ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

24 de outubro de 2013 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Desaparecimento de um fundamento jurídico da decisão em causa no processo principal — Falta de pertinência das questões submetidas — Não conhecimento do mérito»

No processo C‑180/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Administrativen sad Sofia‑grad (Bulgária), por decisão de 4 de abril de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 16 de abril de 2012, no processo

Stoilov i Ko EOOD

contra

Nachalnik na Mitnitsa Stolichna,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente de secção, C. G. Fernlund, A. Ó Caoimh (relator), C. Toader e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: M. Aleksejev, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 11 de abril de 2013,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Stoilov i Ko EOOD, por B. Aleksiev, advokat,

em representação do Nachalnik na Mitnitsa Stolichna, por N. Yotsova, D. Yordanova, Y. Yordanova, S. Dimitrova e S. Zlatkov, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por B.‑R. Killmann, D. Roussanov e L. Bouyon, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 18 de julho de 2013,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Nomenclatura Combinada para o ano de 2009, que figura no Anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (JO L 256, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1031/2008 da Comissão, de 19 de setembro de 2008 (JO L 291, p. 1, a seguir «NC»), em especial das subposições 5407 61 30 e 6303 92 10 desta, bem como a interpretação do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO L 302, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1791/2006 do Conselho, de 20 de novembro de 2006 (JO L 363, p. 1, a seguir «código aduaneiro»), dos princípios da confiança legítima e da força do caso julgado, bem como dos artigos 41.° e 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

2

Este pedido foi apresentado no quadro de um litígio que opõe a Stoilov i Ko ЕООD (a seguir «Stoilov») ao Nachalnik na Mitnitsa Stolichna (diretor das alfândegas da capital) a respeito da classificação pautal de mercadorias, designadas como «materiais para o fabrico de estores», provenientes da China.

Quadro jurídico

Direito da União

Código aduaneiro

3

Nos termos do artigo 68.o do código aduaneiro, para a conferência das declarações aceites no âmbito do procedimento dito «normal», as autoridades aduaneiras podem proceder:

«a)

A um controlo documental que incida sobre a declaração […];

b)

À verificação das mercadorias, acompanhada de uma eventual extração de amostras com vista à sua análise ou a um controlo mais aprofundado.»

4

O artigo 71.o do código aduaneiro dispõe:

«1.   Os resultados da conferência da declaração servem de base à aplicação das disposições que regem o regime aduaneiro a que as mercadorias se encontram sujeitas.

2.   Caso não se proceda à conferência da declaração, a aplicação das disposições previstas no n.o 1 efetua‑se com base nos elementos da declaração.»

5

Nos termos do artigo 221.o, n.o 1, do código aduaneiro, o «montante dos direitos deve ser comunicado ao devedor, de acordo com modalidades adequadas, logo que o respetivo registo seja efetuado».

6

O artigo 232.o, que figura na Secção 2, intitulada «Prazo e modalidades de pagamento do montante dos direitos», do título VII, capítulo 3, do código aduaneiro, enuncia:

«1.   Quando o montante de direitos não for pago no prazo fixado:

a)

As autoridades aduaneiras recorrerão a todas as possibilidades previstas nas disposições em vigor, incluindo a execução forçada, para assegurar o pagamento desse montante.

Poderão ser adotadas disposições especiais, de acordo com o procedimento do comité, no âmbito do regime de trânsito, relativamente aos fiadores;

b)

Em acréscimo do montante dos direitos serão cobrados juros de mora. A taxa dos juros de mora poderá ser superior à taxa dos juros de crédito e não poderá ser inferior a esta taxa.

2.   As autoridades aduaneiras podem renunciar à cobrança de juros de mora […]»

7

Figurando no título VIII do código aduaneiro, intitulado «Direito de recurso», o artigo 243.o tem a seguinte redação:

«1.   Todas as pessoas têm o direito de interpor recurso das decisões tomadas pelas autoridades aduaneiras ligadas à aplicação da legislação aduaneira e lhe digam direta e individualmente respeito.

[…]

2.   O direito de recurso pode ser exercido:

a)

Numa primeira fase, perante a autoridade aduaneira […]

b)

Numa segunda fase, perante uma instância independente, que pode ser uma autoridade judiciária ou um órgão especializado equivalente, nos termos das disposições em vigor nos Estados‑Membros.»

A NC

8

A primeira parte da NC refere‑se às disposições preliminares. Nessa parte, sob o título I, consagrado às regras gerais, a secção A, intitulada «Regras gerais para a interpretação da [NC]», enuncia:

«A classificação das mercadorias na [NC] rege‑se pelas seguintes regras:

1.

Os títulos das Secções, Capítulos e Subcapítulos têm apenas valor indicativo. Para os efeitos legais, a classificação é determinada pelos textos das posições e das Notas de Secção e de Capítulo e, desde que não sejam contrárias aos textos das referidas posições e Notas, pelas Regras seguintes.

2.

a)

Qualquer referência a um artigo em determinada posição abrange esse artigo mesmo incompleto ou inacabado, desde que apresente, no estado em que se encontra, as características essenciais do artigo completo ou acabado. Abrange igualmente o artigo completo ou acabado, ou como tal considerado nos termos das disposições precedentes, mesmo que se apresente desmontado ou por montar.

b)

Qualquer referência a uma matéria em determinada posição diz respeito a essa matéria, quer em estado puro, quer misturada ou associada a outras matérias. Da mesma forma, qualquer referência a obras de uma matéria determinada abrange as obras constituídas inteira ou parcialmente por essa matéria. A classificação destes produtos misturados ou artigos compostos efetua‑se conforme os princípios enunciados na Regra 3.

[…]»

9

A NC baseia‑se no Sistema Harmonizado Mundial de Designação e Codificação de Mercadorias elaborado pela Organização Mundial das Alfândegas, do qual retoma as posições e subposições com seis algarismos, e só o sétimo e o oitavo algarismos constituem subdivisões que são próprias à NC. Na sua segunda parte, intitulada «Tabela dos direitos», a NC inclui uma classificação das mercadorias por secções, capítulos, posições e subposições.

10

A secção XI intitula‑se «Matérias têxteis e suas obras». A nota 7 desta secção tem a seguinte redação:

«Na presente Secção consideram‑se ‘confecionados’:

a)

Os artefactos cortados em forma diferente da quadrada ou retangular;

b)

Os artefactos obtidos já acabados e prontos para serem usados ou podendo ser utilizados depois de separados mediante simples corte dos fios não entrelaçados, sem costura nem outro trabalho complementar, tais como alguns esfregões, toalhas de mão, toalhas de mesa, lenços de pescoço de forma quadrada e mantas;

c)

Os artefactos cujas orlas tenham sido quer embainhadas por qualquer processo, quer arrematadas por franjas com nós obtidas a partir de fios do próprio artefacto ou de fios acrescentados; todavia, não se consideram confecionadas as matérias têxteis em peça cujas orlas, desprovidas de ourelas, tenham sido simplesmente fixadas;

[…]»

11

Figurando nessa secção XI, o capítulo 54 da NC, intitulado «Filamentos sintéticos ou artificiais; lâminas e formas semelhantes de matérias têxteis sintéticas ou artificiais», inclui designadamente a posição 5407, que designa os «[t]ecidos de fios de filamentos sintéticos, incluindo os tecidos obtidos a partir dos produtos da posição 5404». Esta posição inclui designadamente a categoria de «outros tecidos, que contenham pelo menos 85%, em peso, de filamentos de poliéster» que inclui designadamente a subposição 5407 61 relativa aos «outros tecidos, que contenham pelo menos 85%, em peso, de filamentos de poliéster não texturizados». Esta subposição inclui ela própria, entre outras, a subposição 5407 61 30, cuja epígrafe é «tintos».

12

O subcapítulo I, intitulado «Outros têxteis confecionados», que figura na secção XI, capítulo 63 da NC, inclui, entre outras, a posição 6303 que designa os «[c]ortinados, cortinas, reposteiros e estores; sanefas». Esta posição divide‑se em duas categorias, «de malha» e «outros». Esta última categoria inclui nomeadamente a subposição 6303 92 denominada «de fibra sintética». Esta subposição divide‑se, por seu turno nas subposições 6303 92 10 e 6303 92 90, cujas epígrafes são, respetivamente, «de falsos tecidos» e «outros».

Direito búlgaro

13

O artigo 34.o, n.o 3, do Código de Procedimento Administrativo (Administrativnoprotsesualen kodeks) prevê que a «Administração garante às partes a possibilidade de formular os seus comentários a respeito da prova produzida bem como quanto às alegações avançadas num prazo determinado que não pode exceder sete dias. As partes podem apresentar por escrito pedidos e objeções».

14

Segundo o artigo 35.o desse código, o ato administrativo individual é adotado após a clarificação dos factos e circunstâncias pertinentes considerados e o exame das explicações e objeções avançadas, se for caso disso, pelos cidadãos ou organismos visados.

15

Nos termos do artigo 179.o, n.o 1, do Código de Processo Civil (Grazhdanski protsesualen kodeks, a seguir «GPK»), um documento oficial, elaborado por um funcionário no âmbito das suas funções e segundo a forma e as modalidades requeridas constitui prova das declarações feitas na sua presença e dos atos que tenham sido feitos por si ou na sua presença.

16

Por força do artigo 297.o do GPK, uma decisão que produza efeitos vincula o órgão jurisdicional que a proferiu, bem como qualquer outro órgão jurisdicional ou a Administração.

17

Segundo o artigo 302.o GPK, uma decisão do tribunal administrativo que produza efeitos vincula o juiz cível quanto à validade e à legalidade do ato administrativo.

18

Em conformidade com o artigo 211.o, n.o 1, da Lei aduaneira (Zakon na mitnitsite, a seguir «ZM»), quando o montante dos direitos não tenha sido pago no prazo estabelecido, as autoridades aduaneiras podem utilizar todas as possibilidades que essa mesma lei, ou outras normas jurídicas, lhes conferem para obter o pagamento desse montante, incluindo a adoção de atos administrativos de execução.

19

Nos termos do artigo 211.oa do ZM, «[a]s decisões de recuperação coerciva de créditos públicos do Estado são atos administrativos individuais adotados pelo diretor das alfândegas na área geográfica em que nasceu a dívida não liquidada dentro do prazo; esses atos declaram a exigibilidade de dívidas aduaneiras e de outras dívidas públicas».

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

20

Por declaração aduaneira apresentada em 8 de janeiro de 2009, a Stoilov declarou «materiais para o fabrico de estores» na subposição 6303 92 10 da NC. Foram calculados e pagos direitos aduaneiros de 7598,56 leva búlgaros (BGN) e um imposto sobre o valor acrescentado de 23544,53 BGN.

21

Tendo em vista verificar essa declaração, as autoridades aduaneiras efetuaram, em 9 de janeiro de 2009, uma análise de amostras em laboratório, que foi objeto de um relatório.

22

Tendo em conta a análise do laboratório das alfândegas, essas autoridades consideraram que os bens abrangidos pela referida declaração não podiam ser classificados no capítulo 63 da NC. Resultava do exame que esses bens preenchiam as condições para serem classificados no capítulo 54 da NC, mais precisamente na subposição 5407 61 30.

23

Nestas condições, em 27 de abril de 2009, o Nachalnik na Mitnitsa Stolichna notificou à Stoilov uma decisão que classificava os bens abrangidos pela declaração aduaneira de 8 de janeiro de 2009 nessa subposição (a seguir «decisão de notificação»), implicando, por isso, uma majoração da taxa dos direitos aduaneiros de 6,5% para 8% e a aplicação, por força do Regulamento (CE) n.o 1487/2005 do Conselho, de 12 de setembro de 2005, que institui um direito antidumping definitivo e estabelece a cobrança definitiva do direito provisório instituído sobre as importações de certos tecidos acabados, de filamentos de poliéster, originários da República Popular da China (JO L 240, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1087/2007 do Conselho, de 18 de setembro de 2007 (JO L 246, p. 1), de um direito antidumping definitivo de 74,8%.

24

Por força dessa decisão, a Stoilov dispunha de um prazo de sete dias para pagar voluntariamente os créditos públicos de 1211,37 BGN, de direitos aduaneiros, 82372,82 BGN, de direitos antidumping, e 16 716,84 BGN, de imposto sobre o valor acrescentado.

25

A Stoilov interpôs recurso gracioso da referida decisão perante a Administração e, posteriormente, recorreu para o Administrativen sad Sofia‑grad (tribunal administrativo de Sofia).

26

Entretanto, como a Stoilov não liquidou os montantes indicados na decisão de notificação no prazo estabelecido, o Nachalnik na Mitnitsa Stolichna adotou a decisão de cobrança coerciva de créditos do Estado n.o 13, de 7 de agosto de 2009 (a seguir «decisão de cobrança»).

27

Em 11 de setembro de 2009, a Stoilov interpôs recurso administrativo desta última decisão, pedindo que fosse ordenada uma peritagem independente relativa à classificação das mercadorias tributadas. Na falta de resposta dentro prazo, a Stoilov interpôs diretamente o recurso no processo principal para o Administrativen sad Sofia‑grad, em 7 de outubro de 2009.

28

Em 14 de outubro de 2009, a instância administrativa superior, ou seja, o diretor regional das alfândegas, negou provimento ao recurso administrativo interposto em 11 de setembro de 2009 e recusou a realização da peritagem requerida.

29

Por acórdão de 30 de dezembro de 2010, o Administrativen sad Sofia‑grad confirmou a decisão de notificação.

30

A Stoilov interpôs recurso de cassação deste último acórdão para o Varhoven administrativen sad (supremo tribunal administrativo), recurso esse que continuava pendente no momento da decisão de reenvio prejudicial.

31

Segundo o Administrativen sad Sofia‑grad, as duas possibilidades de classificação das mercadorias em causa no processo principal são as dos capítulos 54 e 63 da NC. Para as distinguir, há que interpretar o conceito de «artigo confecionado» na aceção da nota 7 do referido capítulo 63 e o de «tecido», referido na subposição 5407 61 30 da NC.

32

Além disso, importa apreciar se, tendo em conta o destino reservado a cinco outras declarações aduaneiras, para mercadorias como as que estão em causa no processo principal, apresentadas pela Stoilov antes e depois da apresentação da declaração controvertida, esta sociedade pode invocar o princípio da confiança legítima para obter a classificação das mercadorias em causa sob o código pautal 6303 92 10.

33

Por outro lado, recordando que esta última declaração deu lugar a dois processos nacionais distintos sobre a mesma questão de facto e de direito, o órgão jurisdicional de reenvio considera ser necessário submeter ao Tribunal de Justiça a questão de saber qual é, à luz do artigo 243.o, n.o 1, do código aduaneiro, o ato suscetível de recurso.

34

Por último, considera que há que solicitar a interpretação dos artigos 41.° e 47.° da Carta.

35

Nestas circunstâncias, o Administrativen sad Sofia‑grad decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

As mercadorias — tiras enroladas de falsos tecidos para fabrico de estores de rolo interiores — para efeitos da classificação na pauta aduaneira nos termos da [NC], devem ser classificadas, segundo as suas características, como ‘tecido’, no código NC 5407 61 30 ou, pelo contrário, no código NC 6303 92 10 em correspondência com a sua única utilização, que consiste no fabrico de estores de rolo interiores, tendo em conta que:

a)

a expressão ‘artefactos confecionados’, na aceção da nota 7 do capítulo 63 [intitulado] ‘outros artefactos têxteis confecionados; sortidos: artefactos de matérias têxteis; calçado, chapéus e artefactos de uso semelhante, usados; trapos’ da secção XI [intitulada] ‘matérias têxteis e suas obras’ da [NC], interpretada em conjugação com a [secção A,] n.o 2, alínea a), das Regras Gerais da Nomenclatura Combinada relativa à expressão ‘artigo […] incompleto ou inacabado’, tendo em conta o caso mencionado na alínea c) da nota 7, as características das mercadorias controvertidas e a possibilidade de a partir delas ser fabricado um só produto final;

b)

a questão de saber se o conceito de ‘tecido’ nos termos do capítulo 54, subposição 5407 61 30, da [NC] abrange tiras de material, as quais, como o produto final que constitui a sua única utilização — estores de rolo interiores —, que também dispõem de orlas reforçadas na parte longitudinal, designadamente atendendo à menção expressa deste produto na subposição 6303 92 10 da Nomenclatura?

2)

Existe um motivo razoável para se entender que a classificação pautal da mercadoria criou no declarante e responsável pela importação das mercadorias a confiança legítima de que, nos termos do artigo 71.o, n.o 2, do [código aduaneiro], e à luz do princípio da confiança legítima, deve ser aplicado o número pautal da mercadoria indicado na declaração aduaneira, quando, de acordo com os factos descritos no processo principal, à data da entrega da declaração aduaneira existiam as seguintes circunstâncias:

a)

relativamente a uma anterior declaração aduaneira de mercadorias idênticas com idêntico número pautal, as autoridades aduaneiras, após um controlo das mercadorias que incluiu a respetiva classificação pautal e que foi registado num protocolo, não colheram amostras para análise e concluíram que as mercadorias correspondiam às indicações constantes da declaração; e

b)

após ter sido concedida autorização de saída às mercadorias, não foi efetuado qualquer posterior controlo de cinco outras declarações aduaneiras de mercadorias idênticas com idêntico número pautal, as quais também tinham sido apresentadas anteriormente, designadamente antes e depois da data do protocolo relativo aos controlos aduaneiros, no qual se fez constar que o número pautal estava correto?

3)

Deve o artigo 243.o, n.o 1, do [código aduaneiro], à luz do princípio da recorribilidade dos atos definitivos e executórios, ser interpretado no sentido de que só pode ser interposto recurso de uma decisão tomada nos termos do artigo 232.o, n.o 1, alínea a), deste regulamento, se tal decisão tiver sido tomada por atraso no pagamento, se nela for fixado o montante dos direitos de importação e se ela constituir, em conformidade com o direito nacional do Estado‑Membro, um título executivo para a cobrança de direitos?

4)

Devem os artigos 41.°, n.o 2, alínea a) e 47.° da [Carta] ser interpretados no sentido de que, quando um pedido de produção de prova mediante um perito independente, apresentado pelo responsável pela mercadoria após lhe ter sido feita a comunicação prevista no artigo 221.o, n.o 1, do [código aduaneiro], não tiver sido expressamente decidido por uma autoridade aduaneira e não for mencionado na fundamentação de decisões posteriores existe uma violação insanável do direito a uma boa administração e do direito de defesa em processo administrativo, que também já não pode ser sanada num processo jurisdicional, dado que um interessado que se encontre nas circunstâncias do processo principal só no processo perante um tribunal de primeira instância, através da colocação de questões a um perito independente, tem a possibilidade de provar as suas objeções relativamente à classificação pautal da mercadoria?»

Quanto ao reenvio prejudicial

36

Segundo jurisprudência constante, o processo instituído pelo artigo 267.o TFUE é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais, graças ao qual o primeiro fornece aos segundos os elementos de interpretação do direito da União que lhes são necessários para a resolução do litígio que lhes foi submetido (v., designadamente, acórdãos de 16 de julho de 1992, Meilicke, C-83/91, Colet., p. I-4871, n.o 22, e de 27 de novembro de 2012, Pringle, C‑370/12, n.o 83).

37

No quadro dessa cooperação, o juiz nacional a quem foi submetido o litígio é, à luz das especificidades do processo, o mais bem colocado para apreciar tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal (v., neste sentido, designadamente, acórdãos de 16 de julho de 1992, Lourenço Dias, C-343/90, Colet., p. I-4673, n.o 15; e de 21 de fevereiro de 2006, Ritter‑Coulais, C-152/03, Colet., p. I-1711, n.o 14).

38

No entanto, incumbe ao Tribunal de Justiça, se for caso disso, examinar as condições em que um órgão jurisdicional nacional lhe submete questões prejudiciais, de modo a verificar a sua própria competência, e, em especial, determinar se a interpretação do direito da União que é solicitada apresenta uma relação com a realidade e com o objeto do litígio no processo principal, de modo a não ser levado a formular pareceres sobre questões gerais ou hipotéticas (v., designadamente, neste sentido, acórdãos de 16 de dezembro de 1981, Foglia, 244/80, Recueil, p. 3045, n.os 18 e 21; e de 30 de setembro de 2003, Inspire Art, C-167/01, Colet., p. I-10155, n.o 45). Se concluir que a questão submetida não é manifestamente pertinente para a resolução do litígio, o Tribunal de Justiça não pode pronunciar‑se sobre as questões prejudiciais (v., designadamente, acórdãos, já referidos, Lourenço Dias, n.o 20, e Ritter‑Coulais, n.o 15 e jurisprudência referida).

39

Ora, resulta, neste caso, das observações escritas submetidas ao Tribunal e da resposta do órgão jurisdicional de reenvio ao pedido de esclarecimentos que lhe foi dirigido pelo Tribunal que, por acórdão de 5 de julho de 2012, o Varhoven administrativen sad anulou a decisão mencionada no n.o 29 do presente acórdão e a decisão de notificação.

40

Segundo as explicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, na sua resposta a esse pedido de esclarecimentos, sobre o efeito da anulação da decisão de notificação no processo principal, e como resulta do texto desse acórdão, anexo a essa resposta, o Varhoven administrativen sad decidiu designadamente que a classificação pautal a que o Nachalnik na Mitnitsa Stolichna procedeu, que tinha sido confirmado pelo Administrativen sad Sofia‑grad, era errada à luz dos elementos de prova e das peritagens constantes dos autos. Quanto a este ponto, o Varhoven administrativen sad considerou que os elementos tomados em consideração pelo Administrativen sad Sofia‑grad não eram confirmados pelas provas produzidas nem pelas conclusões do relatório do perito judicial.

41

Nessa resposta, o órgão jurisdicional de reenvio indicou igualmente que lhe incumbe certificar‑se da observância das regras processuais que condicionam a legalidade da decisão de cobrança, entre as quais, designadamente, a relativa à notificação da existência de uma «dívida não liquidada», na aceção do artigo 211.oa do ZM, pela decisão de notificação.

42

Na audiência no Tribunal de Justiça, o Nachalnik na Mitnitsa Stolichna admitiu que, devido à sua anulação pelo Varhoven administrativen sad, a decisão de notificação já não existe na ordem jurídica búlgara.

43

Além disso, nessa mesma audiência, a Stoilov referiu uma decisão que pôs termo à cobrança dos créditos públicos, proferida pela Autoridade Pública de Execução em 24 de setembro de 2012. Essa decisão pôs termo ao processo de execução coerciva desencadeado em conformidade com a decisão de cobrança. Embora contestando a respetiva validade, o Nachalnik na Mitnitsa Stolichna não negou a existência dessa decisão.

44

Nestas condições, tenha ou não sido posto termo ao processo de execução coerciva, iniciado na sequência da decisão de cobrança, resulta, em todo o caso, das considerações procedentes que, como o advogado‑geral observa no n.o 16 das suas conclusões, o órgão jurisdicional de reenvio já não será chamado, para resolver o litígio no processo principal, a adotar uma decisão suscetível de tomar em consideração a resposta que o Tribunal viesse a dar às questões submetidas.

45

Com efeito, como indicou o órgão jurisdicional de reenvio na sua resposta ao pedido de esclarecimentos do Tribunal, a decisão de notificação foi anulada na totalidade pelo Varhoven administrativen sad e a existência desta última decisão constitui, como já foi indicado no n.o 41 do presente acórdão, uma condição processual para a adoção da decisão de cobrança.

46

Nestas condições, há que considerar que o presente pedido de decisão prejudicial não tem por objeto uma interpretação do direito da União que seja objetivamente necessária para a decisão que o juiz deve proferir (v. por analogia, designadamente, acórdão de 9 de outubro de 1997, Grado e Bashir, C-291/96, Colet., p. I-5531, n.o 16). Com efeito, esse pedido, na falta de objeto, não permite retirar elementos de interpretação do direito da União que o órgão jurisdicional de reenvio pudesse aplicar utilmente para resolver, em função desse direito, o litígio pendente (v., designadamente, neste sentido, acórdão de 16 de setembro de 1982, Vlaeminck, 132/81, Recueil, p. 2953, n.o 13).

47

É certo que, na sua resposta ao pedido de esclarecimentos do Tribunal quanto ao efeito da anulação da decisão de notificação no processo principal, o órgão jurisdicional de reenvio considerou que as autoridades aduaneiras podem adotar novas decisões com o mesmo conteúdo que as decisões de notificação e de cobrança. Todavia, mesmo admitindo que ainda é esse o caso, não obstante o acórdão de 5 de julho de 2012 do Varhoven administrativen sad, responder às questões submetidas em tais condições equivaleria a emitir um parecer sobre questões hipotéticas, em violação da missão confiada ao Tribunal de Justiça no quadro da cooperação jurisdicional instituída pelo artigo 267.o TFUE (v., neste sentido, acórdãos de 3 de fevereiro de 1983, Robards, 149/82, Recueil, p. 171, n.o 19; Meilicke, já referido, n.o 25; e de 21 de março de 2002, Cura Anlagen, C-451/99, Colet., p. I-3193, n.o 26).

48

À luz do exposto, deve concluir‑se que não há que responder às questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

Quanto às despesas

49

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) decide:

 

Não há que responder às questões submetidas pelo Administrativen sad Sofia‑grad (Bulgária).

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: búlgaro.