Conclusões do Advogado-Geral

Conclusões do Advogado-Geral

1. No presente recurso, K. Nikolaou (a seguir «recorrente») pede a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia, de 20 de fevereiro de 2013, Nikolaou/Tribunal de Contas (2), que julgou improcedente a ação de indemnização destinada a obter reparação do dano alegadamente sofrido pela recorrente, na sequência de irregularidades e da violação do direito da União, cometidas contra si, pelo Tribunal de Contas.

I – Quadro jurídico

2. A Decisão 99/50, do Tribunal de Contas, de 16 de dezembro de 1999, relativa às condições e modalidades dos inquéritos internos no domínio da luta contra a fraude, a corrupção e qualquer outra atividade ilegal lesiva dos interesses financeiros das Comunidades, dispõe no seu artigo 2.°:

«Os funcionários ou agentes do Tribunal [de Contas] que tenham conhecimento de elementos de facto que possam deixar presumir a existência, no seio da instituição, de eventuais casos de fraude, corrupção ou qualquer outra atividade ilegal, lesiva dos interesses financeiros das Comunidades, informarão imediatamente o Secretário‑Geral do Tribunal [de Contas (3) ], em conformidade.

O Secretário‑Geral transmitirá, imediatamente, ao Organismo [Europeu de Luta Antifraude (OLAF)] e ao Presidente do Tribunal [de Contas] que dará conhecimento da informação ao membro responsável pelo setor, ao qual pertença o funcionário ou agente, todos os elementos de facto que deixem presumir a existência de irregularidades previstas no parágrafo seguinte e procederá a um inquérito preliminar, sem prejuízo dos inquéritos internos efetuados pelo [OLAF].

[...]

Os membros, funcionários e agentes não podem, em caso algum, sofrer tratamento não equitativo ou discriminatório em consequência da prestação das informações previstas nos parágrafos antecedentes.»

3. O artigo 4.°, primeiro parágrafo, da Decisão 99/50, prevê:

«No caso de se revelar a possibilidade de uma implicação pessoal de um membro, funcionário ou agente do Tribunal [de Contas], o interessado deve ser rapidamente informado, desde que tal não seja suscetível de prejudicar o inquérito. Em qualquer caso, na sequência do inquérito, não podem ser extraídas conclusões visando especificamente um membro, funcionário ou agente, sem que o interessado tenha tido a possibilidade de se exprimir sobre todos os factos que lhe digam respeito.»

II – Antecedentes do litígio

4. A recorrente foi membro do Tribunal de Contas de 1996 a 2001. De acordo com uma reportagem publicada em 19 de fevereiro de 2002, no quotidiano Europa Journal , o eurodeputado Staes teria tido acesso a informações relativas a comportamentos ilícitos da recorrente, durante o seu mandato como membro do Tribunal de Contas.

5. Por carta de 18 de março de 2002, o Secretário‑Geral remeteu ao Diretor‑Geral do OLAF um dossiê com os elementos respeitantes a esses factos, de que ele próprio e o Presidente do Tribunal de Contas tinham tido conhecimento. Além disso, o Secretário‑Geral pediu ao OLAF para lhe indicar, se devia informar a recorrente da existência de um inquérito a seu respeito, em conformidade com o artigo 4.° da Decisão 99/50.

6. Por carta de 8 de abril de 2002, o Presidente do Tribunal de Contas informou a recorrente da existência de um inquérito interno, conduzido pelo OLAF, na sequência do artigo publicado no Europa Journal. Por carta de 26 de abril de 2002, o Diretor‑Geral do OLAF informou a recorrente de que tinha sido instaurado um inquérito interno, no qual era convidada a cooperar, na sequência de informações que os serviços tinham recebido do eurodeputado Staes e com fundamento num processo de inquérito preliminar elaborado pelo Secretário‑Geral.

7. De acordo com o relatório do OLAF, de 28 de outubro de 2002, as informações a respeito da recorrente teriam sido facultadas ao eurodeputado Staes por dois funcionários do Tribunal de Contas, um dos quais antigo membro do gabinete da recorrente. As acusações analisadas respeitavam, em primeiro lugar, a importâncias em dinheiro que a recorrente teria recebido do seu pessoal a título de empréstimos; em segundo lugar, a alegadas falsas declarações de pedidos de transferência do gozo de férias do seu chefe de gabinete que lhe permitiram o reembolso a este último de cerca de 28 790 euros, de férias não gozadas nos anos de 1999, 2000 e 2001; em terceiro lugar, à utilização do carro de serviço para fins não previstos nos regulamentos aplicáveis; em quarto lugar, à programação de deslocações em serviço do motorista da recorrente para fins não previstos nos regulamentos aplicáveis; em quinto lugar, a uma política de absentismo dentro do gabinete da recorrente; em sexto lugar, a atividades de natureza comercial e a intervenções junto de pessoas altamente colocadas para facilitar essas atividades por pessoas da sua família; em sétimo lugar, a uma fraude cometida no quadro de um concurso; e, em oitavo lugar, a fraudes relativas a despesas de representação recebidas pela recorrente.

8. O OLAF concluiu pela possibilidade de terem sido cometidas infrações, suscetíveis de serem qualificadas de falsificação, de prevaricação e de fraude, em relação aos de pedidos de transferência do gozo de férias do seu chefe de gabinete. De acordo com o relatório final, a recorrente e os membros do seu gabinete podem ter cometido infrações de natureza penal, em relação às importâncias em dinheiro que a primeira teria recebido a título de empréstimos, segundo as pessoas envolvidas. Nestas circunstâncias e em conformidade com artigo 10.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 1073/1999, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativo aos inquéritos efetuados pela Organização Europeia de Luta Antifraude (OLAF) (4), o OLAF informou as autoridades judiciárias luxemburguesas, para que investigassem os factos que pudessem indiciar a comissão de infrações penais.

9. No tocante às outras acusações, com exceção da de fraude cometida no âmbito de um concurso, o OLAF evidenciou possíveis irregularidades ou situações duvidosas no comportamento da recorrente e sugeriu ao Tribunal de Contas a adoção de medidas corretivas em relação a ela, bem como de medidas para melhorar o sistema de controlo dentro da instituição.

10. Em 26 de abril de 2004, a recorrente foi ouvida na reunião restrita do Tribunal de Contas, para efeitos da eventual aplicação do artigo 247.°, n.° 7, CE. Por carta de 13 de maio de 2004, o Presidente do Tribunal de Contas explicou que, quanto ao envio do processo para o Tribunal de Justiça, para os efeitos da aplicação do artigo 247.°, n.° 7, CE, pelo facto de a recorrente ter, alegadamente, pedido e obtido empréstimos pessoais de membros do seu gabinete, a unanimidade exigida pelo artigo 6.°, do regulamento interno do Tribunal de Contas, na versão aprovada em 31 de janeiro de 2002, não tinha sido alcançada na reunião que tinha tido lugar, em 4 de maio de 2004. A este propósito, o Presidente do Tribunal de Contas acrescentou que uma grande maioria dos membros da instituição considerou que o comportamento da recorrente era totalmente inapropriado. Quanto aos dias de férias do chefe de gabinete da recorrente, o Presidente do Tribunal de Contas esclareceu que a instituição tinha adiado a sua decisão, enquanto aguardava pelas conclusões do processo pendente nos órgãos jurisdicionais luxemburgueses.

11. Por sentença de 2 de outubro de 2008, a secção correcional do tribunal d’arrondissement de Luxembourg (Luxemburgo) absolveu a recorrente e o seu chefe de gabinete das acusações de falsificação, de prevaricação, de falsas declarações e subsidiariamente de apropriação de subsídio, de subvenção ou de subsídio ilegal e, também subsidiariamente, de fraude (a seguir a «sentença de 2 de outubro de 2008»). O tribunal d’arrondissement do Luxemburgo considerou, no essencial, que algumas das explicações dadas pelo chefe de gabinete da recorrente e por ela própria criavam uma dúvida sobre o conjunto dos elementos de prova carreados pelo OLAF e pela polícia judiciária luxemburguesa, para demonstrar que o referido chefe de gabinete tinha estado em férias não declaradas, durante vários dias, durante os anos de 1999, 2000 e 2001. O tribunal d’arrondissement do Luxemburgo concluiu, por conseguinte, que, sem qualquer dúvida, a materialidade dos factos imputados à recorrente não tinha sido estabelecida, e que qualquer dúvida devia aproveitar ao arguido, devendo a recorrente ser absolvida das acusações imputadas.

12. Por carta de 14 de abril de 2009, a recorrente pediu ao Tribunal de Contas para publicar uma comunicação relativa à sua absolvição em todos os jornais luxemburgueses, alemães, gregos, franceses, espanhóis e belgas e para informar as outras instituições da União Europeia. Subsidiariamente e na eventualidade de o Tribunal de Contas não proceder a essas publicações, a recorrente pediu uma indemnização de 100 000 euros, para reparação dos danos morais, quantia que se comprometia a utilizar, para fazer as referidas publicações. A recorrente pediu também ao Tribunal de Contas, primeiro, que lhe pagasse 40 000 euros, para reparação dos danos morais causados pelo processo que correu termos nos órgãos jurisdicionais luxemburguesas e 57 771,40 euros, para compensação dos danos patrimoniais provocados pelo mesmo processo, segundo, que lhe indemnizasse todas as despesas em que incorreu, nomeadamente, no juízo de instrução e no tribunal d’arrondissement do Luxemburgo e, terceiro, que lhe indemnizasse todas as despesas que fez com o processo no Tribunal de Contas.

13. Por carta de 7 de julho de 2009, o Presidente do Tribunal de Contas deu conhecimento à recorrente da decisão adotada em resposta aos seus pedidos. A decisão rejeitou, por um lado, os argumentos alegados na carta de 14 de abril de 2009, e, por outro, comunicou à recorrente que o Tribunal de Contas tinha procurado determinar, com base nas informações de que dispunha, se os factos tinham um grau de gravidade suficiente para pedir ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse sobre a existência de infrações às obrigações que incumbiam ao antigo membro, nos termos do Tratado CE e sobre a necessidade de aplicação de eventuais sanções. A este propósito, o Tribunal de Contas comunicou à recorrente as informações que o tinham levado a decidir não recorrer ao Tribunal de Justiça, entre as quais figuravam, nomeadamente, a absolvição da recorrente pela sentença de 2 de outubro de 2008 e a inexistência de prejuízo causado ao orçamento comunitário, tendo em conta a reposição da quantia paga indevidamente a Koutsouvelis, seu chefe de gabinete (5) .

III – Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

14. Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral, em 16 de junho de 2009, a recorrente propôs uma ação de indemnização, tendo em vista obter a condenação do Tribunal de Contas no pagamento da quantia de 85 000 euros, acrescida de juros, contados desde 14 de abril de 2009, para reparação dos danos morais causados pelas ações e omissões dessa Instituição, quantia que se comprometia a utilizar na publicação da sua absolvição.

15. Na fundamentação da sua ação, a recorrente invocou em primeiro lugar seis fundamentos relativos à violação caraterizada pelo Tribunal de Contas das normas de direito da União que conferem direitos aos particulares. Depois, alegou a existência de um nexo de causalidade direto entre a referida violação e o dano moral e patrimonial que lhe foi causado.

16. O Tribunal Geral julgou improcedente a referida ação, por considerar que o Tribunal de Contas não tinha cometido nenhuma das imputadas violações do direito de União.

17. Em especial, pela importância que tem para este recurso, o Tribunal Geral concluiu, nos n. os  27 a 32 do acórdão recorrido, que os atos do Tribunal de Contas relativos ao inquérito preliminar não foram ilegais. De facto, ao remeter ao OLAF o processo que continha as primeiras informações recolhidas, antes de ter ouvido a recorrente, essa Instituição não violou as obrigações que decorrem da interpretação conjugada dos artigos 2.° e 4.° da Decisão 99/50, nem os direitos de defesa da demandante, ou o princípio da imparcialidade.

18. Nos n. os  44 a 47 do acórdão recorrido o Tribunal Geral também respondeu às acusações relativas, por um lado, ao facto de o Tribunal de Contas não ter tomado nenhuma decisão formal, na sequência da sentença de 2 de outubro de 2008, que absolveu a recorrente de todas as acusações que lhe tinham sido imputadas e, por outro lado, ao facto de o Presidente do Tribunal de Contas ter incluído na sua carta, de 13 de maio de 2004, uma observação depreciativa e supérflua, a propósito da opinião expressa pela maioria dos membros da instituição. Os números criticados estão redigidos como se segue:

«44 É importante destacar que a omissão censurada ao Tribunal de Contas não está ferida de ilegalidade.

45 A este propósito, cabe sublinhar, em primeiro lugar, que a recorrente foi absolvida com fundamento nas dúvidas levantadas, conforme refere a sentença de 2 de outubro de 2008, por algumas explicações dadas pelo chefe de gabinete na audiência pública. Sem que seja necessário tecer considerações sobre a razoabilidade das dúvidas evidenciadas pelo tribunal d’arrondissement do Luxemburgo, é forçoso constatar que este motivo de absolvição não implica que as acusações imputadas à recorrente não tenham nenhum fundamento, mas, como declarou o referido tribunal, não foram provadas sem qualquer dúvida.

46 Em segundo lugar, como argumentou o Tribunal de Contas, cabe, em exclusivo, às autoridades jurisdicionais nacionais pronunciar‑se sobre as acusações, no plano penal e ao Tribunal de Justiça analisá‑las no plano disciplinar, ao abrigo do artigo 247.°, n.° 7, CE. Por conseguinte, o Tribunal de Contas não dispunha de competência para se pronunciar a este propósito.

47 Em terceiro lugar, não se pode deduzir do facto de o Tribunal de Contas não ter recorrido ao Tribunal de Justiça, ao abrigo desta última disposição, que o Tribunal de Contas entendeu que os factos imputados à recorrente não tinham fundamento. Com efeito, de acordo com o artigo 6.° do Regulamento interno do Tribunal de Contas, na versão de 31 de janeiro de 2002, a decisão de recorrer ao Tribunal de Justiça ser tomada por unanimidade. Por conseguinte, embora seja verdade que o não recurso ao Tribunal de Justiça implica que a unanimidade não foi alcançada, isso não significa uma tomada de posição do Tribunal de Contas quanto à materialidade dos factos. Neste contexto não era despropositado que o Presidente do Tribunal de Contas comunicasse à recorrente que a grande maioria dos membros da Instituição considerou o seu comportamento inaceitável, impedindo, assim, que o fato de não submeter o assunto ao Tribunal de Justiça pudesse ser entendido como uma suposta negação da materialidade dos factos imputados, o que, aliás, não corresponderia à realidade.»

19. Por fim, o Tribunal Geral respondeu à acusação segundo a qual o Tribunal de Contas deveria, em virtude do seu dever de assistência, ter comunicado à imprensa e às instituições a absolvição da recorrente. A este propósito, ao referir‑se às razões expostas nos n. os  45 e 46 do acórdão recorrido, considerou não se poder inferir do dever de assistência nenhuma obrigação de publicar a absolvição da recorrente.

IV – Fundamentos e principais argumentos invocados em apoio do recurso

20. A recorrente invoca quatro fundamentos para sustentar o seu recurso.

21. No primeiro fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral infringiu o princípio da presunção de inocência, previsto no artigo 48.°, n.° 1 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir a «Carta») e no artigo 6.°, n.° 2 da Convenção Europeia dos Direito do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»). Com efeito, este princípio garante, nomeadamente, que um órgão jurisdicional da União não pode pôr em dúvida a inocência de uma pessoa acusada, tanto mais que essa pessoa foi anteriormente ilibada por uma decisão da justiça penal nacional transitada em julgado. Daqui decorre, segundo a recorrente, que o Tribunal Geral considerou erradamente, nos n. os  43 a 46 e 49 do acórdã o recorrido, que a omissão por parte do Tribunal de Contas de adotar uma decisão que fizesse constar a não citação da recorrente no Tribunal de Justiça e por outro, de restabelecer a sua reputação, não estava «ferida de ilegalidade».

22. A recorrente critica, em especial, a formulação do n.° 45 do acórdão recorrido, ao considerar que a apreciação do Tribunal Geral que ali figura constitui uma violação manifesta do princípio da presunção de inocência. Com efeito, resulta da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que a circunstância de a absolvição da recorrente ter sido motivada pela subsistência de uma dúvida, não pode ter nenhum efeito na obrigação do Tribunal Geral de não fundamentar a sua decisão no motivo da absolvição em questão.

23. O Tribunal de Contas contrapõe que o primeiro fundamento é baseado na não tomada em consideração do âmbito do artigo 6.°, n.° 2 da CEDH, bem como do artigo 48.°, n.° 1 da Carta. Na verdade, a presunção de inocência é válida para a pessoa acusada perante uma autoridade judicial que deve decidir da sua culpabilidade ou da sua inocência com base nos factos da acusação que lhe são apresentados. Ora, no âmbito de uma ação de indemnização por responsabilidade extracontratual proposta pela demandante, não se debate a questão da sua culpabilidade à luz do direito luxemburguês. Por conseguinte, o Tribunal Geral não podia infringir a presunção de inocência.

24. Por outro lado, esse fundamento assenta na premissa errada de que o Tribunal de Contas e o Tribunal Geral efetuaram uma reanálise do mérito da sentença de 2 de outubro de 2008. O Tribunal de Contas considera que, pelo contrário, cada instituição, no exercício da sua competência no contexto do processo, aceitou a referida sentença e retirou daí as conclusões que se impunham nos respetivos processos decisórios. Em especial, o Tribunal Geral considerou a sentença de 2 de outubro de 2008 como um elemento de facto que devia tomar em conta na apreciação da legalidade dos atos ou das omissões do Tribunal de Contas.

25. O Tribunal de Contas deduziu dos n. os  120 a 122 do acórdão de 11 de julho de 2006, Comissão/Cresson (6), que nada impedia o Tribunal Geral de fazer uma outra apreciação dos mesmos factos no contexto da sua análise de uma eventual responsabilidade extracontratual do Tribunal de Contas, à luz do direito da União, apesar de reconhecer que o tribunal d’arrondissement do Luxemburgo tinha concluído que a materialidade de alguns factos imputados à recorrente não tinha sido estabelecida sem qualquer dúvida e que, por conseguinte, as pessoas em questão deviam ser ilibadas da acusação, que lhes fora imputada, de infrações ao direito penal luxemburguês Ao proceder desta forma, o Tribunal Geral nunca colocou em causa a sentença de 2 de outubro de 2008, nem a presunção de inocência, de que a recorrente beneficiava nessa instância.

26. Através do seu segundo fundamento, a recorrente critica o Tribunal Geral por ter violado o princípio da cooperação leal, consagrado no artigo 4.° TUE, n.° 3, em relação ao tribunal d’arrondissement do Luxemburgo, ao desvirtuar as considerações e as apreciações efetuadas por este último.

27. Na sua opinião, este princípio implica que, quando um tribunal nacional proferiu uma sentença que transitou em julgado e, nos termos da qual a pessoa foi absolvida das infrações que lhe tinham sido imputadas, as instituições da União, incluindo o Tribunal Geral, são obrigadas a respeitar essa sentença e não a privar do seu efeito útil.

28. Ora, embora os factos em questão sejam idênticos àqueles sobre os quais o tribunal d’arrondissement do Luxemburgo se pronunciou, o Tribunal Geral violou o princípio da cooperação leal ao fazer uma apreciação totalmente diferente desses mesmos factos.

29. Por outro lado, no n.° 35 do acórdão recorrido, o Tribunal contraditou as conclusões do tribunal d’arrondissement do Luxemburgo, quando considerou que a «gestão de qualquer sistema de férias é baseado na obrigação do superior hierárquico de verificar a presença do pessoal que lhe está subordinado e assegurar‑se de que qualquer ausência esteja em conformidade com a regulamentação das férias» e que [e]ssa obrigação não é afetada pela eventual inexistência de um sistema integrado que permita verificar, de forma que não dependa do superior hierárquico, que o número declarado de dias de férias não gozadas no fim de cada ano corresponde à realidade».

30. Por fim, o Tribunal Geral não respeitou a sentença de 2 de outubro de 2008, na medida em que considerou no n.° 38 do acórdão recorrido que «o caráter deficitário do sistema de registo e de controlo dos dias de férias no Tribunal de Contas, aplicável à data dos factos, não poderia justificar o arquivamento de um inquérito ou de uma atuação contra [a recorrente]», quando foi precisamente o caráter deficitário do sistema de gestão de férias no Tribunal de Contas que conduziu à absolvição da recorrente.

31. Em resposta a estes argumentos, o Tribunal de Contas afirma que o segundo fundamento assenta num desconhecimento das funções de cada uma das instituições envolvidas, bem como do artigo 4.° TUE, n.° 3. Com efeito, o Tribunal Geral não reanalisou a sentença de 2 de outubro de 2008, nem colocou em causa a sua decisão. A diferente análise de certos factos é explicável pelo contexto distinto dos dois processos, concretamente, por um lado, um processo penal que se enquadra no direito nacional e, por outro, uma ação de indemnização por responsabilidade extracontratual ao abrigo do direito da União.

32. Com o seu terceiro fundamento, a recorrente sustenta que o acórdão recorrido está ferido por um vício de incompetência do Tribunal Geral, pelo facto de ter decidido questões que ultrapassavam as competências que lhe estão cometidas pelos Tratados.

33. Segundo este fundamento, por um lado, embora reconheça no n.° 46 do acórdão recorrido que cabe em exclusivo aos órgãos jurisdicionais nacionais pronunciarem‑se sobre as acusações no plano penal, o Tribunal Geral ultrapassou as competências que lhe estão confiadas pelos Tratados, ao proceder, no n.° 45 do mesmo acórdão, a uma análise aprofundada do motivo da absolvição por existência de dúvida.

34. Por outro lado, o Tribunal Geral também ultrapassou os limites da sua competência, quando fez as afirmações contidas no n.° 47 do acórdão recorrido. De facto, sendo o Tribunal de Justiça a única instituição que pode pronunciar‑se sobre as responsabilidades disciplinares derivadas do comportamento dos membros do Tribunal de Contas, o Tribunal Geral não tinha competência para se expressar sobre a recorrente, tal como fez na sua carta de 13 de maio de 2004, nem sequer uma dúvida que deixasse suspeitar um comportamento inaceitável da parte desta.

35. O Tribunal de Contas contrapôs que este terceiro fundamento deve ser rejeitado, por ser parcialmente inadmissível, reiterando a esse propósito, simplesmente, os argumentos apresentados na primeira instância relativos à carta de 13 de maio de 2004, e por ser parcialmente infundado.

36. Em relação a este último aspeto, sustenta, mais uma vez, que o Tribunal Geral nunca pôs em causa a sentença de 2 de outubro de 2008. Considera que a avaliação de um mesmo comportamento poderia conduzir a conclusões diferentes consoante na instância correspondente.

37. Com o seu quarto fundamento a recorrente argumenta que o Tribunal Geral interpretou e fez uma aplicação errada dos requisitos exigidos para declarar a responsabilidade extracontratual da União. Com efeito, o Tribunal Geral, quanto à problemática da utilização de um documento falso, acrescentou um requisito suplementar não exigível (a má fé), ao concluir, no n.° 32 do acórdão recorrido que «a eventual transmissão do documento em questão pelo Tribunal de Contas, ao OLAF, ou aos órgãos jurisdicionais luxemburgueses, não significa que a instituição tenha agido de má fé em relação à autenticidade da assinatura da recorrente».

38. Além disso, acrescenta que o Tribunal Geral também cometeu um erro de direito, na interpretação do artigo 2.°, segundo parágrafo da Decisão 99/50, conjugado com o seu artigo 4.°, primeiro parágrafo, na medida em que concluiu que era suficiente a simples comunicação da existência de um inquérito interno à recorrente conduzido pelo OLAF e que não era, por isso, necessário facultar‑lhe a informação do inquérito preliminar instruído pelo Tribunal de Contas.

39. De acordo com o Tribunal de Contas, as alegações respeitantes a este quarto fundamento devem ser julgadas inadmissíveis, uma vez que consistem, por um lado, num pedido de reanálise dos factos do caso vertente ao Tribunal de Justiça e, por outro lado, numa simples reiteração dos argumentos apresentados na primeira instância, em especial, no que respeita à alegação relativa à não notificação do inquérito preliminar.

40. Quanto ao mérito, no n.° 32 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não acrescentou nenhuma condição suplementar relativa à responsabilidade extracontratual da União, ao afirmar que a simples remessa de um documento ao OLAF ou às autoridades luxemburguesas não era um indício de má fé do Tribunal de Contas em relação à autenticidade da assinatura da recorrente. Do mesmo modo, o Tribunal Geral não cometeu erros de leitura do artigo 2.°, segundo parágrafo, da Decisão 99/50, dado que esta disposição não impõe a obrigação de comunicar a abertura de um inquérito preliminar à pessoa suspeita de irregularidades, mas exige simplesmente que o Secretário‑Geral dê, sem demora, conhecimento ao OLAF das informações recolhidas no âmbito desse inquérito.

V – Apreciação

41. Vamos analisar, numa primeira fase, em conjunto, os primeiro a terceiro fundamentos alegados pela recorrente, na medida em que os argumentos suscitados apoiam‑se entre si e visam os mesmos números do acórdão recorrido. Numa segunda fase, analisaremos o quarto fundamento.

A – Quanto aos fundamentos relativos à violação da presunção de inocência e do princípio da cooperação leal, bem como da incompetência do Tribunal Geral

42. Os três primeiros fundamentos pretendem, no essencial, pôr em causa o raciocínio adotado pelo Tribunal Geral, nos n. os  44 a 49 do acórdão recorrido.

43. Importa não esquecer as alegações, às quais o Tribunal Geral pretendeu responder nesta parte do acórdão recorrido.

44. Em primeiro lugar, a recorrente censurou o Tribunal de Contas por não ter adotado uma decisão oficial a ilibá‑la de todas as acusações, na sequência da sentença de 2 de outubro de 2008, uma vez que não tinha sido feita a prova dos comportamentos que justificaram a remessa do processo ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 247.°, n.° 7, CE. Na sua opinião, nessa decisão, o Tribunal de Contas deveria ter desistido de pedir ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse, ao abrigo desta última disposição.

45. Em segundo lugar, a recorrente censurou o Presidente do Tribunal de Contas por ter violado o princípio da imparcialidade e o dever de assistência, ao incluir na carta de 13 de maio de 2004, uma observação depreciativa e supérflua, a propósito da opinião expressa pela maioria dos membros da instituição.

46. Em terceiro lugar, a recorrente argumentou que o Tribunal de Contas deveria ter feito comunicações à imprensa e às instituições a respeito da sua absolvição, por força do seu dever de assistência.

47. Antes de mais, indicamos que foi acertadamente, na nossa opinião, que o Tribunal Geral negou provimento a estes três pedidos da recorrente.

48. Todavia, como alegou a recorrente, a argumentação que o Tribunal Geral desenvolveu no n.° 45 do acórdão recorrido suscita problemas no que se refere à presunção de inocência.

49. Por força do artigo 48.°, n.° 1, da Carta «[t]odo o arguido se presume inocente enquanto não tiver sido legalmente provada a sua culpa». Esta disposição corresponde ao artigo 6.°, n.° 2, da CEDH. Em conformidade com o artigo 52, n.° 3 da Carta, o direito à presunção de inocência tem o mesmo sentido e o mesmo alcance que o direito correspondente garantido pela CEDH.

50. A presunção de inocência deve ser garantida a montante e a jusante do processo penal. Com efeito, o artigo 6.°, n.° 2 da CEDH procura também «impedir que pessoas que tenham sido absolvidas ou beneficiado de um arquivamento dos autos sejam, de facto, tratadas, por agentes ou autoridades públicas, como culpadas da infração que lhes fora imputada» (7) . O reconhecimento do direito à presunção de inocência, depois de um processo penal, explica‑se pelo facto de que «[s]em proteção que faça respeitar, em qualquer procedimento posterior, uma absolvição ou a uma decisão de arquivamento dos autos, as garantias de um processo equitativo, enunciadas no artigo 6.°, n.° 2 da CEDH, corriam o risco de se tornarem teóricas e ilusórias. Está também em causa, uma vez terminado o processo, a reputação do interessado e a maneira como esta é percebida pelo público» (8) .

51. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem precisou, assim, que «o campo de aplicação do artigo 6.° [n.° 2 da CEDH] não se limita aos processos penais pendentes, mas pode ser alargado às decisões proferidas após o despacho de arquivamento […] ou o acórdão de uma absolvição […], na medida em que as questões suscitadas nesses processos constituem um corolário e um complemento dos respetivos processos penais, nos quais a recorrente tinha a qualidade ‘de arguido’» (9) . O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem verifica se, «pela sua forma de agir, pelos fundamentos das suas decisões ou pela linguagem utilizada no seu discurso» (10), as autoridades e os órgãos jurisdicionais nacionais que têm de se pronunciar sobre uma sentença penal «levantaram dúvidas sobre a inocência do recorrente e, dessa forma, violaram o princípio da presunção de inocência» (11) . 

52. Como decorre especialmente do acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, Vassilios Stavropoulos c. Grécia, de 27 de setembro de 2007, «a expressão de dúvidas sobre a inocência de um arguido não é admissível depois de uma decisão de absolvição, transitada em julgado» (12) . Na esteira da jurisprudência desse Tribunal «uma vez a decisão de absolvição transitada em julgado ‑ mesmo que se trate de uma decisão de absolvição, pela aplicação do princípio in dubio pro reo , em conformidade com o artigo 6.° [n.° 2 da CEDH] — a expressão de dúvidas sobre a culpabilidade, inclusive as baseadas nos fundamentos da absolvição, não é compatível com a presunção de inocência» (13) . 

53. Nesse mesmo acórdão, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem considerou que, «por força do princípio ‘ in dúbio pro reo’ , que constitui uma expressão especial do princípio da presunção de inocência, não deve existir nenhuma diferença qualitativa entre uma absolvição por falta de provas e uma absolvição resultante da comprovação da inocência do arguido sem qualquer dúvida. Na verdade, as sentenças de absolvição não se diferenciam em razão dos fundamentos que são adotados caso a caso pelo juiz penal. Bem pelo contrário, no artigo 6.° [n,.° 2 da CEDH], o dispositivo de uma sentença de absolvição deve ser respeitado por qualquer autoridade que se pronuncie de forma direta ou incidental sobre a responsabilidade penal do interessado» (14) .

54. À luz desta jurisprudência, a formulação do n.° 45 do acórdão recorrido parece‑nos ser passível de contestação.

55. Antes de mais, lembramos que, a este propósito, o Tribunal Geral sublinhou que a recorrente tinha sido «absolvida com fundamento em dúvidas surgidas, de acordo com a sentença de 2 de outubro de 2008, de algumas explicações dadas pelo chefe do seu gabinete, durante a audiência de julgamento». O Tribunal Geral acrescentou, indicando que, «[s]em que seja necessário pronunciar‑se sobre a razoabilidade das dúvidas evidenciadas pelo tribunal d’arrondissement do Luxemburgo, é forçoso constatar que este fundamento da absolvição não implica que as acusações imputadas à recorrente não tenham qualquer fundamento, mas, como expôs o referido tribunal, implica que elas não foram provadas para além de qualquer ‘dúvida razoável’».

56. Nesta parte da sua argumentação o Tribunal Geral socorreu‑se do fundamento da absolvição, no processo penal, ao insistir no facto de que trata de uma absolvição, pela aplicação do princípio in dubio pro reo , para justificar a não adoção, pelo Tribunal de Contas, de uma decisão oficial a absolver a recorrente das acusações. Serve‑se, desta forma, do fundamento da absolvição para negar a existência de uma falta do Tribunal de Contas e daí extrair uma consequência sobre a apreciação do mérito da ação de indemnização. Em suma, o raciocínio que emana do n.° 45 do acórdão recorrido é o de que, uma vez que a recorrente foi absolvida, pela aplicação do princípio in dúbio pro reo e que este motivo da absolvição não basta para deixar sem fundamento as acusações de que foi alvo, foi com razão que o Tribunal de Contas recusou adotar uma decisão oficial absolvendo‑a de qualquer acusação, em consequência da sentença de 2 de outubro de 2008.

57. Ao formular a sua argumentação desta maneira, o Tribunal Geral dá a impressão de que considera que uma absolvição, pela aplicação do princípio in dubio pro reo, tem menos força do que uma absolvição baseada numa afirmação mais direta da inocência da recorrente. Fragiliza a decisão tomada pelo juiz penal, o que, concomitantemente, contribui para lançar a dúvida sobre a inocência da recorrente.

58. Ao violar, assim, a presunção de inocência da recorrente, o Tribunal Geral comete, por isso, um erro de direito.

59. Na nossa opinião, a constatação deste erro não é, no entanto, suscetível de provocar a anulação do acórdão recorrido. De facto, é importante lembrar que resulta de jurisprudência constante que, se os fundamentos de um acórdão do Tribunal Geral contiverem uma violação de direito da União, mas a sua parte decisória se mostrar fundamentada por outras razões jurídicas, deve ser negado provimento ao recurso dele interposto (15) .

60. A este propósito destacamos que, acertadamente, o Tribunal Geral indicou, no n.° 46 do acórdão recorrido, que «cabe exclusivamente às autoridades jurisdicionais nacionais analisar as acusações, no plano penal, e ao Tribunal de Justiça pronunciar‑se sobre elas, no plano disciplinar, por força do artigo 247.°, n.° 7, CE». Deduz‑se daqui, com razão, que [o] Tribunal de Contas não tinha, por conseguinte, competência para se pronunciar a este propósito.

61. Efetivamente, é evidente que o Tribunal de Contas não está habilitado para adotar uma decisão de absolvição, seja no plano penal, seja no plano disciplinar. Por outro lado, o Tribunal de Contas não estava, de modo algum, obrigado a proceder à publicação da absolvição da recorrente. Por conseguinte, o Tribunal Geral negou provimento, com razão, a estes dois pedidos da recorrente, com base na argumentação exposta no n.° 46 do acórdão recorrido.

62. A única obrigação do Tribunal de Contas, no contexto deste processo, era decidir chamar ou não o Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 247.°, n.° 7, CE, a pronunciar‑se sobre a existência de um incumprimento de uma obrigação do cargo de membro do Tribunal de Contas, no sentido desta última disposição.

63. A este propósito, sublinhamos que a argumentação do Tribunal Geral teria sido, ao mesmo tempo, mais convincente e completa, se tivesse acentuado mais a autonomia dos processos penais e disciplinares.

64. Com efeito, tanto na primeira instância, como neste recurso, a argumentação da recorrente assentou, em grande parte, na ideia de que haveria de certo modo uma relação de automatismo, entre a existência de uma absolvição no processo penal e a adoção de uma decisão pelo Tribunal de Contas, nos termos da qual este renunciaria a chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se, ao abrigo do artigo 247.°, n.° 7, CE.

65. Esta argumentação da recorrente é, fundamentalmente, errada, como pode ser deduzido, tanto da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, como deste Tribunal de Justiça.

66. Em primeiro lugar, resulta da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que o direito à presunção de inocência, em situações de absolvição em processo penal ou de arquivamento dos processos, não impede, de maneira nenhuma, que posteriormente sejam instaurados processos disciplinares ou ações de indemnização, com base nos mesmos factos.

67. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem admitiu, assim, que os organismos disciplinares podem apreciar, de forma independente, os factos de processos que lhes são submetidos, quando os elementos constitutivos de infrações penais e de comportamentos censuráveis disciplinarmente não são idênticos (16) . Neste contexto, a constatação de que os factos não podem ser sujeitos a qualificação de infração penal não impede a instauração de um processo disciplinar, com fundamento nesses mesmos factos. Do ponto de vista do direito da presunção de inocência, o único limite é que, durante o processo disciplinar, a inocência da pessoa em causa, no plano penal, não pode ser posta em causa.

68. Além disso, em matéria de contencioso de responsabilidade extracontratual, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem admitiu, no seu acórdão Ringvold c. Noruega, de 11 de fevereiro de 2003 (17), que «a questão da reparação do dano devia ser objeto de uma análise jurídica distinta, fundamentada em critérios e exigências em matéria de prova diferentes, em vários pontos importantes, dos aplicáveis no domínio da responsabilidade penal» (18) . O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem considerou, assim, que «se a absolvição decidida em processo penal não deve ser posta em causa, num processo para reparação de danos, também não deve ser obstáculo ao estabelecimento de uma responsabilidade civil, com base em exigências de prova menos estritas, que conduza à obrigação de pagar uma indemnização, com fundamento nos mesmos factos» (19) .

69. Em segundo lugar, segundo uma lógica análoga, o Tribunal de Justiça, no seu acórdão Comissão/Cresson, já referido, pôs a tónica no caráter autónomo dos processos penais, por um lado, e, por outro, do processo baseado no artigo 213.°, n.° 2, CE que visa sancionar a violação das obrigações que decorrem do exercício do cargo de membro da Comissão Europeia.

70. Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça, considerou, com efeito, que não estava «vinculado pela qualificação jurídica dos factos efetuada no âmbito do processo penal» (20) e que lhe competia, «no pleno uso do seu poder de apreciação, indagar se os factos imputados no âmbito de um processo baseado no artigo 213.°, n.° 2, CE [constituíam] um incumprimento dos deveres decorrentes do cargo de membro da Comissão» (21) . O Tribunal de Justiça concluiu que a decisão da chambre du conseil du tribunal de première instance de Bruxelas [Bélgica] que constata a inexistência de responsabilidade de E. Cresson não o pode vincular (22) .

71. Esta argumentação, baseada no caráter autónomo dos processos penais e disciplinares, é transponível para o processo que, à data dos factos, estava previsto no artigo 287.°, n.° 7, CE e que consta, atualmente, do artigo 286.°, n.° 6, TFUE. De onde resulta que, quando é chamado a analisar se um membro do Tribunal de Contas faltou ou não ao cumprimento das obrigações decorrentes do exercício do cargo, o Tribunal de Justiça não está vinculado pela sentença penal que absolveu a pessoa em causa.

72. Com o mesmo fundamento extraído do caráter autónomo dos processos penais e disciplinares, o Tribunal de Contas, enquanto autoridade que pede ao Tribunal de Justiça para se pronunciar, não pode estar vinculado por essa sentença penal. Em especial, para responder claramente à argumentação da recorrente, a existência de uma absolvição em processo penal não impede de maneira nenhuma o Tribunal de Contas de pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie, ao abrigo do artigo 286.°, n.° 6, TFUE. Mesmo nessa hipótese, o Tribunal de Contas conserva o seu poder de apreciação, quanto a um eventual pedido ao Tribunal de Justiça para se pronunciar.

73. Deduzimos destes elementos que o processo penal pendente num órgão jurisdicional nacional e o procedimento previsto no artigo 247.°, n.° 7, CE, atualmente no artigo 286.°, n.° 6, TFUE, são diferentes, não apenas quanto ao seu objeto e à sua finalidade, mas também quanto à natureza e ao grau de prova exigível. Ainda que os dois processos tenham por fundamento as mesmas circunstâncias de facto, na verdade são independentes, de forma que, sob reserva de não pôr em causa o veredito do juiz penal, uma absolvição no plano penal não impede de maneira nenhuma o Tribunal de Contas de pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie, nem este último de decidir sobre a existência de um incumprimento das obrigações decorrentes do cargo de membro do Tribunal de Contas.

74. No presente processo, resulta dos autos que o tribunal d’arrondissement do Luxemburgo decidiu, na sua sentença de 2 de outubro de 2008 que os factos provados não podiam justificar a qualificação da infração penal, nos termos do direito luxemburguês.

75. Assim, a apreciação efetuada pelo tribunal d’arrondissement do Luxemburgo não significa, no entanto, um obstáculo que impeça o Tribunal de Contas de decidir chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se sobre os incumprimentos relativos à gestão dos dias de férias. Com efeito, o grau de precisão dos factos ou das provas que é exigível para a qualificação da infração penal não é necessariamente o mesmo que o requerido para a constatação da existência de um incumprimento das obrigações que incumbem aos membros do Tribunal de Contas. Por outro lado, e em todo o caso, incumbe apenas ao Tribunal de Justiça, quando chamado a pronunciar‑se, nos termos do artigo 286.°, n.° 6, TFUE, apreciar o alcance da força de caso julgado que deve ser reconhecido, no caso concreto, à sentença penal nacional.

76. Daqui resulta que a recusa de o Tribunal de Contas adotar uma decisão oficial de absolvição e reconhecer um vínculo de automatismo entre a absolvição no processo penal e o pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 247.°, n.° 7, CE, foi totalmente justificada e não poderia, neste recurso, ser posta em causa, alegando‑se que o não provimento pelo Tribunal Geral do pedido da recorrente com vista a obter a declaração da ilegalidade dessa recusa constitui uma violação da presunção de inocência ou do princípio da cooperação leal.

77. Foi em conformidade com o caráter autónomo dos processos penais e disciplinares e no exercício do seu poder de apreciação que o Tribunal de Contas procurou determinar, com base nas informações de que dispunha, se os factos imputados à recorrente tinham um grau de gravidade suficiente (23), para chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se, nos termos do artigo 247.°, n.° 7, CE. Como testemunha a sua carta de 7 de julho de 2009, o Tribunal de Contas, no momento em que decidiu não chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se sobre a questão relativa à gestão dos dias de férias, não teve apenas em conta a absolvição da recorrente no plano penal. Tomou também em consideração outros parâmetros (24) . 

78. Vamos agora analisar as críticas que a recorrente formulou ao n.° 47 do acórdão recorrido.

79. Nesse número, o Tribunal Geral respondeu à argumentação da recorrente, segundo a qual o Presidente do Tribunal de Contas teria violado o princípio da imparcialidade e o dever de assistência, ao escrever, na sua carta de 13 de maio de 2004, uma observação depreciativa e supérflua, a propósito da opinião expressa pela maioria dos membros da instituição.

80. Segundo a recorrente, o Tribunal Geral teria ultrapassado os limites da sua competência e teria avalisado uma interpretação errada da esfera de competência do Tribunal de Contas, quando considerou, no referido número, que «não era inapropriado o Presidente do Tribunal de Contas comunicar à recorrente que a grande maioria dos membros da instituição considerou inaceitável o seu comportamento, o que impedia, assim, que a inexistência de pedido ao Tribunal de Justiça para se pronunciar, pudesse ser percebida como uma pretensa negação da materialidade dos factos imputados».

81. É importante esclarecer que a passagem da carta de 13 de maio de 2004 que contém a observação criticada, diz apenas respeito às alegações relativas aos empréstimos pessoais feitos à recorrente. Este aspeto do processo não foi incluído no processo penal em que foi proferida a sentença de 2 de outubro de 2008. A absolvição da recorrente no plano penal não é, portanto, levada em conta na análise do n.° 47 do acórdão recorrido.

82. Feito este esclarecimento, o Tribunal Geral não ultrapassou, na nossa opinião, a sua esfera de competências, quando considerou, por um lado, que o facto de não submeter o assunto ao Tribunal de Justiça para se pronunciar não significava a negação da materialidade dos factos e, por outro, que o Presidente do Tribunal de Contas podia dirigir à recorrente o comentário criticado.

83. Com efeito, a apreciação contida no n.° 47 do acórdão recorrido constitui uma resposta do Tribunal Geral à alegação da recorrente que considera que a observação que o Presidente do Tribunal de Contas incluiu na carta de 13 de maio de 2004, viola o princípio da imparcialidade e o dever de assistência. Assim, ao tomar posição sobre este aspeto, no quadro da ação de indemnização por responsabilidade extracontratual que lhe foi submetida, o Tribunal Geral não ultrapassou os limites da sua competência.

84. Além disso, o facto de o Tribunal de Contas não submeter o processo ao Tribunal de Justiça, revela que nem todos os membros do Tribunal de Contas consideraram que o incumprimento em causa representava um limiar de gravidade suficiente, para chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se, nos termos do artigo 247.°, n.° 7, CE. A constatação de que a unanimidade não foi alcançada nesta questão, não significa a inexistência de nenhum incumprimento. A este propósito, convém lembrar, por analogia com o procedimento contra os membros da Comissão, que o Tribunal de Justiça esclareceu, no seu acórdão Comissão/Cresson, já referido, que uma condenação, nos termos do artigo 213.°, n.° 2, CE, exige que o incumprimento tenha um certo grau de gravidade (25) . O Presidente do Tribunal de Contas podia, por conseguinte, no quadro da sua competência e sem violar o princípio da imparcialidade e o dever de assistência, explicitar à recorrente o resultado da votação e comunicar‑lhe que a maioria dos membros do Tribunal de Contas tinha considerado o seu comportamento absolutamente inapropriado, embora não o tivesse considerado por unanimidade suficientemente grave para justificar um pedido ao Tribunal de Justiça para se pronunciar, nos termos do artigo 247.°, n.° 7, CE. Por outro lado, convém esclarecer que a carta de 13 de maio de 2004 só foi endereçada à recorrente e que não há nada nos autos que indique que foi comunicada a outras pessoas, além do seu destinatário.

85. Por conseguinte, consideramos que o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito no raciocínio que desenvolveu sobre o n.° 47 do acórdão recorrido. Apenas realçamos que o Tribunal Geral deveria ter, com todo o rigor, repetiu a qualificação do comportamento da recorrente, tal como constava da carta de 13 de maio de 2004, concretamente, um comportamento «absolutamente inapropriado» (26), em vez de o qualificar de «inaceitável». Na nossa opinião, esta diferente formulação não é, no entanto, suficiente para declarar a existência de um erro de direito. Observamos, aliás, que a recorrente se limitou, quanto a este aspeto, a formular uma observação na sua petição, sem tirar uma consequência direta quanto à existência de um erro de direito (27) .

86. Por fim, consideramos que os n. os  35 e 38 do acórdão recorrido são isentos de crítica à luz do princípio da cooperação leal. Efetivamente, foi com razão, e sem pôr em causa a sentença de 2 de outubro de 2008 que o Tribunal Geral considerou, no essencial, que o caráter deficitário do sistema de registo e de controlo dos dias de férias no Tribunal de Contas, por um lado, não afetava a obrigação do superior hierárquico de verificar a assiduidade do pessoal sob a sua autoridade e assegurar‑se que qualquer ausência era conforme à regulamentação das férias e, por outro, não podia justificar o arquivamento de qualquer inquérito ou procedimento contra a recorrente.

87. Uma vez que a análise dos primeiro ao terceiro fundamentos invocados pela recorrente, não nos permite propor ao Tribunal de Justiça a anulação do acórdão recorrido, vamos, agora, analisar o quarto fundamento.

B – Quanto ao quarto fundamento relativo à interpretação e à aplicação erradas do direito da União, no que diz respeito aos requisitos da responsabilidade extracontratual da União e a Decisão 99/50

88. Segundo a recorrente, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na interpretação do artigo 2.°, segundo parágrafo, da Decisão 99/50, conjugado com o seu artigo 4.°, primeiro parágrafo, na medida em que concluiu que a simples comunicação à recorrente, da existência de um inquérito interno conduzido pelo OLAF, era suficiente e que não era, por isso, necessário informá‑la do inquérito preliminar efetuado pelo Tribunal de Contas.

89. Contrariamente ao que a recorrente alega, o Tribunal Geral considerou, em nossa opinião com razão, nos n. os  29 e 30 do acórdão recorrido, que o artigo 4.°, da Decisão 99/50, não obrigava o Tribunal de Contas a divulgar à recorrente o conteúdo do processo de inquérito preliminar, aberto ao abrigo do artigo 2.°, daquela mesma decisão, nem de lhe tomar declarações, antes de remeter os autos ao OLAF.

90. O artigo 2.°, segundo parágrafo, da Decisão 99/50, comete ao Secretário‑Geral a obrigação de comunicar ao OLAF, sem demora, quaisquer elementos de facto que possam deixar presumir a existência de irregularidades e de proceder a um inquérito preliminar, sem prejuízo dos inquéritos internos efetuados pelo OLAF.

91. Como o Tribunal Geral sublinhou no n.° 29 do acórdão recorrido, o inquérito preliminar a que se refere esta disposição tem por objetivo, por um lado, permitir ao Secretário‑Geral apreciar se os elementos levados ao seu conhecimento deixam presumir a existência de irregularidades que causem prejuízos aos interesses financeiros da União e, por outro, remeter ao OLAF, em conformidade com o artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1073/1999, um dossiê que lhe permita apreciar se deve ser aberto um inquérito interno, por força do artigo 5.°, segundo parágrafo, do mesmo regulamento.

92. Assim, o inquérito preliminar constitui a fase, durante a qual são coligidas e averiguadas as informações relativas a alegações de irregularidades, para se ponderar se deve ser aberto um inquérito interno. Dito de outra forma, as informações coligidas, para sustentar tais alegações, devem ser averiguadas, para se apreciar o seu caráter de veracidade, antes de se as comunicar às autoridades competentes para instruir um inquérito interno, no caso o OLAF.

93. Na medida em que o objetivo do inquérito preliminar não é tecer conclusões sobre a pessoa em questão, o Tribunal Geral declarou, com razão, no n.° 29 do acórdão recorrido que a obrigação que decorre do artigo 4.°, segundo parágrafo, alínea a), da Decisão 99/50, não diz respeito aos atos do Secretário‑Geral, no quadro do artigo 2,.°, da mesma decisão.

94. Durante essa fase prévia de recolha e de avaliação das informações que apoiam as alegações de irregularidades, os riscos de pressão sobre as testemunhas são especialmente elevados. Consequentemente, é indispensável que não sejam levantados obstáculos à descoberta da verdade, nem à eficácia do inquérito preliminar.

95. A este propósito, é importante salientar que o artigo 4.°, primeiro parágrafo, primeiro período, da Decisão 99/50, desde que se possa considerar que esta disposição abrange tanto o inquérito interno, como o inquérito preliminar, prevê a regra, nos termos da qual a pessoa alvo das alegações de irregularidades deve ser informada rapidamente do seu envolvimento pessoal contém uma limitação importante, concretamente, que essa informação seja transmitida «desde que tal não seja suscetível de prejudicar o inquérito».

96. É pacífico que, nas cartas de 8 e de 26 de abril de 2002, a recorrente foi informada da abertura de inquérito pelo OLAF, do seu objetivo, da identidade dos instrutores e do facto de que estes a convidariam a cooperar. Por outro lado, a recorrente foi informada, por carta de 26 de abril de 2002, de que tinha sido efetuado um inquérito preliminar pelo Tribunal de Contas e que o respetivo processo tinha sido remetido ao OLAF. Estas comunicações respondem aos requisitos do artigo 4.°, primeiro parágrafo, primeiro período, da Decisão 99/50, na medida em que conciliam o princípio de uma informação rápida da pessoa visada com a necessidade de assegurar a eficácia do inquérito. Por outro lado, chamamos a atenção que uma informação rápida não é sinónimo de informação imediata ou desde o início do inquérito.

97. Por conseguinte, a argumentação da recorrente que pretende pôr em causa o raciocínio seguido pelo Tribunal Geral, nos n. os  29 e 30 do acórdão recorrido, não é fundada.

98. O mesmo se passa com a alegação de que o Tribunal Geral interpretou e aplicou erradamente os requisitos da responsabilidade extracontratual da União, no n.° 32 do acórdão recorrido. A este respeito, basta referir que a apreciação do Tribunal Geral de que «a eventual remessa do documento em causa pelo Tribunal de Contas, ao OLAF ou às autoridades luxemburguesas, não significa que a instituição tenha agido de má fé, em relação à autenticidade da assinatura da recorrente» foi feita subsidiariamente. De facto, o Tribunal Geral declarou, a título principal, que não estava provado que o documento controvertido, cuja autenticidade da assinatura era contestada, tivesse sido remetido ao OLAF ou às autoridades luxemburguesas. Dado que esta última declaração não foi posta em causa, esta última alegação deve ser considerada inoperante.

99. Resulta destas considerações que o quarto fundamento deve ser julgado improcedente, por falta de fundamentação. Consequentemente, deve ser negado provimento ao recurso.

VI – Conclusão

100. Tendo em conta todas as considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que:

– negue provimento ao recurso e

– condene Kalliopi Nikolaou nas despesas.

(1) .

(2)  — T‑241/09, a seguir o «acórdão recorrido».

(3)  — A seguir o «Secretário‑Geral».

(4)  — JO L 136, p. 1.

(5)  — N. os  47 a 49 da carta de 7 de julho de 2009.

(6)  — C‑432/04, Colet., p. I‑6387.

(7)  — V. TEDH, acórdão Allen c. Reino Unido, de 12 de julho de 2013 (§ 94).

(8)  — Idem .

(9)  — V. TEDH, acórdão Teodor c. Roménia, de 4 de junho de 2013 (§ 37 e jurisprudência citada).

(10)  — Idem (§ 40).

(11)  — Idem .

(12)  — § 38 e jurisprudência citada.

(13)  — Idem .

(14)  — TEDH, acórdão Vassilios Stavropoulos c. Grécia, já referido (§ 39). V. também, TEDH, acórdão Tendam c. Espanha, de 13 de julho de 2010 (§ 39).

(15)  — V., nomeadamente, acórdão de 19 de abril de 2012, Artegodan/Comissão (C‑221/10 P, n.° 94 e jurisprudência citada).

(16)  — V., nomeadamente, TEDH, acórdão Vanjak c. Croácia, de 14 de janeiro de 2010 (§ 69 a 72).

(17)  — Coletânea de acórdãos e decisões 2003‑II.

(18)  — § 38.

(19)  — Idem .

(20)  — N.° 121.

(21)  — Idem .

(22)  — N.° 122.

(23)  — Acórdão Comissão/Cresson, já referido (n.° 72).

(24)  — Esses outros parâmetros que constam do ponto 48 dessa carta são os seguintes: o «facto de, tendo em conta o reembolso das importâncias pagas indevidamente ao Sr. Koutsouvelis, não ter sido causado nenhum prejuízo ao orçamento comunitário», o «tempo decorrido desde os factos em questão», a «doença» da recorrente, bem como o «stress que [lhe] foi causado pela duração do processo penal».

(25)  — N.° 72.

(26)  — V. n.° 8 do acórdão recorrido.

(27)  — V. nota em pé de página da petição.


CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

YVES BOT

apresentadas em 20 de março de 2014 ( 1 )

Processo C‑220/13 P

Kalliopi Nikolaou

contra

Tribunal de Contas da União Europeia

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Decisão 99/50 do Tribunal de Contas Europeu — Inquérito preliminar — Inquérito interno instruído pelo OLAF — Presunção de inocência — Cooperação leal — Competência do Tribunal Geral»

1. 

No presente recurso, K. Nikolaou (a seguir «recorrente») pede a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia, de 20 de fevereiro de 2013, Nikolaou/Tribunal de Contas ( 2 ), que julgou improcedente a ação de indemnização destinada a obter reparação do dano alegadamente sofrido pela recorrente, na sequência de irregularidades e da violação do direito da União, cometidas contra si, pelo Tribunal de Contas.

I – Quadro jurídico

2.

A Decisão 99/50, do Tribunal de Contas, de 16 de dezembro de 1999, relativa às condições e modalidades dos inquéritos internos no domínio da luta contra a fraude, a corrupção e qualquer outra atividade ilegal lesiva dos interesses financeiros das Comunidades, dispõe no seu artigo 2.o:

«Os funcionários ou agentes do Tribunal [de Contas] que tenham conhecimento de elementos de facto que possam deixar presumir a existência, no seio da instituição, de eventuais casos de fraude, corrupção ou qualquer outra atividade ilegal, lesiva dos interesses financeiros das Comunidades, informarão imediatamente o Secretário‑Geral do Tribunal [de Contas ( 3 )], em conformidade.

O Secretário‑Geral transmitirá, imediatamente, ao Organismo [Europeu de Luta Antifraude (OLAF)] e ao Presidente do Tribunal [de Contas] que dará conhecimento da informação ao membro responsável pelo setor, ao qual pertença o funcionário ou agente, todos os elementos de facto que deixem presumir a existência de irregularidades previstas no parágrafo seguinte e procederá a um inquérito preliminar, sem prejuízo dos inquéritos internos efetuados pelo [OLAF].

[...]

Os membros, funcionários e agentes não podem, em caso algum, sofrer tratamento não equitativo ou discriminatório em consequência da prestação das informações previstas nos parágrafos antecedentes.»

3.

O artigo 4.o, primeiro parágrafo, da Decisão 99/50, prevê:

«No caso de se revelar a possibilidade de uma implicação pessoal de um membro, funcionário ou agente do Tribunal [de Contas], o interessado deve ser rapidamente informado, desde que tal não seja suscetível de prejudicar o inquérito. Em qualquer caso, na sequência do inquérito, não podem ser extraídas conclusões visando especificamente um membro, funcionário ou agente, sem que o interessado tenha tido a possibilidade de se exprimir sobre todos os factos que lhe digam respeito.»

II – Antecedentes do litígio

4.

A recorrente foi membro do Tribunal de Contas de 1996 a 2001. De acordo com uma reportagem publicada em 19 de fevereiro de 2002, no quotidiano Europa Journal, o eurodeputado Staes teria tido acesso a informações relativas a comportamentos ilícitos da recorrente, durante o seu mandato como membro do Tribunal de Contas.

5.

Por carta de 18 de março de 2002, o Secretário‑Geral remeteu ao Diretor‑Geral do OLAF um dossiê com os elementos respeitantes a esses factos, de que ele próprio e o Presidente do Tribunal de Contas tinham tido conhecimento. Além disso, o Secretário‑Geral pediu ao OLAF para lhe indicar, se devia informar a recorrente da existência de um inquérito a seu respeito, em conformidade com o artigo 4.o da Decisão 99/50.

6.

Por carta de 8 de abril de 2002, o Presidente do Tribunal de Contas informou a recorrente da existência de um inquérito interno, conduzido pelo OLAF, na sequência do artigo publicado no Europa Journal. Por carta de 26 de abril de 2002, o Diretor‑Geral do OLAF informou a recorrente de que tinha sido instaurado um inquérito interno, no qual era convidada a cooperar, na sequência de informações que os serviços tinham recebido do eurodeputado Staes e com fundamento num processo de inquérito preliminar elaborado pelo Secretário‑Geral.

7.

De acordo com o relatório do OLAF, de 28 de outubro de 2002, as informações a respeito da recorrente teriam sido facultadas ao eurodeputado Staes por dois funcionários do Tribunal de Contas, um dos quais antigo membro do gabinete da recorrente. As acusações analisadas respeitavam, em primeiro lugar, a importâncias em dinheiro que a recorrente teria recebido do seu pessoal a título de empréstimos; em segundo lugar, a alegadas falsas declarações de pedidos de transferência do gozo de férias do seu chefe de gabinete que lhe permitiram o reembolso a este último de cerca de 28790 euros, de férias não gozadas nos anos de 1999, 2000 e 2001; em terceiro lugar, à utilização do carro de serviço para fins não previstos nos regulamentos aplicáveis; em quarto lugar, à programação de deslocações em serviço do motorista da recorrente para fins não previstos nos regulamentos aplicáveis; em quinto lugar, a uma política de absentismo dentro do gabinete da recorrente; em sexto lugar, a atividades de natureza comercial e a intervenções junto de pessoas altamente colocadas para facilitar essas atividades por pessoas da sua família; em sétimo lugar, a uma fraude cometida no quadro de um concurso; e, em oitavo lugar, a fraudes relativas a despesas de representação recebidas pela recorrente.

8.

O OLAF concluiu pela possibilidade de terem sido cometidas infrações, suscetíveis de serem qualificadas de falsificação, de prevaricação e de fraude, em relação aos de pedidos de transferência do gozo de férias do seu chefe de gabinete. De acordo com o relatório final, a recorrente e os membros do seu gabinete podem ter cometido infrações de natureza penal, em relação às importâncias em dinheiro que a primeira teria recebido a título de empréstimos, segundo as pessoas envolvidas. Nestas circunstâncias e em conformidade com artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 1073/1999, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativo aos inquéritos efetuados pela Organização Europeia de Luta Antifraude (OLAF) ( 4 ), o OLAF informou as autoridades judiciárias luxemburguesas, para que investigassem os factos que pudessem indiciar a comissão de infrações penais.

9.

No tocante às outras acusações, com exceção da de fraude cometida no âmbito de um concurso, o OLAF evidenciou possíveis irregularidades ou situações duvidosas no comportamento da recorrente e sugeriu ao Tribunal de Contas a adoção de medidas corretivas em relação a ela, bem como de medidas para melhorar o sistema de controlo dentro da instituição.

10.

Em 26 de abril de 2004, a recorrente foi ouvida na reunião restrita do Tribunal de Contas, para efeitos da eventual aplicação do artigo 247.o, n.o 7, CE. Por carta de 13 de maio de 2004, o Presidente do Tribunal de Contas explicou que, quanto ao envio do processo para o Tribunal de Justiça, para os efeitos da aplicação do artigo 247.o, n.o 7, CE, pelo facto de a recorrente ter, alegadamente, pedido e obtido empréstimos pessoais de membros do seu gabinete, a unanimidade exigida pelo artigo 6.o, do regulamento interno do Tribunal de Contas, na versão aprovada em 31 de janeiro de 2002, não tinha sido alcançada na reunião que tinha tido lugar, em 4 de maio de 2004. A este propósito, o Presidente do Tribunal de Contas acrescentou que uma grande maioria dos membros da instituição considerou que o comportamento da recorrente era totalmente inapropriado. Quanto aos dias de férias do chefe de gabinete da recorrente, o Presidente do Tribunal de Contas esclareceu que a instituição tinha adiado a sua decisão, enquanto aguardava pelas conclusões do processo pendente nos órgãos jurisdicionais luxemburgueses.

11.

Por sentença de 2 de outubro de 2008, a secção correcional do tribunal d’arrondissement de Luxembourg (Luxemburgo) absolveu a recorrente e o seu chefe de gabinete das acusações de falsificação, de prevaricação, de falsas declarações e subsidiariamente de apropriação de subsídio, de subvenção ou de subsídio ilegal e, também subsidiariamente, de fraude (a seguir a «sentença de 2 de outubro de 2008»). O tribunal d’arrondissement do Luxemburgo considerou, no essencial, que algumas das explicações dadas pelo chefe de gabinete da recorrente e por ela própria criavam uma dúvida sobre o conjunto dos elementos de prova carreados pelo OLAF e pela polícia judiciária luxemburguesa, para demonstrar que o referido chefe de gabinete tinha estado em férias não declaradas, durante vários dias, durante os anos de 1999, 2000 e 2001. O tribunal d’arrondissement do Luxemburgo concluiu, por conseguinte, que, sem qualquer dúvida, a materialidade dos factos imputados à recorrente não tinha sido estabelecida, e que qualquer dúvida devia aproveitar ao arguido, devendo a recorrente ser absolvida das acusações imputadas.

12.

Por carta de 14 de abril de 2009, a recorrente pediu ao Tribunal de Contas para publicar uma comunicação relativa à sua absolvição em todos os jornais luxemburgueses, alemães, gregos, franceses, espanhóis e belgas e para informar as outras instituições da União Europeia. Subsidiariamente e na eventualidade de o Tribunal de Contas não proceder a essas publicações, a recorrente pediu uma indemnização de 100000 euros, para reparação dos danos morais, quantia que se comprometia a utilizar, para fazer as referidas publicações. A recorrente pediu também ao Tribunal de Contas, primeiro, que lhe pagasse 40000 euros, para reparação dos danos morais causados pelo processo que correu termos nos órgãos jurisdicionais luxemburguesas e 57 771,40 euros, para compensação dos danos patrimoniais provocados pelo mesmo processo, segundo, que lhe indemnizasse todas as despesas em que incorreu, nomeadamente, no juízo de instrução e no tribunal d’arrondissement do Luxemburgo e, terceiro, que lhe indemnizasse todas as despesas que fez com o processo no Tribunal de Contas.

13.

Por carta de 7 de julho de 2009, o Presidente do Tribunal de Contas deu conhecimento à recorrente da decisão adotada em resposta aos seus pedidos. A decisão rejeitou, por um lado, os argumentos alegados na carta de 14 de abril de 2009, e, por outro, comunicou à recorrente que o Tribunal de Contas tinha procurado determinar, com base nas informações de que dispunha, se os factos tinham um grau de gravidade suficiente para pedir ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse sobre a existência de infrações às obrigações que incumbiam ao antigo membro, nos termos do Tratado CE e sobre a necessidade de aplicação de eventuais sanções. A este propósito, o Tribunal de Contas comunicou à recorrente as informações que o tinham levado a decidir não recorrer ao Tribunal de Justiça, entre as quais figuravam, nomeadamente, a absolvição da recorrente pela sentença de 2 de outubro de 2008 e a inexistência de prejuízo causado ao orçamento comunitário, tendo em conta a reposição da quantia paga indevidamente a Koutsouvelis, seu chefe de gabinete ( 5 ).

III – Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

14.

Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral, em 16 de junho de 2009, a recorrente propôs uma ação de indemnização, tendo em vista obter a condenação do Tribunal de Contas no pagamento da quantia de 85000 euros, acrescida de juros, contados desde 14 de abril de 2009, para reparação dos danos morais causados pelas ações e omissões dessa Instituição, quantia que se comprometia a utilizar na publicação da sua absolvição.

15.

Na fundamentação da sua ação, a recorrente invocou em primeiro lugar seis fundamentos relativos à violação caraterizada pelo Tribunal de Contas das normas de direito da União que conferem direitos aos particulares. Depois, alegou a existência de um nexo de causalidade direto entre a referida violação e o dano moral e patrimonial que lhe foi causado.

16.

O Tribunal Geral julgou improcedente a referida ação, por considerar que o Tribunal de Contas não tinha cometido nenhuma das imputadas violações do direito de União.

17.

Em especial, pela importância que tem para este recurso, o Tribunal Geral concluiu, nos n.os 27 a 32 do acórdão recorrido, que os atos do Tribunal de Contas relativos ao inquérito preliminar não foram ilegais. De facto, ao remeter ao OLAF o processo que continha as primeiras informações recolhidas, antes de ter ouvido a recorrente, essa Instituição não violou as obrigações que decorrem da interpretação conjugada dos artigos 2.° e 4.° da Decisão 99/50, nem os direitos de defesa da demandante, ou o princípio da imparcialidade.

18.

Nos n.os 44 a 47 do acórdão recorrido o Tribunal Geral também respondeu às acusações relativas, por um lado, ao facto de o Tribunal de Contas não ter tomado nenhuma decisão formal, na sequência da sentença de 2 de outubro de 2008, que absolveu a recorrente de todas as acusações que lhe tinham sido imputadas e, por outro lado, ao facto de o Presidente do Tribunal de Contas ter incluído na sua carta, de 13 de maio de 2004, uma observação depreciativa e supérflua, a propósito da opinião expressa pela maioria dos membros da instituição. Os números criticados estão redigidos como se segue:

«44

É importante destacar que a omissão censurada ao Tribunal de Contas não está ferida de ilegalidade.

45

A este propósito, cabe sublinhar, em primeiro lugar, que a recorrente foi absolvida com fundamento nas dúvidas levantadas, conforme refere a sentença de 2 de outubro de 2008, por algumas explicações dadas pelo chefe de gabinete na audiência pública. Sem que seja necessário tecer considerações sobre a razoabilidade das dúvidas evidenciadas pelo tribunal d’arrondissement do Luxemburgo, é forçoso constatar que este motivo de absolvição não implica que as acusações imputadas à recorrente não tenham nenhum fundamento, mas, como declarou o referido tribunal, não foram provadas sem qualquer dúvida.

46

Em segundo lugar, como argumentou o Tribunal de Contas, cabe, em exclusivo, às autoridades jurisdicionais nacionais pronunciar‑se sobre as acusações, no plano penal e ao Tribunal de Justiça analisá‑las no plano disciplinar, ao abrigo do artigo 247.o, n.o 7, CE. Por conseguinte, o Tribunal de Contas não dispunha de competência para se pronunciar a este propósito.

47

Em terceiro lugar, não se pode deduzir do facto de o Tribunal de Contas não ter recorrido ao Tribunal de Justiça, ao abrigo desta última disposição, que o Tribunal de Contas entendeu que os factos imputados à recorrente não tinham fundamento. Com efeito, de acordo com o artigo 6.o do Regulamento interno do Tribunal de Contas, na versão de 31 de janeiro de 2002, a decisão de recorrer ao Tribunal de Justiça ser tomada por unanimidade. Por conseguinte, embora seja verdade que o não recurso ao Tribunal de Justiça implica que a unanimidade não foi alcançada, isso não significa uma tomada de posição do Tribunal de Contas quanto à materialidade dos factos. Neste contexto não era despropositado que o Presidente do Tribunal de Contas comunicasse à recorrente que a grande maioria dos membros da Instituição considerou o seu comportamento inaceitável, impedindo, assim, que o fato de não submeter o assunto ao Tribunal de Justiça pudesse ser entendido como uma suposta negação da materialidade dos factos imputados, o que, aliás, não corresponderia à realidade.»

19.

Por fim, o Tribunal Geral respondeu à acusação segundo a qual o Tribunal de Contas deveria, em virtude do seu dever de assistência, ter comunicado à imprensa e às instituições a absolvição da recorrente. A este propósito, ao referir‑se às razões expostas nos n.os 45 e 46 do acórdão recorrido, considerou não se poder inferir do dever de assistência nenhuma obrigação de publicar a absolvição da recorrente.

IV – Fundamentos e principais argumentos invocados em apoio do recurso

20.

A recorrente invoca quatro fundamentos para sustentar o seu recurso.

21.

No primeiro fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral infringiu o princípio da presunção de inocência, previsto no artigo 48.o, n.o 1 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir a «Carta») e no artigo 6.o, n.o 2 da Convenção Europeia dos Direito do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»). Com efeito, este princípio garante, nomeadamente, que um órgão jurisdicional da União não pode pôr em dúvida a inocência de uma pessoa acusada, tanto mais que essa pessoa foi anteriormente ilibada por uma decisão da justiça penal nacional transitada em julgado. Daqui decorre, segundo a recorrente, que o Tribunal Geral considerou erradamente, nos n.os 43 a 46 e 49 do acórdão recorrido, que a omissão por parte do Tribunal de Contas de adotar uma decisão que fizesse constar a não citação da recorrente no Tribunal de Justiça e por outro, de restabelecer a sua reputação, não estava «ferida de ilegalidade».

22.

A recorrente critica, em especial, a formulação do n.o 45 do acórdão recorrido, ao considerar que a apreciação do Tribunal Geral que ali figura constitui uma violação manifesta do princípio da presunção de inocência. Com efeito, resulta da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que a circunstância de a absolvição da recorrente ter sido motivada pela subsistência de uma dúvida, não pode ter nenhum efeito na obrigação do Tribunal Geral de não fundamentar a sua decisão no motivo da absolvição em questão.

23.

O Tribunal de Contas contrapõe que o primeiro fundamento é baseado na não tomada em consideração do âmbito do artigo 6.o, n.o 2 da CEDH, bem como do artigo 48.o, n.o 1 da Carta. Na verdade, a presunção de inocência é válida para a pessoa acusada perante uma autoridade judicial que deve decidir da sua culpabilidade ou da sua inocência com base nos factos da acusação que lhe são apresentados. Ora, no âmbito de uma ação de indemnização por responsabilidade extracontratual proposta pela demandante, não se debate a questão da sua culpabilidade à luz do direito luxemburguês. Por conseguinte, o Tribunal Geral não podia infringir a presunção de inocência.

24.

Por outro lado, esse fundamento assenta na premissa errada de que o Tribunal de Contas e o Tribunal Geral efetuaram uma reanálise do mérito da sentença de 2 de outubro de 2008. O Tribunal de Contas considera que, pelo contrário, cada instituição, no exercício da sua competência no contexto do processo, aceitou a referida sentença e retirou daí as conclusões que se impunham nos respetivos processos decisórios. Em especial, o Tribunal Geral considerou a sentença de 2 de outubro de 2008 como um elemento de facto que devia tomar em conta na apreciação da legalidade dos atos ou das omissões do Tribunal de Contas.

25.

O Tribunal de Contas deduziu dos n.os 120 a 122 do acórdão de 11 de julho de 2006, Comissão/Cresson ( 6 ), que nada impedia o Tribunal Geral de fazer uma outra apreciação dos mesmos factos no contexto da sua análise de uma eventual responsabilidade extracontratual do Tribunal de Contas, à luz do direito da União, apesar de reconhecer que o tribunal d’arrondissement do Luxemburgo tinha concluído que a materialidade de alguns factos imputados à recorrente não tinha sido estabelecida sem qualquer dúvida e que, por conseguinte, as pessoas em questão deviam ser ilibadas da acusação, que lhes fora imputada, de infrações ao direito penal luxemburguês Ao proceder desta forma, o Tribunal Geral nunca colocou em causa a sentença de 2 de outubro de 2008, nem a presunção de inocência, de que a recorrente beneficiava nessa instância.

26.

Através do seu segundo fundamento, a recorrente critica o Tribunal Geral por ter violado o princípio da cooperação leal, consagrado no artigo 4.o TUE, n.o 3, em relação ao tribunal d’arrondissement do Luxemburgo, ao desvirtuar as considerações e as apreciações efetuadas por este último.

27.

Na sua opinião, este princípio implica que, quando um tribunal nacional proferiu uma sentença que transitou em julgado e, nos termos da qual a pessoa foi absolvida das infrações que lhe tinham sido imputadas, as instituições da União, incluindo o Tribunal Geral, são obrigadas a respeitar essa sentença e não a privar do seu efeito útil.

28.

Ora, embora os factos em questão sejam idênticos àqueles sobre os quais o tribunal d’arrondissement do Luxemburgo se pronunciou, o Tribunal Geral violou o princípio da cooperação leal ao fazer uma apreciação totalmente diferente desses mesmos factos.

29.

Por outro lado, no n.o 35 do acórdão recorrido, o Tribunal contraditou as conclusões do tribunal d’arrondissement do Luxemburgo, quando considerou que a «gestão de qualquer sistema de férias é baseado na obrigação do superior hierárquico de verificar a presença do pessoal que lhe está subordinado e assegurar‑se de que qualquer ausência esteja em conformidade com a regulamentação das férias» e que [e]ssa obrigação não é afetada pela eventual inexistência de um sistema integrado que permita verificar, de forma que não dependa do superior hierárquico, que o número declarado de dias de férias não gozadas no fim de cada ano corresponde à realidade».

30.

Por fim, o Tribunal Geral não respeitou a sentença de 2 de outubro de 2008, na medida em que considerou no n.o 38 do acórdão recorrido que «o caráter deficitário do sistema de registo e de controlo dos dias de férias no Tribunal de Contas, aplicável à data dos factos, não poderia justificar o arquivamento de um inquérito ou de uma atuação contra [a recorrente]», quando foi precisamente o caráter deficitário do sistema de gestão de férias no Tribunal de Contas que conduziu à absolvição da recorrente.

31.

Em resposta a estes argumentos, o Tribunal de Contas afirma que o segundo fundamento assenta num desconhecimento das funções de cada uma das instituições envolvidas, bem como do artigo 4.o TUE, n.o 3. Com efeito, o Tribunal Geral não reanalisou a sentença de 2 de outubro de 2008, nem colocou em causa a sua decisão. A diferente análise de certos factos é explicável pelo contexto distinto dos dois processos, concretamente, por um lado, um processo penal que se enquadra no direito nacional e, por outro, uma ação de indemnização por responsabilidade extracontratual ao abrigo do direito da União.

32.

Com o seu terceiro fundamento, a recorrente sustenta que o acórdão recorrido está ferido por um vício de incompetência do Tribunal Geral, pelo facto de ter decidido questões que ultrapassavam as competências que lhe estão cometidas pelos Tratados.

33.

Segundo este fundamento, por um lado, embora reconheça no n.o 46 do acórdão recorrido que cabe em exclusivo aos órgãos jurisdicionais nacionais pronunciarem‑se sobre as acusações no plano penal, o Tribunal Geral ultrapassou as competências que lhe estão confiadas pelos Tratados, ao proceder, no n.o 45 do mesmo acórdão, a uma análise aprofundada do motivo da absolvição por existência de dúvida.

34.

Por outro lado, o Tribunal Geral também ultrapassou os limites da sua competência, quando fez as afirmações contidas no n.o 47 do acórdão recorrido. De facto, sendo o Tribunal de Justiça a única instituição que pode pronunciar‑se sobre as responsabilidades disciplinares derivadas do comportamento dos membros do Tribunal de Contas, o Tribunal Geral não tinha competência para se expressar sobre a recorrente, tal como fez na sua carta de 13 de maio de 2004, nem sequer uma dúvida que deixasse suspeitar um comportamento inaceitável da parte desta.

35.

O Tribunal de Contas contrapôs que este terceiro fundamento deve ser rejeitado, por ser parcialmente inadmissível, reiterando a esse propósito, simplesmente, os argumentos apresentados na primeira instância relativos à carta de 13 de maio de 2004, e por ser parcialmente infundado.

36.

Em relação a este último aspeto, sustenta, mais uma vez, que o Tribunal Geral nunca pôs em causa a sentença de 2 de outubro de 2008. Considera que a avaliação de um mesmo comportamento poderia conduzir a conclusões diferentes consoante na instância correspondente.

37.

Com o seu quarto fundamento a recorrente argumenta que o Tribunal Geral interpretou e fez uma aplicação errada dos requisitos exigidos para declarar a responsabilidade extracontratual da União. Com efeito, o Tribunal Geral, quanto à problemática da utilização de um documento falso, acrescentou um requisito suplementar não exigível (a má fé), ao concluir, no n.o 32 do acórdão recorrido que «a eventual transmissão do documento em questão pelo Tribunal de Contas, ao OLAF, ou aos órgãos jurisdicionais luxemburgueses, não significa que a instituição tenha agido de má fé em relação à autenticidade da assinatura da recorrente».

38.

Além disso, acrescenta que o Tribunal Geral também cometeu um erro de direito, na interpretação do artigo 2.o, segundo parágrafo da Decisão 99/50, conjugado com o seu artigo 4.o, primeiro parágrafo, na medida em que concluiu que era suficiente a simples comunicação da existência de um inquérito interno à recorrente conduzido pelo OLAF e que não era, por isso, necessário facultar‑lhe a informação do inquérito preliminar instruído pelo Tribunal de Contas.

39.

De acordo com o Tribunal de Contas, as alegações respeitantes a este quarto fundamento devem ser julgadas inadmissíveis, uma vez que consistem, por um lado, num pedido de reanálise dos factos do caso vertente ao Tribunal de Justiça e, por outro lado, numa simples reiteração dos argumentos apresentados na primeira instância, em especial, no que respeita à alegação relativa à não notificação do inquérito preliminar.

40.

Quanto ao mérito, no n.o 32 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não acrescentou nenhuma condição suplementar relativa à responsabilidade extracontratual da União, ao afirmar que a simples remessa de um documento ao OLAF ou às autoridades luxemburguesas não era um indício de má fé do Tribunal de Contas em relação à autenticidade da assinatura da recorrente. Do mesmo modo, o Tribunal Geral não cometeu erros de leitura do artigo 2.o, segundo parágrafo, da Decisão 99/50, dado que esta disposição não impõe a obrigação de comunicar a abertura de um inquérito preliminar à pessoa suspeita de irregularidades, mas exige simplesmente que o Secretário‑Geral dê, sem demora, conhecimento ao OLAF das informações recolhidas no âmbito desse inquérito.

V – Apreciação

41.

Vamos analisar, numa primeira fase, em conjunto, os primeiro a terceiro fundamentos alegados pela recorrente, na medida em que os argumentos suscitados apoiam‑se entre si e visam os mesmos números do acórdão recorrido. Numa segunda fase, analisaremos o quarto fundamento.

A – Quanto aos fundamentos relativos à violação da presunção de inocência e do princípio da cooperação leal, bem como da incompetência do Tribunal Geral

42.

Os três primeiros fundamentos pretendem, no essencial, pôr em causa o raciocínio adotado pelo Tribunal Geral, nos n.os 44 a 49 do acórdão recorrido.

43.

Importa não esquecer as alegações, às quais o Tribunal Geral pretendeu responder nesta parte do acórdão recorrido.

44.

Em primeiro lugar, a recorrente censurou o Tribunal de Contas por não ter adotado uma decisão oficial a ilibá‑la de todas as acusações, na sequência da sentença de 2 de outubro de 2008, uma vez que não tinha sido feita a prova dos comportamentos que justificaram a remessa do processo ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 247.o, n.o 7, CE. Na sua opinião, nessa decisão, o Tribunal de Contas deveria ter desistido de pedir ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse, ao abrigo desta última disposição.

45.

Em segundo lugar, a recorrente censurou o Presidente do Tribunal de Contas por ter violado o princípio da imparcialidade e o dever de assistência, ao incluir na carta de 13 de maio de 2004, uma observação depreciativa e supérflua, a propósito da opinião expressa pela maioria dos membros da instituição.

46.

Em terceiro lugar, a recorrente argumentou que o Tribunal de Contas deveria ter feito comunicações à imprensa e às instituições a respeito da sua absolvição, por força do seu dever de assistência.

47.

Antes de mais, indicamos que foi acertadamente, na nossa opinião, que o Tribunal Geral negou provimento a estes três pedidos da recorrente.

48.

Todavia, como alegou a recorrente, a argumentação que o Tribunal Geral desenvolveu no n.o 45 do acórdão recorrido suscita problemas no que se refere à presunção de inocência.

49.

Por força do artigo 48.o, n.o 1, da Carta «[t]odo o arguido se presume inocente enquanto não tiver sido legalmente provada a sua culpa». Esta disposição corresponde ao artigo 6.o, n.o 2, da CEDH. Em conformidade com o artigo 52, n.o 3 da Carta, o direito à presunção de inocência tem o mesmo sentido e o mesmo alcance que o direito correspondente garantido pela CEDH.

50.

A presunção de inocência deve ser garantida a montante e a jusante do processo penal. Com efeito, o artigo 6.o, n.o 2 da CEDH procura também «impedir que pessoas que tenham sido absolvidas ou beneficiado de um arquivamento dos autos sejam, de facto, tratadas, por agentes ou autoridades públicas, como culpadas da infração que lhes fora imputada» ( 7 ). O reconhecimento do direito à presunção de inocência, depois de um processo penal, explica‑se pelo facto de que «[s]em proteção que faça respeitar, em qualquer procedimento posterior, uma absolvição ou a uma decisão de arquivamento dos autos, as garantias de um processo equitativo, enunciadas no artigo 6.o, n.o 2 da CEDH, corriam o risco de se tornarem teóricas e ilusórias. Está também em causa, uma vez terminado o processo, a reputação do interessado e a maneira como esta é percebida pelo público» ( 8 ).

51.

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem precisou, assim, que «o campo de aplicação do artigo 6.o [n.o 2 da CEDH] não se limita aos processos penais pendentes, mas pode ser alargado às decisões proferidas após o despacho de arquivamento […] ou o acórdão de uma absolvição […], na medida em que as questões suscitadas nesses processos constituem um corolário e um complemento dos respetivos processos penais, nos quais a recorrente tinha a qualidade ‘de arguido’» ( 9 ). O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem verifica se, «pela sua forma de agir, pelos fundamentos das suas decisões ou pela linguagem utilizada no seu discurso» ( 10 ), as autoridades e os órgãos jurisdicionais nacionais que têm de se pronunciar sobre uma sentença penal «levantaram dúvidas sobre a inocência do recorrente e, dessa forma, violaram o princípio da presunção de inocência» ( 11 ).

52.

Como decorre especialmente do acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, Vassilios Stavropoulos c. Grécia, de 27 de setembro de 2007, «a expressão de dúvidas sobre a inocência de um arguido não é admissível depois de uma decisão de absolvição, transitada em julgado» ( 12 ). Na esteira da jurisprudência desse Tribunal «uma vez a decisão de absolvição transitada em julgado ‑ mesmo que se trate de uma decisão de absolvição, pela aplicação do princípio in dubio pro reo, em conformidade com o artigo 6.o [n.o 2 da CEDH] — a expressão de dúvidas sobre a culpabilidade, inclusive as baseadas nos fundamentos da absolvição, não é compatível com a presunção de inocência» ( 13 ).

53.

Nesse mesmo acórdão, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem considerou que, «por força do princípio ‘in dúbio pro reo’, que constitui uma expressão especial do princípio da presunção de inocência, não deve existir nenhuma diferença qualitativa entre uma absolvição por falta de provas e uma absolvição resultante da comprovação da inocência do arguido sem qualquer dúvida. Na verdade, as sentenças de absolvição não se diferenciam em razão dos fundamentos que são adotados caso a caso pelo juiz penal. Bem pelo contrário, no artigo 6.o [n,.° 2 da CEDH], o dispositivo de uma sentença de absolvição deve ser respeitado por qualquer autoridade que se pronuncie de forma direta ou incidental sobre a responsabilidade penal do interessado» ( 14 ).

54.

À luz desta jurisprudência, a formulação do n.o 45 do acórdão recorrido parece‑nos ser passível de contestação.

55.

Antes de mais, lembramos que, a este propósito, o Tribunal Geral sublinhou que a recorrente tinha sido «absolvida com fundamento em dúvidas surgidas, de acordo com a sentença de 2 de outubro de 2008, de algumas explicações dadas pelo chefe do seu gabinete, durante a audiência de julgamento». O Tribunal Geral acrescentou, indicando que, «[s]em que seja necessário pronunciar‑se sobre a razoabilidade das dúvidas evidenciadas pelo tribunal d’arrondissement do Luxemburgo, é forçoso constatar que este fundamento da absolvição não implica que as acusações imputadas à recorrente não tenham qualquer fundamento, mas, como expôs o referido tribunal, implica que elas não foram provadas para além de qualquer ‘dúvida razoável’».

56.

Nesta parte da sua argumentação o Tribunal Geral socorreu‑se do fundamento da absolvição, no processo penal, ao insistir no facto de que trata de uma absolvição, pela aplicação do princípio in dubio pro reo, para justificar a não adoção, pelo Tribunal de Contas, de uma decisão oficial a absolver a recorrente das acusações. Serve‑se, desta forma, do fundamento da absolvição para negar a existência de uma falta do Tribunal de Contas e daí extrair uma consequência sobre a apreciação do mérito da ação de indemnização. Em suma, o raciocínio que emana do n.o 45 do acórdão recorrido é o de que, uma vez que a recorrente foi absolvida, pela aplicação do princípio in dúbio pro reo e que este motivo da absolvição não basta para deixar sem fundamento as acusações de que foi alvo, foi com razão que o Tribunal de Contas recusou adotar uma decisão oficial absolvendo‑a de qualquer acusação, em consequência da sentença de 2 de outubro de 2008.

57.

Ao formular a sua argumentação desta maneira, o Tribunal Geral dá a impressão de que considera que uma absolvição, pela aplicação do princípio in dubio pro reo, tem menos força do que uma absolvição baseada numa afirmação mais direta da inocência da recorrente. Fragiliza a decisão tomada pelo juiz penal, o que, concomitantemente, contribui para lançar a dúvida sobre a inocência da recorrente.

58.

Ao violar, assim, a presunção de inocência da recorrente, o Tribunal Geral comete, por isso, um erro de direito.

59.

Na nossa opinião, a constatação deste erro não é, no entanto, suscetível de provocar a anulação do acórdão recorrido. De facto, é importante lembrar que resulta de jurisprudência constante que, se os fundamentos de um acórdão do Tribunal Geral contiverem uma violação de direito da União, mas a sua parte decisória se mostrar fundamentada por outras razões jurídicas, deve ser negado provimento ao recurso dele interposto ( 15 ).

60.

A este propósito destacamos que, acertadamente, o Tribunal Geral indicou, no n.o 46 do acórdão recorrido, que «cabe exclusivamente às autoridades jurisdicionais nacionais analisar as acusações, no plano penal, e ao Tribunal de Justiça pronunciar‑se sobre elas, no plano disciplinar, por força do artigo 247.o, n.o 7, CE». Deduz‑se daqui, com razão, que [o] Tribunal de Contas não tinha, por conseguinte, competência para se pronunciar a este propósito.

61.

Efetivamente, é evidente que o Tribunal de Contas não está habilitado para adotar uma decisão de absolvição, seja no plano penal, seja no plano disciplinar. Por outro lado, o Tribunal de Contas não estava, de modo algum, obrigado a proceder à publicação da absolvição da recorrente. Por conseguinte, o Tribunal Geral negou provimento, com razão, a estes dois pedidos da recorrente, com base na argumentação exposta no n.o 46 do acórdão recorrido.

62.

A única obrigação do Tribunal de Contas, no contexto deste processo, era decidir chamar ou não o Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 247.o, n.o 7, CE, a pronunciar‑se sobre a existência de um incumprimento de uma obrigação do cargo de membro do Tribunal de Contas, no sentido desta última disposição.

63.

A este propósito, sublinhamos que a argumentação do Tribunal Geral teria sido, ao mesmo tempo, mais convincente e completa, se tivesse acentuado mais a autonomia dos processos penais e disciplinares.

64.

Com efeito, tanto na primeira instância, como neste recurso, a argumentação da recorrente assentou, em grande parte, na ideia de que haveria de certo modo uma relação de automatismo, entre a existência de uma absolvição no processo penal e a adoção de uma decisão pelo Tribunal de Contas, nos termos da qual este renunciaria a chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se, ao abrigo do artigo 247.o, n.o 7, CE.

65.

Esta argumentação da recorrente é, fundamentalmente, errada, como pode ser deduzido, tanto da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, como deste Tribunal de Justiça.

66.

Em primeiro lugar, resulta da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que o direito à presunção de inocência, em situações de absolvição em processo penal ou de arquivamento dos processos, não impede, de maneira nenhuma, que posteriormente sejam instaurados processos disciplinares ou ações de indemnização, com base nos mesmos factos.

67.

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem admitiu, assim, que os organismos disciplinares podem apreciar, de forma independente, os factos de processos que lhes são submetidos, quando os elementos constitutivos de infrações penais e de comportamentos censuráveis disciplinarmente não são idênticos ( 16 ). Neste contexto, a constatação de que os factos não podem ser sujeitos a qualificação de infração penal não impede a instauração de um processo disciplinar, com fundamento nesses mesmos factos. Do ponto de vista do direito da presunção de inocência, o único limite é que, durante o processo disciplinar, a inocência da pessoa em causa, no plano penal, não pode ser posta em causa.

68.

Além disso, em matéria de contencioso de responsabilidade extracontratual, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem admitiu, no seu acórdão Ringvold c. Noruega, de 11 de fevereiro de 2003 ( 17 ), que «a questão da reparação do dano devia ser objeto de uma análise jurídica distinta, fundamentada em critérios e exigências em matéria de prova diferentes, em vários pontos importantes, dos aplicáveis no domínio da responsabilidade penal» ( 18 ). O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem considerou, assim, que «se a absolvição decidida em processo penal não deve ser posta em causa, num processo para reparação de danos, também não deve ser obstáculo ao estabelecimento de uma responsabilidade civil, com base em exigências de prova menos estritas, que conduza à obrigação de pagar uma indemnização, com fundamento nos mesmos factos» ( 19 ).

69.

Em segundo lugar, segundo uma lógica análoga, o Tribunal de Justiça, no seu acórdão Comissão/Cresson, já referido, pôs a tónica no caráter autónomo dos processos penais, por um lado, e, por outro, do processo baseado no artigo 213.o, n.o 2, CE que visa sancionar a violação das obrigações que decorrem do exercício do cargo de membro da Comissão Europeia.

70.

Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça, considerou, com efeito, que não estava «vinculado pela qualificação jurídica dos factos efetuada no âmbito do processo penal» ( 20 ) e que lhe competia, «no pleno uso do seu poder de apreciação, indagar se os factos imputados no âmbito de um processo baseado no artigo 213.o, n.o 2, CE [constituíam] um incumprimento dos deveres decorrentes do cargo de membro da Comissão» ( 21 ). O Tribunal de Justiça concluiu que a decisão da chambre du conseil du tribunal de première instance de Bruxelas [Bélgica] que constata a inexistência de responsabilidade de E. Cresson não o pode vincular ( 22 ).

71.

Esta argumentação, baseada no caráter autónomo dos processos penais e disciplinares, é transponível para o processo que, à data dos factos, estava previsto no artigo 287.o, n.o 7, CE e que consta, atualmente, do artigo 286.o, n.o 6, TFUE. De onde resulta que, quando é chamado a analisar se um membro do Tribunal de Contas faltou ou não ao cumprimento das obrigações decorrentes do exercício do cargo, o Tribunal de Justiça não está vinculado pela sentença penal que absolveu a pessoa em causa.

72.

Com o mesmo fundamento extraído do caráter autónomo dos processos penais e disciplinares, o Tribunal de Contas, enquanto autoridade que pede ao Tribunal de Justiça para se pronunciar, não pode estar vinculado por essa sentença penal. Em especial, para responder claramente à argumentação da recorrente, a existência de uma absolvição em processo penal não impede de maneira nenhuma o Tribunal de Contas de pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie, ao abrigo do artigo 286.o, n.o 6, TFUE. Mesmo nessa hipótese, o Tribunal de Contas conserva o seu poder de apreciação, quanto a um eventual pedido ao Tribunal de Justiça para se pronunciar.

73.

Deduzimos destes elementos que o processo penal pendente num órgão jurisdicional nacional e o procedimento previsto no artigo 247.o, n.o 7, CE, atualmente no artigo 286.o, n.o 6, TFUE, são diferentes, não apenas quanto ao seu objeto e à sua finalidade, mas também quanto à natureza e ao grau de prova exigível. Ainda que os dois processos tenham por fundamento as mesmas circunstâncias de facto, na verdade são independentes, de forma que, sob reserva de não pôr em causa o veredito do juiz penal, uma absolvição no plano penal não impede de maneira nenhuma o Tribunal de Contas de pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie, nem este último de decidir sobre a existência de um incumprimento das obrigações decorrentes do cargo de membro do Tribunal de Contas.

74.

No presente processo, resulta dos autos que o tribunal d’arrondissement do Luxemburgo decidiu, na sua sentença de 2 de outubro de 2008 que os factos provados não podiam justificar a qualificação da infração penal, nos termos do direito luxemburguês.

75.

Assim, a apreciação efetuada pelo tribunal d’arrondissement do Luxemburgo não significa, no entanto, um obstáculo que impeça o Tribunal de Contas de decidir chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se sobre os incumprimentos relativos à gestão dos dias de férias. Com efeito, o grau de precisão dos factos ou das provas que é exigível para a qualificação da infração penal não é necessariamente o mesmo que o requerido para a constatação da existência de um incumprimento das obrigações que incumbem aos membros do Tribunal de Contas. Por outro lado, e em todo o caso, incumbe apenas ao Tribunal de Justiça, quando chamado a pronunciar‑se, nos termos do artigo 286.o, n.o 6, TFUE, apreciar o alcance da força de caso julgado que deve ser reconhecido, no caso concreto, à sentença penal nacional.

76.

Daqui resulta que a recusa de o Tribunal de Contas adotar uma decisão oficial de absolvição e reconhecer um vínculo de automatismo entre a absolvição no processo penal e o pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 247.o, n.o 7, CE, foi totalmente justificada e não poderia, neste recurso, ser posta em causa, alegando‑se que o não provimento pelo Tribunal Geral do pedido da recorrente com vista a obter a declaração da ilegalidade dessa recusa constitui uma violação da presunção de inocência ou do princípio da cooperação leal.

77.

Foi em conformidade com o caráter autónomo dos processos penais e disciplinares e no exercício do seu poder de apreciação que o Tribunal de Contas procurou determinar, com base nas informações de que dispunha, se os factos imputados à recorrente tinham um grau de gravidade suficiente ( 23 ), para chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se, nos termos do artigo 247.o, n.o 7, CE. Como testemunha a sua carta de 7 de julho de 2009, o Tribunal de Contas, no momento em que decidiu não chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se sobre a questão relativa à gestão dos dias de férias, não teve apenas em conta a absolvição da recorrente no plano penal. Tomou também em consideração outros parâmetros ( 24 ).

78.

Vamos agora analisar as críticas que a recorrente formulou ao n.o 47 do acórdão recorrido.

79.

Nesse número, o Tribunal Geral respondeu à argumentação da recorrente, segundo a qual o Presidente do Tribunal de Contas teria violado o princípio da imparcialidade e o dever de assistência, ao escrever, na sua carta de 13 de maio de 2004, uma observação depreciativa e supérflua, a propósito da opinião expressa pela maioria dos membros da instituição.

80.

Segundo a recorrente, o Tribunal Geral teria ultrapassado os limites da sua competência e teria avalisado uma interpretação errada da esfera de competência do Tribunal de Contas, quando considerou, no referido número, que «não era inapropriado o Presidente do Tribunal de Contas comunicar à recorrente que a grande maioria dos membros da instituição considerou inaceitável o seu comportamento, o que impedia, assim, que a inexistência de pedido ao Tribunal de Justiça para se pronunciar, pudesse ser percebida como uma pretensa negação da materialidade dos factos imputados».

81.

É importante esclarecer que a passagem da carta de 13 de maio de 2004 que contém a observação criticada, diz apenas respeito às alegações relativas aos empréstimos pessoais feitos à recorrente. Este aspeto do processo não foi incluído no processo penal em que foi proferida a sentença de 2 de outubro de 2008. A absolvição da recorrente no plano penal não é, portanto, levada em conta na análise do n.o 47 do acórdão recorrido.

82.

Feito este esclarecimento, o Tribunal Geral não ultrapassou, na nossa opinião, a sua esfera de competências, quando considerou, por um lado, que o facto de não submeter o assunto ao Tribunal de Justiça para se pronunciar não significava a negação da materialidade dos factos e, por outro, que o Presidente do Tribunal de Contas podia dirigir à recorrente o comentário criticado.

83.

Com efeito, a apreciação contida no n.o 47 do acórdão recorrido constitui uma resposta do Tribunal Geral à alegação da recorrente que considera que a observação que o Presidente do Tribunal de Contas incluiu na carta de 13 de maio de 2004, viola o princípio da imparcialidade e o dever de assistência. Assim, ao tomar posição sobre este aspeto, no quadro da ação de indemnização por responsabilidade extracontratual que lhe foi submetida, o Tribunal Geral não ultrapassou os limites da sua competência.

84.

Além disso, o facto de o Tribunal de Contas não submeter o processo ao Tribunal de Justiça, revela que nem todos os membros do Tribunal de Contas consideraram que o incumprimento em causa representava um limiar de gravidade suficiente, para chamar o Tribunal de Justiça a pronunciar‑se, nos termos do artigo 247.o, n.o 7, CE. A constatação de que a unanimidade não foi alcançada nesta questão, não significa a inexistência de nenhum incumprimento. A este propósito, convém lembrar, por analogia com o procedimento contra os membros da Comissão, que o Tribunal de Justiça esclareceu, no seu acórdão Comissão/Cresson, já referido, que uma condenação, nos termos do artigo 213.o, n.o 2, CE, exige que o incumprimento tenha um certo grau de gravidade ( 25 ). O Presidente do Tribunal de Contas podia, por conseguinte, no quadro da sua competência e sem violar o princípio da imparcialidade e o dever de assistência, explicitar à recorrente o resultado da votação e comunicar‑lhe que a maioria dos membros do Tribunal de Contas tinha considerado o seu comportamento absolutamente inapropriado, embora não o tivesse considerado por unanimidade suficientemente grave para justificar um pedido ao Tribunal de Justiça para se pronunciar, nos termos do artigo 247.o, n.o 7, CE. Por outro lado, convém esclarecer que a carta de 13 de maio de 2004 só foi endereçada à recorrente e que não há nada nos autos que indique que foi comunicada a outras pessoas, além do seu destinatário.

85.

Por conseguinte, consideramos que o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito no raciocínio que desenvolveu sobre o n.o 47 do acórdão recorrido. Apenas realçamos que o Tribunal Geral deveria ter, com todo o rigor, repetiu a qualificação do comportamento da recorrente, tal como constava da carta de 13 de maio de 2004, concretamente, um comportamento «absolutamente inapropriado» ( 26 ), em vez de o qualificar de «inaceitável». Na nossa opinião, esta diferente formulação não é, no entanto, suficiente para declarar a existência de um erro de direito. Observamos, aliás, que a recorrente se limitou, quanto a este aspeto, a formular uma observação na sua petição, sem tirar uma consequência direta quanto à existência de um erro de direito ( 27 ).

86.

Por fim, consideramos que os n.os 35 e 38 do acórdão recorrido são isentos de crítica à luz do princípio da cooperação leal. Efetivamente, foi com razão, e sem pôr em causa a sentença de 2 de outubro de 2008 que o Tribunal Geral considerou, no essencial, que o caráter deficitário do sistema de registo e de controlo dos dias de férias no Tribunal de Contas, por um lado, não afetava a obrigação do superior hierárquico de verificar a assiduidade do pessoal sob a sua autoridade e assegurar‑se que qualquer ausência era conforme à regulamentação das férias e, por outro, não podia justificar o arquivamento de qualquer inquérito ou procedimento contra a recorrente.

87.

Uma vez que a análise dos primeiro ao terceiro fundamentos invocados pela recorrente, não nos permite propor ao Tribunal de Justiça a anulação do acórdão recorrido, vamos, agora, analisar o quarto fundamento.

B – Quanto ao quarto fundamento relativo à interpretação e à aplicação erradas do direito da União, no que diz respeito aos requisitos da responsabilidade extracontratual da União e a Decisão 99/50

88.

Segundo a recorrente, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na interpretação do artigo 2.o, segundo parágrafo, da Decisão 99/50, conjugado com o seu artigo 4.o, primeiro parágrafo, na medida em que concluiu que a simples comunicação à recorrente, da existência de um inquérito interno conduzido pelo OLAF, era suficiente e que não era, por isso, necessário informá‑la do inquérito preliminar efetuado pelo Tribunal de Contas.

89.

Contrariamente ao que a recorrente alega, o Tribunal Geral considerou, em nossa opinião com razão, nos n.os 29 e 30 do acórdão recorrido, que o artigo 4.o, da Decisão 99/50, não obrigava o Tribunal de Contas a divulgar à recorrente o conteúdo do processo de inquérito preliminar, aberto ao abrigo do artigo 2.o, daquela mesma decisão, nem de lhe tomar declarações, antes de remeter os autos ao OLAF.

90.

O artigo 2.o, segundo parágrafo, da Decisão 99/50, comete ao Secretário‑Geral a obrigação de comunicar ao OLAF, sem demora, quaisquer elementos de facto que possam deixar presumir a existência de irregularidades e de proceder a um inquérito preliminar, sem prejuízo dos inquéritos internos efetuados pelo OLAF.

91.

Como o Tribunal Geral sublinhou no n.o 29 do acórdão recorrido, o inquérito preliminar a que se refere esta disposição tem por objetivo, por um lado, permitir ao Secretário‑Geral apreciar se os elementos levados ao seu conhecimento deixam presumir a existência de irregularidades que causem prejuízos aos interesses financeiros da União e, por outro, remeter ao OLAF, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1073/1999, um dossiê que lhe permita apreciar se deve ser aberto um inquérito interno, por força do artigo 5.o, segundo parágrafo, do mesmo regulamento.

92.

Assim, o inquérito preliminar constitui a fase, durante a qual são coligidas e averiguadas as informações relativas a alegações de irregularidades, para se ponderar se deve ser aberto um inquérito interno. Dito de outra forma, as informações coligidas, para sustentar tais alegações, devem ser averiguadas, para se apreciar o seu caráter de veracidade, antes de se as comunicar às autoridades competentes para instruir um inquérito interno, no caso o OLAF.

93.

Na medida em que o objetivo do inquérito preliminar não é tecer conclusões sobre a pessoa em questão, o Tribunal Geral declarou, com razão, no n.o 29 do acórdão recorrido que a obrigação que decorre do artigo 4.o, segundo parágrafo, alínea a), da Decisão 99/50, não diz respeito aos atos do Secretário‑Geral, no quadro do artigo 2,.°, da mesma decisão.

94.

Durante essa fase prévia de recolha e de avaliação das informações que apoiam as alegações de irregularidades, os riscos de pressão sobre as testemunhas são especialmente elevados. Consequentemente, é indispensável que não sejam levantados obstáculos à descoberta da verdade, nem à eficácia do inquérito preliminar.

95.

A este propósito, é importante salientar que o artigo 4.o, primeiro parágrafo, primeiro período, da Decisão 99/50, desde que se possa considerar que esta disposição abrange tanto o inquérito interno, como o inquérito preliminar, prevê a regra, nos termos da qual a pessoa alvo das alegações de irregularidades deve ser informada rapidamente do seu envolvimento pessoal contém uma limitação importante, concretamente, que essa informação seja transmitida «desde que tal não seja suscetível de prejudicar o inquérito».

96.

É pacífico que, nas cartas de 8 e de 26 de abril de 2002, a recorrente foi informada da abertura de inquérito pelo OLAF, do seu objetivo, da identidade dos instrutores e do facto de que estes a convidariam a cooperar. Por outro lado, a recorrente foi informada, por carta de 26 de abril de 2002, de que tinha sido efetuado um inquérito preliminar pelo Tribunal de Contas e que o respetivo processo tinha sido remetido ao OLAF. Estas comunicações respondem aos requisitos do artigo 4.o, primeiro parágrafo, primeiro período, da Decisão 99/50, na medida em que conciliam o princípio de uma informação rápida da pessoa visada com a necessidade de assegurar a eficácia do inquérito. Por outro lado, chamamos a atenção que uma informação rápida não é sinónimo de informação imediata ou desde o início do inquérito.

97.

Por conseguinte, a argumentação da recorrente que pretende pôr em causa o raciocínio seguido pelo Tribunal Geral, nos n.os 29 e 30 do acórdão recorrido, não é fundada.

98.

O mesmo se passa com a alegação de que o Tribunal Geral interpretou e aplicou erradamente os requisitos da responsabilidade extracontratual da União, no n.o 32 do acórdão recorrido. A este respeito, basta referir que a apreciação do Tribunal Geral de que «a eventual remessa do documento em causa pelo Tribunal de Contas, ao OLAF ou às autoridades luxemburguesas, não significa que a instituição tenha agido de má fé, em relação à autenticidade da assinatura da recorrente» foi feita subsidiariamente. De facto, o Tribunal Geral declarou, a título principal, que não estava provado que o documento controvertido, cuja autenticidade da assinatura era contestada, tivesse sido remetido ao OLAF ou às autoridades luxemburguesas. Dado que esta última declaração não foi posta em causa, esta última alegação deve ser considerada inoperante.

99.

Resulta destas considerações que o quarto fundamento deve ser julgado improcedente, por falta de fundamentação. Consequentemente, deve ser negado provimento ao recurso.

VI – Conclusão

100.

Tendo em conta todas as considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que:

negue provimento ao recurso e

condene Kalliopi Nikolaou nas despesas.


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) T‑241/09, a seguir o «acórdão recorrido».

( 3 ) A seguir o «Secretário‑Geral».

( 4 ) JO L 136, p. 1.

( 5 ) N.os 47 a 49 da carta de 7 de julho de 2009.

( 6 ) C-432/04, Colet., p. I-6387.

( 7 ) V. TEDH, acórdão Allen c. Reino Unido, de 12 de julho de 2013 (§ 94).

( 8 ) Idem.

( 9 ) V. TEDH, acórdão Teodor c. Roménia, de 4 de junho de 2013 (§ 37 e jurisprudência citada).

( 10 ) Idem (§ 40).

( 11 ) Idem.

( 12 ) § 38 e jurisprudência citada.

( 13 ) Idem.

( 14 ) TEDH, acórdão Vassilios Stavropoulos c. Grécia, já referido (§ 39). V. também, TEDH, acórdão Tendam c. Espanha, de 13 de julho de 2010 (§ 39).

( 15 ) V., nomeadamente, acórdão de 19 de abril de 2012, Artegodan/Comissão (C‑221/10 P, n.o 94 e jurisprudência citada).

( 16 ) V., nomeadamente, TEDH, acórdão Vanjak c. Croácia, de 14 de janeiro de 2010 (§ 69 a 72).

( 17 ) Coletânea de acórdãos e decisões 2003‑II.

( 18 ) § 38.

( 19 ) Idem.

( 20 ) N.o 121.

( 21 ) Idem.

( 22 ) N.o 122.

( 23 ) Acórdão Comissão/Cresson, já referido (n.o 72).

( 24 ) Esses outros parâmetros que constam do ponto 48 dessa carta são os seguintes: o «facto de, tendo em conta o reembolso das importâncias pagas indevidamente ao Sr. Koutsouvelis, não ter sido causado nenhum prejuízo ao orçamento comunitário», o «tempo decorrido desde os factos em questão», a «doença» da recorrente, bem como o «stress que [lhe] foi causado pela duração do processo penal».

( 25 ) N.o 72.

( 26 ) V. n.o 8 do acórdão recorrido.

( 27 ) V. nota em pé de página da petição.