ACÓRDÃO DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

24 de outubro de 2013 ( *1 )

«União aduaneira e pauta aduaneira comum — Regime preferencial para importação de produtos originários dos Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP) — Artigos 16.° e 32.° do Protocolo n.o 1 do anexo V do Acordo de Cotonou — Importação de fibras sintéticas da Nigéria na União Europeia — Irregularidades no certificado de circulação das mercadorias EUR.1 emitido pelas autoridades competentes do Estado de exportação — Carimbo não conforme com o modelo comunicado à Comissão — Certificados a posteriori e de substituição — Código Aduaneiro Comunitário — Artigos 220.° e 236.° — Possibilidade de aplicar a posteriori um direito aduaneiro preferencial que já não estava em vigor à data do pedido de reembolso — Requisitos»

No processo C‑175/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Finanzgericht München (Alemanha), por decisão de 16 de fevereiro de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 13 de abril de 2012, no processo

Sandler AG

contra

Hauptzollamt Regensburg,

O TRIBUNAL de JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: E. Juhász, presidente da Décima Secção, exercendo funções de presidente de secção, A. Rosas e C. Vajda (relator), juízes,

advogado‑geral: M. Wathelet,

secretário: C. Strömholm, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 10 de julho de 2013,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Sandler AG, por H.‑M. Wolffgang, Steuerberater, N. Harksen e R. Hannemann‑Kacik, Rechtsanwältinnen,

em representação do Hauptzollamt Regensburg, por M. Brandl e C. Stephan, na qualidade de agentes,

em representação da República Helénica, por F. Dedousi, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por L. Keppenne e B.‑R. Killmann, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 16.° e 32.° do Protocolo n.o 1 do anexo V do Acordo de parceria entre os estados de África, das Caraíbas e do Pacífico e a Comunidade Europeia e os seus Estados‑Membros assinado em Cotonu, em 23 de junho de 2000 (JO L 317, p. 3), e aprovado em nome da Comunidade pela Decisão 2003/159/CE do Conselho, de 19 de dezembro de 2002 (JO 2003, L 65, p. 27, a seguir «Acordo de Cotonou»), dos artigos 220.° e 236.° do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO L 302, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1791/2006 do Conselho, de 20 de novembro de 2006 (JO L 363, p. 1, a seguir «código aduaneiro»), bem como do artigo 889.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento n.o 2913/92 (JO L 253, p. 1), conforme alterado pela última vez pelo Regulamento (CE) n.o 214/2007 da Comissão, de 28 de fevereiro de 2007 (JO L 62, p. 6, a seguir «Regulamento n.o 2454/93»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Sandler AG (a seguir «Sandler») ao Hauptzollamt Regensburg [Administração Aduaneira Principal de Ratisbonne (Alemanha), a seguir «HZA»] a respeito de dois avisos de liquidação dos direitos de importação emitidos pelo HZA após o controlo a posteriori em razão da não conformidade dos carimbos que figuram nos certificados de circulação das mercadorias EUR.1 (a seguir «certificados EUR.1») emitidos pelas autoridades nigerianas competentes com os comunicados pelas referidas autoridades à Comissão Europeia.

Quadro jurídico

Acordo de Cotonou

3

Através do Acordo de Cotonou, a União Europeia, de modo não recíproco, concedeu um tratamento tarifário preferencial aos produtos originários do grupo dos Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP) (a seguir «Estados ACP»). Para este efeito, a União Europeia obteve uma derrogação, até 31 de dezembro de 2007, à cláusula da nação mais favorecida prevista no artigo 1.o, n.o 1, do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 (GATT) que figuram no anexo 1A do Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio (OMC), assinado em Marrakech, em 15 de abril de 1994, e aprovado pela Decisão 94/800/CE do Conselho, de 22 de dezembro de 1994, relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia e em relação às matérias da sua competência, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986‑1994) (JO L 336, p. 1). Este regime deixou de ser aplicável em 1 de janeiro de 2008.

4

O artigo 36.o, n.o 3, do Acordo de Cotonou previa que as preferências comerciais não recíprocas aplicadas no quadro da quarta Convenção celebrada entre os Estados ACP e a Comunidade eram mantidas durante o período preparatório para todos os Estados ACP, com conformidade com as condições definidas no anexo V desse acordo. Certos produtos, incluindo os têxteis originários dos Estados ACP eram, por conseguinte, autorizados a ser importados na União com isenção de direitos aduaneiros e de taxas de efeito equivalente. O artigo 37.o, n.o 1, do referido acordo especificava que o período preparatório terminava o mais tardar em 31 de dezembro de 2007.

5

O anexo V desse mesmo acordo fixava as condições de aplicação do regime comercial aplicável durante o período preparatório. Por força das disposições do Protocolo n.o 1 do referido anexo, relativo à definição do conceito de «produtos originários» e aos métodos de cooperação administrativa (a seguir «Protocolo n.o 1»), os produtos originários dos Estados ACP beneficiavam, nos termos do artigo 14.o, n.o 1, alínea a), do Protocolo n.o 1, das vantagens do anexo V de Acordo de Cotonou quando da sua importação na União mediante a apresentação de um certificado EUR.1 emitido pelas autoridades aduaneiras do Estado de exportação nos termos do artigo 15.o, n.o 1, do Protocolo n.o 1.

6

Os certificados EUR.1 tinham aposto um carimbo das autoridades aduaneiras do Estado de exportação cujos modelos deviam, nos termos do artigo 31.o, n.o 1, do Protocolo n.o 1, ser comunicados à Comissão, que, por sua vez, os comunicava aos Estados‑Membros. A mesma disposição previa que os certificados EUR.1 eram aceites para a aplicação do tratamento preferencial a partir da data em que as informações necessárias fossem recebidas pela Comissão. O artigo 31.o, n.o 2, do Protocolo n.o 1 especificava que a União e os Estados ACP prestavam mutuamente assistência por intermédio das suas respetivas Administrações Aduaneiras para o controlo da autenticidade dos certificados EUR.1.

7

O artigo 23.o do Protocolo n.o 1 previa que as provas de origem deviam ser apresentadas às autoridades aduaneiras do país de importação de acordo com os procedimentos aplicáveis nesse país.

8

O artigo 16.o do Protocolo n.o 1, sob a epígrafe «Emissão a posteriori do certificado de circulação EUR.1», tem a seguinte redação:

«1.   [...] o [certificado EUR.1] pode, excepcionalmente, ser emitido após a exportação dos produtos a que se refere se:

a)

não tiver sido emitido no momento da exportação devido a erro, omissões involuntárias ou circunstâncias especiais; ou

b)

se apresentar às autoridades aduaneiras prova suficiente de que foi emitido um [certificado EUR.1] que, por motivos de ordem técnica, não foi aceite na importação.

2.   Para efeitos da aplicação do n.o 1, o exportador deve indicar no seu pedido o local e a data da exportação dos produtos a que o certificado de circulação se refere, bem como as razões de seu pedido.

3.   As autoridades aduaneiras só podem emitir um [certificado EUR.1] a posteriori depois de terem verificado a conformidade dos elementos do pedido do exportador com os do processo correspondente.

4.   Os certificados EUR.1 emitidos a posteriori devem conter uma das seguintes menções:

‘NACHTRÄGLICH AUSGESTELLT’, ‘DÉLIVRÉ A POSTERIORI’, ‘RILASCIATO A POSTERIORI’, ‘AFGEGEVEN A POSTERIORI’, ‘ISSUED RETROSPECTIVELY’, ‘UDSTEDT EFTERFØLGENDE’, ‘ΕΚΔΟΘΕΝ ΕΚ ΤΩΝ ΥΣΤΕΡΩΝ’, ‘EXPEDIDO A POSTERIORI’, ‘EMITIDO A POSTERIORI’, ‘ANNETTU JÄLKIKÄTEEN’, ‘UTFÄRDAT I EFTERHAND’.

5.   As menções referidas no n.o 4 devem ser inscritas na casa ‘Observações’ do [certificado EUR.1].»

9

O artigo 18.o do Protocolo n.o 1, sob a epígrafe «Emissão de certificados de circulação EUR.1 com base numa prova de origem emitida anteriormente», previa:

«Quando os produtos originários forem colocados sob controlo de uma estância aduaneira num Estado ACP ou na [União], a substituição da prova de origem inicial por um ou mais certificados de circulação EUR.1 é sempre possível para a expedição de todos ou alguns desses produtos para outros locais situados nos Estados ACP ou na [União]. O ou os certificados de circulação EUR.1 de substituição serão emitidos pela estância aduaneira sob cujo controlo os produtos foram colocados.»

10

O artigo 32.o do Protocolo n.o 1, sob a epígrafe «Controlo da prova de origem», dispunha:

«1.   Os controlos a posteriori da prova de origem efetuar‑se‑ão por amostragem ou sempre que as autoridades aduaneiras de país de importação tenham dúvidas fundadas quanto à autenticidade do documento, à qualidade de originário dos produtos em causa ou quanto ao cumprimento dos outros requisitos do presente protocolo.

2.   Para efeitos de aplicação de n.o 1, as autoridades aduaneiras do país de importação devolverão o certificado de circulação EUR.1 e a fatura, se esta tiver sido apresentada, a declaração na fatura, ou uma fotocópia destes documentos às autoridades aduaneiras do país de exportação, indicando, se for caso disso, as razões que justificam a realização de um inquérito. Em apoio ao pedido de controlo a posteriori devem ser enviados todos os documentos e informações obtidos que levem a supor que as menções inscritas na prova de origem são inexatas.

3.   O controlo é efetuado pelas autoridades aduaneiras de Estado de exportação. Para o efeito, essas autoridades podem exigir a apresentação de qualquer documento comprovativo e fiscalizar a contabilidade de exportador ou proceder a qualquer outro controlo que considerem adequado.

4.   Se as autoridades aduaneiras do país de importação decidirem suspender a concessão do regime preferencial aos produtos em causa até serem conhecidos os resultados do controlo, concederão a autorização de saída dos produtos ao importador, sob reserva da aplicação das medidas cautelares consideradas necessárias.

5.   As autoridades aduaneiras que requerem o controlo serão informadas dos seus resultados com a maior brevidade possível. Esses resultados devem indicar claramente se os documentos são autênticos, se os produtos em causa podem ser considerados como produtos originários dos Estados ACP […], e se satisfazem os outros requisitos de presente protocolo.

6.   Se, nos casos de dúvidas fundamentadas, não for recebida resposta no prazo de dez meses a contar da data do pedido de controlo, ou se a resposta não contiver informações suficientes para apurar a autenticidade do documento em causa ou a verdadeira origem dos produtos, as autoridades aduaneiras requerentes recusarão o benefício de regime preferencial, salvo se se tratar de circunstâncias excecionais.

7.   Caso o procedimento de controlo ou qualquer outra informação disponível levem a supor que as disposições de presente protocolo estão a ser infringidas, o Estado ACP, por sua própria iniciativa ou a pedido [da União], efetuará os inquéritos necessários, ou tomará medidas para a realização desses inquéritos com a devida urgência, a fim de identificar e prevenir tais infrações, podendo, para o efeito, convidar [a União] a participar nesses inquéritos.»

11

Para ajudar os Estados‑Membros de importação a aplicar as disposições relativas aos regimes de trocas preferenciais previstos pelo Acordo de Cotonou, a Comissão publicou um documento intitulado «Notas explicativas relativas ao Protocolo n.o 1 do anexo V do Acordo de Parceria ACP‑CE, relativo à definição da noção de ‘produtos originários’ e aos métodos de cooperação administrativa» (JO 2002, C 228, p. 2, a seguir «notas»).

12

Nos n.os 10, 15 e 17 das mesmas, as notas contêm explicações suplementares no que diz respeito aos artigos 16.° e 32.° do Protocolo n.o 1, bem como exemplos com indicações da conduta a seguir.

13

O n.o 10 das notas, sob a epígrafe «Artigo 16.o — Razões técnicas», dispõe:

«Um [certificado EUR.1] pode ser rejeitado por ‘razões técnicas’ por não ter sido emitido em conformidade com as disposições previstas. Trata‑se de casos em que pode ser posteriormente apresentado um certificado emitido a posteriori. Esta categoria abrange, por exemplo, as seguintes situações:

[...]

falta de carimbo e de assinatura no [certificado EUR.1] (por exemplo: casa n.o 11),

[...]

o [certificado EUR.1] é visado com um novo carimbo ainda não comunicado,

[...]

Procedimento a seguir:

Após a aposição da menção ‘DOCUMENTO RECUSADO’, indicando a(s) razão/razões, o certificado é devolvido ao importador para que este possa obter um novo certificado emitido a posteriori. Todavia, a administração aduaneira pode eventualmente conservar uma fotocópia do documento recusado para efeitos de um controlo a posteriori ou se tiver razões para suspeitar da existência de fraude.»

14

O n.o 15 das notas, sob a epígrafe «Artigo 32.o — Recusa do regime preferencial sem verificação», prevê:

«Trata‑se dos casos em que a prova da origem é considerada como não aplicável. Esta categoria abrange designadamente as seguintes situações:

os produtos a que se refere o [certificado EUR.1] não beneficiam de regime preferencial,

a casa ‘Designação das mercadorias’ (casa n.o 8 EUR.1) não está preenchida ou indica mercadorias diferentes das apresentadas,

[...]

Procedimento a seguir:

A prova de origem, anotada da menção ‘NÃO APLICÁVEL’, deve ser conservada pela administração aduaneira em que foi apresentada, a fim de evitar qualquer nova tentativa de utilização.

Nos casos em que tal se afigure oportuno, as autoridades aduaneiras do país de importação informam sem demora as autoridades aduaneiras do país de exportação da recusa.»

15

O n.o 17 das notas, sob a epígrafe «Artigo 32.o — Dúvida fundada», tem a seguinte redação:

«Esta situação diz respeito, por exemplo, aos seguintes casos:

[...]

o [certificado EUR.1] não foi assinado ou datado pela autoridade emissora,

as mercadorias, embalagens ou outros documentos de acompanhamento contêm marcas que indicam uma origem diferente da referida no [certificado EUR.1],

[...]

o carimbo utilizado para o visto do documento difere do que foi comunicado.

Procedimento a seguir:

O documento é enviado para controlo a posteriori às autoridades emissoras com indicação dos motivos de pedido de controlo. Enquanto se aguardam os resultados de controlo, são tomadas todas as medidas cautelares consideradas necessárias pelas autoridades aduaneiras para garantir o pagamento dos direitos aplicáveis.»

Código aduaneiro

16

O código aduaneiro foi revogado pelo Regulamento (CE) n.o 450/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2008, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (Código Aduaneiro Modernizado) (JO L 145, p. 1), do qual algumas disposições entraram em vigor em 24 de junho de 2008, e outras entraram em vigor em 24 de junho de 2013. Não obstante, tendo em conta a data dos factos do litígio no processo principal, este continua a reger‑se pelas regras enunciadas no código aduaneiro.

17

O artigo 77.o do código aduaneiro visava os casos em que a declaração aduaneira era feita utilizando um procedimento informático e previa que as autoridades aduaneiras podiam nesses casos dispensar o declarante de ter de apresentar os documentos de acompanhamento com a declaração. Nesses casos, esses documentos deviam todavia estar à disposição das autoridades aduaneiras.

18

O artigo 78.o do código aduaneiro permitia às autoridades aduaneiras proceder à revisão da declaração aduaneira, bem como ao controlo a posteriori dos documentos e dados comerciais relativos às operações de importação, após a concessão da autorização de saída das mercadorias. Quando resultasse da revisão da declaração ou dos controlos a posteriori dos documentos que as disposições que regem o regime aduaneiro em causa tinham sido aplicadas com base em elementos inexatos ou incompletos, as autoridades aduaneiras tomariam as medidas necessárias para regularizar a situação, tendo em conta os novos elementos de que dispõem.

19

O artigo 236.o, n.o 1, do código aduaneiro precisava, nomeadamente, quanto ao procedimento relativo ao reembolso ou à dispensa de pagamento de direitos relativos a uma dívida aduaneira reputada inexistente, o seguinte:

«Proceder‑se‑á ao reembolso dos direitos de importação ou dos direitos de exportação na medida em que se provar que, no momento de seu pagamento, o respetivo montante não era legalmente devido ou que foi objeto de registo de liquidação contrariamente ao disposto no n.o 2 do artigo 220.o

[...]

Não será concedido qualquer reembolso ou dispensa de pagamento quando os factos conducentes ao pagamento ou ao registo de liquidação de um montante que não era legalmente devido resultarem de um artifício de interessado.»

20

Por força do artigo 247.o do código aduaneiro, as medidas necessárias para a aplicação do referido código eram adotadas pela Comissão.

21

No que diz respeito ao procedimento de reembolso ou dispensa de pagamento dos direitos, o artigo 889.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2454/93 continha um determinado número de regras quanto à concessão a posteriori de um regime pautal preferencial e dispunha:

«Quando o pedido de reembolso ou da dispensa de pagamento se basear na existência, à data da aceitação da declaração de introdução em livre prática das mercadorias, de um direito de importação reduzido ou nulo, aplicável no âmbito de um contingente pautal ou de um limite máximo pautal ou de um outro regime pautal preferencial, o reembolso ou a dispensa de pagamento só serão concedidos quando, na data da entrega do referido pedido, este for acompanhado dos documentos necessários:

se se tratar de um contingente pautal, este não estiver esgotado,

nos outros casos, se não tiver sido efetuada a reintrodução do direito normalmente devido.

Todavia, o reembolso ou a dispensa de pagamento serão concedidos, mesmo se as condições previstas no parágrafo anterior não estiverem preenchidas, quando, em consequência de um erro cometido pelas próprias autoridades aduaneiras, o direito reduzido ou nulo não tiver sido aplicado a mercadorias cuja declaração para introdução em livre prática continha todos os elementos e estava acompanhada de todos os documentos necessários para a aplicação de direito reduzido ou nulo.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

22

Entre 19 de maio de 2005 e 11 de julho de 2007, a Sandler colocou em livre prática na União, através das declarações aduaneiras feitas por via eletrónica e aplicando o sistema ATLAS, várias remessas de fibras sintéticas. O Hauptzollamt Hamburg‑Hafen‑Waltershof [Administração Aduaneira Principal do porto de Hamburgo (Alemanha)] colocou essas mercadorias em livre prática baseando‑se na origem declarada, concretamente a Nigéria, que permite a obtenção do direito aduaneiro preferencial «zero». As autoridades aduaneiras prescindiram da apresentação dos certificados EUR.1 referidos nas declarações aduaneiras assim como do controlo desses certificados.

23

Em 2008, quando de um controlo a posteriori, nos termos do artigo 78.o do código aduaneiro, dos certificados EUR.1, o HZA constatou que, em 34 dos certificados EUR.1 tinha sido aposto um carimbo redondo com as menções no seu contorno «NIGERIA CUSTOMS SERVICE» e «TIN CAN ISLAND PORT. LAGOS», bem como, no interior, depois de uma data, os termos «ASST.COMPTROLLER o/c Export Seat Releasing Officer». Segundo o HZA, o carimbo não coincidia com o modelo comunicado à Comissão pelas autoridades nigerianas nos termos do artigo 31.o, n.o 1, do Protocolo n.o 1, sendo este um carimbo de formato diferente com as seguintes menções no seu contorno «NIGERIA CUSTOMS SERVICE», e «EXPORT SEAT», bem como, no interior, depois de uma data, os termos «TINCAN PORT»:

Carimbo aposto nos certificados EUR.1

Modelo de carimbo comunicado pelas autoridades nigerianas

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24

Segundo as informações fornecidas pelo HZA ao órgão jurisdicional de reenvio, os modelos de carimbos comunicados pelas autoridades nigerianas estavam em vigor desde 1 de julho de 2003 até à expiração do regime preferencial previsto no anexo V do Acordo de Cotonou, ou seja, 31 de dezembro de 2007, e não foi comunicada nenhuma modificação desses modelos pelas autoridades nigerianas entre essas duas datas.

25

Por esta razão, o HZA informou a Sandler, por correio de 30 de abril de 2008, que os certificados EUR.1 não podiam ser aceites e que a menção «documento recusado» devia ser neles aposta. Além disso, o HZA precisou que era necessário cobrar direitos aduaneiros de importação, mas que, todavia, mediante a apresentação de um novo certificado EUR.1, seria possível o reembolso dos direitos cobrados. Através de dois avisos de liquidação dos direitos de importação de 14 de maio de 2008 e 3 de junho de 2008, o HZA ordenou a cobrança dos direitos aduaneiros num montante total de 65612,71 euros, em aplicação do direito aduaneiro de 4% aplicável às mercadorias originárias de Estados terceiros.

26

Em 10 de setembro de 2008, a Sandler apresentou certificados EUR.1 apostos de carimbos conformes com o modelo comunicado à Comissão e pediu o reembolso dos direitos aduaneiros pagos na sequência dos dois avisos de liquidação. Esses certificados EUR.1 tinham, na casa n.o 7 intitulada «Observações», a menção «being issued in replacement of EUR.1 […]» («emitido em substituição de EUR.1 […]»), combinada com a data e o número dos certificados EUR.1 que tinham sido recusados pelo HZA.

27

Por decisão de 22 de setembro de 2008, o HZA recusou o reembolso pelo facto de que, por força do artigo 889.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2454/93, a concessão a posteriori do regime preferencial só podia fazer‑se se o direito aduaneiro preferencial solicitado estivesse ainda em vigor no momento da apresentação do pedido de reembolso. Ora, como o regime preferencial previsto pelo Acordo de Cotonou tinha expirado em 31 de dezembro de 2007, já não estava previsto nenhum direito aduaneiro preferencial para as mercadorias importadas da Nigéria a partir de 1 de janeiro de 2008.

28

Além disso, a Sandler solicitou o reembolso dos direitos aduaneiros invocando a equidade, ao abrigo do artigo 239.o do código aduaneiro. Esse pedido foi igualmente recusado pelo HZA por decisão de 23 de fevereiro de 2009.

29

A Sandler opôs‑se a essas decisões do HZA, oposições que foram indeferidas. A Sandler, em seguida, interpôs recursos contra cada uma dessas decisões de indeferimento no órgão jurisdicional de reenvio. Esses recursos foram apensados pelo referido órgão jurisdicional.

30

No órgão jurisdicional de reenvio, a Sandler alegou que uma inexatidão num certificado EUR.1 verificada pelas autoridades aduaneiras de um Estado terceiro no âmbito do sistema de cooperação administrativa deve ser considerada um erro que o operador económico não pode detetar. Com efeito, este último não tem nenhuma função de controlo, tanto mais que não está previsto que o modelo de carimbo necessário possa ser consultado nas autoridades aduaneiras do Estado de importação. A Sandler salienta, além disso, que os certificados EUR.1 iniciais tinham sido redigidos corretamente do ponto de vista material e que apenas um carimbo incorreto tinha sido utilizado. Assim, sustenta que não se tratava de certificados EUR.1 não válidos. Ao aporem o carimbo incorreto, as autoridades nigerianas tinham simplesmente cometido um erro formal que teriam corrigido ao emitir a posteriori certificados EUR.1 revistos.

31

Em apoio da sua opinião, a Sandler alega que, no caso dos autos, em vez de invocar o procedimento previsto no artigo 16.o do Protocolo n.o 1, deveria ser efetuado um controlo a posteriori dos certificados EUR.1 nos termos do artigo 32.o do referido protocolo na medida em que os certificados EUR.1 de origem emitidos pelas autoridades competentes de um Estado parte no Acordo de Cotonou não podiam ser anulados de modo unilateral, sem a participação das autoridades desse Estado. Em caso de recusa de um certificado EUR.1 baseada no artigo 16.o do Protocolo n.o 1, a origem preferencial da mercadoria é incontestável e apenas a emissão regular dos certificados EUR.1 seria, por razões de administração interna, problemática. Na medida em que o HZA não apresentou um pedido de controlo a posteriori, nos termos do artigo 32.o do Protocolo n.o 1, haveria que considerar que não tinha havido nenhuma dúvida quanto à autenticidade do justificativo do regime preferencial.

32

No essencial, o HZA alega que o artigo 16.o do Protocolo n.o 1 era aplicável no caso dos autos porque os certificados EUR.1 originais tinham um carimbo que era claramente diferente dos modelos comunicados pelas autoridades nigerianas. Os erros técnicos previstos pelo artigo 16.o do Protocolo n.o 1 dizem respeito a falhas mais graves do que as previstas no artigo 32.o do referido protocolo. O HZA salienta ainda que, no caso dos autos, o carimbo utilizado era totalmente diferente dos modelos comunicados e não tinha nenhuma similitude com estes últimos, de modo que não se tratava de uma «diferença» na aceção do n.o 17 das notas, em relação ao modelo comunicado, circunstância que justificaria uma dúvida quanto à autenticidade do certificado EUR.1. A diferença entre os carimbos que são objeto do litígio no processo principal e os modelos comunicados pelas autoridades nigerianas é de tal modo importante que a aplicação do direito aduaneiro preferencial não é possível.

33

O órgão jurisdicional de reenvio considera que, para decidir o litígio que lhe foi submetido, é determinante saber se o HZA tem fundamento para opor ao pedido de reembolso da Sandler o facto de que, por força do artigo 889.o do Regulamento n.o 2454/93, um reembolso só pode ser concedido se a tarifa preferencial que estava em vigor no momento em que as mercadorias entraram em prática for aplicável no momento da apresentação do pedido de reembolso. Embora o artigo 889.o do Regulamento n.o 2454/93 não se oponha a um reembolso nessas circunstâncias, coloca‑se a questão de saber se as autoridades de um Estado‑Membro podem, sem fazer o pedido formal de controlo a posteriori com fundamento no artigo 32.o do Protocolo n.o 1, controlar e/ou recursar um certificado EUR.1 emitido pelo Estado ACP quando as autoridades aduaneiras desses Estados utilizaram um carimbo diferente daquele que foi comunicado à Comissão e, assim, recusar por sua própria iniciativa ao importador a concessão de um direito aduaneiro preferencial.

34

Nestas condições, o Finanzgericht München decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 889.o, n.o 1, primeiro parágrafo, segundo travessão, do [Regulamento n.o 2454/93] ser interpretado no sentido de que só regula o caso de um pedido de reembolso quando uma mercadoria começa por ser introduzida em livre prática, em aplicação da taxa para países terceiros, sendo constatado mais tarde que, no momento da aceitação da declaração aduaneira, estava em vigor um direito de importação reduzido ou nulo (no caso vertente uma taxa preferencial) que, porém, à data da apresentação do pedido de reembolso, já tinha novamente expirado, com a consequência de que a expiração de um regime preferencial temporário não pode ser alegada contra o interessado que apresenta o pedido de reembolso quando, ao ser realizado o desalfandegamento, é concedida a taxa preferencial e só no âmbito de uma cobrança a posteriori realizada pela Administração é negada a preferência e aplicada a taxa para países terceiros?

2)

Devem os artigos 16.°, n.o 1, alínea b), [e/ou] 32.° do Protocolo n.o 1 […] ser interpretados no sentido de que as autoridades aduaneiras do Estado de importação, quando o Estado de exportação apõe a um [certificado EUR.1] um carimbo diferente do modelo comunicado à Comissão, podem tratar esta discrepância, na dúvida, como [um erro técnico] na aceção do artigo 16.o, n.o 1, alínea b), do Protocolo n.o 1 […] e, deste modo, declarar inválidos os certificados de circulação de mercadorias EUR.1 sem participação das autoridades aduaneiras do Estado de exportação?

3)

Em caso de resposta [afirmativa] à segunda questão:

a)

O artigo 16.o, n.o 1, alínea b), do Protocolo n.o 1 […] é aplicável também quando [o erro técnico] não é constatad[o] diretamente na importação, mas só no âmbito de [um controlo] posteriormente levad[o] a cabo pelas autoridades aduaneiras?

b)

Pode o artigo 16.o, n.os 4 e 5, do Protocolo n.o 1 […] ser interpretado no sentido de que [um erro técnico] se considera retificad[o] quando num [certificado EUR.1] emitido a posteriori não foi inscrita literalmente, na casa ‘Observações’, nenhuma das menções previstas no artigo 16.o, n.o 4, do [referido protocolo], mas apenas uma que, em última análise, indica que o certificado para fins preferenciais foi emitido a posteriori?

4)

Em caso de resposta negativa à segunda questão:

Deve o artigo 236.o, n.o 1, do [código aduaneiro] ser interpretado no sentido de que os direitos de importação não são legalmente devidos e, por conseguinte, foram incorretamente cobrados a posteriori nos termos do artigo 220.o, n.o 1, do [código aduaneiro], quando os certificados de circulação de mercadorias EUR.1 inicialmente utilizados não puderem ser declarados inválidos pelas autoridades aduaneiras do país de importação sem participação das autoridades aduaneiras do país de exportação?

5)

Também no caso de um [certificado EUR.1] emitido a posteriori, nos termos do artigo 16.o do Protocolo n.o 1 […], o reembolso de direitos de importação já cobrados e pagos em conformidade com o artigo 889.o do [Regulamento n.o 2454/93] só é possível quando a taxa preferencial ainda estiver em vigor na data em que for apresentado o pedido de reembolso?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

35

Através da primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se o artigo 889.o, n.o 1, primeiro parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.o 2454/93 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a um pedido de reembolso de direitos quando foi solicitado e concedido um regime pautal preferencial quando da colocação em livre prática das mercadorias e foi só ulteriormente, no âmbito de uma verificação a posteriori ocorrida depois do termo do regime pautal preferencial e o restabelecimento do direito normalmente devido, que as autoridades do Estado de importação procederam à cobrança da diferença relativa ao direito aduaneiro aplicável às mercadorias originárias de países terceiros.

36

Há que declarar a este respeito, como salienta de resto o órgão jurisdicional de reenvio no pedido de decisão prejudicial, que a exceção à aplicação do artigo 236.o do código aduaneiro prevista no artigo 889.o, n.o 1, primeiro parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.o 2454/93 visa, segundo o teor desta última disposição, apenas os casos em que uma mercadoria é colocada em livre prática nos termos do direito aduaneiro normalmente devido, mas que na sequência de um direito aduaneiro reduzido, ou mesmo uma isenção aduaneira, podia ser invocado por força, por exemplo, de um regime preferencial.

37

Por conseguinte, numa situação como a do processo principal, quando um regime pautal preferencial foi pedido e concedido quando da colocação em livre prática das mercadorias e só foi posteriormente, no âmbito de uma verificação a posteriori ocorrida depois do termo do regime pautal preferencial e o restabelecimento do direito normalmente devido, que as autoridades do Estado de importação procederam à cobrança da diferença relativa ao direito aduaneiro aplicável às mercadorias originárias de países terceiros, o artigo 889.o, n.o 1, primeiro parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.o 2454/93 não pode impedir um pedido de reembolso da referida diferença.

38

Por conseguinte, há que responder à primeira questão submetida que o artigo 889.o, n.o 1, primeiro parágrafo, segundo travessão, do Regulamento n.o 2454/93 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a um pedido de reembolso de direitos quando o regime pautal preferencial foi solicitado e concedido no momento da colocação em livre prática das mercadorias e foi só posteriormente, no âmbito de uma verificação a posteriori ocorrida depois da expiração do regime pautal preferencial e o restabelecimento do direito normalmente devido, que as autoridades do Estado de importação procederam à cobrança da diferença relativamente ao direito aduaneiro aplicável às mercadorias originárias de países terceiros.

Quanto à segunda questão, bem como à primeira parte da terceira questão

39

Através da segunda questão, bem como da primeira parte da terceira questão, que há que apreciar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 16.°, n.o 1, alínea b), e 32.° do Protocolo n.o 1 devem ser interpretados no sentido de que, se, durante um controlo a posteriori, se verificar que um carimbo que não corresponde ao modelo comunicado pelas autoridades do Estado de exportação foi aposto no certificado EUR.1, as autoridades aduaneiras do Estado de importação podem recusar esse certificado e restituí‑lo ao importador a fim de lhe permitir a emissão de um certificado a posteriori com base no artigo 16.o, n.o 1, alínea b), do Protocolo n.o 1 em vez de desencadear o procedimento previsto no artigo 32.o deste protocolo.

40

Cumpre salientar a este respeito que, por força do artigo 14.o, n.o 1, alínea a), do Protocolo n.o 1, a apresentação de um certificado EUR.1 emitido pelas autoridades aduaneiras do Estado de exportação era um requisito de procedimento prévio à aplicação aos produtos originários dos Estados ACP do benefício do regime instituído pelo anexo V de Acordo de Cotonou.

41

O artigo 31.o, n.o 1, do Protocolo n.o 1 previa, por outro lado, que nos certificados EUR.1 devia ser aposto um carimbo das autoridades aduaneiras do Estado de exportação cujos modelos dos cunhos eram comunicados à Comissão, que os comunicava aos Estados‑Membros. Em virtude do segundo parágrafo desta mesma disposição, os certificados EUR.1 eram aceites para a aplicação do tratamento preferencial a partir da data em que as informações necessárias tivessem sido recebidas pela Comissão.

42

É pacífico que os carimbos apostos nos certificados EUR.1 em causa no processo principal não estavam manifestamente em conformidade com o modelo comunicado à Comissão pelas autoridades nigerianas, estando esses modelos de carimbos em vigor desde 1 de julho de 2003 e até à expiração do regime preferencial previsto no anexo V do Acordo de Cotonou, concretamente, 31 de dezembro de 2007, sem que qualquer modificação tenha sido entretanto comunicada pelas autoridades nigerianas.

43

Daqui resulta que, por força do artigo 31.o, n.o 1, segundo parágrafo, do Protocolo n.o 1, as autoridades do Estado‑Membro de importação não podiam, em caso nenhum, aceitar os certificados EUR.1 como os que estão em causa no processo principal.

44

No que diz respeito ao procedimento a seguir nessa situação pelas autoridades do Estado‑Membro de importação, o Protocolo n.o 1 não contém nenhuma disposição que delimite expressamente os respetivos âmbitos de aplicação, por um lado, do procedimento previsto no artigo 16.o deste protocolo e, por outro, do procedimento previsto no seu artigo 32.o Assim, este protocolo parece permitir uma certa margem de apreciação das autoridades do Estado‑Membro de importação.

45

A opção entre estes dois procedimentos deve ser efetuada tendo em consideração, além das regras do Protocolo n.o 1 e das notas, todas as circunstâncias do caso concreto, incluindo os elementos factuais.

46

As notas que, não tendo nenhuma característica vinculativa para as autoridades dos Estados‑Membros, constituem um documento útil a fim de assegurar a aplicação uniforme das disposições do protocolo n.o 1 não contêm nenhuma instrução a este respeito.

47

Com efeito, os n.os 10 e 17 dessas notas podem guiar a conduta de uma autoridade confrontada com uma discrepância entre os carimbos utilizados e o modelo comunicado. O n.o 10 das referidas notas recomenda, no caso de utilização de um «novo carimbo ainda não comunicado», a restituição do certificado ao importador a fim de lhe poder permitir obter o certificado a posteriori nos termos do artigo 16.o, n.o 1, alínea b), do Protocolo n.o 1. Em contrapartida, o n.o 17 dessas mesmas notas aconselha, no caso de o carimbo utilizado ter diferenças em relação ao comunicado, o envio de um certificado para controlo a posteriori às autoridades do Estado de exportação nos termos do artigo 32.o do Protocolo n.o 1.

48

Todavia, há que recordar que o n.o 10 das notas evoca a possibilidade de uma aplicação paralela das disposições dos artigos 16.°, n.o 1, e 32.° do Protocolo n.o 1 e confirma, por conseguinte, que, contrariamente ao que alega a Comissão nas suas observações escritas, os âmbitos de aplicação dessas disposições não se excluem mutuamente. O referido n.o 10 prevê, com efeito, que a autoridade do Estado‑Membro de importação que restitui o certificado recusado ao importador a fim de lhe permitir pedir a emissão a posteriori de um novo certificado nos termos do artigo 16.o, n.o 1, do Protocolo n.o 1 conserve uma fotocópia do certificado recusado, nomeadamente, «para efeitos de um controlo a posteriori» nos termos do artigo 32.o do Protocolo n.o 1.

49

Decorre de jurisprudência constante que o sistema de cooperação administrativa previsto por um protocolo que enuncia, no anexo a um acordo celebrado entre a União e um Estado terceiro, regras relativas à origem de produtos assenta na confiança mútua entre as autoridades dos Estados‑Membros de importação e as do Estado de exportação e que a comparação estabelecida por um protocolo relativo à origem dos produtos só pode funcionar se o Estado de importação reconhecer as apreciações feitas legalmente a esse respeito pelo Estado de exportação (v. acórdão de 15 de dezembro de 2011, Afasia Knits Deutschland, C-409/10, Colet., p. I-13331, n.os 28, 29 e jurisprudência referida).

50

No entanto, a essência da confiança mútua não é colocada em causa pelo facto de o Protocolo n.o 1 permitir, consoante as circunstâncias, a opção das autoridades de um Estado de importação entre os procedimentos previstos nos artigos 16.° e 32.° deste protocolo. Com efeito, contrariamente ao que sugerem a Sandler e a Comissão, ambos esses procedimentos exigem a participação das autoridades do Estado de exportação, consistindo a única diferença na questão de saber se essas autoridades são contactadas pelas autoridades do Estado‑Membro de importação, nos termos do artigo 32.o do Protocolo n.o 1, ou pelo importador, nos termos do artigo 16.o, n.o 1, do Protocolo n.o 1. Em ambos os casos, é apenas após a intervenção das autoridades do Estado de exportação que os produtos originários do Estado ACP em causa poderão beneficiar do regime instituído pelo anexo V do Acordo de Cotonou. Assim, nos termos do artigo 16.o do Protocolo n.o 1, eram as autoridades do Estado de exportação que podiam, depois da verificação das indicações contidas no pedido do exportador, emitir um certificado EUR.1 a posteriori. Do mesmo modo, os controlos previstos pelo artigo 32.o do referido protocolo eram efetuados pelas autoridades do Estado de exportação a fim de confirmar a autenticidade dos certificados EUR.1 e a origem dos produtos.

51

Além disso, deve ser rejeitada a argumentação da Comissão segundo a qual é unicamente quando as autoridades do Estado‑Membro de importação suspeitam que existam novos carimbos e pensam que lhes serão comunicados pelo Estado terceiro que essas autoridades podem recusar o certificado EUR.1, ao passo que, se não acreditarem que lhes sejam notificados novos carimbos, não têm outra escolha senão iniciar um procedimento de controlo a posteriori previsto pelo artigo 32.o do Protocolo n.o 1. Com efeito, é impossível, na prática, para as autoridades do Estado‑Membro de importação distinguir de forma útil essas duas situações.

52

No que diz respeito à questão de saber se, quando existe uma diferença entre os carimbos, como a que está em causa no processo principal, reconhecida não diretamente no momento da importação, mas apenas quando de um controlo a posteriori, as autoridades do Estado‑Membro de importação podem ainda recusar um certificado EUR.1 e obrigar o importador a cumprir o procedimento previsto no artigo 16.o, n.o 1, alínea b), do Protocolo n.o 1, há que precisar que o conceito de «importação», na aceção desta disposição, deve, como sublinhou a Comissão, ser interpretado no sentido amplo e abranger, assim, em princípio, todo o período que corre até à extinção de todas as obrigações do importador.

53

Nos termos do artigo 23.o de Protocolo n.o 1, as provas da origem deviam efetivamente ser apresentadas às autoridades aduaneiras segundo as regras de procedimento em vigor no Estado de importação, o que significa, num caso como o do processo principal, nomeadamente, em conformidade com o código aduaneiro.

54

O artigo 77.o, n.o 2, do código aduaneiro especificava a este respeito que, quando as formalidades aduaneiras fossem preenchidas por um procedimento informático, como ocorreu no processo principal, as autoridades aduaneiras podiam aceitar que os certificados EUR.1 não fossem apresentados com a declaração aduaneira, mas que fossem guardados à disposição das referidas autoridades a fim de que estas pudessem ulteriormente proceder a controlos. O artigo 16.o do código aduaneiro previa, por outro lado, que as pessoas em questão deviam conservar, durante o prazo fixado pelas disposições em vigor e durante pelo menos três anos civis, todos os documentos e informações independentemente do suporte, e o artigo 221.o, n.o 3, do código aduaneiro, lido em conjugação com o artigo 201.o, n.o 2, do mesmo código, permitia a comunicação ao devedor da dívida aduaneira durante três anos a contar da aceitação da declaração aduaneira.

55

Tendo em conta estas considerações, os termos «por motivos de ordem técnica, não foi aceite na importação», que figuram no artigo 16.o, n.o 1, alínea b), do Protocolo n.o 1, devem ser lidos em conjugação com o artigo 23.o deste protocolo e com o artigo 77.o, n.o 2, do código aduaneiro, no sentido de que estes termos visam o momento em que o país de importação controla efetivamente pela primeira vez, em conformidade com as regras do procedimento, os certificados EUR.1. Portanto, os referidos termos podem também aplicar‑se quando de um controlo efetuado a posteriori.

56

Por conseguinte, há que responder à segunda questão, bem como à primeira parte da terceira questão, que os artigos 16.°, n.o 1, alínea b), e 32.° do Protocolo n.o 1 devem ser interpretados no sentido de que, se resultar de um controlo a posteriori que um carimbo aposto no certificado EUR.1 não corresponde ao modelo comunicado pelas autoridades do Estado de exportação, as autoridades aduaneiras do Estado de importação podem recusar esse certificado e restituí‑lo ao importador a fim de lhe permitir obter o certificado a posteriori nos termos do artigo 16.o, n.o 1, alínea b), do Protocolo n.o 1 em vez de desencadear o procedimento previsto no artigo 32.o deste protocolo.

Quanto à segunda parte da terceira questão

57

Através da segunda parte da terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se o artigo 16.o, n.os 4 e 5, do Protocolo n.o 1 deve ser interpretado no sentido de que um certificado EUR.1 que tem na casa n.o 7, sob a epígrafe «Observações», não a menção especificada no n.o 4 dessa disposição, mas uma indicação que deve, em definitivo, ser interpretada como significando que o certificado EUR.1 foi emitido nos termos do artigo 16.o, n.o 1, desse protocolo, deve, nas circunstâncias como as existentes no processo principal, ser considerado um certificado EUR.1 emitido a posteriori suscetível de permitir às mercadorias em causa beneficiar de um regime instituído pelo anexo V do Acordo de Cotonou.

58

Há que recordar, a este respeito, que, em conformidade com os artigos 14.° e 15.°, n.o 7, do Protocolo n.o 1, o certificado EUR.1 deve, em princípio, ter sido emitido no momento em que a exportação real das mercadorias foi efetuada, a fim de poder ser apresentado às autoridades aduaneiras do Estado de importação.

59

O artigo 16.o, n.o 1, do Protocolo n.o 1 constitui uma exceção a essa regra na medida em que permite, a título excecional e derrogando expressamente o artigo 15.o, n.o 7, deste protocolo, a emissão de certificados EUR.1 depois da exportação, designadamente quando for demonstrado que o certificado EUR.1 foi emitido, mas que não foi aceite na importação por razões técnicas.

60

O artigo 16.o, n.os 4 e 5, do Protocolo n.o 1 exige neste contexto que os certificados EUR.1 emitidos a posteriori devem ter, na casa «Observações», uma das menções específicas cujo texto preciso figura no dito n.o 4, concretamente, «emitido a posteriori».

61

Em contrapartida, é pacífico, no processo principal, que os certificados EUR.1 apresentados pela Sandler depois do HZA ter recusado aceitar os certificados EUR.1 que a mesma tinha inicialmente apresentado, embora tivessem apostos carimbos em conformidade com o modelo comunicado à Comissão, continham, na casa «Observações», não a menção especificada no artigo 16.o, n.o 4, de Protocolo n.o 1, mas a menção «emitido a posteriori», com a data e o número dos certificados EUR.1 recusados.

62

Na verdade, esta última fórmula podia permitir entender que os certificados apresentados pela Sandler numa segunda fase tinham sido emitidos ao abrigo do artigo 18.o do Protocolo n.o 1 relativo aos certificados de substituição.

63

Todavia, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a autoridade de emissão, através destas menções, indicou no essencial, de modo suficientemente preciso, que os certificados EUR.1 emitidos posteriormente deviam substituir os justificativos do regime preferencial inicialmente emitidos. Além disso, não resulta dos autos apresentados ao Tribunal de Justiça que a Sandler ou as autoridades do Estado de exportação tivessem pretendido invocar o artigo 18.o do Protocolo n.o 1 ou que os requisitos para a aplicação dessa disposição estavam preenchidos.

64

Nestas circunstâncias, os certificados EUR.1 como os que estão em causa no processo principal podiam, em princípio, ser equiparados aos certificados EUR.1 emitidos a posteriori, e não era por conseguinte legítimo que as autoridades do Estado de importação recusassem aceitá‑los enquanto tais.

65

Assim, as autoridades do Estado de importação são obrigadas, depois de terem apreciado todas as circunstâncias pertinentes, ou a aceitar os novos certificados EUR.1 como retificando o erro técnico cometido no primeiro conjunto de certificados ou, se tiverem dúvidas fundamentadas relativas à autenticidade dos documentos em causa ou à origem dos produtos em causa, a desencadear o procedimento de controlo previsto pelo artigo 32.o do Protocolo n.o 1.

66

Por conseguinte, há que responder à segunda parte da terceira questão que os artigos 16.°, n.os 4 e 5, e 32.° do Protocolo n.o 1 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que as autoridades de um Estado de importação recusem aceitar, como um certificado EUR.1 emitido a posteriori na aceção do artigo 16.o, n.o 1, deste protocolo, um certificado EUR.1 que, estando em conformidade em todos os seus outros elementos com as exigências das disposições desse protocolo, não contém, na casa «Observações», a menção especificada no n.o 4 dessa disposição, mas uma indicação que deve, em definitivo, ser interpretada como significando que o certificado EUR.1 foi emitido nos termos do artigo 16.o, n.o 1, desse protocolo. Em caso de dúvidas relativas à autenticidade desse documento ou à origem dos produtos em causa, essas autoridades são obrigadas a desencadear o procedimento de controlo previsto no artigo 32.o do referido protocolo.

Quanto à quarta questão

67

Atendendo à resposta dada à segunda questão, não há que responder à quarta questão submetida.

Quanto à quinta questão

68

Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não é necessário dar resposta à quinta questão submetida.

Quanto às despesas

69

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

 

1)

O artigo 889.o, n.o 1, primeiro parágrafo, segundo travessão, do Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário, conforme alterado pela última vez pelo Regulamento (CE) n.o 214/2007 da Comissão, de 28 de fevereiro de 2007, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a um pedido de reembolso de direitos quando o regime pautal preferencial foi solicitado e concedido no momento da colocação em livre prática das mercadorias e foi só posteriormente, no âmbito de uma verificação a posteriori ocorrida depois da expiração do regime pautal preferencial e o restabelecimento do direito normalmente devido, que as autoridades do Estado de importação procederam à cobrança da diferença relativamente ao direito aduaneiro aplicável às mercadorias originárias de países terceiros.

 

2)

Os artigos 16.°, n.o 1, alínea b), e 32.° do Protocolo n.o 1 do anexo V do Acordo de parceria entre os estados de África, das Caraíbas e do Pacífico e a Comunidade Europeia e os seus Estados‑Membros assinado em Cotonu, em 23 de junho de 2000, e aprovado em nome da Comunidade pela Decisão 2003/159/CE de Conselho, de 19 de dezembro de 2002, devem ser interpretados no sentido de que, se resultar de um controlo a posteriori que um carimbo aposto no certificado EUR.1 não corresponde ao modelo comunicado pelas autoridades do Estado de exportação, as autoridades aduaneiras do Estado de importação podem recusar esse certificado e restituí‑lo ao importador a fim de lhe permitir obter o certificado a posteriori nos termos do artigo 16.o, n.o 1, alínea b), desse protocolo em vez de desencadear o procedimento previsto no artigo 32.o do referido protocolo.

 

3)

Os artigos 16.°, n.os 4 e 5, e 32.° do Protocolo n.o 1 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que as autoridades de um Estado de importação recusem aceitar, como um certificado EUR.1 emitido a posteriori na aceção do artigo 16.o, n.o 1, deste protocolo, um certificado EUR.1 que, estando em conformidade em todos os seus outros elementos com as exigências das disposições desse protocolo, não contém, na casa «Observações», a menção especificada no n.o 4 dessa disposição, mas uma indicação que deve, em definitivo, ser interpretada como significando que o certificado EUR.1 foi emitido nos termos do artigo 16.o, n.o 1, desse protocolo. Em caso de dúvidas relativas à autenticidade desse documento ou à origem dos produtos em causa, essas autoridades são obrigadas a desencadear o procedimento de controlo previsto no artigo 32.o do referido protocolo.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.