CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

NIILO JÄÄSKINEN

apresentadas em 7 de fevereiro de 2013 ( 1 )

Processo C-536/11

Bundeswettbewerbsbehörde

contra

Donau Chemie AG

Donauchem GmbH

DC Druck-Chemie Süd GmbH & Co KG

Brenntag Austria Holding GmbH

Brenntag CEE GmbH

ASK Chemicals GmbH, anteriormente Ashland-Südchemie-Kernfest GmbH

ASK Chemicals Austria GmbH, anteriormente Ashland Südchemie Hantos Ges.m.b.H.

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Oberlandesgericht Wien (Áustria)]

«Concorrência — Ação de indemnização — Prova — Admissibilidade — Acesso de terceiros aos autos de um processo de direito público em matéria da concorrência, transitado em julgado, para efeitos de fundamentação de uma ação civil — Pedido de acesso de uma associação que representa terceiros potencialmente afetados por um cartel — Proibição legal de acesso a processos de direito público em matéria da concorrência sem consentimento de todas as partes — Falta de uma competência judicial para a ponderação de fatores relevantes, incluindo a proteção de provas recolhidas em processos de clemência, contrária ao effet utile — Princípios da equivalência e da eficácia — Artigo 19.o, n.o 1, TUE — Artigo 101.o TFUE — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 47.o»

I — Introdução

1.

O § 39, n.o 2, da Bundesgesetz gegen Kartelle und andere Wettbewerbsbeschränkungen (lei federal austríaca de 2005 sobre cartéis e outras restrições à concorrência; a seguir «KartG») opõe-se a que terceiros tenham acesso aos autos de um processo de direito público da concorrência na inexistência de consentimento das partes nesse processo. A Verband Druck & Medientechnik (a seguir «Associação») representa os interesses de empresas do setor da impressão gráfica. Pediu ao Oberlandesgericht Wien, que intervém na qualidade de tribunal em matéria de concorrência (a seguir «tribunal da concorrência») que lhe concedesse o acesso aos autos do processo de direito público em matéria da concorrência, transitado em julgado, que opôs a Bundeswettbewerbsbehörde (a seguir «autoridade federal da concorrência») à Donau Chemie AG e a outros seis operadores económicos que exercem a sua atividade no mercado da distribuição grossista de produtos químicos para impressão gráfica.

2.

No presente processo, o Tribunal de Justiça é convidado a utilizar princípios desenvolvidos no seu acórdão de 14 de junho de 2011, Pfleiderer ( 2 ), que tinha por objeto o acesso aos ficheiros de uma autoridade de concorrência nacional por parte de terceiros que pretendiam propor ações cíveis de indemnização contra empresas que tenham violado o artigo 101.o TFUE, sendo que algumas das informações contidas nos ficheiros haviam sido recolhidas ao abrigo do programa de clemência dessa autoridade.

3.

Jurisprudência assente do Tribunal de Justiça limita a autonomia processual nacional dos Estados-Membros na aplicação do direito da União Europeia, independentemente de o litígio dizer respeito ao direito da concorrência ou não. O princípio da equivalência exige que estejam disponíveis para as ações baseadas no direito da União as mesmas vias e regras processuais que são aplicáveis às ações análogas de natureza puramente nacional. O princípio da eficácia ou da proteção jurisdicional efetiva obriga os tribunais dos Estados-Membros a garantirem que as vias e regras processuais nacionais não tornem impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União.

4.

O primeiro destes princípios é relevante para a resolução do litígio porque, nos termos do direito austríaco, nem o processo civil nem o processo criminal subordinam o acesso de terceiros aos autos a uma condição absoluta de consentimento de todas as partes. Significa isto que as regras processuais austríacas relevantes impõem às ações civis de indemnização por violação do direito da concorrência da União Europeia ( 3 ) uma condição que não se aplica às ações análogas de natureza puramente nacional? ( 4 ).

5.

A restrição do acesso de terceiros aos autos do tribunal da concorrência também levanta o problema da proteção jurisdicional efetiva dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União Europeia. No presente processo, o princípio clássico da eficácia, que descrevi anteriormente, deve ser reconsiderado à luz do artigo 19.o, n.o 1, TUE, que foi introduzido pelo Tratado de Lisboa. O artigo 19.o, n.o 1, TUE, refere que «os Estados-Membros estabelecem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União». Por sua vez, isto pressupõe a apreciação do direito de acesso aos tribunais, tal como é protegido pelo artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, interpretado à luz do artigo 6.o, n.o 1, da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (a seguir «CEDH») e da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem desenvolvida com base nesta disposição ( 5 ).

6.

Por último, o artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia também é importante para a decisão da questão de saber se o consentimento para o acesso aos autos de um processo de direito público em matéria da concorrência, transitado em julgado, infringe o direito a uma audição equitativa, pelo menos quando algumas destas informações tenham sido fornecidas ao abrigo de uma garantia de direito público de clemência. Isto tem implicações no que diz respeito ao direito à não autoincriminação e à proteção dos segredos comerciais.

II — Quadro jurídico

A — Legislação da União

7.

A primeira frase do primeiro considerando do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado ( 6 ), refere que a fim de estabelecer um regime que assegure a não distorção da concorrência no mercado comum, há que proceder à aplicação eficaz e uniforme dos artigos 81.°[CE] e 82.°[CE] na Comunidade.

8.

O artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003, intitulado «Cooperação entre a Comissão e as autoridades dos Estados-Membros responsáveis em matéria de concorrência», tem a seguinte redação:

«A Comissão e as autoridades dos Estados-Membros responsáveis em matéria de concorrência aplicam as regras comunitárias de concorrência em estreita cooperação.»

9.

O artigo 35.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1/2003 dispõe:

«Os Estados-Membros devem designar a autoridade ou autoridades em matéria de concorrência responsáveis pela aplicação dos artigos 81.°[CE] e 82.°[CE] do Tratado de forma a que sejam efetivamente respeitadas as disposições do presente regulamento. As medidas necessárias a conferir às referidas autoridades competência para aplicarem estes artigos devem ser tomadas antes de 1 de maio de 2004. As autoridades designadas podem incluir os tribunais;»

B — Legislação nacional

10.

O § 39, n.o 2, da KartG enuncia:

«As pessoas que não sejam partes no processo só podem obter acesso aos autos do processo no tribunal da concorrência com o consentimento das partes.»

11.

Nos termos do § 219, n.o 2, do Zivilprozessordnung (Código de Processo Civil):

«Mediante o consentimento de ambas as partes, terceiros podem igualmente ter acesso aos autos e obter cópias e extratos (impressões) dos mesmos, desde que essa medida não seja contrária ao interesse legítimo superior de outra pessoa ou a interesses públicos superiores na aceção do § 26, n.o 2, primeira frase, da DSG 2000 (lei da proteção de dados de 2000). Na falta desse consentimento, o terceiro só poderá ter acesso e obter cópias se demonstrar a existência de um interesse em agir [ ( 7 ) ].»

12.

De acordo com o § 273 da mesma lei:

(1)   Se se constatar que uma parte tem direito a uma compensação por danos ou um interesse ou outro tipo de direito, mas a prova do montante controvertido dos danos ou do interesse ou do direito a compensar não puder ser produzida ou só puder ser produzida com dificuldades desproporcionadas, o tribunal poderá, a pedido ou oficiosamente, fixar este montante de acordo com a sua livre convicção, mesmo sem considerar provas oferecidas por uma das partes. A fixação do montante pode ser precedida da audição, sob juramento, de uma das partes acerca das circunstâncias relevantes para a fixação do montante.

(2)   Se, entre vários pedidos formulados na mesma ação judicial algum deles tiver valor insignificante em relação ao montante total, forem controversas e a clarificação total de todas as suas circunstâncias relevantes criar dificuldades desproporcionadas à importância dos pedidos em causa, o tribunal poderá decidir da mesma forma (n.o 1), segundo a sua livre convicção. O mesmo se aplica a pedidos individuais cujo montante reclamado não exceda, em cada caso, 1000 euros.»

13.

De acordo com o § 77, n.o 1, do Strafprozessordnung (Código de Processo Penal):

«Se existir um interesse jurídico fundamentado, os serviços do Ministério Público e os tribunais podem também autorizar nos casos não expressamente referidos neste código o acesso às conclusões disponíveis de um inquérito ou de um processo principal, desde que nenhum interesse público ou privado superior se oponha a isso.»

III — Litígio no processo principal e questões prejudiciais.

14.

Por despacho de 26 de março de 2010, o tribunal da concorrência aplicou coimas aos demandados no processo principal pela sua participação em acordos e práticas concertadas em violação do artigo 101.o do TFUE. Este processo (a seguir «processo de cartel») tinha sido iniciado pela autoridade federal da concorrência com base num pedido de clemência apresentado por um dos demandados. O tribunal da concorrência considerou que, neste caso, tinha ocorrido uma violação da proibição de constituição de cartéis e que existia um cartel proibido a operar no mercado da distribuição grossista gráfica de produtos químicos para impressão, na Áustria. A decisão foi confirmada pelo Oberster Gerichtshof [Supremo Tribunal] na qualidade de tribunal superior da concorrência, por despacho de 4 de outubro de 2010 transitado em julgado.

15.

A Associação pede o acesso ao dossiê («Akteneinsicht») do processo de cartel na posse do tribunal da concorrência ( 8 ). Afirma que de, acordo com os seus estatutos, tem poderes para representar os interesses dos seus membros, incluindo empresas pertencentes ao setor da impressão gráfica. De acordo com o despacho de reenvio, a pedido dos seus membros, a Associação analisa, especificamente, o montante dos prejuízos sofridos em consequência de violações do direito da concorrência com vista à preparação de ações de indemnização.

16.

A Associação afirma que precisa de ter acesso aos autos do processo no tribunal da concorrência para estabelecer a natureza e o valor do prejuízo sofrido, ou para o calcular com base nas informações deles constantes. Segundo ela, esta circunstância confere-lhe interesse legítimo em agir.

17.

Todas as partes no processo de cartel, com exceção da autoridade federal da concorrência, recusaram o seu consentimento. A autoridade federal da concorrência estava disposta a consentir que a requerente tivesse acesso ao despacho do tribunal de primeira instância, ou seja, à decisão do tribunal da concorrência, mas a nada mais. Nos termos do direito austríaco, mais especificamente por força do § 39, n.o 2, da KartG e das suas regras sobre «proteção dos segredos comerciais», isto significa que nem os autos nem o despacho do tribunal da concorrência podem ser comunicados à Associação para ajudá-la na preparação de uma ação de indemnização contra as demandadas, ou para qualquer outro fim.

18.

À luz da decisão do Tribunal de Justiça no processo Pfleiderer e das indicações dadas nesse processo, segundo as quais o direito da União Europeia exige que todos os interesses sejam ponderados, caso a caso, quando um terceiro, invocando danos resultantes da violação do artigo 101.o TFUE, pede acesso aos autos constituídos num processo de direito público que tem por objeto a mesma infração, mesmo se esses autos tiverem sido constituídos num contexto de clemência, o tribunal da concorrência pretende saber se o direito austríaco é compatível com o princípio do efeito útil e com a obrigação que incumbe aos Estados-Membros de permitirem aos particulares propor ações de indemnização por violação do direito da concorrência ( 9 ). O tribunal da concorrência também tem dúvidas quanto à compatibilidade do § 39, n.o 2, da KartG com o princípio da não discriminação, uma vez que, nos termos do direito austríaco, nos processos civis ordinários, como as ações de responsabilidade civil, ou nos processos penais não é exigido o consentimento de todas as partes relativamente aos dossiês na posse dos tribunais.

19.

Atendendo às considerações anteriores, o tribunal da concorrência submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões para decisão a título prejudicial, nos termos do artigo 267.oTFUE:

«1.

O direito da União [opõe-se], atendendo especialmente ao acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de junho de 2011, Pfleiderer (C-360/09) […] a uma disposição nacional em matéria de cartéis, que [subordina], sem exceções, [inclusive nos processos em que foram aplicados o artigo 101.o ou o artigo 102.oTFUE, conjugado com o Regulamento (CE) n.o 1/2003,] o acesso aos [documentos dos processos no tribunal da concorrência] a terceiros que não são partes [nesses] processos, com a finalidade de preparar[em] ações de indemnização contra [os participantes num] cartel, [ao consentimento] de todas as partes [nesses processos], e que não permite [que] o órgão jurisdicional [pondere casuisticamente os] interesses protegidos pelo direito da União para determinar as condições em que o acesso […] deve ser concedido ou recusado?

No caso de resposta negativa à primeira questão:

2.

O direito [da União] opõe-se a uma disposição nacional dessa natureza, que [também é] aplicável a um processo em matéria de cartéis […] de âmbito [exclusivamente] nacional e […] não [prevê] nenhum regime específico para documentos [apresentados na sequência de pedidos] de clemência, quando […] disposições nacionais equivalentes aplicáveis] noutros tipos de processos, em especial [em] processos[, contenciosos e não contenciosos, de natureza civil e] penal, permitem o acesso a [documentos judiciais] sem [o consentimento] das partes, desde que o terceiro […] demonstre um interesse jurídico [nesse acesso e não existam,] no caso concreto, interesses [superiores de outra pessoa] ou interesses públicos superiores que se oponham ao [referido] acesso […]?»

20.

Foram apresentadas observações escritas pela Associação, pela autoridade federal da concorrência, pela Donau Chemie AG e pela Donauchem GmbH, pela Brenntag CEE GmbH, pela Ask Chemicals GmbH e pela ASK Chemicals Áustria GmbH ( 10 ), pela DC Druck Chemie Süd GmbH & Co KG, pelos Governos da Áustria, Bélgica, Alemanha, Espanha, Itália, pela Comissão e pelo Órgão de Fiscalização da EFTA. Todos os acima mencionados, com exceção do Governo italiano, compareceram na audiência que se realizou em 4 de outubro de 2012, juntamente com a República Francesa.

IV — Apreciação jurídica

A — Admissibilidade do despacho de reenvio

21.

Nas suas observações escritas, a Comissão contesta a admissibilidade do despacho de reenvio. Observa que esse despacho não fornece qualquer indicação sobre se o órgão jurisdicional de reenvio considera que foram satisfeitas as condições previstas no § 219, n.o 2, do Código de Processo Civil. Esta disposição constitui, segundo parece, a norma nacional que regularia o acesso aos autos se o § 39, n.o 2, da KartG fosse declarado incompatível com direito da União. O § 219, n.o 2, do Código de Processo Civil exige a demonstração de um interesse jurídico nesse acesso. A Comissão observa, portanto, que as respostas às questões submetidas poderão ser meramente hipotéticas se a Associação não conseguir demonstrar um interesse jurídico suficiente.

22.

Também gostaria de referir que embora muitas das observações escritas da Comissão se destinem a responder à primeira questão também são relevantes para a questão da admissibilidade. É esse o caso quando a Comissão pergunta, por exemplo, se no direito austríaco não haverá vias processuais alternativas para a recolha dos elementos de prova necessários. A Comissão observa que é importante saber em que medida o tribunal chamado a pronunciar-se sobre um pedido de indemnização toma em consideração a prova escrita ou dá prioridade ao testemunho oral. Neste último caso, os documentos contidos nos autos serão de menor importância. Outra questão importante é saber a medida em que a prova indireta, por oposição à prova direta, está autorizada no direito nacional e é suficiente para fundamentar um pedido de indemnização.

23.

De igual modo, a autoridade federal da concorrência argumenta que a matriz do direito austríaco apresenta vias processuais suficientes para a obtenção da prova e para a concretização eficaz dos pedidos de indemnização fundados no direito da concorrência. Por exemplo, a autoridade federal da concorrência questiona, inter alia, as dificuldades com que os membros da Associação se podem deparar no que diz respeito à quantificação dos danos. A Associação salientou que, nos termos do § 273 do Código de Processo Civil, se o montante do dano sofrido não puder ser determinado, ou só puder ser determinado com grandes dificuldades, o tribunal poderá fazer uma apreciação livre.

24.

De acordo com jurisprudência constante, não incumbe ao Tribunal de Justiça, no âmbito de um reenvio prejudicial, pronunciar-se sobre a interpretação de disposições nacionais nem julgar se a interpretação dada pelo órgão jurisdicional de reenvio das disposições de direito nacional é correta ( 11 ). Também compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar a exatidão das indicações relativas à referida prática administrativa ( 12 ).

25.

A este respeito é importante fazer uma distinção conceptual entre: i) os documentos de uma autoridade responsável competente em matéria da concorrência relativos a uma investigação antitrust; ii) os documentos relativos a um processo num órgão jurisdicional competente para decidir a questão, que podem incluir, designadamente (alguns ou o conjunto) dos documentos da investigação antitrust; e iii) provas documentais apresentadas perante um tribunal competente relativamente a um eventual pedido cível fundado numa restrição da concorrência ( 13 ).

26.

Neste contexto, qualquer que seja a distribuição das competências decisórias entre os diferentes órgãos ( 14 ), deparamo-nos com três questões diferentes: i) o acesso aos documentos obtidos no quadro de uma investigação antitrust e na posse de uma autoridade responsável em matéria de concorrência, ou seja, o acesso a documentos administrativos; ii) o acesso a documentos do órgão jurisdicional do Estado-Membro competente para apreciar processos em matéria de concorrência, ou seja, o acesso a documentos judiciais; e iii) a disponibilidade desses documentos administrativos ou judiciais para efeitos de propositura de uma ação civil. Isto pode implicar «pre-trial discovery» (medidas previstas pela «common law» — sobretudo o direito americano — para produção, antes da audiência, de informações na posse da parte contrária) ou obrigações de divulgação de documentos no contexto de uma ação civil.

27.

De acordo com a redação inequívoca das questões prejudiciais, o presente processo pertence à segunda categoria, isto é, o acesso a documentos na posse de um tribunal competente para decidir processos de direito público em matéria de cartéis. Mesmo que, tecnicamente, pareça ter sido registado pelo tribunal da concorrência como uma continuação do processo de concorrência, o pedido destes documentos, é independente da infração substantiva do direito da União Europeia e/ou do direito nacional da concorrência e de qualquer ação cível de indemnização proposta nos competentes tribunais civis ( 15 ).

28.

Portanto, o presente litígio pendente no tribunal da concorrência não é de forma alguma hipotético, e o direito da União Europeia pode claramente afetar o seu resultado, nomeadamente quanto à questão de saber se o acesso aos documentos solicitados deve ser concedido ou recusado. Além disso, as questões relativas à legitimidade ou ao interesse em agir da Associação ou dos seus membros num processo cível que possa eventualmente ser instaurado, ou as normas em matéria de prova aplicáveis nesse processo, são irrelevantes para a admissibilidade do presente pedido de decisão prejudicial, embora possam afetar claramente a aplicação do princípio da eficácia, sendo a apreciação deste princípio da competência do órgão jurisdicional nacional.

29.

Tendo em conta o direito aplicável e os factos em apreço, considero que o Tribunal de Justiça tem na sua posse todas as informações necessárias para responder às questões prejudiciais. Por estes motivos, considero o despacho de reenvio admissível.

B — Resposta à segunda questão

30.

Decidi responder às questões prejudiciais na ordem inversa porque, neste caso, considero mais lógico analisar em primeiro lugar o princípio da equivalência, que consta da segunda questão prejudicial. Isto é assim porque, na minha opinião, do ponto de vista dos limites da autonomia processual nacional, a questão da equivalência precede logicamente a da eficácia. Não obstante o que foi referido pelo órgão jurisdicional nacional no início da segunda questão, na perspetiva do direito da União, é necessário examinar as duas questões para poder fornecer uma resposta útil.

31.

A resposta à segunda questão prejudicial pode ser muito simples. Subscrevo a posição defendida por todas as partes, com exceção da Associação, de que o § 39, n.o 2, da KartG não é uma disposição análoga, na aceção da jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o princípio da equivalência, ao § 219, n.o 2, do Código de Processo Civil ou ao § 77, n.o 1, do Código de Processo Penal, no contexto da aplicação do direito da concorrência. Importa acrescentar que esta conclusão não se baseia no princípio geral da não discriminação, mas no princípio da equivalência que, de acordo com jurisprudência assente, limita a autonomia processual nacional. O princípio mencionado em primeiro lugar prevê que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente. Isto não parece aplicar-se aos presentes factos, dado que o princípio da equivalência serve o mesmo objetivo.

32.

O respeito do princípio da equivalência pressupõe que a regra nacional em causa seja aplicável indiferentemente às ações fundadas na violação do direito da União e às fundadas na violação do direito interno «que tenham um objeto e uma causa semelhantes» ( 16 ). Todavia, o princípio da equivalência não pode ser interpretado no sentido de obrigar um Estado-Membro a alargar o seu regime interno mais favorável a todas as ações intentadas num determinado domínio do direito ( 17 ).

33.

Normalmente, a tarefa de comparar os diferentes processos nacionais, em termos de equivalência, é deixada ao órgão jurisdicional de reenvio, que deve verificar a semelhança das ações em causa, na perspetiva do seu objeto, da sua razão de ser e dos seus elementos essenciais ( 18 ). Para determinar se uma disposição processual nacional é menos favorável, há que tomar em consideração o lugar que ocupa no processo, visto como um todo, bem como a sua tramitação e as suas especificidades ( 19 ).

34.

Contudo, o Tribunal de Justiça tem ocasionalmente tomado posição sobre a questão de saber se a disposição nacional em causa é compatível com o princípio da equivalência. Em alguns casos, o Tribunal de Justiça deu uma indicação sobre o seu entendimento, mas deixou a decisão sobre essa questão ao órgão jurisdicional nacional ( 20 ) enquanto noutros casos tomou uma decisão definitiva sobre a compatibilidade ou não da regra nacional relevante com os requisitos da equivalência ( 21 ). Entendo que, no caso em apreço, deve ser adotada esta última abordagem.

35.

Neste caso, a proibição de que terceiros tenham acesso aos documentos do tribunal da concorrência aplica-se tanto nos processos baseados no direito da concorrência da União Europeia como nos baseados no direito da concorrência austríaco. Por outras palavras, não existe uma diferença de tratamento de uma situação com origem no exercício de um direito decorrente do direito da União Europeia e de uma situação puramente interna ( 22 ).

36.

Na minha opinião, é indiscutível que estes processos são comparáveis com os processos ordinários civis e os processos penais, dado que nenhum deles tem por objeto a proteção dos programas de clemência ou outros aspetos específicos dos processos de direito público no contexto da aplicação das políticas em matéria de concorrência.

37.

Proponho, assim, que a segunda questão seja respondida no sentido de que o princípio da equivalência ao abrigo do direito da União Europeia não se opõe a uma disposição nacional como o § 39, n.o 2, da KartG.

C — Resposta à primeira questão

1. Observações preliminares

38.

Com a primeira questão prejudicial, o tribunal da concorrência pretende ser esclarecido sobre a compatibilidade com o direito da União Europeia de uma lei de um Estado-Membro que impõe a proibição do acesso de terceiros a documentos na posse do tribunal da concorrência, na falta do consentimento das partes no processo de direito público em matéria da concorrência. As preocupações do órgão jurisdicional nacional referem-se, mais especificamente, à questão da compatibilidade dessa proibição com o direito a pedir a reparação do dano causado por um acordo ou prática proibida numa ação cível proposta contra as partes nesse acordo, conforme estabelecido pelo Tribunal de Justiça no acórdão Courage e Crehan ( 23 ) e confirmado no acórdão Manfredi e o. ( 24 ).

39.

Esta questão torna-se mais complexa devido ao facto de alguma das informações solicitadas pela Associação terem sido fornecidas, no contexto de um programa de clemência, por uma das empresas contra quem a Associação tenciona propor uma ação.

40.

No seu acórdão Pfleiderer, o Tribunal de Justiça adotou uma abordagem que, na minha opinião, é igualmente válida para o presente litígio. Declarou que nem as disposições do Tratado CE em matéria de concorrência nem o Regulamento n.o 1/2003 preveem regras comuns de clemência ou regras comuns sobre o direito de acesso a documentos relativos a um procedimento de clemência voluntariamente comunicados a uma autoridade nacional da concorrência em aplicação de um programa nacional de clemência ( 25 ). O Tribunal de Justiça considerou, seguidamente, que, na falta de uma regulamentação vinculativa do direito da União nesta matéria, incumbe aos Estados-Membros estabelecer e aplicar as regras nacionais sobre direito de acesso das pessoas lesadas por um cartel aos documentos relativos aos procedimentos de clemência ( 26 ), sob condição de não tornarem impossível ou excessivamente difícil a aplicação do direito da União e, especificamente no domínio do direito da concorrência, de zelarem por que as regras que estabelecem ou aplicam não prejudiquem a aplicação efetiva dos artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE ( 27 ).

41.

Isto levou o Tribunal de Justiça, no acórdão Pfleiderer, a uma conclusão que é igualmente pertinente para o caso em apreço, apesar do contexto institucional ser diferente naquele processo, que tinha por objeto o acesso a documentos administrativos e não judiciais. O Tribunal de Justiça declarou, nomeadamente, que, ao examinar um pedido de acesso a documentos no contexto de um programa nacional de clemência, há que ponderar a proteção das informações voluntariamente fornecidas pelo requerente de clemência (cuja eficácia e, por conseguinte, a aplicação efetiva dos artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE poderiam ser afetadas pela comunicação dos documentos a pessoas que pretendem propor uma ação de indemnização) ( 28 ) e a necessidade de zelar por que as regras nacionais aplicáveis não sejam menos favoráveis do que as regras que regulam os pedidos análogos de natureza interna e não sejam aplicadas de modo a tornar impossível na prática ou excessivamente difícil a obtenção dessa reparação ( 29 ). Esta ponderação só podia ser realizada pelos órgãos jurisdicionais nacionais numa base casuística ( 30 ). Voltaremos a seguir ao significado destas conclusões.

42.

Além disso, como declarou o Tribunal de Justiça no acórdão van Schijndel, cada caso em que se coloque a questão de saber se uma disposição processual nacional torna impossível ou excessivamente difícil a aplicação do direito comunitário deve ser analisado tendo em conta a posição que essa disposição ocupa no processo, a sua tramitação e as suas especificidades nas diversas instâncias nacionais. Nesta perspetiva, há que tomar em consideração, se for caso disso, os princípios que estão na base do sistema jurídico nacional, como a proteção dos direitos de defesa, o princípio da segurança jurídica e o bom andamento do processo ( 31 ). Portanto, este princípio também deve ser tido devidamente em conta.

43.

Porém, embora as conclusões do acórdão Pfleiderer sejam relevantes para o presente litígio, é igualmente importante ter em mente as diferenças. Nesse processo, o órgão jurisdicional de reenvio procurava obter esclarecimentos sobre o impacto que o acesso de um terceiro lesado à informação comunicada por um requerente de clemência a uma autoridade de um Estado-Membro responsável em matéria de concorrência pode ter no sistema de cooperação e de intercâmbio de informações estabelecido nos artigos 11.° e 12.° do Regulamento n.o 1/2003 no contexto de um processo de clemência ( 32 ).

44.

Mas a primeira questão em apreço tem por objeto uma proibição imposta pela legislação nacional relativamente a todos os documentos dos processos do tribunal da concorrência na falta do consentimento das partes, independentemente de pertencerem ou não a procedimentos de clemência, e por força da qual o órgão jurisdicional nacional está impedido de levar a cabo a ponderação prescrita pelo Tribunal de Justiça no acórdão Pfleiderer.

45.

Por outras palavras, em alguns aspetos, o presente litígio está mais próximo do problema apreciado pelo Tribunal de Justiça no acórdão Courage e Crehan, já referido, que tratava a proibição pelo direito inglês das ações de indemnização propostas pelas partes de contratos ilegais, incluindo os acordos em violação do artigo 101.o TFUE. Na minha opinião, a ideia central constava do n.o 26 desse acórdão:.

«A plena eficácia do artigo 85.o do Tratado e, em particular, o efeito útil da proibição enunciada no seu n.o 1 seriam postos em causa se não fosse possível a qualquer pessoa reclamar reparação do prejuízo que lhe houvesse sido causado por um contrato ou um comportamento suscetível de restringir ou falsear o jogo da concorrência [ ( 33 ) ].»

46.

Portanto, a questão crucial é a seguinte: a restrição austríaca, conforme descrita pelo tribunal da concorrência, significa que não é possível à Associação ou às empresas seus membros pedido a reparação do prejuízo que lhes foi causado por um cartel ilegal, no sentido de que a proibição austríaca torna impossível na prática ou excessivamente difícil a aplicação do direito da União ( 34 )? Segundo as declarações do Tribunal de Justiça no acórdão DEB, é necessário perguntar se a Associação dispõe de uma via processual que lhe assegure uma proteção jurisdicional efetiva dos direitos que para ela resultam da ordem jurídica da UE ( 35 ); poderá a mesma invocar perante um órgão jurisdicional austríaco os direitos que lhe são conferidos pelo ordenamento da União ( 36 )?

47.

Por último, deve ter-se em conta o artigo 19.o, n.o 1, TUE, e a medida em que este assegura uma garantia suplementar ao princípio de eficácia. Nos termos do artigo 19.o, n.o 1, os Estados-Membros devem estabelecer as vias de recurso «necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União». Por outras palavras, à luz dessa disposição do Tratado, o nível da proteção jurisdicional efetiva dos direitos baseados na União parece ser mais exigente do que a fórmula clássica que se refere à impossibilidade prática ou à dificuldade excessiva. Na minha opinião, isto significa que as vias processuais nacionais devem ser acessíveis, imediatas, e razoavelmente pouco onerosas para os benefícios que proporcionam ( 37 ).

48.

Do ponto de vista da política da concorrência, o presente processo está relacionado com o debate sobre a denominada aplicação privada das regras da concorrência. Ao contrário da situação nos Estados Unidos, é possível que o conceito não seja o mais adequado neste caso, tendo em conta o facto de que no âmbito do direito da União Europeia em matéria da concorrência não existem mecanismos como a «pre-trial discovery», as ações coletivas («class actions») e a indemnização «punitiva» («punitive damages»). A meu ver, talvez ao contrário das suas contrapartes nos Estados Unidos, as vítimas das restrições à concorrência na União Europeia pretendem apenas a proteção jurídica de um direito de ação privado, mais do que a aplicação de uma política pública.

2. Jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre as regras nacionais em matéria de prova e princípios gerais relativos ao effet utile

49.

Resulta claramente da jurisprudência que os Estados-Membros devem assegurar que as modalidades de prova e, em especial, as regras sobre a atribuição do ónus da prova aplicáveis às ações relativas a violações do direito da União Europeia não tornam impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício pelos particulares dos direitos que lhe são conferidos pela ordem jurídica da União Europeia ( 38 ).

50.

Por exemplo, o Tribunal de Justiça já declarou que compete ao órgão jurisdicional nacional verificar se um particular que pretenda propor uma ação de indemnização ao abrigo do direito da União Europeia em matéria de responsabilidade do Estado pode beneficiar de um processo especial que prevê a audição de testemunhas, ou, subsidiariamente, produzir outro tipo de prova, nomeadamente documental, dos prejuízos sofridos ( 39 ). Caso contrário, as modalidades de prova tornariam impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício pelo particular dos direitos que lhe são conferidos pela ordem jurídica da União Europeia ( 40 ). Por outras palavras, as restrições de provas«[cruciais] para o pedido do demandante» ( 41 ) são incompatíveis com o effet utile. Entre as outras regras em matéria de prova que o Tribunal de Justiça considerou estarem sujeitas ao escrutínio dos órgãos jurisdicionais nacionais por violação do princípio do effet utile figuram as que põem em perigo o princípio da igualdade de armas ( 42 ).

51.

Na minha opinião, a subordinação do acesso a documentos judiciais dos processos de direito público em matéria da concorrência ao consentimento do infrator das regras da concorrência é claramente dissuasivo do exercício do direito de propor uma ação cível de indemnização por violação do direito da concorrência da União Europeia ( 43 ). O Tribunal de Justiça já declarou que se um particular for dissuadido pelo infrator de apresentar atempadamente uma ação judicial, este último não poderá vir invocar as normas processuais nacionais relativas aos prazos de proposição de uma ação ( 44 ). Não vejo motivos para limitar a aplicação deste princípio aos prazos, e sou favorável ao seu alargamento às regras em matéria de prova que impõem encargos, as quais têm um efeito dissuasivo análogo ( 45 ). Examinarei mais à frente a conformidade das vias processuais que dissuadem da aplicação dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União Europeia com o artigo 19.o, n.o 1, TUE.

3. Artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais

52.

Como observou recentemente o Tribunal de Justiça, o princípio da proteção jurisdicional efetiva que figura no artigo 47.o é constituído por diversos elementos, que incluem, nomeadamente, os direitos de defesa, o princípio da igualdade de armas, o direito de acesso aos tribunais assim como o direito de aconselhamento, defesa e representação ( 46 ). Além disso, o direito de acesso aos tribunais também inclui, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a competência dos órgãos jurisdicionais nacionais para examinar todas as questões de facto e de direito pertinentes para os litígios que são chamados a decidir ( 47 ). Na minha opinião, um tribunal nacional que decide sobre as consequências de direito civil de uma restrição ilegal da concorrência não pode ter uma «competência» dessa natureza se, na prática, for impedido de apreciar material probatório essencial, como os documentos reunidos em processos de direito público em matéria da concorrência no âmbito dos quais já tenha sido dada como provada a existência de uma restrição ilegal da concorrência, como um cartel.

53.

Por conseguinte, a limitação da disponibilidade de material probatório essencial prejudica o direito dos litigantes de obterem uma resolução judicial do respetivo litígio ( 48 ). Também afeta os seus direitos de defenderem utilmente a sua causa no tribunal ( 49 ).

54.

Porém, o direito de acesso aos tribunais não é um direito absoluto ( 50 ). Pode estar sujeito a limitações, desde que estas não prejudiquem a própria essência do direito, prossigam um fim legítimo e a relação existente entre os meios utilizados e o objetivo pretendido for proporcionada ( 51 ).

55.

O artigo 47.o também é relevante para o caso em apreço porque garante audiências equitativas, o que protege os interesses das empresas que participaram no cartel. Na minha opinião, em regra, não deve ser concedido acesso às declarações autoincriminatórias prestadas por um requerente de clemência ( 52 ). O direito à não autoincriminação está consagrado desde longa data no direito da União Europeia ( 53 ), e é diretamente oponível às autoridades nacionais responsáveis em matéria de concorrência que aplicam as regras da União Europeia ( 54 ).

56.

É certo que os programas de clemência não garantem proteção contra os pedidos de indemnizações por perdas e danos ( 55 ) e que o direito à não autoincriminação não se aplica em contextos de direito privado. Não obstante, razões de ordem pública e de lealdade para com a parte que prestou declarações autoincriminatórias no contexto de um programa de clemência são argumentos de peso contra a concessão de acesso aos processos de direito público em matéria da concorrência quando a parte que beneficia deles interveio como testemunha da autoridade competente para o exercício da ação judicial.

4. Aplicação ao presente processo

57.

O Tribunal de Justiça já declarou que o direito da União Europeia obriga os Estados-Membros a assegurarem que a legislação nacional não afete o direito a uma proteção jurisdicional efetiva ( 56 ); os interessados não podem ser impedidos de invocar os seus direitos perante os órgãos jurisdicionais nacionais. A proibição austríaca de acesso aos processos do tribunal da concorrência na falta do consentimento de todas as partes produz esse efeito?

58.

O Tribunal de Justiça já declarou que a divulgação a terceiros de documentos trocados entre a Comissão e as empresas durante um processo de controlo de operações de concentração de empresas causava prejuízo não só à proteção dos objetivos da atividade de investigação como à proteção dos interesses comerciais das empresas envolvidas nesse processo ( 57 ). Porém, os princípios deste tipo ( 58 ) concorrem ao nível da União Europeia com as regras em matéria de acesso a documentos e a obrigação de transparência, previstas tanto na legislação da União como no direito primário da União Europeia ( 59 ).

59.

Consequentemente, o Tribunal de Justiça desenvolveu jurisprudência constante que abrange casos relativos ao acesso a documentos na posse da Comissão no âmbito de investigações da concorrência ( 60 ) e que, essencialmente, impõe a ponderação de imperativos deste tipo entre si, por referência à avaliação de cada documento individual solicitado. Isto significa que, ao nível da União Europeia, uma proibição absoluta de acesso a documentos da Comissão obtidos no contexto de uma investigação em matéria de cartéis é inconcebível.

60.

Estes princípios, que foram desenvolvidos no contexto do acesso aos documentos detidos pela Comissão Europeia, não são diretamente transponíveis a nível nacional. Contudo, fornecem o contexto, o cenário e a perspetiva para a avaliação da compatibilidade da proibição absoluta do direito austríaco com o princípio do effet utile.

61.

De igual modo, como resulta do acórdão do Tribunal de Justiça no acórdão Pfleiderer, já referido, também se deve ter em conta o imperativo da proteção dos programas de clemência. De acordo com o n.o 26 da Comunicação da Comissão sobre a cooperação entre a Comissão e os tribunais dos Estados-Membros da UE na aplicação dos artigos 81.° e 82.° do Tratado CE ( 61 ), «[…]a Comissão não transmitirá aos tribunais nacionais informações apresentadas voluntariamente por um requerente de imunidade em matéria de coimas ou de redução do seu montante sem a anuência do mesmo», embora, como já referi, a aplicação de medidas de clemência pela Comissão não oferece qualquer garantia no contexto dos processos cíveis de indemnização ( 62 ).

62.

Este tipo de considerações é igualmente pertinente na avaliação da compatibilidade do § 39, n.o 2, KartG, em especial quando os processos cíveis de indemnização desempenham um papel complementar na União Europeia ( 63 ), na aplicação do direito da concorrência. Assim sendo, em meu entender, o direito dos particulares de exigirem uma indemnização aos operadores económicos que violaram o direito da concorrência da União Europeia, consagrado no acórdão Courage e Crehan e no acórdão Manfredi e o., não deve ser desenvolvido a ponto de colocar em perigo a eficácia dos mecanismos europeus ou nacionais de aplicação de direito público.

63.

A disposição austríaca foi defendida com o argumento de que o legislador austríaco realizou a necessária ponderação entre os interesses públicos e privados concorrentes, e concluiu que era adequado dar precedência absoluta ao interesse público na aplicação eficaz das regras em matéria da concorrência. Porém, em minha opinião, à exceção de algumas situações não abrangidas pelo âmbito de aplicação do direito da concorrência, uma ponderação que não deixe espaço a um dos interesses concorrentes não é compatível com o princípio da proporcionalidade.

64.

Assim, do ponto de vista da proporcionalidade, entendo que seria mais adequada uma regra legislativa que previsse a proteção absoluta dos participantes num programa de clemência, mas exigisse que os interesses dos outros participantes numa prática restritiva fossem ponderados com os interesses das alegadas vítimas. Recordo que, na Áustria, o âmbito da proteção da confidencialidade dos documentos do tribunal da concorrência não está limitado aos segredos comerciais das empresas participantes. Além disso, na minha opinião, e exceto no caso das empresas que beneficiam de clemência, a participação numa restrição ilegal da concorrência não constitui um segredo comercial que mereça a proteção do direito da União Europeia ( 64 ).

65.

Por conseguinte, na minha opinião, uma proibição absoluta do acesso aos documentos do tribunal da concorrência na falta do consentimento das partes é um obstáculo desproporcionado ao direito de acesso aos tribunais garantido pelo artigo 47.o, sobretudo quando, conforme resulta dos autos do presente processo, os acórdãos do tribunal da concorrência não são tornados públicos.

66.

Na minha opinião, o que é necessário por força do imperativo do effet utile é que o juiz nacional que decide do acesso de um terceiro aos documentos do tribunal disponha de um mecanismo que lhe permite levar a cabo uma ponderação do tipo enunciado no acórdão Pfleiderer. Tal ponderação permitiria ao juiz nacional confrontar entre si todos os fatores concorrentes, como a proteção de segredos comerciais legítimos das empresas que participaram na restrição e o dever que incumbe aos Estados-Membros por força do artigo 19.o, n.o 1, TUE, de estabelecer as vias de recurso «necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União». O legislador nacional pode regular os fatores a ter em conta nessa ponderação, mas não pode impedir a sua realização, exceto talvez no que diz respeito à informação prestada pelas empresas que beneficiam de clemência.

67.

Dito isto, é jurisprudência assente do Tribunal de Justiça que, «embora o Tratado CE tenha previsto um determinado número de ações diretas que podem ser intentadas, se for o caso, por particulares perante o juiz comunitário, não pretendeu criar perante os órgãos jurisdicionais nacionais, para proteger o direito comunitário, vias de recurso diferentes das estabelecidas pelo direito nacional. Só assim não seria se resultasse da economia da ordem jurídica nacional em causa que não existe nenhuma outra via de recurso que permita, ainda que a título incidental, assegurar o respeito dos direitos conferidos aos litigantes pelo direito comunitário» ( 65 ).

68.

Por conseguinte, ao levar a cabo a sua apreciação, o tribunal da concorrência está obrigado a ter em devida consideração os meios alternativos de recolha de provas disponíveis nos termos do direito austríaco. Tal inclui, por exemplo, as regras processuais sobre a divulgação de documentos no contexto de uma ação civil ou as regras que regulam o acesso a documentos administrativos da autoridade federal da concorrência, assim como os §§ 219, n.o 2, e 273 do Código de Processo Civil, antes de decidir, sendo caso disso, que partes dos seus ficheiros podem ser divulgados a terceiros a fim de respeitar a proteção jurisdicional efetiva no contexto das ações de indemnização, na aceção do acórdão Courage e Crehan e do acórdão Manfredi e o., contra os operadores económicos que relativamente foi demonstrado que violaram o artigo 101.o TFUE. O mesmo exercício deve ser levado a cabo no que diz respeito à quantificação dos danos ( 66 ).

69.

Em conclusão, dentro de parâmetros que podem ser definidos pelo legislador nacional, e desde que se respeitem os princípios do direito da União Europeia acima desenvolvidos, deve existir um espaço para ponderar o interesse público relativo à aplicação efetiva das regras em matéria da concorrência com os interesses privados das vítimas de violações das mesmas regras.

70.

Proponho, portanto que o Tribunal de Justiça responda à primeira questão no sentido de que o princípio da proteção jurisdicional efetiva, aplicado à luz do artigo 19.o, n.o 1, TUE, se opõe a uma disposição nacional em matéria de concorrência como o § 39, n.o 2, da KartG, que proíbe o acesso, na falta do consentimento das partes, aos documentos do tribunal da concorrência a terceiros que pretendem propor ações cíveis de indemnização contra os participantes num cartel.

V — Conclusão

71.

Por conseguinte, proponho as seguintes respostas às questões submetidas pelo tribunal da concorrência.

«1.

O princípio da proteção jurisdicional efetiva previsto pelo direito da União Europeia, aplicado à luz do artigo 19.o, n.o 1, TUE, opõe-se a uma disposição nacional em matéria de concorrência que subordina ao consentimento de todas as partes processuais a concessão do acesso aos documentos na posse de um órgão jurisdicional nacional e reunidos no âmbito de um processo em matéria de concorrência que envolve a aplicação do direito da concorrência da União Europeia a terceiros que não são partes nesse processo mas pretendem preparar ações de indemnização contra os participantes do acordo objeto do processo em matéria de concorrência. A resposta só será diferente se o direito nacional oferecer, para efeitos de obtenção da prova de violação do direito da concorrência da União Europeia e de determinação dos danos, vias alternativas que garantam uma tutela jurisdicional efetiva do direito de propor uma ação cível de indemnização por violação dessas disposições e que respeitem o artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

2.

O princípio da equivalência previsto no direito da União Europeia não se opõe a uma disposição nacional da concorrência que subordina, sem exceções, ao consentimento de todas as partes processuais a concessão do acesso aos documentos na posse de um órgão jurisdicional nacional e reunidos no âmbito de um processo em matéria de concorrência que envolve a aplicação do direito da concorrência da União Europeia a terceiros que não são partes nesse processo, quando a regra se aplicar indistintamente aos processos em matéria de direito da concorrência puramente nacionais mas diferir das disposições nacionais aplicáveis ao acesso de terceiros a documentos judiciais no contexto de outros tipos de processo, em especial nos processos civis, contenciosos e não contenciosos, e nos processos penais.»


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) Acórdão Pfleiderer (C-360/09, Colet., p. I-5161).

( 3 ) V. acórdãos de 13 de julho de 2006, Manfredi e o. (C-295/04 a C-298/04, Colet., p. I-6619), e de 20 de setembro de 2001, Courage e Crehan (C-453/99, Colet., p. I-6297).

( 4 ) V., por exemplo, acórdão de 1 de dezembro de 1998, Levez (C-326/96, Colet., p. I-7835).

( 5 ) V., de igual modo, conclusões do advogado-geral J. Mazák no processo Pfleiderer, já referido (n.o 3).

( 6 ) JO 2003, L 1, p. 1.

( 7 ) O § 219, n.o 2, do Código de Processo Civil não se aplica aos processos de direito público em matéria de concorrência.

( 8 ) No pedido de acesso a documentos, a Associação referiu a [Kartellakt], 29 Kt 5/09.

( 9 ) Acórdãos Courage e Crehan e Manfredi e o., já referidos na nota 3.

( 10 ) Conforme indicado na página de rosto das presentes conclusões, a ASK Chemicals GmbH era anteriormente chamada Ashland-Südchemie-Kernfest GmbH, e a ASK Chemicals Austria GmbH era anteriormente Ashland Südchemie Hantos Ges.m.b.H.

( 11 ) Acórdão de 29 de abril de 2004, Orfanopoulos (C-482/01 e C-493/01, Colet., p. I-5257, n.o 42 e jurisprudência referida).

( 12 ) Ibidem (n.o 45).

( 13 ) Ao nível da União Europeia, refira-se: i) os documentos da Comissão; ii) os documentos do Tribunal Geral; e iii) as provas apresentadas no órgão jurisdicional nacional que decide sobre as consequências cíveis de uma restrição ilegal da concorrência. V., também, acórdão de 21 de setembro de 2010, Suécia/API e Comissão (C-514/07 P, C-528/07 P e C-532/07 P, Colet., p. I-8533). Nos n.os 79 a 82 desse acórdão, o Tribunal de Justiça salienta que a atividade judicial está excluída do direito de acesso aos documentos garantido pelo Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), e das obrigações de transparência do artigo 255.o CE (atual artigo 15.o, n.o 3, TFUE). As conclusões do advogado-geral M. Poiares Maduro, apresentadas em 1 de outubro de 2009 nesse processo, analisam, nos n.os 21 a 39, as diferentes abordagens nacionais e internacionais do acesso aos documentos judiciais.

( 14 ) V., por exemplo, ECN Working Group, Co-operation Issues and Due Process, «Decision Making Powers», relatório de 31 de outubro de 2012. Nas pp. 5 e 6 do relatório é salientado que existem três modelos institucionais básicos de aplicação das regras da concorrência na União; i) o modelo administrativo monista em que uma única autoridade administrativa investiga os casos e adota decisões de aplicação. Em algumas jurisdições, a autoridade pode não ser competente para impor sanções; ii) o modelo administrativo dualista, em que a investigação e a tomada de decisões estão divididas por dois organismos. Um dos organismos é responsável pela investigação dos processos, que são mais tarde remetidos para o outro organismo responsável pela decisão do processo; iii) o modelo jurisdicional, em que um tribunal decide sobre o mérito e sobre as sanções, ou apenas esta última parte, sendo a primeira parte deixada à autoridade competente em matéria de concorrência. Na p. 9 do relatório, explica-se que a Áustria se enquadra no primeiro dos dois modelos jurisdicionais, isto é, o modelo jurisdicional puro.

( 15 ) O tribunal da concorrência utiliza o número de registo do processo reproduzido na nota 8. A Associação está registada como interveniente no presente processo.

( 16 ) Acórdão de 19 de julho de 2012, Littlewoods Retail (C-591/10, n.o 31).

( 17 ) Ibidem (n.o 31).

( 18 ) Acórdão Littlewoods Retail, já referido na nota 16 (n.o 31), citando acórdão de 29 de outubro de 2009, Pontin (C-63/08, Colet., p. I-10467).

( 19 ) Acórdão de 8 de setembro de 2011, Rosado Santana (C-177/10, Colet., p. I-7907, n.o 90 e jurisprudência referida).

( 20 ) Por exemplo, acórdãos Rosado Santana, já referido na nota 19 (n.o 91), e de 19 de junho de 2003, Sante Pasquini (C-34/02, Colet., p. I-6515, n.os 64 a 73).

( 21 ) Acórdão de 26 de janeiro de 2010, Transportes Urbanos y Servicios Generales SAL (C-118/08, Colet., p. I-635, n.o 46).

( 22 ) Acórdão Sante Pasquini, já referido na nota 20 (n.o 59).

( 23 ) Já referido na nota 3 (n.o 26).

( 24 ) Já referido na nota 3 (n.o 78).

( 25 ) N.o 20. O Tribunal de Justiça observou, no n.o 21 do acórdão Pfleiderer, que nem a Comunicação da Comissão relativa à cooperação no âmbito da rede de autoridades de concorrência (JO 2004, C 101, p. 43) nem a Comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2006, C 298, p. 17), ambas relacionadas com o tema da clemência, são vinculativas para os Estados-Membros. No n.o 22 desse acórdão, o Tribunal de Justiça sublinhou que, no quadro da REC, um regime-modelo em matéria de clemência, que visa a harmonização de alguns elementos dos programas nacionais nesta matéria, foi elaborado e adotado no decurso do ano de 2006. Este regime-modelo também não produzia efeitos vinculativos para os órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros.

( 26 ) Acórdão Pfleiderer, já referido na nota 2 (n.o 23).

( 27 ) Ibidem (n.o 24 e jurisprudência referida).

( 28 ) Ibidem (n.os 25 a 26). Subscrevo ainda a observação do advogado-geral J. Mazák no n.o 34 das suas conclusões apresentadas, em 16 de dezembro de 2010, no processo Pfleiderer, no sentido de que «creio que, sempre que um Estado-Membro, através da(s) sua(s) autoridade(s) responsável(is) em matéria de concorrência, adotar um regime de clemência com vista à aplicação eficaz do artigo 101.o TFUE, deve, não obstante a autonomia processual de que goza na aplicação da referida disposição, assegurar que o regime é criado e aplicado de forma eficaz».

( 29 ) Acórdão Pfleiderer (n.o 30).

( 30 ) Ibidem (n.o 31).

( 31 ) Acórdão de 14 de dezembro de 1995 (C-430/93 e C-431/93, Colet., p. I-4705, n.o 19).

( 32 ) V. conclusões do advogado-geral J. Mazák (n.o 22).

( 33 ) O sublinhado é meu.

( 34 ) À semelhança do que foi considerado, por exemplo, no acórdão de 22 de dezembro de 2010, DEB (C-279/09, Colet., p. I-13849), onde o Tribunal de Justiça considerou que uma regra nacional que exige o pagamento antecipado de encargos judiciais antes da propositura de uma ação por responsabilidade de um Estado-Membro, quando não tenha sido possível obter assistência judiciária, podia violar o direito de acesso a um tribunal. A decisão sobre se esta situação se tinha efetivamente verificado no caso concreto foi deixada ao órgão jurisdicional nacional.

( 35 ) Acórdão de 11 de setembro de 2003, Safalero (C-13/01, Colet., p. I-8679, n.o 54).

( 36 ) V. conclusões do advogado-geral P. Mengozzi apresentadas em 21 de janeiro de 2009, no processo Mono Car Styling (C-12/08, Colet., p. I-6653, n.o 84), citando os n.os 38 a 40 do acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de março de 2007, Unibet (C-432/05, Colet., p. I-2271).

( 37 ) V., por analogia, acórdão DEB, já referido na nota 34.

( 38 ) Acórdãos de 3 de fevereiro de 2000, Dounias (C-228/98, Colet., p. I-577, n.o 69 e jurisprudência referida); de 29 de abril de 2004, Pusa (C-224/02, Colet., p. I-5763, n.o 44); e de 24 de abril de 2008, Arcor (C-55/06, Colet., p. I-2931, n.o 191 e jurisprudência referida). V. também, no que diz respeito às regras em matéria de prova, acórdãos de 7 de setembro de 2006, Laboratoires Boiron SA (C-526/04, Colet., p. I-7259, n.os 52 a 57), e de 1 julho de 2010, Speranza (C-35/09, Colet., p. I-6581, n.o 47).

( 39 ) Acórdão Dounias, já referido na nota 38 (n.o 71).

( 40 ) Ibidem (n.o 71).

( 41 ) Conclusões apresentadas em 23 de setembro de 1999, pelo advogado-geral F. G. Jacobs no processo Dounias, já referido na nota 38 (n.o 50).

( 42 ) V., por exemplo, acórdãos de 10 de abril de 2003, Steffensen (C-276/01, Colet., p. I-3735), e de 6 de novembro de 2012, Otis e o. (C-199/11).

( 43 ) Acórdão de 15 de abril de 2010, Barth (C-542/08, Colet., p. I-3189, n.o 40).

( 44 ) V., por exemplo, acórdão de 1 de dezembro de 1998, Levez (C-326/96, Colet., p. I-7835, n.o 32), em que se considerou que o facto de uma entidade patronal ter mentido sobre o nível da remuneração auferida por trabalhadores do sexo masculino que efetuavam um trabalho equivalente, «esteve na origem» do atraso do recurso de B. S. Levez.

( 45 ) V., como exemplo clássico, acórdão de 9 de novembro de 1983, San Giorgio (199/82, Recueil, p. 3595).

( 46 ) Acórdão Otis, já referido na nota 42 (n.o 48).

( 47 ) Ibidem (n.o 49).

( 48 ) V. conclusões do advogado-geral M. Darmon apresentadas em 29 de maio de 1991, no processo Verholen e o. (C-87/90, C-88/90 e C-89/90, Colet., p. I-3757, n.o 33).

( 49 ) Acórdão DEB, já referido na nota 34 (n.o 45), citando TEDH, acórdão Steel e Morris c. Reino Unido de 15 de fevereiro de 2005, § 59.

( 50 ) Ibidem (n.o 45).

( 51 ) Ibidem (n.o 47), citando TEDH, acórdãos Tolstoy-Miloslavsky e Reino Unido de 13 de julho de 1995, série A, n.o 316-B, §§ 59 a 67, e Kreuz c. Polónia de 19 de junho de 2001, Recueil des arrêts et décisions 2001-VI, §§ 54 e 55. V., também, conclusões da advogada-geral E. Sharpston apresentadas em 30 de novembro de 2006, acórdão de 13 de março de 2007, Unibet (C- 432/05, Colet., p. I-2271, n.o 38).

( 52 ) V. conclusões do advogado-geral J. Mazák apresentadas em 16 de dezembro de 2010 no processo Pfleiderer já referido na nota 2 (n.o 46).

( 53 ) V., como exemplo clássico, acórdão de 18 de maio de 1982, AM & S Europe/Comissão (155/79, Recueil, p. 1575).

( 54 ) Recentemente reiterado no acórdão do Tribunal Geral de 14 de novembro de 2012, Nexans France e Nexans/Comissão (T-135/09, n.o 128 e jurisprudência referida). V., também, acórdão de 14 de setembro de 2010, Akzo Nobel Chemicals e Akros Chemicals/Comissão (C-550/07 P, Colet., p. I-8301).

( 55 ) V. Comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2006, C 298, p. 17, n.o 39). «O facto de ser concedida imunidade em matéria de coimas ou uma redução do seu montante não protege a empresa das consequências de direito civil da sua participação numa infração ao artigo 81.o CE.»

( 56 ) Acórdão Mono Car Styling, já referido (n.o 49 e jurisprudência referida).

( 57 ) Acórdão de 28 de junho de 2012, Comissão/Editions Odile Jacob SAS (C-404/10 P, n.os 123 e 124).

( 58 ) A que se poderia somar, por exemplo, o conceito conexo de proteção dos segredos comerciais. Acórdãos de 26 de junho de 2007, Ordre des barreaux francophones et germanophones (C-305/05, Colet., p. I-5305), e de 29 de março de 2012, Interseroh (C-1/11).

( 59 ) V., em especial, Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43).

( 60 ) Por exemplo, acórdãos Comissão/Editions Odile Jacob, já referido, e de 22 de maio de 2012, Energie Baden-Württemberg/Comissão (T-344/08).

( 61 ) JO 2004, L 101, p. 54.

( 62 ) Vale a pena observar que o Tribunal Geral considerou recentemente que era necessário autorizar as partes a consultarem os ficheiros da Comissão na Secretaria quando o processo se baseava em informações fornecidas por uma empresa num contexto de clemência. V. acórdão do Tribunal Geral de 14 de novembro de 2012, Prysmian e Prysmian Cavi e Sistemi Energia/Comissão (T-140/09).

( 63 ) Commission Staff Working Paper accompanying the White Paper on Damages actions for breach of the EC antitrust rules SEC (2008) 404, point 2, page 7.

( 64 ) V. observações relativas aos segredos comerciais no n.o 33 das conclusões que apresentei em 7 de junho de 2012, no processo Westbahn Management (C-136/11). A Comissão sempre publicou as decisões em que aplica o direito da concorrência da União Europeia, não revelando, quando necessário, os elementos que constituem segredos comerciais.

( 65 ) Acórdão Unibet, já referido (n.os 40 e 41 e jurisprudência referida).

( 66 ) A advogada-geral E. Sharpston sustentou que os problemas práticos de quantificação são insuficientes para tornar uma ação de indemnização «impossível na prática ou excessivamente difícil». V. n.o 49 das suas conclusões no processo Unibet. Na minha opinião, trata-se de uma questão de grau de dificuldade que deve ser apreciada pelo órgão jurisdicional nacional à luz do artigo 19.o, n.o 1, TUE.