CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

NIILO JÄÄSKINEN

apresentadas em 24 de maio de 2012 ( 1 )

Processo C-62/11

Land Hessen

contra

Florence Feyerbacher

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Hessisches Landessozialgericht (Alemanha)]

«Privilégios e Imunidades da União — Natureza jurídica do acordo de sede do Banco Central Europeu — Contrato de direito público — Ausência de efeitos erga omnes — Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais — Artigo 36.o, n.o 1 — Condições de emprego do pessoal do Banco Central Europeu — Ausência de caráter exclusivo — Aplicabilidade das disposições de direito social alemão que preveem a atribuição da prestação parental aos agentes do Banco Central Europeu — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 34.o - Direito de acesso às prestações de segurança social»

I — Introdução

1.

A República Federal da Alemanha tem a faculdade de conceder prestações de segurança social aos agentes do Banco Central Europeu? Esta é, no essencial, a questão submetida ao Tribunal de Justiça pelo Hessischen Landessozialgericht (Alemanha).

2.

O órgão jurisdicional de reenvio questiona-se mais exatamente, por um lado, quanto à natureza jurídica do acordo de 18 de setembro de 1998, celebrado entre o Governo alemão e o Banco Central Europeu (BCE) relativo à sede desta instituição (a seguir «acordo de sede») ( 2 ). Por outro lado, põe em evidência a necessidade de definir o âmbito das condições de emprego do pessoal do Banco Central Europeu, tendo em conta o artigo 36.o, n.o 1, do Protocolo relativo aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu (a seguir «Estatutos do SEBC») ( 3 ).

3.

As questões prejudiciais foram submetidas no âmbito de um litígio que opõe F. Feyerbacher, agente do BCE de nacionalidade alemã com domicílio na Alemanha, ao Land Hessen, quanto à recusa deste último em atribuir a F. Feyerbacher uma prestação parental.

4.

O pedido de decisão prejudicial é, pois, relativo, por um lado, à natureza jurídica do acordo de sede, e em especial, à questão de saber se tem ou não conexão com o direito da União. Por outro lado, coloca a questão de saber se o artigo 15.o do acordo de sede — que, por força do artigo 36.o, n.o 1, do Estatuto do SEBC, exclui a aplicação das disposições materiais e processuais do direito do trabalho e do direito social da República Federal da Alemanha às condições de emprego do pessoal do BCE, aprovadas pelo Conselho do BCE ( 4 ) (a seguir «CDE») — constitui uma norma de conflito de leis que se opõe a que o referido Estado-Membro conceda aos membros do pessoal do BCE que residam no seu território, com fundamento no princípio da territorialidade, prestações familiares, tais como a prestação parental, previstas pela sua legislação nacional.

5.

A este propósito, saliente-se que o elemento central do processo consiste em saber se, e eventualmente em que medida, a República Federal da Alemanha continua a ter a liberdade de, ao abrigo do artigo 36.o, n.o 1, dos Estatutos do SEBC, aplicar a sua legislação nacional para efeitos de concessão de prestações de segurança social aos membros do pessoal do BCE em complemento das estabelecidas nas CDE.

II — Quadro jurídico

A — Direito da União

1. Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

6.

O direito às prestações sociais é garantido no artigo 34.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia ( 5 ). Nos termos do referido artigo:

«1.   A União reconhece e respeita o direito de acesso às prestações de segurança social e aos serviços sociais que concedem proteção em casos como a maternidade, doença, acidentes de trabalho, dependência ou velhice, bem como em caso de perda de emprego, de acordo com o direito da União e com as legislações e práticas nacionais.

2.   Todas as pessoas que residam e se desloquem legalmente no interior da União têm direito às prestações de segurança social e às regalias sociais nos termos do direito da União e das legislações e práticas nacionais.

[…]»

2. Estatutos do SEBC

7.

As operações externas do BCE são definidas no artigo 23.o Este pode designadamente «estabelecer relações com bancos centrais e instituições financeiras de países terceiros e, quando for caso disso, com organizações internacionais».

8.

Nos termos do artigo 24.o, intitulado «Outras operações», o BCE, além das operações decorrentes das suas atribuições, pode «efetuar operações com fins administrativos ou destinadas ao respetivo pessoal».

9.

O artigo 35.o, n.os 1 e 4, dos Estatutos do SEBC e do BCE dispõe:

«35.° — 1.   Os atos ou omissões do BCE podem ser fiscalizados ou interpretados pelo Tribunal de Justiça da União Europeia nos casos e nas condições estabelecidos nos Tratados […]

[…]

35.° — 4.   O Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir com fundamento em cláusula compromissória constante de um contrato de direito público ou privado celebrado pelo BCE ou por sua conta.»

10.

Nos termos do artigo 36.o, n.o 1, dos Estatutos do SEBC, o «Conselho do BCE, sob proposta da Comissão Executiva, definirá o regime aplicável ao pessoal do BCE».

11.

O artigo 39.o dos referidos estatutos prevê:

«O BCE goza, no território dos Estados-Membros, dos privilégios e imunidades necessários ao cumprimento da sua missão, nas condições definidas no protocolo relativo aos privilégios e imunidades da União Europeia.»

3. protocolo relativo aos privilégios e imunidades da União Europeia

12.

O artigo 14.o do protocolo relativo aos privilégios e imunidades da União Europeia dispõe ( 6 ):

«O Parlamento Europeu e o Conselho, por meio de regulamentos adotados de acordo com o processo legislativo ordinário e após consulta às instituições interessadas, estabelecem o regime das prestações sociais aplicáveis aos funcionários e outros agentes da União.»

13.

O artigo 22.o, primeiro parágrafo, do referido protocolo prevê a aplicabilidade do mesmo ao BCE, aos membros dos seus órgãos e ao seu pessoal, sem prejuízo do disposto nos Estatutos do SEBC e do BCE.

4. Acordo de sede

14.

Segundo o quinto parágrafo do preâmbulo do acordo de sede, este tem por objetivo definir os privilégios e imunidades do BCE na República Federal da Alemanha em conformidade com o protocolo relativo aos privilégios e imunidades ( 7 ).

15.

Sob a epígrafe «Inaplicabilidade do direito do trabalho e social alemão», o artigo 15.o do acordo de sede dispõe:

«Tendo em conta o disposto no artigo 36.o [dos Estatutos do SEBC], as condições de emprego dos membros da Comissão Executiva e dos agentes não estão subordinadas às disposições materiais e processuais do direito do trabalho e do direito social da República Federal da Alemanha.»

16.

O artigo 21.o do acordo de sede prevê que, em caso de divergência entre a República Federal da Alemanha e o BCE sobre a interpretação e a aplicação do referido acordo, qualquer uma das partes pode submeter essa divergência ao Tribunal de Justiça, em conformidade com o disposto no artigo 35.o, n.o 4, dos Estatutos do SEBC.

5. Disposições das CDE

17.

O âmbito de aplicação pessoal das CDE ( 8 ) é definido na primeira parte destas, intitulada «Disposições gerais». O artigo 1.o, n.o 1, das CDE dispõe:

«[…] é considerado ‘membro do pessoal’ do [BCE] qualquer pessoa que tenha celebrado com o BCE um contrato de trabalho com duração indeterminada ou com termo certo superior a um ano, e que tenha assumido as suas funções.»

18.

O artigo 9.o, que se integra na segunda parte das CDE, intitulada «Relações de trabalho», dispõe:

«a)

As relações de trabalho entre o BCE e os membros do seu pessoal são reguladas por contratos de trabalho celebrados em conformidade com as presentes condições de emprego […]

[…]

c)

As condições de emprego não são reguladas por qualquer direito nacional específico. O BCE aplica: i) os princípios gerais comuns às ordens jurídicas dos Estados-Membros; ii) os princípios gerais do direito comunitário […] e iii) os regulamentos e diretivas […] em matéria de política social […].»

19.

A terceira parte das CDE intitula-se «Remuneração-base, prestações e subsídios». O artigo 21.o precisa, quanto às prestações e subsídios — a saber, abono de lar, subsídio por filho a cargo, subsídio de expatriação, prestação escolar e prestação pré-escolar — referidos nos artigos 15.° a 20.° das CDE, que «estas prestações são complementares de quaisquer outras prestações da mesma natureza de outras proveniências». Os agentes do BCE são igualmente obrigados a requerer e a declarar «estas prestações e subsídios, que são deduzidos aos devidos pelo BCE».

20.

Por sua vez, da quarta parte das CDE, intitulada «Prestações associadas ao início e à cessação de funções», faz parte o artigo 24.o, que precisa que as prestações previstas nos artigos 23.° e 24.° são complementares em relação a «quaisquer outras prestações da mesma natureza de diferente proveniência». Os agentes do BCE são igualmente obrigados a requerer e a declarar «estas prestações, que são deduzidas às devidas pelo BCE».

21.

Segundo o artigo 29.o das CDE, que figura na quinta parte das mesmas, intitulado «Duração do trabalho e descanso», os agentes do BCE «têm direito a uma licença parental não remunerada que cumpra, no mínimo, o disposto na Diretiva 96/34/CE [ ( 9 )]».

22.

Da sexta parte das CDE, intitulada «Segurança social», constam as normas que regulam, designadamente, a remuneração em caso de ausência por doença ou acidente, o subsídio de invalidez e o seguro de doença e de acidente.

23.

A sexta parte inclui igualmente as disposições relativas às prestações, ou seja, o subsídio mensal de desemprego, o abono de lar e uma cobertura pelos regimes de seguro de doença e de seguro de acidente do BCE, a que têm direito os agentes que se encontrem desempregados após a rescisão do seu contrato com o BCE. No entanto, decorre do artigo 36.o das CDE que estas «prestações são complementares em relação a quaisquer outras prestações da mesma natureza de diferente proveniência». Os agentes do BCE são igualmente obrigados a requerer e a declarar «estas prestações, que são deduzidas às devidas pelo BCE».

B — Direito nacional

24.

O § 1, n.o 1, da lei relativa à prestação parental e à licença parental (Gesetz zum Elterngeld- und Elternzeit) de 5 de dezembro de 2006 ( 10 ) (a seguir «BEEG»), dispõe:

«Tem direito à prestação parental, quem

1.

tenha domicílio ou residência habitual na Alemanha,

2.

viva com um filho a cargo,

3.

se ocupe pessoalmente da guarda e educação do filho, e

4.

não exerça uma atividade ou profissão a tempo inteiro.»

25.

O § 1, n.o 2, ponto 3, desta mesma lei, respeita à hipótese de exercício de uma atividade fora da Alemanha:

«Tem também direito à prestação parental quem, não preenchendo nenhum dos requisitos do n.o 1, ponto 1,

[…]

[…]

3.

tenha a nacionalidade alemã e exerça uma atividade apenas a título temporário numa organização internacional ou supranacional, em particular os funcionários destacados em conformidade com as diretivas federais na matéria, ou qualquer pessoa que exerça a título temporário no estrangeiro uma atividade à qual foi afetada […].»

26.

No que diz respeito ao cômputo de prestações equivalentes, o § 3, n.o 3, primeiro período, da BEEG, prevê o seguinte:

«As prestações equivalentes à prestação parental a que tenha direito uma pessoa que preencha os requisitos do § 1 fora da Alemanha ou por parte de uma organização internacional ou supranacional serão deduzidas da prestação parental na medida em que correspondam ao mesmo período de tempo e não sejam aplicáveis os regulamentos adotados com fundamento no Tratado que institui a Comunidade Europeia.»

III — Litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação processual no Tribunal de Justiça

27.

F. Feyerbacher tem nacionalidade alemã e reside na Alemanha, onde exerceu uma atividade profissional antes de se tornar membro do pessoal do BCE. A este último título, recebe uma remuneração sujeita ao imposto comunitário e está abrangida pelo regime aplicável aos funcionários do BCE previsto pelas CDE, não estando inscrita na segurança social alemã.

28.

Dado que as CDE não estabelecem qualquer prestação parental, F. Feyerbacher, na sequência do nascimento da sua filha, em 5 de setembro de 2008, apresentou um pedido de prestação parental nos termos do § 1, n.o 1, da BEEG com base no seu salário no BCE, ou, a título subsidiário, a concessão da prestação legal mínima de 300 euros mensais.

29.

Em apoio do seu pedido, F. Feyerbacher alegou que preenchia os requisitos para beneficiar dessa prestação previstos no § 1, n.o 1, da BEEG, na medida em que tinha domicílio na Alemanha, aí se ocupava do seu filho e não exercia, durante o período a que correspondia a prestação, uma atividade profissional a tempo inteiro.

30.

Por decisões de 4 de dezembro de 2008 e de 8 de janeiro de 2009, em resposta à reclamação de F. Feyerbacher, o Land Hessen indeferiu o pedido com o fundamento de, nos termos do protocolo relativo aos privilégios e imunidades e do artigo 15.o do acordo de sede, ser aplicável a F. Feyerbacher o direito da União e não o direito do trabalho ou o direito social alemão. Por conseguinte, o pessoal do BCE não tem, em princípio, qualquer direito à prestação parental. Além disso, a autoridade em questão observou que F. Feyerbacher não é sujeito passivo de impostos na Alemanha.

31.

F. Feyerbacher interpôs recurso das referidas decisões para o Sozialgericht Frankfurt (tribunal de primeira instância de Frankfurt competente em matéria social). Em apoio do seu recurso, F. Feyerbacher alegou igualmente que o acordo de sede foi concluído muito antes da entrada em vigor da BEEG, pelo que não pode decorrer do referido acordo qualquer exclusão da prestação parental. Além disso, sendo o seu contrato com o BCE um contrato de trabalho a termo, tratava-se de uma atividade temporária na aceção do § 1, n.o 2, ponto 3, da BEEG. Em sua opinião, devia ser também tido em conta o § 3, n.o 2, da BEEG, que prevê em que casos são dedutíveis da prestação parental alemã as prestações equivalentes recebidas no estrangeiro pelo interessado e pagas por uma organização internacional ou supranacional.

32.

Por acórdão de 30 de setembro de 2009, o Sozialgericht Frankfurt deu provimento ao recurso e anulou as decisões de 4 de dezembro de 2008 e de 8 de janeiro de 2009. Segundo este órgão jurisdicional, F. Feyerbacher preenche os requisitos para beneficiar da prestação em causa, tais como previstos no § 1, n.o 1, da BEEG.

33.

O Sozialgericht Frankfurt considerou que só a lei, através de uma disposição especial, pode excluir uma categoria de pessoas do benefício das prestações da BEEG. Considerou, no entanto, que o artigo 15.o do acordo de sede não constitui uma disposição desse tipo, porque o direito à prestação parental não se enquadra nas condições de emprego dos agentes do BCE a que se refere esse artigo. Além disso, também não é justificada, no presente processo, a recusa da prestação a F. Feyerbacher, na medida em que o pessoal do BCE não beneficia de prestações a título de seguro, de assistência e de promoção sociais, das quais faz parte a prestação parental em questão. Por conseguinte, no presente caso, não há cúmulo de prestações.

34.

Tendo sido interposto recurso desta decisão para o Hessisches Landessozialgericht, este considera que F. Feyerbacher preenche os requisitos previstos no § 1, n.o 1, da BEEG e deve, portanto, poder beneficiar da prestação parental, exceto se uma disposição específica conforme com as exigências da lei excluir a sua aplicabilidade. O referido órgão jurisdicional não exclui a possibilidade de o artigo 15.o do acordo de sede poder constituir uma disposição desse tipo.

35.

Nestas circunstâncias, por decisão entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 10 de fevereiro de 2011, o Hessisches Landessozialgericht decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O Acordo [de sede] faz parte do direito da União, o qual tem primazia sobre o direito nacional, ou trata-se de um tratado de direito internacional?

2)

Deve o artigo 15.o do acordo de sede, lido em conjugação com o artigo 36.o [dos Estatutos do SEBC e do BCE] ser interpretado em termos restritivos, no sentido de que o direito social alemão que concede o direito a prestações sociais só não é aplicável aos agentes do BCE se o BCE lhes conceder uma prestação social comparável em conformidade com o regime aplicável ao seu pessoal?

3)

Em caso de resposta negativa à questão n.o 2:

a)

Devem as disposições acima mencionadas ser interpretadas no sentido de que se opõem à aplicação de uma disposição nacional que concede prestações familiares exclusivamente com fundamento no princípio da territorialidade?

b)

Podem as considerações do Tribunal de Justiça no acórdão de 20 de maio de 2008, Bosmann (C-352/06, Colet., I-3827, n.os 31-33) ser transpostas para a aplicação das disposições acima mencionadas? O artigo 15.o do acordo de sede, lido em conjugação com o artigo 36.o dos Estatutos do SEBC e do BCE, impede a República Federal da Alemanha de conceder prestações familiares aos agentes do BCE residentes no seu território?»

36.

Foram apresentadas observações escritas por F. Feyerbacher, pelo Governo alemão, pela Comissão Europeia e pelo BCE. Nenhuma das partes requereu a realização de audiência.

IV — Análise

A — Quanto ao acordo de sede

1. Natureza jurídica do acordo de sede

37.

Saliente-se desde já que a qualificação do acordo de sede enquanto ato jurídico não é isenta de dificuldades. Como resulta das observações apresentadas ao Tribunal de Justiça, são concebíveis duas qualificações, a saber, por um lado, a de acordo internacional a que a lei nacional de aprovação confere o mesmo nível que as leis nacionais em sentido formal ou, por outro, a de ato abrangido pelo direito da União que, nessa qualidade, prevalece sobre o direito nacional. Prefiro a segunda orientação.

38.

Antes de mais, no que respeita à independência do BCE, saliente-se que a mesma é assegurada pelo disposto no artigo 130.o TFUE e pelo artigo 7.o dos Estatutos do SEBC e do BCE. No entanto, como resulta da jurisprudência do Tribunal, a independência do BCE, que tem por finalidade contribuir para a realização dos seus objetivos, não tem como consequência destacá-lo completamente da União e subtraí-lo à aplicação das normas de direito da União ( 11 ). O BCE não pode, pois, ser considerado como uma organização intergovernamental com uma competência dita «funcional» em direito internacional. Pelo contrário, inicialmente, tratava-se de um organismo sui generis  ( 12 ) e, na situação atual do direito da União, trata-se de uma instituição da União nos termos do artigo 13.o UE ( 13 ), cujas competências resultam do direito primário.

39.

A independência do BCE não constitui, pois, um fim em si, mas obedece a um objetivo preciso. O princípio de independência visa designadamente permitir ao BCE a prossecução efetiva do objetivo da estabilidade dos preços e, sem prejuízo deste objetivo, apoiar as políticas económicas da União, como exige o artigo127.° TFUE ( 14 ).

40.

Cumpre igualmente recordar que o BCE tem personalidade jurídica, nos termos do artigo 282.o, n.o 3, TFUE, e do artigo 9.o, n.o 1, dos Estatutos do SEBC e do BCE. As suas competências para efetuar operações externas e outras operações não abrangidas nas suas missões são, contudo, especificadas pelos artigos 23.° e 24.° dos Estatutos do SEBC e do BCE ( 15 ). Tendo em conta a sua personalidade jurídica, afigura-se-me que o BCE tem competência para celebrar acordos internacionais relativos às suas missões no âmbito da política monetária ( 16 ). Em contrapartida, como salienta a Comissão, não dispõe de qualquer competência para celebrar acordos internacionais em nome da União devido ao facto de não ter qualquer competência neste domínio e de apenas serem aplicáveis os procedimentos estabelecidos no artigo 218.o TFUE.

41.

Fora das operações relativas à política monetária, reguladas pelo artigo 23.o dos Estatutos do SEBC e do BCE, o BCE pode, nos termos do artigo 24.o dos referidos estatutos, efetuar outras operações necessárias do ponto de vista do seu funcionamento, como a conclusão do acordo de sede. No entanto, a redação deste artigo não especifica a natureza dos atos que o BCE pode adotar no quadro dessas operações. Por essa razão, a fim de poder determinar a natureza jurídica do acordo de sede, é necessário analisar este último no seu contexto jurídico específico, a saber, o do protocolo relativo aos privilégios e imunidades.

42.

Como resulta do quinto parágrafo do preâmbulo do referido acordo, o mesmo tem por objetivo definir os privilégios e imunidades do BCE na República Federal da Alemanha de acordo com o protocolo relativo aos privilégios e imunidades ( 17 ). Trata-se, pois, de uma medida complementar em relação ao protocolo relativo aos privilégios e imunidades destinada a dar aplicação às disposições do referido protocolo no contexto específico do BCE ( 18 ). O artigo 15.o do referido acordo prende-se mais especificamente com o artigo 14.o deste protocolo que estabelece o procedimento aplicável à fixação do regime de prestações de segurança social aplicáveis aos funcionários e outros agentes europeus.

43.

Neste contexto de direito primário da União, o artigo 21.o do acordo de sede relativo à resolução de litígios remete para o artigo 35.o, n.o 4, dos Estatutos do SEBC e do BCE, que estabelece a competência do Tribunal de Justiça com base numa cláusula compromissória formulada nos mesmo termos que o artigo 272.o TFUE, a saber, uma «cláusula compromissória constante de um contrato de direito público ou de direito privado». Tendo em conta a qualidade das partes, bem como o objeto do acordo de sede, a cláusula compromissória constante do acordo de sede só pode visar um contrato de direito público ( 19 ).

44.

Esta conclusão foi, aliás, implicitamente confirmada pelo Tribunal de Justiça no processo BCE/Alemanha, já referido. Neste processo, o Tribunal de Justiça baseou a sua competência numa leitura conjugada dos artigos 21.° do referido acordo, 35.°, n.o 4, dos Estatutos do SEBC e 272.° TFUE ( 20 ).

45.

Ora, contrariamente ao que alega o Governo alemão, considero que não se trata de um acordo internacional na aceção do direito internacional público, mas de um contrato de direito público celebrado entre o BCE e a República Federal da Alemanha.

46.

Esclareça-se que a ordem jurídica à qual está ligado este acordo só pode ser a da União. Como referi anteriormente, a leitura do preâmbulo do referido acordo mostra a existência de uma conexão específica com o direito da União que consiste em que o acordo de sede constitui a aplicação do protocolo relativo aos privilégios e imunidades no presente contexto específico ( 21 ). Apesar das conexões que este acordo apresenta com a República Federal da Alemanha, o mesmo integra-se claramente no direito da União, uma vez que tem por objetivo especificar os Privilégios e Imunidades reconhecidos ao BCE no território alemão pelo referido protocolo ( 22 ).

47.

Consequentemente, o acordo de sede inscreve-se no contexto jurídico estabelecido pelo protocolo relativo aos privilégios e imunidades e, de forma mais ampla, no quadro do direito da União, que constitui o quadro jurídico de referência para efeitos da interpretação das suas disposições.

2. Efeitos do acordo de sede, enquanto contrato de direito público, em relação aos particulares

48.

Estando apurado que o acordo de sede é um contrato de direito público na aceção do direito da União, cumpre a seguir determinar se, e em que medida, esse contrato é suscetível de ter efeitos em relação a particulares como F. Feyerbacher.

49.

Em regra geral, um contrato de direito público, à semelhança de um contrato de direito privado, só tem efeito vinculativo entre as partes no referido contrato. Enquanto contrato de direito público com efeitos obrigatórios em relação às partes contratantes, o acordo de sede deve ser considerado como manifestando a vontade do BCE e da República Federal da Alemanha de precisar os respetivos direitos e obrigações em conformidade com o disposto no protocolo relativo aos privilégios e imunidades. Por esta razão, o acordo de sede não pode ser considerado um ato com efeitos erga omnes no quadro do direito da União ( 23 ).

50.

Esclareça-se que a ausência desse efeito pode ser deduzida da competência regulamentar limitada do BCE. Esta competência decorre do artigo 132.o, n.o 1, TFUE e do artigo 34.o, n.o 1, dos Estatutos do SEBC e do BCE, nos termos dos quais o BCE está habilitado a adotar regulamentos, tomar decisões ou a formular recomendações e emitir pareceres. Além disso, o Conselho do BCE pode adotar orientações e dar instruções nos termos do artigo 12.o, n.o 1, dos Estatutos do SEBC e do BCE. O BCE pode, assim, exercer a competência regulamentar prevista no artigo 36.o, n.o 1, dos Estatutos do SEBC e do BCE em relação ao seu pessoal. No entanto, não pode modificar o alcance ou o âmbito de aplicação das condições de emprego através de contrato celebrado com um Estado-Membro.

51.

Consequentemente, um contrato de direito público como o acordo de sede no presente processo não pode ter efeito vinculativo em relação a terceiros, a saber, os outros Estados-Membros, as outras instituições da União e os particulares. Dito de outro modo, um efeito erga omnes exigiria que o acordo de sede tivesse sido adotado sob a forma de regulamento ou de decisão ( 24 ).

52.

Além disso, parece útil comparar os efeitos do acordo de sede com os das diretivas em relação aos particulares. Tal como uma diretiva, que não pode, por si só, criar obrigações para um particular e não pode, portanto, ser invocada enquanto tal, contra ele ( 25 ), o acordo de sede não pode ter efeitos negativos sobre os direitos conferidos ao particular pelo direito da União ou pela legislação nacional ( 26 ).

53.

Mais especificamente no que respeita ao artigo 15.o do acordo de sede, entendo que esta disposição deve ser considerada como remetendo para o conteúdo do artigo 36.o, n.o 1, dos Estatutos do SEBC e do BCE, nos termos do qual o Conselho do BCE definirá o regime ( 27 ) aplicável ao pessoal do BCE.

54.

Assim, por um lado, esta disposição de direito primário beneficia de primado de aplicação em relação ao direito nacional alemão. Por outro, tendo em conta os seus efeitos intra partes, o artigo 15.o do acordo de sede isenta a República Federal da Alemanha de qualquer obrigação de aplicação das disposições do direito do trabalho ou do direito social alemão aos agentes do BCE.

55.

Saliente-se que, nos acórdãos já referidos Comissão/Alemanha e Comissão/Bélgica, relativos à interpretação do Estatuto dos Funcionários europeus estabelecido por via de regulamento, o Tribunal de Justiça considerou que o caráter complementar das prestações familiares estatutárias em relação às prestações da mesma natureza com outra proveniência se impõe aos Estados-Membros e não pode ser desrespeitado por disposições legislativas nacionais.

56.

O Tribunal de Justiça declarou, por um lado, que as disposições do Estatuto se opõem a que um Estado-Membro exclua o pagamento das prestações familiares por filhos a cargo previstas pela sua legislação devido à possibilidade de beneficiar, em relação ao mesmo filho, das prestações estatutárias, no caso de o beneficiário, cônjuge de um funcionário em funções ou aposentado, ou de outro agente, exercer ou ter exercido uma atividade assalariada no seu território ( 28 ).

57.

Por outro lado, declarou que as referidas disposições se opõem igualmente a que um Estado-Membro preveja que as prestações familiares devidas nos termos da sua legislação sejam reduzidas no montante das prestações equiparáveis previstas pelas disposições estatutárias no caso de o cônjuge de um funcionário, em funções ou aposentado, ou de outro agente, exercer ou ter exercido uma atividade assalariada no seu território, ou de o próprio funcionário exercer fora das instituições essa atividade a tempo parcial ( 29 ).

58.

Nestas condições, para poder responder utilmente às interrogações do órgão jurisdicional de reenvio, é necessário reformular as questões que este submeteu. Com efeito, a análise conjugada das questões apresentadas mostra que o órgão jurisdicional a quo pretende, no essencial, saber se o artigo 36.o, n.o 1, dos Estatutos do SEBC, que é referido unicamente a título subsidiário nas questões prejudiciais, se opõe a que a República Federal da Alemanha conceda prestações de segurança social, como a prestação parental em causa no processo principal, aos agentes do BCE em geral, nos termos da sua legislação nacional, com fundamento no princípio da territorialidade ou, a título subsidiário, quando as CDE não previrem essa prestação.

59.

Considero, portanto, que, para efeitos da resolução do litígio no processo principal, é necessário responder a esta interrogação reformulada. Atento o facto de a referida questão dizer respeito à interpretação e aplicação do direito da União, o Tribunal de Justiça é competente para lhe responder. Consequentemente, não pode ser acolhida a argumentação do Governo alemão relativa à inadmissibilidade do pedido de decisão prejudicial em razão da natureza do acordo de sede enquanto ato de direito internacional e da incompetência do Tribunal de Justiça daí decorrente para o interpretar no âmbito do processo prejudicial previsto no artigo 267.o TFUE.

B — Quanto à faculdade da República Federal da Alemanha de conceder prestações de segurança social aos agentes do BCE

1. Natureza jurídica das condições de emprego

60.

Importa sublinhar, em primeiro lugar, que a relação de trabalho entre o BCE e os seus agentes é definida pelas CDE, adotadas pelo Conselho do BCE, sob proposta da Comissão Executiva, com base no artigo 36.o-1 dos Estatutos do SEBC e do BCE. Nos termos do artigo 9.o, alínea a), das CDE, as relações de trabalho entre o BCE e os seus agentes regem-se por contratos de trabalho celebrados em conformidade com as disposições previstas pelas referidas CDE. Como observou o Tribunal de Justiça, o regime adotado para as relações de trabalho entre o BCE e os seus agentes é de natureza contratual e não estatutária ( 30 ).

61.

Além disso, recorde-se que as referidas CDE foram adotadas não por regulamento, mas através de um ato qualificado de «decisão», de modo que não produzem qualquer efeito obrigatório em relação aos Estados-Membros que não são destinatários das mesmas. No entanto, tal como o Estatuto dos funcionários europeus, que tem por única finalidade regulamentar as relações jurídicas entre as instituições europeias e os seus funcionários, as CDE vinculam o BCE e o seu pessoal e, à semelhança do Estatuto dos funcionários europeus em relação à função pública europeia, fixam os direitos e obrigações dos membros do pessoal do BCE ( 31 ).

62.

A este respeito, importa igualmente recordar que o artigo 36.o-1 dos Estatutos do SEBC confere ao BCE autonomia regulamentar no que respeita ao regime aplicável ao seu pessoal. Este regime, definido pelas CDE e pelas regras aplicáveis ao pessoal (artigo 21.o do regulamento interno do BCE), é distinto das regras aplicáveis aos funcionários e das regras aplicáveis aos outros agentes das Comunidades Europeias. É também autónomo relativamente ao direito dos Estados-Membros ( 32 ).

63.

Nos termos do artigo 36.o-1 dos Estatutos do SEBC, o BCE mantém a liberdade de definir o regime aplicável ao seu pessoal, o qual deve ser compreendido como incluindo não só as condições de trabalho mas também as prestações de segurança social a que um agente do BCE (ou o seu beneficiário) tem direito nessa qualidade ( 33 ). No entanto, contrariamente ao que referiu a Comissão nas suas observações, a competência regulamentar conferida ao BCE pelos Estatutos do SEBC para a definição do regime aplicável ao seu pessoal, não constitui uma norma de conflito de leis que, enquanto tal, exclua a aplicabilidade de outros regimes em matéria de segurança social. Considero que o artigo 36.o-1 dos Estatutos do SEBC constitui uma disposição que permite ao BCE regulamentar explícita ou implicitamente a aplicabilidade dos diferentes sistemas de segurança social ao seu pessoal ( 34 ).

64.

Consequentemente, a problemática abordada pelo órgão jurisdicional nacional sobre a relação existente entre o regime estabelecido pelas CDE e outros sistemas, como o estabelecido pelo direito social alemão, não pode ser resolvida de forma global. Pelo contrário, uma resposta adequada à referida problemática implica que se analisem sucessivamente todas as categorias de prestações em causa ( 35 ).

2. Âmbito de aplicação das CDE

65.

O âmbito de aplicação pessoal das CDE é definido no artigo 1.o das mesmas. Como resulta deste artigo, o conceito de membro do pessoal remete para toda e qualquer pessoa que tenha assinado um contrato de trabalho com o BCE com duração indeterminada ou a termo certo por mais de um ano, e que tenha assumido funções no BCE. Os anexos IIa e IIb das CDE estabelecem ainda as condições específicas aplicáveis aos contratos de curta duração (inferior a um ano) e aos participantes no programa denominado «Graduate Programme».

66.

A este respeito, observe-se que, diversamente dos participantes no «Graduate Programme», aos quais são aplicáveis as CDE, salvo disposição em contrário do anexo IIa, aqueles que celebraram um contrato de curta duração (pessoal dito «temporário») com o BCE, aos quais são aplicáveis as condições específicas previstas no anexo IIb, parecem estar excluídos do âmbito de aplicação pessoal das CDE nos termos do disposto no seu artigo 1.o Daí concluo que o pessoal temporário não figura na categoria de agentes do BCE aos quais é aplicável o artigo 4.o-C do Regulamento n.o 549/69 ( 36 ), nos termos do qual o pessoal do BCE beneficia igualmente dos privilégios e imunidades previstos em relação aos funcionários e agentes europeus pelo protocolo relativo aos privilégios e imunidades.

67.

No que respeita ao âmbito de aplicação material das CDE, recorde-se, em primeiro lugar, que, em conformidade com a sua competência regulamentar na matéria, o BCE prevê, no artigo 9.o, alínea c), das CDE, que não é aplicável às condições de emprego qualquer direito nacional. Por força desta disposição, a legislação nacional em matéria de segurança social baseada na existência de uma relação de emprego não pode, pois, ser aplicada nem ao BCE enquanto empregador nem aos agentes desta instituição enquanto empregados. Consequentemente, as disposições dos regimes nacionais de segurança social obrigatória não podem ser aplicadas aos agentes do BCE.

68.

Falta, no entanto, definir o estatuto das prestações que são atribuídas com um fundamento distinto da relação de trabalho. Estas prestações incluem as prestações atribuídas com base em sistemas nos quais o agente do BCE se inscreveu voluntariamente, as atribuídas ao agente numa qualidade distinta da de agente do BCE ( 37 ) ou as atribuídas ao agente com fundamento no princípio da territorialidade.

3. As diferentes categorias de prestações previstas pelas CDE

69.

Resulta das CDE que os agentes do BCE se devem inscrever no sistema de seguro de doença e de acidente do BCE. A natureza obrigatória desta inscrição exclui pois qualquer aplicação de sistemas nacionais obrigatórios equivalentes.

70.

A leitura das CDE revela, no entanto, a existência de numerosas conexões entre o sistema estabelecido pelas CDE e o previsto pelo direito nacional. Como resulta das CDE, as prestações familiares, bem como as prestações de emprego, previstas pelas quarta e sexta partes das CDE, são pagas pelo BCE subsidiariamente em relação às prestações equivalentes atribuídas por outros organismos.

71.

A este respeito, importa salientar que, segundo as CDE, o benefício das referidas prestações pressupõe que o agente do BCE tenha previamente requerido a atribuição de prestações provenientes de outras fontes à autoridade ou organismo competente, e que tenha comunicado o seu montante ao BCE. Consequentemente, as prestações equivalentes só são pagas a título complementar.

72.

Em minha opinião, estas opções regulamentares demonstram que o regime estabelecido pelas CDE possui caraterísticas que permitem concluir que, pelo menos no que respeita às prestações familiares, não se trata de um sistema exclusivo, ou mesmo primário, mas de um regime complementar em relação a outros sistemas de segurança social. Esta constatação é válida mesmo em relação a prestações de segurança social atribuídas ao próprio agente, e não unicamente em relação a prestações concedidas aos membros da família ou aos sucessores dos agentes.

73.

Nestas condições, diversamente da Comissão e do BCE, considero que não há razões sérias de natureza institucional, ligadas à independência do BCE, para interpretar as CDE no sentido da exclusão da atribuição de uma prestação parental, como a que está em causa no processo principal, com base na legislação nacional aplicável. Saliente-se que os regimes aplicáveis ao pessoal do BCE e da União admitem a aplicação de outros sistemas de segurança social ao referido pessoal ( 38 ).

74.

Face aos elementos anteriormente apresentados que mostram o caráter predominantemente complementar do regime estabelecido pelas CDE, o argumento do BCE relativo à necessidade de garantir a independência deste e de lhe permitir funcionar sem obstáculos na sua sede de Frankfurt am Main e que, segundo ele, justificava a exclusão sistemática do pessoal do BCE do direito do trabalho e do direito social alemão, parece-me pouco convincente. Com efeito, é o próprio BCE que obriga os agentes a apresentar pedidos a outros organismos para poderem beneficiar das prestações que o BCE paga unicamente a título complementar.

75.

Além disso, devido ao caráter subsidiário das prestações, como as prestações familiares, previstas pelas CDE em relação às prestações provenientes de outras fontes, considero que uma interpretação segundo a qual as CDE excluem de forma sistemática a aplicabilidade da legislação nacional em matéria de segurança social, não pode ser justificada pela necessidade de assegurar a igualdade dos funcionários e agentes da União de diferentes nacionalidades.

76.

Ainda que um dos objetivos subjacentes às disposições do protocolo relativo aos privilégios e imunidades consista em assegurar a igualdade das remunerações dos funcionários e agentes da União, aos quais não são aplicáveis o imposto nacional sobre os rendimentos nem, em regra geral, o direito nacional da segurança social, este objetivo, tal como a igualdade dos Estados-Membros, não pode ser alcançado tendo em conta o caráter complementar das prestações pagas pelo BCE no contexto específico do regime aplicável ao pessoal do BCE ( 39 ).

77.

Assim, há que observar que as CDE não excluem de forma global a aplicabilidade dos sistemas nacionais de segurança social. O regime estabelecido pelas CDE tem, assim, duplo impacto. Por um lado, estas excluem a aplicação da legislação nacional relativa à segurança social em matéria de pensões e de seguro de doença e de acidente dos agentes do BCE ( 40 ). Por outro lado, como salientei anteriormente, constituem um regime complementar e subsidiário no que respeita à atribuição das prestações e subsídios abrangidos pelas quarta e sexta partes das CDE.

4. Efeitos do artigo 34.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia sobre a interpretação das CDE

78.

Para ser exaustivo, analisarei finalmente as situações nas quais, em razão da omissão do BCE, os seus agentes têm a possibilidade de beneficiar de certas prestações, quer inscrevendo-se, de forma voluntária, num sistema específico ( 41 ), quer com fundamento no princípio da territorialidade, como acontece com a prestação parental no presente processo. Neste contexto, em especial, é fundamental ter em conta o disposto na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

79.

Cumpre, pois, salientar a importância do respeito do artigo 34.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, nos termos do qual deve ser respeitado o direito de acesso às prestações de segurança social e aos serviços sociais que concedem proteção nos casos definidos pela referida disposição ( 42 ). Com efeito, em conformidade com esta disposição, e tendo em conta a redação do artigo 9.o, alínea c), das CDE, que reconhece expressamente a aplicabilidade dos princípios gerais do direito da União no contexto das CDE, estas não podem ser interpretadas no sentido de que está excluída a aplicabilidade, em relação aos agentes ou ex-agentes do BCE, das prestações sociais baseadas na legislação nacional quando não é paga qualquer prestação equivalente pelo BCE ( 43 ).

80.

Esta interpretação é ainda corroborada pelo raciocínio adotado pelo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência resultante do acórdão Bosmann, já referido. Embora a referida jurisprudência seja relativa a situações transfronteiriças num contexto jurídico inteiramente diferente ( 44 ), o princípio da complementaridade desenvolvido pelo Tribunal de Justiça em matéria de segurança social, nos termos do qual o Estado-Membro de residência não pode ser privado da sua faculdade de atribuir prestações familiares às pessoas que residam no seu território, parece-me pertinente no presente processo ( 45 ). Com efeito, o raciocínio do Tribunal de Justiça mostra claramente que o referido Estado-Membro não perde a sua faculdade de atribuir prestações sociais com fundamento no princípio da territorialidade pelo simples facto de ser aplicável ao interessado um outro sistema de segurança social.

81.

Designadamente no que respeita à prestação parental em causa no processo principal, importa igualmente recordar que, em conformidade com o artigo 29.o das CDE, a licença parental deve cumprir as exigências da diretiva relativa à mesma licença. No entanto, não é possível concluir daí que a inexistência de uma disposição nas CDE estabelecendo uma prestação parental — cuja atribuição iria, certamente, além da exigência mínima da diretiva — tenha por consequência que o Estado-Membro em causa, em razão desta ausência, fique privado da sua faculdade de conceder a referida prestação com base no princípio da territorialidade.

82.

Pelo contrário, como resulta da cláusula 4.°, n.o 1, do acordo constante da referida diretiva, os Estados-Membros podem manter ou introduzir disposições mais favoráveis do que as previstas no referido acordo. Tendo em conta estes elementos, considero que as CDE não podem ser entendidas no sentido de que proíbem a atribuição de uma prestação parental a um agente do BCE tendo em conta que essa prestação não está prevista nas referidas condições.

83.

Acrescente-se que seria igualmente contrário ao artigo 34.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia interpretar as CDE como estabelecendo um regime exclusivo que se opusesse a qualquer aplicação do direito social nacional aos membros do pessoal do BCE. Em particular, em conformidade com as disposições que regulam o estatuto dos trabalhadores temporários, saliente-se que essa interpretação baseada apenas na existência de uma relação de emprego entre o interessado e o BCE teria por consequência privá-lo de qualquer proteção social, exceto a proteção baseada no seguro de doença e de acidente e a proteção contra os riscos de doença profissional e de acidente no exercício de funções ( 46 ).

84.

Nestas condições, considero que a República Federal da Alemanha continua a dispor da liberdade de conceder prestações sociais aos agentes do BCE desde que a concessão das mesmas não esteja associada à existência de uma atividade profissional na legislação nacional e o BCE não atribua uma prestação equivalente de forma exclusiva.

85.

No entanto, cumpre salientar que, de acordo com o artigo 15.o do acordo de sede, a República Federal da Alemanha não tem qualquer obrigação de aplicar a sua legislação neste domínio aos agentes do BCE. Consequentemente, dependem do direito nacional a aplicabilidade das disposições do direito nacional, na medida em que as condições de atribuição estejam preenchidas, bem como o montante da prestação atribuída.

V — Conclusão

86.

Face ao exposto, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões submetidas pelo Hessisches Landessozialgericht do seguinte modo:

«O artigo 36.o, n.o 1, do Protocolo relativo aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que a República Federal da Alemanha conceda prestações sociais, como a prestação parental em causa no processo principal, aos agentes do Banco Central Europeu, em conformidade com a legislação nacional, com fundamento no princípio de territorialidade, salvo se essa prestação estiver prevista pelas condições de emprego do Banco Central Europeu de forma exclusiva.»


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) BGBl. 1998 II, p. 2745. Está igualmente disponível no sítio Internet do BCE a versão alemã do acordo de sede, única que faz fé, bem como uma tradução inglesa.

( 3 ) Trata-se do Protocolo n.o 4 anexo ao Tratado da União Europeia e ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JO 2010, C 83, p. 230).

( 4 ) Com fundamento no artigo 36.o, n.o 1, dos Estatutos do SEBC, o Conselho do BCE adotou, em 9 de junho de 1998, as condições de emprego do pessoal do BCE (JO 1999, L 125, p. 32), diversas vezes alteradas. As condições de emprego não foram publicadas no Jornal Oficial da União Europeia. No entanto, estão disponíveis ao público em língua inglesa no sítio Internet do BCE.

( 5 ) Com o intuito de clarificar e, apesar de o acordo ter sido celebrado antes e a prestação em causa no processo principal abranger um período integralmente anterior à entrada em vigor do Tratado de Lisboa, o quadro jurídico abrange os textos do direito primário na sua redação posterior a esta data. Com efeito, salvo a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que, na sequência da entrada em vigor deste tratado, assumiu caráter vinculativo, as disposições pertinentes para a minha análise permaneceram em larga medida idênticas às vigentes antes da referida data.

( 6 ) Trata-se do Protocolo n.o 7 anexo ao Tratado da União Europeia e ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JO 2010, C 83, p. 266, a seguir «protocolo relativo aos privilégios e imunidades»).

( 7 ) No momento da assinatura do referido acordo, tratava-se mais exatamente do Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades das Comunidades Europeias de 8 de abril de 1965 (JO 1967, 152, p. 13), na versão anexa aos Tratados CE e Euratom.

( 8 ) Tradução livre da versão inglesa disponível no sítio Internet do BCE.

( 9 ) Diretiva 96/34/CE do Conselho de 3 de junho de 1996 relativa ao Acordo-quadro sobre a licença parental celebrado pela UNICE, pelo CEEP e pela CES (JO L 145, p. 4).

( 10 ) BGBl. 2006 I, p. 2748.

( 11 ) Acórdão de 10 julho de 2003, Comissão/BCE (C-11/00, Colet., I-7147, n.o 135). Para uma análise dos diferentes aspetos da independência do BCE, v. n.os 150 a 155 das conclusões do advogado-geral F. G. Jacobs neste processo, e Gaitanides, C., Das Recht der Europäischen Zentralbank. Unabhängigkeit und Kooperation in der Europäischen Währungsunion. Mohr Siebeck, Tübingen, 2005, pp. 55 e segs. V. igualmente, por analogia, acórdão de 10 de julho de 2003, Comissão/BEI (C-15/00, Colet., p. I-7281, n.os 101 e 102 e jurisprudência aí referida).

( 12 ) Na doutrina, foram apresentadas várias teses quanto ao estatuto do BCE na construção europeia. Para uma síntese destes pontos de vista, v. Gaitanides, C., op. cit, pp. 51 a 55.

( 13 ) No momento em que foi concluído o acordo de sede, em 18 de setembro de 1998, o BCE não figurava no círculo mais restrito das instituições comunitárias enumeradas no artigo 7.o CE. Sob a égide do Tratado CE, o SEBC e o BCE ocupavam efetivamente uma posição especial na arquitetura institucional.

( 14 ) V. n.o 150 das conclusões do advogado-geral F. G. Jacobs no processo Comissão/BCE, já referido.

( 15 ) V. Ott, A., «EU Regulatory Agencies in EU External Relations: Trapped in a Legal Minefield between European and International Law», European Foreign Affairs Review, 2008, n.o 13, p. 527.

( 16 ) V., neste sentido, Horng, D.-C., «The European Central Bank’s External Relations with Third Countries and the IMF», European Foreign Affairs Review, 2004, n.o 3, p. 326.

( 17 ) V. despacho de 17 de dezembro de 1968, Ufficio Imposte di Consumo di Ispra/Comissão (2/68, Colet.,1965-68, p. 899; Recueil, p. 635). Saliente-se que, neste processo, o Tribunal de Justiça não seguiu a abordagem proposta pelo advogado-geral K. Roemer nas suas conclusões, que consistia em aplicar, por analogia, os princípios que regiam o acordo de sede da ONU ao acordo assinado entre a Comissão e o Governo italiano no que respeita à sede do Centro de Comum Investigação de Ispra. O Tribunal de Justiça considerou que, ainda que a Comissão, com o objetivo de assegurar a execução do protocolo relativo aos privilégios e imunidades e, se necessário, de o completar, tenha podido celebrar um acordo de sede com o Estado-Membro interessado, este acordo não poderia, no entanto, reduzir os direitos e garantias resultantes diretamente do referido protocolo em benefício dos Estados-Membros e dos seus órgãos, das instituições da Comunidade e dos particulares. No que respeita às Escolas Europeias, v., a contrario, acórdãos de 15 de janeiro de 1986, Hurd (44/84, Colet., p. 29, n.os 20 a 22), e de 30 de setembro de 2010, Comissão/Bélgica (C-132/09, Colet., p. I-8695, n.o 44).

( 18 ) V. acórdão de 8 de dezembro de 2005, BCE/Alemanha (C-220/03, Colet., p. I-10595, n.o 24).

( 19 ) V. Schwarze, J., EU-Kommentar, artigo 238.o CE, 2.a ed., Nomos, Baden-Baden, 2009, pp. 1839 a 1843.

( 20 ) Acórdão BCE/Alemanha, já referido (n.o 27).V. igualmente n.o 29 das conclusões da advogada-geral G. Stix-Hackl neste processo.

( 21 ) Acórdão BCE/Alemanha, já referido (n.o 24).

( 22 ) Segundo a doutrina, um contrato de direito público na aceção do artigo 272.o TFUE, cuja redação corresponde à do artigo 35.o, n.o 4, dos Estatutos do SEBC, tanto pode enquadrar-se no direito de um Estado-Membro como no do direito da União. No que respeita à primeira possibilidade referida, o acordo de sede só tem conexão com o sistema jurídico da República Federal da Alemanha, cuja aplicabilidade deve, todavia, ser excluída tendo em conta o objeto do referido acordo, a saber, a execução das disposições do protocolo relativo aos privilégios e imunidades em relação ao BCE na República federal da Alemanha. V., a este respeito, Schwarze, J., op. cit., p. 1842.

( 23 ) No que respeita à inexistência de efeitos erga omnes das disposições constantes de um acordo de sede, v. a posição adotada pelo Tribunal de Justiça no despacho Ufficio Imposte di Consumo di Ispra/Comissão, já referido (p. 640).

( 24 ) V., neste sentido, acórdãos de 7 de maio de 1987, Comissão/Alemanha (189/85, Colet., p. 2061, n.o 14), e Comissão/Bélgica (186/85, Colet., p. 2029, n.o 21). O Tribunal de Justiça declarou expressamente que a versão pertinente do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias e o Regime aplicável aos outros agentes das Comunidades foi adotada através do Regulamento (CEE, Euratom, CECA) n.o 259/68 do Conselho, de 29 de fevereiro de 1968 (JO L 56, p. 1; EE 01 F1 p. 129, a seguir «Estatuto dos funcionários europeus»), e que este regulamento tinha, assim, caráter geral e era obrigatório em todos os seus elementos e diretamente aplicável em qualquer Estado-Membro.

( 25 ) V., a este respeito, designadamente, acórdão de 5 de outubro de 2004, Pfeiffer e o. (C-397/01 a C-403/01, Colet., p. I-8835, n.o 108 e jurisprudência aí referida).

( 26 ) Não excluo que a conclusão possa ser diferente no âmbito de uma análise à luz do direito alemão do acordo de sede, que foi ratificado na República Federal da Alemanha pela lei de aprovação de 19 de dezembro de 1998 (BGBl. 1998 II, p. 2996).

( 27 ) Há que salientar, a este respeito, que o termo utilizado na versão alemã do artigo 36.o, n.o 1, do Estatutos do SEBC é «Beschäftigungsbedingungen», que corresponde à terminologia utilizada no artigo 15.o do acordo de sede.

( 28 ) Acórdão Comissão/Alemanha, já referido (n.o 30).

( 29 ) Acórdão Comissão/Bélgica, já referido (n.o 35).

( 30 ) Acórdão de 14 de outubro de 2004, Pflugradt/BCE (C-409/02 P, Colet., p. I-9873, n.os 31 a 33 e jurisprudência aí referida). Cabe, no entanto, precisar que o BCE, enquanto instituição, dispõe de um poder de apreciação para a organização dos seus serviços, apesar da natureza contratual do ato jurídico que fundamenta a relação de trabalho entre este último e o seu pessoal. V., a este respeito, conclusões do advogado-geral P. Léger no processo Pflugradt/BCE, já referido (n.o 36 e jurisprudência aí referida).

( 31 ) V., por analogia, despacho do Tribunal Geral, de 18 de abril de 2002, IPSO e USE/BCE (T-238/00, Colet., p. II-2237, n.os 48 a 50 e jurisprudência aí referida). V., igualmente, acórdão de 10 de junho de 1999, Johannes (C-430/97, Colet., p. I-3475, n.o 19).

( 32 ) Acórdão do Tribunal Geral de 22 de outubro de 2002, Pflugradt/BCE (T-178/00 e T-341/00, Colet., p. II-4035, n.o 48). V. igualmente acórdão IPSO e USE/BCE, já referido (n.os 48 e 49). Em caso de lacunas das condições de emprego ou das regras aplicáveis ao pessoal do BCE, há que interpretá-las à luz da jurisprudência relativa ao Estatuto dos funcionários europeus. V., neste sentido, acórdão de 20 de novembro de 2003, Cerafogli e Poloni/BCE (T-63/02, Colet., p. II-4929, n.o 51).

( 33 ) O Tribunal de Justiça considerou que as prestações familiares, enquanto componentes da remuneração, estão associadas à relação de emprego. V., a este respeito, acórdãos já referidos Comissão/Alemanha (n.o 26) e Comissão/Bélgica (n.o 29).

( 34 ) Os acórdãos já referidos Comissão/Alemanha e Comissão/Bélgica, bem como as conexões entre os diferentes regimes de segurança social aplicáveis aos agentes do BCE baseiam-se na hipótese de que os funcionários e agentes da União, bem como os do BCE, podem igualmente estar abrangidos pelo âmbito de aplicação de outros sistemas de segurança social.

( 35 ) O mesmo princípio está subjacente à aplicação do sistema estabelecido pelo Regulamento (CEE) n.o 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na versão alterada e atualizada pelo Regulamento (CE) n.o 118/97 do Conselho de 2 de dezembro de 1996 (JO 1997, L 28, p. 1), alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1606/98 do Conselho de 29 de junho de 1998 (JO L 209, p. 1),e pelo Regulamento (CE) n.o 883/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social (JO L 166, p. 1). V., em especial, capítulos 1 a 8 dos referidos regulamentos, relativos às diferentes categorias de prestações.

( 36 ) Regulamento (Euratom, CECA, CEE) n.o 549/69 do Conselho, de 25 de março de 1969, que fixa as categorias dos funcionários e agentes das Comunidades Europeias aos quais se aplica o disposto no artigo 12.o, no segundo parágrafo do artigo 13.o e no artigo 14.o do Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades das Comunidades (JO L 74, p. 1), tal como alterado pelo Regulamento (CE, CECA, Euratom) n.o 1198/98 do Conselho, de 5 de junho de 1998 (JO L 166, p. 3). Cumpre precisar que, no estado atual do direito da União, se trata dos artigos 11.°, 12.°, segundo parágrafo, e 13.°, do protocolo relativo aos privilégios e imunidades.

( 37 ) Trata-se, designadamente das prestações de que o agente pode beneficiar enquanto ex-membro de um sistema de segurança social ou sucessor desse membro.

( 38 ) V., designadamente, artigos 67.° e 68.° do Estatuto dos funcionários europeus.

( 39 ) V., quanto a estes objetivos, acórdão de 16 de dezembro de 1960, Humblet/Estado belga, 6/60, Recueil, pp. 1125, 1157, Colet.,1954-1961, p. 545). V. igualmente n.o 30 e jurisprudência aí referida das conclusões do advogado-geral P. Cruz Villalón no processo Bourges-Maunoury e Heintz (cônjuge de M. Bourges-Maunoury) (C-558/10, pendente no Tribunal de Justiça).

( 40 ) No que respeita à prestação de invalidez, as disposições das CDE parecem-me pouco claras.

( 41 ) A título exemplificativo, observe-se que decorre dos autos remetidos ao Tribunal de Justiça que o seguro de dependência previsto pela legislação nacional alemã constitui um desses sistemas no qual os agentes do BCE se podem inscrever voluntariamente. No que respeita aos pormenores do regime alemão do seguro de dependência, V. acórdão de 8 de julho de 2004, Gaumann-Cerri e Barth (C-502/01 e C-31/02, Colet., p. I-6483, n.os 3 a 7).

( 42 ) Nos termos do artigo 51.o da referida Carta, as disposições da mesma têm por destinatários a União, bem como os Estados-Membros, apenas quando apliquem o direito da União. Além disso, como decorre do preâmbulo desta Carta, a mesma não cria novos direitos, mas reafirma os direitos que decorrem, nomeadamente, das tradições constitucionais e das obrigações internacionais comuns aos Estados-Membros. Neste contexto, cumpre, pois, interpretar as disposições do direito da União em conformidade com as disposições da referida Carta.

( 43 ) Saliente-se que essa interpretação conduziria a uma situação pouco satisfatória na medida em que os agentes do BCE participantes no «Graduate Programme», em caso de desemprego, não teriam direito ao subsídio de desemprego atribuído com base no regime nacional de segurança social pertinente, mesmo não beneficiando de prestações deste tipo atribuídas pelo BCE nos termos do disposto no anexo IIa das CDE.

( 44 ) Neste contexto, saliente-se igualmente que, diversamente do presente processo, os acórdãos de 16 de dezembro de 2004, My (C-293/03, Colet., p. I-12013), e de 16 de fevereiro de 2006, Öberg (C-185/04, Colet., p. I-1453), referidos pelo órgão jurisdicional de reenvio são relativos a situações em que o interessado tinha cessado funções numa instituição da União.

( 45 ) V. acórdão Bosmann, já referido (n.o 31). V. designadamente, no que respeita à legislação aplicável em matéria de segurança social, acórdãos de 12 de junho de 1986, Ten Holder (302/84, Colet., p. 1821, n.os 19 a 21), e de 11de novembro de 2004, Adanez-Vega (C-372/02, Colet., p. I-10761, n.o 18). V. igualmente acórdão de 16 de julho de 2009, von Chamier-Glisczinski (C-208/07, Colet., p. I-6095, n.os 55 e 56) e n.o 55 das conclusões do advogado-geral J. Mazák nos processos apensos Hudzinski e Wawrzyniak (C-611/10 e C-612/10, pendentes no Tribunal de Justiça).

( 46 ) As condições de emprego aplicáveis aos trabalhadores temporários são reguladas pelo anexo IIb das CDE, que prevê unicamente essa cobertura limitada na parte intitulada «Segurança Social» do referido anexo.