ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

10 de abril de 2014 ( *1 )

«Agricultura — Política agrícola comum — Regimes de apoio direto — Regulamento (CE) n.o 73/2009 — Sistema integrado de gestão e de controlo relativo a determinados regimes de ajudas — Sistema de identificação das parcelas agrícolas — Condições de elegibilidade para a ajuda — Controlos administrativos — Controlos in loco — Regulamento (CE) n.o 796/2004 — Determinação das superfícies elegíveis para a ajuda — Teledeteção — Inspeção física das parcelas agrícolas»

No processo C‑485/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo College van Beroep voor het bedrijfsleven (Países Baixos), por decisão de 24 de outubro de 2012, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 31 de outubro de 2012, no processo

Maatschap T. van Oosterom en A. van Oosterom‑Boelhouwer

contra

Staatssecretaris van Economische Zaken, Landbouw en Innovatie,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: A. Tizzano, presidente de secção, A. Borg Barthet (relator), E. Levits, S. Rodin e F. Biltgen, juízes,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação do Governo neerlandês, por M. Bulterman e M. de Ree, na qualidade de agentes,

em representação do Governo alemão, por T. Henze e J. Möller, na qualidade de agentes,

em representação do Governo helénico, por I.‑K. Chalkias e A.‑E. Vasilopoulou, na qualidade de agentes,

em representação do Governo espanhol, por N. Díaz Abad, na qualidade de agente,

em representação do Governo polaco, por B. Majczyna e M. Szpunar, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por B. Schima e B. Burggraaf, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 32.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.o 796/2004 da Comissão, de 21 de abril de 2004, que estabelece regras de execução relativas à condicionalidade, à modulação e ao sistema integrado de gestão e de controlo previstos no Regulamento (CE) n.o 1782/2003 do Conselho, de 29 de setembro de 2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio direto no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores (JO L 141, p. 18), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 972/2007 da Comissão, de 20 de agosto de 2007 (JO L 216, p. 3, a seguir «Regulamento n.o 796/2004»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Maatschap T. van Oosterom en A. van Oosterom‑Boelhouwer (a seguir «Maatschap») ao Staatssecretaris van Economische Zaken, Landbouw en Innovatie (Secretário de Estado para os Assuntos Económicos, a Agricultura e a Inovação, a seguir, «Staatssecretaris»), a propósito das condições de determinação da superfície elegível para a ajuda concedida a título do regime de pagamento único relativo ao ano de 2009.

Quadro jurídico

Regulamento (CE) n.o 73/2009

3

Nos termos do artigo 14.o, primeiro parágrafo, do Regulamento (CE) n.o 73/2009 do Conselho, de 19 de janeiro de 2009, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio direto aos agricultores no âmbito da Política Agrícola Comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores, que altera os Regulamentos (CE) n.o 1290/2005 (CE) n.o 247/2006 e (CE) n.o 378/2007 e revoga o Regulamento (CE) n.o 1782/2003 (JO L 30, p. 16):

«Cada Estado‑Membro cria e mantém um sistema integrado de gestão e de controlo (a seguir designado por ‘sistema integrado’).»

4

Em conformidade com o artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 73/2009:

«O sistema integrado inclui os seguintes elementos:

a)

Uma base de dados informatizada;

b)

Um sistema de identificação das parcelas agrícolas;

c)

Um sistema de identificação e registo dos direitos ao pagamento;

d)

Os pedidos de ajuda;

e)

Um sistema integrado de controlo;

f)

Um sistema único de registo da identidade dos agricultores que apresentam um pedido de ajuda.»

5

Segundo o artigo 17.o do referido regulamento:

«O sistema de identificação das parcelas agrícolas é estabelecido com base em mapas, documentos cadastrais ou outras referências cartográficas. Devem ser utilizadas técnicas empregadas nos sistemas informatizados de informação geográfica, incluindo de preferência ortoimagens aéreas ou espaciais, com um padrão homogéneo que garanta um rigor pelo menos equivalente ao da cartografia à escala de 1:10 000.»

6

O artigo 20.o do mesmo regulamento prevê:

«1.   Os Estados‑Membros procedem a controlos administrativos dos pedidos de ajuda, a fim de verificar as condições de elegibilidade para a ajuda.

2.   Os controlos administrativos são completados por um sistema de controlos in loco, para verificação da elegibilidade para a ajuda. Para o efeito, os Estados‑Membros estabelecem um plano de amostragem das explorações agrícolas.

Os Estados‑Membros podem recorrer a técnicas de teledeteção e ao sistema mundial de navegação por satélite (GNSS) para a realização dos controlos in loco das parcelas agrícolas.

[...]»

7

O artigo 29.o, n.o 3, do Regulamento n.o 73/2009 dispõe:

«Os pagamentos ao abrigo de regimes de apoio enumerados no Anexo I não são efetuados antes da conclusão da verificação das condições de elegibilidade, a realizar pelo Estado‑Membro nos termos do artigo 20.o»

8

Nos termos do artigo 146.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 73/2009:

«As remissões efetuadas noutros atos para o Regulamento (CE) n.o 1782/2003 devem entender‑se como sendo feitas para o presente regulamento e devem ler‑se nos termos do quadro de correspondência constante do Anexo XVIII.»

Regulamento n.o 796/2004

9

O Regulamento n.o 796/2004, embora revogado, com efeitos em 1 de janeiro de 2010, pelo Regulamento (CE) n.o 1122/2009 da Comissão, de 30 de novembro de 2009, que estabelece regras de execução do Regulamento (CE) n.o 73/2009 do Conselho no que respeita à condicionalidade, à modulação e ao sistema integrado de gestão e de controlo, no âmbito dos regimes de apoio direto aos agricultores previstos no referido regulamento, bem como regras de execução do Regulamento (CE) n.o 1234/2007 do Conselho no que respeita à condicionalidade no âmbito do regime de apoio previsto para o setor vitivinícola (JO L 316, p. 65), continua, contudo, aplicável aos factos do litígio no processo principal. Os considerandos 11, 36 e 40 enunciavam:

«(11)

A fim de contribuir para a defesa dos interesses financeiros da Comunidade, é conveniente prever que os pagamentos ao abrigo do [Regulamento n.o 73/2009] só possam ser feitos uma vez concluídos os controlos relativos aos critérios de elegibilidade.

[...]

(36)

Em regra, os controlos de superfície in loco consistem em duas partes, estando a primeira relacionada com verificação e medições de parcelas agrícolas declaradas com base em materiais gráficos, fotografias aéreas, etc.. A segunda parte consiste numa inspeção física das parcelas, a fim de verificar a dimensão real das parcelas agrícolas declaradas, bem como, em função do regime de ajudas em causa, a cultura declarada e a sua qualidade. Quando necessário, deve proceder‑se a medições. A inspeção física no campo pode ser realizada por amostragem.

[...]

(40)

Devem estabelecer‑se os termos de utilização da teledeteção para a realização de controlos in loco, devendo igualmente ser previstas disposições para os controlos físicos a realizar nos casos em que a fotointerpretação não conduza a resultados nítidos.»

10

Nos termos do artigo 2.o, pontos 22 e 26, do Regulamento n.o 796/2004, entende‑se por:

«22)

‘Superfície determinada’: a superfície relativamente à qual tenham sido respeitados todos os requisitos regulamentares para a concessão da ajuda; no caso do regime de pagamento único, a superfície declarada só pode ser considerada determinada se estiver efetivamente ligada a um número correspondente de direitos ao pagamento;

[...]

26)

‘Parcela de referência’: uma superfície geograficamente delimitada a que corresponde uma identificação única registada no SIG do sistema de identificação do Estado‑Membro referido no artigo [15.° do Regulamento n.o 73/2009];»

11

O artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento n.o 796/2004 dispunha:

«Os controlos administrativos e in loco previstos no presente regulamento serão efetuados de modo a assegurar a verificação eficaz do cumprimento dos requisitos de concessão das ajudas e dos requisitos e normas aplicáveis no âmbito da condicionalidade.»

12

O artigo 24.o do referido regulamento previa:

«1.   Os controlos administrativos previstos no [artigo 20.o do Regulamento n.o 73/2009] devem permitir a deteção de irregularidades, nomeadamente a deteção automática através de meios informáticos, incluindo controlos cruzados:

[...]

c)

Das parcelas agrícolas declaradas no pedido único e das parcelas de referência constantes do sistema de identificação das parcelas agrícolas, para verificar que as superfícies em si são elegíveis, a título da ajuda;

[...]

2.   A indicação de irregularidades resultantes de controlos cruzados será seguida dos procedimentos administrativos adequados e, se for caso disso, de controlos in loco.

[...]»

13

O artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento n.o 796/2004 dispunha:

«O número total de controlos in loco abrangerá, anualmente, pelo menos 5% dos agricultores que apresentem pedidos no âmbito do regime de pagamento único ou do regime de pagamento único por superfície.

[...]»

14

Nos termos do artigo 27.o, n.os 1 e 3, do Regulamento n.o 796/2004:

«1.   As amostras de controlo para os controlos in loco em conformidade com o presente regulamento são selecionadas pela autoridade competente com base numa análise de risco e de modo a serem representativas dos pedidos de ajuda apresentados. […]

[…]

3.   A autoridade competente conservará registos das razões da seleção de cada agricultor para um controlo in loco. O inspetor que realize um controlo in loco será informado dessas razões antes do início do controlo in loco

15

O artigo 29.o do Regulamento n.o 796/2004, intitulado «Elementos dos controlos in loco», previa no segundo parágrafo:

«Os Estados‑Membros podem utilizar a teledeteção e as técnicas utilizadas nos sistemas globais de navegação por satélite.»

16

Nos termos do artigo 32.o, n.o 1, desse regulamento:

«Os Estados‑Membros que recorram à possibilidade, prevista no n.o 2 do artigo 29.o, de efetuar controlos in loco por teledeteção devem:

a)

Proceder à fotointerpretação de imagens obtidas por satélite ou de fotografias aéreas de todas as parcelas agrícolas do pedido a controlar, com vista a reconhecer o coberto vegetal e medir a superfície;

b)

Efetuar controlos físicos in loco de todas as parcelas agrícolas relativamente às quais a fotointerpretação não dê à autoridade competente garantias suficientes quanto à exatidão da declaração em causa.»

Litígio no processo principal e questão prejudicial

17

Em 13 de maio de 2009, a Maatschap, uma exploração agrícola, pediu o pagamento dos seus direitos e, para esse efeito, declarou catorze parcelas com uma área total de 30,72 hectares.

18

Por decisão de 28 de dezembro de 2009, o Staatssecretaris considerou a área de 30,72 hectares declarada como «superfície determinada» na aceção do artigo 2.o, ponto 22, do Regulamento n.o 796/2004, e fixou em 11888,12 euros o montante dos direitos a pagar, a título de pagamento antecipado, para o ano de 2009.

19

Na mesma decisão, foi precisado que, na sequência de observações formuladas pela Comissão Europeia, o registo das parcelas estava a ser atualizado e que os dados relativos às parcelas pertencentes à Maatschap, em especial as que continham elementos da paisagem tais como sebes vivas, canais ou caminhos, eram suscetíveis de serem alterados.

20

O pedido de pagamento único apresentado pela Maatschap para o ano de 2009 foi objeto de uma nova avaliação. Por conseguinte, o Staatssecretaris reavaliou a área total das parcelas em causa em 27,84 hectares e, por decisão de 30 de junho de 2010, o montante do pagamento único concedido à Maatschap, para o ano de 2009, foi fixado em 8643,02 euros (a seguir «decisão de 30 de junho de 2010»). Esta decisão precisava que a Maatschap não era, todavia, obrigada a devolver a diferença entre este montante e o adiantamento que já tinha recebido.

21

A Maatschap contestou a referida decisão. Alegou, nomeadamente, que foi atribuída demasiada importância ao espaço ao longo dos canais e que, na medida em que não foram corretamente tidas em conta as sombras nas fotografias aéreas, o tamanho das árvores foi sobrevalorizado. Contestou igualmente a criação de «miniparcelas» na sequência da exclusão dos caminhos. Criticou a falta de precisão das fotografias aéreas em que o Staatssecretaris se baseou e reclamou uma medição física in loco das parcelas.

22

Por decisão de 27 de janeiro de 2011, após ter novamente examinado todos os elementos, o Staatssecretaris determinou a superfície elegível para a ajuda em 28,14 hectares.

23

Por correio de 4 de março de 2011, a Maatschap interpôs um recurso dessa decisão. No College van Beroep voor het bedrijfsleven, alega que a área das suas parcelas não foi determinada de forma correta. Baseia‑se, nomeadamente, num relatório de medição elaborado, com o auxílio de um sistema mundial de navegação por satélite, por uma sociedade privada e do qual resulta que a área das parcelas que declarou no seu pedido é de 28,75 hectares.

24

Segundo o Staatssecretaris, as áreas declaradas pela Maatschap no seu pedido de ajuda foram comparadas com a versão atualizada do sistema de identificação das parcelas agrícolas.

25

Em contrapartida, o órgão jurisdicional de reenvio considera que o pedido de ajuda apresentado pela Maatschap foi diretamente comparado com as fotografias aéreas realizadas depois de apresentação do pedido. Além disso, estas mesmas fotografias foram utilizadas para a determinação da cartografia do sistema de identificação das parcelas que é atualizado anualmente. Contudo, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a decisão de 30 de junho de 2010 foi adotada apenas com base nas fotografias e dados de medição delas resultantes.

26

Neste contexto, o referido órgão jurisdicional considera que o artigo 32.o do Regulamento n.o 796/2004, que é expressamente aplicável quando a autoridade competente procede à interpretação de fotografias aéreas no âmbito de uma verificação in loco, também deve ser aplicável quando, como no litígio no processo principal, esta interpretação for realizada no âmbito de um controlo administrativo.

27

Ora, este mesmo órgão jurisdicional considera que, ao contrário de outras versões linguísticas, a versão neerlandesa do artigo 32.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 796/2004 deve ser interpretada no sentido de que um controlo físico in loco é necessário sempre que, com base nas fotografias aéreas, não se possa comprovar se a declaração do agricultor em causa é exata.

28

Nestas condições, o College van Beroep voor het bedrijfsleven decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve o artigo 32.o do Regulamento (CE) n.o 796/2004 ser interpretado no sentido de que é obrigatório proceder a um controlo físico in loco para se poder concluir, com base em fotografia aérea efetuada no contexto da apreciação de uma declaração apresentada por um agricultor, que a sua declaração não é exata?»

Quanto à questão prejudicial

Quanto à admissibilidade

29

O Governo neerlandês sustenta que o pedido de decisão prejudicial não é admissível, uma vez que não é pertinente para a resolução do litígio no processo principal e que apresenta um caráter hipotético. Este governo alega que o artigo 32.o do Regulamento n.o 796/2004 diz respeito aos controlos in loco. Por conseguinte, dado que, no litígio no processo principal, o pedido de ajuda apresentado pela Maatschap para o ano de 2009 não foi deferido para um controlo in loco e que nenhum controlo in loco foi realizado junto desta sociedade, a referida disposição não é aplicável.

30

O Governo neerlandês acrescenta que, contrariamente ao que indica o órgão jurisdicional de reenvio, o pedido apresentado pela Maatschap, a título do pagamento único para o ano de 2009, não foi comparado com as fotografias aéreas, mas com o registo das parcelas, em conformidade com o previsto no artigo 24.o do Regulamento n.o 796/2004.

31

Segundo jurisprudência constante, as questões relativas à interpretação do direito da União submetidas pelo órgão jurisdicional nacional no âmbito regulamentar e factual que define sob a sua responsabilidade, e cuja exatidão não cabe ao Tribunal de Justiça verificar, gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar‑se a pronunciar‑se sobre um pedido prejudicial apresentado por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for de natureza hipotética ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (v. acórdão Odar, C‑152/11, EU:C:2012:772, n.o 24 e jurisprudência aí referida).

32

A referida presunção de pertinência não pode ser ilidida pelo simples facto de uma das partes no processo principal contestar determinados factos cuja exatidão não compete ao Tribunal de Justiça verificar e de que depende a definição do objeto do referido litígio (acórdão Amurta, C‑379/05, EU:C:2007:655, n.o 65 e jurisprudência aí referida).

33

Ora, a questão de saber se o pedido de ajuda apresentado pela Maatschap para o ano de 2009 foi diretamente comparado com as fotografias aéreas ou com o registo das parcelas constitui precisamente uma questão que faz parte do quadro factual que não cabe ao Tribunal de Justiça verificar.

34

Além disso, o simples facto de, segundo o Governo neerlandês, as parcelas da Maatschap não terem sido selecionadas pelas autoridades competentes para serem objeto de um controlo in loco não é suscetível de demonstrar de forma manifesta que o pedido de decisão prejudicial é hipotético ou que não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio.

35

Com efeito, o órgão jurisdicional de reenvio solicita a interpretação do artigo 32.o do Regulamento n.o 796/2004 em circunstâncias como as do litígio nele pendente, a saber, quando o pedido de um agricultor foi diretamente comparado com as fotografias aéreas realizadas depois da apresentação do pedido. Com efeito, este considera que a norma prevista no artigo 32.o do Regulamento n.o 796/2004, que é expressamente aplicável quando a autoridade competente procede à interpretação de fotografias aéreas no âmbito de uma verificação in loco, também deve ser aplicável quando esta interpretação for realizada no âmbito de um controlo qualificado de «administrativo» pelas autoridades competentes.

36

Por conseguinte, a argumentação do Governo neerlandês, segundo a qual, no âmbito do litígio principal, o Staatsecretaris procedeu exclusivamente a um controlo administrativo na aceção do artigo 24.o do Regulamento n.o 796/2004, não é suscetível de tornar o pedido de decisão prejudicial inadmissível.

37

Consequentemente, o pedido de decisão prejudicial deve ser declarado admissível.

Quanto ao mérito

38

Com a sua questão, o órgão jurisdicional pergunta, em substância, se o Regulamento n.o 796/2004 deve ser interpretado no sentido de que, quando, no contexto de uma atualização do sistema de identificação das parcelas agrícolas, a autoridade nacional competente verifica a elegibilidade para a ajuda das parcelas declaradas no pedido de pagamento único de um agricultor com base em imagens aéreas realizadas depois da apresentação do pedido, a referida autoridade é obrigada, em conformidade com o previsto no artigo 32.o, n.o 1, do referido regulamento, a proceder a uma inspeção física in loco quando considera que a declaração efetuada por este agricultor é inexata.

39

A título preliminar, há que recordar que, em conformidade com o previsto no artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento n.o 73/2009, os Estados‑Membros procedem a controlos administrativos dos pedidos de ajuda apresentados pelos agricultores, a fim de verificar as condições de elegibilidade para a ajuda.

40

Como resulta do artigo 24.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 796/2004, os controlos administrativos devem permitir a deteção de irregularidades e, nomeadamente, verificar a elegibilidade para a ajuda das superfícies declaradas.

41

Para o efeito, os Estados‑Membros, como resulta dos artigos 14.° e 15.° do Regulamento n.o 73/2009, são obrigados, nomeadamente, a instituir um sistema de identificação das parcelas que permita comparar as parcelas declaradas no pedido de ajuda apresentado pelo agricultor com as parcelas de referência reproduzidas nesse sistema.

42

Por outro lado, o artigo 20.o, n.o 2, do Regulamento n.o 73/2009 dispõe que os referidos controlos administrativos são completados por um sistema de controlos in loco.

43

Segundo o artigo 27.o do Regulamento n.o 796/2004, os controlos in loco são realizados a partir de uma amostra de controlo selecionada pela autoridade competente em função de uma análise de riscos e da representatividade dos pedidos de ajuda apresentados. O artigo 24.o, n.o 2, desse regulamento prevê, além disso, que um controlo in loco pode ser efetuado quando o controlo administrativo revelar irregularidades.

44

Por outro lado, em conformidade com o artigo 29.o, do Regulamento n.o 796/2004, os Estados‑Membros, para realizar os controlos in loco, têm a possibilidade de optar pela teledeteção. O artigo 32.o, n.o 1, alínea a), desse regulamento precisa que a teledeteção é efetuada mediante fotointerpretação de imagens obtidas por satélite ou de fotografias aéreas, ao passo que o referido número, alínea b), prevê um controlo físico in loco das parcelas agrícolas relativamente às quais a fotointerpretação não dê à autoridade competente garantias suficientes quanto à exatidão da declaração do agricultor.

45

Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio considera que o artigo 32.o, n.o 1, do Regulamento n.o 796/2004 é aplicável ao litígio nele pendente na medida em que o Staatsecretaris comparou as parcelas agrícolas declaradas pela Maatschap no seu pedido com as fotografias aéreas realizadas depois da apresentação deste pedido.

46

A este respeito, há que recordar que resulta, inequivocamente, da redação do artigo 32.o do Regulamento n.o 796/2004 e da economia desse regulamento que este artigo é aplicável aos controlos in loco.

47

Ora, no litígio no processo principal, não se afigura, sem prejuízo de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, que o pedido da Maatschap foi objeto desse controlo.

48

Com efeito, não resulta da decisão de reenvio que as parcelas da Maatschap tenham sido selecionadas, com base numa análise de riscos, para serem objeto de um controlo in loco, nos termos do artigo 27.o do Regulamento n.o 796/2004, nem que a autoridade competente tenha considerado adequado, nos termos do artigo 24.o, n.o 2, desse regulamento, realizar esse controlo na sequência de irregularidades que tenham sido reveladas através de controlos cruzados.

49

Assim, não se pode considerar, a priori, que o Staatsecretaris atuou no âmbito do artigo 32.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 796/2004.

50

Esta apreciação não é posta em causa pela circunstância de o controlo, que conduziu à adoção da decisão de 30 de junho de 2007, ter sido realizado a partir de fotografias aéreas tiradas, depois da apresentação do pedido de ajuda, para a atualização do sistema de identificação das parcelas agrícolas.

51

Com efeito, por um lado, resulta do artigo 17.o do Regulamento n.o 73/2009, nos termos do qual o sistema de identificação das parcelas agrícolas inclui, de preferência, uma cobertura por ortoimagens aéreas ou espaciais, que a fotointerpretação de imagens obtidas por satélite ou de fotografias aéreas pode também servir para determinar a superfície elegível para uma ajuda no âmbito de controlos administrativos.

52

Por outro lado, o facto de o Staatsecretaris ter controlado as parcelas declaradas pela Maatschap a partir de fotografias aéreas realizadas depois da apresentação do seu pedido de ajuda e não com base no sistema de identificação das parcelas, não exclui que, nas circunstâncias do litígio no processo principal, o controlo assim efetuado possa ser qualificado de «administrativo».

53

É certo que o artigo 24.o do Regulamento n.o 796/2004 prevê que a deteção de irregularidades intervém, em especial, de forma automática através de meios informáticos. O n.o 1, alínea c), deste artigo precisa, a este respeito, que os controlos administrativos incluem os controlos cruzados efetuados entre as parcelas agrícolas declaradas no pedido único e as parcelas de referência constantes do sistema de identificação das parcelas agrícolas, para verificar a elegibilidade para a ajuda das superfícies enquanto tais.

54

Dada a complexidade do sistema integrado e tendo em conta o facto de que os controlos administrativos, contrariamente aos controlos in loco que podem ser realizados por amostragem, devem abranger a totalidade dos pedidos de ajuda, é, com efeito, indispensável utilizar meios técnicos e métodos de controlo adequados a fim de poder responder eficazmente ao número elevado de pedidos.

55

Contudo, nenhuma disposição dos Regulamentos n.o 73/2009 e n.o 794/2004 obsta a que os controlos administrativos destinados a verificar a elegibilidade para a ajuda das superfícies declaradas por um agricultor no seu pedido sejam parcialmente realizados de forma não automática e com base em imagens aéreas que não fazem parte integrante do sistema de identificação das parcelas agrícolas, sem prejuízo de esses controlos permitirem, em conformidade com o artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento n.o 796/2004, assegurar uma verificação eficaz da observância dos requisitos de concessão das ajudas, bem como dos requisitos e das normas aplicáveis no âmbito da condicionalidade.

56

Uma situação desse género poderá, nomeadamente, verificar‑se quando, como no litígio no processo principal, os controlos administrativos destinados a verificar a elegibilidade para a ajuda das parcelas declaradas por um agricultor não possam ser inteiramente efetuados com base no sistema de identificação das parcelas agrícolas devido à atualização simultânea deste último.

57

O sistema de identificação das parcelas agrícolas permite identificar todas as parcelas e situá‑las geograficamente a fim, nomeadamente, de permitir à autoridade competente controlar o preenchimento das condições de elegibilidade para a ajuda das referidas parcelas. Por conseguinte, para que os controlos automáticos possam ser efetuados com base nesse sistema, é indispensável que os dados relativos às parcelas em causa sejam exatos.

58

Se tal não acontecer, cabe à autoridade competente tomar as medidas necessárias para garantir, em conformidade com o artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento n.o 796/2004, uma verificação eficaz da observância dos requisitos de concessão das ajudas, incluindo, se necessário, o exame das parcelas declaradas pelo agricultor comparando‑as com imagens aéreas recentes que não fazem parte integrante do sistema de identificação das parcelas agrícolas.

59

O artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento n.o 796/2004, prevê que a constatação de inexatidões na declaração do agricultor deve ser seguida dos procedimentos administrativos adequados e, se for caso disso, de um controlo in loco. Em conformidade com o objetivo referido no artigo 23.o, n.o 1, do Regulamento n.o 796/2004, o mesmo deve suceder quando as irregularidades forem reveladas na sequência de uma comparação efetuada entre as parcelas agrícolas declaradas no pedido de pagamento único e as imagens aéreas recentes destinadas à atualização do sistema de identificação das parcelas agrícolas.

60

Como resulta da redação do artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento n.o 796/2004, incumbe, todavia, à autoridade competente apreciar as medidas a adotar em caso de irregularidade constatada.

61

Por conseguinte, quando a autoridade não tem quaisquer dúvidas quanto aos dados de medição resultantes das imagens aéreas à sua disposição, não pode, em qualquer caso, ser obrigada a proceder a uma medição in loco das parcelas em causa. Caso contrário, a margem de apreciação assim reconhecida à autoridade competente seria inoperante.

62

De resto, essa interpretação está em conformidade com a economia do Regulamento n.o 796/2004. Com efeito, o artigo 26.o do Regulamento n.o 796/2004 prevê que os Estados‑Membros devem proceder a controlos in loco por amostragem e em proporções mínimas. Ora, a possibilidade de só proceder a um número reduzido de controlos in loco, que é dada aos Estados‑Membros por motivos evidentes associados aos custos, estaria comprometida se as autoridades competentes fossem obrigadas a proceder a uma inspeção in loco sempre que seja constatada uma irregularidade.

63

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à questão submetida que o Regulamento n.o 796/2004 deve ser interpretado no sentido de que, quando os controlos cruzados automáticos destinados a verificar a elegibilidade para a ajuda das parcelas declaradas no pedido de pagamento único de um agricultor são, devido à atualização do sistema de identificação das parcelas agrícolas, completadas por uma verificação com base em imagens aéreas recentes que conduzem à constatação de inexatidões na declaração deste último, a autoridade competente não é obrigada a proceder a uma inspeção in loco, mas dispõe, em conformidade com o artigo 24.o, n.o 2, desse regulamento, de um poder de apreciação quanto às medidas a adotar em consequência. Em especial, a referida autoridade não pode ser obrigada a proceder a uma medição in loco das parcelas em causa quando não tem quaisquer dúvidas quanto aos dados de medição resultantes das imagens aéreas à sua disposição.

Quanto às despesas

64

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

O Regulamento (CE) n.o 796/2004 da Comissão, de 21 de abril de 2004, que estabelece regras de execução relativas à condicionalidade, à modulação e ao sistema integrado de gestão e de controlo previstos no Regulamento (CE) n.o 1782/2003 do Conselho, de 29 de setembro de 2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio direto no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 972/2007 da Comissão, de 20 de agosto de 2007, deve ser interpretado no sentido de que, quando os controlos cruzados automáticos destinados a verificar a elegibilidade para a ajuda das parcelas declaradas no pedido de pagamento único de um agricultor são, devido à atualização do sistema de identificação das parcelas agrícolas, completadas por uma verificação com base em imagens aéreas recentes que conduzem à constatação de inexatidões na declaração deste último, a autoridade competente não é obrigada a proceder a uma inspeção in loco, mas dispõe, em conformidade com o artigo 24.o, n.o 2, desse regulamento, de um poder de apreciação quanto às medidas a adotar em consequência. Em especial, a referida autoridade não pode ser obrigada a proceder a uma medição in loco das parcelas em causa quando não tem quaisquer dúvidas quanto aos dados de medição resultantes das imagens aéreas à sua disposição.

 

Assinaturas


( *1 )   Língua do processo: neerlandês.