ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

8 de novembro de 2012 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Ação de indemnização — Recusa de uma proposta apresentada no âmbito de um procedimento de concurso da União — Prazo de prescrição — Início da contagem do prazo — Aplicação do prazo de dilação em razão da distância»

No processo C-469/11 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 5 de setembro de 2011,

Evropaïki Dynamiki — Proigmena Systimata Tilepikoinonion Pliroforikis kai Tilematikis AE, com sede em Atenas (Grécia), representada por N. Korogiannakis, dikigoros,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por E. Manhaeve e M. Wilderspin, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: R. Silva de Lapuerta, exercendo funções de presidente da Terceira Secção, K. Lenaerts, G. Arestis, J. Malenovský e T. von Danwitz (relator), juízes,

advogado-geral: Y. Bot,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 12 de julho de 2012,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Com o seu recurso, a Evropäiki Dynamiki — Proigmena Systimata Tilepikoinonion Pliroforikis kai Tilematikis AE (a seguir «Evropaïki Dynamiki») pede a anulação do despacho do Tribunal Geral da União Europeia de 22 de junho de 2011, Evropaïki Dynamiki/Comissão (T-409/09, Colet., p. II-3765, a seguir «despacho recorrido»), através do qual foi julgada improcedente a ação em que pedia a reparação do prejuízo pretensamente sofrido pela recusa de uma proposta apresentada no âmbito de um procedimento de concurso.

Quadro jurídico

Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia

2

O artigo 46.o, n.o 1, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, aplicável ao processo no Tribunal Geral por força do artigo 53.o, primeiro parágrafo, do referido estatuto, dispõe, na sua versão aplicável no momento da interposição do recurso:

«As ações contra a União em matéria de responsabilidade extracontratual prescrevem no prazo de cinco anos a contar da ocorrência do facto que lhes tenha dado origem. A prescrição interrompe-se, quer pela apresentação do pedido no Tribunal de Justiça, quer através de pedido prévio que o lesado pode dirigir à instituição competente da União. Neste último caso, o pedido deve ser apresentado no prazo de dois meses previsto no artigo 263.o [TFUE]; o disposto no segundo parágrafo do artigo 265.o [TFUE] é aplicável, sendo caso disso.»

Regulamento de Processo do Tribunal Geral

3

O artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral prevê:

«Os prazos processuais são acrescidos de um prazo de dilação fixo, em razão da distância, de dez dias.»

Factos na origem do litígio

4

A Evropaïki Dynamiki apresentou, em maio de 2004, uma proposta num concurso da Comissão Europeia.

5

Em 15 de setembro de 2004, a Evropaïki Dynamiki recebeu um ofício da Comissão, datado do mesmo dia, em que esta a informava de que a sua proposta não tinha sido aceite, especificando que os fundamentos dessa recusa tinham a ver com a composição e a estabilidade da equipa, com os procedimentos propostos para a transferência de conhecimentos no final do projeto e com o facto de a proposta não apresentar a melhor relação qualidade/preço. Indicava também que a Evropaïki Dynamiki podia solicitar por escrito informações adicionais sobre os fundamentos da recusa da sua proposta.

6

Por ofício de 22 de outubro de 2004, a Comissão, a pedido da Evropaïki Dynamiki, prestou algumas informações complementares relativamente à avaliação da sua proposta.

7

A Evropaïki Dynamiki recorreu para o Tribunal Geral, pedindo a anulação da decisão da Comissão de 15 de setembro de 2004, constante do ofício da Comissão dessa mesma data, que recusou a sua proposta e adjudicou o contrato ao proponente selecionado no âmbito do concurso. Por acórdão de 10 de setembro de 2008, Evropaïki Dynamiki/Comissão (T-465/04), o Tribunal Geral anulou essa decisão, por falta de fundamentação. Considerou que a referida decisão assim como, designadamente, a correspondência subsequente não permitiam identificar claramente os fundamentos da recusa da proposta da Evropaïki Dynamiki.

Tramitação do processo no Tribunal Geral

8

Em 25 de setembro de 2009, a Evropaïki Dynamiki intentou uma ação no Tribunal Geral, enviada por telecópia, em que pedia a reparação do prejuízo que alega ter sofrido devido à recusa ilegal da sua proposta, prejuízo esse que consiste no lucro bruto que teria obtido com o contrato se o mesmo lhe tivesse sido adjudicado. Além disso, pediu uma indemnização por lucros cessantes, uma vez que sofreu prejuízos devido à perda simultânea da oportunidade de executar o contrato em causa e da oportunidade de lhe serem adjudicados outros contratos, designadamente o contrato adjudicado ao proponente que venceu o primeiro concurso.

9

As encomendas postais contendo o original assinado da petição e as respetivas cópias e anexos foram expedidas em 3 de outubro de 2009, por intermédio de um serviço de entrega de encomendas postais.

10

Em 5 de outubro de 2009, a Secretaria do Tribunal Geral informou o advogado da Evropaïki Dynamiki de que a encomenda postal contendo o original ainda não tinha chegado. Foi apresentada na Secretaria, nesse mesmo dia, uma cópia dos documentos em falta e um novo original assinado da petição.

11

Em 16 de novembro de 2009, a Secretaria do Tribunal Geral informou a Evropaïki Dynamiki de que o novo original da petição, apresentada em 5 de outubro de 2009, era diferente da cópia desta recebida por telecópia em 25 de setembro de 2009. Por força do artigo 43.o, n.o 6, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a data considerada como data de propositura da ação é 5 de outubro de 2009.

12

Posteriormente, a Evropaïki Dynamiki expôs em duas cartas as razões pelas quais o original da petição não tinha chegado dentro dos prazos, bem como as circunstâncias da perda da encomenda postal pela empresa à qual confiara o serviço de entrega. Além disso, pedia ao Tribunal Geral que reconhecesse, no caso vertente, a existência de um caso de força maior e que considerasse que a data de apresentação do original da petição era 25 de setembro de 2009 e não 5 de outubro de 2009.

13

Em dezembro de 2009, a Evropaïki Dynamiki foi informada, pela empresa de serviços de entrega de encomendas postais a que recorrera, de que a encomenda em falta não tinha sido encontrada.

14

A Comissão suscitou no Tribunal Geral uma exceção de inadmissibilidade ao abrigo do artigo 114.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, por prescrição do pedido de indemnização.

Despacho recorrido

15

Antes de mais, o Tribunal Geral, no despacho recorrido, decidiu que o prazo de prescrição tinha começado a correr a partir do momento em que a recorrente foi notificada da decisão da Comissão de recusa da sua proposta, concretamente, em 15 de setembro de 2004. A este respeito, o Tribunal Geral constatou que a recusa da proposta, e não a fundamentação da recusa, constituía o facto que dá origem à ação de responsabilidade em matéria de contratos públicos e consubstancia os danos pretensamente sofridos pelo proponente afastado. Embora os n.os 44, 45 e 48 do despacho do Tribunal Geral de 14 de setembro de 2005, Ehcon/Comissão (T-140/04, Colet., p. II-3287), possam, na verdade, como alega a recorrente, ser interpretados em sentido contrário, não podem pôr em causa esta solução, visto que devem ser interpretados no seu contexto e de acordo com a sua ordem lógica.

16

Não permitir que o prazo de prescrição da ação de responsabilidade extracontratual da Comunidade comece a correr enquanto a parte pretensamente lesada não tiver adquirido pessoalmente a convicção de que sofreu um prejuízo tem a consequência de o momento da prescrição da referida ação variar consoante a perceção individual que cada parte tiver da existência do dano, o que está em contradição com a exigência de segurança jurídica.

17

A este propósito, importa, além disso, observar que resulta de uma carta enviada à Secretaria do Tribunal Geral pela recorrente que esta considerava que o comportamento ilegal da Comissão ocorreu a partir do envio do ofício de 15 de setembro de 2004 que lhe comunicava a recusa da proposta, uma vez que, implicitamente, fez o prazo de prescrição correr a partir dessa data.

18

Assim, o prazo de prescrição de cinco anos expirou em 15 de setembro de 2009.

19

Em seguida, o Tribunal Geral decidiu que esse prazo de prescrição não era prolongado pelo prazo de dilação em razão da distância previsto no artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Este prazo apenas diz respeito aos prazos processuais e não ao prazo de prescrição previsto no artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, cujo decurso acarreta a prescrição da ação de responsabilidade extracontratual [v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 11 de janeiro de 2002, Biret e Cie/Conselho, T-210/00, Colet., p. II-47, n.os 19 e 45, e de 21 de abril de 2005, Holcim (Deutschland)/Comissão, T-28/03, Colet., p. II-1357, n.o 74; e despachos do Tribunal Geral de 19 de maio de 2008, Transport Schiocchet — Excursions/Comissão, T-220/07, n.os 15 e 35, e de 16 de dezembro de 2009, Cattin/Comissão, T-194/08, n.os 61 e 65].

20

Estes dois tipos de prazo são diferentes por natureza, o que pode ser inferido da jurisprudência. Os prazos processuais, como os prazos de recurso, são de ordem pública e não estão na disponibilidade das partes e do juiz. Ao invés, o juiz não pode suscitar oficiosamente o fundamento baseado na prescrição da ação de responsabilidade. Além disso, o artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça não distingue, para o cálculo do prazo de prescrição, se a causa de interrupção deste prazo decorre da interposição de um recurso ou da apresentação de um pedido prévio.

21

Ora, a aplicação do prazo processual previsto no artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral leva a que a prescrição tenha lugar no termo de um período diferente, consoante o lesado tenha optado por se dirigir diretamente ao tribunal da União ou, previamente, à instituição competente. Esta diferença, não prevista no artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, faz o termo do prazo de prescrição depender de um fator que não é objetivo e tem ainda como consequência favorecer a solução contenciosa dos litígios em detrimento da busca de soluções por acordo.

22

O facto de o Tribunal Geral ter decidido, no acórdão de 14 de setembro de 1995, Lefebvre e o./Comissão (T-571/93, Colet., p. II-2379, n.o 26), que, no âmbito da prescrição das ações contra a União em matéria de responsabilidade extracontratual, é necessário tomar em consideração o prazo de dilação em razão da distância, não põe em causa esta conclusão, uma vez que esse acórdão constitui um caso isolado.

23

Por último, o Tribunal Geral deduziu daqui que a ação de responsabilidade extracontratual que lhe fora submetida já tinha prescrito, no que se refere aos alegados prejuízos, uma vez que fora intentada mais de cinco anos após a ocorrência dos factos que lhe deram origem, na aceção do artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, sem que fosse necessário apreciar outros fundamentos e argumentos suscitados pelas partes, incluindo a existência de um caso fortuito ou de um caso de força maior.

24

Quanto ao pedido da recorrente de ressarcimento do dano resultante da perda da oportunidade de lhe serem adjudicados contratos ulteriores, o Tribunal Geral entendeu que o pedido era manifestamente improcedente, sem que fosse necessário pronunciar-se sobre a sua admissibilidade.

Pedidos das partes

25

A Evropaïki Dynamiki pede ao Tribunal que se digne:

anular o despacho recorrido;

julgar integralmente improcedente a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão;

remeter o processo ao Tribunal Geral para que decida do mérito da causa; e

condenar a Comissão no pagamento da totalidade das despesas, suportadas nas duas instâncias, mesmo que seja negado provimento ao presente recurso.

26

A Comissão pede que o Tribunal se digne:

negar provimento ao recurso; e

condenar a recorrente nas despesas relativas às duas instâncias.

Quanto ao presente recurso

27

A Evropaïki Dynamiki invoca quatro fundamentos de recurso, relativos a erros de direito cometidos pelo Tribunal Geral. O primeiro e quarto fundamentos dizem respeito a uma interpretação errada, respetivamente, do artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça e do artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, lido em conjugação com o referido artigo 46.o O segundo e terceiro fundamentos dizem respeito a uma violação dos princípios da igualdade de tratamento e da segurança jurídica.

Quanto ao quarto fundamento

Argumentos das partes

28

No seu quarto fundamento, que importa examinar em primeiro lugar, a Evropaïki Dynamiki sustenta que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao decidir que o prazo de prescrição tinha começado a correr a partir do momento em que a decisão de recusa da sua proposta lhe tinha sido comunicada, concretamente, em 15 de setembro de 2004. Contrariamente ao decidido no despacho recorrido, o Tribunal Geral, no despacho Ehcon/Comissão, já referido, considerou que o prazo de prescrição começava a correr a partir do momento em que o proponente efetivamente tomava conhecimento dos fundamentos da recusa da sua proposta. Segundo a Evropaïki Dynamiki, um proponente só está em condições de avaliar a legalidade do procedimento de adjudicação do contrato a partir do momento em que lhe sejam comunicados os fundamentos da decisão da Comissão de recusa da sua proposta.

29

No presente caso, a recorrente apenas recebeu os fundamentos da decisão da Comissão entre 20 e 23 de outubro de 2004, de modo que o prazo de prescrição começou a correr em 23 de outubro de 2004.

30

A Comissão considera que o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito ao considerar que o prazo de prescrição começou a correr a partir de 15 de setembro de 2004. Como resulta do despacho recorrido, a Evropaïki Dynamiki terá implicitamente admitido que esta data era a data de início da contagem desse prazo.

31

A título subsidiário, a Comissão alega que a apreciação do Tribunal Geral relativamente ao início da contagem do referido prazo é, em todo o caso, correta.

Apreciação do Tribunal

32

Nos termos do artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, as ações contra a União em matéria de responsabilidade extracontratual prescrevem num prazo de cinco anos a contar da ocorrência do facto que lhes tenha dado origem.

33

O prazo de prescrição assim previsto foi determinado tendo em conta, nomeadamente, o tempo necessário à parte alegadamente lesada para reunir as informações apropriadas com vista a uma eventual ação e para verificar os factos que puderem ser invocados em apoio dessa ação (despacho de 18 de julho de 2002, Autosalone Ispra dei Fratelli Rossi/Comissão, C-136/01 P, Colet., p. I-6565, n.o 28).

34

De acordo com jurisprudência assente, esse prazo começa a correr quando estiverem reunidas todas as condições a que se encontra subordinada a obrigação de reparação, nomeadamente quando o dano a reparar se concretizou [acórdãos de 27 de janeiro de 1982, Birra Wührer e o./Conselho e Comissão, 256/80, 257/80, 265/80, 267/80 e 5/81, Recueil, p. 85, n.o 10; de 19 de abril de 2007, Holcim (Deutschland)/Comissão, C-282/05 P, Colet., p. I-2941, n.o 29; e de 17 de julho de 2008, Comissão/Cantina sociale di Dolianova e o., C-51/05 P, Colet., p. I-5341, n.o 54].

35

Na verdade, importa interpretar o artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça no sentido de que a prescrição não pode ser oposta ao lesado que só tomou conhecimento do facto gerador deste dano numa data tardia, e não podia dispor assim de um prazo razoável para a propositura da ação ou apresentação do pedido antes do termo do prazo de prescrição (acórdão de 7 de novembro de 1985, Adams/Comissão, 145/83, Recueil, p. 3539, n.o 50).

36

Todavia, as condições a que se encontra subordinada a obrigação de reparação dos danos visados no artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, e, portanto, as regras da prescrição aplicáveis às ações destinadas à reparação dos referidos danos, não se podem basear em critérios que não sejam estritamente objetivos (acórdão Comissão/Cantina sociale di Dolianova e o., já referido, n.o 59).

37

Assim, um conhecimento preciso e circunstanciado dos factos da causa não figura entre os elementos que devem estar reunidos para fazer correr o prazo de prescrição (despacho Autosalone Ispra dei Fratelli Rossi/Comissão, já referido, n.o 31, e acórdão Comissão/Cantina sociale di Dolianova e o., já referido, n.o 61). Do mesmo modo, a apreciação subjetiva da realidade do dano pela vítima desse dano não pode ser tomada em consideração na determinação do ponto de partida do prazo de prescrição da ação em matéria de responsabilidade extracontratual da União (acórdão Comissão/Cantina sociale di Dolianova e o., já referido, n.o 61).

38

No caso de litígios decorrentes de atos individuais, o prazo de prescrição começa a correr quando a decisão tiver produzido os respetivos efeitos relativamente aos seus destinatários [acórdãos do Tribunal de Justiça, Holcim (Deutschland)/Comissão, já referido, n.o 30, e de 11 de junho de 2009, Tranosports Schiocchet — Excursions/Comissão, C-335/08 P, n.o 33].

39

No presente caso, o pedido de indemnização da Evropaïki Dynamiki baseia-se na recusa da proposta que apresentou num concurso da Comissão.

40

Num caso destes, como o Tribunal Geral concluiu corretamente no despacho recorrido, sem que a Evropaïki Dynamiki tivesse contestado essa conclusão, a decisão da entidade adjudicante que recusou a proposta apresentada constitui o facto gerador do dano suscetível de dar lugar à responsabilidade extracontratual dessa entidade. Essa decisão gera efeitos danosos para o proponente em causa a partir do momento em que a sua proposta é recusada. Assim, cumpre considerar, em princípio, que é o conhecimento dessa decisão pelo proponente que dá início à contagem do prazo de prescrição, e não o conhecimento da respetiva fundamentação.

41

Nestas condições, e atendendo ao constatado nos n.os 36 e 37 do presente acórdão, há que considerar que o prazo de prescrição começou a correr no dia em que a Evropaïki Dynamiki recebeu o ofício da Comissão informando-a de que a sua proposta não tinha sido aceite, concretamente, em 15 de setembro de 2004. A este respeito, é irrelevante o facto de a recorrente ter recebido, em data posterior, informações complementares relativamente aos fundamentos da recusa da sua proposta.

42

Neste contexto, também é irrelevante que a decisão de 15 de setembro de 2004 tenha sido anulada, em 10 de setembro de 2008, pelo acórdão do Tribunal Geral, Evropaïki Dynamiki/Comissão, já referido, por falta de fundamentação. Com efeito, é indiferente, para efeitos do começo da contagem do prazo de prescrição, que a atuação ilegal da União tenha sido reconhecida por uma decisão judicial [acórdão do Tribunal de Justiça, Holcim (Deutschland)/Comissão, já referido, n.o 31].

43

Em todo o caso, a Evropaïki Dynamiki não alegou que não dispôs de um prazo razoável para a propositura da ação antes do termo do prazo de prescrição, por este ter começado a correr a partir do momento em que tomou conhecimento da decisão da Comissão de recusa da sua proposta, ou ainda por falta de fundamentação desta decisão.

44

Nestas condições, conclui-se que o Tribunal Geral decidiu, corretamente, que o prazo de prescrição começou a correr a partir de 15 de setembro de 2004 e julga-se improcedente o quarto fundamento.

Quanto ao primeiro fundamento

Argumentos das partes

45

Com o seu primeiro fundamento, a Evropaïki Dynamiki alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar que o artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, que prevê um prazo de dilação em razão da distância, não se aplica ao prazo de prescrição previsto no artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça. Considera que o prazo de dilação em razão da distância se aplica a todos os prazos de interposição de recurso ou de apresentação de peças processuais. A distinção feita, pelo Tribunal Geral, entre «prazo processual» e «prazo de prescrição» não tem fundamento na redação destas disposições nem na jurisprudência.

46

A jurisprudência referida pelo Tribunal Geral em apoio da sua tese de que o artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral não se aplica ao prazo de prescrição dizia apenas respeito aos prazos processuais e não ao prazo de prescrição previsto no artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça. Pelo contrário, o Tribunal Geral, no n.o 26 do acórdão Lefebvre e o./Comissão, já referido, reconheceu expressamente que os artigos 101.° a 103.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral se aplicam aos processos em matéria de responsabilidade extracontratual e, assim, ao prazo de prescrição.

47

No entender da Comissão, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao considerar que o prazo de dilação em razão da distância não é aplicável ao prazo de prescrição, uma vez que este último tem caráter sui generis. Quer o Tribunal de Justiça quer o Tribunal Geral decidiram que um pedido de indemnização prescreveu desde que tenha sido apresentado cinco anos após a data da ocorrência do dano. O acórdão Lefebvre e o./Comissão, já referido, não está em sintonia com a jurisprudência ulterior e não pode ser invocado dado não tratar expressamente da questão de saber se o prazo de dilação em razão da distância é aplicável.

Apreciação do Tribunal

48

Por força do artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, o prazo de dilação em razão da distância aplica-se aos prazos processuais e toma em conta as dificuldades em que se encontram as partes devido ao maior ou menor afastamento em relação à sede do Tribunal de Justiça (v., neste sentido, acórdão de 15 de junho de 1994, Comissão/BASF e o., C-137/92 P, Colet., p. I-2555, n.o 40).

49

O prazo de prescrição, previsto no artigo 46.o, n.o 1, do Estatuto do Tribunal de Justiça, não constitui, todavia, um prazo processual. Estes dois prazos são, como concluiu corretamente o Tribunal Geral, diferentes por natureza.

50

Os prazos processuais foram instituídos com o objetivo de assegurar uma boa administração da justiça, a clareza e a segurança das situações jurídicas (v., neste sentido, acórdãos de 12 de julho de 1984, Moussis/Comissão, 227/83, Recueil, p. 3133, n.o 12, e de 7 de maio de 1986, Barcella e o./Comissão, 191/84, Colet., p. 1541, n.o 12). Assim, designadamente, os prazos de recurso, como o previsto no artigo 263.o, sexto parágrafo, TFUE, e os prazos de recurso de uma decisão do Tribunal Geral, como o previsto no artigo 56.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, destinam-se a assegurar que as decisões administrativas e judiciais adquirem caráter definitivo e, assim, a proteger interesses públicos. Por conseguinte, os prazos processuais são de ordem pública e não estão à disposição das partes ou do juiz, devendo o seu respeito ser apreciado oficiosamente pelo tribunal da União (v., neste sentido, acórdão do 23 de janeiro de 1997, Coen, C-246/95, Colet., p. 1-403, n.o 21 e jurisprudência referida).

51

Ao invés, o Tribunal de Justiça decidiu já que o respeito pelo prazo de prescrição não pode ser apreciado oficiosamente pelo tribunal da União, mas deve ser suscitado pela parte interessada (v., neste sentido, acórdão de 30 de maio de 1989, Roquette frères/Comissão, 20/88, Colet., p. 1553, n.o 12).

52

Com efeito, diferentemente dos prazos processuais, o prazo de prescrição em causa, ao levar à extinção da instância, está relacionado com o direito substantivo, uma vez que afeta o exercício de um direito subjetivo que o interessado não pode voltar efetivamente a invocar nos tribunais.

53

Além disso, o prazo de prescrição, previsto no artigo 46.o, n.o 1, do Estatuto do Tribunal de Justiça, tem designadamente a função, por um lado, de assegurar a proteção dos direitos do lesado, devendo este dispor de tempo suficiente para recolher as informações adequadas com vista à eventual propositura de ação, e, por outro, de evitar que o lesado possa retardar indefinidamente o exercício do seu direito à indemnização. Este prazo protege, por conseguinte, em definitivo, o lesado e a pessoa responsável pelo dano.

54

A prescrição constitui, assim, um pressuposto processual que, diferentemente dos prazos processuais, não é de ordem pública, mas determina a extinção da ação de responsabilidade unicamente a pedido do demandado.

55

Para o efeito, o artigo 46.o, n.o 1, do Estatuto do Tribunal de Justiça determina, no seu primeiro período, a duração do prazo de prescrição. No seu segundo período, esta disposição prevê os factos que levam à interrupção do dito prazo, a saber, a ação de indemnização proposta no Tribunal de Justiça que põe em causa a responsabilidade extracontratual da União, ou o pedido prévio dirigido à instituição competente da União. Este segundo período, embora, na verdade, designe os efeitos processuais dos factos interruptivos que enumera, entre os quais figura, designadamente, um ato processual, não visa impor ao lesado um prazo para a propositura da ação e, assim, um prazo processual, visto que aquele pode igualmente interromper o prazo de prescrição previsto no artigo 46.o, n.o 1, primeiro período, do Estatuto do Tribunal de Justiça, através de um pedido prévio dirigido à instituição competente da União.

56

Além disso, o cálculo do prazo de prescrição não pode, em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 36 do presente acórdão, basear-se em critérios diferentes de critérios estritamente objetivos nem, como o Tribunal Geral concluiu corretamente, diferenciar consoante a interrupção deste prazo seja causada pela propositura de uma ação ou pela apresentação de um pedido prévio. A aplicação do prazo de dilação em razão da distância ao prazo de prescrição tem a consequência de esta se verificar no termo de um período diferente consoante a parte lesada tenha optado pela propositura de ação no Tribunal Geral ou por dirigir um pedido prévio à instituição competente da União, o que está em contradição com a exigência de segurança jurídica necessária para a aplicação dos prazos de prescrição (acórdão Comissão/Cantina sociale di Dolianova e o., já referido, n.o 60).

57

No que toca à eventual repercussão do n.o 26 do acórdão Lefebvre e o./Comissão, já referido, e invocado pela Evropaïki Dynamiki em apoio do seu primeiro fundamento, importa realçar que, embora nesse acórdão tivesse sido aplicado o prazo de dilação em razão da distância para se chegar à conclusão de que a ação em causa era admissível, essa aplicação não foi corroborada com qualquer fundamento suscetível de influir na apreciação que antecede.

58

Por último, verifica-se que a duração do prazo de prescrição previsto no artigo 46.o, n.o 1, do Estatuto do Tribunal de Justiça não é comparável à dos prazos para a propositura de uma ação ou interposição de recurso de uma decisão do Tribunal Geral, pelo que não se pode sustentar que a aplicação do prazo de dilação em razão da distância ao prazo de prescrição é necessária para assegurar o gozo efetivo do direito à indemnização previsto no artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE.

59

Nestas condições, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao decidir que o artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral não se aplica ao prazo de prescrição previsto no artigo 46.o, n.o 1, do Estatuto do Tribunal de Justiça. Há, assim, que julgar improcedente o primeiro fundamento.

Quanto ao segundo e terceiro fundamentos

Argumentos das partes

60

Com o segundo e terceiro fundamentos, a Evropaïki Dynamiki alega que o Tribunal Geral, ao considerar que o artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral não se aplicava ao artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, violou os princípios da igualdade de tratamento e da segurança jurídica.

61

Enquanto o artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral continuar em vigor, o Tribunal Geral deve aplicá-lo de modo uniforme. Embora atualmente as dificuldades que os particulares ou os Estados-Membros encontram para o cumprimento dos prazos sejam claramente menores do que à época em que o prazo de dilação em razão da distância foi instituído, a abolição deste prazo viola, contudo, o princípio da igualdade de tratamento entre as partes e os advogados estabelecidos no Luxemburgo e as partes e os advogados estabelecidos noutros Estados-Membros.

62

Quanto ao princípio da segurança jurídica, uma vez que a relação entre o artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça e o artigo 102.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral não está especificada nos textos processuais em questão, uma mudança na aplicação do artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral só pode ocorrer mediante uma alteração dos Regulamentos de Processo, e não por um despacho interpretativo do Tribunal Geral.

63

No entender da Comissão, estes fundamentos são improcedentes atendendo aos argumentos aduzidos quanto ao primeiro fundamento.

Apreciação do Tribunal

64

Com o segundo e terceiro fundamentos, a Evropaïki Dynamiki pretende, no essencial, demonstrar que o Tribunal Geral devia ter aplicado, no presente caso, o prazo de dilação em razão da distância previsto no artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

65

A este propósito, não se pode deixar de observar que a aplicação, no presente caso, do artigo 102.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral depende, em conformidade com o que se observou no n.o 48 do presente acórdão, unicamente da questão de saber se o prazo de prescrição, previsto no artigo 46.o do Estatuto do Tribunal de Justiça, deve ser qualificado ou não de prazo processual.

66

Em conformidade com o que se observou no n.o 49 do presente acórdão, o prazo de prescrição não constitui um prazo processual.

67

Nestas condições, o segundo e terceiro fundamentos, baseados, respetivamente, numa violação do princípio da igualdade de tratamento e numa violação do princípio da segurança jurídica, são improcedentes.

68

Decorre do exposto que, como nenhum dos fundamentos invocados pela recorrente foi acolhido, há que julgar o recurso improcedente na íntegra.

Quanto às despesas

69

Por força do disposto no artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, aplicável ao processo de recurso de decisão do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da Evropaïki Dynamiki e tendo esta sido vencida, há que condená-la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A Evropaïki Dynamiki — Proigmena Systimata Tilepikoinonion Pliroforikis kai Tilematikis AE é condenada nas despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.