ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

21 de março de 2013 ( *1 )

«Serviços de telecomunicações — Diretiva 2002/20/CE — Artigos 3.° e 12.° a 14.° — Direitos de utilização de radiofrequências — Taxas aplicáveis aos direitos de utilização de radiofrequências — Taxas únicas aplicáveis à concessão e à renovação dos direitos de utilização de radiofrequências — Método de cálculo — Alteração dos direitos existentes»

No processo C-375/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pela Cour constitutionnelle (Bélgica), por decisão de 16 de junho de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 15 de julho de 2011, no processo

Belgacom SA,

Mobistar SA,

KPN Group Belgium SA

contra

Estado belga,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: L. Bay Larsen, exercendo funções de presidente da Quarta Secção, J.-C. Bonichot, C. Toader, A. Prechal e E. Jarašiūnas (relator), juízes,

advogado-geral: N. Jääskinen,

secretário: R. Şereş, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 11 de junho de 2012,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Belgacom SA, por N. Cahen e I. Mathy, avocates,

em representação da Mobistar SA, por V. Vanden Acker, avocate,

em representação da KPN Group Belgium SA, por A. Verheyden e K. Stas, avocats,

em representação do Governo belga, por T. Materne e M. Jacobs, na qualidade de agentes, assistidos por D. Lagasse, avocat,

em representação do Governo cipriota, por D. Kalli, na qualidade de agente,

em representação do Governo lituano, por D. Kriaučiūnas e A. Svinkūnaitė, na qualidade de agentes,

em representação do Governo neerlandês, por C. Wissels e C. Schillemans, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por C. Vrignon, L. Nicolae e G. Braun, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 25 de outubro de 2012,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 3.° e 12.° a 14.° da Diretiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva autorização) (JO L 108, p. 21).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre, por um lado, a Belgacom SA (a seguir «Belgacom»), a Mobistar SA (a seguir «Mobistar») e a KPN Group Belgium SA (a seguir «KPN Group Belgium») e, por outro, o Estado belga, a respeito da conformidade das taxas devidas por estes operadores de telefonia móvel em aplicação dos artigos 2.° e 3.° da Lei de 15 de março de 2010 (Moniteur belge de 25 de março de 2010, p. 18849, a seguir «Lei de 15 de março de 2010»), que alteraram o artigo 30.o da Lei de 13 de junho de 2005 relativa às comunicações eletrónicas (Moniteur belge de 20 de junho de 2005, p. 28070, a seguir «Lei de 13 de junho de 2005»), com o regime de taxas previsto na diretiva autorização.

Quadro jurídico

Direito da União

3

A Diretiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva-quadro) (JO L 108, p. 33, a seguir «diretiva-quadro»), dispõe, no seu artigo 8.o, intitulado «Objetivos de política geral e princípios de regulação»:

«1.   Os Estados-Membros deverão assegurar que, no desempenho das funções de regulação constante[s] da presente diretiva e das diretivas específicas, as autoridades reguladoras nacionais tomem todas as medidas razoáveis para realizar os objetivos fixados nos n.os 2, 3 e 4. Tais medidas deverão ser proporcionais a esses objetivos.

Os Estados-Membros deverão assegurar que as autoridades reguladoras nacionais, no desempenho das funções de regulação constantes da presente diretiva e das diretivas específicas, e nomeadamente das destinadas a assegurar uma concorrência efetiva, tomem na máxima conta que é desejável garantir a neutralidade tecnológica da regulamentação.

[…]

2.   As autoridades reguladoras nacionais devem promover a concorrência na oferta de redes de comunicações eletrónicas, de serviços de comunicações eletrónicas e de recursos e serviços conexos, nomeadamente:

[…]

b)

Assegurando que a concorrência no setor das comunicações eletrónicas não seja distorcida nem entravada;

c)

Encorajando investimentos eficientes em infraestruturas e promovendo a inovação; e

d)

Incentivando uma utilização eficiente e assegurando uma gestão eficaz das radiofrequências e dos recursos de numeração.

[…]»

4

Os considerandos 32 e 33 da diretiva autorização enunciam o seguinte:

«(32)

Para além dos encargos administrativos, podem ser impostas taxas pela utilização de radiofrequências e números, para garantir a utilização ótima de tais recursos. Tais taxas não devem impedir o desenvolvimento de serviços inovadores e da concorrência no mercado. A presente diretiva não prejudica o objetivo para o qual são empregues as taxas aplicáveis aos direitos de utilização. Essas taxas podem, por exemplo, ser utilizadas para financiar atividades das autoridades reguladoras nacionais que não possam ser cobertas pelos encargos administrativos. Se, em caso de procedimento de seleção concorrencial ou comparativa, as taxas relativas aos direitos de utilização das radiofrequências consistirem total ou parcialmente num montante único, serão propostas modalidades de pagamento adequadas, a fim de assegurar que tais taxas não conduzam, na prática, a uma seleção com base em critérios alheios ao objetivo de garantir uma utilização ótima das radiofrequências. A Comissão pode publicar, numa base regular, estudos comparativos sobre as melhores práticas em matéria de consignação de radiofrequências, de consignação de números ou de concessão de direitos de passagem.

(33)

Os Estados-Membros podem ter necessidade de alterar os direitos, condições, procedimentos, encargos e taxas relacionados com as autorizações gerais e os direitos de utilização, quando para tal exista uma justificação objetiva. Essas alterações deve[m] ser devida e atempadamente notificadas a todas as partes interessadas, às quais deve ser dada a oportunidade de exprimirem os seus pontos de vista sobre essas alterações.»

5

O artigo 3.o da diretiva autorização, intitulado «Autorização geral de redes e serviços de comunicações eletrónicas», prevê, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   Os Estados-Membros garantirão a liberdade de oferecer serviços e redes de comunicações eletrónicas, sob reserva das condições fixadas na presente diretiva. Para o efeito, os Estados-Membros não impedirão que uma empresa ofereça serviços ou redes de comunicações eletrónicas, exceto pelos motivos constantes do n.o 1 do artigo 46.o do Tratado.

2.   A oferta de serviços de comunicações eletrónicas ou a oferta de redes de comunicações eletrónicas pode, sem prejuízo das obrigações específicas referidas no n.o 2 do artigo 6.o ou dos direitos de utilização referidos no artigo 5.o, apenas estar sujeita a uma autorização geral. […]»

6

O artigo 12.o da diretiva autorização, intitulado «Encargos administrativos», dispõe:

«1.   Todos os encargos administrativos impostos às empresas que ofereçam serviços ou redes ao abrigo da autorização geral ou às quais foi concedido um direito de utilização:

a)

Cobrirão, no total, apenas os custos administrativos decorrentes da gestão, controlo e aplicação do regime de autorização geral, bem como dos direitos de utilização e das obrigações específicas referidas no n.o 2 do artigo 6.o, os quais poderão incluir custos de cooperação internacional, harmonização e normalização, análise de mercados, vigilância do cumprimento e outros tipos de controlo do mercado, bem como trabalho de regulação que envolva a preparação e execução de legislação derivada e decisões administrativas, como decisões em matéria de acesso e de interligação; e

b)

Serão impostos às empresas de forma objetiva, transparente e proporcional, que minimize os custos administrativos adicionais e os encargos conexos.

2.   Caso imponham encargos administrativos, as autoridades reguladoras nacionais publicarão uma súmula anual dos seus custos administrativos e do montante total resultante da cobrança dos encargos. Em função da diferença entre o montante total dos encargos e os custos administrativos, serão feitos os devidos ajustamentos.»

7

O artigo 13.o da mesma diretiva, intitulado «Taxas aplicáveis aos direitos de utilização e direitos de instalação de recursos», prevê:

«Os Estados-Membros podem autorizar a autoridade competente a impor taxas sobre os direitos de utilização das radiofrequências, ou números ou direitos de instalação de recursos em propriedade pública ou privada que reflitam a necessidade de garantir a utilização ótima desses recursos. Os Estados-Membros garantirão que tais taxas sejam objetivamente justificadas, transparentes, não discriminatórias e proporcionais relativamente ao fim a que se destinam e terão em conta os objetivos do artigo 8.o da [diretiva-quadro].»

8

O artigo 14.o da diretiva autorização, intitulado «Alteração dos direitos e obrigações», enuncia:

«1.   Os Estados-Membros garantirão que os direitos, condições e procedimentos relativos às autorizações gerais e aos direitos de utilização ou direitos de instalação de recursos apenas possam ser alterados em casos objetivamente justificados e de modo proporcional. A intenção de proceder a tais alterações será anunciada de forma adequada, e será concedido às partes interessadas, incluindo utilizadores e consumidores, um prazo suficiente para exprimirem os seus pontos de vista sobre as alterações propostas, prazo esse que, salvo em circunstâncias excecionais, não será inferior a quatro semanas.

2.   Os Estados-Membros não restringirão nem retirarão direitos de instalação de recursos antes de expirado o prazo para o qual foram atribuídos, salvo em casos justificados e, se apropriado, em conformidade com as disposições nacionais relevantes em matéria de compensação por direitos retirados.»

9

A parte B do anexo da diretiva autorização prevê:

«Condições que podem ser associadas aos direitos de utilização de radiofrequências

[…]

6.

Taxas de utilização, em conformidade com o artigo 13.o da presente diretiva.

[…]»

10

O artigo 14.o da diretiva autorização, conforme alterado pela Diretiva 2009/140/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2009 (JO L 337, p. 37), prevê:

«1.   Os Estados-Membros devem garantir que os direitos, condições e procedimentos relativos às autorizações gerais e direitos de utilização ou aos direitos de instalação de recursos apenas possam ser alterados em casos objetivamente justificados e de um modo proporcionado, tendo em conta, se for caso disso, as condições específicas aplicáveis aos direitos transmissíveis de utilização de radiofrequências. Salvo nos casos em que as alterações propostas sejam menores e tenham sido acordadas com o titular dos direitos ou da autorização geral, a intenção de proceder a tais alterações é anunciada de forma adequada, e é concedido aos interessados, incluindo utilizadores e consumidores, um prazo suficiente para exprimirem os seus pontos de vista sobre as mesmas, prazo esse que, salvo em circunstâncias excecionais, não pode ser inferior a quatro semanas.

2.   Os Estados-Membros não podem restringir nem revogar direitos de instalação de recursos ou direitos de utilização de radiofrequências antes de expirado o prazo para o qual foram atribuídos, salvo em casos justificados e, se aplicável, em conformidade com o anexo e as disposições nacionais relevantes em matéria de indemnizações por perda de direitos.»

11

O artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2009/140 dispõe:

«Os Estados-Membros devem aprovar e publicar, até 25 de maio de 2011, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva. Os Estados-Membros devem comunicar imediatamente à Comissão o texto dessas disposições.

Os Estados-Membros aplicam essas disposições a partir de 26 de maio de 2011.

[…]»

Direito belga

12

O artigo 30.o da Lei de 13 de junho de 2005 dispõe o seguinte:

«§ 1 Os   direitos de utilização referidos nos artigos 11.° [direitos de utilização de número] e 18.° [direitos de utilização de radiofrequências] podem ser sujeitos a taxas, para garantir uma utilização ótima desses meios. As taxas são cobradas pelo [Institut belge des services postaux et des télécommunications (Instituto Belga dos Serviços Postais e de Telecomunicações), a seguir ‘IBPT’].

§ 2   Após parecer do [IBPT], o Rei fixa o montante e as modalidades das taxas referidas no n.o 1.»

13

O artigo 2.o da Lei de 15 de março de 2010 prevê:

«São introduzidas as seguintes alterações ao artigo 30.o da Lei de 13 de junho de 2005 […]:

1o   Entre os n.os 1 e 2 são inseridos os n.os 1.1., 1.2., 1.3. e 1.4., com a seguinte redação:

‘§ 1.1.

Com o objetivo indicado no n.o 1, os operadores autorizados a dispor de direitos de utilização de radiofrequências para exploração de uma rede e para fornecimento de serviços de comunicações eletrónicas móveis oferecidas ao público estão sujeitos, [no início do período de validade dos direitos de utilização], ao pagamento de uma taxa única.

A taxa única é determinada no momento da concessão das frequências.

A taxa única tem o valor de:

1o

51644 euros por MHz e por mês, para as bandas de frequência de 880-915 MHz e 925-960 MHz. A obtenção de direitos de utilização para as bandas de frequência de 880-915 MHz e 925-960 MHz implica também a obtenção de direitos de utilização para as bandas de frequência de 1710-1785 MHz e 1805-1880 MHz: a quantidade de espetro atribuído nas bandas de 1710-1785 MHz e 1805-1880 MHz é igual ao dobro da quantidade de espetro atribuído nas bandas de 880-915 MHz e 925-960 MHz, arredondado para o múltiplo de 5 MHz superior. Por derrogação do que procede, até 26 de novembro de 2015, a taxa única para a quantidade de espetro atribuído em 1 de janeiro de 2010 nas bandas de 880-915 MHz e 925-960 MHz é também aplicável à quantidade máxima de espetro que pode ser atribuído em 1 de janeiro nas bandas de 1710-1785 MHz e 1805-1880 MHz;

2o

20833 euros por MHz e por mês, para as bandas de frequência de 1920-1980 MHz e 2110-2170 MHz, salvo se a quantidade total de espetro detido pelo operador nestas bandas de frequência não exceder 2 x 5 MHz. Neste último caso, a taxa única é de 32000 por MHz e por mês.

3o

2778 euros por MHz e por mês, para a banda de frequência de 2500-2690 MHz.

No momento da adjudicação das frequências mediante venda em hasta pública, o montante mínimo da taxa única referido no presente número 1.1. vale como base de licitação para os candidatos.

§ 1.2.

Os operadores estão sujeitos a uma taxa única para cada período de renovação da autorização.

O montante da taxa única corresponde à taxa única referida no § 1.1., primeiro parágrafo.

Para o cálculo do montante, é tida em conta a parte dos direitos de utilização que o operador pretende manter quando da renovação.

Se o operador pretender ceder espetro, este deve formar um bloco contínuo.

§ 1.3.

O pagamento da taxa única é efetuado, consoante o caso, nos quinze dias seguintes ao início do período de validade referido no § 1.1., primeiro parágrafo, e nos quinze dias seguintes ao início do período de renovação referido no § 1.2., primeiro parágrafo.

Por derrogação do parágrafo anterior, o operador tem a possibilidade de efetuar o pagamento do seguinte modo:

a)

o operador paga um valor proporcional ao número de meses restante até ao ano civil seguinte, consoante o caso, nos quinze dias seguintes ao início do período de validade referido no § 1.1, primeiro parágrafo, e nos quinze dias seguintes ao início do período de renovação referido no § 1.2, primeiro parágrafo;

b)

além disso, o operador paga, até 15 de dezembro, o mais tardar, a totalidade da taxa única relativa o ano seguinte. Se a autorização expirar durante o ano seguinte, o operador paga um valor proporcional ao número de meses restante até à expiração dos direitos de utilização;

c)

a taxa de juro legal, calculada em conformidade com o artigo 2.o, § 1, da Lei de 5 de maio de 1865 relativa a juros de empréstimo, é aplicável, consoante o caso, a partir do décimo sexto dia seguinte ao início do período de validade referido no § 1.1., primeiro parágrafo, ou do décimo sexto dia seguinte ao início do período de renovação referido no § 1.2., primeiro parágrafo;

d)

em simultâneo com o pagamento da taxa única, o operador paga os juros sobre o remanescente do montante em dívida.

O operador informa o [IBPT] da sua opção, nos dois dias úteis seguintes, consoante o caso, ao início do período de validade referido no § 1.1., primeiro parágrafo, e ao início do período de renovação referido no § 1.2., primeiro parágrafo.

A taxa única não é reembolsada em caso algum, nem total nem parcialmente.

§ 1.4. Se um operador não pagar, total ou parcialmente, a taxa única pelas respetivas bandas de frequência, como estipulado no § 1.1., 1°, 2° ou 3°, todos os direitos de utilização para as respetivas bandas de frequência são revogados’.

2o   O § 2 é completado com a expressão ‘com exceção do disposto nos §§ 1.1., 1.2. e 1.3.’»

14

O artigo 3.o da Lei de 15 de março de 2010 dispõe:

«A título transitório, se o prazo para renunciar à recondução tácita da sua autorização já tiver expirado no momento da entrada em vigor da presente lei, o operador pode, contudo, renunciar à renovação dos seus direitos de utilização, até ao primeiro dia do novo período dos direitos de utilização prolongada, sem estar sujeito à taxa única relativa a este novo período.»

15

O artigo 14.o da Lei de 15 de março de 2010 prevê:

«A presente lei entra em vigor na data da sua publicação no Moniteur belge [Moniteur belge de 25 de março de 2010, p. 18849].»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

16

A Belgacom, a Mobistar e a KPN Group Belgium são operadores de redes de telefonia móvel, a quem foram concedidas autorizações com direitos de utilização das radiofrequências de 900 MHz, 1800 MHz e 2000 MHz a 2600 MHz, na Bélgica.

17

A Lei de 12 de dezembro de 1994 (Moniteur belge de 22 de dezembro de 1994, p. 31624) liberalizou o setor da telefonia móvel na Bélgica, permitindo ao Conselho de Ministros atribuir a operadores diferentes do anterior operador público autorizações individuais para a prestação de serviços de telefonia móvel na banda de frequência de 900 MHz, por um período de quinze anos a contar da data da respetiva emissão.

18

Em 27 de novembro de 1995, o Conselho de Ministros atribuiu uma autorização à Mobistar e, em 2 de julho de 1996, a Belgacom Mobile recebeu autorização, com efeitos retroativos a 8 de abril de 1995, para explorar uma rede para os canais de 900 MHz, que já utilizava ao abrigo de um contrato de gestão com o Estado belga. Em contrapartida, cada um dos dois operadores devia pagar um direito único de concessão de cerca de 9 mil milhões de BEF (223104172,30 euros) e taxas anuais ao IBPT pela utilização das radiofrequências.

19

Em 1997, o Governo belga decidiu abrir à exploração a banda DCS 1800 MHz, a fim de permitir a entrada no mercado de um terceiro e, possivelmente, de um quarto operador. O Decreto Real de 24 de outubro de 1997 relativo ao estabelecimento e à exploração de redes de telefonia móvel DCS-1800 fixou o procedimento para a obtenção de uma autorização para o estabelecimento e a exploração de uma rede de telefonia móvel DCS-1800, prevendo que essa autorização seria válida por um período de quinze anos a contar da data da emissão da autorização de exploração. Em 2 de julho de 1998, a KPN Group Belgium (anteriormente KPN Orange SA, depois BASE SA) obteve uma autorização para a banda de 1800 MHz, contra pagamento de um direito único de concessão no valor de 8,005 mil milhões de BEF (198438766,50 euros) e de taxas anuais pela utilização das frequências.

20

Tendo em conta as desvantagens da utilização das frequências de 1800 MHz por comparação com as frequências de 900 MHz, designadamente um alcance mais fraco das estações de base, que implica a instalação de um maior número de antenas para obter a mesma cobertura, o IBPT decidiu, em 2003, atribuir à KPN Group Belgium alguns canais de 900 MHz e, em troca, atribuir também alguns canais de 1800 MHz à Belgacom e à Mobistar. Consequentemente, a partir de 2003, a KPN Group Belgium beneficiou da concessão de frequência de 900 MHz suplementares, como contrapartida da concessão à Belgacom e à Mobistar de frequências na banda de 1800 MHz. O equilíbrio do número de canais assim atribuídos a cada um dos três operadores devia manter-se até 2015.

21

O Decreto Real de 18 de janeiro de 2001 instituiu o procedimento de concessão de autorizações para os sistemas de terceira geração UMTS que utilizam as bandas de frequência entre 1885-2025 MHz e 2110-2200 MHz. A Belgacom, a Mobistar e a KPN Group Belgium apresentaram candidatura e obtiveram autorização para explorar esses sistemas mediante contrapartida de um direito único de concessão no valor de 150 milhões de euros, pago por cada um desses operadores, por um período de vinte anos, com possibilidade de prorrogação, por decreto real, por períodos de 5 anos.

22

No momento da concessão de cada uma das referidas autorizações, a Belgacom, a Mobistar e a KPN Group Belgium obrigaram-se a pagar, em contrapartida:

um direito único de concessão;

uma taxa anual pela disponibilização das frequências;

uma taxa anual pela gestão das autorizações.

23

Por decisão de 25 de novembro de 2008, o IBPT renunciou à renovação tácita das autorizações de utilização das radiofrequências de segunda geração (2G) que tinham sido concedidas aos três operadores Belgacom, Mobistar e KPN Group Belgium, a fim de impor uma nova taxa e implementar uma política do espetro a mais eficaz possível.

24

A Belgacom, a Mobistar e a KPN Group Belgium impugnaram esta decisão na Cour d’appel de Bruxelles, a qual foi anulada por este órgão jurisdicional, através do acórdão de 20 de julho de 2009, que dizia respeito à Belgacom, e do acórdão de 22 de setembro de 2009, que dizia respeito à Mobistar. Na sequência destes dois acórdãos, o IBPT decidiu revogar a sua decisão de 25 de novembro de 2008 aplicável à KPN Group Belgium, para garantir um tratamento idêntico dos três operadores.

25

Na sequência dos ditos acórdãos da Cour d’appel de Bruxelles, o legislador belga, em 15 de março de 2010, aprovou uma lei que alterou o artigo 30.o da Lei de 13 de junho de 2005. Como resulta dos artigos 2.° e 3.° da Lei de 15 de março de 2010, referidos nos n.os 13 e 14 do presente acórdão, essa lei prevê:

uma taxa única, em substituição do anterior direito único de concessão, aplicável aos operadores de telefonia móvel, para garantir uma utilização ótima das radiofrequências, e que é devida não só no momento da concessão das autorizações dos direitos de utilização das radiofrequências mas também aquando de cada renovação da autorização existente;

um montante de taxa única variável em função da radiofrequência em causa e calculada com base no direito único de concessão pago pelos operadores no momento em que obtiveram pela primeira vez a respetiva autorização, em resultado quer de um procedimento de concurso comparativo quer de um leilão;

a possibilidade de os operadores de telefonia móvel renunciarem aos seus direitos de utilização antes do início do período de validade dos seus direitos de utilização, sem ficarem obrigados ao pagamento da taxa única relativa aos direitos a que renunciaram;

além da taxa única, a obrigação de os operadores que são titulares de uma autorização pagarem duas taxas anuais, a saber, uma taxa destinada a cobrir os custos de disponibilização das frequências e outra destinada a cobrir as despesas de gestão da autorização.

26

A Belgacom, a Mobistar e a KPN Group Belgium interpuseram recursos na Cour constitutionnelle, para anulação dos artigos 2.° e 3.° da Lei de 15 de março de 2010. Em apoio dos seus pedidos, alegaram, designadamente, que estas disposições são contrárias aos artigos 3.° e 12.° a 14.° da diretiva autorização. Mais precisamente, contestam o facto de a taxa única ser devida não só na data da concessão da autorização mas também na data da sua renovação e de ser cobrada complementarmente à taxa que pagam anualmente pela disponibilização das frequências. A Belgacom, a Mobistar e a KPN Group Belgium contestam igualmente o montante e as regras de cálculo da taxa única, porquanto esta é calculada não em função do valor económico das frequências, mas em função do valor de mercado para os operadores.

27

O órgão jurisdicional de reenvio refere que resulta dos trabalhos preparatórios da Lei de 15 de março de 2010 que a taxa única constitui uma compensação pela utilização das frequências e prossegue um objetivo idêntico ao das taxas anuais pela disponibilização das frequências, sem substituir o pagamento destas últimas taxas. Indica que resulta também dos referidos trabalhos preparatórios que o legislador belga considerou que os artigos 2.° e 3.° da Lei de 15 de março de 2010, cuja validade foi impugnada no órgão jurisdicional de reenvio, estão em conformidade com a diretiva autorização, dado que preveem uma divisão das compensações devidas pelos direitos de utilização entre uma parte única e uma parte anual. Com efeito, a taxa única cobre o direito de utilização das frequências e corresponde ao valor do espetro, enquanto recurso escasso, ao passo que a taxa anual cobre os custos de utilização das frequências, ou seja, o controlo, a coordenação, a inspeção e outras atividades da autoridade competente.

28

Foi nestas condições que a Cour constitutionnelle decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Os artigos 3.°, 12.° e 13.°, na sua versão atual, da [d]iretiva [‘autorização’] permitem aos Estados-Membros impor aos operadores titulares de direitos individuais de utilização de frequências móveis por um período de quinze anos no quadro de autorizações para implementar e explorar no seu território uma rede móvel[,] concedidas na vigência do anterior regime jurídico, uma taxa única para renovação dos seus direitos individuais de utilização das frequências, cujo montante, relativo ao número de frequências e de meses a que os direitos de utilização dizem respeito, é calculado com base no anterior direito de concessão única ligado à atribuição das referidas autorizações, taxa única essa que é cobrada complementarmente, por um lado, a uma taxa única de disponibilização de frequências destinada antes de mais a cobrir os custos de disponibilização das frequências, ao mesmo tempo que as valoriza parcialmente, sendo as duas taxas justificadas pelo objetivo de favorecer a utilização ótima das frequências, e, por outro, a uma taxa que cobre as despesas de gestão da autorização?

2)

Os artigos 3.°, 12.° e 13.° da mesma diretiva ‘autorização’ permitem aos Estados-Membros impor aos operadores candidatos à obtenção de novos direitos de utilização das frequências móveis o pagamento de uma taxa única, cujo montante é determinado por licitação quando da adjudicação das frequências, de modo a valorizá-las, taxa única essa que é cobrada complementarmente, por um lado, a uma taxa anual de disponibilização destinada antes de mais a cobrir os custos da disponibilização das frequências, ao mesmo tempo que as valoriza parcialmente, sendo as duas taxas justificadas pelo objetivo de favorecer a utilização ótima das frequências, e, por outro, a uma taxa anual de gestão das autorizações de implementação e exploração de uma rede móvel, emitidas na vigência do anterior regime legal?

3)

O artigo 14.o, n.o 2, da mesma [d]iretiva ‘autorização’ permite a um Estado-Membro impor aos operadores de telecomunicações móveis, para um novo período de renovação dos respetivos direitos individuais de utilização de frequências móveis, já obtido por alguns deles, mas antes de o mesmo ter início, o pagamento de uma taxa única para a renovação dos direitos de utilização das frequências de que dispunham no início desse novo período, taxa única essa que é justificada pelo objetivo de favorecer a utilização ótima das frequências mediante a sua valorização e cobrada complementarmente, por um lado, a uma taxa anual de disponibilização das frequências destinada antes de mais a cobrir os custos de disponibilização das frequências, ao mesmo que as valoriza parcialmente, sendo as duas taxas justificadas pelo objetivo de favorecer a utilização ótima das frequências, e, por outro, a uma taxa anual de gestão das autorizações de implementação e exploração de uma rede móvel, emitidas na vigência do anterior regime legal?

4)

O artigo 14.o, n.o 1, da mesma diretiva ‘autorização’ permite a um Estado-Membro acrescentar, como requisito para a obtenção e renovação dos direitos de utilização das frequências, uma taxa única, fixada por meio de licitação e sem limite máximo, e que é cobrada complementarmente, por um lado, a uma taxa anual de disponibilização das frequências destinada, antes de mais, a cobrir os custos da disponibilização das frequências, ao mesmo tempo que as valoriza parcialmente, sendo as duas taxas justificadas pelo objetivo de favorecer a utilização ótima das frequências, e, por outro, a uma taxa anual de gestão das autorizações de implementação e exploração de uma rede móvel, emitidas na vigência do anterior regime legal?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto às duas primeiras questões

Quanto à admissibilidade

29

O Governo cipriota põe em causa a admissibilidade da segunda questão prejudicial, alegando que a resposta a esta questão não é objetivamente necessária para resolver o litígio do processo principal. Com efeito, considera que a segunda questão diz respeito à concessão de novos direitos de utilização de radiofrequências, quando resulta da decisão de reenvio que o litígio respeita à renovação de direitos de utilização de radiofrequências.

30

A este propósito, importa recordar que, por força de jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, as questões relativas à interpretação do direito da União, submetidas pelo juiz nacional no quadro regulamentar e factual que este define sob a sua responsabilidade, e cuja exatidão não compete ao Tribunal de Justiça verificar, gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar-se sobre um pedido apresentado por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não disponha dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (v., nomeadamente, acórdão de 12 de julho de 2012, VALE Építési, C-378/10, n.o 18 e jurisprudência referida).

31

No caso em apreço, a segunda questão visa a interpretação da diretiva autorização, no que respeita à possibilidade de os Estados-Membros imporem uma taxa única aos operadores de telefonia móvel candidatos à obtenção de novos direitos de utilização das radiofrequências. Ora, resulta dos autos que os artigos 2.° e 3.° da Lei de 15 de março de 2010, que são objeto dos recursos de anulação no processo principal, preveem uma taxa única não apenas para a renovação dos direitos de utilização das radiofrequências mas também para as novas aquisições de direitos de utilização de radiofrequências.

32

Nestas condições, não se pode considerar que a interpretação solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal. Por conseguinte, a segunda questão prejudicial deve ser declarada admissível.

Quanto ao mérito

33

Com as suas duas primeiras questões, que devem ser examinadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 3.°, 12.° e 13.° da diretiva autorização devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que um Estado-Membro imponha aos operadores de telefonia móvel titulares de direitos de utilização de radiofrequências uma taxa única devida tanto por uma nova aquisição de direitos de utilização de radiofrequências como pela renovação destes últimos, em acréscimo não só de uma taxa anual de disponibilização das frequências, destinada, antes de mais, a cobrir os custos de disponibilização das frequências, ao mesmo tempo que as valoriza parcialmente, sendo as duas taxas justificadas pelo objetivo de favorecer a utilização ótima do recurso escasso que essas frequências constituem, mas também de uma taxa que cobre as despesas de gestão da autorização.

34

O órgão jurisdicional de reenvio interroga-se também sobre a conformidade, com estas disposições da diretiva autorização, das regras de fixação do montante da taxa única aplicável aos direitos de utilização de radiofrequências, que é determinado quer por referência ao anterior direito de concessão único calculado com base no número de frequências e de meses a que os direitos de utilização se reportam, quer por licitação aquando da adjudicação das frequências.

35

A título preliminar, cumpre declarar que os artigos 3.° e 12.° desta diretiva, que são relativos, respetivamente, à obrigação de os Estados-Membros garantirem a liberdade de oferecer redes e serviços de comunicações eletrónicas e às regras de imposição de «encargos administrativos», não se destinam a ser aplicados a uma taxa como a que está em causa no processo principal, que não se enquadra em nenhuma destas duas situações.

36

Como resulta das duas primeiras questões, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que interprete a diretiva autorização, no que respeita, por um lado, à possibilidade de os Estados-Membros imporem uma taxa única aos operadores de telefonia móvel e, por outro, às regras de fixação do montante da taxa única, tanto a título da atribuição como a título da renovação dos direitos de utilização de radiofrequências.

37

No que se refere à imposição de uma taxa única, cumpre declarar, a título preliminar, que a diretiva autorização diz apenas respeito ao procedimento de atribuição dos direitos de utilização de radiofrequências e não contém nenhuma disposição especial que estabeleça os requisitos do procedimento de renovação dos direitos de utilização de radiofrequências já atribuídos.

38

No entanto, como sublinhou o advogado-geral no n.o 40 das suas conclusões, quando os direitos de utilização individuais são concedidos pelos Estados-Membros, por um período limitado, a renovação dessa autorização deve ser considerada como uma atribuição de novos direitos para um novo período.

39

Por conseguinte, importa declarar que, em conformidade com a diretiva autorização, o procedimento de atribuição dos direitos de utilização de radiofrequências e o procedimento de renovação dos referidos direitos devem estar sujeitos ao mesmo regime. Por conseguinte, o artigo 13.o da diretiva autorização deve ser aplicado da mesma forma aos dois procedimentos.

40

A este respeito, importa sublinhar que resulta de jurisprudência assente que, no âmbito da diretiva autorização, os Estados-Membros não podem receber outras taxas ou encargos sobre o fornecimento de redes e de serviços de comunicações eletrónicas além das previstas nesta diretiva (v., por analogia, acórdãos de 18 de julho de 2006, Nuova società di telecomunicazioni, C-339/04, Colet., p. I-6917, n.o 35; de 10 de março de 2011, Telefónica Móviles España, C-85/10, Colet., p. I-1575, n.o 21; e de 12 de julho de 2012, Vodafone España e France Telecom España, C-55/11, C-57/11 e C-58/11, n.o 28).

41

No processo principal, como resulta da decisão de reenvio, o órgão jurisdicional nacional pretende, em substância, saber se o artigo 13.o da diretiva autorização deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um Estado-Membro sujeite os operadores a uma taxa única pelos «direitos de utilização de radiofrequências», como a que está em causa no processo principal, quando já lhes é imposta, por um lado, uma taxa anual de disponibilização de frequências e, por outro, uma taxa que cobre as despesas de gestão da autorização.

42

A este respeito, importa recordar que, por força do artigo 13.o da diretiva autorização, os Estados-Membros podem, além das taxas destinadas a cobrir as despesas administrativas, sujeitar os direitos de utilização de radiofrequências a uma taxa que tem por fim assegurar uma utilização ótima desses recursos (v., neste sentido, acórdão de 20 de outubro de 2005, ISIS Multimedia Net e Firma O2, C-327/03 e C-328/03, Colet., p. I-8877, n.o 23, e acórdão Telefónica Móviles España, já referido, n.o 24).

43

Ora, o artigo 13.o da diretiva autorização não determina expressamente a forma que deve ter essa taxa imposta pela utilização de radiofrequências, nem a frequência da sua imposição.

44

Pelo contrário, resulta do considerando 32 da diretiva autorização que as taxas pela utilização de radiofrequências podem consistir num montante único ou num montante periódico.

45

Por outro lado, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a diretiva autorização não se pronuncia sobre a finalidade com que essas taxas são cobradas (v., neste sentido, acórdão Telefónica Móviles España, já referido, n.o 33).

46

No entanto, o artigo 13.o desta diretiva impõe que os Estados-Membros garantam que as taxas aplicáveis à utilização de radiofrequências sejam objetivamente justificadas, transparentes, não discriminatórias e proporcionadas relativamente ao fim a que se destinam e tenham em conta os objetivos fixados no artigo 8.o da diretiva-quadro, designadamente o da promoção da concorrência e o da utilização eficiente das radiofrequências.

47

Resulta também do referido artigo 13.o e do considerando 32 da diretiva autorização que a imposição de uma taxa aos operadores de serviços de telecomunicações pela utilização de recursos deve prosseguir o objetivo de assegurar uma utilização ótima de tais recursos e não impedir o desenvolvimento de serviços inovadores e da concorrência no mercado.

48

Por conseguinte, os artigos 12.° e 13.° da diretiva autorização não se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que prevê a imposição de uma taxa que visa favorecer a utilização ótima das frequências, mesmo que essa taxa venha em acréscimo de outra taxa anual destinada também, em parte, ao mesmo objetivo, contanto que o conjunto dessas taxas cumpra os requisitos enunciados nos n.os 46 e 47 do presente acórdão, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

49

No que respeita às regras de fixação do montante de uma taxa única aplicável aos direitos de utilização de radiofrequências, como a que está em causa no processo principal, importa recordar que a diretiva autorização fixa as exigências que os Estados-Membros devem respeitar na determinação do montante de uma taxa pela utilização de radiofrequências, sem contudo prever expressamente um modo concreto de determinação do montante dessa taxa (acórdão Telefónica Móviles España, já referido, n.o 25).

50

A este propósito, importa recordar que a autorização de utilizar um bem público que constitui um recurso escasso permite ao titular da mesma realizar lucros económicos consideráveis e confere-lhe vantagens comparativamente a outros operadores que também pretendam utilizar e explorar esse recurso, o que justifica a imposição de uma taxa que reflita, designadamente, o valor da utilização do recurso escasso em causa (acórdão Telefónica Móviles España, já referido, n.o 27).

51

Nestas condições, o objetivo de assegurar que os operadores utilizem de forma ótima os recursos escassos a que têm acesso implica que o montante dessa taxa seja fixado a um nível adequado que reflita, designadamente, o valor da utilização desses recursos, o que exige que a situação económica e tecnológica do mercado em causa seja tida em conta (acórdão Telefónica Móviles España, já referido, n.o 28).

52

Daqui decorre, como sublinhou o advogado-geral nos n.os 54 e 55 das suas conclusões, que a fixação de uma taxa aplicável aos direitos de utilização de radiofrequências por referência quer ao montante do anterior direito de concessão único calculado com base no número de frequências e de meses a que os direitos de utilização se reportam quer aos montantes resultantes de licitações pode constituir um método apropriado de determinação do valor das radiofrequências.

53

Com efeito, tendo em conta os princípios utilizados pelo Reino da Bélgica para fixar o montante do anterior direito de concessão único, afigura-se que ambos os métodos permitem obter montantes que têm relação com a rentabilidade previsível das radiofrequências em causa. Ora, a diretiva autorização não se opõe à utilização de um critério deste tipo para fixar o montante das taxas acima mencionadas.

54

Tendo em conta o conjunto destas considerações, há que responder às duas primeiras questões que os artigos 12.° e 13.° da diretiva autorização devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que um Estado-Membro imponha uma taxa única aos operadores de telefonia móvel titulares de direitos de utilização de radiofrequências, devida tanto por uma nova aquisição de direitos de utilização de radiofrequências como pela renovação destes últimos, em acréscimo não só de uma taxa anual de disponibilização de frequências, destinada a favorecer a utilização ótima dos recursos, mas também de uma taxa que cobre as despesas de gestão da autorização, contanto que essas taxas visem realmente assegurar uma utilização ótima do recurso que essas radiofrequências constituem, sejam objetivamente justificadas, transparentes, não discriminatórias e proporcionadas relativamente ao fim a que se destinam e tenham em conta os objetivos fixados no artigo 8.o da diretiva-quadro, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

55

Com esta mesma ressalva, a fixação do montante de uma taxa única pelos direitos de utilização de radiofrequências por referência quer ao montante do anterior direito de concessão único calculado com base no número de frequências e de meses a que os direitos de utilização de frequências se reportam quer aos montantes resultantes de licitações pode ser um método apropriado de determinação do valor das radiofrequências.

Quanto à quarta questão

56

Com a sua quarta questão, a que importa responder antes da terceira, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 14.o, n.o 1, da diretiva autorização deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um Estado-Membro imponha a um operador de telefonia móvel uma taxa como a que está em causa no processo principal.

57

Importa observar que o artigo 14.o, n.o 1, da diretiva autorização prevê que os Estados-Membros podem alterar os direitos, condições e procedimentos aplicáveis aos direitos de utilização de radiofrequências, em casos objetivamente justificados e de modo proporcionado. Além disso, este artigo prevê que a intenção de proceder a tais alterações é anunciada de forma adequada e que é concedido aos interessados um prazo suficiente, de pelo menos quatro semanas, para exprimirem os seus pontos de vista.

58

Além disso, resulta da parte B, n.o 6, do anexo da diretiva autorização que a imposição de taxas pelos direitos de utilização de radiofrequências, em conformidade com o artigo 13.o desta diretiva, é uma das condições que podem ser associadas aos direitos de utilização de radiofrequências.

59

Daqui decorre que a imposição de uma taxa única como a que está em causa no processo principal constitui uma alteração das condições aplicáveis aos operadores titulares de direitos de utilização de radiofrequências. Em consequência, os Estados-Membros estão obrigados a garantir que as condições estabelecidas para a alteração do regime de taxas impostas aos operadores de telefonia móvel a título dos diretos de utilização de radiofrequências sejam respeitadas.

60

Consequentemente, importa observar que um Estado-Membro que pretenda alterar as taxas aplicáveis aos direitos de utilização de radiofrequências previamente conferidos deve assegurar que essa alteração esteja conforme com as condições estabelecidas no artigo 14.o, n.o 1, da diretiva autorização, a saber, ser objetivamente justificada, efetuada de modo proporcionado e ter sido previamente notificada a todos os interessados, para lhes permitir exprimir os seus pontos de vista. Compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se, à luz das circunstâncias do litígio em causa no processo principal, são respeitadas as condições previstas no artigo 14.o, n.o 1, da diretiva autorização.

61

Neste contexto, importa sublinhar que a instauração de uma taxa conforme com as condições previstas no artigo 13.o da diretiva autorização, como mencionadas nos n.os 46 e 47 do presente acórdão, deve ser considerada objetivamente justificada e efetuada de modo proporcionado.

62

Tendo em conta o que precede, importa responder à quarta questão que o artigo 14.o, n.o 1, da diretiva autorização deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que um Estado-Membro imponha a um operador de telefonia móvel uma taxa como a que está em causa no processo principal, contanto que essa alteração seja objetivamente justificada, efetuada de modo proporcionado e tenha sido previamente notificada a todos os interessados, para lhes permitir exprimir os seus pontos de vista, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar à luz das circunstâncias do litígio em causa no processo principal.

Quanto à terceira questão

63

Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 14.o, n.o 2, da diretiva autorização deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um Estado-Membro imponha a um operador de telefonia móvel uma taxa como a que está em causa no processo principal.

64

Importa observar que, por força do artigo 14.o, n.o 2, da diretiva autorização, os Estados-Membros não podem restringir nem revogar direitos de utilização de radiofrequências, salvo em casos justificados e, se aplicável, em conformidade com o anexo da diretiva autorização e com as disposições nacionais relevantes em matéria de indemnizações por perda de direitos.

65

A este respeito, há que declarar que, no artigo 14.o, n.o 2, da diretiva autorização, diferentemente do n.o 1 do mesmo artigo, os conceitos de «restrição» e de «revogação» dos direitos de utilização de radiofrequências só se reportam a situações em que o conteúdo e o alcance desses direitos podem ser alterados.

66

Mesmo admitindo que, tendo em conta o seu prazo de transposição, a diretiva autorização fosse aplicável aos factos do processo principal, em todo o caso, a imposição aos operadores de telefonia móvel de taxas como as que estão em causa no processo principal não é suscetível de influenciar o conteúdo e o alcance dos direitos de utilização de radiofrequências conferidos aos operadores em questão. Consequentemente, importa declarar que a alteração do regime de taxas não constitui uma restrição nem uma revogação dos direitos de utilização de radiofrequências na aceção do artigo 14.o, n.o 2, da diretiva autorização.

67

Em face do que precede, importa responder à terceira questão que o artigo 14.o, n.o 2, da diretiva autorização deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que um Estado-Membro imponha a um operador de telefonia móvel uma taxa como a que está em causa no processo principal.

Quanto às despesas

68

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

1)

Os artigos 12.° e 13.° da Diretiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva autorização), devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que um Estado-Membro imponha uma taxa única aos operadores de telefonia móvel titulares de direitos de utilização de radiofrequências, devida tanto por uma nova aquisição de direitos de utilização de radiofrequências como pela renovação destes últimos, em acréscimo não só de uma taxa anual de disponibilização de frequências, destinada a favorecer a utilização ótima dos recursos, mas também de uma taxa que cobre as despesas de gestão da autorização, com a ressalva de que essas taxas visem realmente assegurar uma utilização ótima do recurso que essas radiofrequências constituem, sejam objetivamente justificadas, transparentes, não discriminatórias e proporcionadas relativamente ao fim a que se destinam e tenham em conta os objetivos fixados no artigo 8.o da Diretiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva-quadro), o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

Com esta mesma ressalva, a fixação do montante de uma taxa única pelos direitos de utilização de radiofrequências por referência quer ao montante do anterior direito de concessão único calculado com base no número de frequências e de meses a que os direitos de utilização de frequências se reportam quer aos montantes resultantes de licitações pode ser um método apropriado para determinar o valor das radiofrequências.

 

2)

O artigo 14.o, n.o 1, da Diretiva 2002/20 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que um Estado-Membro imponha a um operador de telefonia móvel uma taxa como a que está em causa no processo principal, contanto que essa alteração seja objetivamente justificada, efetuada de modo proporcionado e tenha sido previamente notificada a todos os interessados, para lhes permitir exprimir os seus pontos de vista, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar à luz das circunstâncias do litígio em causa no processo principal.

 

3)

O artigo 14.o, n.o 2, da Diretiva 2002/20 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que um Estado-Membro imponha a um operador de telefonia móvel uma taxa como a que está em causa no processo principal.

 

Assinaturas


( *1 )   Língua do processo: francês.