CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 22 de março de 2012 ( 1 )

Processo C-583/10

Estados Unidos da América

contra

Christine Nolan

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) (Reino Unido)]

«Diretiva 98/59/CE — Admissibilidade — Proteção dos trabalhadores — Despedimentos coletivos — Informação e consulta dos trabalhadores — Encerramento de uma base militar americana — Âmbito de aplicação — Momento da obrigação de consulta»

I — Introdução

1.

Pelo presente pedido de decisão prejudicial, a Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) (Reino Unido) solicitou esclarecimentos sobre o momento da obrigação de consulta dos representantes dos trabalhadores no contexto de um despedimento coletivo previsto por um empregador, ao abrigo da Diretiva 98/59 do Conselho de 20 de julho de 1998 relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos despedimentos coletivos ( 2 ).

2.

Este pedido foi submetido no âmbito de um litígio que opõe os Estados Unidos da América a C. Nolan, uma empregada civil de uma base militar americana situada no Reino Unido, relativamente à obrigação de proceder atempadamente a consultas do pessoal civil dessa base antes de proceder aos despedimentos coletivos ocorridos no dia 30 de junho de 2006, em conformidade com o Trade Union and Labour Relations (Consolidation) Act 1992, que transpôs a Diretiva 98/59 para o direito nacional ( 3 ).

3.

Mais concretamente, decorre das informações comunicadas pelo órgão jurisdicional de reenvio que a decisão de encerrar a base militar a partir do mês de setembro de 2006 foi tomada pelo Secretary of the US Army, e aprovada pelo Secretary of Defence antes do dia 13 de março de 2006. Essa decisão foi comunicada informalmente às autoridades militares britânicas em abril de 2006 e tornada pública pelos meios de comunicação social em 21 de abril de 2006. Em 24 de abril de 2006, o oficial que comandava a base convidou o pessoal para uma reunião destinada a explicar a decisão de encerrar a base e a apresentar desculpas pela forma como o encerramento tinha sido anunciado ao público.

4.

O Governo do Reino Unido foi oficialmente informado no dia 9 de maio que a base seria restituída ao Reino Unido no dia 30 de setembro de 2006.

5.

Em junho de 2006, as autoridades americanas entregaram aos representantes do pessoal civil da base militar um memorando referindo que todos os membros desse pessoal, isto é, cerca de 200 trabalhadores, seriam despedidos. Numa reunião ocorrida no dia 14 de junho de 2006, as autoridades americanas informaram os representantes do pessoal que consideravam que a data do início das consultas se tinha iniciado no dia 5 de junho de 2006.

6.

A decisão formal de rescindir os contratos de trabalho foi tomada no quartel general das forças armadas americanas na Europa, situado em Mannheim (Alemanha). Foram enviadas cartas de despedimento no dia 30 de junho de 2006, indicando os dias 29 e 30 de setembro de 2006 como datas do fim do vínculo laboral.

7.

Foi nestas circunstâncias que C. Nolan, uma representante dos membros do pessoal afetados, propôs uma ação de indemnização contra os Estados Unidos no Southampton Employment Tribunal, que julgou procedente o pedido ao declarar nomeadamente que o empregador não tinha consultado atempadamente os representantes dos trabalhadores, não tendo explicado por que razões essas consultas tinham sido atrasadas até ao dia 5 de junho de 2006, sem poderem ter sido iniciadas antes da decisão de 13 de março de 2006 ou, de todo o modo, a partir do dia 24 de abril de 2006, ou ainda a partir da informação oficial de 9 de maio de 2006. Este órgão jurisdicional deu igualmente provimento ao pedido de indemnização apresentado por C. Nolan.

8.

O recurso interposto pelos Estados Unidos da América no Employment Appeal Tribunal foi julgado improcedente.

9.

Os Estados Unidos recorreram então para a Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) (Reino Unido).

10.

Considerando os argumentos apresentados pelos Estados Unidos da América, já invocados no Employment Appeal Tribunal, a Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) (Reino Unido) decidiu que estes deveriam ser julgados improcedentes. Contudo, tendo sido igualmente solicitado a pronunciar-se sobre um fundamento respeitante ao alcance do acórdão do Tribunal de Justiça Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o. ( 4 ) (a seguir «acórdão Akavan»), proferido depois da decisão do Employment Appeal Tribunal, o órgão jurisdicional de reenvio estimou que esse acórdão suscitava determinadas dúvidas sobre a interpretação das disposições da Diretiva 98/95, que devem ser esclarecidas antes de proferir a sua decisão.

11.

Foi nestas circunstâncias que o órgão jurisdicional de reenvio decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«A obrigação de consulta, por parte do empregador, sobre o despedimento coletivo, prevista na Diretiva 98/59/CE, constitui-se i) quando o empregador propõe, sem que ainda a tenha tomado, uma decisão estratégica comercial ou operacional que conduza, previsível ou inevitavelmente, a despedimentos coletivos; ou ii) apenas quando essa decisão for efetivamente tomada e o empregador propuser, então, os consequentes despedimentos coletivos?».

12.

Foram apresentadas observações escritas por C. Nolan, pela Comissão Europeia e pelo Órgão de Fiscalização da EFTA. Estas partes interessadas foram igualmente ouvidas na audiência que ocorreu no dia 18 de janeiro de 2012.

II — Análise

A — Quanto à aplicabilidade da Diretiva 98/59 e à competência do Tribunal de Justiça para responder à questão submetida

13.

Embora a Comissão tenha proposto que se responda à questão colocada, manifestou no entanto dúvidas, mesmo reservas, quanto à aplicabilidade da Diretiva 98/59 nos casos de despedimentos coletivos numa base militar, ainda mais quando esse estabelecimento, embora situado no território de um Estado-Membro, releva da autoridade de um Estado terceiro. Nas suas observações escritas, essa parte interessada fundamentou as suas dúvidas no artigo 1.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 98/59, que exclui do seu campo de aplicação os trabalhadores das Administrações Públicas ou dos estabelecimentos de direito público (ou, nos Estados-Membros que não reconhecem esta noção, as entidades equivalentes) que ela estima poderem estender-se às bases militares. Em resposta a uma questão escrita colocada pelo Tribunal de Justiça, e na audiência, a Comissão alegou que, de qualquer forma, aplicar a Diretiva 98/59 numa situação como a do processo principal, carecia de efeitos práticos, porquanto as razões que conduziram um Estado terceiro a decidir encerrar um estabelecimento militar fazem parte do exercício do jus imperii. Por conseguinte, tais razões não podem ser objeto de consultas prévias com os representantes dos trabalhadores. Na sua resposta à mesma questão escrita, os Estados Unidos partilham, no essencial, dessa opinião.

14.

Estas observações não são totalmente desprovidas de fundamento e eu compreendo perfeitamente, em especial, o interesse jurídico, de natureza geral, em determinar o verdadeiro alcance do artigo 1.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 98/59, disposição que o Tribunal de Justiça ainda não teve, até agora, oportunidade de interpretar.

15.

No entanto, não me parece minimamente necessário, nem mesmo oportuno, entrar neste debate para concluir pela competência do Tribunal de Justiça para responder à questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio à luz de todas as circunstâncias do presente processo.

16.

Importa recordar, a este respeito, que a Diretiva 98/59 apenas procedeu a uma harmonização parcial das regras de proteção dos trabalhadores em caso de despedimentos coletivos ( 5 ), referindo explicitamente o seu artigo 5.o que a diretiva não prejudica a faculdade que os Estados-Membros têm de aplicar ou de introduzir disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis aos trabalhadores.

17.

Os Estados-Membros conservam dessa forma a faculdade de aplicar regras nacionais de proteção dos trabalhadores em caso de despedimento coletivo a situações que não são abrangidas stricto sensu pelas disposições da Diretiva 98/59. Assim, nos termos do artigo 5.o da Diretiva 98/59, um Estado-Membro pode perfeitamente estender o âmbito de aplicação da proteção conferida aos trabalhadores em caso de despedimentos coletivos aos trabalhadores das Administrações Públicas ou dos estabelecimentos de direito público, no sentido do artigo 1.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 98/59.

18.

Tal parece, aliás, ter sido a conduta seguida pelo legislador do reino Unido ao transpor a Diretiva 98/59, tal como o Employment Appeal Tribunal e o órgão jurisdicional de reenvio o realçaram nas respetivas decisões.

19.

De facto, por um lado, decorre da fundamentação da decisão do primeiro dos órgãos jurisdicionais referidos, em particular dos n.os 71 e 84, tal como foram citados por C. Nolan e pelo Órgão de Fiscalização da EFTA nas respetivas respostas à questão colocada pelo Tribunal de Justiça, que o Reino Unido optou, nos termos do artigo 5.o da Diretiva 98/59, por não excluir do campo de aplicação desta última os organismos enumerados no 1.°, n.o 2, alínea b), da referida diretiva.

20.

Por outro lado, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o único caso pertinente em que o empregador pode ser exonerado do cumprimento das obrigações de consulta previstas pelo artigo 188.o do Trade Union and Labour Relations (Consolidation) Act 1992 é aquele, previsto no n.o 7 desse mesmo artigo, em que esse empregador pode demonstrar a existência de circunstâncias particulares que já não tornam o cumprimento dessas obrigações «razoavelmente exequível». O órgão jurisdicional de reenvio realçou que os Estados Unidos da América não invocaram, no entanto, essa derrogação no processo principal ( 6 ).

21.

Além disso, nenhum desses órgãos jurisdicionais considerou que a situação dos trabalhadores civis de um estabelecimento militar de um país terceiro situado no Reino Unido poderia ser excluída do âmbito de aplicação do artigo 188.o do Trade Union and Labour Relations (Consolidation) Act 1992 em virtude de outras exclusões específicas previstas nessa legislação, tais como as previstas nos seus artigos 273.°, n.o 2, e 274.°, a respeito dos membros do pessoal da coroa britânica («Crown employment»). Relativamente à repartição das funções jurisdicionais entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, prevista no artigo 267.o TFUE, não cabe a este último questionar a aplicação que foi feita do direito nacional num caso concreto.

22.

Por último, o órgão jurisdicional de reenvio realçou igualmente que a questão da imunidade do Estado, que foi tardiamente invocada pelos Estados Unidos da América no Southampton Employment Tribunal devido ao facto de apenas ter sido suscitada no âmbito do pedido de indemnização de C. Nolan, e não anteriormente no decurso da ação de indemnização, não era objeto do recurso interposto que devia dirimir ( 7 ) e não podia, em qualquer caso, ser apreciada independentemente da cláusula de derrogação prevista no artigo 188.o, n.o 7, do Trade Union and Labour Relations (Consolidation) Act 1992, não invocada no processo principal ( 8 ). Desta forma, decorre claramente dos autos que a aplicação da obrigação de consulta dos representantes dos trabalhadores, prevista na legislação britânica que transpôs a Diretiva 98/95, não é de todo desprovida de efeitos nas circunstâncias como as do processo principal ( 9 ).

23.

Daí decorre que, partindo do princípio que o estatuto de um estabelecimento militar, que além de pertencer a um Estado terceiro, pode ser equiparado ao de uma Administração Pública no sentido do artigo 1.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 98/59, o legislador do Reino Unido entendeu incluir no campo de aplicação pessoal do Trade Union and Labour Relations (Consolidation) Act 1992, situações não abrangidas pela Diretiva 98/59, aplicando, para solucionar essas situações, o regime previsto pela diretiva, concretamente, a obrigação de o empregador antes do despedimento e atempadamente consultar os representantes dos trabalhadores.

24.

Ora, constitui jurisprudência bem assente que, no caso em que uma legislação nacional atenda, para solucionar situações puramente internas, as previstas pelo direito da União, o Tribunal de Justiça é competente para se pronunciar sobre as questões submetidas pelo órgão jurisdicional nacional relativamente à interpretação das disposições ou dos conceitos do direito da União por forma a assegurar uma interpretação uniforme, independentemente das condições em que essas disposições devem ser aplicadas ( 10 ).

25.

Esta solução foi efetivamente adotada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Rodrigues Maior e o. ( 11 ), num pedido de decisão prejudicial que dizia respeito à interpretação da Diretiva 98/59 num contexto em que o legislador nacional decidiu incluir no conceito de despedimentos coletivos casos de cessação das relações de trabalho não abrangidos pela Diretiva 98/59 e excluindo desse conceito o caso submetido a esse órgão jurisdicional nacional, mas que este último considerava dever ser abrangido por esse conceito ( 12 ).

26.

Não vejo, a fortiori, que considerações poderiam conduzir o Tribunal de Justiça a optar por uma linha de raciocínio diferente no presente processo.

27.

Além disso, nenhum elemento do presente processo permite pressupor que o órgão jurisdicional de reenvio dispõe da faculdade de se afastar da interpretação que o Tribunal de Justiça faz das disposições da Diretiva 98/59 ( 13 ). Em vez disso, o órgão jurisdicional de reenvio alegou por diversas vezes que o seu dever é interpretar o artigo 188.o do Trade Union and Labour Relations (Consolidation) Act 1992, na medida do possível, em conformidade com a Diretiva 98/59, tal como interpretada pelo Tribunal de Justiça ( 14 ).

28.

Nessas circunstâncias, proponho que o Tribunal de Justiça declare que deve responder à questão colocada.

B — Quanto à questão prejudicial

29.

É pedido ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a questão da determinação do momento da obrigação de consulta prévia que incumbe ao empregador em caso de despedimento coletivo.

30.

Mais concretamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se essa obrigação nasce quando o empregador preconiza tomar uma decisão estratégica comercial ou operacional que conduzirá, previsível ou inevitavelmente, a despedimentos coletivos ou apenas quando essa decisão for efetivamente tomada e o empregador propuser, então, os consequentes despedimentos coletivos.

31.

C. Nolan considera que apenas a primeira alternativa permite preservar o efeito útil da Diretiva 98/59, a Comissão e o Órgão de Fiscalização da EFTA adotam uma posição mais variada. Estas estimam, no essencial, nomeadamente à luz do acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., já referido, e considerando os factos do processo principal, que a obrigação de o empregador proceder a consultas relativamente aos despedimentos coletivos nasce quando é tomada uma decisão estratégica ou comercial que o obriga a prever ou a projetar despedimentos coletivos.

32.

Subscrevo igualmente essa interpretação da Diretiva 98/59.

33.

Convém recordar, antes de mais, que, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 98/59, sempre que tenciona efetuar despedimentos coletivos, a entidade patronal é obrigada a consultar em tempo útil os representantes dos trabalhadores, com o objetivo de chegar a um acordo.

34.

Nos termos do n.o 2 desse mesmo artigo, essas consultas incidirão, pelo menos, sobre as possibilidades de evitar ou de reduzir os despedimentos coletivos, bem como sobre os meios de atenuar as suas consequências recorrendo a medidas sociais de acompanhamento destinadas, nomeadamente, a auxiliar a reintegração ou reconversão dos trabalhadores despedidos.

35.

As obrigações que incumbem ao empregador nos termos da Diretiva 98/59 devem assim constituir-se num momento em que ainda é possível preservar o efeito útil dessas consultas, em especial a possibilidade de evitar ou de reduzir os despedimentos coletivos ou, pelo menos, atenuar as consequências ( 15 ). Essa consulta não pode assim ser desencadeada demasiado tarde. Tal seria o caso se o empregador iniciasse as consultas após a decisão de rescindir os contratos de trabalho ( 16 ).

36.

Daí decorre, como foi já decidido pelo Tribunal de Justiça, nomeadamente no n.o 41 do acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., já referido, a obrigação de consulta prevista no referido artigo 2.o é considerada constituir-se quando a entidade patronal tenciona efetuar um despedimento coletivo ou elabora um projeto de despedimento coletivo ( 17 ).

37.

Nesse mesmo acórdão, ao qual o órgão jurisdicional de reenvio se refere extensivamente, o Tribunal de Justiça teve igualmente ocasião de precisar o alcance das obrigações de consulta que incumbem ao empregador numa situação de grupo de empresas e na qual a perspetiva de um despedimento coletivo não era uma escolha direta do empregador, mas de uma empresa que o controla, tal como previsto no artigo 2.o, n.o 4, da Diretiva 98/59 ( 18 ).

38.

Como decorre da fundamentação seguida pelo Tribunal de Justiça nesse acórdão, este estava perfeitamente ciente que este tipo de situação necessitava, especialmente, de proceder com cuidado na determinação do momento da obrigação de consulta.

39.

Antes de mais, o Tribunal de Justiça sublinhou nesse acórdão que a obrigação de consulta não pode ser acionada prematuramente. Assim, informando as preocupações expressas pelo Governo do Reino Unido nesse processo, o Tribunal de Justiça referiu, no n.o 45, que a constituição precoce da obrigação de consulta poderia conduzir a resultados contrários ao objetivo da Diretiva 98/59, designadamente a restrições à flexibilidade das empresas quanto à sua reestruturação, a um aumento dos encargos administrativos e à incitação inútil dos trabalhadores a preocuparem-se com a segurança do seu emprego. Ainda a respeito do nascimento precoce das consultas com os representantes dos trabalhadores, o Tribunal de Justiça acrescentou, no essencial, no n.o 46 do mesmo acórdão, que a razão de ser e a eficácia das consultas exigem que sejam fixados os fatores a ter em conta durante as mesmas, o que não pode ser alcançado se esses fatores não são conhecidos.

40.

Em seguida, o Tribunal de Justiça recordou que a obrigação de consulta prevista no artigo 2.o da Diretiva 98/59 também não podia ser desencadeada tardiamente. De facto, no âmbito da adoção de uma decisão estratégica ou comercial por uma empresa que controla o empregador, o Tribunal de Justiça decidiu, no n.o 47 do acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., que uma consulta que começasse após a tomada de uma decisão que tornasse necessários tais despedimentos coletivos já não poderia utilmente incidir sobre o exame de alternativas possíveis para evitá-los. O Tribunal de Justiça concluiu, no n.o 48 desse mesmo acórdão, que a obrigação de consulta dos representantes dos trabalhadores constitui-se no seio de um grupo de empresas no momento em que tenha sido adotada uma decisão estratégica ou comercial que o leve a considerar ou a projetar despedimentos coletivos.

41.

Em resumo, ou a perspetiva de um despedimento coletivo resulta diretamente da escolha do empregador, caso em que, em conformidade com o n.o 41 do acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., já referido, o desencadear da obrigação de consulta se produz quando o empregador tenciona efetuar um despedimento coletivo ou elabora um projeto de despedimento, ou a perspetiva de um despedimento não resulta diretamente da decisão do referido empregador, mas antes de outra entidade associada, caso em que, em conformidade com o n.o 48 desse mesmo acórdão, a obrigação de consulta do empregador nasce no momento em que essa outra entidade tenha adotado uma decisão estratégica ou comercial que obriga o empregador a considerar ou a projetar despedimentos coletivos.

42.

Eu acrescento, ainda que tal já resulte implicitamente dos parágrafos precedentes das presentes conclusões, que decorre do referido acórdão, que, numa situação em que uma filial de um grupo de empresas tem a qualidade de «empregador», no sentido da Diretiva 98/59, cumpre sempre a esta última realizar consultas com os representantes dos seus trabalhadores, independentemente do facto de os despedimentos coletivos serem considerados ou projetados na sequência de uma decisão (estratégica ou comercial) da sua sociedade-mãe ( 19 ). Contudo, para alcançar os objetivos atribuídos às consultas com os representantes dos trabalhadores, é necessário, em tal caso, que tenha sido previamente identificada a filial em que estão previstos os despedimentos coletivos ( 20 ). Por último, o Tribunal de Justiça também precisou que a sociedade-mãe só pode tomar uma decisão que tenha por efeito direto obrigar uma das suas filiais a rescindir os contratos dos trabalhadores afetados por um despedimento coletivo no termo do processo de consulta levado a cabo nessa filial, sob pena de sujeitar esta última, enquanto empregadora, às consequências do incumprimento desse processo ( 21 ).

43.

No processo principal, importa realçar que o estabelecimento militar em que foram previstos os despedimentos coletivos foi corretamente identificado, mas o órgão jurisdicional de reenvio não precisou qual das entidades mencionadas na decisão de reenvio (comando do estabelecimento militar, quartel general das forças armadas norte americanas na Europa sedeada em Mannheim, que enviou as cartas de despedimento, ou mesmo, ainda que de forma improvável, o Secretary of the US Army) deve ser considerada como possuindo a qualidade de «empregador», ao qual incumbia a obrigação de consulta, nos termos da Diretiva 98/59 e do Trade Union and Labour Relations (Consolidation) Act 1992.

44.

A explicação parece residir num conceito algo vago de «empregador» no processo principal, segundo o qual designa, de forma geral, as forças armadas dos Estados Unidos da América, conceito que talvez não seja estranho às dificuldades que o órgão jurisdicional de reenvio encontra para interpretar as obrigações que incumbem ao referido empregador. De facto, ao reler-se a questão prejudicial submetida, à luz dos factos tal como são expostos pelo órgão jurisdicional de reenvio, esta parece designar sob a denominação de «empregador» entidades diferentes. Assim, «o empregador [que] propõe, sem que ainda a tenha tomado, uma decisão estratégica comercial ou operacional», previsto na alínea i) da referida questão, não é, muito provavelmente, a mesma entidade que o «empregador» que «propuser [...] os consequentes despedimentos coletivos», referido na alínea ii).

45.

No entanto, resulta de forma suficientemente clara da decisão de reenvio, ao contrário do que alegaram a Comissão e a autoridade de fiscalização da AELE nas suas observações escritas, que o processo principal se insere no segundo caso referido no n.o 41 das presentes conclusões, ou seja, corresponde a uma situação em que o empregador — a saber, provavelmente, ou o comandante do estabelecimento ou o quartel general do United States Army Europe (Usareur) do chefe de estado- maior adjunto em Mannheim — não está diretamente na origem dos despedimento coletivos previstos, mas de que estes últimos resultam, como foi salientado pelo órgão jurisdicional de reenvio, de uma decisão adotada a um «nível bem mais elevado» do que o comando local ( 22 ).

46.

De facto, não penso, à luz da escolha efetuada pelo legislador do Reino Unido quando da transposição da Diretiva 98/59 no território desse Estado-Membro, que exista um obstáculo à aplicação da fundamentação efetuada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o, já referido, a respeito das obrigações de consulta que incumbem a uma filial que tem a qualidade de empregador, no sentido da referida diretiva, na sequência de uma decisão estratégica ou comercial da sua sociedade-mãe, à situação de um estabelecimento militar cujo despedimento coletivo dos seus trabalhadores civis se prevê na sequência de uma decisão de restruturação das atividades militares tomada a um nível mais alto da hierarquia que culmina no encerramento do referido estabelecimento.

47.

Nesta fase, e relativamente à segunda hipótese prevista no n.o 41 das presentes conclusões, a única questão que resta é a de saber se, no processo principal, foi adotada uma decisão estratégica pelo empregador de preconizar ou de projetar despedimentos coletivos.

48.

A repartição de competências entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais que caracteriza o processo de reenvio prejudicial implica, evidentemente, que compete ao órgão jurisdicional de reenvio proceder a essa verificação. Este último deve assim verificar, à luz do critério indicado anteriormente, como decidiram, no essencial, os órgãos jurisdicionais nacionais, se as consultas iniciadas em 5 de junho de 2006, foram desencadeadas tardiamente, no sentido de que não conseguiram cumprir o objetivo previsto pela Diretiva 98/59 e pela legislação do Reino Unido que o transpôs.

49.

A este respeito, de um ponto de vista metodológico, o órgão jurisdicional de reenvio deverá, em minha opinião, identificar qual dos eventos mencionados na decisão de reenvio anteriores a 5 de junho de 2006 constitui uma decisão estratégica, e é vinculativa para o empregador para efeitos da aplicação da obrigação de consulta, bem como o momento em que essa decisão foi adotada.

50.

Ultrapassada essa fase, o órgão jurisdicional de reenvio pode determinar se as consultas com os representantes dos trabalhadores do estabelecimento militar de 5 de junho de 2006 foram desencadeadas em «tempo útil», no sentido do artigo 2.o da Diretiva 98/59 e do artigo 188.o do Trade Union and Labour Relations (Consolidation) Act 1992.

51.

Esta resposta implica, à luz dos factos do processo principal, que nenhuma das duas alternativas previstas na questão prejudicial deve ser privilegiada. De facto, as consultas seriam precoces se, como se sugere na primeira alternativa, incumbisse ao empregador desencadeá-las mesmo antes de ter sido tomada qualquer «decisão estratégica comercial ou operacional». Por outras palavras, o que interessa é saber se, quando essa decisão foi tomada, esta obriga o empregador a prever despedimentos coletivos ou não. Pelo contrário, o desencadeamento das consultas seria tardio se essa decisão estratégica tivesse sido tomada sem deixar qualquer margem de manobra ao empregador que lhe permita prever os despedimentos coletivos, dado que esse desencadeamento ocorre, como decorre da cronologia dos eventos na origem do processo principal recordada na decisão de reenvio, várias semanas depois da adoção da referida decisão.

52.

Assim, tendo em conta os factos do processo principal, proponho que o Tribunal de Justiça responda à questão prejudicial do seguinte modo: a Diretiva 98/59 deve ser interpretada no sentido de que a obrigação de consulta, por parte de um empregador, dos representantes dos trabalhadores nasce quando uma decisão estratégica comercial ou operacional que o obriga a ponderar ou a projetar despedimentos coletivos foi adotada por um órgão ou uma entidade que o controla. Cumpre ao órgão jurisdicional de reenvio identificar, à luz dos factos que estão na origem do processo principal, qual dos eventos mencionados na decisão de reenvio, anteriores ao dia do início efetivo das consultas aos trabalhadores do estabelecimento em causa, constitui uma decisão estratégica, vinculativa para o empregador para efeitos da aplicação da obrigação de consulta, bem como o momento em que essa decisão foi adotada.

III — Conclusão

53.

Por todos os fundamentos expostos, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à questão prejudicial apresentada pela Court of Appeal (England & Wales) (Civil Division) (Reino Unido) do seguinte modo:

«A Diretiva 98/59/CE do Conselho, de 20 de julho de 1998, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos despedimentos coletivos, deve ser interpretada no sentido de que a obrigação de consulta, por parte do empregador, dos representantes dos trabalhadores nasce quando um organismo ou uma entidade que controla o empregador toma uma decisão estratégica comercial ou operacional que o obriga a prever ou a projetar despedimentos coletivos.

Compete ao órgão jurisdicional de reenvio identificar, à luz dos factos que estão na origem do processo principal, qual dos eventos mencionados na decisão de reenvio, anteriores ao dia do início efetivo das consultas aos trabalhadores do estabelecimento em causa, constitui uma decisão estratégica, vinculativa para o empregador para efeitos da aplicação da obrigação de consulta, bem como o momento em que essa decisão foi adotada.»


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) JO L 225, p. 16.

( 3 ) A diferença de data entre o ato de transposição no Reino Unido (1992) e a adoção da Diretiva 98/95 (1998) explica-se pelo facto de esta última apenas constituir a «codificação» da Diretiva 75/129/CEE do Conselho, de 17 de fevereiro de 1975, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos despedimentos coletivos (JO L 48, p. 29; EE 05 F2 p. 54), alterada pela Diretiva 92/56/CEE do Conselho de 24 de junho de 1992 (JO L 245, p. 3).

( 4 ) Acórdão de 10 de setembro de 2009, C-44/08 (Colet., p. I-8163).

( 5 ) V., relativamente à Diretiva 75/129, alterada pela Diretiva 92/56, o acórdão de 8 de junho de 1994, Comissão/Reino Unido (C-383/92, Colet., p. I-2479, n.o 25), e, relativamente à Diretiva 98/59, acórdão de 16 de julho de 2009, Mono Car Styling (C-12/08, Colet., p. I-6653, n.o 35), e acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., já referido (n. 60).

( 6 ) V. n.o 42 da decisão de reenvio. A compatibilidade dessa cláusula de exoneração com as disposições da Diretiva 98/95 não é objeto do presente processo.

( 7 ) V. n.o 29 da decisão de reenvio.

( 8 ) V. n.o 42 da decisão de reenvio.

( 9 ) Além disso, mesmo limitando-me à Diretiva 98/59, não partilho da opinião da Comissão segundo a qual a aplicação desta diretiva seria destituída de qualquer efeito prático pelo facto de os representantes dos trabalhadores não poderem, de qualquer forma, ser consultados quantos aos motivos que conduziram ao encerramento pelos Estados Unidos de um dos seus estabelecimentos militares. De facto, convém lembrar que, nos termos do artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva 98/59, as consultas incidirão não apenas sobre as possibilidades de evitar ou de reduzir os despedimentos colectivos, mas também sobre os meios de atenuar as suas consequências. Por conseguinte, a aplicação desta diretiva pode ter um efeito parcial significativo.

( 10 ) V., nesse sentido, nomeadamente, acórdãos de 18 de outubro de 1990, Dzodzi (C-297/88 e C-197/89 Colet., p. I-3763, n.o 37), de 15 de janeiro de 2002, Andersen og Jensen (C-43/00, Colet., p. I-379, n.o 18), de 16 de março de 2006, Poseidon Chartering (C-3/04, Colet., p. I-2505, n.o 16), de 28 de outubro de 2010, Volvo Car Germany (C-203/09, Colet., p. I-10721, n.o 25) e de 31 de março de 2011, Aurubis Balgaria (C-546/09, Colet., p. I-2531, n.o 24).

( 11 ) Acórdão de 10 de dezembro de 2009 (C-323/08, Colet., p. I-11621, n.o 27).

( 12 ) Acórdão de 10 de dezembro de 2009 (C-323/08, Colet., p. I-11621, n.o 27).

( 13 ) V., nesse sentido, acórdãos, já referidos, Poseidon Chatering (n.o 18) e Volvo Car Germany (n.o 27).

( 14 ) V., a título de exemplo, n.os 45 e 60 da decisão de reenvio.

( 15 ) V., nesse sentido, acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., já referido (n.o 38).

( 16 ) V., nesse sentido, acórdão de 27 de janeiro de 2005, Junk (C-188/03, Colet., p. I-885, n.os 36 e 37), e acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., já referido (n.o 38).

( 17 ) Acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., já referido (n.o 41 e jurisprudência referida).

( 18 ) Este artigo dispõe: «[a]s obrigações previstas nos n.os 1, 2 e 3 são aplicáveis independentemente de a decisão dos despedimentos coletivos ser tomada pelo empregador ou por uma empresa que o controle».

( 19 ) V. acórdão Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., já referido (n.o 62).

( 20 ) Idem (n.o 64).

( 21 ) Idem (n.o 71).

( 22 ) V. o memorando de comando do estabelecimento militar referido no n.o 21 da decisão de reenvio.