ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

3 de outubro de 2013 ( *1 )

«Diretiva 1999/44/CE — Direitos do consumidor em caso de falta de conformidade do bem — Caráter insignificante dessa falta — Exclusão da rescisão do contrato — Competência do tribunal nacional»

No processo C‑32/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Juzgado de Primera Instancia n.o 2 de Badajoz (Espanha), por decisão de 13 de janeiro de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 23 de janeiro de 2012, no processo

Soledad Duarte Hueros

contra

Autociba SA,

Automóviles Citroën España SA,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: A. Tizzano (relator), presidente de secção, M. Berger, A. Borg Barthet, E. Levits e J.‑J. Kasel, juízes,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 24 de janeiro de 2013,

vistas as observações apresentadas:

em representação de S. Duarte Hueros, por J. Menaya Nieto‑Aliseda, abogado,

em representação da Autociba SA, por M. Ramiro Gutiérrez e L. T. Corchero Romero, abogados,

em representação do Governo espanhol, por S. Centeno Huerta, na qualidade de agente,

em representação do Governo alemão, por F. Wannek, na qualidade de agente,

em representação do Governo francês, por G. de Bergues e S. Menez, na qualidade de agentes,

em representação do Governo húngaro, por M. Z. Fehér, K. Szíjjártó e Z. Biró‑Tóth, na qualidade de agentes,

em representação do Governo polaco, por M. Szpunar e B. Majczyna, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por J. Baquero Cruz e M. van Beek, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 28 de fevereiro de 2013,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativa a certos aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas (JO L 171, p. 12).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe S. Duarte Hueros à Autociba SA (a seguir «Autociba») e à Automóviles Citroën España SA a respeito do seu pedido de rescisão de um contrato de venda de um veículo por falta de conformidade deste com o referido contrato.

Quadro jurídico

Direito da União

3

O primeiro considerando da Diretiva 1999/44 enuncia:

«Considerando que os n.os 1 e 3 do artigo 153.o [CE] estabelece que a Comunidade deve contribuir para a realização de um nível elevado de defesa dos consumidores através de medidas adotadas nos termos do artigo 95.o [CE]».

4

O artigo 1.o, n.o 1, da mesma diretiva dispõe:

«A presente diretiva tem por objetivo a aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros relativas a certos aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, com vista a assegurar um nível mínimo uniforme de defesa dos consumidores no contexto do mercado interno.»

5

O artigo 2.o, n.o 1, da referida diretiva prevê:

«O vendedor tem o dever de entregar ao consumidor bens que sejam conformes com o contrato de compra e venda.»

6

O artigo 3.o da Diretiva 1999/44, sob a epígrafe «Direitos do consumidor», tem a seguinte redação:

«1.   O vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue.

2.   Em caso de falta de conformidade, o consumidor tem direito a que a conformidade do bem seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, nos termos do n.o 3, a uma redução adequada do preço, ou à rescisão do contrato no que respeita a esse bem, nos termos dos n.os 5 e 6.

3.   Em primeiro lugar, o consumidor pode exigir do vendedor a reparação ou a substituição do bem, em qualquer dos casos sem encargos, a menos que isso seja impossível ou desproporcionado.

[…]

5.   O consumidor pode exigir uma redução adequada do preço, ou a rescisão do contrato:

se o consumidor não tiver direito a reparação nem a substituição, ou

se o vendedor não tiver encontrado uma solução num prazo razoável, ou

se o vendedor não tiver encontrado uma solução sem grave inconveniente para o consumidor.

6.   O consumidor não tem direito à rescisão do contrato se a falta de conformidade for insignificante.»

7

O artigo 8.o, n.o 2, da referida diretiva dispõe:

«Os Estados‑Membros podem adotar ou manter, no domínio regido pela presente diretiva, disposições mais estritas compatíveis com o Tratado [CE], com o objetivo de assegurar um nível mais elevado de proteção do consumidor.»

8

Nos termos do artigo 11.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da mesma diretiva:

«Os Estados‑Membros adotarão as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva […]»

Direito espanhol

9

A lei nacional de transposição para o direito espanhol da Diretiva 1999/44 em vigor à época dos factos do litígio no processo principal era a Lei 23/2003 sobre garantias na venda de bens de consumo (Ley 23/2003 de Garantías en la Venta de Bienes de Consumo), de 10 de julho de 2003 (BOE n.o 165, de 11 de julho de 2003, p. 27160, a seguir «Lei 23/2003»).

10

Nos termos do artigo 4.o, primeiro parágrafo, da Lei 23/2003:

«O vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue. Nas condições fixadas na presente lei, reconhece‑se ao consumidor o direito à reparação do bem, ou à sua substituição, à redução do preço e à rescisão do contrato».

11

O artigo 5.o, n.o 1, da referida lei estabelece:

«Se o bem não é conforme ao contrato, o consumidor pode exigir a reparação ou a substituição do bem, a menos que uma dessas possibilidades seja impossível ou desproporcionada. A partir do momento em que o consumidor informa o vendedor da escolha feita, tal vincula ambas as partes. Esta decisão do consumidor não prejudica o disposto no artigo seguinte quando a reparação ou a substituição não permitem colocar o bem em conformidade com o contrato.»

12

O artigo 7.o da mesma lei tem a seguinte redação:

«Procede‑se à redução do preço ou à rescisão do contrato, à escolha do consumidor, quando este não pode exigir a reparação ou a substituição, ou quando a reparação ou a substituição não foram feitas num prazo razoável ou sem inconveniente maior para o consumidor. Não há rescisão quando a falta de conformidade for insignificante.»

13

O artigo 216.o do Código de Processo Civil (Ley de Enjuiciamiento Civil) dispõe:

«Os tribunais cíveis conhecerão dos processos que lhe são submetidos com base nos elementos de facto, nas provas e nos pedidos das partes, salvo se a lei dispuser diferentemente em casos especiais.»

14

O artigo 218.o, n.o 1, do Código de Processo Civil enuncia:

«As decisões judiciais devem ser claras e precisas e devem pronunciar‑se sobre os pedidos e outras pretensões das partes deduzidos oportunamente no processo. Tais decisões incluem as declarações exigidas, condenam ou absolvem o réu e decidem de todos os aspetos controvertidos que foram objeto da discussão.

O tribunal, sem se afastar do pedido ao admitir elementos de facto ou de direito diferentes dos que as partes procuraram alegar, decide nos termos das disposições aplicáveis ao processo, ainda que estas não tenham sido corretamente citadas ou invocadas pelas partes em litígio.»

15

O artigo 400.o do Código de Processo Civil determina:

«1.   Quando os pedidos que constam da petição puderem basear‑se em diversos factos ou em fundamentos jurídicos distintos, devem ser deduzidos na petição os que sejam conhecidos ou possam ser invocados no momento da sua propositura, não sendo permitido reservar a sua alegação para um processo posterior.

[…]

2.   Em conformidade com o disposto no número anterior, para efeitos de litispendência e de caso julgado, os factos e os fundamentos jurídicos invocados num litígio consideram‑se como tendo sido alegados num processo anterior se estes pudessem ter sido alegados neste último.»

16

O artigo 412.o, n.o 1, do Código de Processo Civil prevê:

«Uma vez fixado o objeto do processo na petição, na contestação e, se for o caso, no pedido reconvencional, as partes não o podem alterar posteriormente.»

Litígio no processo principal e questão prejudicial

17

Em julho de 2004, S. Duarte Hueros comprou à Autociba um veículo equipado com uma capota amovível. No mês de agosto seguinte, após o pagamento do veículo pela compradora por um preço de 14320 euros, a Autociba fez a entrega desse veículo.

18

Uma vez que, quando chovia, a água se infiltrava pelo tejadilho para o interior do veículo, S. Duarte Hueros levou este à oficina da Autociba. Sendo infrutíferas as várias tentativas de reparação, S. Duarte Hueros pediu a substituição deste veículo.

19

Na sequência da recusa da Autociba de proceder a essa substituição, S. Duarte Hueros intentou uma ação no Juzgado de Primera Instancia n.o 2 de Badajoz em que pedia a rescisão do contrato de compra e venda e a condenação solidária da Autociba e da Citroën España SA — esta última, na qualidade de fabricante do veículo — ao reembolso do preço de aquisição do veículo.

20

O Juzgado de Primera Instancia n.o 2 de Badajoz salienta, no entanto, que, sendo insignificante o defeito que deu origem ao litígio que lhe foi submetido, improcede o pedido de rescisão do contrato de compra e venda, nos termos do artigo 3.o, n.o 6, da Diretiva 1999/44.

21

Neste contexto, embora S. Duarte Hueros tivesse direito a uma redução do preço de aquisição, com base no artigo 3.o, n.o 5, da referida diretiva, o órgão jurisdicional de reenvio declara, todavia, que essa solução não pode ser acolhida devido às regras processuais internas, designadamente, o artigo 218.o, n.o 1, do Código de Processo Civil, relativo ao princípio da congruência entre o requerido pelas partes e o pronunciado pelos tribunais, uma vez que nenhum pedido tinha sido formulado nesse sentido pelo consumidor, quer a título principal quer a título subsidiário.

22

Por outro lado, visto que S. Duarte Hueros tinha a possibilidade de reclamar tal redução do preço, ainda que a título subsidiário, no quadro do processo principal, nenhum pedido judicial seria admissível num litígio posterior devido ao facto de, em direito espanhol, o princípio do caso julgado abranger todas as reivindicações que teriam podido ser já formuladas num processo anterior.

23

Nestas condições, tendo dúvidas quanto à compatibilidade do direito espanhol com os princípios decorrentes da Diretiva 1999/44, o Juzgado de Primera Instancia n.o 2 de Badajoz decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«No caso de um consumidor, não tendo obtido a reposição do bem em conformidade porque, embora a tenha pedido de forma reiterada, a reparação não foi levada a cabo, pedir judicialmente com caráter exclusivo a resolução do contrato e esta não for procedente por se estar perante uma falta de conformidade insignificante, pode o tribunal conceder oficiosamente ao consumidor uma redução adequada do preço?»

Quanto à questão prejudicial

24

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se a Diretiva 1999/44 se opõe à regulamentação de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, que, quando um consumidor com direito a uma redução adequada do preço de um bem estipulado no contrato de compra e venda se limita a pedir judicialmente apenas a rescisão desse contrato, quando esta não pode ser obtida devido ao caráter insignificante da falta de conformidade desse bem, não permite ao juiz nacional incumbido da apreciação do litígio conceder oficiosamente essa redução, e isto não obstante o referido consumidor não estar autorizado a precisar o seu pedido inicial nem a intentar nova ação para esse efeito.

25

A este propósito, importa recordar que a finalidade da Diretiva 1999/44 consiste, como indicado no seu primeiro considerando, em garantir um nível elevado de defesa dos consumidores (acórdão de 17 de abril de 2008, Quelle, C-404/06, Colet., p. I-2685, n.o 36).

26

Em especial, o artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 1999/44 impõe ao vendedor a obrigação de entregar ao consumidor um bem que seja conforme com o contrato de compra e venda.

27

Nesta perspetiva, nos termos do artigo 3.o, n.o 1, da referida diretiva, o vendedor responde, perante o consumidor, por qualquer falta de conformidade do bem que exista no momento da entrega (v. acórdãos Quelle, já referido, n.o 26, e de 16 de junho de 2011, Gebr. Weber e Putz, C-65/09 e C-87/09, Colet., p. I-5257, n.o 43).

28

O referido artigo 3.o enumera, no seu n.o 2, os direitos que o consumidor pode invocar face ao vendedor em caso de falta de conformidade do bem entregue. Num primeiro momento, nos termos do n.o 3 desse artigo, o consumidor tem o direito de exigir a reposição da conformidade do bem. Não sendo possível repor essa conformidade, pode exigir, num segundo momento, nos termos do n.o 5 do mesmo artigo, uma redução do preço ou a rescisão do contrato (v. acórdãos, já referidos, Quelle, n.o 27, e Gebr. Weber e Putz, n.o 44). Todavia, como resulta do n.o 6 desse artigo 3.o, quando a falta de conformidade do bem entregue for insignificante, o consumidor não tem direito a pedir essa rescisão e, nesse caso, dispõe apenas do direito a pedir uma redução adequada do preço de venda do bem em causa.

29

Neste contexto, como realçou, no essencial, a advogada‑geral no n.o 41 das suas conclusões, importa precisar que o referido artigo 3.o não contém disposições por força das quais o tribunal nacional esteja obrigado, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, a conceder oficiosamente ao consumidor uma redução adequada do preço de venda do bem em causa.

30

O artigo 3.o da Diretiva 1999/44, lido em conjugação com o artigo 11.o, n.o 1, desta última, limita‑se, de facto, a impor aos Estados‑Membros a adoção das medidas necessárias para que o consumidor possa efetivamente exercer os seus direitos, recorrendo a várias opções previstas em caso da falta de conformidade do bem. Como também realçou a advogada‑geral no n.o 25 das suas conclusões, esta diretiva não contém indicações quanto aos mecanismos que permitem invocar os referidos direitos por via judicial.

31

Por conseguinte, na falta de regulamentação da União na matéria, as regras processuais destinadas a assegurar a salvaguarda dos direitos conferidos aos consumidores pela Diretiva 1999/44 são as previstas na ordem jurídica interna dos Estados‑Membros, por força do princípio da autonomia processual destes últimos. No entanto, essas regras não devem ser menos favoráveis do que as que regulam situações análogas de natureza interna (princípio da equivalência) nem ser organizadas de forma a, na prática, tornar impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (v., neste sentido, acórdão de 21 de fevereiro de 2013, Banif Plus Bank, C‑472/11, n.o 26 e jurisprudência referida).

32

Relativamente ao princípio da equivalência, há que salientar que os autos de que o Tribunal de Justiça dispõe não revelam nenhum elemento que permita suscitar dúvidas quanto à conformidade da regulamentação processual espanhola com este princípio.

33

Com efeito, resulta dos autos que esta regulamentação se aplica independentemente do facto de o direito com base no qual foi intentada a ação pelo consumidor ser abrangido pelo direito da União ou pelo direito nacional.

34

No que se refere ao princípio da efetividade, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, cada caso em que se coloque a questão de saber se uma disposição processual nacional torna impossível ou excessivamente difícil a aplicação do direito da União deve ser analisado tendo em conta o lugar que essa disposição ocupa no processo, visto como um todo, no desenrolar deste e nas suas particularidades, perante as várias instâncias nacionais (acórdãos de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito, C‑618/10, n.o 49, e de 14 de março de 2013, Aziz, C‑415/11, n.o 53).

35

No presente caso, decorre da decisão de reenvio que, por um lado, em aplicação dos artigos 216.° e 218.° do Código de Processo Civil, o tribunal nacional está vinculado pelos pedidos apresentados pelo demandante na sua petição e, por outro, este último não pode modificar o objeto de tal pedido no decurso do processo, nos termos do artigo 412.o, n.o 1, do mesmo código.

36

Além disso, por força do artigo 400.o do referido código, o demandante não tem possibilidade de intentar nova ação alegando pretensões que teria podido invocar, pelo menos a título subsidiário, no momento de um processo anterior. Com efeito, com base no princípio do caso julgado, essa ação seria inadmissível.

37

Por conseguinte, decorre destas indicações que, no sistema processual espanhol, um consumidor que requer judicialmente a rescisão do contrato de compra e venda de um bem fica definitivamente impossibilitado de beneficiar do direito de obter a redução adequada do preço deste, ao abrigo do artigo 3.o, n.o 5, da Diretiva 1999/44, se o juiz nacional incumbido de apreciar o litígio considerar que, na realidade, a falta de conformidade deste bem reveste um caráter insignificante, exceto quando for apresentado, a título subsidiário, um pedido em que se solicita a concessão dessa redução.

38

A este respeito, importa, no entanto, declarar que, tendo em conta o desenrolar e as especificidades do referido sistema processual, essa hipótese deve ser considerada como muito improvável, porquanto existe um risco não despiciendo de o consumidor em causa não apresentar um pedido subsidiário, o qual, de resto, visaria obter uma proteção inferior à visada com o pedido principal, quer devido à obrigação particularmente rígida de concomitância com esta última, quer porque ignora ou não se apercebe do alcance dos seus direitos (v., por analogia, acórdão Aziz, já referido, n.o 58).

39

Neste contexto, cumpre concluir que tal regime processual, ao não permitir ao tribunal nacional reconhecer oficiosamente o direito de o consumidor obter uma redução adequada do preço de venda do bem, quando este não está autorizado a precisar o seu pedido inicial nem a propor nova ação para esse efeito, é de molde a prejudicar a efetividade da proteção dos consumidores pretendida pelo legislador da União.

40

Com efeito, o sistema espanhol exige, no essencial, ao consumidor que antecipe o resultado da apreciação relativa à qualificação jurídica da falta de conformidade do bem que deve ser efetuada, a título definitivo, pelo juiz competente, o que confere uma natureza meramente aleatória e, portanto, inadequada à proteção que é concedida pelo artigo 3.o, n.o 5, da Diretiva 1999/44. E tanto mais quanto, como no processo principal, essa análise se revela particularmente complexa, de modo que a referida qualificação depende de modo determinante da instrução levada a cabo pelo juiz a quem foi submetido o litígio.

41

Nestas condições, como realçou a advogada‑geral no n.o 31 das suas conclusões, há que concluir que a regulamentação espanhola em causa no processo principal não se afigura conforme com o princípio da efetividade, dado que a mesma torna excessivamente difícil ou mesmo impossível nos processos judiciais intentados pelos consumidores em caso de falta de conformidade com o contrato de compra e venda do bem entregue a aplicação da proteção conferida pela Diretiva 1999/44 a estes últimos.

42

Assim sendo, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar quais as disposições nacionais aplicáveis ao litígio que lhe foi submetido e fazer tudo o que for da sua competência, tomando em consideração o direito interno no seu todo e aplicando os métodos de interpretação por este reconhecidos, para garantir a plena eficácia do artigo 3.o, n.o 5, da Diretiva 1999/44 e alcançar uma solução conforme com o objetivo prosseguido por esta (v., neste sentido, acórdão de 24 de janeiro de 2012, Dominguez, C‑282/10, n.o 27 e jurisprudência referida).

43

Atendendo às considerações precedentes, há que responder à questão submetida que a Diretiva 1999/44 deve ser interpretada no sentido de que se opõe à regulamentação de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, que, quando um consumidor com direito a uma redução adequada do preço de um bem estipulado no contrato de compra e venda se limita a pedir judicialmente apenas a rescisão desse contrato, quando esta não pode ser obtida devido ao caráter insignificante da falta de conformidade desse bem, não permite ao juiz nacional incumbido de apreciar o litígio conceder oficiosamente essa redução, e isto não obstante o referido consumidor não estar autorizado a precisar o seu pedido inicial nem a intentar nova ação para esse efeito.

Quanto às despesas

44

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

A Diretiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativa a certos aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, deve ser interpretada no sentido de que se opõe à regulamentação de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, que, quando um consumidor com direito a uma redução adequada do preço de um bem estipulado no contrato de compra e venda se limita a pedir judicialmente apenas a rescisão desse contrato, quando esta não pode ser obtida devido ao caráter insignificante da falta de conformidade desse bem, não permite ao juiz nacional incumbido de apreciar o litígio conceder oficiosamente essa redução, e isto não obstante o referido consumidor não estar autorizado a precisar o seu pedido inicial nem a intentar nova ação para esse efeito.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.