicia de Madrid (Tribunal Superior de Justiça de Madrid) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve considerar‑se que as condições de emprego a que se refere o artigo 4.o, n.o 1, do [acordo‑quadro] abrangem a compensação pela cessação de um contrato [de trabalho] a termo?

2)

Caso se entenda que essa compensação está incluída nas [referidas] condições de emprego, os trabalhadores titulares de um contrato de trabalho ou de uma relação laboral concluídos diretamente entre um empregador e um trabalhador cujo termo seja determinado por condições objetivas, tais como uma data concreta, a realização de uma obra ou a prestação de um serviço específico ou um certo evento, têm o direito de receber, à data da cessação do contrato, a mesma compensação que recebe um trabalhador contratado por tempo indeterminado quando o contrato deste, sendo equiparável, cessa por causas objetivas?

3)

Se o trabalhador contratado a termo tiver o direito de receber uma compensação idêntica à de um trabalhador contratado por tempo indeterminado verificando‑se a cessação da relação laboral por causas objetivas, deve entender‑se que o artigo 49.o, n.o 1, alínea c) do [Estatuto dos Trabalhadores] transpôs corretamente a Diretiva 1999/70[...] a contratos de trabalho a termo, ou que é discriminatório e contrário à mesma, pondo em causa o seu objetivo e efeito útil?

4)

Não existindo razões objetivas para que os trabalhadores contratados a termo resolutivo não tenham direito a uma compensação devida pela cessação de um contrato de trabalho a termo, considera‑se discriminatória a distinção prevista no [Estatuto dos Trabalhadores] entre as condições de emprego destes trabalhadores, não só face às condições dos trabalhadores contratados por tempo indeterminado mas também relativamente às dos restantes trabalhadores contratados a termo?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

24

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «condições de emprego» inclui a compensação que um empregador está obrigado a pagar a um trabalhador na sequência da cessação do contrato de trabalho a termo.

25

A título preliminar, há que recordar que, nos termos do artigo 1.o, alínea a), do acordo‑quadro, um dos seus objetivos é melhorar a qualidade do trabalho a termo, garantindo a aplicação do princípio da não discriminação. Além disso, o preâmbulo do acordo‑quadro precisa, no seu terceiro parágrafo, que esse acordo‑quadro «[a]firma [...] a vontade dos parceiros sociais em estabelecerem um quadro‑geral que garanta a igualdade de tratamento em relação aos trabalhadores contratados a termo, protegendo‑os contra discriminações [...]». O considerando 14 da Diretiva 1999/70 indica, para este efeito, que o objetivo do acordo‑quadro é, nomeadamente, melhorar a qualidade do trabalho com contrato a termo, enunciando prescrições mínimas suscetíveis de garantir a aplicação do princípio da não discriminação (v. acórdãos de 22 de dezembro de 2010, Gavieiro Gavieiro e Iglesias Torres, C‑444/09 e C‑456/09, EU:C:2010:819, n.o 47; de 12 de dezembro de 2013, Carratù, C‑361/12, EU:C:2013:830, n.o 40; e de 13 de março de 2014, Nierodzik, C‑38/13, EU:C:2014:152, n.o 22).

26

O acordo‑quadro, designadamente o seu artigo 4.o, destina‑se a aplicar o referido princípio aos trabalhadores contratados a termo, com vista a impedir que uma relação laboral desta natureza seja utilizada por um empregador para privar estes trabalhadores dos direitos que são reconhecidos aos trabalhadores contratados por tempo indeterminado (acórdãos de 13 de setembro de 2007, Del Cerro Alonso, C‑307/05, EU:C:2007:509, n.o 37; de 22 de dezembro de 2010, Gavieiro Gavieiro e Iglesias Torres, C‑444/09 e C‑456/09, EU:C:2010:819, n.o 48; e de 13 de março de 2014, Nierodzik, C‑38/13, EU:C:2014:152, n.o 23).

27

Tendo em conta os objetivos prosseguidos pelo acordo‑quadro, o artigo 4.o do acordo‑quadro deve ser entendido no sentido de que exprime um princípio do direito social da União que não pode ser interpretado de modo restritivo (acórdãos de 13 de setembro de 2007, Del Cerro Alonso, C‑307/05, EU:C:2007:509, n.o 38; de 22 de dezembro de 2010, Gavieiro Gavieiro e Iglesias Torres, C‑444/09 e C‑456/09, EU:C:2010:819, n.o 49; e de 13 de março de 2014, Nierodzik, C‑38/13, EU:C:2014:152, n.o 24).

28

No que respeita ao conceito de «condições de emprego», na aceção do artigo 4.o do acordo‑quadro, o Tribunal de Justiça já declarou que o critério decisivo para determinar se uma medida se enquadra neste conceito é precisamente o do emprego, a saber, a relação laboral estabelecida entre um trabalhador e o seu empregador (acórdãos de 12 de dezembro de 2013, Carratù, C‑361/12, EU:C:2013:830, n.o 35, e de 13 de março de 2014, Nierodzik, C‑38/13, EU:C:2014:152, n.o 25).

29

Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, estão assim abrangidos no conceito de «condições de emprego», na aceção do artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro, os prémios trienais de antiguidade que correspondem a um dos elementos da remuneração devida ao trabalhador a termo na mesma medida que a um trabalhador por tempo indeterminado (v., neste sentido, acórdãos de 13 de setembro de 2007, Del Cerro Alonso, C‑307/05, EU:C:2007:509, n.o 47, e de 22 de dezembro de 2010, Gavieiro Gavieiro e Iglesias Torres, C‑444/09 e C‑456/09, EU:C:2010:819, n.os 50 a 58).

30

Além disso, o Tribunal de Justiça considerou que este conceito engloba também as regras relativas à determinação do prazo de aviso prévio aplicável em caso de cessação dos contratos de trabalho a termo. A este respeito, o Tribunal de Justiça precisou que uma interpretação do artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro que excluísse da definição do conceito de «condições de emprego», na aceção do artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro, os requisitos de cessação de um contrato de trabalho a termo equivaleria a reduzir, contrariando o objetivo atribuído à referida disposição, o âmbito da proteção contra discriminações concedida aos trabalhadores com contratos a termo (v., neste sentido, acórdão de 13 de março de 2014, Nierodzik, C‑38/13, EU:C:2014:152, n.os 27 e 29).

31

Ora, estas considerações podem ser integralmente transpostas relativamente a uma compensação como a que está em causa no processo principal. Atendendo a que a compensação é atribuída ao trabalhador pela cessação do contrato de trabalho que o liga ao seu empregador e que cumpre o critério enunciado no número 28 do presente acórdão, está abrangida pelo conceito de «condições de emprego».

32

Por conseguinte, há que responder à primeira questão que o artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «condições emprego» inclui a compensação que um empregador está obrigado a pagar a um trabalhador pela cessação do seu contrato de trabalho a termo.

Quanto às questões segunda a quarta

33

Com as questões segunda a quarta, que devem ser examinadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o do acordo‑quadro se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que recusa qualquer compensação pela cessação do contrato de trabalho ao trabalhador contratado mediante um contrato de trabalho de interinidad ao passo que essa compensação é atribuída, designadamente, aos trabalhadores permanentes numa situação comparável.

34

No que se refere ao artigo 4.o do acordo‑quadro, há que recordar que este enuncia, no seu n.o 1, que, no que diz respeito às condições de emprego, os trabalhadores contratados a termo não poderão receber tratamento menos favorável do que os trabalhadores permanentes numa situação comparável pelo simples motivo de os primeiros terem um contrato a termo, salvo se razões objetivas justificarem um tratamento diferente.

35

Segundo jurisprudência constante, o princípio da não discriminação exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, exceto se esse tratamento for objetivamente justificado (acórdão de 8 de setembro de 2011, Rosado Santana, C‑177/10, EU:C:2011:557, n.o 65 e jurisprudência referida).

36

No caso em apreço, há que observar que existe uma diferença de tratamento entre os trabalhadores contratados a termo e os trabalhadores por tempo indeterminado, na medida em que, contrariamente aos trabalhadores contratados mediante contrato de trabalho de duração indeterminada, os trabalhadores contratados mediante contrato de trabalho de interinidad não têm direito a qualquer compensação em caso de cessação do seu contrato e qualquer que seja a duração dos períodos de serviço cumpridos.

37

A este respeito, há que precisar que o princípio da não discriminação foi aplicado e concretizado pelo acordo‑quadro unicamente no que se refere às diferenças de tratamento entre os trabalhadores contratados a termo e os trabalhadores contratados por tempo indeterminado que se encontram numa situação comparável (despachos de 11 de novembro de 2010, Vino, C‑20/10, não publicado, EU:C:2010:677, n.o 56; de 22 de junho de 2011, Vino, C‑161/11, não publicado, EU:C:2011:420C, n.o 28; e de 7 de março de 2013, Rivas Montes, C‑178/12, não publicado, EU:C:2013:150, n.o 43).

38

Em contrapartida, as eventuais diferenças de tratamento entre certas categorias de pessoal contratado a termo, como aquela a que também se refere o órgão jurisdicional de reenvio na quarta questão, não estão abrangidas pelo princípio da não discriminação consagrado pelo referido acordo‑quadro (despacho de 11 de novembro de 2010, Vino, C‑20/10, não publicado, EU:C:2010:677, n.o 57).

39

Atendendo à desigualdade observada, há que verificar, num primeiro momento, a comparabilidade das situações em causa no processo principal e, depois, num segundo momento, a existência de uma eventual justificação objetiva.

Quanto à comparabilidade das situações em causa

40

Para apreciar se as pessoas interessadas exercem um trabalho idêntico ou similar na aceção do acordo‑quadro, cumpre, em conformidade com o seu artigo 3.o, n.o 2, e o seu artigo 4.o, n.o 1, averiguar se, atendendo a uma globalidade de fatores como a natureza do trabalho, as condições de formação e as condições de trabalho, se pode considerar que estas pessoas se encontram numa situação comparável (acórdãos de 18 de outubro de 2012, Valenza e o., C‑302/11 a C‑305/11, EU:C:2012:646, n.o 42 e jurisprudência referida, e de 13 de março de 2014, Nierodzik, C‑38/13, EU:C:2014:152, n.o 31).

41

Com efeito, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, apenas na hipótese de as funções exercidas por um trabalhador, como a recorrente no processo principal, no âmbito de diferentes contratos de trabalho a termo, não corresponderem às exercidas por trabalhadores permanentes, a diferença de tratamento alegada, relativa à atribuição de uma compensação de cessação do contrato de trabalho não seria contrária ao artigo 4.o do acordo‑quadro, uma vez que esta diferença de tratamento se referiria a situações diferentes (acórdão de 18 de outubro de 2012, Valenza e o., C‑302/11 a C‑305/11, EU:C:2012:646, n.o 48 e jurisprudência referida).

42

Embora, em última análise, caiba ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se a recorrente no processo principal, quando exerceu funções de secretária no Ministério da Defesa no âmbito dos diferentes contratos de trabalho de interinidad, se encontrava numa situação comparável à dos trabalhadores contratados por tempo indeterminado por essa mesma entidade durante esse período (v., por analogia, acórdãos de 18 de outubro de 2012, Valenza e o., C‑302/11 a C‑305/11, EU:C:2012:646, n.o 43 e jurisprudência referida, e de 13 de março de 2014, Nierodzik, C‑38/13, EU:C:2014:152, n.o 32), há que salientar, contudo, que, no caso em apreço, resulta dos elementos dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que a recorrente no processo principal efetuava um trabalho análogo ou idêntico ao de um trabalhador permanente.

43

Com efeito, a própria circunstância de a recorrente ter ocupado durante sete anos consecutivos o mesmo posto de um trabalhador dispensado a tempo inteiro das suas obrigações profissionais para o exercício de um mandato sindical permite concluir não só que a interessada cumpria os requisitos de formação para aceder ao posto de trabalho em questão mas também que efetuava o mesmo trabalho que a pessoa que substituiu de forma permanente durante este longo período de tempo, estando sujeita às mesmas condições de trabalho.

44

Por conseguinte, há que considerar que a situação de trabalhadora a termo da recorrente no processo principal era comparável à de um trabalhador permanente.

Quanto à existência de uma justificação objetiva

45

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o conceito de «razões objetivas» exige que a desigualdade de tratamento em causa seja justificada pela existência de elementos precisos e concretos, que caracterizem a condição de emprego em questão, no contexto específico no qual esta se insere e com base em critérios objetivos e transparentes, a fim de verificar se esta desigualdade responde a uma real necessidade e é adequada e necessária para atingir o objetivo prosseguido. Os ditos elementos podem resultar, nomeadamente, da natureza particular das tarefas para cuja realização esses contratos a termo foram celebrados e das características inerentes a essas tarefas ou, eventualmente, da prossecução de um objetivo legítimo de política social de um Estado‑Membro (v.,nomeadamente, acórdãos de 13 de setembro de 2007, Del Cerro Alonso, C‑307/05, EU:C:2007:509, n.os 53 e 58; de 22 de dezembro de 2010, Gavieiro Gavieiro e Iglesias Torres, C‑444/09 e C‑456/09, EU:C:2010:819, n.o 55; de 8 de setembro de 2011, Rosado Santana, C‑177/10, EU:C:2011:557, n.o 73; e de 18 de outubro de 2012, Valenza e o., C‑302/11 a C‑305/11, EU:C:2012:646, n.o 51).

46

O conceito de «razões objetivas», na aceção do artigo 4.o, n.os 1 e/ou 4, do acordo‑quadro, deve portanto ser entendido no sentido de que não permite justificar uma diferença de tratamento entre os trabalhadores contratados a termo e os trabalhadores contratados por tempo indeterminado, pelo facto de essa diferença estar prevista numa norma nacional geral e abstrata, como uma lei ou uma convenção coletiva (acórdãos de 13 de setembro de 2007, Del Cerro Alonso, C‑307/05, EU:C:2007:509, n.o 57; de 22 de dezembro de 2010, Gavieiro Gavieiro e Iglesias Torres, C‑444/09 e C‑456/09, EU:C:2010:819, n.o 54; de 8 de setembro de 2011, Rosado Santana, C‑177/10, EU:C:2011:557, n.o 72; e de 18 de outubro de 2012, Valenza e o., C‑302/11 a C‑305/11, EU:C:2012:646, n.o 50).

47

Além disso, o recurso apenas à natureza temporária do trabalho do pessoal da Administração Pública não corresponde a estas exigências e não é suscetível de constituir uma «razão objetiva» na aceção do artigo 4.o, n.os 1 e/ou 4, do acordo‑quadro. Com efeito, admitir que a mera natureza temporária de uma relação laboral bastaria para justificar uma diferença de tratamento entre trabalhadores contratados a termo e trabalhadores contratados por tempo indeterminado esvaziaria de conteúdo os objetivos da Diretiva 1999/70 e do acordo‑quadro e equivaleria a perpetuar a manutenção de uma situação desfavorável aos trabalhadores contratados a termo (acórdãos de 22 de dezembro de 2010, Gavieiro Gavieiro e Iglesias Torres, C‑444/09 e C‑456/09, EU:C:2010:819, n.os 56 e 57; de 8 de setembro de 2011, Rosado Santana, C‑177/10, EU:C:2011:557, n.o 74; e de 18 de outubro de 2012, Valenza e o., C‑302/11 a C‑305/11, EU:C:2012:646, n.o 52).

48

As explicações fornecidas pelo Governo espanhol referem‑se à diferente natureza e objeto, que distingue os contratos de trabalho a termo dos contratos de trabalho por tempo indeterminado, na medida em que a diferença entre os dois tipos de contratos residiria na sua duração e na expectativa de estabilidade da relação laboral.

49

A este respeito, embora caiba, em princípio, ao órgão jurisdicional de reenvio determinar se os argumentos aí apresentados constituem «razões objetivas» na aceção do artigo 4.o, n.o 1, do acordo‑quadro, tendo em conta a jurisprudência recordada no n.o 42 do presente acórdão, há, contudo, que salientar que o Governo espanhol se limita a sublinhar a diferente natureza e objeto que distinguem os contratos de trabalho de interinidad dos contratos de trabalho por tempo indeterminado, invocando o critério da duração e a expectativa de estabilidade da relação contratual dos segundos.

50

Ora, como resulta dos n.os 46 e 47 do presente acórdão, nem a natureza temporária da relação laboral, nem a inexistência de qualquer disposição na regulamentação nacional quanto à atribuição de uma compensação pela cessação do contrato de trabalho de interinidad são suscetíveis de constituir, por si sós, tais razões objetivas.

51

Além do mais, o argumento relativo à previsibilidade do fim do contrato de trabalho de interinidad não assenta em critérios objetivos e transparentes, quando não só um tal contrato de trabalho de interinidad é suscetível de se perpetuar, à semelhança da situação da recorrente no processo principal, cujas relações contratuais se estenderam por um período de mais de dez anos, mas também um tal argumento é contrariado pela circunstância de que, em situações comparáveis, a regulamentação nacional pertinente prevê a atribuição de uma compensação pela cessação do contrato de trabalho a outras categorias de trabalhadores a termo.

52

Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder às questões segunda a quarta que o artigo 4.o do acordo‑quadro deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo nacional, que recusa qualquer compensação pela cessação do contrato de trabalho ao trabalhador contratado mediante um contrato de trabalho de interinidad, ao passo que permite a atribuição de uma tal compensação, designadamente, aos trabalhadores permanentes numa situação comparável. O mero facto de esse trabalhador ter executado o seu trabalho com base num contrato de trabalho de interinidad não constitui uma razão objetiva que permita justificar a recusa do direito a tal compensação ao referido trabalhador.

Quanto às despesas

53

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

 

1)

O artigo 4.o, n.o 1, do Acordo‑Quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de março de 1999, que figura em anexo à Diretiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de junho de 1999, respeitante ao Acordo‑Quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo, deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «condições de emprego» inclui a compensação que um empregador está obrigado a pagar a um trabalhador pela cessação do seu contrato de trabalho a termo.

 

2)

O artigo 4.o do Acordo‑Quadro relativo a contratos de trabalho a termo que figura em anexo à Diretiva 1999/70, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo nacional, que recusa qualquer compensação pela cessação do contrato de trabalho ao trabalhador contratado mediante um contrato de trabalho de interinidad (temporário) ao passo que permite a atribuição de uma tal compensação, designadamente, aos trabalhadores permanentes numa situação comparável. O mero facto de esse trabalhador ter executado o seu trabalho com base num contrato de trabalho de interinidad não constitui uma razão objetiva que permita justificar a recusa do direito a tal compensação ao referido trabalhador.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.