DESPACHO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção)

16 de janeiro de 2014 ( *1 )

«Agricultura — Regulamento (CE) n.o 1698/2005 — FEADER — Exigências quanto à forma jurídica dos grupos de ação local — Alteração dessas exigências — Competência dos Estados‑Membros — Limites»

No processo C‑24/13,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Fővárosi közigazgatási és munkaügyi bíróság (Hungria), por decisão de 3 de janeiro de 2013, entrado no Tribunal de Justiça em 21 de janeiro de 2013, no processo

Dél‑Zempléni Nektár Leader Nonprofit kft

contra

Vidékfejlesztési miniszter,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção),

composto por: M. Safjan, presidente de secção, J. Malenovský e A. Prechal (relator), juízes,

advogado‑geral: P. Cruz Villalón,

secretário: A. Calot Escobar,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de decidir por despacho fundamentado, nos termos dos artigos 53.°, n.o 2, e 99.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça,

profere o presente

Despacho

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do Regulamento (CE) n.o 1698/2005 do Conselho, de 20 de setembro de 2005, relativo ao apoio ao desenvolvimento rural pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) (JO L 277, p. 1) e do Regulamento (CE) n.o 1974/2006 da Comissão, de 15 de dezembro de 2006, que estabelece normas de execução do Regulamento (CE) n.o 1698/2005 (JO L 368, p. 15).

2

O pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre a Dél‑Zempléni Nektár Leader Nonprofit kft. (a seguir «DZNLN») ao vidékfejlesztési miniszter (ministro do Desenvolvimento Rural), a respeito de uma decisão de revogação do reconhecimento da DZNLN como grupo de ação local.

Quadro jurídico

Direito da União

3

O Regulamento n.o 1698/2005 fixa as regras de intervenção do FEADER.

4

O artigo 15.o, n.o 1, do referido regulamento dispõe:

«A ação do FEADER nos Estados‑Membros processa‑se através de programas de desenvolvimento rural. Esses programas executam uma estratégia de desenvolvimento rural através de um conjunto de medidas agrupadas de acordo com os eixos definidos no título IV, para cuja execução é solicitado o apoio do FEADER.

Cada programa de desenvolvimento rural abrange um período compreendido entre 1 de janeiro de 2007 e 31 de dezembro de 2013.»

5

Nos termos do regime de ajuda do Eixo 4 «Leader», o artigo 61.o do Regulamento n.o 1698/2005 refere:

«A abordagem Leader inclui, no mínimo, os seguintes elementos:

a)

Estratégias locais de desenvolvimento por zona destinadas a territórios rurais sub‑regionais bem identificados;

b)

Parcerias locais dos setores público e privado (a seguir designadas ‘grupos de ação local’);

c)

Abordagem ascendente em que os grupos de ação local têm poderes de decisão no que diz respeito à elaboração e execução de estratégias locais de desenvolvimento;

d)

Conceção e execução multissectoriais da estratégia baseadas na interação entre agentes e projetos de diferentes sectores da economia local;

[…]

g)

Ligação em rede de parcerias locais.»

6

Com a epígrafe «Grupos de ação local», o artigo 62.o do Regulamento n.o 1698/2005 dispõe:

«1.   Os grupos de ação local executam, em parceria, uma abordagem local de desenvolvimento que satisfaça as seguintes condições:

a)

Devem propor uma estratégia local de desenvolvimento integrada baseada, no mínimo, nos elementos referidos nas alíneas a) a d) e g) do artigo 61.o e ser responsáveis pela sua execução;

b)

Devem ser um grupo já beneficiário das iniciativas Leader II […] ou Leader + […] ou constituído de acordo com a abordagem Leader, ou um novo grupo que represente parceiros dos vários sectores socioeconómicos locais no território em causa. Ao nível da tomada de decisões, os parceiros sociais e económicos, assim como outros representantes da sociedade civil, tais como agricultores, mulheres rurais, jovens e respetivas associações, devem representar, no mínimo, 50% da parceria local;

c)

Devem demonstrar capacidade para definir e executar uma estratégia de desenvolvimento na zona;

2.   A autoridade de gestão assegura que os grupos de ação local selecionem um responsável administrativo e financeiro capaz de administrar fundos públicos e garantir o funcionamento satisfatório da parceria ou se associem numa estrutura comum legalmente constituída que garanta o funcionamento satisfatório da parceria e a capacidade para administrar fundos públicos.

[…]

4.   Os grupos de ação local escolhem os projetos a financiar ao abrigo da estratégia. Podem igualmente selecionar projetos de cooperação.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

7

A DZNLN, uma sociedade por quotas sem fins lucrativos, foi reconhecida como grupo de ação local Leader por decisão da Új Magyarország Vidékfejlesztési Program Irányító Hatósága (Autoridade responsável pelo Programa de Desenvolvimento Rural «Nova Hungria») de 26 de setembro de 2008.

8

A DZNLN exerceu então a sua atividade como grupo de ação local Leader no respeito do preceituado, quer no direito da União, quer no direito nacional.

9

O reconhecimento acima referido foi retirado à DZNLN por decisão de 26 de abril de 2012, com efeitos a 30 de abril de 2012, pelo facto de, nos termos do artigo 2.o, n.os 1 a 3, do Decreto 54/2011 do Ministro do Desenvolvimento Rural, a partir dessa data, só as associações, com exclusão, portanto, das entidades que, como a DZNLN, funcionam sob a forma de sociedade económica sem fins lucrativos, poderem ter o título de grupo de ação local Leader.

10

Interposto recurso de impugnação dessa decisão pela DZNLN, o Fővárosi közigazgatási és munkaügyi bíróság (tribunal administrativo e do trabalho de Budapeste) questiona a sua conformidade com os Regulamentos n.os 1698/2005 e 1974/2006. Esse órgão jurisdicional decidiu então suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O Regulamento [n.o 1698/2005] e o Regulamento [n.o 1974/2006] podem ser interpretados no sentido de que os grupos de ação local criados em relação às ajudas agrícolas só podem revestir num Estado‑Membro uma forma de organização legalmente prevista?

2)

O legislador do Estado‑Membro pode, com base nos regulamentos referidos, estabelecer uma distinção através da qual se reconheçam apenas os grupos de ação local que revistam determinadas formas jurídicas, fixando requisitos distintos ou mais restritos do que os previstos no artigo 62.o[, n.o 1,] do Regulamento n.o 1698/2005?

3)

Em conformidade com os regulamentos referidos, basta que, num Estado‑Membro, os grupos de ação local preencham unicamente os requisitos previstos no artigo 62.o[, n.o 1,] do Regulamento n.o 1698/2005? O Estado‑Membro pode restringir a referida disposição através da imposição de outras exigências de forma ou exigências legais às entidades que preencham os requisitos previstos no [referido artigo 62.o, n.o 1]?

4)

Devem os regulamentos referidos ser interpretados no sentido de que a decisão de suprimir grupos de ação local que preenchem os requisitos previstos no artigo 62.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1698/2005 entra no poder discricionário de um Estado‑Membro, e no sentido de que, durante todo o tempo em que estiveram operacionais, respeitaram na íntegra as normas pertinentes nacionais e da União, permitindo unicamente o funcionamento dos grupos de ação local que revistam uma forma jurídica nova?

5)

Devem os regulamentos referidos ser interpretados no sentido de que, em relação aos programas de ajudas que já estejam em curso ou durante o período de programação, um Estado‑Membro também pode modificar, sendo caso disso, o quadro jurídico de funcionamento dos grupos de ação local?

6)

Como devem os regulamentos referidos ser interpretados no caso de serem suprimidos os grupos de ação local que até então tenham exercido as suas atividades de forma eficaz e legal? O que acontece nesse caso às obrigações contraídas e aos direitos adquiridos pelos grupos de ação local, tendo especialmente em conta o conjunto total de entidades afetadas pela supressão?

7)

Deve o artigo 62.o, n.o 2, do [Regulamento n.o 1698/2005] ser interpretado no sentido de que é admissível e conforme com o direito a disposição através da qual um Estado‑Membro exige que os grupos de ação local Leader que revistam a forma de sociedade comercial sem fim lucrativo se transformem em associação no prazo de um ano, com base no facto de que apenas a forma jurídica de associação como organização social pode garantir corretamente a criação de uma rede entre os sócios locais, dado que, por um lado, em conformidade com o direito húngaro vigente, o fim fundamental [de uma] sociedade comercial é a obtenção de lucros e, por outro, os interesses económicos excluem a angariação pública e a adesão de novos sócios?»

Quanto às questões prejudiciais

11

A título preliminar, recorde‑se, por um lado, que, de acordo com o artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, quando a resposta a uma questão prejudicial possa ser claramente deduzida da jurisprudência ou não suscite nenhuma dúvida razoável, o Tribunal pode, a qualquer momento, mediante proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, decidir pronunciar‑se por meio de despacho fundamentado. Na presente lide, há que aplicar essa disposição no que respeita às primeira a quinta e sétima questões.

12

Por outro lado, nos termos do artigo 53.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, quando um pedido for manifestamente inadmissível, o Tribunal, ouvido o advogado‑geral, pode, a qualquer momento, decidir pronunciar‑se por despacho fundamentado. Na presente lide, há que aplicar essa disposição no que respeita à sexta questão.

Quanto às primeira a terceira questões

13

Com as primeira a terceira questões, que convém analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os Regulamentos n.os 1698/2005 e 1974/2006 devem ser interpretados no sentido de que exigem, proíbem ou permitem a aprovação de disposições nacionais que disponham que um grupo de ação local que preencha todas as condições enumeradas no artigo 62.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1698/2005, esteja ainda sujeito à obrigação de adotar uma forma de organização jurídica determinada e a outras exigências a ela associadas.

14

A esse respeito, há que lembrar que, embora, devido à sua própria natureza e à sua função no sistema das fontes do direito da União, as disposições dos regulamentos produzam, regra geral, um efeito imediato nos ordenamentos jurídicos nacionais, sem que seja necessário que as autoridades nacionais adotem medidas de aplicação, algumas das suas disposições podem necessitar, para serem implementadas, da adoção de medidas de aplicação por parte dos Estados‑Membros (v., nomeadamente, acórdão de 25 de outubro de 2012, Ketelä, C‑592/11, n.o 35 e jurisprudência aí referida).

15

A esse respeito, resulta de jurisprudência constante que os Estados‑Membros podem adotar medidas de aplicação de um regulamento desde que não criem obstáculos à sua aplicabilidade direta, desde que não dissimulem a sua natureza comunitária e desde que precisem o exercício da margem de apreciação que lhes é conferida por esse regulamento, respeitando embora os limites das suas disposições (acórdão Ketelä, já referido, n.o 36 e jurisprudência aí referida).

16

É com base nas disposições aplicáveis do regulamento em causa, interpretadas à luz dos objetivos desse regulamento, que se tem de determinar se essas disposições proíbem, impõem ou permitem que os Estados‑Membros adotem certas medidas de aplicação e, nomeadamente, neste último caso, se a medida em causa se inscreve no quadro da margem de apreciação reconhecida a cada Estado‑Membro (acórdão Ketelä, já referido, n.o 37 e jurisprudência aí referida).

17

Em segundo lugar, há que lembrar que, nos termos do artigo 51.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») as suas disposições têm por destinatários os Estados‑Membros quando apliquem o direito da União. Quando procedem a essa aplicação, os Estados‑Membros são também obrigados a assegurar o respeito pelos princípios gerais do direito da União, nomeadamente os princípios da igualdade de tratamento, da segurança jurídica, da proteção da confiança legítima e da proporcionalidade (v., nomeadamente, acórdãos de 20 de junho de 2002, Mulligan e o., C-313/99, Colet., p. I-5719, n.o 46, e de 4 de junho de 2009, JK Otsa Talu, C-241/07, Colet., p. I-4323, n.o 46).

18

À luz dos elementos recordados nos n.os 15 e 16 do presente despacho, refira‑se, antes de mais, que o Regulamento n.o 1698/2005 não prevê quaisquer regras relativas a uma forma jurídica determinada que os grupos de ação local devam revestir. A este respeito, o dito regulamento limita‑se a enunciar no seu artigo 62.o, n.o 2, que a autoridade de gestão assegura que os grupos de ação local selecionem um responsável administrativo e financeiro capaz de administrar fundos públicos e garantir o funcionamento satisfatório da parceria ou se associem numa estrutura comum legalmente constituída que garanta o funcionamento satisfatório da parceria e a capacidade para administrar fundos públicos.

19

Nestas condições, e tendo nomeadamente em conta a escolha que esta última disposição confere à autoridade de gestão, o Regulamento n.o 1698/2005 não pode ser interpretado no sentido de que impõe que os Estados‑Membros prevejam que os grupos de ação local devam adotar uma forma jurídica determinada.

20

Seguidamente, há que observar que o referido artigo 62.o, n.o 2, também não pode ser interpretado no sentido de que se opõe a que os Estados‑Membros exijam que os grupos de ação local adotem uma forma jurídica determinada, privilegiando, assim, uma das formas a que se refere essa disposição.

21

Conforme resulta dos seus próprios termos, esta disposição não tem outra finalidade a não ser contribuir para garantir o bom funcionamento da parceria e a sua capacidade de gerir subvenções públicas.

22

Ora, tendo em conta, nomeadamente, as indicações contidas nos artigos 61.° e 62.°, n.o 1, do Regulamento n.o 1698/2005, do qual resulta que o grupo de ação local constitui uma parceria público‑privada que inclui uma vasta gama de parceiros privados e que deve ser dotado de poder decisório e de capacidade para definir e executar uma estratégia local de desenvolvimento pela qual é responsável, há que observar que a obrigação de recorrer a uma forma jurídica determinada na criação desse grupo pode contribuir de modo particularmente eficaz para se atingir essa finalidade. Nesta medida, a imposição dessa obrigação integra‑se, em princípio, na margem de apreciação de que dispõem os Estados‑Membros na execução do Regulamento n.o 1698/2005.

23

Por último, quanto à questão de saber se, ao adotar uma regulamentação como a que está em causa no processo principal, as autoridades nacionais respeitaram essa margem de apreciação de que dispõem na execução do Regulamento n.o 1698/2005, há que lembrar que, conforme resulta de jurisprudência constante, a necessidade de obter uma interpretação do direito da União que seja útil ao órgão jurisdicional nacional exige, nomeadamente, que este defina o quadro factual e legal em que se inserem as questões que submete ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que assentam essas questões (v., nomeadamente, acórdão de 31 de janeiro de 2008, Centro Europa 7, C-380/05, Colet., p. I-349, n.o 57 e jurisprudência aí referida).

24

Ora, a esse respeito refira‑se que, para além da afirmação de que resulta do artigo 2.o, n.os 1 a 3, do Decreto 54/2011 que, a partir de 30 de abril de 2012, só as entidades que recorram à forma jurídica de associação podem ter o título de grupo de ação local Leader, a decisão de reenvio não contém nenhuma indicação quanto às outras condições e disposições que caracterizam o novo quadro jurídico instituído, nem esclarece as características jurídicas específicas que as «associações» devem ter nos termos do direito nacional aplicável. Por outro lado, essa decisão não contém nenhuma precisão quanto ao quadro jurídico interno anterior nem indicações claras quanto aos motivos que levaram a autoridade competente a substituí‑lo por um novo.

25

Por conseguinte, há que observar que o conteúdo da decisão de reenvio não permite que o Tribunal de Justiça dê ao órgão jurisdicional de reenvio indicações que vão além das indicações de natureza geral que já foram dadas nos n.os 15 a 17 do presente despacho.

26

A esse respeito, refira‑se, nomeadamente, que as informações fornecidas nas decisões de reenvio não servem apenas para permitir ao Tribunal de Justiça dar respostas úteis, mas também para dar aos Governos dos Estados‑Membros e às demais partes interessadas a possibilidade de apresentarem observações nos termos do artigo 23.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia. Ora, segundo jurisprudência constante, compete ao Tribunal de Justiça velar pela salvaguarda dessa possibilidade, tendo em conta que, nos termos da referida disposição, apenas as decisões de reenvio são notificadas às partes interessadas (v., nomeadamente, despacho de 28 de junho de 2000, Laguillaumie, C-116/00, Colet., p. I-4979, n.o 14 e jurisprudência aí referida).

27

Nessa medida, o facto de o Governo húngaro, nas observações escritas, se ter empenhado em descrever com maior precisão o quadro regulamentar interno, sem cujo conhecimento não seria possível dar respostas, eventualmente mais precisas, às perguntas suscitadas nas questões prejudiciais, não pode sanar as referidas lacunas que caracterizam a decisão de reenvio.

28

Por outro lado, refira‑se que, embora as questões do órgão jurisdicional de reenvio visem formalmente o Regulamento n.o 1974/2006, esse órgão jurisdicional não identifica, nas questões ou no corpo da decisão de reenvio, uma disposição desse regulamento cuja interpretação peça em particular nem dá, a fortiori, explicações sobre a relação que estabelece entre essa disposição e a lide principal ou o seu objeto. Nestas condições, não há que conhecer das questões submetidas à luz do Regulamento n.o 1974/2006.

29

Em face do exposto, há que responder às três primeiras questões que as disposições do Regulamento n.o 1698/2005, em particular os seus artigos 61.° e 62.°, devem ser interpretadas no sentido de que não exigem nem, em princípio, proíbem a adoção de disposições nacionais que disponham que um grupo de ação local que preenche todas as condições enumeradas no artigo 62.o, n.o 1, desse regulamento só pode exercer a sua atividade sob uma forma jurídica determinada. Contudo, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio garantir que, tendo em conta todas as suas características relevantes, essa regulamentação não cria obstáculos à aplicabilidade direta do referido regulamento e precisa o exercício da margem de apreciação conferida por esse mesmo regulamento aos Estados‑Membros, respeitando os limites das suas disposições. Cabe‑lhe igualmente garantir que essa regulamentação nacional respeita as disposições da Carta e os princípios gerais do direito da União.

Quanto às quarta, quinta e sétima questões

30

Com as quarta, quinta e sétima questões, que devem ser analisadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o direito da União se opõe a que uma regulamentação nacional que dispõe que os grupos de ação local só podem exercer a sua atividade sob forma jurídica determinada seja aplicada, após um período transitório de um ano, a grupos de ação local validamente constituídos sob outra forma jurídica na vigência da regulamentação nacional anterior, mesmo apesar de estarem em curso os programas de ajuda e o respetivo período de programação.

31

Conforme resulta do n.o 17 do presente despacho, os Estados‑Membros têm, nomeadamente, a obrigação de, ao aprovarem uma regulamentação como a que está em causa no processo principal, respeitar a Carta e os princípios gerais do direito da União.

32

Entre esses princípios gerais figura o princípio da segurança jurídica, que exige que uma regulamentação que tenha consequências desfavoráveis para os particulares seja clara e precisa e que a sua aplicação seja previsível para os sujeitos de direito (v., nomeadamente, acórdão de 7 de junho de 2005, VEMW e o., C-17/03, Colet., p. I-4983, n.o 80 e jurisprudência aí referida).

33

O Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que um particular não pode confiar na ausência total de alteração legislativa, mas apenas pôr em causa as modalidades de aplicação de tal alteração. A esse respeito, o princípio da segurança jurídica exige, em particular, que o legislador tome em consideração as situações específicas dos operadores e preveja, sendo esse o caso, adaptações à aplicação das novas normas jurídicas (v. acórdão VEMW e o., já referido, n.o 81, e jurisprudência aí referida).

34

Neste contexto, há que observar que um período transitório de um ano para permitir que os operadores se adaptem a uma nova regulamentação como a do processo principal se revela, em princípio, razoável.

35

Quanto aos outros aspetos dessa regulamentação, há que observar que o órgão jurisdicional de reenvio não forneceu, no pedido de decisão prejudicial, indicações suficientes que permitam ao Tribunal de Justiça dar uma resposta útil que vá além dos princípios já reiterados nos n.os 15 a 17 do presente despacho e no âmbito da resposta às três primeiras questões prejudiciais.

36

Com efeito, para além da precisão relativa à duração do período transitório, a descrição do quadro jurídico interno relevante contida na decisão de reenvio revela‑se lacunar, como já se referiu no n.o 24 do presente despacho. Do mesmo modo, há que referir a inexistência, nessa mesma decisão, de quaisquer elementos de informação no que respeita, por um lado, às condições que caracterizam o reconhecimento inicial como grupo de ação local e às obrigações jurídicas de que, a esse título, a DZNLN beneficiou por parte das autoridades, e, por outro lado, às implicações concretas para uma entidade como a DZNLN resultantes da passagem à forma jurídica de associação no âmbito do novo regime jurídico instituído pelo Decreto 54/2011 ou, não procedendo a essa mudança de forma, da perda da qualidade de grupo de ação local.

37

Nestas condições, há que responder às quarta, quinta e sétima questões que o direito da União não se opõe, em princípio, a que uma regulamentação nacional que dispõe que os grupos de ação local só podem exercer a sua atividade sob uma forma jurídica determinada possa ser aplicada, após um período transitório de um ano, a grupos de ação local constituídos sob outra forma jurídica na vigência da regulamentação nacional anterior, mesmo apesar de estarem em curso os programas de ajuda e o respetivo período de programação. Contudo, isto só vale na medida em que, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, tendo em conta, nomeadamente, as características específicas das sucessivas regulamentações nacionais e os seus efeitos concretos, a aplicação da nova regulamentação a esses grupos de ação local precise o exercício da margem de apreciação conferida aos Estados‑Membros pelo Regulamento n.o 1698/2005, respeitando os limites das suas disposições, e respeite as disposições da Carta e os princípios gerais do direito da União.

Quanto à sexta questão

38

Com a sua sexta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, que implicações poderão as disposições dos Regulamentos n.os 1698/2005 e 1974/2006 ter no que respeita ao destino a dar às obrigações assumidas e aos direitos adquiridos por um grupo de ação local quando este desaparecer.

39

A este respeito, há que lembrar que, de acordo com jurisprudência constante, no âmbito da cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais instituída pelo artigo 267.o TFUE, é da competência exclusiva do juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a proferir, apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões colocadas digam respeito à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (v., designadamente, acórdão de 24 de abril de 2012, Kamberaj, C‑571/10, n.o 40 e jurisprudência aí referida).

40

Contudo, cabe ao Tribunal de Justiça analisar as condições em que os pedidos lhe são submetidos pelo juiz nacional, para verificar a sua própria competência. Com efeito, o espírito de colaboração que deve presidir ao funcionamento do reenvio prejudicial implica que, pelo seu lado, o juiz nacional tenha em consideração a função cometida ao Tribunal de Justiça, que é a de contribuir para a administração da justiça nos Estados‑Membros, e não a de formular opiniões sobre questões gerais ou hipotéticas (v. acórdão Kamberaj, já referido, n.o 41 e jurisprudência aí referida).

41

A esse respeito, a indeferimento de um pedido de decisão prejudicial apresentado por um órgão jurisdicional nacional só é possível se resultar de forma manifesta que a interpretação solicitada do direito da União não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, ou ainda quando o problema for hipotético ou o Tribunal de Justiça não disponha dos elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são submetidas (v. acórdão Kamberaj, já referido, n.o 42 e jurisprudência aí referida).

42

No caso em apreço, refira‑se que a lide principal opõe a DZNLN ao vidékfejlesztési miniszter a respeito da legalidade da decisão em que o segundo revoga o reconhecimento do primeiro como grupo de ação local.

43

Em contrapartida, não resulta de nenhum elemento da referida decisão que o litígio que o órgão jurisdicional de reenvio é chamado a decidir também seja relativo ao destino a dar a obrigações assumidas ou a direitos adquiridos por esse grupo de ação local, e não se pode deixar de observar, a esse respeito, que o órgão jurisdicional de reenvio não identificou de que modo poderá a sexta questão submetida ao Tribunal de Justiça ter uma relação com a realidade ou com o objeto do litígio que lhe foi submetido (v., neste sentido, acórdão Kamberaj, já referido, n.o 57).

44

Nestas condições, há que considerar que essa questão não diz respeito a uma interpretação do direito da União que corresponda a uma necessidade objetiva para a decisão que o órgão jurisdicional de reenvio deve proferir (v., neste sentido, despacho de 24 de março de 2011, Abt e o., C‑194/10, n.os 37 e 38 e jurisprudência aí referida).

45

Por conseguinte, a sexta questão é manifestamente inadmissível.

Quanto às despesas

46

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Nona Secção) declara:

 

1)

As disposições do Regulamento (CE) n.o 1698/2005 do Conselho, de 20 de setembro de 2005, relativo ao apoio ao desenvolvimento rural pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER), em particular os seus artigos 61.° e 62.°, devem ser interpretadas no sentido de que não exigem nem, em princípio, proíbem a adoção de disposições nacionais que disponham que um grupo de ação local que preenche todas as condições enumeradas no artigo 62.o, n.o 1, desse regulamento só pode exercer a sua atividade sob uma forma jurídica determinada. Contudo, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio garantir que, tendo em conta todas as suas características relevantes, essa regulamentação não cria obstáculos à aplicabilidade direta do referido regulamento e precisa o exercício da margem de apreciação conferida por esse mesmo regulamento aos Estados‑Membros, respeitando os limites das suas disposições. Cabe‑lhe igualmente garantir que essa regulamentação nacional respeita as disposições da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e os princípios gerais do direito da União.

 

2)

O direito da União não se opõe, em princípio, a que uma regulamentação nacional que dispõe que os grupos de ação local só podem exercer a sua atividade sob uma forma jurídica determinada possa ser aplicada, após um período transitório de um ano, a grupos de ação local constituídos sob outra forma jurídica na vigência da regulamentação nacional anterior, mesmo apesar de estarem em curso os programas de ajuda e o respetivo período de programação. Contudo, isto só vale na medida em que, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, tendo em conta, nomeadamente, as características específicas das sucessivas regulamentações nacionais e os seus efeitos concretos, a aplicação da nova regulamentação a esses grupos de ação local precise o exercício da margem de apreciação conferida aos Estados‑Membros pelo Regulamento n.o 1698/2005, respeitando os limites das suas disposições, e respeite as disposições da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e os princípios gerais do direito da União.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: húngaro.