CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NILS WAHL

apresentadas em 12 de março de 2015 ( 1 )

Processo C‑497/12

Davide Gullotta

Farmacia di Gullotta Davide & C. Sas

contra

Ministero della Salute

Azienda Sanitaria Provinciale di Catania

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunale Amministrativo Regionale per la Sicilia (Itália)]

«Pedidos de decisão prejudicial — Competência do Tribunal de Justiça — Admissibilidade das questões — Elementos de facto do processo principal circunscritos a um Estado‑Membro — Âmbito da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Liberdade de estabelecimento — Saúde pública — Parafarmácias»

1. 

Na sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça tem sublinhado, de forma constante, que o processo de decisão prejudicial é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça da União Europeia e os órgãos jurisdicionais nacionais, graças ao qual o primeiro fornece aos segundos os elementos de interpretação do direito da União que lhes são necessários para a resolução do litígio que lhes foi submetido ( 2 ). O Tribunal de Justiça realçou igualmente o espírito de colaboração inerente a este processo, que implica que os órgãos jurisdicionais nacionais tenham em consideração a função cometida ao Tribunal de Justiça, que é ajudá‑los na administração da justiça nos Estados‑Membros, e não formular opiniões sobre questões gerais ou hipotéticas ( 3 ).

2. 

Estes princípios têm ainda maior significado hoje em dia, na medida em que o Tribunal de Justiça tem sido, ano após ano, chamado a proferir um número de decisões sem precedentes, a maioria das quais respeitante, precisamente, a pedidos de decisão prejudicial ( 4 ). Nalgumas decisões prejudiciais, o Tribunal de Justiça tem de interpretar disposições em novos domínios do direito da União, noutras tem de aplicar os princípios fundamentais da ordem jurídica da UE a novos conjuntos de circunstâncias que podem suscitar questões éticas ou sociopolíticas especialmente delicadas ( 5 ).

3. 

Apesar de, no passado, o Tribunal de Justiça se ter mostrado relativamente relutante em declarar‑se incompetente ao abrigo do artigo 267.o TFUE e generoso na apreciação da admissibilidade dos pedidos, hoje pode questionar‑se se o Tribunal de Justiça não deverá adotar uma postura mais rigorosa nessas matérias. Como já referi anteriormente, o alargamento substancial da competência do Tribunal de Justiça, em consequência da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, associado à expansão da União Europeia ao longo da última década, culminando na recente adesão da Croácia, pode ter um impacto significativo na capacidade do Tribunal de Justiça para decidir os litígios com a necessária rapidez, mantendo simultaneamente a qualidade das suas decisões ( 6 ).

4. 

Na minha opinião, o processo em apreço proporciona uma oportunidade para clarificar melhor a jurisprudência do Tribunal de Justiça nesta matéria, chamando a atenção para algumas decisões recentes do Tribunal de Justiça que apontam para determinados desenvolvimentos. Na minha opinião, esses desenvolvimentos estão em consonância com a análise proposta nas presentes conclusões.

I – Quadro jurídico

5.

Em Itália, a Lei n.o 468/1913 definiu a prestação de serviços farmacêuticos como uma «atividade essencialmente pública» que só podia ser levada a cabo por farmácias municipais ou por farmácias privadas com licença do governo. Foi instituído um instrumento administrativo para controlar a oferta: a pianta organica, que consiste numa espécie de quadro orgânico concebido para assegurar a distribuição equitativa de medicamentos em todo o território nacional. É importante referir que, posteriormente, o Decreto Real n.o 1265/1934 circunscreveu a venda de todos os tipos de medicamentos exclusivamente às farmácias (artigo 122.o).

6.

Mais tarde, a Lei n.o 537/1993 requalificou os medicamentos com base nas seguintes classes: «classe A», para medicamentos essenciais e medicamentos para doenças crónicas; «classe B», para medicamentos (não incluídos na «classe A») de interesse significativo do ponto de vista terapêutico; e «classe C», para medicamentos não incluídos nas classes A ou B. Nos termos do artigo 8.o, n.o 14, da Lei n.o 537/1993, o custo dos medicamentos abrangidos pelas classes A e B deve ser integralmente suportado pelo Servizio Sanitario Nazionale (serviço nacional de saúde italiano, a seguir «SSN»), enquanto o custo dos medicamentos da classe C deve ser integralmente suportado pelo utente.

7.

Posteriormente, o artigo 85.o, n.o 1, da Lei n.o 388/2000 suprimiu a «classe B», e o artigo 1.o da Lei n.o 311/2004 criou uma nova categoria de medicamentos — a «classe C‑a» — de forma a abranger medicamentos que não estão sujeitos a receita médica e que, ao contrário dos produtos abrangidos pelas outras categorias, podem ser objeto de publicidade (habitualmente designados por «medicamentos de venda livre»). Tal como no caso dos medicamentos da classe C, o custo dos medicamentos da classe C‑a deve ser suportado pelo utente.

8.

O Decreto‑Lei n.o 223/2006, convertido na Lei n.o 248/2006, permitiu a abertura de novos estabelecimentos comerciais, diferentes das farmácias. Estes são habitualmente designados por «parafarmácias» e estão autorizados a vender medicamentos de venda livre (produtos da «classe C‑a)»).

9.

Mais recentemente, o Decreto‑Lei n.o 201/2011, convertido na Lei n.o 214/2011, alargou o leque de categorias de medicamentos que podem ser vendidos em parafarmácias, pelo que, atualmente, estas podem disponibilizar ao público alguns medicamentos da classe C para os quais não seja exigida receita médica. A referida legislação foi aplicada pelo Decreto Ministerial de 18 de abril de 2012. Por último, o Decreto‑Lei n.o 1/2012, convertido na Lei n.o 27/2012, aumentou o número de farmácias previsto na pianta organica: atualmente, a lei prevê que, em vez de uma farmácia por cada 4500 pessoas, deve existir uma farmácia por cada 3300 pessoas.

II – Factos, processo e questões prejudiciais

10.

D. G. Gullotta (a seguir «recorrente») é um farmacêutico qualificado que está inscrito na Ordine dei Farmacisti di Catania (Ordem dos Farmacêuticos de Catânia) e gere uma parafarmácia em Itália.

11.

No processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio, o recorrente impugnou, no Tribunale Amministrativo Regionale per la Sicilia (a seguir «TAR da Sicília»), a Decisão n.o 0034681 do Ministero della Salute (Ministério da Saúde), de 13 de agosto de 2011 (a seguir «decisão impugnada»), que indeferiu o pedido de autorização apresentado pelo recorrente para vender medicamentos que estão sujeitos a receita médica, mas cujo custo não é objeto de comparticipação pelo SSN. O recorrente alegou que a legislação italiana aplicada pelo Ministero della Salute na decisão impugnada é incompatível com o direito da União, por vários motivos.

12.

No contexto desse processo, o órgão jurisdicional italiano, tendo dúvidas sobre a compatibilidade da legislação italiana em causa com o direito da União, decidiu suspender o processo e submeter as três questões seguintes para decisão prejudicial:

«1)

Os princípios da liberdade de estabelecimento, da não discriminação e da proteção da concorrência, consagrados nos artigos 49.° e segs. TFUE, opõem‑se a uma legislação nacional que não permite a um farmacêutico qualificado e inscrito na sua ordem profissional, mas que não explora um estabelecimento comercial integrado na pianta organica [quadro orgânico], vender a retalho, na parafarmácia de que é proprietário, medicamentos sujeitos a prescrição médica em ‘receita livre’, ou seja, não comparticipados pelo serviço nacional de saúde e pagos integralmente pelos cidadãos, e que estabelece também neste setor uma proibição de venda de determinadas categorias de medicamentos e uma contingentação do número de estabelecimentos comerciais que podem existir em território nacional?

2)

Deve o artigo 15.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [a seguir «Carta»] ser interpretado no sentido de que o princípio aí consagrado é aplicável sem limites também à profissão de farmacêutico, sem que a relevância pública desta profissão justifique regimes diferentes entre farmacêuticos que exploram farmácias e farmacêuticos que exploram parafarmácias no que respeita à venda dos medicamentos referidos na questão 1?

3)

Devem os artigos 102.° [TFUE] e 106.° [TFUE] ser interpretados no sentido de que a proibição de abuso de posição dominante é aplicável sem limites à profissão de farmacêutico, na medida em que o farmacêutico que explora uma farmácia tradicional, ao vender medicamentos ao abrigo de convenç[ão] com o [SSN], beneficia da proibição imposta aos titulares de parafarmácias de venderem medicamentos da classe C, sem que isso tenha uma justificação válida nas inegáveis especificidades da profissão de farmacêutico decorrentes do interesse público na proteção da saúde dos cidadãos?»

13.

Tendo‑lhe sido enviada uma cópia do acórdão Venturini ( 7 ) do Tribunal de Justiça, respeitante à mesma legislação nacional que está em causa no processo em apreço, o TAR da Sicília informou o Tribunal de Justiça, por ofício de 1 de agosto de 2014, de que desejava manter a segunda e a terceira questões submetidas para decisão prejudicial.

14.

No presente processo, foram apresentadas observações escritas por D. G. Gullotta, pela Federfarma, pelos Governos italiano, grego e espanhol, bem como pela Comissão. O Tribunal de Justiça decidiu não realizar a audiência.

III – Análise

15.

Antes de analisar sucessivamente cada uma das questões submetidas a título prejudicial, considero que é útil tecer algumas considerações prévias sobre dois conceitos distintos mas intimamente relacionados: a competência do Tribunal de Justiça nos termos do artigo 267.o TFUE e a admissibilidade dos pedidos de decisão prejudicial. Com efeito, as partes que apresentaram observações no presente processo parecem confundir um pouco esses dois conceitos. Tal não é surpreendente, uma vez que, no passado, o Tribunal de Justiça nem sempre adotou uma terminologia coerente na sua jurisprudência.

A – Considerações prévias sobre a competência do Tribunal de Justiça e a admissibilidade dos pedidos de decisão prejudicial

16.

O papel e as funções do Tribunal de Justiça são regulados, tal como os de qualquer outra instituição da União Europeia, pelo princípio da atribuição. A este respeito, o artigo 13.o, n.o 2, TUE dispõe: «[c]ada instituição atua dentro dos limites das atribuições que lhe são conferidas pelos Tratados, de acordo com os procedimentos, condições e finalidades que estes estabelecem».

17.

Consequentemente, a competência do Tribunal de Justiça é estabelecida pelo sistema jurisdicional previsto nos Tratados, ao qual apenas se pode recorrer quando estejam preenchidas as condições estabelecidas nas disposições aplicáveis ( 8 ).

18.

No que diz respeito ao processo de reenvio prejudicial, o artigo 267.o TFUE faz depender expressamente a competência do Tribunal de Justiça de várias condições ( 9 ). Mais concretamente, nos termos do primeiro parágrafo dessa disposição, as questões submetidas para decisão prejudicial devem dizer respeito a disposições do direito da União cuja interpretação ou validade suscite dúvidas no processo principal. Além disso, nos termos do segundo parágrafo dessa disposição, o organismo que submete a questão prejudicial deve ser um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro e a decisão sobre a questão prejudicial submetida deve ser necessária ao julgamento da causa no processo principal. Esta última condição significa, em especial, que no órgão jurisdicional de reenvio deve encontrar‑se pendente um verdadeiro litígio e que a resposta do Tribunal de Justiça deve ser relevante para a resolução desse litígio ( 10 ).

19.

Estas condições devem estar preenchidas não apenas no momento em que o órgão jurisdicional nacional apresenta o pedido ao Tribunal de Justiça, mas igualmente durante o processo. Se as condições não estiverem, ou deixarem de estar, preenchidas, o Tribunal de Justiça deve declarar‑se incompetente, podendo fazê‑lo em qualquer fase do processo ( 11 ).

20.

Se, por outro lado, a informação disponibilizada pelo órgão jurisdicional de reenvio não for suficiente para que o Tribunal de Justiça estabeleça, de forma clara, a sua competência, ou melhor, para que dê uma resposta que possa ser útil ao órgão jurisdicional de reenvio, o reenvio prejudicial pode ser declarado inadmissível. A informação que deve ser incluída no pedido de decisão prejudicial consta do artigo 94.o do Regulamento de Processo. Essa informação tem, de facto, um duplo objetivo: permite não só que o Tribunal de Justiça dê respostas úteis, mas igualmente que os governos dos Estados‑Membros e outros interessados apresentem observações nos termos do artigo 23.o do Estatuto do Tribunal de Justiça ( 12 ).

21.

Assim, as duas situações acima descritas (incompetência e inadmissibilidade do pedido) dizem respeito a duas questões processuais diferentes. Enquanto a incompetência traduz essencialmente um limite à competência do Tribunal de Justiça, na medida em que não lhe é reconhecido o poder de decidir em determinadas situações, a inadmissibilidade surge normalmente em consequência de um erro processual, devido à inobservância de normas processuais pelo órgão jurisdicional de reenvio.

22.

Consequentemente, do ponto de vista teórico, deve distinguir‑se estas duas situações ( 13 ).Contudo, existe igualmente um aspeto mais prático nessa distinção. A incompetência não pode, em princípio, ser solucionada ou corrigida pelo órgão jurisdicional de reenvio. Consequentemente, um pedido de decisão prejudicial rejeitado por incompetência está condenado a nunca ser apreciado pelo Tribunal de Justiça, a menos que, obviamente, existam elementos de facto essenciais dos quais o Tribunal de Justiça não tenha tomado conhecimento ( 14 ). Pelo contrário, um órgão jurisdicional nacional cujo pedido seja considerado inadmissível pode, se for caso disso, submeter um novo pedido de decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça, que preencha todas as condições previstas no artigo 94.o do Regulamento de Processo ( 15 ).

23.

É possível traçar um paralelismo entre os pedidos de decisão prejudicial e os recursos diretos. No contexto dos recursos diretos, os tribunais da UE normalmente também distinguem os processos em que carecem de competência dos processos em que o pedido é inadmissível. Por exemplo, um recurso de anulação é rejeitado por incompetência se o recorrente impugnar a validade de atos adotados por autoridades nacionais ( 16 ), ou de sentenças proferidas por órgãos jurisdicionais nacionais ( 17 ) ou por outros tribunais internacionais ( 18 ). De igual modo, os tribunais da UE declararam‑se incompetentes em matéria de ações de indemnização contra organismos não pertencentes à UE, tais como as autoridades dos Estados‑Membros ( 19 ).

24.

Em contrapartida, erros processuais cometidos por um recorrente que impeçam a continuação da ação conduzem apenas à declaração da inadmissibilidade do pedido. Tal é normalmente o caso, por exemplo, dos recursos de anulação interpostos após o término do prazo de dois meses previsto no artigo 263.o TFUE ( 20 ), dos recursos interpostos por pessoas que não estejam representadas por um advogado ( 21 ) ou das ações por incumprimento intentadas sem observância da fase pré‑contenciosa do processo prevista no artigo 258.o TFUE ( 22 ).

25.

Dito isto, a diferença entre incompetência e inadmissibilidade não deve ser sobrevalorizada, uma vez que, na prática, ambas podem conduzir ao mesmo resultado. O Tribunal de Justiça rejeita o pedido do órgão jurisdicional nacional, sem entrar em discussão relativamente à substância das questões submetidas a título prejudicial.

B – Questão 1

26.

Através da sua primeira questão, o TAR da Sicília pretende essencialmente obter uma orientação do Tribunal de Justiça quanto à compatibilidade, com as normas da UE relativas à liberdade de estabelecimento, de uma legislação nacional que reserva às farmácias a venda de medicamentos sujeitos a receita médica, mas cujo custo não é suportado pelo SSN, mas sim pelo utente.

27.

Devo salientar desde já que, na minha opinião, deve considerar‑se que a questão em apreço foi retirada pelo órgão jurisdicional de reenvio.

28.

No processo que deu origem ao acórdão Venturini, supra referido, foi submetida ao Tribunal de Justiça uma questão análoga pelo TAR da Lombardia ( 23 ). A Secretaria do Tribunal de Justiça enviou ao TAR da Sicília uma cópia do acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça nesse processo. Em resposta, o TAR da Sicília afirmou que pretendia manter a segunda e a terceira questões, embora não se tenha pronunciado expressamente quanto à primeira questão. Consequentemente, pode inferir‑se dessa resposta, a contrario, que o órgão jurisdicional de reenvio pretendeu retirar a primeira questão. O teor geral da resposta do TAR da Sicília, na qual este órgão jurisdicional tem em conta o acórdão Venturini, parece corroborar esta conclusão.

29.

Assim, abordarei a questão 1 apenas de forma sintética, uma vez que me dará oportunidade de realçar algumas questões processuais importantes.

1. Competência do Tribunal de Justiça

30.

A Federfarma contesta a admissibilidade da primeira questão. A Federfarma alega que todos os aspetos do processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio estão circunscritos à Itália. Consequentemente, na medida em que as normas da EU em matéria de liberdade de estabelecimento não são aplicáveis, a questão deve ser considerada hipotética.

31.

É verdade que, de acordo com jurisprudência assente, quando a situação de facto no processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio não apresenta qualquer elemento de conexão com o exercício de uma liberdade fundamental, em princípio a apreciação da compatibilidade da legislação nacional aplicável com as disposições da UE invocadas não é necessária para que o órgão jurisdicional nacional possa tomar uma decisão. Uma vez que as normas do Tratado não são aplicáveis no processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio, a resposta às questões submetidas a título prejudicial não é relevante para a resolução do litígio ( 24 ).

32.

Dito isto, em vários processos o Tribunal de Justiça considerou que era competente e proferiu um acórdão, apesar de estar em causa uma situação de facto puramente interna de um Estado‑Membro.

33.

Nas conclusões que apresentei no processo que deu origem ao acórdão Venturini, procurei fazer um apanhado desses casos, agrupando‑os em três linhas de jurisprudência principais. Na primeira linha de jurisprudência (a seguir «jurisprudência Oosthoek»), o Tribunal de Justiça salientou que, com base na informação contida nos autos, embora os factos do processo estivessem circunscritos ao interior de um único Estado‑Membro, não podiam ser afastados certos efeitos transfronteiriços da legislação nacional impugnada. Na segunda linha de jurisprudência (a seguir «jurisprudência Guimont»), o Tribunal de Justiça considerou admissíveis as questões submetidas a título prejudicial, não obstante o caráter interno do processo principal, na medida em que a interpretação solicitada do direito da União afigurava‑se útil ao órgão jurisdicional de reenvio, uma vez que o direito nacional lhe impunha que atribuísse a um cidadão nacional os mesmos direitos que um nacional de outro Estado‑Membro na mesma situação retiraria do direito da União, ou seja, o direito nacional proibia a discriminação inversa contra cidadãos nacionais. Por último, numa terceira linha de jurisprudência (a seguir «jurisprudência Thomasdünger»), o Tribunal de Justiça declarou‑se competente para se pronunciar, a título prejudicial, sobre questões de direito da União em situações nas quais os factos no processo no órgão jurisdicional de reenvio saíam do âmbito de aplicação direto das disposições da União, mas em que as referidas disposições tinham passado a ser aplicáveis por força da legislação nacional, a qual era conforme, nas soluções dadas a situações internas, às soluções do direito da União ( 25 ).

34.

Após identificar estas linhas de jurisprudência, considerei que constituíam uma aplicação correta do artigo 267.o TFUE. Com efeito, diziam respeito a casos em que, embora todos os elementos de facto estivessem circunscritos ao interior de um único Estado‑Membro, os elementos de direito relevantes não estavam. Contudo, acrescentei igualmente que, nalguns desses casos, o Tribunal de Justiça parece ter‑se declarado competente com base em meras presunções, sem verificar se as condições relevantes estavam realmente preenchidas. Com efeito, os pedidos de decisão prejudicial não continham nenhum elemento que permitisse ao Tribunal de Justiças estabelecer, de forma clara, a sua competência. Considerei — e ainda hoje considero — essa abordagem problemática ( 26 ).

35.

Uma vez que a competência do Tribunal de Justiça em situações que são puramente internas e de um único Estado‑Membro constitui uma exceção a um princípio geral, nas conclusões que apresentei no processo Venturini, sugeri que o Tribunal de Justiça fosse mais rigoroso ao verificar se as condições relevantes estão preenchidas ( 27 ). Em especial, propus que o Tribunal de Justiça se declarasse incompetente nos casos em que nem os autos nem o texto do pedido de decisão prejudicial exponham os motivos pelos quais o Tribunal de Justiça pode ter competência, não obstante o caráter puramente interno do processo principal. A este respeito, salientei que, nesse tipo de situações, devia incumbir ao órgão jurisdicional nacional explicar ao Tribunal de Justiça o motivo pelo qual, por exemplo, a aplicação da medida nacional em apreço é potencialmente suscetível de dificultar o exercício de uma liberdade fundamental pelos operadores económicos estrangeiros, ou indicar a existência, na sua ordem jurídica nacional, de uma norma ou princípio contra a discriminação inversa suscetível de ser aplicada à situação em apreço ( 28 ).

36.

Posteriormente, no acórdão Airport Shuttle Express, a advogada‑geral J. Kokott chegou a uma conclusão idêntica. Também ela, nas suas conclusões, se manifestou crítica em relação a várias decisões nas quais o Tribunal de Justiça respondeu às questões submetidas a título prejudicial, não obstante a aparente inexistência de qualquer aspeto transfronteiriço nos elementos de facto do processo principal. A advogada‑geral J. Kokott sugeriu que o Tribunal de Justiça fosse mais cauteloso na apreciação da sua competência ao abrigo do artigo 267.o TFUE nos casos que se afigurem puramente internos de um Estado‑Membro. Reconheceu que o Tribunal de Justiça pode, ainda assim, ter de responder nalguns desses casos, por exemplo, quando o direito nacional aplicável se oponha a uma discriminação inversa. Contudo, a advogada‑geral J. Kokott realçou que, nessas circunstâncias, cabe ao órgão jurisdicional nacional fornecer ao Tribunal de Justiça informações detalhadas, atualizadas e fiáveis sobre esse aspeto do direito nacional. Na falta de tais informações no despacho de reenvio, o Tribunal de Justiça não deve considerar‑se competente de ânimo leve, pelo que, em geral, deve recusar responder às questões submetidas a título prejudicial ( 29 ).

37.

Desde então, várias decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça parecem indiciar um maior rigor na avaliação, pelo Tribunal de Justiça, da sua competência ao abrigo do artigo 267.o TFUE quando, não obstante o facto de o litígio ser puramente interno, o órgão jurisdicional nacional solicita a interpretação das disposições do Tratado em matéria de liberdades fundamentais.

38.

Com efeito, no acórdão Airport Shuttle Express, supra referido, o Tribunal de Justiça seguiu as conclusões da advogada‑geral J. Kokott e declarou‑se incompetente para responder à questão colocada pelo órgão jurisdicional nacional, relativa à interpretação do artigo 49.o TFUE. O Tribunal de Justiça realçou que o processo principal dizia respeito a uma situação puramente interna da Itália e que o pedido de decisão prejudicial não continha qualquer informação sobre a forma como as medidas nacionais impugnadas pelos recorrentes eram suscetíveis de afetar operadores económicos estrangeiros. Consequentemente, o Tribunal de Justiça concluiu que a interpretação do artigo 49.o TFUE solicitada não era relevante para os processos pendentes no órgão jurisdicional de reenvio ( 30 ).

39.

No despacho Tudoran, o Tribunal de Justiça recusou pronunciar‑se sobre uma questão que dizia respeito à compatibilidade de determinadas disposições do Código de processo Civil romeno com os artigos 49.° e 56.° TFUE, na medida em que a situação em apreço no processo principal era uma situação puramente interna da Roménia e que nada no pedido de decisão prejudicial indicava que a jurisprudência Guimont ou Thomasdünger ( 31 ), supra referida, pudesse ser aplicada ( 32 ).

40.

De igual modo, no despacho Szabó, o Tribunal de Justiça declarou‑se incompetente para responder a uma das questões submetidas a título prejudicial, uma vez que o processo principal dizia respeito a um caso puramente interno da Hungria e que o órgão jurisdicional de reenvio não explicara por que razão considerava que as disposições de direito da União cuja interpretação solicitava podiam ser aplicáveis nesse processo ( 33 ).

41.

O Tribunal de Justiça seguiu uma abordagem idêntica noutros processos que não diziam respeito a liberdades fundamentais mas que, dada a inexistência de qualquer nexo de ligação com o direito da União, considerou que diziam respeito a situações puramente internas dos Estados‑Membros em causa. Por exemplo, no acórdão C, o Tribunal de Justiça recusou responder a um pedido de decisão prejudicial que dizia respeito à interpretação de uma disposição da Diretiva 2004/80/CE relativa à indemnização das vítimas da criminalidade ( 34 ), uma vez que a recorrente no processo principal fora vítima de um crime violento cometido no território do Estado‑Membro da sua residência. Em primeiro lugar, o Tribunal de Justiça realçou que a Diretiva 2004/80 só prevê uma indemnização no caso de ser cometido um crime doloso violento num Estado‑Membro diferente daquele em que a vítima tem a sua residência habitual. Em seguida, salientou que, de acordo com jurisprudência assente, mesmo numa situação puramente interna, o Tribunal de Justiça pode proceder à interpretação solicitada quando o direito nacional obrigue o órgão jurisdicional de reenvio a evitar a discriminação inversa contra os cidadãos nacionais. Contudo, o Tribunal de Justiça acrescentou que não lhe incumbe tomar essa iniciativa se não resultar do pedido de decisão prejudicial que o órgão jurisdicional de reenvio está efetivamente sujeito à referida obrigação. É de notar que o despacho de reenvio nesse processo nada referia a esse respeito ( 35 ).

42.

Além disso, no despacho De Bellis e o., o Tribunal de Justiça declarou‑se incompetente para responder a uma questão sobre o princípio da proteção da confiança legítima, uma vez que a situação em análise não tinha qualquer conexão com o direito da União e que as disposições nacionais relevantes não continham qualquer referência expressa ao direito da União. Por conseguinte, as condições estabelecidas na jurisprudência Thomasdünger não estavam preenchidas ( 36 ).

43.

À luz destas decisões recentes, concluo que o Tribunal de Justiça, em processos que sejam puramente internos, já não parece presumir que as condições para se declarar competente se encontram reunidas quando os autos contenham apenas indícios vagos nesse sentido. Nesses casos, o Tribunal de Justiça exige agora que o órgão jurisdicional de reenvio forneça uma explicação mais compreensível e fundamentada dos motivos pelos quais considera que o Tribunal de Justiça é competente.

44.

Estes desenvolvimentos na jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à apreciação da sua competência ao abrigo do artigo 267.o TFUE são bem‑vindos. O desejo do Tribunal de Justiça de cooperar com os órgãos jurisdicionais nacionais não deve, na minha opinião, levá‑lo a responder a questões que possam ser hipotéticas e, como tal, em casos em que a sua competência seja, no mínimo, duvidosa.

45.

Neste contexto, se esta questão não tivesse sido retirada, talvez o Tribunal de Justiça pudesse ter suscitado oficiosamente a questão da sua competência para se pronunciar ( 37 ).Com efeito, é ponto assente que todos os elementos de facto no processo principal estão circunscritos à Itália: o recorrente é cidadão italiano e reside e explora uma parafarmácia na Itália. No despacho de reenvio, não é possível encontrar nenhuma referência a quaisquer elementos transfronteiriços. O despacho também não fornece nenhuma outra informação quanto à razão pela qual a interpretação do artigo 49.o TFUE pode, todavia, ser útil para a resolução do litígio. Em especial, não é referido que alguma disposição relevante do direito italiano deva ser interpretada da mesma forma que o direito da União. Mais ainda, em nenhum lado é afirmado que, no processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio, os recorrentes podem ser protegidos por uma norma nacional que proíbe a discriminação inversa.

46.

O facto de um ou mais pedidos de decisão prejudicial anteriores, provenientes do mesmo Estado‑Membro, se reportarem mais concretamente a uma norma ou princípio que proíbe a discriminação inversa em detrimento dos cidadãos nacionais não constitui uma base sólida para presumir que tal norma ou princípio é igualmente aplicável no processo atualmente pendente no órgão jurisdicional de reenvio. Tal presunção não passaria de mera especulação, uma vez que o Tribunal de Justiça não está (nem pode estar) em condições de conhecer com exatidão o âmbito de aplicação dessa norma ou princípio, ou a sua posição na hierarquia das normas, ou os desenvolvimentos legislativos ou judiciais relevantes nesse Estado‑Membro ( 38 ).

2. Substância

47.

Quanto à substância da primeira questão submetida para decisão prejudicial, no caso improvável de o Tribunal de Justiça pretender pronunciar‑se sobre ela, a resposta parece‑me, de qualquer forma, clara.

48.

No acórdão Venturini, o Tribunal de Justiça considerou que a legislação nacional em apreço era suscetível de dificultar e tornar menos atrativo o estabelecimento, no território italiano, de um farmacêutico nacional de outro Estado‑Membro, que tivesse a intenção de aí explorar uma parafarmácia. Consequentemente, essa legislação constituía uma restrição à liberdade de estabelecimento para efeitos do artigo 49.o TFUE. No entanto, o Tribunal de Justiça considerou que tal legislação se afigurava adequada para garantir a realização do objetivo de assegurar um fornecimento seguro e de qualidade de medicamentos à população, bem como, consequentemente, a proteção da saúde pública, e não parecia ir além do que era necessário para alcançar esse objetivo ( 39 ).

49.

Uma vez que a legislação nacional em causa no processo principal é a mesma que foi objeto de análise pelo Tribunal de Justiça no acórdão Venturini, a resposta à questão 1 — se esta não tivesse sido retirada — teria de ser idêntica: o artigo 49.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que não obsta a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio, que não permite a um farmacêutico vender a retalho, na parafarmácia de que é proprietário, medicamentos sujeitos a receita médica que não são comparticipados pelo SSN e que são pagos pelo cliente.

C – Questão 2

50.

Através da segunda questão, o TAR da Sicília pretende essencialmente saber se o artigo 15.o da Carta («Liberdade profissional e direito de trabalhar») deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio, que estabelece uma distinção, no que respeita ao direito a vender os medicamentos referidos na questão 1, entre farmacêuticos que são proprietários de farmácias e farmacêuticos que são proprietários de parafarmácias.

1. Competência do Tribunal de Justiça

51.

O Governo italiano e a Comissão alegam que o Tribunal de Justiça não tem competência para responder à segunda questão submetida pelo TAR da Sicília, na medida em que a Carta não se aplica à situação em causa no processo principal.

52.

Não considero que esta posição esteja correta.

53.

De acordo com uma linha jurisprudencial atualmente consolidada, o âmbito de aplicação da Carta no que respeita à ação dos Estados‑Membros está definido no artigo 51.o, n.o 1, da mesma, nos termos do qual as disposições da Carta têm como destinatários os Estados‑Membros apenas quando apliquem o direito da União ( 40 ).

54.

A referida disposição confirma igualmente a jurisprudência assente segundo a qual os direitos fundamentais garantidos pela ordem jurídica da União são aplicáveis em todas as situações reguladas pelo direito da União, mas não fora dessas situações ( 41 ). Quando uma situação jurídica não esteja abrangida pelo direito da União, o Tribunal de Justiça não tem competência para dela conhecer e quaisquer disposições da Carta invocadas não podem, por si próprias, servir de base a essa competência ( 42 ).

55.

Neste contexto, deve igualmente referir‑se que o conceito de «aplicação do direito da União», referido no artigo 51.o, n.o 1, da Carta, impõe a existência de um certo grau de conexão, que ultrapassa a mera proximidade das matérias em causa ou as incidências indiretas de uma matéria na outra ( 43 ). Para determinar se uma legislação nacional implica a aplicação do direito da União, para efeitos do artigo 51.o da Carta, importa verificar: i) se essa legislação tem como objetivo aplicar uma disposição do direito da União; ii) qual o caráter dessa legislação e se a mesma prossegue objetivos diferentes dos abrangidos pelo direito da União, ainda que seja suscetível de afetar indiretamente este último; e ainda iii) se existe uma regulamentação de direito da União específica na matéria ou suscetível de a afetar ( 44 ). Em especial, o Tribunal de Justiça concluiu pela inaplicabilidade dos direitos fundamentais da União a uma determinada legislação nacional em razão de as disposições da União no domínio relevante não imporem, nesse caso, aos Estados‑Membros qualquer obrigação relativamente à situação em causa no processo principal ( 45 ).

56.

À luz destes princípios, analisarei agora se a situação jurídica que deu origem ao processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio está abrangida pelo âmbito de aplicação do direito da União, para efeitos do artigo 51.o da Carta.

57.

Infelizmente, o despacho de reenvio não contém qualquer informação específica sobre esta questão. Contudo, não obstante as evidentes limitações desse despacho, considero que a resposta à questão deve ser afirmativa. A minha interpretação da conexão entre os factos do processo e as disposições do direito da União aplicáveis no processo principal é a seguinte.

58.

Por um lado, a legislação em causa não parece ter como objetivo, stricto sensu, aplicar o direito da União: a legislação regula, com o objetivo mais genérico de proteger a saúde pública, a venda a retalho de medicamentos em todo o território italiano, de forma a assegurar que o fornecimento desses produtos à população é seguro e de qualidade ( 46 ).

59.

Neste contexto, importa recordar que, por força do artigo 168.o, n.o 7, TFUE, a ação da União no domínio da saúde pública deve respeitar as responsabilidades dos Estados‑Membros no que se refere à definição das respetivas políticas de saúde, bem como à organização e prestação de serviços de saúde e de cuidados médicos. As responsabilidades dos Estados‑Membros devem incluir a gestão dos serviços médicos e de cuidados de saúde, bem como a repartição dos recursos que lhes são afetados. Além disso, o Tribunal de Justiça afirmou que, em princípio, cabe aos Estados‑Membros decidir qual o nível de proteção da saúde pública que pretendem assegurar e o modo como esse nível deve ser alcançado. Dado que o nível de proteção pode variar de um Estado‑Membro para outro, há que reconhecer aos Estados‑Membros, a este respeito, uma margem de apreciação ( 47 ).

60.

Contudo, por outro lado, o direito da União contém normas específicas — designadamente, os artigos 49.° e 52.°, n.o 1, TFUE — que são, em princípio, suscetíveis de afetar a aplicabilidade da legislação em apreço no órgão jurisdicional de reenvio.

61.

A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que, no caso de algum Estado‑Membro invocar razões imperiosas de interesse geral para justificar uma regulamentação suscetível de entravar o exercício de uma das liberdades fundamentais, esta justificação, prevista no direito da União, deve ser interpretada à luz dos princípios gerais do direito da União, nomeadamente dos direitos fundamentais agora garantidos pela Carta. Assim, a regulamentação nacional em causa só pode beneficiar das exceções previstas se estiver em conformidade com os direitos fundamentais cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça ( 48 ).

62.

Daqui decorre que essa obrigação de conformidade com os direitos fundamentais insere‑se claramente no âmbito de aplicação do direito da União e, por conseguinte, no da Carta. Deve considerar‑se que o emprego, por um Estado‑Membro, de exceções previstas pelo direito da União para justificar um entrave a uma liberdade fundamental garantida pelo Tratado «aplica o direito da União», na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da Carta ( 49 ), como afirmou o Tribunal de Justiça no acórdão Pfleger.

63.

Voltando ao presente processo, os artigos 49.° e 52.°, n.o 1, TFUE impõem efetivamente algumas obrigações às autoridades italianas em relação à situação em apreço no órgão jurisdicional de reenvio. Entre outras, a medida que constitui uma restrição à liberdade de estabelecimento (as limitações à venda a retalho de determinados medicamentos) deve ser aplicada de forma não discriminatória; deve ser adequada para alcançar o objetivo legítimo de ordem pública prosseguido; e não deve ir além do que é necessário para alcançar esse objetivo ( 50 ).

64.

Por conseguinte, sou da opinião de que o Tribunal de Justiça é competente para responder à segunda questão prejudicial submetida pelo TAR da Sicília. Todavia, tenho sérias dúvidas quanto à admissibilidade dessa questão.

2. Admissibilidade

65.

De acordo com jurisprudência assente, no âmbito da cooperação instituída pelo artigo 267.o TFUE, a necessidade de obter uma interpretação do direito da União que possa ser útil ao órgão jurisdicional nacional exige que este defina o quadro factual e regulamentar em que as questões submetidas a título prejudicial se inserem ou que, pelo menos, explique as circunstâncias de facto em que as questões se baseiam ( 51 ). Nesse contexto, o Tribunal de Justiça realçou a importância de o órgão jurisdicional nacional indicar as razões precisas que o levaram a interrogar‑se sobre a interpretação do direito da União e a considerar necessário apresentar questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça ( 52 ). Em especial, o Tribunal de Justiça sublinhou a necessidade de a decisão de reenvio fornecer um mínimo de explicações sobre as razões da escolha das disposições do direito da União cuja interpretação solicita e sobre o nexo, tal como entendido pelo órgão jurisdicional de reenvio, entre essas disposições e a legislação nacional aplicável ao litígio que lhe foi submetido ( 53 ).

66.

Tal como referido no n.o 20 supra, estes requisitos relativos ao conteúdo de um pedido de decisão prejudicial constam expressamente do artigo 94.o do Regulamento de Processo, presumindo‑se — como o Tribunal de Justiça realçou recentemente — que sejam do conhecimento do órgão jurisdicional de reenvio, que os deve respeitar escrupulosamente ( 54 ).

67.

À luz destes princípios, considero que, no que respeita à segunda questão prejudicial submetida no presente processo, o despacho de reenvio não satisfaz esses requisitos.

68.

O despacho de reenvio não explica, nem sequer resumidamente, por que razão o órgão jurisdicional de reenvio considera necessária a interpretação do artigo 15.o da Carta para decidir o litígio que tem pendente. O órgão jurisdicional nacional limita‑se a afirmar que tem dúvidas quanto à questão de saber se os princípios consagrados nessa disposição podem aplicar‑se plenamente à profissão de farmacêutico, ainda que o exercício dessa profissão esteja condicionado por várias obrigações impostas pelo interesse geral.

69.

Quanto a este aspeto, não hesito em afirmar que qualquer trabalhador e qualquer empresa com atividade no mercado interno — incumbido(a) ou não de cumprir uma ou mais obrigações de interesse geral — deve beneficiar do direito consagrado no artigo 15.o da Carta. Considero igualmente difícil negar que a legislação em causa no processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio é suscetível de limitar parcialmente esse direito ( 55 ).

70.

Contudo, uma vez que se demonstre que essa restrição é justificada pela necessidade de proteger a saúde pública ( 56 ), não vejo que outros aspetos de incompatibilidade entre a legislação nacional em causa e o direito da União possam ser suscitados pelo artigo 15.o da Carta.

71.

Com efeito, o artigo 52.o, n.o 1, da Carta admite a introdução de restrições ao exercício de direitos como os constantes do artigo 15.o da Carta, desde que as restrições sejam previstas por lei, respeitem o conteúdo essencial dos referidos direitos e liberdades e, na observância do princípio da proporcionalidade, sejam necessárias e correspondam efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União Europeia ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros ( 57 ).

72.

Neste contexto, quase nem é necessário realçar que, no artigo 35.o, a Carta reconhece igualmente como um direito fundamental que todas as pessoas tenham acesso à prevenção em matéria de saúde e beneficiem de cuidados médicos.

73.

Neste enquadramento, seria de esperar encontrar no despacho de reenvio algumas explicações sobre a razão pela qual o órgão jurisdicional de reenvio considerava que a legislação nacional em causa não conciliava, de forma adequada, aqueles dois direitos fundamentais, ou sobre a razão pela qual essa legislação não respeitava o direito previsto no artigo 15.o da Carta.

74.

Na falta de qualquer explicação sobre estes aspetos cruciais, tenho de concluir que a segunda questão submetida pelo TAR da Sicília é inadmissível, na medida em que o despacho de reenvio não respeita o artigo 94.o do Regulamento de Processo.

3. Substância

75.

Quanto à substância da questão suscitada pelo órgão jurisdicional de reenvio na questão 2, limitarei a minha análise ao seguinte:

76.

Não vejo, nem no despacho de reenvio nem nas observações apresentadas por D. G. Gullotta, nada que possa suscitar dúvidas quanto ao facto de a legislação nacional em causa ter conciliado, de forma justa e adequada, a liberdade profissional e o direito ao trabalho, por um lado, com o direito aos cuidados de saúde, por outro. Também não encontro nada que indicie que o direito previsto no artigo 15.o da Carta tenha sido tão severamente restringido que possa considerar‑se que o conteúdo essencial desse direito ficou comprometido.

77.

Assim sendo, não penso que o artigo 15.o da Carta se oponha a uma legislação como a legislação nacional em causa no processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio.

D – Questão 3

78.

Por último, através da sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, essencialmente, se os artigos 102.° e 106.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação, como a que está em causa no processo principal, que reserva a venda a retalho de determinados medicamentos apenas às farmácias, excluindo as parafarmácias.

1. Admissibilidade

79.

No que respeita à terceira questão, devo igualmente manifestar as minhas dúvidas quanto à sua admissibilidade. Uma vez mais, o despacho de reenvio não contém nenhuma explicação das razões pelas quais o órgão jurisdicional de reenvio considera que a legislação em causa não respeita os artigos 102.° e 106.° TFUE.

80.

Em primeiro lugar, no que respeita ao artigo 102.o TFUE, não compreendo bem se, na opinião do órgão jurisdicional de reenvio, deve considerar‑se que cada uma (ou algumas) das mais de 15000 farmácias situadas em todo o território italiano detém uma posição dominante individual ou se deve considerar‑se que essas entidades detêm uma posição dominante conjunta. Em segundo lugar, ainda que se admita a existência de uma posição dominante, fica por determinar em que medida essa posição pode ser explorada ilegitimamente com o objetivo de eliminar a concorrência do(s) mercado(s) relevante(s).

81.

Em segundo lugar, no que respeita ao artigo 106.o TFUE, deve salientar‑se que o Tribunal de Justiça confirmou recentemente, uma vez mais, a sua jurisprudência no sentido de que um Estado‑Membro viola as proibições estabelecidas nas disposições conjugadas dos artigos 106.°, n.o 1, e 102.° TFUE quando adote uma medida legislativa, regulamentar ou administrativa que crie uma situação na qual uma empresa pública ou uma empresa à qual concedeu direitos especiais ou exclusivos seja levada, pelo simples exercício dos direitos privilegiados que lhe foram conferidos, a abusar da sua posição dominante, ou quando esses direitos possam criar uma situação em que essa empresa seja levada a ter tal conduta abusiva. O Tribunal de Justiça esclareceu igualmente que, para que ocorra uma violação das disposições conjugadas dos artigos 106.°, n.o 1, e 102.° TFUE, é necessário que seja identificada uma consequência anticoncorrencial, potencial ou real, suscetível de resultar do facto de o Estado ter concedido direitos especiais ou exclusivos a algumas empresas ( 58 ).

82.

Neste enquadramento, torna‑se evidente que — admitindo que possa considerar‑se que a legislação em causa confere às farmácias direitos especiais ou exclusivos, na aceção do artigo 106.o, n.o 1, TFUE — seria ainda necessário compreender de que modo, na perspetiva do órgão jurisdicional de reenvio, as farmácias podem ser induzidas a abusar da sua posição dominante em consequência dos direitos especiais ou exclusivos concedidos.

83.

Contudo, não é dada qualquer explicação sobre esta matéria. Por conseguinte, nestas circunstâncias, é impossível compreender por que razão e de que forma os artigos 102.° e 106.° podem opor‑se a uma legislação nacional como a que está em causa no processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio ( 59 ).

84.

Com efeito, observo que foi colocada ao Tribunal de Justiça uma questão muito semelhante no processo Servizi Ausiliari Dottori Commercialisti, em que um órgão jurisdicional italiano perguntou ao Tribunal de Justiça se os artigos 102.° e 86.° TFUE se opunham a uma legislação nacional que reservava exclusivamente aos centros de assistência fiscal — sociedades anónimas autorizadas pelo Ministério das Finanças italiano — o direito de exercer determinadas atividades de consultoria e de assistência em matéria fiscal. Na sua decisão, o Tribunal de Justiça sublinhou que o simples facto de se criar uma posição dominante através da concessão de direitos especiais ou exclusivos não é, enquanto tal, incompatível com os Tratados. Assim, para que ocorra uma violação dos artigos 102.° e 106.°, n.o 1, TFUE, é necessário não apenas que a legislação nacional em causa tenha como efeito conceder direitos especiais ou exclusivos a determinadas empresas, mas também que essa legislação possa levar essas empresas a abusar da sua posição dominante. Contudo, o Tribunal de Justiça concluiu que nem o despacho de reenvio nem as observações escritas lhe forneciam elementos de facto e de direito que lhe permitissem determinar se estavam preenchidas as condições relativas à existência de uma posição dominante ou de um comportamento abusivo, na aceção dos artigos 102.° e 106.°, n.o 1, TFUE. Por conseguinte, declarou a questão inadmissível ( 60 ).

85.

Na minha opinião, o processo em apreço justifica idêntica conclusão.

2. Substância

86.

Tal como referido supra, não consigo encontrar, nem no despacho de reenvio nem nas observações apresentadas por D. G. Gullotta, nada que indicie uma violação dos artigos 102.° e 106.°, n.o 1, TFUE.

87.

Consequentemente, não vejo motivos para que os artigos 102.° e 106.° TFUE devam ser interpretados no sentido que se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio, que reserva a venda a retalho de determinados medicamentos apenas às farmácias, excluindo as parafarmácias.

E – Considerações finais

88.

Em 2014, houve quase 40 processos nos quais o Tribunal de Justiça rejeitou pedidos de decisão prejudicial, quer porque estes totalmente inadmissíveis, quer porque considerou que era claramente incompetente. Num número de casos igualmente significativo, os pedidos dos órgãos jurisdicionais nacionais foram parcialmente rejeitados por esses motivos. A grande maioria desses processos suscitava precisamente o tipo de questões processuais analisadas nas presentes conclusões: i) questões relativas à interpretação das liberdades fundamentais, não obstante todos os aspetos do processo principal estarem circunscritos ao território de um Estado‑Membro ( 61 ); ii) questões relativas à interpretação da Carta em casos que não apresentavam uma conexão clara com o direito da União ( 62 ), ou iii) despachos de reenvio que não descreviam o contexto de facto e de direito subjacente às questões submetidas a título prejudicial ( 63 ).

89.

Lamentavelmente, não é raro os órgãos jurisdicionais nacionais submeterem questões ao Tribunal de Justiça a expressar dúvidas quanto à compatibilidade de normas do direito nacional com o direito da União, referindo um número relativamente significativo de disposições da UE, mas sem explicar por que razão cada uma dessas disposições pode ser relevante para o processo em causa. Problemas idênticos são suscitados por pedidos de decisão prejudicial que, em contrapartida, questionam a compatibilidade de normas do direito nacional com o direito da União, sem identificar quaisquer disposições específicas do direito da União.

90.

Esta prática não é aceitável. Cada caso rejeitado por motivos processuais resulta num assinalável desperdício de recursos, tanto para o órgão jurisdicional nacional que apresenta o pedido de decisão prejudicial como para o sistema judiciário da EU (em especial, devido à necessidade de traduzir o despacho de reenvio para todas as línguas oficiais da União Europeia). Acresce que a administração da justiça é adiada em relação às partes no processo principal, sem quaisquer vantagens.

91.

O artigo 19.o, n.o 1, TUE designa como guardiões do ordenamento jurídico e do sistema judicial da União quer o Tribunal de Justiça quer os tribunais dos Estados‑Membros. Com efeito, quer o Tribunal de Justiça quer os órgãos jurisdicionais nacionais foram incumbidos de garantir a aplicação plena do direito da União em todos os Estados‑Membros e a tutela jurisdicional dos direitos conferidos aos particulares pelo referido direito ( 64 ).

92.

À luz deste princípio constitucional fundamental, o Tribunal de Justiça está empenhado em fazer tudo o que estiver ao seu alcance para ajudar os órgãos jurisdicionais nacionais a desempenhar a sua função jurisdicional na ordem jurídica da União. No entanto, o Tribunal de Justiça tem igualmente consciência dos limites à sua própria atuação impostos pelos Tratados.

93.

Os órgãos jurisdicionais nacionais devem ter igualmente em atenção esses limites. Em especial, devem estar cientes das recentes decisões que indicam que o Tribunal de Justiça tem vindo a adotar uma abordagem mais restritiva na apreciação da sua competência para responder a questões que lhe sejam submetidas ao abrigo do artigo 267.o TFUE e da admissibilidade dessas questões.

94.

Em termos gerais, os órgãos jurisdicionais nacionais devem ter sempre em mente que o princípio da cooperação leal subjacente ao processo previsto no artigo 267.o TFUE ( 65 ) é aplicável reciprocamente. Devem ajudar o Tribunal de Justiça … a ajudá‑los.

IV – Conclusão

95.

À luz das considerações que antecedem, proponho que o Tribunal de Justiça declare que a segunda e terceira questões prejudiciais submetidas pelo Tribunale Amministrativo Regionale per la Sicilia no Processo C‑497/12 são inadmissíveis.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) V., por exemplo, acórdãos The Chartered Institute of Patent Attorneys (C‑307/10, EU:C:2012:361, n.o 31) e Danske Slagterier (C‑445/06, EU:C:2009:178, n.o 65). V., igualmente, acórdão Meilicke (C‑83/91, EU:C:1992:332, n.o 22).

( 3 ) V., entre muitos, acórdãos Kamberaj (C‑571/10, EU:C:2012:233, n.o 41); Zurita García e Choque Cabrera (C‑261/08 e C‑348/08, EU:C:2009:648, n.o 36); e Schneider (C‑380/01, EU:C:2004:73, n.o 23).

( 4 ) Nos últimos anos, tem‑se verificado um aumento constante de novos processos. Este fenómeno atingiu o seu máximo em 2013, ano em que o Tribunal de Justiça proferiu o maior número de acórdãos de sempre e também recebeu o maior número de sempre de novos processos. Nesse ano, os pedidos de decisão prejudicial representaram quase 60% desses processos (v. Relatório Anual do Tribunal de Justiça de 2013).

( 5 ) Para referir apenas alguns acórdãos: Pringle (C‑370/12, EU:C:2012:756); Z (C‑363/12, EU:C:2014:159); D (C‑167/12, EU:C:2014:169); International Stem Cell Corporation (C‑364/13, EU:C:2014:2451); e Gauweiler e o. (C‑62/14, processo pendente).

( 6 ) V. conclusões que apresentei no processo Venturini e o. (C‑159/12 a C‑161/12, EU:C:2013:529, a seguir, «Venturini», n.os 22 a 25).

( 7 ) Processos C‑159/12 a C‑161/12, EU:C:2013:791.

( 8 ) V., neste sentido, acórdão Unión de Pequeños Agricultores contra Conselho da União Europeia (C‑50/00 P, EU:C:2002:462, n.os 44 e 45).

( 9 ) V. acórdão Torralbo Marcos (C‑265/13, EU:C:2014:187, n.o 27 e jurisprudência referida).

( 10 ) Sobre esta questão, v., conclusões que apresentei no processo Torresi (Processos apensos C‑58/13 e C‑59/13, EU:C:2014:265, n.os 19 a 81).

( 11 ) V. artigo 100.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça (a seguir «Regulamento de Processo»).

( 12 ) V., inter alia, despacho Viacom (C‑190/02, EU:C:2002:569, n.o 14 e jurisprudência referida).

( 13 ) As duas situações são, de facto, referidas separadamente no artigo 53.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, que tem a seguinte redação: «Se o Tribunal for manifestamente incompetente para conhecer de um processo ou se um pedido ou uma petição forem manifestamente inadmissíveis, o Tribunal, ouvido o advogado‑geral, pode, a qualquer momento, decidir pronunciar‑se por despacho fundamentado, pondo assim termo à instância».

( 14 ) Deve ter‑se em conta que os factos relevantes e a legislação nacional aplicável são determinados pelo órgão jurisdicional nacional no seu pedido de decisão prejudicial. Em regra, o Tribunal de Justiça não questiona esses aspetos do pedido. V., por exemplo, acórdão Trespa International (C‑248/07, EU:C:2008:607, n.o 36 e jurisprudência referida).

( 15 ) V., neste sentido, Naômé, C., Le renvoi préjudiciel en droit européen ‑ Guide pratique, Larcier, Bruxelas, 2010 (2 a ed.), pp. 85 e 86.

( 16 ) V. despacho Killinger/Alemanha e o. (C‑396/03 P, EU:C:2005:355, n.os 15 e 26).

( 17 ) V., por exemplo, despacho Kauk/Alemanha (T‑334/11, EU:T:2011:408).

( 18 ) V., por exemplo, despacho Calviv/Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (C‑171/14 P, EU:C:2014:2281).

( 19 ) V., designadamente, despacho Gluiber/Alemanha (T‑126/98, EU:T:1998:237).

( 20 ) V., por exemplo, despacho Alsharghawi/Conselho (T‑532/14 R, EU:T:2014:732).

( 21 ) Como dispõe o artigo 19.o do Estatuto. V., por exemplo, despacho ADR Center/Comissão (C‑259/14 P, EU:C:2014:2417).

( 22 ) V., entre muitos, acórdão Comissão/França (C‑225/98, EU:C:2000:494, n.o 69).

( 23 ) EU:C:2013:791.

( 24 ) V., inter alia, acórdãos USSL n.o 47 di Biella (C‑134/95, EU:C:1997:16, n.o 19); RI.SAN (C‑108/98, EU:C:1999:400, n.o 23); e Omalet (C‑245/09, EU:C:2010:808, n.o 12).

( 25 ) V. conclusões que apresentei no processo que deu origem ao acórdão Venturini (EU:C:2013:529, n.os 32 a 53).

( 26 ) Ibid., n.os 53 a 55.

( 27 ) Ibid., n.os 24 e 55.

( 28 ) Ibid., n.os 38, 42 a 44, 50 e 51.

( 29 ) Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo que deu origem ao acórdão Airport Shuttle Express (C‑162/12 e C‑163/12, EU:C:2013:617, n.os 26 a 60).

( 30 ) V. acórdão Airport Shuttle Express (C‑162/12 e C‑163/12, EU:C:2014:74, n.os 28 a 51).

( 31 ) V. n.o 33 supra.

( 32 ) Despacho Tudoran (C‑92/14, EU:C:2014:2051, n.os 34 a 42).

( 33 ) Despacho Szabó (C‑204/14, EU:C:2014:2220, n.os 15 a 25).

( 34 ) Diretiva 2004/80/CE do Conselho, de 29 de abril de 2004 (JO 2004 L 261, p. 15).

( 35 ) V. C‑122/13, EU:C:2014:59.

( 36 ) V. C‑246/14, EU:C:2014:2291.

( 37 ) V., por exemplo, acórdão Romeo (C‑313/12, EU:C:2013:718, n.o 20 e jurisprudência referida).

( 38 ) V. conclusões que apresentei no processo que deu origem ao acórdão Venturini (EU:C:2013:529, n.os 42 a 45) e conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo que deu origem ao acórdão Airport Shuttle Express (EU:C:2013:617, n.os 54 e 55).

( 39 ) EU:C:2013:791.

( 40 ) V., entre muitos, acórdão Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.o 17) e despacho Sociedade Agrícola e Imobiliária da Quinta de S. Paio (C‑258/13, EU:C:2013:810, n.o 18).

( 41 ) V., inter alia, despacho Boncea e o. (C‑483/11 e C‑484/11, EU:C:2011:832, n.o 29), e acórdão Åkerberg Fransson (EU:C:2013:105, n.o 19).

( 42 ) V., neste sentido, despacho Currà e o. (C‑466/11, EU:C:2012:465, n.o 26), e acórdão Åkerberg Fransson (EU:C:2013:105, n.o 22).

( 43 ) Acórdão Siragusa (C‑206/13, EU:C:2014:126, n.o 24). V., igualmente, neste sentido, jurisprudência referida.

( 44 ) Ibid., n.o 25, e jurisprudência referida.

( 45 ) Ibid., n.o 26, e acórdão Julián Hernández e o. (C‑198/13, EU:C:2014:2055, n.o 35).

( 46 ) V. acórdão Venturini (EU:C:2013:791, n.os 40 e 63).

( 47 ) V., neste sentido, entre outros, acórdãos Blanco Pérez e Chao Gómez (C‑570/07 e C‑571/07, EU:C:2010:300, n.o 44) e Venturini (EU:C:2013:791, n.o 59).

( 48 ) V. acórdão Pfleger e o. (C‑390/12, EU:C:2014:281, n.o 35, e jurisprudência referida).

( 49 ) Ibid., n.o 36. V., igualmente, conclusões da advogada‑geral E. Sharpston no mesmo processo (EU:C:2013:747, n.os 36 a 46).

( 50 ) V., neste sentido, entre muitos, acórdãos Hartlauer (C‑169/07, EU:C:2009:141, n.o 44), e Apothekerkammer des Saarlandes e o. (C‑171/07 e C‑172/07, EU:C:2009:316, n.o 25).

( 51 ) V., entre muitos, acórdão Mora IPR (C‑79/12, EU:C:2013:98, n.o 35) e despachos Augustus (C‑627/11, EU:C:2012:754, n.o 8) e Mlamali (C‑257/13, EU:C:2013:763, n.o 18).

( 52 ) V., neste sentido, acórdão Mora IPR (EU:C:2013:98, n.o 36) e despachos Mlamali (EU:C:2013:763, n.o 20) e Talasca (C‑19/14, EU:C:2014:2049, n.o 19).

( 53 ) V., neste sentido, acórdãos Asemfo (C‑295/05, EU:C:2007:227, n.o 33) e Mora IPR (EU:C:2013:98, n.o 37). V., igualmente, despacho Laguillaumie (C‑116/00, EU:C:2000:350, n.os 23 e 24).

( 54 ) V. despacho Talasca (EU:C:2014:204, n.o 21).

( 55 ) V. n.os 48 e 49 supra.

( 56 ) Ibid.

( 57 ) V. acórdão Schaible (C‑101/12, EU:C:2013:661, n.o 27 e jurisprudência referida).

( 58 ) V., entre outros, acórdãos Comissão/DEI (C‑553/12 P, EU:C:2014:2083, n.os 41 a 46); MOTOE (C‑49/07, EU:C:2008:376, n.o 49); e Connect Austria (C‑462/99, EU:C:2003:297, n.o 80).

( 59 ) Com efeito, o Tribunal de Justiça afirmou que a exigência de precisão no despacho de reenvio no que respeita ao quadro factual e regulamentar é válida, muito particularmente, no domínio da concorrência, que se caracteriza por situações de facto e de direito complexas: V., despacho Laguillaumie (EU:C:2000:350, n.o 19 e jurisprudência referida).

( 60 ) C‑451/03, EU:C:2006:208, n.os 20 a 26.

( 61 ) V., inter alia, acórdão Airport Shuttle Express (EU:C:2014:74), e despachos Tudoran (EU:C:2014:2051) e Szabó (EU:C:2014:2220).

( 62 ) V., inter alia, despachos Kárász (C‑199/14, EU:C:2014:2243); Pańczyk (C‑28/14, EU:C:2014:2003); e Široká (C‑459/13, EU:C:2014:2120).

( 63 ) V., inter alia, despachos Herrenknecht (C‑366/14, EU:C:2014:2353); Hunland‑Trade (C‑356/14, EU:C:2014:2340); e 3D I (C‑107/14, EU:C:2014:2117).

( 64 ) V. parecer 1/09 (EU:C:2011:123, n.os 66 a 69).

( 65 ) V., n.o 1 supra.