ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

15 de outubro de 2014 ( *1 )

«Recurso de anulação — Regulamento (UE) n.o 492/2011 — Decisão de execução 2012/733/UE — Rede EURES — Poder de execução da Comissão Europeia — Alcance — Artigo 291.o, n.o 2, TFUE»

No processo C‑65/13,

que tem por objeto um recurso de anulação nos termos do artigo 263.o TFUE, interposto em 7 de fevereiro de 2013,

Parlamento Europeu, representado por A. Tamás e J. Rodrigues, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por J. Enegren e C. Zadra, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: R. Silva de Lapuerta, presidente de secção, K. Lenaerts (relator), vice‑presidente do Tribunal de Justiça, J.‑C. Bonichot, A. Arabadjiev e J. L. da Cruz Vilaça, juízes,

advogado‑geral: P. Cruz Villalón,

secretário: V. Tourrès, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 30 de abril de 2014,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 10 de julho de 2014,

profere o presente

Acórdão

1

Com a sua petição, o Parlamento Europeu pede a anulação da Decisão de Execução 2012/733/UE da Comissão, de 26 de novembro de 2012, que executa o Regulamento (UE) n.o 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho no que se refere à compensação das ofertas e dos pedidos de emprego e ao restabelecimento da rede EURES (JO L 328, p. 21, a seguir «decisão recorrida»).

Quadro jurídico

Regulamento n.o 492/2011

2

Os considerandos 8 e 9 do Regulamento n.o 492/2011 enunciam:

«(8)

Os mecanismos de contacto e compensação, nomeadamente através da colaboração direta entre os serviços centrais de emprego, e também entre os serviços regionais, bem como da coordenação do intercâmbio de informações, asseguram, de uma maneira geral, uma visão mais clara do mercado de trabalho. Os trabalhadores que pretendam deslocar‑se deverão também ser informados regularmente acerca das condições de vida e de trabalho.

(9)

Existem laços estreitos entre a livre circulação dos trabalhadores, o emprego e a formação profissional, na medida em que esta tende a colocar os trabalhadores em condições de responder a ofertas de emprego concretas, feitas noutras regiões da União. Estes laços obrigam a estudar os problemas relacionados com esta matéria já não isoladamente, mas nas suas relações de interdependência, tendo também em conta os problemas de emprego a nível regional. Torna‑se, portanto, necessário orientar os esforços dos Estados‑Membros para a coordenação da sua política de emprego.»

3

Nos termos do artigo 11.o do mesmo regulamento:

«1.   [...]

Os serviços centrais de emprego dos Estados‑Membros devem cooperar estreitamente entre si e com a Comissão tendo em vista uma ação comum no domínio da compensação das ofertas e pedidos de emprego na União e da colocação dos trabalhadores que daí resulte.

2.   Para o efeito, os Estados‑Membros devem designar serviços especializados aos quais compete organizar os trabalhos nos domínios referidos no segundo parágrafo do n.o 1 e colaborar entre si e com os serviços da Comissão.

[...]»

4

O artigo 12.o do mesmo regulamento prevê:

«1.   Os Estados‑Membros devem comunicar à Comissão informações sobre os problemas relacionados com a livre circulação e o emprego dos trabalhadores, bem como informações relativas à situação e à evolução do emprego.

2.   Tendo plenamente em conta o parecer do Comité Técnico referido no artigo 29.o (‘Comité Técnico’), a Comissão estabelece a forma como as informações referidas no n.o 1 do presente artigo devem ser elaboradas.

3.   Em conformidade com as modalidades estabelecidas pela Comissão, tendo plenamente em conta o parecer do Comité Técnico, o serviço especializado de cada Estado‑Membro comunica aos serviços especializados dos outros Estados‑Membros e ao Gabinete Europeu de Coordenação [da Compensação das Ofertas e Pedidos de Emprego (a seguir ‘Gabinete Europeu de Coordenação’)] referido no artigo 18.o as informações respeitantes às condições de vida e de trabalho e à situação no mercado de emprego adequadas para servir de orientação aos trabalhadores dos outros Estados‑Membros. Estas informações devem ser atualizadas regularmente.

[...]»

5

O artigo 13.o do Regulamento n.o 492/2011 dispõe:

«1.   O serviço especializado de cada Estado‑Membro deve comunicar regularmente aos serviços especializados dos outros Estados‑Membros e ao Gabinete Europeu de Coordenação referido no artigo 18.o:

a)

As ofertas de emprego suscetíveis de ser preenchidas por nacionais de outros Estados‑Membros;

b)

As ofertas de emprego dirigidas aos países terceiros;

c)

Os pedidos de emprego apresentados por pessoas que tenham declarado formalmente que desejam trabalhar noutro Estado‑Membro;

d)

Informações, por regiões e ramos de atividade, relativas aos candidatos a emprego que tenham declarado estar efetivamente dispostos a ocupar um posto de trabalho noutro país.

O serviço especializado de cada Estado‑Membro deve transmitir estas informações aos serviços e organismos de emprego competentes o mais cedo possível.

2.   As ofertas e os pedidos de emprego a que se refere o n.o 1 devem ser difundidos segundo um sistema uniformizado estabelecido pelo Gabinete Europeu de Coordenação referido no artigo 18.o, em colaboração com o Comité Técnico.

Este sistema pode ser adaptado, se necessário.»

6

O artigo 17.o do Regulamento n.o 492/2011, que constitui o único artigo da secção 3 deste regulamento, intitulada «Das medidas reguladoras do equilíbrio no mercado de trabalho», dispõe:

«1.   Com base num relatório da Comissão, elaborado a partir das informações prestadas pelos Estados‑Membros, estes e a Comissão analisam conjuntamente, pelo menos uma vez por ano, os resultados das disposições da União relativas às ofertas e aos pedidos de emprego.

2.   A fim de realizar o equilíbrio entre as ofertas e os pedidos de emprego na União, os Estados‑Membros examinam conjuntamente com a Comissão todas as possibilidades tendentes ao preenchimento prioritário dos empregos disponíveis por nacionais de Estados‑Membros. Para esse efeito, tomam todas as medidas necessárias.

[...]»

7

O artigo 18.o do Regulamento n.o 492/2011 dispõe:

«Ao Gabinete Europeu de Coordenação […], criado na Comissão, compete em geral favorecer, ao nível da União, o contacto e a compensação das ofertas e dos pedidos de emprego. Competem‑lhe em especial todas as tarefas de natureza técnica que incumbem à Comissão neste domínio, nos termos do presente regulamento, nomeadamente prestar apoio aos serviços nacionais de emprego.

O Gabinete Europeu de Coordenação estabelece a síntese das informações referidas nos artigos 12.° e 13.° e dos dados resultantes dos estudos e pesquisas efetuados nos termos do artigo 11.o a fim de dar a conhecer informações úteis sobre a evolução previsível do mercado de emprego na União. [...]»

8

Nos termos do artigo 19.o, n.o 1, do referido regulamento:

«Compete ao Gabinete Europeu de Coordenação, nomeadamente:

a)

Coordenar as operações práticas necessárias ao nível da União para o contacto e a compensação das ofertas e dos pedidos de emprego e analisar os movimentos de trabalhadores daí resultantes;

[...]»

9

O artigo 20.o do mesmo regulamento enuncia:

«A Comissão pode organizar, com o acordo da autoridade competente de cada Estado‑Membro, e segundo as condições e modalidades por si fixadas sob parecer do Comité Técnico, visitas e missões de funcionários dos outros Estados‑Membros e programas de aperfeiçoamento de pessoal especializado.»

10

O artigo 21.o do Regulamento n.o 492/2011 institui um Comité Consultivo ao qual compete assistir a Comissão no exame das questões suscitadas pela execução do Tratado FUE e das medidas tomadas para sua aplicação, em matérias relativas à livre circulação e ao emprego dos trabalhadores.

11

O artigo 29.o do referido regulamento institui um Comité Técnico ao qual compete assistir a Comissão na preparação, na promoção e no acompanhamento de todos os trabalhos e medidas técnicas que contribuam para a aplicação do presente regulamento e de eventuais disposições complementares.

12

O artigo 38.o do mesmo regulamento dispõe:

«A Comissão adota as medidas de execução necessárias à aplicação do presente regulamento. Para esse efeito, deve agir em estreito contacto com as administrações centrais dos Estados‑Membros.»

Decisão recorrida

13

Os considerandos 4 e 7 da decisão recorrida enunciam:

«(4)

EURES deve contribuir para um melhor funcionamento dos mercados de trabalho, bem como para colmatar as necessidades económicas, ao facilitar a mobilidade transnacional e transfronteiras dos trabalhadores e ao garantir, simultaneamente, que tal mobilidade seja feita em condições equitativas e no respeito das normas laborais. Deve fazer com que os mercados de trabalho se tornem mais transparentes, assegurando o intercâmbio e o tratamento das ofertas e dos pedidos de emprego (ou seja, a ‘compensação’ na aceção do regulamento) e apoiar atividades nos domínios do recrutamento, do aconselhamento e da orientação a nível nacional e transfronteiras, concorrendo assim para os objetivos da estratégia ‘Europa 2020’.

(7)

A supressão dos monopólios, em conjunto com outros desenvolvimentos, levou à emergência de uma vasta gama de prestadores de serviços de emprego no mercado de trabalho. Para concretizar plenamente o seu potencial, EURES tem de se abrir à participação destes operadores, determinados a respeitar plenamente as normas laborais e os requisitos legais aplicáveis, bem como as demais normas de qualidade EURES.»

14

O artigo 1.o da decisão recorrida dispõe:

«A fim de cumprir as obrigações previstas no capítulo II do Regulamento (UE) n.o 492/2011, a Comissão estabelece e gere, em conjunto com os Estados‑Membros, uma rede europeia de serviços de emprego designada EURES.»

15

O artigo 2.o da decisão recorrida prevê:

«Em prol dos candidatos a emprego, dos trabalhadores e dos empregadores, EURES promove, se necessário em cooperação com outros serviços ou redes europeus:

[...]

b)

A compensação e a colocação a nível transnacional, inter‑regional e transfronteiras, através do intercâmbio de ofertas e pedidos de emprego, bem como da participação em atividades de mobilidade específicas a nível da UE;

[...]

d)

A elaboração de medidas destinadas a incentivar e facilitar a mobilidade dos jovens trabalhadores;

[...]»

16

Nos termos do artigo 3.o da decisão recorrida, EURES inclui, além do Gabinete Europeu de Coordenação e dos membros da rede EURES (os serviços especializados designados pelos Estados‑Membros, ou seja, os gabinetes de coordenação nacionais):

«[...]

c)

Os parceiros EURES, em conformidade com o artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 492/2011. Os parceiros EURES são designados pelo respetivo membro EURES e podem incluir prestadores de serviços públicos ou privados que operem no domínio pertinente da colocação e do emprego, bem como organizações sindicais e patronais. Para serem elegíveis, os parceiros EURES devem comprometer‑se a assumir as funções e as responsabilidades previstas no artigo 7.o;

d)

Os parceiros associados EURES, que, em conformidade com o artigo 6.o, prestam serviços limitados sob a supervisão e a responsabilidade de um parceiro EURES ou do Gabinete Europeu de Coordenação.»

17

Nos termos do artigo 4.o, n.o 3, da decisão recorrida, compete, em especial, ao Gabinete Europeu de Coordenação:

«[...]

b)

Analisar a mobilidade geográfica e profissional, tendo em vista equilibrar a oferta e a procura, e conceber uma abordagem geral da mobilidade em consonância com a Estratégia Europeia para o Emprego;

[...]»

18

O artigo 7.o da decisão recorrida dispõe:

«1.   A gama completa de serviços EURES inclui o recrutamento, a adequação de ofertas e pedidos de emprego e a colocação, e abrange todas as fases da colocação, desde a preparação ao pré‑recrutamento até à assistência pós‑colocação, passando pelas informações e o aconselhamento correspondentes.

2.   Estes serviços são apresentados de forma mais detalhada no catálogo dos serviços EURES, que, nos termos do artigo 10.o, faz parte da Carta EURES, e consistem em serviços universais prestados por todos os parceiros EURES e em serviços complementares.

3.   Os serviços universais são os previstos no capítulo II do Regulamento (UE) n.o 492/2011, nomeadamente no artigo 12.o, n.o 3, e no artigo 13.o Os serviços complementares não são obrigatórios na aceção do capítulo II do Regulamento (UE) n.o 492/2011, mas suprem necessidades importantes do mercado de trabalho.

[...]»

19

O artigo 8.o da decisão recorrida dispõe:

«1.   O conselho de administração EURES assiste a Comissão, o seu Gabinete Europeu de Coordenação e os gabinetes de coordenação nacionais na promoção e na supervisão do desenvolvimento de EURES.

[...]

7.   A Comissão consulta o conselho de administração sobre matérias que se prendam com o planeamento estratégico, o desenvolvimento, a implementação, o acompanhamento e a avaliação dos serviços e das atividades previstas na presente decisão, nomeadamente:

a)

Carta EURES, em conformidade com o artigo 10.o;

b)

Estratégias, objetivos operacionais e programas de trabalho da rede EURES;

c)

Relatórios da Comissão previstos no artigo 17.o do Regulamento (UE) n.o 492/2011.»

20

O artigo 10.o da decisão recorrida dispõe:

«1.   A Comissão adota a Carta EURES, de acordo com os procedimentos previstos no artigo 12.o, n.o 2, no artigo 13.o, n.o 2, no artigo 19.o, n.o 1, e no artigo 20.o do Regulamento (UE) n.o 492/2011, após consulta do conselho de administração da rede EURES criado por força do artigo 8.o da presente decisão.

2.   A Carta EURES, que assenta no princípio de que todas as ofertas e pedidos de emprego publicados pelos membros EURES devem ser acessíveis em toda a União Europeia, incidirá em especial sobre:

a)

O catálogo de serviços EURES que descreve os serviços universais e complementares a prestar pelos membros e parceiros EURES, incluindo serviços de adequação de ofertas e pedidos de emprego, inclusive assistência e aconselhamento personalizados a clientes, quer sejam candidatos a emprego, trabalhadores ou empregadores;

[...]

d)

Os objetivos operacionais da rede EURES, as normas de qualidade a aplicar, bem como as obrigações dos membros e parceiros EURES, nomeadamente:

[...]

ii)

tipo de informações (por exemplo, sobre o mercado de trabalho, condições de vida e de trabalho, ofertas e pedidos de emprego, oportunidades de estágio e de aprendizagem, incentivos à mobilidade juvenil, aquisição de competências e obstáculos à mobilidade) que devem fornecer aos seus clientes e ao resto da rede, em cooperação com outros serviços ou redes europeias pertinentes,

iii)

descrição de funções e critérios de nomeação dos coordenadores nacionais, dos conselheiros EURES e outros lugares‑chave a nível nacional,

iv)

formação e qualificações exigidas ao pessoal EURES, bem como condições e procedimentos relativos à organização de visitas e missões dos responsáveis e do pessoal especializado,

[...]»

Pedidos das partes

21

O Parlamento pede ao Tribunal que se digne:

anular a decisão recorrida; e

condenar a Comissão nas despesas.

22

A Comissão pede ao Tribunal que se digne:

negar provimento ao presente recurso; e

condenar o Parlamento nas despesas.

23

A título subsidiário, a Comissão pede que, caso o Tribunal de Justiça julgue o recurso total ou parcialmente procedente, se mantenham os efeitos da decisão recorrida ou das disposições anuladas da mesma, até à entrada em vigor, num prazo razoável, de uma nova decisão destinada a substituir a decisão recorrida.

Quanto ao recurso

Argumentos das partes

24

O Parlamento Europeu invoca, em apoio do seu recurso, um único fundamento, relativo à violação do artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011 e ao desvio do poder de execução que o legislador conferiu à Comissão por força desse artigo.

25

A título preliminar, o Parlamento recorda que o artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011 atribui à Comissão o poder de adotar as medidas de execução «necessárias à aplicação» do regulamento. O legislador da União quis assim limitar o poder de execução ao mínimo indispensável. Por conseguinte, não compete à Comissão procurar, por meio de atos de execução, aperfeiçoar o quadro estabelecido pelo referido regulamento. Com efeito, na arquitetura normativa do Tratado, um ato de execução ao abrigo do artigo 291.o TFUE destina‑se unicamente a aplicar as regras existentes do ato de base, sem todavia o completar.

26

Em seguida, o Parlamento refere‑se a seis artigos da decisão recorrida que, na sua opinião, completam alguns elementos do Regulamento n.o 492/2011 e excedem, por conseguinte, o poder de execução conferido à Comissão pelo artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011.

27

Em primeiro lugar, o Parlamento sustenta que os objetivos enunciados no artigo 2.o, alíneas b) e d), da decisão recorrida refletem opções políticas no sentido de que permitem concentrar a atividade da rede EURES tornando prioritárias certas categorias de trabalhadores no quadro do funcionamento do mecanismo de compensação instituído pelo Regulamento n.o 492/2011. A promoção das atividades de mobilidade específicas e a elaboração de medidas destinadas a incentivar e facilitar a mobilidade dos jovens trabalhadores não decorrem do referido regulamento, que não atribui prioridade a nenhum grupo específico.

28

Em segundo lugar, o Parlamento contesta o poder de a Comissão abrir a rede EURES a entidades privadas, como prevê o artigo 3.o, alínea c), da decisão recorrida. Refere que tal abertura altera, na verdade, o quadro preestabelecido pelo Regulamento n.o 492/2011. Segundo o Parlamento, este regulamento abrange unicamente os agentes do setor público no quadro do mecanismo de compensação instituído pelo referido regulamento.

29

Em terceiro lugar, o Parlamento alega que a função que o artigo 4.o, n.o 3, alínea b), da decisão recorrida atribui ao Gabinete Europeu de Coordenação de «conceber uma abordagem geral da mobilidade» excede largamente o poder de execução conferido à Comissão pelo Regulamento n.o 492/2011. Com efeito, por força dos artigos 18.° e 19.° deste Regulamento n.o 492/2011, disposições que fazem uma distinção entre a Comissão e o Gabinete Europeu de Coordenação instituído no âmbito da Comissão, as funções que incumbem a este último são circunscritas e de natureza puramente técnica ou administrativa. O referido Regulamento n.o 492/2011 não prevê a atribuição ao Gabinete Europeu de Coordenação nenhuma ação concreta de programação.

30

Em quarto lugar, o Parlamento sustenta que a Comissão substituiu o legislador da União ao introduzir no artigo 7.o, n.os 2 e 3, da decisão recorrida o conceito de «serviços complementares». Entende que, por um lado, resulta a contrario da definição de «serviço universal», contida no artigo 7.o, n.o 3, primeiro período, da decisão recorrida, que o Regulamento n.o 492/2011 não abrange os serviços complementares. Por outro lado, no caso de estes últimos serviços estarem cobertos pelo referido regulamento, haveria que concluir que este não faz distinção nenhuma entre os diferentes serviços consoante tenham um caráter obrigatório ou não obrigatório. O Parlamento observa ainda que os serviços complementares, apesar de não obrigatórios, não são desprovidos de efeitos jurídicos. A este respeito, refere o artigo 6.o, n.o 5, da decisão recorrida.

31

Em quinto lugar, o Parlamento alega que, através do artigo 8.o, n.o 7, da decisão recorrida, que prevê a consulta do conselho de administração EURES pela Comissão sobre várias questões, a Comissão criou uma estrutura quase comitológica com vista à aplicação do Regulamento n.o 492/2011, quando o artigo 38.o deste regulamento prevê que a Comissão deve agir em estreito contacto com as Administrações centrais dos Estados‑Membros.

32

O Parlamento Europeu questiona‑se sobre se, em geral, um ato de execução pode criar, por si só, um quadro institucional que condiciona o procedimento que deve ser seguido para a adoção de atos subsequentes, mesmo no caso de serem «atos de execução» no sentido mais estrito possível, isto é, pontuais e puramente técnicos.

33

Em todo o caso, uma parte das questões sobre as quais o conselho de administração EURES deve ser consultado, como o planeamento estratégico ou a Carta EURES, refere‑se a elementos que, segundo o Parlamento, não são nem pontuais nem puramente técnicos, mas que completam o Regulamento n.o 492/2011.

34

Na opinião do Parlamento, mesmo admitindo que a Carta EURES contém medidas que pressupõem atos de execução que a Comissão pode adotar nos termos do artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011 — quod non —, o artigo 10.o, n.o 1, da decisão recorrida, ao prever a consulta do conselho de administração EURES, acrescenta um novo requisito processual para a adoção de tais medidas que não resulta do referido artigo 38.o

35

Por outro lado, segundo o Parlamento, o legislador da União já criou os organismos que devem assistir a Comissão a desenvolver a política decorrente do Regulamento n.o 492/2011. Com efeito, o Comité Consultivo e o Comité Técnico referidos, respetivamente, nos artigos 21.° e 29.° do mesmo regulamento têm essa missão. Daqui resulta a existência de uma potencial sobreposição entre, por um lado, as competências dos referidos Comité Consultivo e Comité Técnico e, por outro, as do conselho de administração EURES decorrentes da decisão recorrida. A Comissão não está mandatada para completar este quadro institucional, conforme resulta do Regulamento n.o 492/2011, sem intervenção do legislador da União.

36

Em sexto lugar, quanto à Carta EURES cuja adoção está prevista no artigo 10.o da decisão recorrida, o Parlamento alega, por um lado, que o n.o 1 deste artigo precisa que a mesma será adotada de acordo com os procedimentos previstos nos artigos 12.°, 13.°, 19.° e 20.° do Regulamento n.o 492/2011. Considera que, deste modo, a Comissão atribuiu a si própria competências de execução e determinou o procedimento aplicável para a adoção da referida Carta, quando a atribuição dessas competências de execução e a determinação de tal procedimento são da competência do legislador da União. Com efeito, ao interpor‑se entre o Regulamento n.o 492/2011 e a futura Carta EURES, o artigo 10.o da decisão recorrida perde todo o caráter executivo na aceção do artigo 291.o TFUE. Segundo o Parlamento, a Carta EURES será objeto de um ato separado que também se baseará no artigo 38.o do referido regulamento.

37

Por outro lado, no que respeita ao conteúdo do artigo 10.o da decisão recorrida, o Parlamento considera que este contém elementos que comportam mais esclarecimentos sobre o alcance dos artigos 12.°, 13.°, 19.° e 20.° do Regulamento n.o 492/2011. Resulta do referido artigo 10.o, n.o 2, alínea d), que a Carta EURES conterá obrigações legais para os membros e parceiros EURES. Enquanto, segundo o artigo 12.o, n.o 3, do Regulamento n.o 492/2011, «as informações respeitantes às condições de vida e de trabalho e à situação no mercado de emprego adequadas para servir de orientação aos trabalhadores» devem ser fornecidas «[e]m conformidade com as modalidades estabelecidas pela Comissão», o artigo 10.o, n.o 2, alínea d), ii), da decisão recorrida especifica o conteúdo desse tipo de informação em acréscimo à formulação geral do Regulamento n.o 492/2011. Por outro lado, este regulamento é, de forma idêntica, completado pelo artigo 10.o, n.o 2, alínea d), iii) e iv), da decisão recorrida no que se refere aos critérios de nomeação ou à formação e qualificações exigidas ao pessoal EURES.

38

A Comissão contrapõe que a decisão recorrida está em plena conformidade com o artigo 291.o TFUE e não excede o poder de execução conforme estabelecido e delimitado no Regulamento n.o 492/2011.

Apreciação do Tribunal

Observações preliminares

39

Nos termos do artigo 291.o, n.o 2, TFUE, quando sejam necessárias condições uniformes de execução dos atos juridicamente vinculativos da União, estes conferirão competências de execução à Comissão ou, em casos específicos devidamente justificados e nos casos previstos nos artigos 24.° TUE e 26.° TUE, ao Conselho da União Europeia.

40

O artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011 confere à Comissão um poder de execução na aceção do artigo 291.o, n.o 2, TFUE. Com efeito, o referido artigo 38.o dispõe que a Comissão adota as medidas de execução necessárias à aplicação deste regulamento.

41

A decisão recorrida baseia‑se no artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011 e, em conformidade com o artigo 291.o, n.o 4, TFUE, tem inserida no seu título a expressão «de execução».

42

Contrariamente ao recurso que deu origem ao acórdão Comissão/Parlamento e Conselho (C‑427/12, EU:C:2014:170), o presente recurso não diz respeito à legalidade da opção do legislador da União quando confere um poder de execução à Comissão na aceção do artigo 291.o, n.o 2, TFUE, em vez de lhe atribuir um poder delegado na aceção do artigo 290.o, n.o 1, TFUE. O presente recurso versa sobre a legalidade do ato de execução, ou seja, a decisão recorrida, baseada no artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011, na medida em que a Comissão excedeu o poder de execução que lhe é conferido por esta disposição e pelo artigo 291.o TFUE.

43

A este respeito, importa salientar, antes de mais, que o poder de execução conferido à Comissão é simultaneamente delimitado pelo artigo 291.o, n.o 2, TFUE e pelas disposições do Regulamento n.o 492/2011. Com efeito, o Tribunal de Justiça já declarou que, quando é conferido um poder de execução à Comissão com base no artigo 291.o, n.o 2, TFUE, esta é chamada a especificar o conteúdo do ato legislativo, a fim de assegurar a sua execução em condições uniformes em todos os Estados‑Membros (acórdão Comissão/Parlamento e Conselho, EU:C:2014:170, n.o 39).

44

Em seguida, resulta de jurisprudência constante que, no quadro do seu poder de execução, cujos limites devem ser apreciados, nomeadamente, em função dos objetivos gerais essenciais do ato legislativo em causa, a Comissão está autorizada a adotar todas as medidas de aplicação necessárias ou úteis para a implementação do referido ato, desde que não sejam contrárias a este (acórdãos Países Baixos/Comissão, C‑478/93, EU:C:1995:324, n.os 30 e 31; Portugal/Comissão, C‑159/96, EU:C:1998:550, n.os 40 e 41; Parlamento/Comissão, C‑403/05, EU:C:2007:624, n.o 51; e Parlamento e Dinamarca/Comissão, C‑14/06 e C‑295/06, EU:C:2008:176, n.o 52).

45

Além disso, resulta da conjugação dos artigos 290.°, n.o 1, TFUE e 291.°, n.o 2, TFUE que a Comissão, quando exerce um poder de execução, não pode alterar nem completar o ato legislativo, mesmo nos seus elementos não essenciais.

46

Com base nas considerações precedentes, deve considerar‑se que a Comissão especifica o conteúdo do ato legislativo na aceção da jurisprudência referida no n.o 43 do presente acórdão quando as disposições do ato de execução que adota, por um lado, respeitem os objetivos gerais essenciais prosseguidos pelo ato legislativo e, por outro, sejam necessárias ou úteis para a sua aplicação, sem o completar nem alterar.

47

É à luz destes princípios que há que examinar o fundamento único invocado pelo Parlamento em apoio do seu recurso.

Quanto à questão de saber se as disposições recorridas respeitam os objetivos gerais essenciais prosseguidos pelo Regulamento n.o 492/2011

48

Por força do artigo 1.o da decisão recorrida, a Comissão estabelece e gere, em conjunto com os Estados‑Membros, uma rede europeia de serviços de emprego designada «EURES», a fim de cumprir as obrigações previstas no capítulo II do Regulamento n.o 492/2011.

49

Por conseguinte, importa examinar se a decisão recorrida respeita os objetivos gerais essenciais prosseguidos pelo capítulo II do referido regulamento, intitulado «Do contacto e compensação das ofertas e pedidos de emprego».

50

Como resulta dos considerandos 8 e 9 do Regulamento n.o 492/2011, o objetivo geral essencial prosseguido pelo capítulo II desse regulamento é «colocar os trabalhadores em condições de responder a ofertas de emprego concretas, feitas noutras regiões da União», «assegura[ndo], de uma maneira geral, uma visão mais clara do mercado de trabalho». Tal visão mais clara deve ser alcançada, nos termos do referido considerando 8, através de «mecanismos de contacto e compensação, nomeadamente através da colaboração direta entre os serviços centrais de emprego, e também entre os serviços regionais, bem como da coordenação do intercâmbio de informações».

51

O artigo 11, n.o 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 492/2011 define essa colaboração ao prever que «[o]s serviços centrais de emprego dos Estados‑Membros devem cooperar estreitamente entre si e com a Comissão tendo em vista uma ação comum no domínio da compensação das ofertas e pedidos de emprego na União e da colocação dos trabalhadores que daí resulte».

52

Ora, decorre do considerando 4 e do artigo 2.o da decisão recorrida que esta visa, à semelhança do Regulamento n.o 492/2011, facilitar a mobilidade geográfica transfronteiriça dos trabalhadores, promovendo, no quadro de uma ação comum, a saber, a rede EURES, a transparência e o intercâmbio de informações nos mercados de trabalho europeus. O objetivo prosseguido pela decisão recorrida está assim de acordo com o objetivo geral essencial do Regulamento n.o 492/2011, especificado no n.o 50 do presente acórdão.

53

É verdade que o artigo 2.o da decisão recorrida menciona, respetivamente nas alíneas b) e d), a «participação em atividades de mobilidade específicas» e a «elaboração de medidas destinadas a incentivar e facilitar a mobilidade dos jovens trabalhadores», entre as ações a promover pela rede EURES, apesar de tais ações não estarem expressamente previstas no Regulamento n.o 492/2011. Todavia, essas ações inscrevem‑se manifestamente no objetivo geral essencial prosseguido pelo mesmo regulamento, que consiste em promover a mobilidade geográfica transfronteiriça dos trabalhadores.

54

Por outro lado, nenhuma das outras disposições da decisão recorrida, que foram mencionadas pelo Parlamento na sua petição de recurso e que se referem à composição e ao funcionamento da rede EURES, permite considerar que, tendo em conta os objetivos gerais essenciais prosseguidos pelo Regulamento n.o 492/2011, a referida decisão é contrária a este regulamento.

55

Com efeito, a possibilidade de entidades privadas serem designadas como parceiros EURES, prevista no artigo 3.o, alínea c), da decisão recorrida, está ligada «à emergência de uma vasta gama de prestadores de serviços de emprego no mercado de trabalho», na sequência da supressão do monopólio dos serviços públicos de emprego, e visa garantir que a rede EURES concretize «plenamente o seu potencial». Esta disposição inscreve‑se no objetivo prosseguido pela decisão recorrida, conforme especificado no n.o 52 do presente acórdão, que está de acordo com o objetivo geral essencial prosseguido pelo Regulamento n.o 492/2011.

56

O mesmo se aplica, por um lado, à função atribuída pelo artigo 4.o, n.o 3, alínea b), da decisão recorrida ao Gabinete Europeu de Coordenação de «conceber uma abordagem geral da mobilidade» e, por outro, aos «serviços complementares», assumidos pela rede EURES por força do artigo 7.o, n.os 2 e 3, da mesma decisão, que suprem, como resulta do referido n.o 3, «necessidades importantes do mercado de trabalho».

57

Por último, a criação do conselho de administração EURES, prevista no artigo 8.o da decisão recorrida, e a atribuição de um papel consultivo a esse conselho pelo n.o 7 desse artigo, bem como a adoção pela Comissão da Carta EURES, prevista no artigo 10.o da referida decisão, visam melhorar o funcionamento da rede EURES e, dessa forma, favorecem a compensação das ofertas e dos pedidos de emprego na União.

58

Tendo em conta as considerações precedentes, deve concluir‑se que a decisão recorrida respeita os objetivos gerais essenciais do capítulo II do Regulamento n.o 492/2011.

Quanto à questão de saber se as disposições recorridas são necessárias ou úteis para a aplicação do Regulamento n.o 492/2011, sem o completar nem alterar

59

O Parlamento sustenta, de uma maneira geral, que o legislador da União quis limitar o poder de execução da Comissão ao mínimo indispensável, ao fazer referência, no artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011, às medidas de execução «necessárias à aplicação» desse regulamento.

60

Esta argumentação não pode ser procedente. Com efeito, o artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011 deve ser interpretado à luz do artigo 291.o TFUE. Nestas circunstâncias, a referência às medidas necessárias, no artigo 38.o do Regulamento n.o 492/2011, está ligada à necessidade de assegurar a aplicação deste regulamento em condições uniformes em todos os Estados‑Membros (v. acórdão Comissão/Parlamento e Conselho, EU:C:2014:170, n.o 39), sem no entanto afetar o alcance do poder de execução de que dispõe a Comissão por força do quadro estabelecido no capítulo II do mesmo regulamento.

61

Ora, uma vez que a utilidade das disposições recorridas para a aplicação do capítulo II do Regulamento n.o 492/2011 não é posta em causa, basta, para efeitos de apreciar se essas disposições respeitam os limites do poder de execução reconhecido à Comissão, examinar se as mesmas completam ou alteram o referido ato legislativo.

62

A este respeito, deve recordar‑se que o artigo 11.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 492/2011, que figura no capítulo II deste, prevê uma cooperação estreita entre os serviços de emprego dos Estados‑Membros e a Comissão «tendo em vista uma ação comum no domínio da compensação das ofertas e pedidos de emprego na União e da colocação dos trabalhadores que daí resulte». Tal ação comum, que implica, como resulta do considerando 9 do Regulamento n.o 492/2011, uma certa coordenação das políticas de emprego dos Estados‑Membros, caracteriza‑se por um intercâmbio de informações sobre os problemas relacionados com a livre circulação e o emprego dos trabalhadores, conforme previsto no artigo 12.o desse regulamento, e pela implementação de um mecanismo de compensação das ofertas e dos pedidos de emprego, conforme previsto nos artigos 13.° a 16.° do referido regulamento, mecanismo esse que implica também um intercâmbio de informações entre os serviços especializados dos Estados‑Membros e entre estes últimos e a Comissão.

63

Ora, há que declarar que, uma vez que a rede EURES não foi estabelecida por esse regulamento, a Comissão foi encarregada não só de implementar a referida «ação comum» mas também de elaborar as regras de funcionamento dessa ação, respeitando as indicações contidas para o efeito no Regulamento n.o 492/2011.

64

Por conseguinte, importa examinar, tento em conta o quadro geral estabelecido pelo Regulamento n.o 492/2011 relativo à ação comum nele prevista, se a Comissão, ao adotar a decisão recorrida, e designadamente as disposições mencionadas na petição de recurso, excedeu o seu poder de execução ao aplicar esse regulamento.

65

O Parlamento sustenta, em primeiro lugar, que a Comissão excedeu o seu poder de execução, ao prever no artigo 2.o, respetivamente nas alíneas b) e d), da decisão recorrida a promoção pela rede EURES da participação em atividades de mobilidade específicas e a elaboração de medidas destinadas a incentivar e facilitar a mobilidade dos jovens trabalhadores.

66

Este argumento deve ser rejeitado.

67

Com efeito, as disposições invocadas pelo Parlamento inscrevem‑se no domínio da colaboração entre a Comissão e os Estados‑Membros, prevista no artigo 11.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 492/2011, sem completar nem alterar o quadro estabelecido pelo ato legislativo a esse respeito. Como salientou o advogado‑geral nos n.os 51 e 53 das suas conclusões, as referidas disposições precisam a ação comum referida nesta última disposição, com destaque para as medidas específicas já prosseguidas pelos Estados‑Membros a nível nacional e de que o artigo 2.o, alíneas b) e d), da decisão recorrida apenas visa assegurar a coordenação.

68

Em segundo lugar, o Parlamento sustenta que a abertura da rede EURES às entidades privadas, prevista no artigo 3.o, alínea c), da decisão recorrida, comporta uma alteração ao Regulamento n.o 492/2011 e excede, por conseguinte, o poder de execução conferido por este regulamento à Comissão.

69

É verdade que, como resulta do n.o 45 do presente acórdão, a Comissão excederia os limites do poder de execução que lhe é conferido pelo Regulamento n.o 492/2011 se alterasse elementos deste regulamento.

70

Todavia, o artigo 3.o, alínea c), da decisão recorrida não comporta nenhuma alteração do quadro estabelecido pelo dito regulamento.

71

Recorde‑se a este respeito que, de acordo com o artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento n.o 492/2011, os Estados‑Membros devem designar os serviços especializados aos quais compete colaborar entre si e com os serviços da Comissão nos domínios da compensação das ofertas e pedidos de emprego na União e da colocação que daí resulte. Não há nenhuma disposição no referido regulamento que reserve a referida cooperação a entidades de natureza pública. A referência aos prestadores de serviços privados, na decisão recorrida, constitui assim uma precisão do quadro estabelecido pelo Regulamento n.o 492/2011 que tem em conta, como resulta do considerando 7 da decisão recorrida, a supressão dos monopólios dos serviços públicos de emprego nos Estados‑Membros.

72

Por conseguinte, o argumento do Parlamento relativo ao artigo 3.o, alínea c), da decisão recorrida também deve ser rejeitado.

73

Em terceiro lugar, o Parlamento alega que a Comissão excedeu o poder de execução que lhe é conferido pelo Regulamento n.o 492/2011 ao prever, no artigo 4.o, n.o 3, alínea b), da decisão recorrida, que compete ao Gabinete Europeu de Coordenação «conceber uma abordagem geral da mobilidade».

74

Este argumento também não pode ser procedente.

75

Com efeito, deve recordar‑se que o Regulamento n.o 492/2011 atribui ao Gabinete Europeu de Coordenação um papel‑chave no mecanismo de compensação das ofertas e dos pedidos de emprego previsto no regulamento.

76

Assim, nos termos do artigo 18.o, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 492/2011, ao Gabinete Europeu de Coordenação «compete em geral favorecer, ao nível da União, o contacto e a compensação das ofertas e dos pedidos de emprego». Embora esta disposição atribua ao referido Gabinete «em especial» tarefas de natureza técnica, deve declarar‑se que o Regulamento n.o 492/2011 também atribui ao mesmo Gabinete importantes tarefas de apoio à ação da Comissão e dos Estados‑Membros.

77

Saliente‑se para o efeito que, por força do artigo 18.o, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 492/2011, o Gabinete Europeu de Coordenação estabelece a síntese das informações referidas nos artigos 12.° e 13.° deste regulamento e dos dados resultantes dos estudos e pesquisas efetuados nos termos do artigo 11.o do referido regulamento a fim de dar a conhecer informações úteis sobre a evolução previsível do mercado de emprego na União. Por outro lado, por força do artigo 19.o, n.o 1, alínea a), do mesmo regulamento, compete ao referido Gabinete «analisar os movimentos de trabalhadores». Deste modo, as tarefas de apoio do Gabinete Europeu de Coordenação devem permitir aos Estados‑Membros e à Comissão adotar, tendo em conta todas as informações pertinentes, as medidas reguladoras necessárias tendentes ao equilíbrio no mercado de trabalho previstas no artigo 17.o do Regulamento n.o 492/2011 e inscrevem‑se no objetivo enunciado no considerando 9 deste regulamento, que consiste em «orientar os esforços dos Estados‑Membros para a coordenação da sua política de emprego».

78

Neste contexto, não se pode considerar que a Comissão excedeu os limites do seu poder de execução ao atribuir ao Gabinete Europeu de Coordenação, no artigo 4.o, n.o 3, alínea b), da decisão recorrida, a tarefa de «conceber uma abordagem geral da mobilidade em consonância com a Estratégia Europeia para o Emprego», uma vez que tal abordagem geral só pode ser a de preparar a adoção das medidas reguladoras previstas no artigo 17.o do Regulamento n.o 492/2011 e apoiar os esforços dos Estados‑Membros para a coordenação das suas políticas de emprego, em conformidade com o considerando 9 deste regulamento, sem no entanto completar ou alterar a natureza da ação de apoio do dito Gabinete prevista no mesmo regulamento.

79

Em quarto lugar, segundo o Parlamento, a Comissão substituiu o legislador da União ao introduzir no artigo 7.o, n.os 2 e 3, da decisão recorrida o conceito de «serviços complementares».

80

Este argumento deve também ser rejeitado.

81

Importa recordar que o artigo 7.o da decisão recorrida define a gama de serviços EURES. O artigo 7.o, n.o 3, desta decisão prevê a possibilidade de a rede EURES oferecer serviços complementares. Segundo esta disposição, tais serviços não são obrigatórios na aceção do capítulo II do Regulamento n.o 492/2011, mas suprem necessidades importantes do mercado de trabalho.

82

Ora, uma vez que os serviços de emprego dos Estados‑Membros não se limitam geralmente a oferecer apenas os serviços que resultam obrigatoriamente do Regulamento n.o 492/2011, a Comissão pôde, sem completar nem alterar o quadro estabelecido pelo referido regulamento, considerar que os eventuais «serviços complementares» assim oferecidos deviam ser inscritos no quadro da execução da cooperação entre a Comissão e os serviços de emprego dos Estados‑Membros, prevista no artigo 11.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 492/2011.

83

Com efeito, como salientou o advogado‑geral no n.o 89 das suas conclusões, para melhor alcançar o objetivo do contacto e compensação das ofertas e pedidos de emprego prosseguido pelas disposições do capítulo II do Regulamento n.o 492/2011, é imprescindível que a rede EURES seja alimentada com todas as informações de que disponham os diferentes serviços nacionais, incluindo as resultantes dos serviços complementares.

84

Em quinto lugar, o Parlamento alega que o artigo 8.o, n.o 7, da decisão recorrida também demonstra que a Comissão não se limitou à sua missão de execução do Regulamento n.o 492/2011.

85

Resulta do artigo 8.o, n.o 1, da decisão recorrida que o conselho de administração EURES assiste a Comissão, o seu Gabinete Europeu de Coordenação e os gabinetes de coordenação nacionais na promoção e na supervisão do desenvolvimento da rede EURES. Nos termos do artigo 8.o, n.o 7, da referida decisão, a Comissão consulta o conselho de administração EURES sobre matérias que se prendam com o planeamento estratégico, o desenvolvimento, a implementação, o acompanhamento e a avaliação dos serviços e das atividades previstas na mesma decisão.

86

Ora, a Comissão não excedeu o seu poder de execução ao instituir um conselho de administração EURES e ao atribuir‑lhe um papel consultivo.

87

Neste contexto, importa recordar que, atendendo a que a rede EURES não foi estabelecida pelo Regulamento n.o 492/2011, este, e em especial o seu artigo 11.o, n.o 1, segundo parágrafo, atribui à Comissão o poder de elaborar regras de funcionamento de uma ação comum entre a Comissão e os Estados‑Membros nos domínios da compensação das ofertas e pedidos de emprego na União e da colocação dos trabalhadores que daí resulte. A criação de um conselho de administração EURES e a atribuição de um papel consultivo ao mesmo pela disposição contestada pelo Parlamento não completa nem altera o quadro estabelecido pelo Regulamento n.o 492/2011, na medida em que visam apenas assegurar o funcionamento eficaz da ação comum prevista no regulamento, sem se sobrepor, como salientou o advogado‑geral no n.o 108 das suas conclusões, às competências do Comité Consultivo e do Comité Técnico, instituídos, respetivamente, pelos artigos 21.° e 29.° do referido regulamento.

88

Por conseguinte, o argumento relativo ao artigo 8.o, n.o 7, da decisão recorrida também não pode ser procedente.

89

Por último, o Parlamento sustenta que a Comissão excedeu o seu poder de execução ao adotar o artigo 10.o da decisão recorrida.

90

Este último argumento também deve ser rejeitado.

91

Com efeito, o artigo 10.o da decisão recorrida limita‑se a enunciar a adoção pela Comissão de uma Carta EURES. Ora, a adoção pela Comissão da referida Carta constituirá um ato de execução na aceção do artigo 291.o, n.o 2, TFUE, cuja legalidade poderá ser apreciada, se for caso disso, no âmbito de um ulterior recurso de anulação, tendo em conta os limites do poder de execução reconhecido à Comissão.

92

No entanto, não é admissível que, pelo simples facto de ter previsto a adoção futura da Carta EURES, a Comissão tenha excedido o seu poder de execução. Com efeito, o artigo 10.o da decisão recorrida não completa nem altera o quadro estabelecido pelo Regulamento n.o 492/2011, uma vez que a referida disposição e a ação nela enunciada visam apenas facilitar o intercâmbio de informações na rede EURES, conforme previsto nos artigos 12.° e 13.° deste regulamento, e promover o seu funcionamento eficaz.

93

Resulta do exposto que o fundamento único invocado pelo Parlamento em apoio do seu recurso não pode ser procedente.

94

Consequentemente, deve ser negado provimento ao recurso.

Quanto às despesas

95

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do Parlamento e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

O Parlamento Europeu é condenado nas despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: francês.