ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção)

18 de setembro de 2014 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Artigo 56.o TFUE — Livre prestação de serviços — Restrições — Diretiva 96/71/CE — Processos de adjudicação dos contratos públicos de serviços — Regulamentação nacional que impõe aos proponentes e aos seus subcontratantes que se comprometam a pagar um salário mínimo ao pessoal que executa as prestações objeto do contrato público — Subcontratante com sede noutro Estado‑Membro»

No processo C‑549/13,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Vergabekammer bei der Bezirksregierung Arnsberg (Alemanha), por decisão de 22 de outubro de 2013, que deu entrada no Tribunal de Justiça no mesmo dia, no processo

Bundesdruckerei GmbH

contra

Stadt Dortmund,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Nona Secção),

composto por: M. Safjan, presidente de secção, A. Prechal (relatora) e K. Jürimäe, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Bundesdruckerei GmbH, por W. Krohn, Rechtsanwalt,

em representação da Stadt Dortmund, por M. Arndts, na qualidade de agente,

em representação do Governo checo, por M. Smolek, J. Vláčil e T. Müller, na qualidade de agentes,

em representação do Governo húngaro, por M. Fehér, K. Szíjjártó e M. Pálfy, na qualidade de agentes,

em representação do Governo polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por S. Grünheid, J. Enegren e A. Tokár, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 56.o TFUE e do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços (JO 1997, L 18, p. p. 1).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Bundesdruckerei GmbH (a seguir «Bundesdruckerei») à Stadt Dortmund (cidade de Dortmund, Alemanha), a propósito da obrigação que figura num caderno de encargos relativo a um contrato público de serviços da Stadt Dortmund de garantir aos trabalhadores de subcontratantes de proponentes o pagamento de um salário mínimo previsto numa regulamentação do Land da entidade adjudicante, mesmo quando o subcontratante em causa tenha sede noutro Estado‑Membro e que as prestações relativas à execução do contrato em causa aí sejam todas executadas.

Quadro jurídico

Direito da União

3

A Diretiva 96/71 prevê no seu artigo 1.o, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação»:

«1.   A presente diretiva é aplicável às empresas estabelecidas num Estado‑Membro que, no âmbito de uma prestação transnacional de serviços e nos termos do n.o 3, destaquem trabalhadores para o território de um Estado‑Membro.

[…]

3.   A presente diretiva é aplicável sempre que as empresas mencionadas no n.o 1 tomem uma das seguintes medidas transnacionais:

a)

Destacar um trabalhador para o território de um Estado‑Membro, por sua conta e sob a sua direção, no âmbito de um contrato celebrado entre a empresa destacadora e o destinatário da prestação de serviços que trabalha nesse Estado‑Membro, desde que durante o período de destacamento exista uma relação de trabalho entre a empresa destacadora e o trabalhador;

ou

b)

Destacar um trabalhador para um estabelecimento ou uma empresa do grupo situados num Estado‑Membro, desde que durante o período de destacamento exista uma relação de trabalho entre a empresa destacadora e o trabalhador;

ou

c)

Destacar, na qualidade de empresa de trabalho temporário ou de empresa que põe um trabalhador à disposição, um trabalhador para uma empresa utilizadora estabelecida no território de um Estado‑Membro ou que nele exerça a sua atividade, desde que durante o período de destacamento exista uma relação de trabalho entre o trabalhador e a empresa de trabalho temporário ou a empresa que põe o trabalhador à disposição.

[…]»

4

O artigo 3.o dessa diretiva, sob a epígrafe «Condições de trabalho e emprego», dispõe no seu n.o 1:

«Os Estados‑Membros providenciarão no sentido de que, independentemente da lei aplicável à relação de trabalho, as empresas referidas no n.o 1 do artigo 1.o garantam aos trabalhadores destacados no seu território as condições de trabalho e de emprego relativas às matérias adiante referidas que, no território do Estado‑Membro onde o trabalho for executado, sejam fixadas:

por disposições legislativas, regulamentares ou administrativas

e/ou

por convenções coletivas ou decisões arbitrais declaradas de aplicação geral na aceção do n.o 8, na medida em que digam respeito às atividades referidas no anexo:

[…]

c)

Remunerações salariais mínimas, incluindo as bonificações relativas a horas extraordinárias; a presente alínea não se aplica aos regimes complementares voluntários de reforma;

[…]

Para efeitos da presente diretiva, a noção de ‘remunerações salariais mínimas’ referida na alínea c) do n.o 1 é definida pela legislação e/ou pela prática nacional do Estado‑Membro em cujo território o trabalhador se encontra destacado.»

5

O artigo 26.o da Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO L 134, p. 114), sob a epígrafe «Condições de execução do contrato», dispunha, antes da sua revogação pela Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos e que revoga a Diretiva 2004/18/CE (JO L 94, p. 65):

«As entidades adjudicantes podem fixar condições especiais de execução do contrato desde que as mesmas sejam compatíveis com o direito comunitário e sejam indicadas no anúncio de concurso ou no caderno de encargos. [As condições] de execução de um contrato podem, designadamente, visar considerações de índole social e ambiental.»

Direito alemão

6

A Lei contra as restrições da concorrência (Gesetz gegen Wettbewerbsbeschränkungen), na sua versão publicada em 26 de junho de 2013 (BGBl. 2013 I, pp. 1750 e 3245), alterada pela última vez pelo § 2, n.o 78, da Lei de 7 de agosto de 2013 (BGBl. 2013 I, p. 3154, a seguir «GWB»), estabelece, nos termos dos seus §§ 102 a 124 um conjunto de regras que regulam os recursos em matéria de procedimentos de adjudicação de contratos públicos, incluindo as relativas ao contencioso nos Vergabekammern des Länder no que respeita à fiscalização dos contratos públicos adjudicados por entidades adjudicantes dos Länder.

7

O § 4 da Lei do Land da Renânia do Norte‑Vestefália relativa à garantia do respeito da convenção coletiva e dos padrões sociais, bem como da concorrência leal na adjudicação de contratos públicos (Gesetz über die Sicherung von Tariftreue und Sozialstandards sowie fairen Wettbewerb bei der Vergabe öffentlicher Aufträge), de 10 de janeiro de 2012 (a seguir «TVgG — NRW») dispõe:

«(1)   Os contratos públicos de serviços cuja realização se insira no âmbito de aplicação da lei relativa ao destacamento de trabalhadores, […].

(2)   Os contratos públicos […] no domínio dos transportes públicos de passageiros por estrada e por caminho de ferro […].

(3)   Os contratos públicos de serviços não abrangidos pelos n.os 1 e 2 só podem ser adjudicados a empresas que, no momento da apresentação da proposta, se comprometam por escrito, mediante uma declaração à entidade adjudicante, a pagar ao seu pessoal […], para a execução da prestação, um salário horário mínimo de, pelo menos, 8,62 euros. As empresas devem, na sua declaração de compromisso, indicar a natureza do compromisso assumido pela sua empresa no âmbito da convenção coletiva bem como o salário horário mínimo que será pago ao pessoal disponibilizado para a execução das prestações. O montante do salário horário mínimo pode ser adaptado em conformidade com o artigo 21.o, através de regulamento do Ministério do Trabalho.»

Litígio no processo principal e questão prejudicial

8

No mês de maio de 2013, a Stadt Dortmund abriu um concurso, à escala da União Europeia, que tinha por objeto um contrato público relativo à digitalização de documentos e à conversão de dados para o serviço de urbanismo daquela cidade. O valor do contrato ascendia a aproximadamente 300000 euros.

9

O n.o 2 das condições especiais do concurso, relativo à observância das disposições da TVgG — NRW, incluía um modelo de declaração a assinar pelo proponente, mediante a qual este declarava que se comprometia a pagar aos seus trabalhadores um salário horário mínimo de 8,62 euros e a exigir aos seus subcontratantes que se comprometessem, por sua vez, a respeitar esse salário mínimo.

10

Por carta de 24 de junho de 2013, a Bundesdruckerei informou a Stadt Dortmund que, se o contrato lhe fosse adjudicado, as prestações objeto do mesmo seriam exclusivamente executadas noutro Estado‑Membro, no caso concreto na Polónia, por um subcontratante estabelecido nesse mesmo Estado. Na sua carta, indicava que esse subcontratante não estava em condições de assumir o compromisso de respeitar o salário mínimo imposto pelas disposições da TVgG — NRW, uma vez que tal salário mínimo não estava previsto por convenções coletivas ou pela lei desse Estado‑Membro e que o pagamento desse salário mínimo não era habitual aí, tendo em conta as condições de vida existentes no referido Estado.

11

Nestas condições, a Bundesdruckerei pediu à Stadt Dortmund que lhe confirmasse que as obrigações previstas no n.o 2 das condições especiais do concurso, relativo à observância das disposições da TVgG — NRW, não se aplicavam ao subcontratante a quem tencionava recorrer. A Bundesdruckerei acrescentou que, na sua opinião, essas obrigações eram contrárias ao direito dos contratos públicos.

12

Por carta de 5 de agosto de 2013, a Stadt Dortmund respondeu que não podia satisfazer o pedido da Bundesdruckerei, uma vez que, enquanto entidade adjudicante pertencente ao Land da Renânia do Norte‑Vestefália, é obrigada a aplicar as disposições da TVgG — NRW e que, na sua opinião, aquelas disposições não podem ser interpretadas no sentido preconizado pela Bundesdruckerei.

13

A Bundesdruckerei recorreu para a Vergabekammer bei der Bezirksregierung Arnsberg (Secção dos contratos públicos do Governo do distrito de Arnsberg) pedindo, além do mais, que fosse ordenado à Stadt Dortmund que alterasse as especificações do concurso no sentido de as obrigações previstas no n.o 2 das condições especiais não se aplicarem aos subcontratantes estabelecidos noutro Estado‑Membro e cujos trabalhadores intervenham, na execução do contrato público, exclusivamente nesse Estado. Em apoio do seu recurso, a Bundesdruckerei alega que essas obrigações constituem uma restrição injustificada à livre prestação de serviços consagrada no artigo 56.o TFUE, uma vez que implica um encargo económico suplementar que pode impedir ou tornar menos atrativa a prestação transfronteiriça de serviços pela empresa em causa.

14

A Stadt Dortmund alega que a obrigação imposta aos subcontratantes de pagarem o salário mínimo previsto no artigo 4.o, n.o 3, da TVgG — NRW é conforme com o direito da União. Com efeito, no caso em apreço, cumpre as exigências que decorrem do acórdão Rüffert (C‑346/06, EU:C:2008:189), uma vez que essa obrigação assenta numa base legal, a saber, a TVgG — NRW. Assim, a referida obrigação podia ser imposta enquanto condição particular relativa à execução do contrato, em conformidade com o artigo 26.o da Diretiva 2004/18. Além disso, essa obrigação legal justifica‑se, uma vez que, como indicou o legislador nacional na exposição de motivos da TVgG — NRW, garante que seja paga uma remuneração razoável aos trabalhadores afetos à execução de obras públicas, o que alivia igualmente os sistemas de segurança social.

15

A Vergabekammer bei der Bezirksregierung Arnsberg considera, em primeiro lugar, que deve ser qualificada de «órgão jurisdicional», na aceção do artigo 267.o TFUE, pelo que é competente para submeter ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial. Invoca a este respeito o acórdão Forposta (anteriormente Praxis) e ABC Direct Contact (C‑465/11, EU:C:2012:801).

16

Em seguida, considera que não resulta da redação do artigo 4.o, n.o 3, da TVgG — NRW que a obrigação prevista nessa disposição seja aplicável aos proponentes de um contrato público que decidam subcontratar a execução das prestações que são objeto desse contrato a operadores estabelecidos exclusivamente noutro Estado‑Membro da União, uma vez que a referida disposição não fornece indicações quanto ao seu âmbito de aplicação territorial. Pode, quando muito, deduzir‑se da finalidade da TVgG — NRW, na medida em que visa assegurar o pagamento de um salário conveniente aos trabalhadores que executam um contrato público adjudicado no Land da Renânia do Norte‑Vestefália, que o seu artigo 4.o, n.o 3, é aplicável em todo o território alemão.

17

Por último, a Vergabekammer bei der Bezirksregierung Arnsberg considera que a extensão desse salário mínimo a trabalhadores que executem contratos públicos fora do território alemão constitui uma restrição à livre prestação de serviços e uma discriminação indireta relativamente aos proponentes que forneçam as suas prestações noutros Estados‑Membros com estruturas de custos muito diferentes.

18

Considera que essa restrição não pode ser justificada pela razão imperiosa de interesse geral que constitui a proteção dos trabalhadores. Com efeito, face à grande disparidade do custo de vida nos diferentes Estados‑Membros da União, a imposição desse salário mínimo aos referidos trabalhadores não é suscetível de permitir alcançar o objetivo legítimo de garantir uma remuneração conveniente no quadro da execução de contratos públicos das entidades adjudicantes do Land da Renânia do Norte‑Vestefália e não seria também necessária para esse fim. O montante horário correspondente a esse salário mínimo seria, para numerosos Estados‑Membros, claramente superior ao que é exigido para assegurar uma remuneração conveniente à luz do custo de vida existente nesses países. Além disso, tratando‑se de contratos públicos inteiramente executados fora do território alemão, não se pode excluir que o interesse geral ligado à proteção dos trabalhadores já seja tido em conta pela legislação do Estado‑Membro em que a prestação é fornecida.

19

Foi nestas condições que a Vergabekammer bei der Bezirksregierung Arnsberg decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 56.o TFUE e o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 96/71/CE opõem‑se a uma disposição do direito nacional e/ou a uma condição de adjudicação imposta por uma entidade adjudicante, nos termos da qual um proponente que pretende que lhe seja adjudicado um dos contratos públicos publicados 1.) se deve vincular a pagar ao pessoal utilizado para a execução do contrato um salário convencional ou um salário mínimo previsto na legislação e 2.) deve impor a um subcontratante contratado ou que prevê contratar uma obrigação semelhante e apresentar ainda à entidade adjudicante uma correspondente declaração de compromisso do subcontratante quando a) a disposição legal apenas prevê uma obrigação deste tipo para a adjudicação de contratos públicos mas não para a concessão de contratos privados e b) o subcontratante tem a sua sede noutro Estado‑Membro da UE e os seus trabalhadores, para executarem as prestações objeto do contrato, trabalham exclusivamente no país de origem do subcontratante?»

Quanto à questão prejudicial

Quanto à admissibilidade

20

A título preliminar, há que verificar se a Vergabekammer bei der Bezirksregierung Arnsberg constitui um «órgão jurisdicional», na aceção do artigo 267.o TFUE e, como tal, se o pedido de decisão prejudicial é admissível.

21

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, para apreciar se o organismo de reenvio tem a natureza de «órgão jurisdicional» na aceção do artigo 267.o TFUE, questão que é unicamente do âmbito do direito da União, o Tribunal de Justiça tem em conta um conjunto de elementos, como a origem legal do organismo, a sua permanência, o caráter vinculativo da sua jurisdição, a natureza contraditória do processo, a aplicação, pelo organismo, das normas de direito, bem como a sua independência [acórdãos HI, C‑92/00, EU:C:2002:379, n.o 25, e Forposta (anteriormente Praxis) e ABC Direct Contact, EU:C:2012:801, n.o 17].

22

A este respeito, resulta de forma evidente dos artigos 104.° e 105.° da GWB, disposições que regem o contencioso em matéria de contratos públicos nas Vergabekammern, que esses organismos, dotados de uma competência exclusiva para dirimir em primeira instância litígios entre operadores económicos e entidades adjudicantes, respondem, quando são chamados a exercer a referida competência, aos critérios recordados no n.o 21 do presente acórdão [v., por analogia, relativamente às entidades de fiscalização dos contratos públicos, acórdãos HI, EU:C:2002:379, n.os 26 e 27, e Forposta (anteriormente Praxis) e ABC Direct Contact, EU:C:2012:801, n.o 18].

23

Resulta do exposto que a Vergabekammer bei der Bezirksregierung Arnsberg deve ser qualificada de «órgão jurisdicional», na aceção do artigo 267. TFUE, pelo que o seu pedido de decisão prejudicial é admissível.

Quanto ao mérito

24

Quanto ao alcance da questão prejudicial, importa constatar que, ao contrário da situação em causa noutros processos, como as que deram origem ao acórdão Rüffert (EU:C:2008:189), a Diretiva 96/71 não é aplicável ao litígio no processo principal.

25

Com efeito, é pacífico que o proponente que interpôs recurso no processo principal não pretende executar o contrato público no território alemão através do destacamento de trabalhadores do seu subcontratante, uma filial a 100% com sede na Polónia.

26

Pelo contrário, nos próprios termos da questão prejudicial, esta diz respeito a uma situação na qual «o subcontratante tem a sua sede noutro Estado‑Membro da EU [diferente da Alemanha] e os seus trabalhadores, para executarem as prestações objeto do contrato, trabalham exclusivamente no país de origem do subcontratante».

27

Essa situação não remete para nenhuma das três medidas transnacionais referidas no artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 96/71, pelo que não é aplicável ao litígio no processo principal.

28

Além disso, embora, conforme alega a Comissão Europeia, o contrato público em causa no processo principal pareça, tendo em conta o seu objeto e o montante do contrato, entrar no âmbito de aplicação da Diretiva 2004/18 e admitindo que as exigências em matéria de salário mínimo prescritas pelo § 4, n.o 3, da TVgG — NRW possam ser qualificadas de «condições especiais de execução do contrato», em particular de «considerações de índole social», que sejam «indicadas no anúncio de concurso ou no caderno de encargos», na aceção do artigo 26.o dessa diretiva, não é menos verdade que, em conformidade com esta última disposição, tais exigências só podem ser impostas na medida em que sejam «compatíveis com o direito comunitário».

29

Daqui decorre que, com a sua questão, a Vergabekammer bei der Bezirksregierung Arnsberg pergunta, em substância, se, numa situação como a do processo principal, em que um proponente pretende executar um contrato público recorrendo exclusivamente a trabalhadores contratados por um subcontratante com sede num Estado‑Membro diferente do da entidade adjudicante, o artigo 56. TFUE se opõe à aplicação de uma regulamentação do Estado‑Membro dessa entidade adjudicante que obriga esse subcontratante a pagar aos referidos trabalhadores um salário mínimo fixado por essa regulamentação.

30

A este respeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a imposição, por força de uma regulamentação nacional, de uma remuneração mínima aos subcontratantes de um proponente estabelecidos num Estado‑Membro diferente do da entidade adjudicante e no qual os salários mínimos são inferiores constitui um encargo económico suplementar que é suscetível de impedir, perturbar ou tornar menos atrativa a execução das suas prestações no Estado‑Membro de acolhimento. Por conseguinte, uma medida como a que está em causa no processo principal é suscetível de constituir uma restrição, na aceção do artigo 56.o TFUE (v., nesse sentido, acórdão Rüffert, EU:C:2008:189, n.o 37).

31

Tal medida nacional pode, em princípio, justificar‑se pelo objetivo da proteção dos trabalhadores a que o legislador do Land da Renânia do Norte‑Vestefália se referiu expressamente no projeto de lei que conduziu à adoção da TVgG — NRW, a saber, assegurar que seja pago um salário conveniente aos trabalhadores a fim de evitar respetivamente o «dumping social» e a penalização das empresas concorrentes que concedam um salário conveniente aos seus trabalhadores.

32

Como tal, o Tribunal de Justiça já declarou que, na medida em que é aplicável apenas aos contratos públicos, tal medida nacional não é adequada para alcançar o referido objetivo se não existirem indícios que levem a pensar que trabalhadores ativos no mercado privado não têm necessidade da mesma proteção salarial que os que trabalham no âmbito da contratação pública (v., neste sentido, acórdão Rüffert, EU:C:2008:189, n.os 38 a 40).

33

Em todo o caso, a regulamentação nacional em causa no processo principal, na medida em que o seu âmbito de aplicação se alarga a uma situação como a que está em causa no litígio no processo principal, na qual trabalhadores executam um contrato público num Estado‑Membro diferente do da entidade adjudicante e no qual os salários mínimos são inferiores, afigura‑se desproporcionada.

34

Com efeito, essa regulamentação, ao impor, nessa situação, um salário mínimo fixo que corresponde ao exigido para assegurar uma remuneração conveniente aos trabalhadores do Estado‑Membro da entidade adjudicante à luz do custo de vida existente nesse Estado‑Membro, mas que não tem relação com o custo de vida prevalecente no Estado‑Membro no qual serão efetuadas as prestações relativas ao contrato público em causa, impedindo, assim, os subcontratantes estabelecidos neste último Estado‑Membro de retirar uma vantagem competitiva das diferenças existentes entre os salários respetivos, excede o necessário para assegurar que seja alcançado o objetivo da proteção dos trabalhadores.

35

A medida de proteção salarial em causa no processo principal também não pode ser justificada à luz do objetivo de estabilidade dos regimes de segurança social. Com efeito, não foi alegado e não se afigura, de resto, defensável que a aplicação dessa medida aos trabalhadores polacos em causa fosse necessária para evitar um risco grave para o equilíbrio do sistema de segurança social alemão (v., por analogia, acórdão Rüffert, EU:C:2008:189, n.o 42). Se esses trabalhadores não recebessem um salário conveniente e, por conseguinte, fossem obrigados a recorrer à segurança social para assegurar um nível mínimo de poder de compra, teriam direito aos auxílios sociais polacos. Ora, tal consequência não afetaria obviamente o sistema de segurança social alemão.

36

Face às considerações anteriores, há que responder à questão submetida que, numa situação como a que está em causa no processo principal, em que um proponente pretende executar um contrato público recorrendo exclusivamente a trabalhadores contratados por um subcontratante estabelecido num Estado‑Membro diferente do da entidade adjudicante, o artigo 56.o° TFUE opõe‑se à aplicação de uma regulamentação do Estado‑Membro dessa entidade adjudicante que obriga esse subcontratante a pagar aos referidos trabalhadores um salário mínimo fixado por essa regulamentação.

Quanto às despesas

37

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Nona Secção) declara:

 

Numa situação como a que está em causa no processo principal, em que um proponente pretende executar um contrato público recorrendo exclusivamente a trabalhadores contratados por um subcontratante estabelecido num Estado‑Membro diferente do da entidade adjudicante, o artigo 56.o TFUE opõe‑se à aplicação de uma regulamentação do Estado‑Membro dessa entidade adjudicante que obriga esse subcontratante a pagar aos referidos trabalhadores um salário mínimo fixado por essa regulamentação.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.