ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

12 de junho de 2014 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas contra a Bielorrússia — Congelamento de fundos e de recursos económicos — Derrogações — Pagamento de honorários profissionais associados à prestação de serviços jurídicos — Poder de apreciação da autoridade nacional competente — Direito a uma proteção jurisdicional efetiva — Incidência da origem ilegal dos fundos — Inexistência»

No processo C‑314/13,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Lietuvos vyriausiasis administracinis teismas (Lituânia), por decisão de 3 de maio de 2013, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 7 de junho de 2013, no processo

Užsienio reikalų ministerija,

Finansinių nusikaltimų tyrimo tarnyba

contra

Vladimir Peftiev,

BelTechExport ZAO,

Sport‑Pari ZAO,

BT Telecommunications PUE,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: T. von Danwitz, presidente de secção, E. Juhász, A. Rosas (relator), D. Šváby e C. Vajda, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação de V. Peftiev, da BelTechExport ZAO, da Sport‑Pari ZAO e da BT Telecommunications PUE, por V. Vaitkutė Pavan e E. Matulionytė, advokatės,

em representação do Governo lituano, por D. Kriaučiūnas e J. Nasutavičienė, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por M. Konstantinidis e A. Steiblytė, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.o 765/2006 do Conselho, de 18 de maio de 2006, que impõe medidas restritivas contra a Bielorrússia (JO L 134, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento de Execução (UE) n.o 84/2011 do Conselho, de 31 de janeiro de 2011 (JO L 28, p. 17), e pelo Regulamento (UE) n.o 588/2011 do Conselho, de 20 de junho de 2011 (JO L 161, p. 1, a seguir «Regulamento n.o 765/2006»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o Užsienio reikalų ministerija (Ministério dos Negócios Estrangeiros) e o Finansinių nusikaltimų tyrimo tarnyba (Serviço de Investigação da Criminalidade Financeira do Ministério da Administração Interna) a V. Peftiev, à BelTechExport ZAO, à Sport‑Pari ZAO e à BT Telecommunications PUE (a seguir «recorridos no processo principal») a respeito de medidas restritivas adotadas contra estes.

Quadro jurídico

3

O considerando 1 do Regulamento n.o 765/2006 tem a seguinte redação:

«Em 24 de março de 2006, o Conselho Europeu deplorou a incapacidade das autoridades da Bielorrússia de respeitarem os compromissos assumidos no âmbito da [Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE)] em matéria de eleições democráticas, considerou que as eleições presidenciais de 19 de março de 2006 foram, no essencial, marcadas por irregularidades e condenou a intervenção das autoridades da Bielorrússia, nomeadamente a detenção nesse dia de manifestantes pacíficos que exerciam o direito legítimo de liberdade de reunião para protestarem contra a forma como estavam a decorrer as eleições presidenciais. O Conselho Europeu decidiu, por conseguinte, aplicar medidas restritivas contra os responsáveis pela violação das regras internacionais em matéria de eleições.»

4

O artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 765/2006 prevê o congelamento dos fundos e recursos económicos pertencentes ao Presidente Lukashenko e a alguns outros funcionários da República da Bielorrússia, bem como às pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos a eles associados, conforme identificados no Anexo I deste regulamento.

5

O artigo 2.o, n.o 2, do Regulamento n.o 765/2006 prevê que é proibido colocar, direta ou indiretamente, fundos ou recursos económicos à disposição das pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos enumerados que figuram nas listas do Anexo I deste regulamento, ou disponibilizá‑los em seu benefício.

6

O artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 765/2006 dispõe:

«Em derrogação do disposto no artigo 2.o, as autoridades competentes dos Estados‑Membros, indicadas nos sítios web enumerados no Anexo II, podem autorizar o desbloqueamento de determinados fundos ou recursos económicos congelados ou a disponibilização de determinados fundos ou recursos económicos, nas condições que considerem adequadas, após terem determinado que os fundos ou recursos económicos:

a)

São necessários para cobrir despesas básicas das pessoas enumeradas no Anexo I ou no Anexo I‑A e dos respetivos membros do agregado familiar, incluindo os pagamentos de géneros alimentícios, rendas ou empréstimos hipotecários, medicamentos e tratamentos médicos, impostos, apólices de seguro e serviços públicos;

b)

Se destinam exclusivamente ao pagamento de honorários profissionais razoáveis e ao reembolso de despesas associadas com a prestação de serviços jurídicos; [...]

[...]»

7

Segundo as informações que figuram no sítio web referido no anexo II do Regulamento n.o 765/2006, a autoridade competente na Lituânia é o Užsienio reikalų ministerija.

8

Segundo o ponto 3 do documento do Conselho intitulado «Melhores práticas da [União Europeia] para a implementação eficaz de medidas restritivas», na sua versão de 24 de abril de 2008 (documento 8666/1/08 VER 1, a seguir «melhores práticas»), estas devem ser consideradas recomendações não exaustivas de caráter geral para a implementação eficaz de medidas restritivas, de acordo com a legislação da União e com a legislação nacional. Tais recomendações não têm caráter vinculativo, nem devem ser interpretadas no sentido de que preconizam qualquer tipo de atuação que possa ser incompatível com a legislação da União ou com a legislação nacional aplicável, nomeadamente em matéria de proteção de dados.

9

Incluídos no título C, capítulo VII, das melhores práticas, intitulado «Isenções por motivos humanitários», os pontos 54 e 55 têm a seguinte redação:

«54

Esta secção incide exclusivamente sobre a aplicação das isenções por motivos humanitários, que se destinam a garantir a satisfação das necessidades básicas das pessoas designadas, não tomando em consideração outro tipo de isenções (p. ex.: para cobrir despesas de contencioso ou de caráter extraordinário).

55

Sem deixar de atuar em plena consonância com a letra e o espírito dos regulamentos, a autoridade competente terá em conta os direitos fundamentais quando conceder isenções para satisfação das necessidades básicas.»

10

Incluídos no título C, capítulo VIII, das melhores práticas, intitulado «Orientações para a análise dos pedidos de isenção», os pontos 57 e 59 a 61 enunciam:

«57

As pessoas e entidades designadas podem pedir autorização para utilizar os seus fundos ou recursos económicos congelados, por exemplo para satisfazer um credor. [...]

[...]

59

Uma pessoa ou entidade que deseje disponibilizar fundos ou recursos económicos a uma pessoa ou entidade designada deve pedir autorização para tal. Ao analisar tais pedidos, as autoridades competentes deveriam, nomeadamente, ter em conta quaisquer provas apresentadas em justificação do pedido, e ponderar se os laços do requerente com a pessoa ou entidade designada são de molde a sugerir que poderiam estar ambos conluiados para contornar as medidas de congelamento.

60

Ao analisar pedidos de autorização para utilizar ou disponibilizar fundos ou recursos económicos congelados, as autoridades competentes deveriam efetuar quaisquer investigações suplementares que considerassem adequadas às circunstâncias, nomeadamente consultas a quaisquer outros Estados‑Membros interessados. As autoridades competentes deveriam ainda ponderar as condições ou garantias destinadas a evitar que os fundos ou recursos económicos libertados fossem utilizados para fins incompatíveis com a finalidade da isenção. Assim, por exemplo, as transferências bancárias diretas poderiam ser preferíveis aos pagamentos em dinheiro.

Sempre que necessário, haveria também que ponderar as condições e limitações apropriadas (por exemplo, a quantidade ou o valor de revenda dos fundos ou recursos económicos que podem ser disponibilizados cada mês) ao conceder uma autorização, tendo em conta os critérios enunciados nos regulamentos. Todas as autorizações deveriam ser concedidas por escrito e previamente à disponibilização dos fundos ou recursos económicos em causa.

61

Os regulamentos obrigam as autoridades competentes a informarem o requerente e os outros Estados‑Membros sobre se o pedido foi deferido. [...]»

Factos no processo principal e questões prejudiciais

11

Através do Regulamento n.o 588/2011 e a Decisão 2011/357/PESC do Conselho, de 20 de junho de 2011, que altera a Decisão 2010/639/PESC respeitante à adoção de medidas restritivas contra alguns altos funcionários da Bielorrússia (JO L 161, p. 25), os recorridos no processo principal foram inscritos nas listas das pessoas sujeitas a medidas restritivas aplicáveis nos Estados‑Membros da União.

12

A fim de contestar essas medidas restritivas, solicitaram os serviços de um escritório de advogados lituano, que interpôs recursos de anulação no Tribunal Geral da União Europeia [processos BelTechExport/Conselho, T‑438/11 (JO 2011, C 290, p. 15); Sport Pari/Conselho, T‑439/11 (JO 2011, C 290, p. 15); BT Telecommunications/Conselho, T‑440/11 (JO 2011, C 290, p. 16); e Peftiev/Conselho, T‑441/11 (JO 2011, C 290, p. 17)].

13

Em 3 de agosto de 2011, esse escritório de advogados emitiu em nome dos recorridos no processo principal quatro faturas pelos serviços jurídicos prestados, com base nas quais os referidos recorridos transferiram para a conta bancária desse escritório os montantes em causa. Contudo, em conformidade com as medidas restritivas decretadas pela União, os montantes transferidos foram congelados na conta bancária do referido escritório de advogados.

14

Entre 2 e 6 de dezembro de 2011, em conformidade com as disposições do artigo 3.o do Regulamento n.o 765/2006, os recorridos no processo principal pediram ao Užsienio reikalų ministerija e ao Finansinių nusikaltimų tyrimo tarnyba para não aplicarem as medidas de congelamento dos recursos financeiros, na medida em que os mesmos eram necessários para pagar os serviços jurídicos em causa.

15

Por decisões de 4 de janeiro de 2012, o Užsienio reikalų ministerija decidiu não conceder aos recorridos no processo principal a isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006. Nas referidas decisões é precisado que «foram tidas em conta todas as circunstâncias jurídicas e políticas». O órgão jurisdicional de reenvio indica que, durante a apreciação do processo administrativo, o Užsienio reikalų ministerija afirmou ter informações segundo as quais os recursos dos recorridos no processo principal destinados a pagar os serviços jurídicos prestados pelo escritório de advogados em causa tinham sido obtidos ilegalmente.

16

Em 19 de janeiro de 2012, o Finansinių nusikaltimų tyrimo tarnyba tomou decisões em que indica não poder deferir os pedidos de isenção apresentados pelos recorridos no processo principal devido à recusa do Užsienio reikalų ministerija.

17

Os recorridos no processo principal interpuseram no Vilniaus apygardos administracinis teismas (Tribunal Administrativo Regional de Vilnius) um recurso em que pediam a anulação das decisões de 4 de janeiro de 2012 do Užsienio reikalų ministerija e das decisões de 19 de janeiro de 2012 do Finansinių nusikaltimų tyrimo tarnyba e que fosse ordenado a estas entidades que procedessem a uma nova apreciação dos seus pedidos e adotassem decisões fundamentadas, tendo em conta a legislação aplicável.

18

Por acórdão de 27 de agosto de 2012, o Vilniaus apygardos administracinis teismas deu provimento na totalidade ao recurso dos recorridos no processo principal e remeteu os seus pedidos para reapreciação ao Užsienio reikalų ministerija e ao Finansinių nusikaltimų tyrimo tarnyba.

19

O Užsienio reikalų ministerija interpôs recurso do acórdão do Vilniaus apygardos administracinis teismas para o Lietuvos vyriausiasis administracinis teismas (Supremo Tribunal Administrativo da Lituânia), em que pedia a anulação desse acórdão e que fosse proferido um novo acórdão. O Finansinių nusikaltimų tyrimo tarnyba formulou um pedido idêntico.

20

No órgão jurisdicional de reenvio, o Užsienio reikalų ministerija, baseando‑se no disposto no artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006, alega que dispõe de um poder de apreciação absoluto para decidir se concede ou não a isenção em causa. Esta interpretação é corroborada pelo facto de se tratar de questões políticas relativas às relações externas dos Estados‑Membros com outros Estados, domínio em que as autoridades dos Estados‑Membros devem dispor de uma ampla margem de atuação.

21

O órgão jurisdicional de reenvio considera, no entanto, à luz das melhores práticas e da jurisprudência do Tribunal de Justiça, que a interpretação da referida disposição deve ter em conta a necessidade de assegurar a proteção dos direitos fundamentais, nomeadamente o direito a uma proteção jurisdicional efetiva. Afirma, a este respeito, que a única possibilidade de anular as medidas restritivas consiste em interpor um recurso no Tribunal Geral, mas que, para tal, em conformidade com os artigos 43.° e 44.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, é indispensável fazer‑se representar por um advogado. O órgão jurisdicional de reenvio salienta, por último, que, em processos desta natureza, o Tribunal Geral aprecia de forma exaustiva os pedidos de assistência judiciária submetidos pelos recorrentes e, quando esta é necessária, defere tais pedidos.

22

Nestas condições, o Lietuvos vyriausiasis administracinis teismas decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 […] ser interpretado no sentido de que a autoridade responsável pela aplicação da isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, alínea b), desse regulamento dispõe de um poder discricionário absoluto ao decidir sobre a concessão dessa isenção?

2)

Em caso de resposta negativa à primeira questão, que critérios devem orientar e vincular essa autoridade ao decidir sobre a concessão da isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 [...]?

3)

Deve o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 […] ser interpretado no sentido de que a referida autoridade competente deve ter em conta, na avaliação sobre se a isenção solicitada deve ou não ser concedida, designadamente, o facto de que os recorrentes, com a apresentação do seu pedido, visam exercer os respetivos direitos fundamentais (no presente processo, o direito à proteção jurisdicional efetiva), mas deve também garantir, no caso de a isenção ser concedida, que o objetivo da sanção prevista não é posto em causa e que a isenção não é utilizada de forma abusiva (por exemplo, pelo facto de o montante destinado a assegurar um recurso jurisdicional ser manifestamente desproporcionado em relação à importância dos serviços jurídicos)?

4)

Deve o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 […] ser interpretado no sentido de que a natureza ilegal da aquisição dos fundos, a cuja utilização se destina a aplicação da isenção prevista nessa disposição, constitui um fundamento suscetível de justificar a não concessão dessa isenção?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira a terceira questões

23

Com a primeira a terceira questões, que devem ser examinadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 deve ser interpretado no sentido de que, quando se pronuncia sobre um pedido de isenção apresentado em conformidade com essa disposição com vista a interpor um recurso que tem por objeto contestar a legalidade das medidas restritivas impostas pela União, a autoridade nacional competente dispõe de um poder discricionário absoluto e, em caso de resposta negativa, quais são os elementos e os critérios que essa autoridade deve ter em consideração.

24

Há que assinalar que, ao decidir sobre um pedido de desbloqueamento de fundos congelados, em conformidade com o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006, a autoridade nacional competente aplica o direito da União. Daqui resulta que está obrigada a respeitar a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), nos termos do artigo 51.o, n.o 1, da referida Carta.

25

Tendo o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 por objetivo facilitar o acesso a serviços jurídicos, deve, consequentemente, ser objeto de uma interpretação que respeite as exigências decorrentes do artigo 47.o da Carta. O artigo 47.o, segundo parágrafo, segundo período, da Carta, relativo ao direito à ação, prevê que toda a pessoa tem a possibilidade de se fazer aconselhar, defender e representar em juízo. O terceiro parágrafo do referido artigo prevê expressamente que é concedida assistência judiciária a quem não disponha de recursos suficientes, na medida em que essa assistência seja necessária para garantir a efetividade do acesso à justiça.

26

Assim, o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 deve ser interpretado em conformidade com o artigo 47.o da Carta no sentido de que um congelamento de fundos não pode ter como consequência privar as pessoas cujos fundos foram congelados de um acesso efetivo à justiça.

27

No caso em apreço, deve recordar‑se que, segundo o artigo 19.o, terceiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e o artigo 43.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, um recurso como o que foi interposto pelos recorridos no processo principal e que é objeto da decisão de reenvio só pode ser assinado por um advogado.

28

A exigência imposta pelo artigo 19.o do Estatuto do Tribunal de Justiça baseia‑se no facto de o advogado ser considerado um colaborador da justiça chamado a prestar, com toda a independência e no interesse superior da mesma, a assistência legal de que o cliente necessita (v., neste sentido, acórdãos, AM & S Europe/Comissão, 155/79, EU:C:1982:157, n.o 24; Akzo Nobel Chemicals e Akcros Chemicals/Comissão, C‑550/07 P, EU:C:2010:512, n.o 42; e Prezes Urzędu Komunikacji Elektronicznej e Polónia/Comissão, C‑422/11 P e C‑423/11 P, EU:C:2012:553, n.o 23). Por outro lado, o Tribunal de Justiça já declarou que, não estando prevista no Estatuto do Tribunal de Justiça ou no seu Regulamento de Processo qualquer derrogação ou exceção a esta obrigação, a apresentação de uma petição assinada pelo próprio recorrente não pode, portanto, bastar para efeito de interposição de um recurso (v. despacho Correia de Matos/Parlamento, C‑502/06 P, EU:C:2007:696, n.o 12).

29

Resulta destes elementos que, ao decidir sobre um pedido de isenção relativo ao congelamento dos fundos e dos recursos económicos em conformidade com o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006, a autoridade nacional competente não dispõe de um poder discricionário absoluto, mas deve exercer as suas competências respeitando os direitos previstos no artigo 47.o, segundo parágrafo, segundo período, da Carta e, numa situação como a que está em causa no processo principal, o caráter indispensável da representação por um advogado para interpor um recurso cujo objeto é contestar a legalidade de medidas restritivas.

30

O Governo lituano alega que, em si, a recusa de conceder a isenção prevista no artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 não viola a essência do direito a uma proteção jurisdicional efetiva, mesmo que a pessoa, singular ou coletiva, que presta os serviços jurídicos, pudesse dispor dos recursos financeiros que lhe são devidos depois do levantamento da medida de congelamento dos fundos e dos recursos económicos. Todavia, este argumento parte do princípio de que o recurso interposto terá sucesso, quando afinal pode fracassar. Por outro lado, um Estado‑Membro não pode exigir que um profissional no domínio dos serviços jurídicos suporte esse risco e esse custo financeiro, quando o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 prevê a concessão de uma isenção ao congelamento dos fundos e dos recursos económicos para garantir o pagamento de honorários profissionais razoáveis e o reembolso de despesas associadas à prestação de serviços jurídicos.

31

Quanto à objeção do Governo lituano de que os recorridos no processo principal podiam pedir a assistência judiciária prevista no direito nacional para obter o patrocínio de um advogado, há que observar que, mediante o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006, o legislador da União instituiu um sistema coerente que permite assegurar o respeito dos direitos garantidos pelo artigo 47.o da Carta, não obstante o congelamento dos fundos. Quando deve obter os serviços jurídicos de que necessita, uma pessoa incluída na lista que constitui o Anexo I deste regulamento não pode ser considerada indigente devido à existência desse congelamento, mas, pelo contrário, deve pedir para o efeito o desbloqueamento de certos fundos ou recursos congelados, desde que estejam reunidos todos os requisitos previstos na referida disposição. Em si mesmo, o referido artigo 3.o, n.o 1, alínea b), opõe‑se, assim, a que a autoridade nacional competente recuse autorizar o desbloqueamento de fundos pelo facto de a referida pessoa poder recorrer à assistência judiciária.

32

No que respeita aos critérios que a autoridade nacional competente deve tomar em consideração ao pronunciar‑se sobre um pedido de isenção, há que observar que o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 prevê limitações à utilização dos fundos, dado que estes se devem destinar exclusivamente ao pagamento de honorários profissionais razoáveis e ao reembolso de despesas associadas à prestação de serviços jurídicos.

33

Por último, para controlar da melhor forma a utilização dos fundos desbloqueados, a autoridade nacional competente pode ter em conta as recomendações previstas no título C, capítulo VII, relativo às isenções por motivos humanitários, das melhores práticas, aplicáveis mutatis mutandis ao pedido de isenção em questão no processo principal, na medida em que esta se destina a proporcionar uma proteção jurisdicional efetiva mediante a interposição de um recurso contra as medidas restritivas aplicadas aos recorridos no processo principal. Segundo as melhores práticas, a autoridade nacional competente pode fixar as condições que considere adequadas para assegurar, nomeadamente, que o objetivo da sanção aplicada não seja ignorado e que a isenção concedida não seja contornada. Essa autoridade pode, nomeadamente, privilegiar as transferências bancárias relativamente aos pagamentos em dinheiro.

34

Tendo em conta estes elementos, há que responder à primeira a terceira questões do seguinte modo:

O artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 deve ser interpretado no sentido de que, quando se pronuncia sobre um pedido de isenção apresentado em conformidade com essa disposição com vista a interpor um recurso que tem por objeto contestar a legalidade das medidas restritivas impostas pela União, a autoridade nacional competente não dispõe de um poder discricionário absoluto, mas deve exercer as suas competências respeitando os direitos previstos no artigo 47.o, segundo parágrafo, segundo período, da Carta e o caráter indispensável da representação por um advogado para interpor um recurso dessa natureza no Tribunal Geral.

A autoridade nacional competente pode verificar se os fundos cujo desbloqueamento é solicitado se destinam exclusivamente ao pagamento de honorários profissionais razoáveis e ao reembolso de despesas associadas à prestação de serviços jurídicos. Pode também fixar as condições que considere adequadas para garantir, nomeadamente, que o objetivo da sanção aplicada não seja ignorado e que a isenção concedida não seja contornada.

Quanto à quarta questão

35

Com a quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 deve ser interpretado no sentido de que um dos fundamentos que pode justificar a não aplicação da exceção prevista nessa disposição pode ser a ilegalidade da aquisição dos fundos cuja utilização é invocada para a aplicação dessa exceção.

36

Como salientam os recorridos no processo principal e a Comissão Europeia, uma apreensão ou um confisco de fundos adquiridos ilegalmente pode ser efetuado em aplicação de diversas regulamentações que têm origem quer no direito da União quer no direito nacional.

37

Essas regulamentações são diferentes do Regulamento n.o 765/2006, em aplicação do qual os fundos dos recorridos no processo principal foram congelados. Com efeito, esse regulamento não tem por objeto punir a aquisição ilegal de fundos, mas, como decorre do seu considerando 1, aplicar medidas restritivas contra os responsáveis pela violação das normas internacionais em matéria eleitoral por ocasião das eleições de 19 de março de 2006 na Bielorrússia.

38

Consequentemente, o congelamento dos fundos e dos recursos económicos dos recorridos no processo principal deve ser efetuado em conformidade com as disposições do Regulamento n.o 765/2006, que prevê as modalidades desse congelamento dos fundos e dos recursos económicos e o regime aplicável a esses fundos e a esses recursos económicos.

39

Assim, uma isenção ao congelamento dos fundos e dos recursos económicos para pagar serviços jurídicos deve ser apreciada em conformidade com o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006, que não faz nenhuma alusão à origem dos fundos e à sua eventual aquisição ilegal.

40

Assim, há que responder à quarta questão que o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006 deve ser interpretado no sentido de que, numa situação como a que está em causa no processo principal, em que um congelamento dos fundos e dos recursos económicos se baseia no referido regulamento, a isenção ao congelamento dos fundos ou dos recursos económicos para pagar serviços jurídicos deve ser apreciada em conformidade com essa disposição, que não faz nenhuma alusão à origem dos fundos e à sua eventual aquisição ilegal.

Quanto às despesas

41

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

 

1)

O artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.o 765/2006 do Conselho, de 18 de maio de 2006, que impõe medidas restritivas contra a Bielorrússia, conforme alterado pelo Regulamento de Execução (UE) n.o 84/2011 do Conselho, de 31 de janeiro de 2011, e pelo Regulamento (UE) n.o 588/2011 do Conselho, de 20 de junho de 2011, deve ser interpretado no sentido de que, quando se pronuncia sobre um pedido de isenção apresentado em conformidade com essa disposição com vista a interpor um recurso que tem por objeto contestar a legalidade das medidas restritivas impostas pela União Europeia, a autoridade nacional competente não dispõe de um poder discricionário absoluto, mas deve exercer as suas competências respeitando os direitos previstos no artigo 47.o, segundo parágrafo, segundo período, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e o caráter indispensável da representação por um advogado para interpor um recurso dessa natureza no Tribunal Geral da União Europeia.

A autoridade nacional competente pode verificar se os fundos cujo desbloqueamento é solicitado se destinam exclusivamente ao pagamento de honorários profissionais razoáveis e ao reembolso de despesas associadas à prestação de serviços jurídicos. Pode também fixar as condições que considere adequadas para garantir, nomeadamente, que o objetivo da sanção aplicada não seja ignorado e que a isenção concedida não seja contornada.

 

2)

O artigo 3.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 765/2006, conforme alterado pelo Regulamento de execução n.o 84/2011 e pelo Regulamento n.o 588/2011, deve ser interpretado no sentido de que, numa situação como a que está em causa no processo principal, em que um congelamento dos fundos e dos recursos económicos se baseia no referido regulamento, a isenção ao congelamento dos fundos ou dos recursos económicos para pagar serviços jurídicos deve ser apreciada em conformidade com essa disposição, que não faz nenhuma alusão à origem dos fundos e à sua eventual aquisição ilegal.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: lituano.