YVES BOT
apresentadas em 15 de maio de 2012 ( 1 )
Processos apensos C-581/10 e C-629/10
Emeka Nelson,
Bill Chinazo Nelson,
Brian Cheimezie Nelson (C-581/10)
contra
Deutsche Lufthansa AG
[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Amtsgericht Köln (Alemanha)]
e
TUI Travel plc,
British Airways plc,
easyJet Airline Co. Ltd,
International Air Transport Association,
The Queen (C-629/10)
contra
Civil Aviation Authority
[pedido de decisão prejudicial apresentado pela High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court) (Reino Unido)]
«Transporte — Regras comuns para a indemnização e a assistência aos passageiros em caso de recusa de embarque e de cancelamento ou atraso considerável de um voo — Direito a indemnização em caso de atraso de um voo — Compatibilidade deste direito com a Convenção de Montreal»
1. |
Os presentes processos têm por objeto a interpretação e a validade dos artigos 5.°, 6.° e 7.° do Regulamento (CE) n.o 261/2004 ( 2 ). |
2. |
Com as questões submetidas ao Tribunal de Justiça, o Amtsgericht Köln (Alemanha) e a High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court) (Reino Unido), pretendem saber, na realidade, se o Tribunal de Justiça confirma a interpretação que fez destas disposições no seu acórdão de 19 de novembro de 2009, Sturgeon e o. ( 3 ), segundo a qual os passageiros de voos atrasados podem ser equiparados aos passageiros de voos cancelados para efeitos da aplicação do direito a indemnização, podendo, por conseguinte, invocar o direito a indemnização previsto no artigo 7.o do Regulamento n.o 261/2004, quando o tempo que perderam por causa de um voo atrasado seja igual ou superior a três horas, isto é, quando chegam ao destino final três ou mais horas após a hora de chegada inicialmente prevista pela transportadora aérea ( 4 ). |
3. |
Nas presentes conclusões, proponho que o Tribunal de Justiça confirme esta interpretação e que decida que os artigos 5.°, 6.° e 7.° deste regulamento são compatíveis com a Convenção para a Unificação de certas Regras relativas ao Transporte Aéreo Internacional, assinada em Montreal em 9 de dezembro de 1999 ( 5 ) e com os princípios da proporcionalidade e da segurança jurídica. |
I — Quadro jurídico
A — Regulamentação internacional
4. |
A Convenção de Montreal foi aprovada em nome da Comunidade Europeia pela Decisão 2001/539/CE ( 6 ) e entrou em vigor, no que respeita à União Europeia, em 28 de junho de 2004. |
5. |
O artigo 19.o da Convenção de Montreal prevê que a transportadora aérea é responsável pelo dano resultante de atraso no transporte aéreo de passageiros, bagagens ou mercadorias. Contudo, a transportadora não será responsável pelo dano resultante de atraso se provar que ela ou os seus trabalhadores ou agentes adotaram todas as medidas que poderiam razoavelmente ser exigidas para evitar o dano ou que lhes era impossível tomar tais medidas. |
6. |
O artigo 29.o da Convenção de Montreal dispõe: «No transporte de passageiros, bagagens e mercadorias, as ações por danos, qualquer que seja o seu fundamento, quer este resida na presente convenção, em contrato, em ato ilícito ou em qualquer outra causa, só podem ser intentadas sob reserva das condições e limites de responsabilidade previstos na presente convenção, sem prejuízo da determinação de quais as pessoas com legitimidade para a ação e de quais os direitos que lhes assistem. Em tais ações, as transportadoras não podem ser condenadas no pagamento de indemnizações punitivas, exemplares ou outras indemnizações não compensatórias.» |
B — Regulamentação da União
7. |
O primeiro considerando do Regulamento n.o 261/2004 indica que a ação da Comunidade no domínio do transporte aéreo deve ter, entre outros, o objetivo de garantir um elevado nível de proteção dos passageiros. |
8. |
O décimo quarto considerando deste regulamento prevê que as obrigações a que estão sujeitas as transportadoras aéreas operadoras deverão ser limitadas ou eliminadas nos casos em que a ocorrência tenha sido causada por circunstâncias extraordinárias que não poderiam ter sido evitadas mesmo que tivessem sido tomadas todas as medidas razoáveis. Essas circunstâncias podem sobrevir, em especial, em caso de instabilidade política, condições meteorológicas incompatíveis com a realização do voo em causa, riscos de segurança, falhas inesperadas para a segurança do voo e greves que afetem o funcionamento da transportadora aérea. |
9. |
Nos termos do décimo quinto considerando do referido regulamento, deve-se considerar que existem circunstâncias extraordinárias sempre que o impacto de uma decisão de gestão do tráfego aéreo, relativa a uma determinada aeronave num determinado dia provoque um atraso considerável, um atraso de uma noite ou o cancelamento de um ou mais voos dessa aeronave, não obstante a transportadora aérea ter efetuado todos os esforços razoáveis para evitar atrasos ou cancelamentos. |
10. |
O artigo 5.o do Regulamento n.o 261/2004 tem o seguinte teor: «1. Em caso de cancelamento de um voo, os passageiros em causa têm direito a: […]
3. A transportadora aérea operadora não é obrigada a pagar uma indemnização nos termos do artigo 7.o, se puder provar que o cancelamento se ficou a dever a circunstâncias extraordinárias que não poderiam ter sido evitadas mesmo que tivessem sido tomadas todas as medidas razoáveis. […]» |
11. |
O artigo 6.o deste regulamento dispõe: «1. Quando tiver motivos razoáveis para prever que em relação à sua hora programada de partida um voo se vai atrasar:
a transportadora aérea operadora deve oferecer aos passageiros:
2. De qualquer modo, a assistência deve ser prestada dentro dos períodos fixados no presente artigo para cada ordem de distância.» |
12. |
O artigo 7.o do Regulamento n.o 261/2004, com a epígrafe «Direito a indemnização», prevê, no seu n.o 1, uma indemnização num valor forfetário, em função da distância do voo em causa. Assim, nos termos desta disposição, os passageiros devem receber uma indemnização no valor de 250 euros para todos os voos até 1500 quilómetros, de 400 euros para todos os voos intracomunitários com mais de 1500 quilómetros e para todos os outros voos entre 1500 e 3500 quilómetros e de 600 euros para todos os voos não abrangidos pelas categorias anteriores. |
II — Quadro factual dos litígios nos processos principais
A — Processo C-581/10
13. |
E. Nelson efetuou uma reserva para os seus dois filhos e para ele próprio no voo LH 565, Lagos-Frankfurt am Main, de 27 de março de 2008, às 22h50. Em 28 de março de 2008, cerca das 2 horas, este voo foi cancelado devido a uma falha técnica que afetava o sistema de direção do trem dianteiro da aeronave. E. Nelson e os seus dois filhos foram então alojados num hotel. Em 28 de março de 2008, às 16 horas, foram conduzidos do hotel para o aeroporto, dado que o avião tinha sido substituído por uma aeronave proveniente de Frankfurt am Main (Alemanha). O voo Lagos-Frankfurt am Main realizou-se, por fim, em 29 de março de 2008, à 1 hora. O órgão jurisdicional de reenvio precisou que este voo tinha o mesmo número de voo, a saber LH 565, e, praticamente os mesmos passageiros que tinham reserva para o voo de 27 de março de 2008. O avião aterrou em Frankfurt am Main, em 29 de março de 2008, às 7h10, com um atraso superior a 24 horas em relação à hora de chegada inicialmente prevista. |
14. |
E. Nelson considera que este atraso lhe confere o direito, bem como aos seus filhos, à indemnização prevista no artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento n.o 261/2004. Nestes termos, propôs uma ação no Amtsgericht Köln tendo por objeto a condenação da companhia aérea Deutsche Lufthansa AG no pagamento, a cada um deles, de um montante de 600 euros com fundamento no artigo 5.o, n.o 1, alínea c), deste regulamento e no artigo 7.o, n.o 1, do mesmo regulamento. |
15. |
A Deutsche Lufthansa AG considera que, uma vez que o voo foi efetuado, não se pode qualificar este voo de «cancelado» na aceção do Regulamento n.o 261/2004. No caso em apreço, está em causa, por conseguinte, um voo atrasado, para o qual este regulamento não prevê uma indemnização. |
16. |
Devido ao facto de se aguardar a decisão no âmbito dos processos apensos que deram lugar ao acórdão Sturgeon e o., já referido, o órgão jurisdicional de reenvio suspendeu a instância. A instância foi retomada após a prolação deste acórdão. Contudo, o órgão jurisdicional de reenvio tem ainda dúvidas quanto à compatibilidade do artigo 7.o do Regulamento n.o 261/2004, nos termos interpretados pelo Tribunal de Justiça no referido acórdão, com a Convenção de Montreal. Por conseguinte, decidiu suspender a instância e submeter questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça. |
B — Processo C-629/10
17. |
Este processo opõe a TUI Travel plc (a seguir, «TUI Travel»), a British Airways plc, a easyJet Airline Co. Ltd e a International Air Transport Association (Associação Internacional do Transporte Aéreo, a seguir, «IATA») à Civil Aviation Authority (Autoridade da Aviação Civil, a seguir «CAA»). |
18. |
A TUI Travel possui sete companhias aéreas, com sede em vários Estados-Membros. Estas companhias realizam essencialmente voos charter por conta da TUI Travel, cuja atividade principal é a organização de viagens e de circuitos turísticos. A IATA é um organismo comercial internacional que reúne cerca de 230 companhias aéreas que representam, por si próprias, 93% do tráfego internacional regular. |
19. |
O litígio no processo principal teve origem num pedido apresentado pelas recorrentes à CAA tendo por objeto que esta confirmasse que não interpretaria o Regulamento n.o 261/2004 no sentido de que impõe a obrigação de as companhias aéreas indemnizarem os passageiros em caso de atraso. A CAA recusou confirmar esta interpretação e indicou que estava vinculada pelo acórdão Sturgeon e o., já referido. As recorrentes recorreram então para a High Court of Justice (Chancery Division), High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division (Administrative Court). A High Court decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça uma série de questões prejudiciais. |
20. |
Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 30 de novembro de 2011, os processos C-581/10 e C-629/10 foram apensados para efeitos da fase oral e do acórdão. |
III — Questões prejudiciais
A — Processo C-581/10
21. |
O Amtsgericht Köln submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
|
B — Processo C-629/10
22. |
A High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court) submeteu as seguintes questões ao Tribunal de Justiça:
|
IV — Análise
A — Observações preliminares
23. |
Dado que algumas das questões suscitadas pelo Amtsgericht Köln e pela High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court) estão relacionadas entre si, proponho que o Tribunal de Justiça as aprecie da seguinte forma. |
24. |
Em primeiro lugar, o Amtsgericht Köln, com a sua terceira questão, e a High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court), com a sua primeira questão, pedem, na realidade, que o Tribunal de Justiça confirme a interpretação que deu aos artigos 5.°, 6.° e 7.° do Regulamento n.o 261/2004 no acórdão Sturgeon e o., já referido. |
25. |
Seguidamente, com a sua segunda questão, a High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court), questiona-se se, na hipótese de o Tribunal de Justiça rever a sua jurisprudência Sturgeon e o., já referida, os artigos 5.°, 6.° e 7.° deste regulamento são inválidos por violação do princípio da igualdade de tratamento. |
26. |
De seguida, a primeira e segunda questões submetidas pelo Amtsgericht Köln e a terceira questão submetida pela High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court), têm por objeto, no essencial, a compatibilidade dos artigos 5.°, 6.° e 7.° do referido regulamento com a Convenção de Montreal, na medida em que os passageiros de um voo atrasado podem requerer a indemnização prevista no artigo 7.o do Regulamento n.o 261/2004, bem como com o princípio da proporcionalidade e o princípio da segurança jurídica. |
27. |
Com a sua quarta questão, a High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court), pretende igualmente saber, no essencial, se o acórdão que o Tribunal de Justiça vier a proferir nos presentes processos deve ter efeitos limitados no tempo na hipótese de decidir que os artigos 5.°, 6.° e 7.° deste regulamento devem ser interpretados no sentido de que a transportadora aérea é obrigada a pagar uma indemnização ao passageiro de um voo atrasado. |
28. |
Por fim, se o Tribunal de Justiça considerar que estas disposições devem ser interpretadas no sentido de que a transportadora aérea não é obrigada a pagar uma indemnização ao passageiro de um voo atrasado, a High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court), com a sua quinta questão, questiona-se sobre o efeito que deve ser atribuído ao acórdão Sturgeon e o., já referido, entre 19 de novembro de 2009, data em que foi proferido, e a data da prolação do acórdão nos presentes processos. |
B — Quanto às questões prejudiciais
1. Quanto ao direito do passageiro dos transportes aéreos a indemnização em caso de atraso de um voo
29. |
O Tribunal de Justiça já teve oportunidade de se interrogar sobre a questão de saber se uma transportadora aérea era obrigada, por força dos artigos 5.°, 6.° e 7.° do Regulamento n.o 261/2004, a indemnizar os passageiros de voos atrasados. Com efeito, no acórdão Sturgeon e o., já referido, decidiu que estes artigos devem ser interpretados no sentido de que os passageiros de voos atrasados podem ser equiparados aos passageiros de voos cancelados para efeitos da aplicação do direito a indemnização, e que esses passageiros podem, assim, invocar o direito a indemnização previsto no artigo 7.o desse regulamento quando o tempo que perderam por causa de um voo atrasado seja igual ou superior a três horas, isto é, quando cheguem ao seu destino final três ou mais horas após a hora de chegada inicialmente prevista pela transportadora aérea ( 7 ). |
30. |
Todavia, os litígios no processo principal confirmam a recusa das transportadoras aéreas de aplicar o referido acórdão e de indemnizar os passageiros que se encontrem nessa situação. Com efeito, estas transportadoras consideram, por um lado, que a interpretação dada pelo Tribunal de Justiça, no seu acórdão Sturgeon e o., já referido, dos artigos 5.°, 6.° e 7.° do regulamento em questão é incompatível com a posição tomada no acórdão IATA e ELFAA, já referido, e, por outro, que o Tribunal de Justiça excedeu a sua competência. |
31. |
Neste último acórdão, o Tribunal de Justiça devia pronunciar-se sobre a validade destas disposições. Em particular, o órgão jurisdicional de reenvio colocava a questão de saber se os artigos 5.° e 6.° do Regulamento n.o 261/2004 não eram inválidos na medida em que não eram conformes com o princípio da segurança jurídica. |
32. |
A este respeito, o Tribunal de Justiça decidiu, nomeadamente, no n.o 76 do referido acórdão, que «embora o preâmbulo de um ato comunitário seja suscetível de precisar o conteúdo deste […], não poderá ser invocado para derrogar as próprias disposições do ato em causa». Prosseguiu, explicando que, «é certo que a redação [do décimo quarto e do décimo quinto considerandos do Regulamento n.o 261/2004] dá a entender que, de um modo geral, a transportadora aérea operadora deveria ser eximida de todas as suas obrigações no caso de circunstâncias extraordinárias, dando, por isso, origem a uma certa ambiguidade entre a intenção, expressa dessa forma pelo legislador comunitário, e o próprio conteúdo dos artigos 5.° e 6.° [deste regulamento], que não conferem um caráter tão geral a essa exoneração da responsabilidade. Todavia, essa ambiguidade não tem um alcance tal que torne incoerente o dispositivo concretizado nesses dois artigos, os quais, por seu lado, são desprovidos de qualquer ambiguidade». |
33. |
O Governo do Reino Unido deduz deste número do acórdão que, segundo o Tribunal de Justiça, o Regulamento n.o 261/2004 não prevê nenhuma obrigação de pagamento de uma indemnização aos passageiros de um voo atrasado e que o Tribunal de Justiça não considerou que o décimo quinto considerando deste regulamento poderia ser utilizado para alterar o significado das disposições do referido regulamento ( 8 ). Assim, o Tribunal de Justiça baseou erradamente o raciocínio no acórdão Sturgeon e o., já referido, a respeito deste considerando e concluiu daí que também é devida uma indemnização em caso de atraso. |
34. |
Penso que do n.o 76 do acórdão IATA e ELFAA, já referido, não se pode deduzir esta análise e que a interpretação dada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Sturgeon e o., já referido, não está em contradição com a posição adotada no primeiro acórdão. |
35. |
Com efeito, este número do acórdão deve ser posicionado no seu contexto. No processo que deu lugar ao acórdão IATA e ELFAA, já referido, o Tribunal de Justiça devia pronunciar-se, como vimos, sobre a validade dos artigos 5.°, 6.° e 7.° do Regulamento n.o 261/2004. As recorrentes defendiam que este último prevê, de forma incoerente, nos seus décimo quarto e décimo quinto considerandos, que, em caso de cancelamento ou de atraso considerável de um voo, a responsabilidade da transportadora aérea operadora pode ser limitada ou eliminada se tiverem ocorrido circunstâncias extraordinárias, ao passo que os artigos 5.° e 6.° deste regulamento, que regulam as suas obrigações nesse caso, não contemplam, salvo no que se refere à obrigação de indemnização, essa exoneração da responsabilidade ( 9 ). |
36. |
Na realidade, as recorrentes demonstraram surpresa pelo facto de não existir, no corpo normativo do Regulamento n.o 261/2004, uma exoneração da obrigação de reembolso ou reencaminhamento e de assistência dos passageiros em caso de atraso de um voo devido a circunstâncias extraordinárias. Segundo estas, o décimo quarto e décimo quinto considerandos deste regulamento indicam que a transportadora aérea deve ser exonerada de qualquer obrigação, seja ela qual for, em caso de circunstâncias extraordinárias não apenas quando o voo foi cancelado, mas também quando este sofreu um atraso. Por conseguinte, as recorrentes consideram que estes considerandos, lidos em conjugação com o artigo 6.o do referido regulamento, relativo aos atrasos, geram um certa ambiguidade, pelo que violam o princípio da segurança jurídica ( 10 ). |
37. |
O Tribunal de Justiça decidiu sobre este elemento, no n.o 76 do seu acórdão IATA e ELFAA, já referido, que essa ambiguidade não tem um alcance tal que torne incoerente o dispositivo instituído pelos artigos 5.° e 6.° do Regulamento n.o 261/2004, os quais, por seu lado, são desprovidos de qualquer ambiguidade. Noutros termos, o Tribunal de Justiça considerou, em minha opinião, que a ambiguidade que a leitura dos considerandos décimo quarto e décimo quinto deste regulamento pode gerar em nada afeta o facto de ser claro no corpo normativo que a justificação relativa a circunstâncias extraordinárias não tem caráter geral, sendo apenas válida para a obrigação de indemnização. |
38. |
Assim, penso que não se pode extrair desta análise a conclusão de que a interpretação efetuada pelo Tribunal de Justiça dos artigos 5.°, 6.° e 7.° do referido regulamento no seu acórdão Sturgeon e o., já referido, está em contradição com a posição que este tomou no acórdão IATA e ELFAA, já referido. |
39. |
Quanto ao próprio princípio da indemnização do passageiro dos transportes aéreos cujo voo sofreu um atraso de pelo menos três horas, uma vez que as partes no litígio principal não apresentaram nenhum elemento novo suscetível de pôr em causa a interpretação que o Tribunal de Justiça fez destas disposições no acórdão Sturgeon e o., já referido, não vejo razão para que o Tribunal de Justiça altere esta interpretação. |
40. |
Neste acórdão, o Tribunal de Justiça aplicou o método da interpretação teleológica do Regulamento n.o 261/2004 ( 11 ). A interpretação dos artigos 5.°, 6.° e 7.° deste regulamento é sugerida no décimo quinto considerando deste e baseia-se no próprio objetivo do texto, que é, recorde-se, garantir um elevado nível de proteção dos passageiros dos transportes aéreos, independentemente de se encontrarem numa situação de recusa de embarque, de cancelamento ou atraso do voo, uma vez que são todos vítimas dos mesmos sérios transtornos e inconvenientes ligados ao transporte aéreo ( 12 ). |
41. |
Na realidade, o Tribunal de Justiça efetuou uma interpretação a contrario do décimo quinto considerando do Regulamento n.o 261/2004. Com efeito, este indica que «existem circunstâncias extraordinárias [e, por este facto, uma exoneração da obrigação de indemnização], sempre que o impacto de uma decisão de gestão do tráfego aéreo, relativa a uma determinada aeronave num determinado dia provoque um atraso considerável, um atraso de uma noite ou o cancelamento de um ou mais voos dessa aeronave».Consequentemente, o Tribunal de Justiça deduziu daqui, no n.o 43 do acórdão Sturgeon e o., já referido, que o conceito de atraso considerável também está associado ao direito a indemnização. |
42. |
Além disso, como indicou o Tribunal de Justiça no n.o 47 do acórdão Sturgeon e o., já referido, segundo um princípio geral de interpretação, um ato comunitário deve ser interpretado, na medida do possível, de uma maneira que não ponha em causa a sua validade. Do mesmo modo, quando uma disposição do direito da União é suscetível de várias interpretações, há que privilegiar a que é capaz de salvaguardar o seu efeito útil. |
43. |
Ora, a posição adotada pelo Tribunal de Justiça neste acórdão pretende, precisamente, não pôr em causa a validade dos artigos 5.°, 6.° e 7.° do Regulamento n.o 261/2004, ao optar por uma interpretação que permite salvaguardar o efeito útil destas disposições. Com efeito, no n.o 52 do referido acórdão, o Tribunal de Justiça salientou que este regulamento visa reparar, nomeadamente, o prejuízo que consiste no tempo perdido pelos passageiros afetados, o qual, tendo em conta o seu caráter irreversível, só pode ser compensado através de uma indemnização. Daqui concluiu que os passageiros de um voo cancelado e os passageiros de um voo atrasado sofrem um prejuízo análogo, que consiste numa perda de tempo, encontrando-se, assim, em situações comparáveis para efeitos da aplicação do direito a indemnização previsto no artigo 7.o do referido regulamento ( 13 ). |
44. |
Assim, seria contrário ao princípio da igualdade de tratamento tratar de maneira diferente estes passageiros, não obstante se encontrarem em situações comparáveis. Esta é a razão pela qual o Tribunal de Justiça decidiu, no n.o 61 do acórdão Sturgeon e o., já referido, que os passageiros cujo voo sofreu um atraso podem invocar o direito a indemnização previsto no artigo 7.o do Regulamento n.o 261/2004. |
45. |
Além disso, o Tribunal de Justiça entendeu que um atraso deve ser julgado considerável, e dar direito a essa indemnização, quando os passageiros cheguem ao seu destino final três ou mais horas após a hora de chegada inicialmente prevista pela transportadora aérea. Esta interpretação do conceito de «atraso considerável», referido no décimo quinto considerando deste regulamento, também foi objeto de crítica por parte, nomeadamente, das transportadoras aéreas e da doutrina que consideram que a fixação dessa duração é arbitrária e não encontra justificação no referido regulamento. |
46. |
Não compartilho desta opinião. Em primeiro lugar, importa recordar que o princípio da segurança jurídica, que constitui um princípio fundamental de direito da União, exige, designadamente, que uma regulamentação seja clara e precisa, a fim de que os administrados possam conhecer sem ambiguidade os seus direitos e obrigações e agir em conformidade ( 14 ). Aplicado à situação dos passageiros de voos atrasados e às transportadoras aéreas, tal significa que os primeiros devem poder saber a partir de quando podem solicitar o pagamento de uma indemnização e as segundas devem poder saber a partir de quando são obrigadas a pagar esta indemnização. Estabelecer um limite de tempo permite evitar que os tribunais nacionais apreciem de maneira diferente o conceito de atraso considerável e que tal provoque uma insegurança jurídica ( 15 ). Os passageiros que sofreram uma perda de tempo de quatro horas podem beneficiar de uma indemnização em determinados Estados-Membros mas não noutros, uma vez que alguns órgãos jurisdicionais nacionais consideram que este atraso é um atraso considerável na aceção do Regulamento n.o 261/2004, enquanto outros consideram que tal não é o caso. Para além da insegurança jurídica, tal teria por efeito criar desigualdades entre passageiros dos transportes aéreos cuja situação é, porém, idêntica. |
47. |
Em segundo lugar, a fim de determinar a perda de tempo a partir da qual os passageiros de um voo atrasado podem solicitar o pagamento de uma indemnização, importa recordar que o Tribunal de Justiça se baseou na situação dos passageiros de voos cancelados que são reencaminhados em conformidade com o artigo 5.o, n.o 1, alínea c), iii), do Regulamento n.o 261/2004, dado que a situação destes é semelhante à dos passageiros de voos atrasados e que as duas categorias de passageiros são informadas, em princípio, no mesmo momento do incidente que dificulta o seu transporte aéreo ( 16 ). Além disso, estas duas categorias de passageiros chegam ao seu destino final após a hora inicialmente prevista e sofrem, por conseguinte, uma perda de tempo semelhante ( 17 ). Seguidamente, o Tribunal de Justiça salientou que os passageiros reencaminhados nos termos do artigo 5.o, n.o 1, alínea c), iii), deste regulamento beneficiam do direito a indemnização previsto no artigo 7.o do referido regulamento se a transportadora não os reencaminhar para um voo que parta até uma hora antes da hora de partida prevista e chegue ao seu destino final até duas horas depois da hora de chegada prevista. Estes passageiros adquirem, assim, o direito a indemnização quando o tempo que perderam for igual ou superior a três horas relativamente à duração inicialmente prevista pela transportadora ( 18 ). |
48. |
Por conseguinte, o Tribunal de Justiça concluiu daqui que os passageiros de voos atrasados podem invocar o direito a indemnização previsto no artigo 7.o do Regulamento n.o 261/2004 quando o tempo que perderam por causa desses voos seja igual ou superior a três horas, isto é, quando cheguem ao seu destino final três horas ou mais após a hora de chegada inicialmente prevista pela transportadora aérea ( 19 ). |
49. |
Consequentemente, tendo em conta todos estes elementos, considero que os artigos 5.°, 6.° e 7.° deste regulamento devem ser interpretados no sentido de que os passageiros de voos atrasados podem invocar o direito a indemnização previsto no artigo 7.o do referido regulamento, quando o tempo que perderam por causa do atraso desses voos seja igual ou superior a três horas, isto é, quando cheguem ao seu destino final três ou mais horas após a hora de chegada inicialmente prevista pela transportadora aérea. |
50. |
Assim, não há que responder à segunda questão submetida pela High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court). |
2. Quanto à compatibilidade dos artigos 5.°, 6.° e 7.° do Regulamento n.o 261/2004 com a Convenção de Montreal, o princípio da proporcionalidade e o princípio da segurança jurídica
51. |
O Amtsgericht Köln interroga-se sobre a questão de saber, no essencial, como se articula o direito a indemnização previsto no artigo 7.o do Regulamento n.o 261/2004 com os artigos 19.° e 29.° da Convenção de Montreal, na medida em que estas últimas disposições excluem a indemnização dos prejuízos resultantes de um atraso no transporte aéreo de passageiros que não seja a título de compensação. |
52. |
Por outro lado, a High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court), interroga-se, na realidade, sobre a questão de saber se, na hipótese de o Tribunal de Justiça decidir que os passageiros de voos atrasados podem solicitar a indemnização prevista no artigo 7.o deste regulamento, esta disposição é inválida, no todo ou em parte, por incompatibilidade com a Convenção de Montreal, violação do princípio da proporcionalidade e/ou violação do princípio da segurança jurídica. |
53. |
No que diz respeito à compatibilidade do direito a indemnização previsto no artigo 7.o do referido regulamento com os artigos 19.° e 29.° da Convenção de Montreal, há que recordar que o Tribunal de Justiça decidiu que qualquer atraso no transporte aéreo pode causar, em termos gerais, dois tipos de prejuízo, a saber, por um lado, prejuízos quase idênticos para todos os passageiros cuja compensação pode assumir a forma de um direito a reembolso ou reencaminhamento ou de um direito a assistência, uniforme e imediata, para todos os interessados e, por outro, prejuízos individuais, inerentes à razão da deslocação destes, cuja compensação exige uma apreciação caso a caso da amplitude dos danos causados e só pode, em consequência, ser objeto de uma indemnização a posteriori e individualizada ( 20 ). |
54. |
A Convenção de Montreal visa regular as condições de indemnização deste segundo tipo de prejuízo ( 21 ). Uma vez que o reembolso ou reencaminhamento e a assistência aos passageiros a que se refere o artigo 6.o do Regulamento n.o 261/2004 em caso de atraso considerável de um voo constituem medidas de compensação uniformes e imediatas, estas não correspondem às medidas cujas condições de exercício são fixadas por esta convenção ( 22 ). |
55. |
Tal como o reembolso ou reencaminhamento e a assistência, a indemnização nos termos do artigo 7.o deste regulamento constitui uma medida uniforme e imediata que visa reparar um prejuízo que consiste, no que se refere ao passageiro dos transportes aéreos cujo voo sofreu, nomeadamente, um atraso, numa perda de tempo irreversível ( 23 ). Isto é confirmado pela natureza forfetária desta indemnização cujo montante varia não em função do prejuízo individual, mas da distância de voo percorrida ou a percorrer, e do seu caráter geral, uma vez que é aplicável indistintamente a todos os passageiros que reúnam os requisitos para beneficiar desta indemnização. |
56. |
Por conseguinte, o artigo 7.o do Regulamento n.o 261/2004 é, no meu entender, compatível com os artigos 19.° e 29.° da Convenção de Montreal. |
57. |
No que se refere ao respeito do princípio da proporcionalidade, o Tribunal de Justiça já teve oportunidade de se pronunciar sobre a compatibilidade do artigo 7.o do regulamento com este princípio ( 24 ). A este respeito, decidiu que as medidas previstas nos artigos 5.° e 6.° do referido regulamento ( 25 ) são, em si mesmas, suscetíveis de reparar imediatamente determinados prejuízos sofridos pelos passageiros dos transportes aéreos em caso de cancelamento ou de atraso considerável de um voo, e permitem, assim, garantir um nível elevado de proteção dos interessados, pretendido pelo Regulamento n.o 261/2004 ( 26 ). |
58. |
Além disso, o Tribunal de Justiça indicou que é jurisprudência assente que a amplitude das diversas medidas adotadas pelo legislador da União varia em função da importância dos prejuízos sofridos pelos passageiros, importância essa que é apreciada em função quer da duração do atraso e da espera pelo próximo voo quer da rapidez com que os interessados foram informados do cancelamento do voo. Os critérios assim estabelecidos para determinar o direito dos passageiros a beneficiar dessas medidas não se revelam de modo nenhum alheios ao requisito da proporcionalidade ( 27 ). |
59. |
Além disso, determinadas partes nos litígios principais avançam o argumento de que a indemnização dos passageiros de voos atrasados acabaria por impor um encargo financeiro arbitrário e excessivamente pesado às transportadoras aéreas. Esta indemnização é desproporcionada em relação ao objetivo prosseguido pelo Regulamento n.o 261/2004. |
60. |
A este respeito, segundo os valores de que a Comissão Europeia teve conhecimento por intermédio da Organização Europeia para a Segurança da Navegação Aérea (Eurocontrol), menos de 1,2% dos voos são suscetíveis de ser abrangidos pelas disposições deste regulamento relativas aos voos atrasados. Além disso, menos de 0,5% dos voos atrasados têm um atraso de três ou mais horas, quer o atraso seja devido a circunstâncias extraordinárias ou não. A proporção dos voos cujo atraso dá direito à indemnização prevista no artigo 7.o do referido regulamento é inferior a 0,15% ( 28 ). |
61. |
A frequência dos atrasos de mais de três horas que dão direito a esta indemnização afigura-se, portanto, limitada. Os efeitos da indemnização devida em caso de atraso de mais de três horas não me parecem, por conseguinte, desproporcionados em relação ao objetivo do Regulamento n.o 261/2004 que é, recordo, garantir um nível elevado de proteção dos passageiros dos transportes aéreos. |
62. |
Tal se justifica tanto mais quanto, como indicou o Tribunal de Justiça no acórdão Sturgeon e o., já referido, as transportadoras aéreas não estão obrigadas a pagar uma indemnização se puderem provar que o cancelamento ou o atraso considerável se ficou a dever a circunstâncias extraordinárias que não poderiam ter sido evitadas mesmo que tivessem sido tomadas todas as medidas razoáveis, ou seja, circunstâncias que escapam ao controlo efetivo da transportadora aérea ( 29 ). Além disso, o cumprimento das obrigações exigidas pelo Regulamento n.o 261/2004 não prejudica o direito de essas transportadoras exigirem uma indemnização a qualquer pessoa que tenha causado o atraso, incluindo terceiros, conforme está previsto no artigo 13.o desse regulamento ( 30 ). Por último, o Tribunal de Justiça também decidiu que o valor da indemnização devida ao passageiro de um voo atrasado, que chega ao seu destino final três ou mais horas após a hora de chegada inicialmente prevista, pode ser reduzido em 50%, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 2, alínea c), do referido regulamento quando o atraso, no caso de um voo não abrangido pelo artigo 7.o, n.o 2, alíneas a) e b), for inferior a quatro horas ( 31 ). O encargo financeiro imposto às transportadoras aéreas em caso de atraso de voo de três ou mais horas pode, portanto, ser nulo ou consideravelmente reduzido. |
63. |
Por conseguinte, tendo em conta o exposto, considero que o artigo 7.o do Regulamento n.o 261/2004 é compatível com o princípio da proporcionalidade. |
64. |
Por último, o órgão jurisdicional de reenvio no processo C-629/10 interroga-se, no essencial, sobre a questão de saber se a interpretação desta disposição dada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Sturgeon e o., já referido, é compatível com o princípio da segurança jurídica. |
65. |
Segundo as recorrentes no processo C-629/10, esta interpretação viola o princípio da segurança jurídica na medida em que é incompatível com a redação clara e inequívoca do Regulamento n.o 261/2004, com a intenção do legislador da União e com o acórdão IATA e ELFAA, já referido. |
66. |
Pelas razões expostas nos n.os 31 a 48 das presentes conclusões, considero que a referida interpretação não é contrária ao princípio da segurança jurídica. |
67. |
Tendo em conta os elementos expostos, entendo que os artigos.°5, 6.° e 7.° do Regulamento n.o 261/2004 são compatíveis com a Convenção de Montreal, com o princípio da proporcionalidade e com o princípio da segurança jurídica. |
3. Quanto aos efeitos no tempo do acórdão a proferir
68. |
As recorrentes no processo C-629/10 pedem que o Tribunal de Justiça limite os efeitos no tempo do acórdão a proferir, na hipótese de responder em termos afirmativos e em termos negativos, respetivamente, à primeira e à terceira questões submetidas pela High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court) neste processo. Pretendem que os artigos 5.°, 6.° e 7.° do Regulamento n.o 261/2004 não possam ser invocados para fundamentar pedidos de indemnização de passageiros relativos a voos atrasados antes da data do acórdão a proferir nos presentes processos, salvo em relação aos passageiros que, na presente data, já tenham intentado uma ação judicial tendo em vista esta indemnização. |
69. |
A este respeito, importa recordar que a interpretação que o Tribunal de Justiça faz de uma norma de direito da União, no exercício da competência que lhe confere o artigo 267.o TFUE, esclarece e precisa o significado e o alcance dessa norma tal como deve ou deveria ter sido entendida e aplicada desde o momento da sua entrada em vigor. Daqui se conclui que a norma assim interpretada pode e deve ser aplicada pelo juiz mesmo às relações jurídicas surgidas e constituídas antes de ser proferido o acórdão sobre o pedido de interpretação se se encontrarem reunidas as condições que permitam submeter aos órgãos jurisdicionais competentes um litígio relativo à aplicação da referida norma ( 32 ). |
70. |
O Tribunal de Justiça pode, a título excecional, tendo em conta as graves perturbações que o seu acórdão pode implicar para o passado, ser levado a limitar a possibilidade de qualquer interessado invocar a interpretação que, a título prejudicial, dê de uma disposição de direito da União ( 33 ). |
71. |
Por outro lado, o Tribunal de Justiça indicou que os efeitos no tempo da interpretação solicitada de uma disposição de direito da União têm necessariamente de ser determinados pelo Tribunal de Justiça num momento preciso. A este respeito, o princípio de que uma limitação só pode ser admitida no próprio acórdão que decide quanto à interpretação pedida garante a igualdade de tratamento dos Estados-Membros e demais interessados face a esse direito e, desse modo, cumpre as exigências decorrentes do princípio da segurança jurídica ( 34 ). |
72. |
Nos presentes processos, as disposições de direito da União objeto de interpretação são os artigos 5.°, 6.° e 7.° do Regulamento n.o 261/2004. No essencial, pergunta-se ao Tribunal de Justiça se estas disposições devem ser interpretadas no sentido de que a transportadora aérea está obrigada ao pagamento de uma indemnização aos passageiros de voos atrasados. O Tribunal de Justiça já teve oportunidade de se pronunciar sobre esta questão no acórdão Sturgeon e o., já referido ( 35 ), e as presentes questões prejudiciais apenas pretendem saber, na realidade, se o Tribunal de Justiça confirma a interpretação que deu das referidas disposições nesse acórdão. |
73. |
Ora, não se pode deixar de observar que, no referido acórdão, o Tribunal de Justiça não limitou no tempo os efeitos deste. |
74. |
Consequentemente, em minha opinião, não se devem limitar no tempo os efeitos do acórdão a proferir nos presentes processos. |
75. |
Uma vez que proponho que o Tribunal de Justiça responda em termos afirmativos à primeira questão submetida pela High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court), no processo C-629/10, não é necessário responder à quinta questão submetida por esta última. |
V — Conclusão
76. |
Vistas as precedentes considerações, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões que lhe foram submetidas pelo Amtsgericht Köln e pela High Court of Justice (England & Wales), Queen’s Bench Division (Administrative Court), do seguinte modo: «Os artigos 5.°, 6.° e 7.° do Regulamento (CE) n.o 261/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de fevereiro de 2004, que estabelece regras comuns para a indemnização e a assistência aos passageiros dos transportes aéreos em caso de recusa de embarque e de cancelamento ou atraso considerável dos voos e que revoga o Regulamento (CEE) n.o 295/91, devem ser interpretados no sentido de que:
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( 1 ) Língua original: francês.
( 2 ) Regulamento (CE) n.o 261/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de fevereiro de 2004, que estabelece regras comuns para a indemnização e a assistência aos passageiros dos transportes aéreos em caso de recusa de embarque e de cancelamento ou atraso considerável dos voos e que revoga o Regulamento (CEE) n.o 295/91 (JO L 46, p. 1).
( 3 ) C-402/07 e C-432/07, Colet., p. I-10923.
( 4 ) N.o 69.
( 5 ) A seguir «Convenção de Montreal».
( 6 ) Decisão do Conselho, de 5 de abril de 2001, relativa à celebração pela Comunidade Europeia da Convenção para a unificação de certas regras relativas ao Transporte Aéreo Internacional (Convenção de Montreal) (JO L 194, p. 38).
( 7 ) N.o 69 do acórdão.
( 8 ) N.os 35 a 38 das suas observações no processo C-581/10.
( 9 ) V. n.o 75 do acórdão.
( 10 ) V., nomeadamente, o n.o 31 das observações da European Low Fares Airline Association e os n.os 132 a 135 das observações da IATA no processo que deu lugar ao acórdão IATA e ELFAA, já referido.
( 11 ) V. n.os 41 e 42 do referido acórdão.
( 12 ) V. acórdão Sturgeon e o., já referido (n.o 44).
( 13 ) Ibidem (n.o 54).
( 14 ) V. o acórdão IATA et ELFAA, já referido (n.o 68 e jurisprudência referida).
( 15 ) V., a este respeito, n.os 88 a 90 das conclusões da advogada-geral E. Sharpston no processo que deu lugar ao acórdão Sturgeon e o., já referido.
( 16 ) Acórdão Sturgeon e o., já referido (n.os 55 e 56).
( 17 ) Ibidem (n.o 56).
( 18 ) Ibidem (n.o 57).
( 19 ) Ibidem (n.o 61).
( 20 ) Acórdão IATA e ELFAA, já referido (n.o 43). V., igualmente, acórdão Sturgeon e o., já referido (n.o 51).
( 21 ) Acórdão IATA e ELFAA, já referido (n.o 44).
( 22 ) Ibidem (n.o 46).
( 23 ) V., neste sentido, acórdão Sturgeon e o., já referido (n.o 52).
( 24 ) V. acórdão IATA e ELFAA, já referido (n.o 81).
( 25 ) Estas medidas são o reembolso ou reencaminhamento e a assistência aos passageiros, nos termos previstos nos artigos 8.° e 9.° do Regulamento n.o 261/2004, e a indemnização, nos termos previstos no artigo 7.o deste regulamento.
( 26 ) Acórdão IATA e ELFAA, já referido (n.o 84).
( 27 ) Ibidem (n.o 85).
( 28 ) V. documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanha a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho, de 11 de abril de 2011 sobre a aplicação do Regulamento (CE) n.o 261/2004 que estabelece regras comuns para a indemnização e a assistência aos passageiros dos transportes aéreos em caso de recusa de embarque e de cancelamento ou atraso considerável dos voos [SEC(2011) 428 final]. Este documento está disponível em língua inglesa.
( 29 ) V. n.o 67 do acórdão.
( 30 ) N.o 68 do acórdão.
( 31 ) Acórdão Sturgeon e o., já referido (n.o 63).
( 32 ) V., nomeadamente, acórdão de 6 de março de 2007, Meilicke e o. (C-292/04, Colet., p. I-1835, n.o 34 e jurisprudência referida).
( 33 ) V., nomeadamente, acórdão de 29 de julho de 2010, Brouwer (C-577/08, Colet., p. I-7489, n.o 33). V., igualmente, acórdão Meilicke e o., já referido (n.o 35).
( 34 ) Acórdão Meilicke e o., já referido (n.o 37).
( 35 ) V. n.o 69 do acórdão.