CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NILS WAHL

apresentadas em 26 de março de 2015 ( 1 )

Processo C‑634/13 P

Total Marketing Services, que sucedeu nos direitos da Total Raffinage Marketing,

contra

Comissão Europeia

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercado das ceras de parafina no Espaço Económico Europeu e mercado alemão do ‘gatsch’ — Fixação dos preços e repartição dos mercados — Decisão que declara a existência de uma infração às regras da concorrência — Duração da participação num cartel ilícito — Cessação da participação — Interrupção da participação — Ónus da prova — Distanciamento público — Perceção dos outros participantes no cartel da intenção de distanciamento»

I – Introdução

1.

Com o presente recurso, a Total Marketing Services, que sucedeu nos direitos da Total Raffinage Marketing (anteriormente Total France SA, a seguir «Total France»), pretende obter a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia Total Raffinage Marketing/Comissão ( 2 ), através do qual este negou provimento, no essencial, ao recurso que aquela interpôs com vista, a título principal, à anulação parcial da Decisão C (2008) 5476 final da Comissão, de 1 de outubro de 2008, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.o [CE] e do artigo 53.o do Acordo EEE (processo COMP/39.181 — Cera de parafina) (a seguir «decisão controvertida»), e, a título subsidiário, à redução do montante da coima que lhe foi aplicada.

2.

Apesar de o presente processo estar estreitamente ligado ao recurso interposto no processo Total/Comissão (C‑597/13 P), em relação ao qual também hoje apresento as minhas conclusões, as questões jurídicas que se colocam, no caso em apreço, são efetivamente distintas. Estas dizem respeito, no essencial, à questão de saber se a fiscalização efetuada pelo Tribunal Geral quanto à participação da recorrente no presumido cartel durante determinados períodos não é insuficiente ou incorreta. Assim, o presente processo permite que sejam fornecidos alguns elementos em matéria de produção de provas da participação de uma empresa num cartel ilícito e de esclarecer, designadamente, as condições em que é possível recorrer ao critério de distanciamento público da empresa em causa.

II – Antecedentes do litígio

3.

Os antecedentes do litígio, assim como o conteúdo da decisão controvertida foram resumidos pelo Tribunal Geral nos n.os 1 a 17 do acórdão recorrido, nos quais o leitor pode obter mais pormenores.

4.

Por necessidades de análise do presente recurso, limitar‑me‑ei a recordar o seguinte.

5.

Através da decisão controvertida, a Comissão Europeia constatou que a recorrente e a sua sociedade‑mãe que a detém quase a 100%, ou seja, a Total SA (a seguir «Total»), tinham, com outras empresas, violado o artigo 81.o, n.o 1, CE e o artigo 53.o, n.o 1, do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, de 2 de maio de 1992 (JO 1994, L 1, p. 3, a seguir «acordo EEE»), ao participarem num cartel sobre o mercado das ceras de parafina no Espaço Económico Europeu (EEE) e no mercado alemão do «gatsch» (da parafina bruta). A recorrente e a sua sociedade‑mãe, a Total, figuravam entre os destinatários da decisão controvertida.

6.

A adoção da decisão controvertida seguiu‑se a um inquérito iniciado na primavera do ano de 2005 na sequência de uma informação fornecida por uma sociedade. No termo deste inquérito, a Comissão concluiu que a maioria dos produtores de cera de parafina e de parafina bruta no EEE, entre os quais figurava a recorrente, tinham participado numa infração única, complexa e continuada ao artigo 81.o CE e ao artigo 53.o do acordo EEE, que abrangia o território do EEE.

7.

Esta infração consistia, principalmente, em acordos ou práticas concertadas para fixação dos preços e troca e divulgação de informações comercialmente sensíveis a respeito das ceras de parafina. No que respeita a determinadas sociedades, entre as quais figura a recorrente, a infração relativa às ceras de parafina consistia igualmente na repartição de clientes ou de mercados e abrangia também a parafina bruta vendida aos clientes finais no mercado alemão (considerandos 2, 95, 328 e artigo 1.o da decisão controvertida).

8.

As práticas ilícitas concretizaram‑se em reuniões anticoncorrenciais, designadas pelos participantes como «reuniões técnicas» ou, por vezes, reuniões «Blauer Salon», e em «reuniões parafina bruta», dedicadas especificamente às questões relativas à parafina bruta.

9.

De acordo com a Comissão, empregados da Total France participaram ativamente na infração durante toda a sua duração. Consequentemente, a Comissão considerou a Total France responsável pela sua participação no cartel (considerandos 555 e 556 da decisão impugnada). Além disso, entre o ano de 1990 e o termo da infração, a Total France era, direta ou indiretamente, detida em mais de 98% pela Total. A Comissão considerou, com base neste facto, que se podia presumir que a Total exercia uma influência determinante no comportamento da Total France, uma vez que as duas sociedades faziam parte da mesma empresa (considerandos 557 a 559 da decisão impugnada).

10.

No caso em apreço, o montante das coimas aplicadas foi calculado com base nas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.o 2, alínea a), do artigo 23.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 ( 3 ), em vigor à data da notificação da comunicação de acusações.

11.

Ao abrigo das referidas orientações, a Comissão, no que respeita à recorrente e à sua sociedade‑mãe, chegou a um montante total de coima de 128163000 euros (considerando 785 da decisão controvertida).

12.

Nos termos do dispositivo da decisão controvertida:

«Artigo 1.o

As seguintes empresas infringiram o artigo 81.o, n.o 1, [CE] e, a partir de 1 de janeiro de 1994, o artigo 53.o do acordo EEE por terem participado, durante os períodos indicados, num acordo continuado e/ou numa prática concertada no setor das ceras de parafina no mercado comum e, a partir de 1 de janeiro de 1994, no EEE:

[…]

Total France […]: de 3 de setembro de 1992 a 28 de abril de 2005; e

[Total]: de 3 de setembro de 1992 a 28 de abril de 2005.

Relativamente às seguintes empresas, a infração diz igualmente respeito, nos períodos indicados, à parafina bruta vendida a clientes finais no mercado alemão:

[…]

Total France […]: de 30 de outubro de 1997 a 12 de maio de 2004; e

[Total]: de 30 de outubro de 1997 a 12 de maio de 2004.

Artigo 2.o

Pela infração referida no artigo 1.o, são aplicadas as seguintes coimas:

[…]

Total France […] solidariamente responsável com [Total]: 128163000 [euros].

[…]»

III – Acórdão recorrido e acórdão proferido no processo Total/Comissão (T‑548/08)

13.

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 17 de dezembro de 2008, a recorrente interpôs recurso da decisão controvertida, apresentando um total de onze fundamentos. Na audiência realizada no Tribunal Geral foi invocado um décimo segundo fundamento.

14.

O Tribunal Geral rejeitou todos estes fundamentos, exceto o oitavo, que era relativo à ilegalidade do método de cálculo consagrado no n.o 24 das Orientações de 2006. O Tribunal considerou que a Comissão tinha, na determinação do coeficiente multiplicador que reflete a duração da participação da Total France na infração, violado os princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento, equiparando um período de participação de 7 meses e 28 dias (para as ceras de parafina) e um período de participação de 6 meses e 12 dias (para a parafina bruta) a uma participação de um ano inteiro. Por conseguinte, o Tribunal Geral alterou o montante total da coima aplicada à recorrente de 128163000 euros para 125459842 euros.

15.

Em contrapartida, no acórdão proferido nesse mesmo dia no processo Total/Comissão (T‑548/08, EU:T:2013:434), o Tribunal Geral considerou que, tendo em conta as circunstâncias do caso em apreço, o montante da coima aplicada à sociedade‑mãe da recorrente era adequado (n.o 224 do acórdão) e, assim, não reduziu na mesma medida a coima aplicada à sociedade‑mãe Total. Além disso, rejeitou todos os fundamentos invocados pela Total neste último processo.

IV – Tramitação do processo no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

16.

A recorrente conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido na medida em que o Tribunal Geral excluiu erradamente a cessação da participação da recorrente na infração após 12 de maio de 2004;

anular o acórdão recorrido na medida em que o Tribunal Geral excluiu erradamente qualquer diferença de tratamento injustificada entre a recorrente e a Repsol YPF Lubricantes y Especialidades SA, Repsol Petróleo SA e a Repsol YPF SA (a seguir «Repsol»), relativa ao período da participação destas na infração;

anular o acórdão recorrido na medida em que o Tribunal Geral excluiu erradamente a interrupção da participação da recorrente na infração entre 26 de maio de 2000 e 26 de junho de 2001;

anular o acórdão recorrido na medida em que o Tribunal Geral não respondeu ao fundamento relativo à falta de análise das provas do comportamento concorrencial da recorrente no mercado;

decidir definitivamente o litígio, nos termos do artigo 61.o do Estatuto do Tribunal de Justiça e, a este título, anular a decisão na medida em que a mesma diz respeito à recorrente e, no exercício pleno da sua competência, reduzir a coima aplicada à recorrente;

no caso de o Tribunal de Justiça não decidir definitivamente o litígio, reservar a decisão quanto às despesas e remeter o processo ao Tribunal Geral para reapreciação, em conformidade com o acórdão do Tribunal de Justiça;

por último, em conformidade como artigo 69.o do Regulamento de Processo, condenar a Comissão nas despesas das duas instâncias.

17.

A Comissão pede que seja negado provimento ao recurso e a condenação da recorrente nas despesas, incluindo nas incorridas no Tribunal Geral.

18.

As partes apresentaram as suas posições respetivas por escrito e oralmente na audiência de 15 de janeiro de 2015.

V – Análise do recurso

19.

O recurso assenta em quatro fundamentos relativos, respetivamente:

a uma violação do artigo 101.o TFUE, das regras de produção de prova, dos princípios da presunção de inocência e da segurança jurídica, assim como da exigência de fundamentação, na medida em que o Tribunal Geral considerou que a recorrente participou na infração após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004 e até 28 de abril de 2005;

a uma violação do princípio da igualdade de tratamento, a uma desvirtuação dos elementos de prova e a uma falta de fundamentação, na medida em que o Tribunal Geral excluiu que a recorrente se tenha retirado do cartel após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004, mas admitiu a saída da Repsol após a reunião de 3 e 4 de agosto de 2004;

a uma violação do artigo 101.o TFUE, dos princípios da presunção de inocência e da segurança jurídica, bem como da exigência de fundamentação, na medida em que o Tribunal Geral considerou que a recorrente não interrompeu a sua participação na infração entre 26 de maio de 2000 e 26 de junho de 2001;

a uma violação dos princípios da proteção jurisdicional efetiva, da individualidade das penas e das sanções, bem como da exigência de fundamentação, na medida em que o Tribunal Geral excluiu, sem o ter examinado, o fundamento relativo ao facto de não terem sido tomadas em consideração as provas do comportamento concorrencial da recorrente.

20.

A Comissão considera, por seu turno, que os fundamentos, que visam pura e simplesmente pedir ao Tribunal de Justiça que julgue novamente o que já foi julgado pelo Tribunal Geral são, no essencial, inadmissíveis. Afirma que, em todo o caso, estes fundamentos são improcedentes.

21.

Antes de abordar o mérito das questões suscitadas, importa fazer algumas referências acerca da admissibilidade dos fundamentos invocados.

22.

É inquestionável que, conforme recordou corretamente a Comissão, não compete ao Tribunal de Justiça efetuar um novo exame da petição apresentada no Tribunal Geral, uma vez que a referida apreciação não é da competência do Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso ( 4 ). Nomeadamente, o Tribunal de Justiça não possui competência para apreciar a matéria de facto nem, em princípio, para examinar as provas que o Tribunal Geral aceitou para demonstrar tais factos. Esta apreciação não constitui, assim, exceto em caso de desvirtuamento desses elementos, uma questão de direito sujeita, enquanto tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça ( 5 ).

23.

Quanto à determinação da duração de uma infração, o Tribunal de Justiça já esclareceu que os conceitos de distanciamento público e de continuidade de uma prática anticoncorrencial — aos quais os fundamentos de recurso invocados fazem referência, traduzem situações factuais, cuja existência é constatada, casuisticamente, pelo juiz que conhece do mérito, com base na apreciação «de um determinado número de coincidências e de indícios» que lhe foram submetidos e em consequência de uma «avaliação global de todas as provas e indícios pertinentes». Quando essas provas tenham sido obtidas regularmente e os princípios gerais de direito e as regras processuais em matéria de produção e apreciação de prova tenham sido respeitados, compete exclusivamente ao Tribunal Geral apreciar o valor a atribuir aos elementos que lhe foram submetidos. Essa apreciação não constitui, por isso, exceto em caso de desvirtuamento desses elementos, uma questão de direito sujeita, enquanto tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça ( 6 ).

24.

Não é menos verdade que devem ser declarados admissíveis os fundamentos do recurso que não se limitam a contestar a exatidão material e a apreciação dos elementos factuais tidos em conta para efeitos do estabelecimento da duração da participação da recorrente no cartel, mas que põem em causa a sua pertinência e a sua importância, assim como a força probatória que lhes é atribuída pelo Tribunal Geral ( 7 ).

25.

No caso em apreço, os primeiro e terceiro fundamentos invocados convidam, no essencial, o Tribunal de Justiça a apreciar se os critérios definidos pela Comissão e avalizados pelo Tribunal Geral, designadamente o que respeita ao não distanciamento público da recorrente e à perceção dos outros participantes, para provar a participação desta durante dois períodos bem determinados estão, ou não, feridos de ilegalidade. Nesta medida, os fundamentos devem ser declarados admissíveis.

26.

Efetuado este esclarecimento, que se afigura importante, abordarei inicialmente a questão de saber se o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na fiscalização da produção de prova da participação da recorrente no cartel, por um lado, após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004 e, por outro, entre 26 de maio de 2000 e 26 de junho de 2001 ao referir‑se ao facto de a recorrente não se ter publicamente distanciado de tal cartel durante estes períodos e à perceção que podem ter tido os membros do referido cartel quanto à participação da recorrente.

27.

Por conseguinte, os primeiro e terceiro fundamentos invocados pela recorrente serão apreciados em conjunto.

A – Quanto aos primeiro e terceiros fundamentos, relativos a uma violação do artigo 101.o TFUE, das regras de produção de prova, dos princípios da presunção de inocência e da segurança jurídica, assim como da exigência de fundamentação, na medida em que o Tribunal Geral considerou que a recorrente participou na infração, por um lado, após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004 e até 28 de abril de 2005 e, por outro, entre 26 de maio de 2000 e 26 de junho de 2001

1. Argumentação das partes

28.

Com o seu primeiro fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral cometeu vários erros de direito ao validar a abordagem da Comissão relativamente à sua participação na infração até 28 de abril de 2005.

29.

Em primeiro lugar, baseando‑se apenas na constatação de que a recorrente não apresentou a prova de que se distanciou publicamente do cartel, o Tribunal Geral inverteu o ónus da prova da duração da participação da recorrente na infração, quando lhe cabia verificar se a Comissão tinha cumprido a sua obrigação de apresentar a prova de que a infração perdurou ininterruptamente entre 12 de maio de 2004 e 28 de abril de 2005, uma vez que a recorrente não participou em contactos colusórios após esta última data.

30.

Em segundo lugar, o Tribunal Geral interpretou incorretamente a jurisprudência do Tribunal de Justiça e a sua própria jurisprudência ao instituir o princípio geral segundo o qual a inexistência de distanciamento público exclui, por princípio, qualquer cessação da infração. Com efeito, a exigência de distanciamento público imposta por esta jurisprudência explica‑se pela participação da empresa em causa em reuniões colusórias e por indícios de concertações ininterruptas durante o período controvertido.

31.

Em terceiro lugar, a tese do Tribunal Geral estabelece uma presunção que comporta um risco de arbitrariedade e de insegurança jurídica, uma vez que a Comissão pode, assim, estabelecer a participação de uma empresa num cartel durante todo esse período quando esta empresa tenha participado numa única reunião anticoncorrencial sem dela se distanciar publicamente. No caso em apreço, os elementos aduzidos pelo Tribunal Geral nos n.os 375 e 376 do acórdão recorrido são relativos a iniciativas puramente unilaterais da empresa que organizava o cartel, que podem, quanto muito, demonstrar que esta empresa pretendeu que a recorrente estivesse presente nas três últimas reuniões técnicas. Ora, a recorrente não deu qualquer seguimento a estas iniciativas. Por outro lado, a posição do Tribunal Geral (n.o 380 do acórdão recorrido), segundo a qual o simples facto de a recorrente não ter participado nas últimas reuniões técnicas não demonstra que não utilizou as informações que recebeu nas anteriores reuniões em que participou e que não beneficiou dos acordos celebrados nestas reuniões equivale igualmente a uma inversão do ónus da prova. De resto, este raciocínio é desmentido pelo facto de o cartel se ter materializado através de uma sucessão de concertações que ocorreram com uma periocidade muito próxima, de três a quatro meses em média.

32.

A Comissão alega que, mesmo admitindo que o primeiro fundamento deve ser considerado admissível este é, em todo o caso, improcedente.

33.

Segundo a Comissão, a recorrente interpretou a jurisprudência incorretamente. No essencial, a recorrente refere‑se aos acórdãos do Tribunal Geral relativos, cada um, a casos específicos que não são necessariamente transponíveis para o processo principal, e isto tanto mais quanto a duração da participação numa infração é uma questão de facto cuja prova deve ser apresentada caso a caso em função das circunstâncias do processo. Salienta que, no processo principal, a prova da continuidade da infração no que respeita à recorrente é relativa à conjugação entre o facto de ter continuado a ser convidada para as reuniões, o que pressupõe que aquele que convida considera que o convidado participa no cartel, e que não se distanciou deste, sendo que os dois elementos estão indissociavelmente ligados.

34.

No entendimento da Comissão, a jurisprudência do Tribunal de Justiça confirma a sua posição e a do Tribunal Geral. Com efeito, no acórdão Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6), o Tribunal de Justiça nunca afirmou que era absolutamente necessário ter participado nas reuniões para que possa ser exigido um distanciamento. Em contrapartida, o critério da perceção dos outros membros do cartel já foi claramente estabelecido. Em resumo, a Comissão alega que a jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral confirma que a inexistência de distanciamento é um elemento bastante importante quando são constatados outros indícios de continuação da participação no cartel e que, em todo o caso, a perceção dos outros membros do cartel é essencial. Deste modo, a jurisprudência não estabelece uma hierarquia dos meios de prova e, no processo principal, nem a Comissão nem o Tribunal Geral se basearam exclusivamente na falta de distanciamento da recorrente.

35.

Em todo o caso, segundo a Comissão, este fundamento carece de base factual. Com efeito, no considerando 602 da decisão controvertida, a Comissão, longe de se fundar exclusivamente na falta de distanciamento público da recorrente, expôs os indícios, que devem ser apreciados em conjunto, que confirmam a continuação da participação da recorrente no cartel assim como essa perceção por parte dos outros participantes. O Tribunal Geral apreciou soberanamente o valor que devia ser atribuído a estes elementos.

36.

No que respeita à produção de prova, a Comissão afirma que se baseou, em primeiro lugar, no facto de a recorrente ter sido convidada para três reuniões que ocorreram antes da execução das inspeções e, em segundo lugar, que não considerou que o único correio eletrónico de 3 de novembro de 2004 podia representar um distanciamento público. O facto de considerar que a continuação da participação no cartel está demonstrada se não existir prova em sentido contrário, que pode assumir a forma de um verdadeiro distanciamento público, é conforme aos princípios que regem o direito probatório. Por outro lado, a não participação de uma empresa em reuniões não implica que se tenha retirado do cartel. As considerações da recorrente, segundo as quais o Tribunal Geral não constatou factos suficientemente próximos no tempo para estabelecer a continuidade da infração são irrelevantes uma vez que, no caso em apreço, não se trata de interrupção temporária da participação num cartel, mas da questão de saber se a empresa em causa permanece como membro deste até ao fim.

37.

Quanto ao terceiro fundamento, as partes alegam o seguinte.

38.

A recorrente afirma que, conforme resulta claramente da declaração efetuada por uma empresa que participava no cartel (declaração que figura nos autos), o seu representante abandonou de forma abrupta e exasperada a reunião de 25 e 26 de maio de 2000 e que nunca mais participou em reuniões posteriores. Não é contestado que, após esta discussão, a recorrente não participou em nenhuma das três reuniões seguintes até ao momento em que o seu novo representante assistiu à reunião de 26 e 27 de junho de 2001. A recorrente sublinha que, em contrapartida, participou em 18 das 21 reuniões organizadas nos cinco anos anteriores, ou seja, em cerca de 4 reuniões por ano.

39.

Segundo a recorrente, a conclusão a que o Tribunal Geral chegou com o fundamento de que esta não tinha apresentado a prova de que se distanciou publicamente do cartel, sem verificar se a Comissão cumpriu a sua obrigação de apresentar os elementos de prova que permitem considerar que a recorrente participou sempre no cartel, constitui uma violação do princípio da presunção de inocência. A recorrente refere‑se ao acórdão Gosselin Group/Comissão ( 8 ), segundo o qual a retoma da participação num cartel é inerente ao facto de se tratar de uma interrupção e o simples facto de a empresa em causa ter participado no cartel tanto antes como após o referido período, é irrelevante.

40.

No que respeita ao critério da perceção dos participantes num cartel, a recorrente afirma que nunca foi alegado nem demonstrado que tinha sido considerada um membro do cartel entre maio de 2000 e junho de 2001 e que, em contrapartida, resulta da já referida declaração de outra empresa que participou no cartel que esta não tinha qualquer dúvida sobre a interrupção da participação da recorrente durante o referido período de treze meses. Em todo o caso, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao excluir qualquer distanciamento público da recorrente na reunião de 25 e 26 de maio de 2000, contrariamente à sua abordagem em relação à situação da Repsol (v., segundo fundamento), de acordo com a qual o critério do distanciamento público pode ser preenchido desde que seja demonstrado que os outros participantes numa reunião têm dúvidas acerca da participação da empresa em causa. Com efeito, o Tribunal Geral aceitou o distanciamento da Repsol com base na mera constatação de que cessaram os convites oficiais enviados pela empresa organizadora das reuniões.

41.

A Comissão alega, a título principal, que este fundamento é inadmissível. A título subsidiário, afirma que este fundamento é improcedente, uma vez que não baseou a sua apreciação relativa à continuidade da participação da recorrente no cartel durante este período apenas na falta de distanciamento. Assim, resulta do considerando 603 da decisão controvertida que, tendo em conta o contexto global, a não participação da recorrente em três reuniões sucessivas, seguida de um regresso regular a partir do mês de junho de 2001, a partir do momento em que o representante da recorrente mudou, não pode constituir uma interrupção de participação no cartel em si mesma. O Tribunal Geral confirmou esta análise com fundamento não só na falta de distanciamento, mas no exame das circunstâncias em que o representante da recorrente abandonou a reunião de 26 de maio de 2000. Com base nesta análise, o Tribunal Geral concluiu que tal não constituía um distanciamento público. A Comissão acrescenta que a saída do representante da recorrente desta reunião não indicava uma retirada do cartel, mas antes um desacordo no que respeita às modalidades de aplicação do cartel. Aliás, o incidente ocorrido na reunião de 26 de maio de 2000 não é descrito, nas declarações efetuadas pela Sasol, como uma retirada da recorrente do cartel.

42.

Além disso, a Comissão alega que, em todo o caso, provou que a recorrente participou no cartel durante todo o período controvertido, de acordo com os princípios desenvolvidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça ( 9 ). Por outro lado, a prova da duração da participação de uma empresa num cartel é uma questão factual. No caso em apreço, a inexistência de elementos de prova de contactos anticoncorrenciais ou de participação em tais contactos durante um período de um ano não basta, por si só, para estabelecer a interrupção da participação no cartel ( 10 ). A este respeito, o argumento da recorrente segundo o qual esta inexistência, pela sua duração e pela sua continuidade, assume um caráter excecional, não se afigura convincente, uma vez que a recorrente também esteve algumas vezes ausente das reuniões colusórias. Em contrapartida, o Tribunal Geral sublinhou que, durante o período controvertido, a recorrente podia beneficiar das informações obtidas nas reuniões anteriores e nos acordos celebrados. Por conseguinte, segundo a Comissão, o Tribunal Geral decidiu corretamente que esta ausência de algumas reuniões constituía apenas um incidente isolado ligado a uma pessoa e nada tinha a ver com uma interrupção da participação da recorrente no cartel.

2. Apreciação

43.

Antes de examinar os parâmetros adotados pela Comissão e confirmados pelo Tribunal Geral para estabelecer a participação da recorrente durante os dois períodos controvertidos, a saber, respetivamente, entre 12 de maio de 2004 e 28 de abril de 2005 (o período de cessação) e entre 26 de maio de 2000 e 26 de junho de 2001 (o período de suspensão/de interrupção), afigura‑se oportuno recordar alguns aspetos sobre os princípios que regem a produção de prova da duração da participação de uma empresa num cartel e, neste contexto, explicar de que modo é que deve ser entendida a referência, que consta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, ao distanciamento público ( 11 ) da empresa em causa.

a) Ensinamentos da jurisprudência sobre o ónus da prova da participação de uma empresa num cartel e sobre a exigência de distanciamento público

44.

Para efeitos do exame das alegações invocadas no âmbito do presente recurso, importa ter presentes alguns princípios fundamentais em matéria de administração e de ónus da prova dos comportamentos anticoncorrenciais.

45.

Antes de mais, há que recordar que cabe à Comissão provar não só a participação num cartel mas igualmente a sua duração. Por força da presunção de inocência, qualquer dúvida sobre a duração ou a continuidade da participação de uma empresa numa infração deve ser decidida a favor desta ( 12 ).

46.

Em seguida, no que respeita mais precisamente à determinação da duração da participação de uma dada empresa numa infração, afigura‑se pacífico que, na falta de elementos de prova suscetíveis de estabelecer diretamente a duração de uma infração, a Comissão deve invocar, no mínimo, elementos de prova que estão relacionados com factos suficientemente próximos no tempo, de modo a que possa ser razoavelmente admitido que esta infração perdurou ininterruptamente entre duas datas precisas. O Tribunal de Justiça admitiu assim que a existência de um comportamento ilícito podia ser inferido de um determinado número de coincidências e de indícios que, considerados no seu todo, podem constituir, na falta de outra explicação coerente, a prova de uma violação das regras da concorrência ( 13 ).

47.

Por último, parece ter sido efetuada uma distinção consoante se trate de determinar a data de cessação de uma participação num cartel e os eventuais períodos de suspensão da referida participação. Nomeadamente, isto resulta do acórdão proferido no processo Comissão/Verhuizingen Coppens ( 14 ), no qual o Tribunal de Justiça admitiu que a Comissão tinha fundamento para considerar que a sociedade visada podia ser considerada responsável por ter participado no referido acordo, ininterruptamente, durante todo o período compreendido entre 13 de outubro de 1992 e 29 de julho de 2003, mesmo que não existisse prova da participação ativa desta no acordo sobre os orçamentos de conveniência para os anos de 1994 e 1995.

48.

O Tribunal de Justiça esclareceu, assim, que o facto de a prova concreta da aplicação de um acordo anticoncorrencial por uma empresa não ter sido produzida relativamente a determinados períodos não obsta a que a infração seja considerada praticada durante um período global mais extenso do que estes, desde que tal conclusão assente em indícios objetivos e concordantes. No âmbito de uma infração que se estende por vários anos, o facto de as manifestações do cartel ocorrerem em períodos diferentes, podendo ser separados por lapsos de tempo mais ou menos longos, não tem incidência quanto à existência desse cartel, desde que as diferentes ações que fazem parte dessa infração prossigam uma única finalidade e se inscrevam no âmbito de uma infração com caráter único e continuado ( 15 ).

49.

Tendo em conta as regras fundamentais que regulam o ónus e a produção de prova na matéria, esta jurisprudência não pode, em meu entender, conduzir à exclusão de qualquer possibilidade de provar que uma empresa suspendeu efetivamente a sua participação num cartel durante um determinante período. Em função da periodicidade dos contactos controvertidos e do caráter significativo, ou não, do período de interrupção alegado relativamente à duração global do cartel, o que compete apenas ao tribunal que aprecia o mérito verificar, é perfeitamente possível concluir que a referida empresa não participou no cartel controvertido durante um ou vários períodos determinados.

50.

Dito de outro modo, a resposta à questão de saber se a inexistência de prova material da participação de uma empresa durante determinados períodos é, ou não, significativa depende das circunstâncias específicas de cada caso. Para ilustrar o meu propósito, refiro o exemplo de um cartel que se estende por uma década e que se materializou em reuniões plurianuais entre concorrentes com um objeto anticoncorrencial. A eventual ausência de um representante de uma empresa em duas reuniões afigura‑se insignificante se existirem outros indícios objetivos e concordantes que confirmem a participação da referida empresa durante o período em causa.

51.

De que modo deve ser compreendida, neste contexto, a exigência de distanciamento público da empresa?

52.

Para responder a esta questão, importa ter em conta as circunstâncias da sua elaboração e especialmente as circunstâncias que deram origem ao acórdão Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6).

53.

Recordo que, neste processo, a sociedade incriminada punha em causa o facto de a Comissão, apoiada neste ponto pelo Tribunal Geral, se referir à circunstância de esta sociedade não se ter distanciado publicamente do acordo.

54.

Chamado a pronunciar‑se sobre esta questão, o Tribunal de Justiça confirmou a abordagem defendida pela Comissão e validada pelo Tribunal Geral. No caso em apreço, declarou que bastava à Comissão demonstrar que a empresa em causa participou em reuniões nas quais foram celebrados acordos de natureza anticoncorrencial, sem a eles se terem oposto, de forma manifesta para provar suficientemente a participação da referida empresa no cartel. Conforme salientou o Tribunal de Justiça, quando a participação nessas reuniões estiver provada ( 16 ), cabe a esta empresa apresentar indícios que possam demonstrar que a sua participação nas referidas reuniões se tinha verificado sem qualquer espírito anticoncorrencial, demonstrando que tinha indicado aos seus concorrentes que participava nessas reuniões numa ótica diferente da deles (v., n.o 81 do acórdão).

55.

É neste sentido que deve ser compreendida a exigência de distanciamento público que assenta na premissa essencial de que a empresa participou numa reunião ou que manteve contactos de natureza anticoncorrencial. O Tribunal de Justiça teve assim o cuidado de esclarecer que «[a razão subjacente a este princípio de direito é que, tendo participado na referida reunião sem se distanciar publicamente do seu conteúdo, a empresa deu a entender aos outros participantes que subscrevia o seu resultado e que atuaria em conformidade com ele»] (v., n.o 82 do acórdão).

56.

Por outras palavras, o critério de não distanciamento público permite manter a presunção, baseada em indícios concretos, segundo a qual se presume que uma empresa que participou em reuniões com um objeto anticoncorrencial participou num cartel abrangido pela proibição do artigo 101.o, n.o 1, TFUE. A referência ao não distanciamento público não pode, em meu entender, mitigar a inexistência de prova de participação, ainda que passiva, numa reunião com um objeto anticoncorrencial. Conforme salientou o advogado‑geral D. Ruiz‑Jarabo Colomer neste processo ( 17 ), se uma empresa participa, juntamente com os seus concorrentes no mercado, em uma ou mais reuniões das quais resulte um acordo contrário à concorrência, a técnica da presunção permite deduzir, na falta de manifestação expressa em contrário, que faz parte do cartel, sobretudo se, depois, participar em medidas de execução do pacto anticoncorrencial. Para demonstrar o mérito de tal presunção, importa, conforme precisa, «partir de factos provados ( 18 ) que permitam […] considerar provados determinados factos» ( 19 ).

57.

Esta solução, que se insere logicamente na solução que já foi adotada em vários processos, relativamente ao recurso a certas presunções ( 20 ), implica que, na falta de qualquer prova de contactos ou de manifestações colusórias entre uma empresa e outros participantes num cartel, a Comissão não se pode limitar a concluir que a participação de uma empresa continuou com base na mera constatação de que esta tinha a obrigação de se distanciar do cartel.

58.

Assim, a exigência de distanciamento público apenas faz sentido se a empresa tiver efetivamente participado em reuniões colusórias ou, pelo menos, se existirem indícios de concertação durante um determinado período. Por conseguinte, só deve ser tida em consideração na presença de uma situação em que seja possível presumir, à luz de elementos concretamente recolhidos na instrução, que a empresa incriminada continuou a participar num cartel. A inexistência de distanciamento público de um cartel por parte de uma empresa não pode constituir, por si só, a prova de tal participação.

59.

O Tribunal de Justiça teve oportunidade de recordar estes princípios em várias ocasiões ( 21 ).

60.

Resulta do conjunto destas considerações que a exigência de distanciamento público deve ser concebida como uma obrigação a cargo da empresa em causa para que esta possa provar que já não participava num cartel durante um determinado período apesar de aparentemente nele participar. Com efeito, recordo que, assim, a exigência de distanciamento público apenas tem sentido se a empresa tiver efetivamente participado em reuniões colusórias ou, pelo menos, se existirem indícios de concertação durante um determinado período.

61.

Importa recordar assertivamente este princípio, sob pena de criar um desvio prejudicial à correta leitura dos princípios que regulam o ónus e a produção de prova dos comportamentos anticoncorrenciais.

b) Aplicação ao caso em apreço: necessária distinção entre a prova da cessação definitiva da pertença ao cartel e prova da interrupção/suspensão da participação

i) Prova da participação da recorrente durante o período de cessação (primeiro fundamento)

62.

Conforme a Comissão sublinhou nos seus articulados, ela concluiu, na decisão controvertida, que a recorrente participou na infração até às verificações que a Comissão efetuou em 28 de abril de 2005, uma vez que, apesar de não ter sido provado que assistiu às reuniões que se realizaram após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004, a recorrente não apresentou qualquer prova que confirme que se retirou formalmente do cartel naquela data. O Tribunal Geral, com base na apreciação dos factos relatados no considerando 602 da decisão controvertida, concluiu que a recorrente não se distanciou do cartel de acordo com a perceção dos outros participantes.

63.

Importa recordar que, no considerando 602 da decisão controvertida, a Comissão afirmou o seguinte:

«[A recorrente] afirma que não participou em nenhuma reunião técnica após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004 e acrescenta que o seu representante cancelou a sua ida à reunião de 3 e 4 de novembro de 2004, de acordo com uma comunicação interna, a conselho do seu superior. A Comissão chama a atenção para o facto de não existir qualquer prova relativa a uma eventual saída do cartel. Nos casos de infrações complexas, o facto de uma empresa não estar presente numa reunião ou não estar de acordo com o que é discutido numa reunião não significa que a empresa tenha deixado de participar numa infração continuada. Para pôr termo à infração, a empresa deve distanciar‑se claramente do cartel. […] [A recorrente] não apresentou qualquer prova específica de que adotou, de forma totalmente autónoma, uma estratégia unilateral no mercado e de que se distanciou clara e abertamente das atividades do cartel. Pelo contrário, as provas de que a Comissão dispõe demonstram que [a recorrente] recebeu os convites oficiais para as três reuniões técnicas seguintes (ou seja, as três últimas reuniões técnicas organizadas antes da realização das inspeções). A Comissão chama a atenção para o facto de o representante [da recorrente] ter confirmado a sua presença na reunião de 3 e 4 de novembro de 2004, ainda que, aparentemente, tenha acabado por cancelar a sua ida. De igual modo, no que respeita à reunião de 23 e 24 de fevereiro de 2005, a [Sasol Wax International AG, Sasol Holding in Germany GmbH e a Sasol Limited, organizadora desta reunião, a seguir ‘Sasol’] já tinha reservado um quarto para o representante [da recorrente] no hotel onde a reunião [se ia realizar], reserva essa que acabou por ser cancelada. Donde a Comissão conclui que, para a Sasol e os restantes participantes, era claro que [a recorrente] tinha participado no cartel até ao fim. A Comissão observa igualmente que as discussões mantidas nas reuniões não eram fundamentalmente diferentes das levadas a cabo nas reuniões anteriores, tendo os participantes continuado a discutir os aumentos de preços, sem referir qualquer tentativa por parte [da recorrente] de sair do cartel (v. considerandos 175, 176 e 177), e que não era invulgar algumas das empresas não participarem em determinadas reuniões ao longo da existência do cartel. Estes dois elementos provam que não houve a perceção de que [a recorrente] tinha saído do cartel após a reunião de maio de 2004. Em todo o caso, a comunicação interna do representante [da recorrente] sobre as razões pelas quais não participou numa reunião não pode ser considerada um distanciamento público. Uma vez que nenhuma outra informação indica [que esta] se distanciou do cartel, a Comissão considera que a participação [da recorrente] no cartel não terminou antes das inspeções.»

64.

No acórdão recorrido, o Tribunal Geral subscreveu a posição da Comissão relativa ao critério do distanciamento público, assim como a perceção deste distanciamento pelos outros participantes do cartel e constatou que a recorrente não se distanciou publicamente do cartel de acordo com a perceção dos outros participantes ( 22 ).

65.

Por outro lado, o Tribunal Geral referiu o correio eletrónico interno de 3 de novembro de 2004 enviado por um agente da recorrente, que tinha a seguinte redação: «[t]endo em conta o objetivo do meeting na Áustria, sigo a recomendação de Thibault. Cancelo a ida a Viena (com partida inicialmente prevista para esta tarde)», e concluiu que tal correio interno, não comunicado aos outros participantes, não constitui um distanciamento público ( 23 ).

66.

Além disso, o Tribunal Geral salientou, a título superabundante, que o simples facto de a recorrente não ter participado nas últimas reuniões técnicas não demonstrava, de forma alguma, que não utilizou a informação sobre os preços aplicados pelas suas concorrentes recebida nas dezenas de reuniões técnicas anteriores em que esteve presente, e que não beneficiou dos acordos de repartição de mercados e de clientes celebrados nas referidas reuniões. O Tribunal Geral concluiu que a recorrente não apresentou nenhuma prova que demonstre que deixou de atuar de acordo com as decisões do cartel em 12 de maio de 2004 ( 24 ).

67.

Desta forma, coloca‑se a questão de saber se, apesar desta constatação, a Comissão podia chegar à conclusão, subscrita pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido, de que a recorrente participou no cartel mesmo após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004. Em especial, importa responder à questão de saber se, para o efeito, era possível considerar o facto de a recorrente não se ter formalmente retirado do cartel e de, para tal, não ter apresentado a prova do seu distanciamento público do cartel.

68.

Exceto se violar os princípios, acima recordados, que devem regular a prova e a produção de prova dos comportamentos anticoncorrenciais, considero que deve ser dada uma resposta negativa à questão.

69.

No caso em apreço, não é contestado que a recorrente não participou nas últimas reuniões técnicas do cartel que se realizaram entre 12 de maio de 2004 (data da sua última participação nas referidas reuniões) e em 29 de abril de 2005 (data em que foram efetuadas as inspeções da Comissão). É igualmente pacífico que não existe qualquer indício de que a recorrente manteve algum contacto com os participantes no cartel controvertido durante este mesmo período.

70.

Neste contexto, não existia o menor indício de prova de que a recorrente tinha, após as reuniões de 11 e 12 de maio de 2004, continuado a participar no cartel controvertido, seja participando nas referidas reuniões ou realizando outras ações colusórias.

71.

A eventual perceção que outros participantes no cartel possam ter acerca da continuação da participação da recorrente para além destas datas não parece ser um critério determinante. Além de tal perceção, materializada em convites e reservas de hotel, não estar claramente demonstrada, não constitui um indício de participação ativa ou tácita no cartel.

72.

O facto, evocado na audiência, de que a Comissão podia ter a firme convicção de que a recorrente, ao contrário de outras empresas ( 25 ), continuou a pertencer ao cartel deve assentar em indícios concretos e não num sentimento ou numa impressão subjetiva, eventualmente corroborado pela presumível compreensão de outros participantes no cartel.

73.

Resulta de todas estas considerações que, no que respeita a este ponto, o acórdão recorrido é censurável. Em meu entender, o Tribunal Geral errou ao confirmar a conclusão de que a recorrente participou no cartel após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004 e até às inspeções do mês de abril de 2005.

74.

Nesta medida, o acórdão recorrido deverá, assim, ser anulado. As consequências concretas de tal anulação sobre o montante da coima aplicada à recorrente serão examinadas em seguida.

ii) Prova da participação da recorrente no cartel entre 26 de maio de 2000 e 26 de junho de 2001 (terceiro fundamento)

75.

Embora as considerações anteriores sejam mutatis mutandis válidas relativamente à prova da participação da recorrente entre 26 de maio de 2000 e 26 de junho de 2001, existe uma grande diferença no facto de, no caso em apreço, estar em causa saber não se a recorrente cessou totalmente a sua participação mas se, eventualmente, interrompeu esta participação durante um determinado período.

76.

Por outras palavras, os princípios que regem o ónus e a produção de prova dos comportamentos anticoncorrenciais são os mesmos. O que diverge é a sua aplicação aos factos que é necessário provar, ou seja, respetivamente, uma interrupção temporária ou uma cessação definitiva da participação num cartel.

77.

Conforme já referi, deve efetivamente ser admitido que os elementos que conduzem a Comissão a concluir pela suspensão, ou não, de uma participação de uma empresa num cartel devem ser entendidos de forma diferente, uma vez que dependem em grande medida de todas as circunstâncias que rodearam a presumível interrupção e das características específicas das atividades colusórias imputadas, tais como a sua frequência e a sua complexidade.

78.

No caso em apreço, afigura‑se que tanto a Comissão (v., considerando 603 da decisão controvertida) como o Tribunal Geral (n.os 394 a 403 do acórdão recorrido) procederam a um exame circunstanciado das condições de saída do representante da recorrente da reunião de 25 e 26 de maio de 2000 e dos contactos anticoncorrenciais visados.

79.

Além de este exame não poder, na falta de uma desvirtuação verificada dos factos, ser posto em causa no âmbito do presente recurso, a abordagem acolhida aparenta ser em larga medida conforme à jurisprudência segundo a qual o facto de essa prova não ter sido produzida relativamente a determinados períodos não obsta a que a infração seja considerada praticada durante um período global mais extenso do que estes, desde que tal conclusão assente em indícios objetivos e concordantes. No âmbito de uma infração que se estende por vários anos, o facto de as manifestações do cartel ocorrerem em períodos diferentes, podendo ser separadas por lapsos de tempo mais ou menos longos, não tem incidência na existência desse acordo, desde que as diferentes ações que fazem parte dessa infração prossigam uma única finalidade e se inscrevam no âmbito de uma infração de caráter único e continuado ( 26 ).

80.

A apreciação da questão de saber se as diferentes ações que fazem parte do cartel visado no caso em apreço prosseguem uma única finalidade e se inserem no âmbito de uma infração de caráter único e continuado, não foi de forma alguma posta em causa no processo principal e depende, em todo o caso, de um exame que está fora da competência do Tribunal de Justiça no âmbito do presente recurso.

81.

Assim, é possível estabelecer uma analogia entre a questão submetida no caso em apreço e a questão examinada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Comissão/Verhuizingen Coppens, no qual foi decidido que a inexistência de prova de contactos anticoncorrenciais ou de participação em tais contactos durante um período de um ano não pode bastar, por si só, para demonstrar a interrupção do cartel ( 27 ).

82.

Por conseguinte, considero que o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

B – Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação do princípio da igualdade de tratamento, a uma desvirtuação dos elementos de prova e a uma falta de fundamentação na medida em que o Tribunal Geral excluiu que a recorrente se tenha retirado após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004, mas reconheceu a saída da Repsol após a reunião

1. Argumentação das partes

83.

O segundo fundamento invocado pela recorrente articula‑se em duas partes.

84.

Na primeira parte, a recorrente invoca, no essencial, que a conclusão do Tribunal Geral, que se baseia no postulado incorreto em matéria de facto segundo o qual a Repsol deixou de receber convites «oficiais» após a reunião de 11 e 12 de maio de 2004, assenta numa desvirtuação das provas e está ferida, em vários aspetos, de falta de fundamentação.

85.

A segunda parte consiste em denunciar uma violação do princípio da não discriminação. A recorrente alega que a duração da sua participação no cartel foi examinada pelo Tribunal Geral com fundamento em critérios diferentes e mais estritos do que os que foram aplicados à Repsol. Com efeito, o Tribunal Geral sujeitou a recorrente a uma exigência de distanciamento público mas não o fez em relação à Repsol, cuja saída foi admitida mesmo sem distanciamento.

86.

A Comissão alega, a título principal, que o fundamento é inoperante, uma vez que nenhum dos argumentos invocados diz respeito à Total, mas sim à situação específica da Repsol. A Comissão alega que, em todo o caso, o fundamento é improcedente.

2. Apreciação

87.

Admitindo que o primeiro fundamento não deve ser acolhido, coloca‑se a questão de saber se a recorrente não foi alvo de um tratamento diferente em relação à Repsol.

88.

A este respeito, importa observar que, nos termos do considerando 604 da decisão controvertida, a Comissão entendeu, nomeadamente, que o caso da Repsol era diferente do caso da Total, uma vez que a reserva dos quartos de hotel efetuada para as duas reuniões de 3 e 4 de novembro de 2004 e de 23 e 24 de fevereiro de 2005 demonstra que a Sasol estava convencida de que a Total iria assistir à reunião, mas não tinha a mesma certeza em relação à Repsol.

89.

O Tribunal Geral, nos n.os 385 a 389 do acórdão recorrido, considerou, no essencial, que existia uma diferença entre as situações destas duas empresas no que respeita à perceção que os outros participantes no cartel tinham do seu distanciamento, perceção que seria materializada pelo envio de convites oficiais e de reservas de hotel.

90.

Considero, pela minha parte, que, no caso de o primeiro fundamento dever ser julgado improcedente, o presente fundamento deve ser declarado inoperante.

91.

Conforme muito corretamente recordou a Comissão, a argumentação da recorrente é relativa não à sua situação específica, mas à situação da Repsol. Mesmo admitindo que o Tribunal Geral cometeu algum erro de apreciação, a recorrente não pode invocá‑lo em seu benefício, com a finalidade, nomeadamente, de reduzir a duração da sua participação no cartel em causa.

92.

Com efeito, é ponto assente que o princípio da igualdade de tratamento deve ser conciliado com o respeito pela legalidade. Ninguém pode invocar em seu benefício uma ilegalidade cometida a favor de outrem ( 28 ).

93.

Por conseguinte, entendo que, mesmo na hipótese de se dever considerar que o raciocínio do Tribunal Geral exposto nos n.os 385 a 389 do acórdão recorrido está ferido de algum erro, há que julgar improcedente o segundo fundamento invocado pela recorrente.

C – Quanto ao quarto fundamento, relativo a uma violação dos princípios da proteção jurisdicional efetiva, da individualidade das penas e das sanções, assim como da exigência de fundamentação, na medida em que o Tribunal Geral excluiu, sem o ter examinado, o fundamento relativo ao facto de não terem sido tomadas em consideração as provas económicas do comportamento concorrencial da recorrente

1. Argumentação das partes

94.

A recorrente alega que, em conformidade com o artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003 ( 29 ), o Tribunal Geral decide nos processos de concorrência com uma competência de plena cognição e que, não obstante o facto de a Comissão dispor de uma margem de apreciação em domínios que dão origem a apreciações económicas complexas, o Tribunal Geral não deve, contudo, abster‑se de fiscalizar a interpretação, por parte da Comissão, de dados de natureza económica ( 30 ). Por outro lado, o princípio da individualidade das penas exige que a não aplicação do acordo seja apreciada individualmente para cada uma das empresas, nomeadamente para o cálculo da coima que lhes deve ser aplicada.

95.

A recorrente alega que o Tribunal Geral se absteve de responder ao seu fundamento relativo à não tomada em consideração das provas económicas por esta se ter comportado de acordo com as regras da concorrência, e de examinar a relevância e o conteúdo destas provas. Com efeito, a recorrente submeteu à Comissão, e posteriormente ao Tribunal Geral, uma análise económica aprofundada que abrange todo o período da infração e que demonstra que nunca aplicou os acordos que foram concluídos nas reuniões técnicas. Esta análise foi ignorada na decisão controvertida e também no acórdão recorrido, na medida em que os n.os 406 e 407 não dão qualquer resposta aos argumentos da recorrente sobre a inexistência de qualquer exame da sua análise económica com vista à apreciação individual do seu comportamento concorrencial no âmbito da fiscalização da sanção e, em particular, das circunstâncias atenuantes. Neste contexto, a recorrente afirma que as conclusões do Tribunal Geral no âmbito do exame do segundo fundamento da petição inicial, para o qual remete o n.o 407 do acórdão recorrido (v., nomeadamente, n.os 186 e 237), dizem respeito à aplicação do acordo a nível global e não ao comportamento individual de cada uma das empresas implicadas.

96.

A Comissão afirma, a título principal, que o fundamento é inadmissível e que, em todo o caso, é improcedente.

2. Apreciação

97.

Em minha opinião este fundamento deve ser rejeitado.

98.

De facto, afigura‑se que o Tribunal Geral consagrou amplas considerações para responder aos argumentos e documentos apresentados pela recorrente com vista a demonstrar que não tinha aplicado o acordo.

99.

Com efeito, nos n.os 163 a 190 do acórdão recorrido, que se inserem no exame do segundo fundamento, o Tribunal Geral rejeitou o argumento da recorrente segundo o qual não aplicou o acordo sobre os preços. Em particular, o Tribunal Geral baseou‑se em provas in tempore non suspecto, tais como as cartas com os preçários da recorrente que comunicavam aumentos dos preços aos clientes (v., nomeadamente, n.o 189 do acórdão).

100.

Por outro lado, o Tribunal Geral, nos n.os 243 a 259 do acórdão recorrido, que também se referem ao exame deste segundo fundamento de recurso invocado em primeira instância, reproduziu com precisão o raciocínio seguido para demonstrar que a recorrente não apresentou provas que confirmem que adotou um comportamento concorrencial no mercado, ao contrário do que sustentava no estudo económico submetido ao Tribunal Geral.

101.

Assim, afigura‑se que o Tribunal Geral cumpriu a sua missão de verificação e de fiscalização da análise da Comissão relativa aos elementos apresentados pela recorrente quanto ao seu comportamento no mercado.

102.

Por conseguinte, a alegação da recorrente segundo a qual o Tribunal Geral apenas efetuou uma análise económica «global», sem ter em consideração a sua situação individual, é, aparentemente, infundada.

VI – Conclusão intercalar

103.

Conforme referi anteriormente, afigura‑se que o primeiro fundamento invocado no recurso é procedente e que, por conseguinte, há que anular o acórdão recorrido na medida em que o Tribunal Geral excluiu incorretamente a cessação da participação da recorrente na infração após 12 de maio de 2004.

104.

A anulação parcial do acórdão recorrido que proponho implica necessariamente uma reavaliação do montante da coima a que a recorrente foi condenada com vista a refletir corretamente a duração da sua participação na infração em causa. O processo parece efetivamente estar em condições de ser julgado na aceção do artigo 61.o, n.o 1, segundo período, do Estatuto do Tribunal de Justiça.

105.

Uma vez que, no âmbito do seu direito de apreciação, o Tribunal de Justiça dispõe de uma competência de plena cognição, prevista no artigo 261.o TFUE em conjugação com o artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003, pode livremente determinar o novo montante da coima ( 31 ).

106.

Embora esta competência habilite o juiz da União, para além da simples fiscalização da legalidade da coima, a substituir a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação, importa igualmente sublinhar que o exercício da competência de plena cognição não equivale a um conhecimento oficioso e que o processo é contraditório ( 32 ).

107.

Deste modo, proponho que o Tribunal de Justiça se limite a reavaliar diminuindo o montante da coima a fim de corrigir o erro de direito identificado no termo do exame do terceiro fundamento.

108.

Em vez de avançar arbitrariamente um número, sugiro, por outro lado, por uma questão de coerência e de previsibilidade, adotar a metodologia prevista nas Orientações de 2006, conforme afinada e ajustada pelo Tribunal Geral no que respeita ao coeficiente multiplicador a aplicar ( 33 ) e, assim, recalcular o montante da coima tendo em conta a duração reduzida da infração.

109.

Como recordou o Tribunal Geral no n.o 565 do acórdão recorrido, para calcular o montante da coima aplicada à recorrente, a Comissão teve em conta, a título da gravidade da infração, 18% do valor anual das vendas de ceras de parafina e 15% do valor anual das vendas de parafina bruta. Os montantes assim obtidos ( 34 ) foram multiplicados, em razão da duração da infração, por um coeficiente de 13 no que respeita às ceras de parafina, e de 7 no que respeita à parafina bruta. No total, incluindo o «montante de partida», a Comissão utilizou os multiplicadores de 14 para as ceras de parafina e de 7 para a parafina bruta.

110.

Para sanar as ilegalidades constatadas no n.o 561 do acórdão recorrido, ajustando o montante da coima aplicada à recorrente de modo a tomar em consideração a duração exata da sua participação na infração, o coeficiente multiplicador utilizado a título da duração da sua participação na infração foi fixado pelo Tribunal Geral em 12,64 (ao qual acresce um ponto a título do montante de partida) no que respeita às ceras de parafina (12 anos, 7 meses e 28 dias) ( 35 ) e em 6,53 no que respeita à parafina bruta (6 anos, 6 meses e 12 dias) ( 36 ). Por último, após aplicação do coeficiente de 1,7 ( 37 ) a título do efeito dissuasivo, o montante da coima foi fixado em 121626710 euros para as ceras de parafina e em 3833132 euros para a parafina bruta, ou seja, um montante total de coima aplicada à recorrente de 125459842 euros.

111.

No caso em apreço, sugiro retomar as etapas do cálculo da coima tendo em conta a ilegalidade relativa à determinação da duração da participação da recorrente no cartel sobre o mercado das ceras de parafina. Uma vez que a duração da participação da recorrente deve ser reduzida para 11 anos, 7 meses e 15 dias, há que reduzir o coeficiente multiplicador aplicado ao montante fixado para a infração (isto é, aquele que conjuga a tomada em consideração da duração da infração e do montante de partida) e sobre o referido mercado de 13,64 para 12,62, o que conduz a um montante intermédio de cerca de 66194974 euros. Após a aplicação do coeficiente de 1,7 a título do efeito dissuasivo, o montante da coima deve, segundo os meus cálculos, ser reduzido para cerca de 112531456 euros no que respeita às ceras de parafina. Acrescido do montante final fixado para a parafina bruta, ou seja, 3833132 euros, o montante total da coima aplicada à recorrente deverá ser fixado num montante de cerca de 116364588 euros.

112.

Por conseguinte, sugiro que o montante da coima aplicada à recorrente seja fixado num montante arredondado de 116364588 euros.

VII – Quanto às despesas

113.

Por força do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, se for dado provimento ao recurso e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

114.

Em conformidade com o artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, em conjugação com o artigo 184.o, n.o 1, deste mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. O artigo 138.o, n.o 3, do referido regulamento precisa que, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas. No entanto, nos termos da mesma disposição, se tal se afigurar justificado tendo em conta as circunstâncias do caso, o Tribunal de Justiça pode decidir que, além das suas próprias despesas, uma parte suporte uma fração das despesas da outra parte.

115.

No processo principal, considero que, tendo em conta as circunstâncias do caso em apreço, importa, no que respeita às despesas efetuadas em primeira instância, decidir que a Total Raffinage Marketing suportará oito décimos das suas próprias despesas e oito décimos das despesas da Comissão. A Comissão suportará dois décimos das suas próprias despesas e dois décimos das despesas efetuadas pela Total Raffinage Marketing.

116.

Quanto ao presente processo, proponho que cada uma das partes seja condenada a suportar as suas despesas referentes ao recurso.

VIII – Conclusão

117.

Tendo em consideração o exposto, proponho ao Tribunal de Justiça que decida da seguinte forma:

1)

O acórdão Total Raffinage Marketing/Comissão (T‑566/08, EU:T:2013:423) é anulado, na medida em que o Tribunal Geral excluiu erradamente a cessação da participação da recorrente na infração após 12 de maio de 2004.

2)

O artigo 1.o da Decisão C (2008) 5476 final da Comissão, de 1 de outubro de 2008, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.o [CE] e do artigo 53.o do Acordo EEE (processo COMP/39.181 — Cera de parafina) é anulado, na medida em que dá por provada a participação da recorrente num acordo continuado e/ou numa prática concertada no setor das ceras de parafina no mercado comum para o período compreendido entre 12 de maio de 2004 e 28 de abril de 2005.

3)

O montante da coima aplicada à Total Raffinage Marketing no artigo 2.o da Decisão C (2008) 5476 final é fixado em 116364588 euros.

4)

Relativamente às despesas referentes ao processo em primeira instância, a Total Raffinage Marketing suportará oito décimos das suas próprias despesas e oito décimos das despesas da Comissão. A Comissão suportará dois décimos das suas próprias despesas e dois décimos das despesas efetuadas pela Total Raffinage Marketing.

5)

Cada uma das partes suportará as suas despesas referentes ao recurso.


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) T‑566/08, EU:T:2013:423, a seguir «acórdão recorrido».

( 3 ) JO 2006, C 210, p. 2, a seguir «Orientações de 2006».

( 4 ) V., nomeadamente, acórdãos Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 51) e Quinn Barlo e o./Comissão (C‑70/12 P, EU:C:2013:351, n.o 26).

( 5 ) Acórdão Comap/Comissão (C‑290/11 P, EU:C:2012:271, n.o 70 e jurisprudência referida).

( 6 ) V. acórdão Comap/Comissão, C‑290/11 P, EU:C:2012:271, n.os 71 e 86, assim como jurisprudência referida.

( 7 ) V., neste sentido, acórdão Siemens e o./Comissão, C‑239/11 P, C‑489/11 P e C‑498/11 P, EU:C:2013:866, n.os 128 a 130 e jurisprudência referida.

( 8 ) T‑208/08 e T‑209/08, EU:T:2011:287, n.o 161.

( 9 ) Acórdãos Technische Unie/Comissão (C‑113/04 P, EU:C:2006:593, n.o 169) e Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 260).

( 10 ) Acórdão Comissão/Verhuizingen Coppens (C‑441/11 P, EU:C:2012:778, n.o 75).

( 11 ) V., nomeadamente, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.os 81 e 82, assim como jurisprudência referida).

( 12 ) V., neste sentido, acórdão Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão (C‑403/04 P e C‑405/04 P, EU:C:2007:52, n.o 52).

( 13 ) Acórdãos Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 57), assim como Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão (C‑403/04 P e C‑405/04 P, EU:C:2007:52, n.o 51).

( 14 ) C‑441/11 P, EU:C:2012:778.

( 15 ) V., a este respeito, acórdãos Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 260) e Technische Unie/Comissão (C‑113/04 P, EU:C:2006:593, n.o 169).

( 16 ) O sublinhado é meu.

( 17 ) Conclusões do advogado‑geral D. Ruiz‑Jarabo Colomer no processo Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, EU:C:2003:85, n.os 127 a 131).

( 18 ) O sublinhado é meu.

( 19 ) Conclusões do advogado‑geral D. Ruiz‑Jarabo Colomer no processo Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, EU:C:2003:85, n.o 128).

( 20 ) V., no mesmo sentido, acórdãos Hüls/Comissão (C‑199/92 P, EU:C:1999:358, n.o 155) e Montecatini/Comissão (C‑235/92 P, EU:C:1999:362, n.o 181).

( 21 ) V., nomeadamente, acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão (C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, EU:C:2005:408, n.os 142 a 145); despacho Adriatica di Navigazione/Comissão (C‑111/04 P, EU:C:2006:105, n.os 48 a 54), e acórdão Comap/Comissão (C‑290/11 P, EU:C:2012:271, n.os 73 a 76), no que respeita a empresas em relação às quais foi provado que participaram em reuniões com um objeto anticoncorrencial.

( 22 ) V. n.os 372 a 375 do acórdão recorrido.

( 23 ) V. n.os 378 e 379 do acórdão recorrido.

( 24 ) V. n.o 380 do acórdão recorrido.

( 25 ) Em particular, são visadas a situação específica da Repsol e a comparabilidade da sua situação com a da recorrente. Assim, o Tribunal Geral salientou que, ao contrário da Repsol, após 4 de agosto de 2004, no caso da recorrente não se verificou qualquer interrupção do envio dos convites oficiais para reuniões técnicas e que foram mesmo reservados quartos para o seu representante (v., nomeadamente, n.os 385 a 388 do acórdão recorrido).

( 26 ) Acórdão Comissão/Verhuizingen Coppens (C‑441/11 P, EU:C:2012:778, n.o 72).

( 27 ) Acórdão Comissão/Verhuizingen Coppens (C‑441/11 P, EU:C:2012:778, n.o 75).

( 28 ) V. acórdão The Rank Group (C‑259/10 e C‑260/10, EU:C:2011:719, n.o 62 e jurisprudência referida).

( 29 ) Regulamento do Conselho de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO 2003, L 1, p. 1).

( 30 ) Acórdão Kone e o./Comissão (C‑510/11 P, EU:C:2013:696, n.o 28).

( 31 ) Acórdão Comissão/Verhuizingen Coppens (C‑441/11 P, EU:C:2012:778, n.o 79 e jurisprudência referida).

( 32 ) V., nomeadamente, Comissão/Parker Hannifin Manufacturing e Parker‑Hannifin (C‑434/13 P, EU:C:2014:2456, n.os 74 e 76, assim como jurisprudência referida).

( 33 ) V. n.os 561, 566 e 567 do acórdão recorrido.

( 34 ) Tendo em conta o valor das vendas anuais nos mercados em causa, que representava 31133865 euros (dos quais 1993620 euros no que respeita à parafina bruta) [v. considerando 640 e n.o 13 do acórdão recorrido, estes montantes correspondem respetivamente a 5245244 euros (no que respeita ao mercado da cera de parafina) e a 299043 euros (no que respeita à parafina bruta)].

( 35 ) Ou seja, um montante de cerca de 71545123 euros.

( 36 ) Ou seja, um montante de 1952750,79 euros.

( 37 ) Aplicado a cada um dos montantes, este coeficiente conduz a quantias de cerca de 121626717,87 e de 3319676,34 euros. Todavia, estes montantes foram respetivamente fixados em 121626710 e em 3833132 euros.