ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)
23 de janeiro de 2014 ( *1 )
«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Marca comunitária — Marca nominativa WESTERN GOLD — Oposição do titular das marcas nominativas nacionais, internacional e comunitária WeserGold, Wesergold e WESERGOLD»
No processo C‑558/12 P,
que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral, interposto ao abrigo do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, entrado em 4 de dezembro de 2012,
Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. Pohlmann, na qualidade de agente,
recorrente,
sendo as outras partes no processo:
riha WeserGold Getränke GmbH & Co. KG, anteriormente Wesergold Getränkeindustrie GmbH & Co. KG, com sede em Rinteln (Alemanha), representada por T. Melchert, Rechtsanwalt,
recorrente em primeira instância,
Lidl Stiftung & Co. KG, com sede em Neckarsulm (Alemanha), representada por M. Wolter e A. K. Marx, Rechtsanwälte,
interveniente em primeira instância,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),
composto por: A. Borg Barthet (relator), presidente de secção, E. Levits e M. Berger, juízes,
advogado‑geral: E. Sharpston,
secretário: A. Calot Escobar,
vistos os autos,
vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,
profere o presente
Acórdão
1 |
Com o seu recurso, o Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) pede a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 21 de setembro de 2012, Wesergold Getränkeindustrie/IHMI — Lidl Stiftung (WESTERN GOLD) (T‑278/10, a seguir «acórdão recorrido»), que anulou a decisão da Primeira Câmara de Recurso do IHMI de 24 de março de 2010 (processo R 770/2009‑1), relativa a um processo de oposição entre a Wesergold Getränkeindustrie GmbH & Co. KG e a Lidl Stiftung & Co. KG (a seguir «decisão controvertida»). |
Quadro jurídico
2 |
O artigo 8.o do Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1), intitulado «Motivos relativos de recusa», dispõe no seu n.o 1: «Após oposição do titular de uma marca anterior, o pedido de registo de marca será recusado: […]
|
Antecedentes do litígio
3 |
Em 23 de agosto de 2006, a Lidl Stiftung & Co. KG (a seguir «Lidl Stiftung»), apresentou um pedido de registo de marca comunitária ao IHMI, nos termos do Regulamento (CE) n.o 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), entretanto substituído pelo Regulamento n.o 207/2009. |
4 |
A marca cujo registo foi pedido é o sinal nominativo «WESTERN GOLD». |
5 |
Os produtos para os quais o registo foi pedido pertencem à classe 33 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem à descrição seguinte, a saber: «Bebidas espirituosas, em especial whisky». |
6 |
O pedido de registo de marca comunitária foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.o 3/2007, de 22 de janeiro de 2007. |
7 |
Em 14 de março de 2007, a Wesergold Getränkeindustrie GmbH & Co. KG (a seguir «Wesergold Getränkeindustrie»), entretanto adquirida pela riha WeserGold Getränke GmbH & Co. KG (a seguir «riha WeserGold Getränke»), deduziu oposição ao abrigo do disposto no artigo 42.o do Regulamento n.o 40/94, cujas disposições foram retomadas no artigo 41.o do Regulamento n.o 207/2009, ao registo da marca em causa para os produtos referidos no n.o 5 do presente acórdão. |
8 |
A oposição baseava‑se em diversas marcas anteriores. |
9 |
A primeira marca anterior invocada foi a marca nominativa comunitária WeserGold, cujo pedido foi apresentado em 3 de janeiro de 2003 e que foi registada em 2 de março de 2005, sob o número 2994739, que designa produtos pertencentes às classes 29, 31 e 32, correspondendo cada uma dessas classes à descrição seguinte:
|
10 |
A segunda marca anterior invocada foi a marca nominativa alemã WeserGold, cujo pedido foi apresentado em 26 de novembro de 2002 e que foi registada em 27 de fevereiro de 2003, sob o número 30257995, que designa produtos pertencentes às classes 29, 31 e 32, correspondendo cada uma dessas classes à descrição seguinte:
|
11 |
A terceira marca anterior invocada foi a marca nominativa internacional n.o 801149 Wesergold, cujo pedido foi apresentado em 13 de março de 2003, e que produz efeitos na República Checa, na Dinamarca, em Espanha, em França, em Itália, na Hungria, na Áustria, na Polónia, em Portugal, na Eslovénia, na Suécia, no Reino Unido e nos países do Benelux, que designa produtos pertencentes às classes 29, 31 e 32, correspondendo cada uma dessas classes à descrição constante no n.o 10 do presente acórdão. |
12 |
A quarta marca anterior invocada foi a marca nominativa alemã WESERGOLD, cujo pedido foi apresentado em 12 de junho de 1970 e que foi registada em 16 de fevereiro de 1973, sob o número 902472, renovada em 13 de junho de 2000, que designa produtos pertencentes à classe 32, correspondendo à descrição seguinte, a saber: «Cidras, limonadas, águas minerais, bebidas à base de sumo de legumes, sumos de frutas». |
13 |
A quinta marca anterior invocada foi a marca nominativa polaca WESERGOLD, cujo pedido foi apresentado em 26 de junho de 1996 e que foi registada em 11 de maio de 1999, sob o número 161413, que designa produtos da classe 32, correspondendo à descrição seguinte, a saber: «Águas minerais e águas de nascente; águas de mesa, bebidas não alcoólicas; sumos de frutas, néctares de frutas, xaropes de frutas, sumos de legumes, néctares de legumes, bebidas refrescantes, bebidas à base de sumos de frutas, limonadas, bebidas gasosas, bebidas minerais, chás gelados, águas minerais aromatizadas, águas minerais com adição de sumo de fruta — todas as bebidas mencionadas igualmente como preparações dietéticas para fins não medicinais». |
14 |
O fundamento invocado pela Wesergold Getränkeindustrie em apoio da oposição foi o previsto no artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 40/94, cujas disposições foram retomadas no artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009. |
15 |
Em 11 de junho de 2009, a Divisão de Oposição do IHMI (a seguir «Divisão de Oposição») deferiu a oposição e rejeitou o pedido de registo da marca comunitária em questão. Por razões de economia processual, a Divisão de Oposição limitou a sua análise da oposição à marca nominativa comunitária anterior, para a qual não era necessária prova da sua utilização séria. |
16 |
Em 13 de julho de 2009, a Lidl Stiftung interpôs recurso da decisão da Divisão de Oposição no IHMI, nos termos dos artigos 58.° a 64.° do Regulamento n.o 207/2009. |
17 |
Através da decisão controvertida, a Primeira Câmara de Recurso do IHMI (a seguir «Câmara de Recurso») julgou o recurso procedente e anulou a decisão da Divisão de Oposição. Considerou que o público relevante é o grande público da União Europeia. Os produtos abrangidos pela marca cujo registo foi pedido, pertencentes à classe 33, a saber, «Bebidas espirituosas, em especial whisky», não são semelhantes aos produtos abrangidos pelas marcas anteriores pertencentes às classes 29 e 31. Existe um grau de semelhança fraco entre os produtos abrangidos por esta marca, pertencentes à classe 33, e os abrangidos pelas marcas anteriores, pertencentes à classe 32. Os sinais em conflito apresentam um grau de semelhança médio nos planos visual e fonético, mas são concetualmente diferentes. No que respeita ao caráter distintivo das marcas anteriores, a Câmara de Recurso considerou, no essencial, que era ligeiramente inferior à média devido à presença do termo «gold», que tem um caráter distintivo fraco. Por último, a Câmara de Recurso indicou que a ponderação de todas as circunstâncias do caso concreto no âmbito da apreciação do risco de confusão conduz à inexistência de risco de confusão entre os sinais em conflito. |
Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido
18 |
Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 21 de junho de 2010, a Wesergold Getränkeindustrie interpôs recurso de anulação da decisão controvertida. |
19 |
Em apoio do seu recurso, a recorrente invocou quatro fundamentos relativos à violação, respetivamente, do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do artigo 64.o, do artigo 75.o, segundo período, e, a título subsidiário, do artigo 75.o, primeiro período, do Regulamento n.o 207/2009. |
20 |
O Tribunal Geral analisou apenas o primeiro destes fundamentos. |
21 |
Nos n.os 24 e 25 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou, no essencial, que o público relevante é constituído pelo consumidor médio da União. |
22 |
No que respeita à comparação dos produtos em causa, o Tribunal Geral considerou, no n.o 41 do acórdão recorrido, que as bebidas espirituosas visadas pela marca cujo registo foi pedido e as bebidas não alcoólicas protegidas pelas marcas anteriores apresentavam apenas um grau de semelhança fraco. |
23 |
No que respeita à comparação dos sinais em conflito, o Tribunal Geral considerou, respetivamente, nos n.os 47 e 50 do acórdão recorrido, que estes sinais apresentavam um grau de semelhança médio no plano visual e no plano fonético, e no n.o 56 do mesmo acórdão, que eram concetualmente diferentes. |
24 |
No n.o 58 do referido acórdão, concluiu que os sinais em conflito eram globalmente diferentes, não obstante as suas semelhanças nos planos visual e fonético. |
25 |
O Tribunal Geral procedeu igualmente ao exame da apreciação do caráter distintivo das marcas anteriores levado a cabo pela Câmara de Recurso, contestado pela Wesergold Getränkeindustrie. |
26 |
No que respeita ao caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, o Tribunal Geral analisou, nos n.os 65 a 68 do acórdão recorrido, o articulado apresentado pela Wesergold Getränkeindustrie na Divisão de Oposição, bem como o articulado apresentado por esta sociedade na Câmara de Recurso. No n.o 70 desse acórdão, o Tribunal Geral considerou que, na sua defesa perante a Câmara de Recurso, a Wesergold Getränkeindustrie não avançou expressamente argumentos quanto ao caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores e que se limitou a remeter para os seus articulados apresentados à Divisão de Oposição, os quais, no entanto, continham uma alegação, sustentada em provas, segundo a qual as marcas anteriores gozavam de um caráter distintivo acrescido pela utilização. |
27 |
Nos n.os 71 e 72 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou, no essencial, nos termos do artigo 64.o, n.o 1, do Regulamento n.o 207/2009, que, por força do recurso nela interposto, a Câmara de Recurso foi chamada a proceder a uma nova apreciação integral do mérito da oposição, tanto quanto à matéria de direito como à matéria de facto e que, consequentemente, estava obrigada a apreciar todos os argumentos apresentados pela Wesergold Getränkeindustrie à Divisão de Oposição. Assim, e na medida em que a Wesergold Getränkeindustrie alegou, no processo que correu na Divisão de Oposição, o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, a Câmara de Recurso não podia, segundo o Tribunal Geral, considerar que esta sociedade não tinha invocado um aumento do caráter distintivo das marcas anteriores, resultante da utilização destas últimas. |
28 |
No n.o 73 do referido acórdão, o Tribunal Geral concluiu que, por conseguinte, a Câmara de Recurso cometeu um erro na aplicação do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009. |
29 |
Nos n.os 82 e 83 do referido acórdão, o Tribunal Geral considerou, no essencial, que, por não ter apreciado a procedência dos argumentos e dos elementos de prova invocados pela Wesergold Getränkeindustrie quanto ao caráter distintivo acrescido pela utilização de marcas anteriores, a Câmara de Recurso não analisou um fator potencialmente pertinente na apreciação global da existência de um risco de confusão entre a marca cujo registo é pedido e as marcas anteriores e, desse modo, cometeu uma violação de formalidades essenciais conducente à anulação da decisão controvertida. |
30 |
Consequentemente, o Tribunal Geral julgou o primeiro fundamento invocado pela Wesergold Getränkeindustrie procedente e anulou a decisão controvertida, sem que tenha sido necessário pronunciar‑se sobre os restantes fundamentos invocados pela recorrente. |
Pedidos das partes ao Tribunal de Justiça
31 |
Com o seu recurso, o IHMI conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne:
|
32 |
A riha WeserGold Getränke conclui pedindo que seja negado provimento ao recurso e que o IHMI seja condenado nas despesas. |
33 |
A Lidl Stiftung conclui pedindo ao Tribunal de Justiça que se digne anular o acórdão recorrido e condenar a riha WeserGold Getränke nas despesas relativas ao processo em primeira instância e ao presente recurso. |
Quanto ao presente recurso
34 |
Em apoio do seu recurso, o IHMI invoca três fundamentos relativos à violação, em primeiro lugar, do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, em segundo lugar, do artigo 76.o, n.o 1, deste regulamento, conjugado com o artigo 64.o, n.o 1, do mesmo, e, em terceiro lugar, da jurisprudência constante segundo a qual um erro não pode conduzir à anulação de uma decisão quando esse erro não tenha manifestamente nenhuma influência nessa decisão. |
Argumentos das partes
35 |
Com o seu primeiro fundamento, o IHMI, apoiado pela Lidl Stiftung, censura o Tribunal de Justiça por ter interpretado de forma errada o artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, na medida em que declarou que a Câmara de Recurso devia ter analisado o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, embora tenha constatado que as marcas em causa eram globalmente diferentes. Ora, a semelhança de sinais é uma condição indispensável à existência de um risco de confusão, na aceção do referido artigo 8.o, n.o 1, alínea b). Logo, segundo o IHMI, se os sinais em conflito são globalmente diferentes, não é necessário proceder à análise do potencial caráter distintivo acrescido pela utilização intensa da marca em que a oposição se baseia. Referindo‑se, nomeadamente, ao acórdão de 12 de outubro de 2004, Vedial/IHMI (C-106/03 P, Colet., p. I-9573, n.o 51), o IHMI alega que tal interpretação é, aliás, conforme com jurisprudência constante. |
36 |
A Lidl Stiftung, baseando‑se no despacho de 14 de março de 2011, Ravensburger/IHMI (C‑370/10 P, n.o 50) acrescenta que, aquando do exame do risco de confusão, cada critério deve ser inicialmente apreciado em si mesmo, independentemente da existência ou do grau de intensidade das restantes condições, e que o caráter distintivo acrescido da marca anterior não é susceptível de compensar a inexistência de semelhança entre as marcas em conflito. |
37 |
Por conseguinte, o IHMI e a Lidl Stiftung consideram que foi sem razão que o Tribunal Geral anulou a decisão controvertida por a Câmara de Recurso não ter examinado o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, na medida em que não se verificava nenhuma condição sine qua non da existência de um risco de confusão, na aceção do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009. |
38 |
A riha WeserGold Getränke considera que o primeiro fundamento do recurso não procede na medida em que a apreciação do Tribunal Geral a respeito da inexistência de semelhança entre as marcas em questão constituiu uma conclusão intercalar que devia ainda ter sido verificada quanto ao caráter distintivo das marcas anteriores. Em sua opinião, a semelhança concetual das marcas não pode ser apreciada independentemente da questão do seu caráter distintivo. Com efeito, a ideia que o público forma de uma marca varia consoante determinados elementos da marca estejam mais presentes no espírito do público em função do conceito para o qual remetem ou da notoriedade que adquiriram enquanto marca. |
39 |
A riha WeserGold Getränke considera ainda que nenhuma jurisprudência assente pode sustentar a tese defendida pelo IHMI. |
Apreciação do Tribunal de Justiça
40 |
Através do seu primeiro fundamento, o IHMI censura, no essencial, o Tribunal Geral por ter anulado a decisão controvertida pelo facto de a Câmara de Recurso não ter examinado o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, não obstante ter previamente constatado que as marcas em conflito eram diferentes. |
41 |
Resulta de jurisprudência constante que, para efeitos da aplicação do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, o risco de confusão pressupõe uma identidade ou semelhança entre a marca cujo registo é pedido e a marca anterior e uma identidade ou semelhança entre os produtos ou serviços designados no pedido de registo e os produtos ou serviços para os quais a marca anterior foi registada, tratando‑se de condições cumulativas (acórdãos Vedial/IHMI, já referido, n.o 51, e de 13 de setembro de 2007, Il Ponte Finanziaria/IHMI, C-234/06 P, Colet., p. I-7333, n.o 48). |
42 |
Contrariamente ao invocado pela riha WeserGold Getränke, a jurisprudência do Tribunal de Justiça a este respeito encontra‑se bem assente. Com efeito, esta última sublinhou por diversas vezes que não havendo semelhança entre a marca anterior e a marca pedida, o caráter distintivo acrescido da marca anterior, a identidade ou a semelhança dos produtos ou dos serviços em causa não são suficientes para declarar o risco de confusão entre as marcas em conflito (v., neste sentido, acórdão de 2 de setembro de 2010, Calvin Klein Trademark Trust/IHMI, C-254/09 P, Colet., p. I-7989, n.o 53 e jurisprudência referida). |
43 |
Por outro lado, no despacho de 4 de março de 2010, Kaul/IHMI (C‑193/09 P), o Tribunal de Justiça rejeitou, por ser manifestamente improcedente, o fundamento relativo ao erro de direito alegadamente cometido pelo Tribunal Geral ao julgar que uma oposição nos termos do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, pode, em determinados casos, ser rejeitada através de um simples exame da semelhança entre as marcas em presença, e assim, nomeadamente, sem exame do caráter distintivo eventualmente elevado da marca anterior. No n.o 45 do referido despacho, o Tribunal de Justiça, no essencial, entendeu que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito quando declarou que, uma vez que a Câmara de Recurso do IHMI chegou à conclusão de que as marcas em presença não podiam, de modo nenhum, ser consideradas semelhantes pelo público pertinente, a Câmara de Recurso podia, legitimamente, deduzir que estava afastado qualquer risco de confusão, sem que fosse necessário analisar previamente o eventual caráter distintivo elevado da marca anterior no âmbito de uma apreciação global do risco de confusão. |
44 |
A semelhança das marcas em questão é, consequentemente, um requisito necessário para apreciar a existência de um risco de confusão, na aceção do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009. Por conseguinte, a inexistência de semelhança entre as marcas em conflito torna este artigo 8.o inaplicável. |
45 |
O caráter distintivo acrescido pela utilização de uma marca é assim um elemento que deve ser tomado em consideração para apreciar se a semelhança entre os sinais ou entre os produtos e os serviços é suficiente para dar lugar a um risco de confusão (v., neste sentido, acórdão de 29 de setembro de 1998, Canon, C-39/97, Colet., p. I-5507, n.o 24). |
46 |
Ora, no presente caso, o raciocínio seguido pelo Tribunal Geral decorre de uma interpretação incorreta do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009. |
47 |
Com efeito, embora, no n.o 58 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral tenha considerado que os sinais em conflito eram globalmente diferentes, não obstante as suas semelhanças nos planos visual e fonético, entendeu daí retirar, quanto à legalidade da decisão controvertida, as consequências jurídicas da inexistência de um exame do caráter distintivo das marcas anteriores por parte da Câmara de Recurso. O Tribunal Geral sublinhou assim, nos n.os 70 a 72 do mencionado acórdão, que essa Câmara devia ter examinado o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, em conformidade com o disposto no artigo 64.o, n.o 1, do Regulamento n.o 207/2009, exame que esta não efetuou. Em consequência, o Tribunal Geral entendeu, no n.o 82 do referido acórdão, que deste erro decorre que a Câmara de Recurso não examinou um fator potencialmente pertinente na apreciação global da existência de risco de confusão e, no n.o 83 do mesmo acórdão, que um erro desta natureza constitui uma violação das formalidades essenciais conducente à anulação da decisão controvertida. |
48 |
Deste modo, ao concluir que havia que declarar a nulidade da decisão controvertida por a Câmara de Recurso não ter procedido à análise do caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, o Tribunal Geral exigiu da Câmara de Recurso o exame de um elemento que não era pertinente para apreciar a existência de um risco de confusão entre as marcas em conflito, na aceção do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009. Com efeito, tendo constatado, previamente, que as marcas em questão eram globalmente distintas, estava afastado todo e qualquer risco de confusão, e a eventual existência de um caráter distintivo acrescido pela utilização de marcas anteriores não podia compensar a inexistência de semelhança entre as referidas marcas. |
49 |
Nestas condições, o IHMI tem razão quando afirma que o acórdão recorrido enferma de um erro de direito quanto à interpretação do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009. |
50 |
Resulta do exposto que, sem que seja necessário examinar os outros dois fundamentos do recurso, há que anular o acórdão recorrido, na medida em que o Tribunal Geral considerou que a Câmara de Recurso devia ter examinado o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores e anulou a decisão controvertida por este motivo, muito embora tivesse previamente constatado que as marcas em conflito não eram semelhantes. |
Quanto ao pedido de substituição de fundamentos
Argumentos das partes
51 |
Sem requerer expressamente uma substituição dos fundamentos do acórdão recorrido, e sublinhando que este não lhe é lesivo, a riha WeserGold Getränke contesta determinados aspetos do referido acórdão. |
52 |
Em primeiro lugar, no que respeita à semelhança entre os produtos, a riha WeserGold Getränke critica o Tribunal Geral por ter rejeitado, no n.o 35 do acórdão recorrido, elementos de prova complementares que apresentou no Tribunal Geral com vista a fazer prova de que numerosos produtores de bebidas espirituosas produzem bebidas não alcoólicas e de que numerosos produtores de sumos produzem bebidas alcoólicas. O Tribunal Geral ignorou ainda que as misturas de bebidas espirituosas com outros produtos são consideradas bebidas espirituosas nos termos do artigo 2.o do Regulamento (CE) n.o 110/2008, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de janeiro de 2008, relativo à definição, designação, apresentação, rotulagem e protecção das indicações geográficas das bebidas espirituosas e que revoga o Regulamento (CEE) n.o 1576/89 do Conselho (JO L 39, p. 16), pelo que estas bebidas deviam ter sido comparadas com as bebidas não alcoólicas abrangidas pelas marcas anteriores. |
53 |
Em segundo lugar, no que respeita à semelhança concetual das marcas em conflito, a riha WeserGold Getränke acusa o Tribunal Geral de não ter fundamentado de forma suficiente a conclusão segundo a qual as diferenças concetuais entre estas marcas neutralizam as semelhanças fonéticas e visuais das mesmas. |
54 |
Em terceiro lugar, a riha WeserGold Getränke critica o Tribunal Geral por este ter examinado apenas uma das marcas anteriores e por não ter apreciado as outras marcas por si invocadas em apoio da sua oposição. |
Apreciação do Tribunal de Justiça
55 |
Importa recordar que, de acordo com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, para que um pedido de substituição de fundamentos seja admissível, é necessária a existência de interesse em agir, no sentido de que deve ser suscetível, pelo seu resultado, de proporcionar um benefício à parte que o apresenta. Pode ser o caso quando o pedido de substituição de fundamentos constitui uma defesa contra um fundamento apresentado pela parte recorrente (acórdão de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, n.o 42 e jurisprudência referida.) |
56 |
Quanto ao primeiro pedido, respeitante aos fundamentos relativos à semelhança dos produtos abrangidos pelas marcas em conflito, importa sublinhar que este não constitui um meio de defesa contra o fundamento invocado pelo IHMI, na medida em que respeita à apreciação que o Tribunal Geral faz do dever que incumbe à Câmara de Recurso de examinar o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores. Um pedido desta natureza não é, deste modo, suscetível de pôr em causa a anulação do acórdão recorrido. Por conseguinte, a riha WeserGold Getränke não tem nenhum interesse na apresentação do referido pedido, que é assim inadmissível. |
57 |
Quanto ao segundo pedido, respeitante aos fundamentos relativos à semelhança concetual das marcas em conflito, há igualmente que constatar que este não constitui um meio de defesa contra o fundamento invocado pelo IHMI, na medida em que visa contestar a apreciação que o Tribunal Geral fez do dever que incumbe à Câmara de Recurso de examinar o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores. Um pedido desta natureza também não é, deste modo, suscetível de pôr em causa a anulação do acórdão recorrido. Por conseguinte, a riha WeserGold Getränke não tem nenhum interesse na apresentação deste pedido, que é assim inadmissível. |
58 |
Quanto ao terceiro pedido, ainda que se admita que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito por só ter examinado uma das marcas anteriores, a qual não foi, de resto, mencionada pela riha WeserGold Getränke, este pedido não é suscetível de neutralizar a anulação do acórdão recorrido, na medida em que o erro de direito cometido pelo Tribunal Geral diz respeito, seja como for, à marca anterior, a qual, segundo a riha WeserGold Getränke, foi objeto de apreciação pelo Tribunal Geral. Tal pedido de substituição de fundamentos não constitui, portanto, um meio de defesa contra os fundamentos invocados pelo IHMI nem confere um benefício suscetível de justificar um interesse de agir. O referido pedido é, por conseguinte, inadmissível. |
59 |
Por conseguinte, há que julgar o pedido de substituição de fundamentos apresentado pela riha WeserGold Getränke inadmissível. |
Quanto à remissão do processo ao Tribunal Geral
60 |
Nos termos do artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, quando o recurso for julgado procedente, o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal Geral. Pode, neste caso, decidir definitivamente o litígio, se estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo ao Tribunal Geral, para julgamento. |
61 |
Na medida em que o Tribunal Geral analisou apenas o primeiro dos quatro fundamentos de recurso invocados pela riha WeserGold Getränke, o Tribunal de Justiça considera que o presente litígio não está em condições de ser julgado. Por conseguinte, há que remeter o processo ao Tribunal Geral. |
Quanto às despesas
62 |
Uma vez que há que remeter o processo ao Tribunal Geral, reserva‑se para final a decisão quanto às despesas do presente recurso. |
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sexta Secção) decide: |
|
|
|
Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: alemão.