Processo T‑237/08

Abadía Retuerta, SA

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI)

«Marca comunitária – Pedido de marca nominativa comunitária CUVÉE PALOMAR – Motivo absoluto de recusa – Marcas de vinho que contêm indicações geográficas – Acordo ADPIC – Artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento (CE) n.° 40/94 [actual artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento (CE) n.° 207/2009]»

Sumário do acórdão

1.      Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Marcas de vinhos ou de bebidas espirituosas que contêm ou são compostas por indicações geográficas destinadas a identificar vinhos ou bebidas espirituosas que não têm essas origens – Conceito

[Acordo ADPIC, artigo 23.°; Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, j)]

2.      Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Marcas de vinhos ou de bebidas espirituosas que contêm ou são compostas por indicações geográficas destinadas a identificar vinhos ou bebidas espirituosas que não têm essas origens

(Regulamentos do Conselho n.° 40/94, artigo 7.°, n.° 1, j), e n.° 1493/1999, artigo 52.°)

3.      Agricultura – Organização comum dos mercados – Vinho – Vinhos de qualidade produzidos em regiões determinadas – Protecção comunitária de indicações geográficas – Requisitos

(Regulamento n.° 1493/1999 do Conselho, artigo 52.°, n.° 1, primeiro parágrafo, e 54.°, n.os 4 e 5)

4.      Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Marcas de vinhos ou de bebidas espirituosas que contêm ou são compostas por indicações geográficas destinadas a identificar vinhos ou bebidas espirituosas que não têm essas origens – Carácter enganoso – Risco de confusão – Não incidência

[Regulamento n.° 40/9 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, j)]

5.      Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Marcas de vinhos ou de bebidas espirituosas que contêm ou são compostas por indicações geográficas destinadas a identificar vinhos ou bebidas espirituosas que não têm essas origens – Artigos definidos ou indefinidos – Não incidência

[Regulamento n.° 40/9 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, j)]

6.      Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Marcas de vinhos ou de bebidas espirituosas que contêm ou são compostas por indicações geográficas destinadas a identificar vinhos ou bebidas espirituosas que não têm essas origens Desconhecimento pelo grande público ou pelos meios interessados do nome que beneficia de uma denominação de origem controlada – Carácter polissémico – Não incidência

[Regulamento n.° 40/9 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, j)]

1.      Embora as disposições do Acordo sobre os aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio (ADPIC) não tenham efeito directo, não é menos verdade que legislação sobre as marcas, isto é, no caso vertente, o artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, deve ser interpretada, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade desse acordo.

O conceito de «indicação geográfica que identifique vinhos», que figura no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, difere, na versão francesa, da que figura no artigo 23.° do acordo APDIC. Todavia, duas outras línguas fazem fé, nos termos da Acta final que consagra os resultados das negociações comerciais multilaterais do Uruguay Round, cujo texto foi redigido em francês, inglês e espanhol. Assim, a expressão «geographical indication identifying wines» é utilizada tanto no artigo 23.° do acordo APDIC como no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, na versão inglesa destas disposições. Por outro lado, a expressão «indicación geográfica que identifique el vino» é utilizada na versão espanhola do artigo 23.° do acordo APDIC, e a expressão «indicación geográfica que identifique el vino» na versão espanhola do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do referido regulamento. Consequentemente, deve considerar‑se que o artigo 7.°, n.° 1, alínea j), deste regulamento as indicações geográficas que identifiquem os vinhos e não as indicações geográficas «destinadas a identificar vinhos».

(cf. n.os 67 a 72)

2.      O motivo absoluto de recusa previsto pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento (CE) n.° 40/94, opõe‑se ao registo do sinal nominativo CUVÉE PALOMAR como marca comunitária para «vinhos», que integram a classe 33 do Acordo de Nice, em razão da existência da denominação de origem controlada «valencia».

Segundo o direito espanhol, a zona de produção protegida pela denominação de origem controlada «valencia» é constituída, nomeadamente, pela sub‑região de Clariano, que compreende, entre outros, o município de nome «el Palomar».

O nome «el Palomar» constitui, portanto, uma indicação geográfica para um vinho de qualidade produzido numa região determinada (v.q.p.r.d.) nos termos da legislação espanhola e, consequentemente, do artigo 52.° do Regulamento n.° 1493/1999, que estabelece a organização comum do mercado vitivinícola, o qual precisa que, se um Estado‑Membro atribuir o nome de uma região determinada, incluindo o nome de um município, a um v.q.p.r.d, esse nome não pode ser utilizado para a designação de produtos do sector vitivinícola não provenientes dessa região e/ou aos quais não tenha sido atribuído esse nome nos termos das regulamentações comunitária e nacional aplicáveis.

Uma vez que o nome «el Palomar» é uma indicação geográfica para um v.q.p.r.d., constitui, consequentemente, uma indicação geográfica que identifica vinhos na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94.

(cf. n.os 82, 86 a 88, 110 a 112)

3.      A protecção comunitária das indicações geográficas estabelecida pelo Regulamento n.° 1493/1999, que estabelece a organização comum do mercado vitivinícola, assenta nas indicações geográficas tal como foram determinadas pela legislação dos Estados‑Membros no respeito das disposições pertinentes do referido regulamento. Essa protecção não resulta de um processo comunitário autónomo nem mesmo de um mecanismo no termo do qual as indicações geográficas reconhecidas pelos Estados‑Membros tivessem sido aprovadas por uma acto comunitário de carácter vinculativo.

As únicas obrigações que decorrem do artigo 54.°, n.os 4 e 5, do Regulamento n.° 1493/1999 são, para os Estados‑Membros, transmitir a lista dos v.q.p.r.d. por si reconhecidos, indicando, em relação a cada um deles, as disposições nacionais que regulam a sua produção e a sua elaboração e, para a Comissão, publicar essa lista na série C ‑ e não na série L ‑ do Jornal Oficial.

Uma vez que a protecção das indicações geográficas tem a sua origem na legislação dos Estados‑Membros, a oponibilidade a terceiros das medidas nacionais pelas quais um Estado‑Membro atribui a um v.q.p.r.d. o nome de uma região determinada, ou o nome de um município, de uma parte de um município ou de um lugar, nos termos do artigo 52.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 1493/1999, resulta da publicação dessa disposições no jornal oficial do Estado‑Membro que as adopta.

(cf. n.os 97 a 99)

4.      O motivo absoluto de recusa previsto pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária aplica‑se sem que seja necessário atender à questão de saber as marcas cujo registo é pedido são ou não susceptíveis de enganar o público ou se comportam um risco de confusão no que respeita à origem do produto.

(cf. n.° 120)

5.      Para aplicar o motivo absoluto de recusa visado no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, sobre a marca comunitária, basta que as marcas contenham ou sejam compostas por elementos que permitam identificar com um grau de certeza a indicação geográfica em causa, sem ter que atender aos artigos definidos ou indefinidos que possam eventualmente fazer parte delas. Só assim não seria se a indicação geográfica fosse composta por o nome de um local que incluísse um artigo indissociável desse nome e que lhe desse um significado próprio e autónomo.

(cf. n.os 125 e 126)

6.      Na medida em que o registo da marca deve ser recusado, pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária, pelo simples motivo de que esta marca contém ou é composta por uma indicação geográfica que identifica vinhos quando os vinhos em causa não têm essa origem, decorre daí que o facto de o nome que beneficia de uma denominação de origem protegida ser desconhecido do grande público ou dos meios interessados, ou possuir um carácter polissémico que lhe atenua o carácter de indicação geográfica é indiferente para efeitos da aplicação desse motivo absoluto de recusa.

(cf. n.° 131)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção)

11 de Maio de 2010 (*)

«Marca comunitária – Pedido de marca nominativa comunitária CUVÉE PALOMAR – Motivo absoluto de recusa – Marcas de vinho que contêm indicações geográficas – Acordo ADPIC – Artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento (CE) n.° 40/94 [actual artigo 7, n.° 1, alínea j), do Regulamento (CE) n.° 207/2009]»

No processo T‑237/08,

Abadía Retuerta, SA, com sede em Sardón de Duero (Espanha), representada por X. Fàbrega Sabaté e M‑l. Curell Aguilà, advogados,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por J. Crespo Carrillo, na qualidade de agente,

recorrido,

que tem por objecto um recurso da decisão da Primeira Câmara de Recurso do IHMI de 2 de Abril de 2008 (processo R 1185/2007‑1), relativa ao registo do sinal nominativo CUVÉE PALOMAR como marca comunitária,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção),

composto por: J. Azizi, presidente, E. Cremona e S. Frimodt Nielsen (relator), juízes,

secretário: J. Palacio González, administradora principal,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 19 de Junho de 2008,

vista a resposta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 18 de Setembro de 2008,

após a audiência de 24 de Novembro de 2009,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

 Regulamentação internacional

1        O artigo 2.°, n.° 1, do Acordo sobre os aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio (a seguir «acordo ADPIC»), que constitui o anexo 1 C do Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio, foi assinado em Marrakech, em 15 de Abril de 1994, e aprovado pela Decisão 94/800/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 1994, relativa à celebração, em nome da Comunidade Europeia e em relação às matérias da sua competência, dos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986‑1994) (JO L 336, p. 1).

2        O artigo 23.° do referido acordo, sob a epígrafe «Protecção adicional das indicações geográficas para vinhos e bebidas alcoólicas», prevê o seguinte:

«1.      Cada membro proporcionará os meios legais necessários para que as partes interessadas possam impedir a utilização de uma indicação geográfica que identifique vinhos, para vinhos não originários do local indicado pela indicação geográfica em questão, ou de uma indicação geográfica que identifique bebidas alcoólicas, para bebidas alcoólicas não originárias do local indicado pela indicação geográfica em questão, mesmo quando a verdadeira origem dos bens esteja indicada ou a indicação geográfica utilizada em tradução ou acompanhada por expressões como ‘espécie’, ‘tipo’, ‘estilo’, ‘imitação’ ou outras similares.

2 ‑ O registro de uma marca para vinhos que contenha ou consista em uma indicação geográfica que identifique vinhos, ou para destilados que contenha ou consista em uma indicação geográfica que identifique destilados, será recusado ou invalidado, ‘ex officio’, se a legislação de um Membro assim o permitir, ou a pedido de uma parte interessada, para os vinhos ou destilados que não tenham essa origem.

3 ‑ No caso de indicações geográficas homónimas para vinhos, a protecção será concedida para cada indicação, sem prejuízo das disposições do parágrafo 4.° do artigo 22.° Cada Membro determinará as condições práticas pelas quais serão diferenciadas entre si as indicações geográficas homónimas em questão, levando em consideração a necessidade de assegurar tratamento equitativo aos produtores interessados e de não induzir a erro os consumidores.

4 ‑ Para facilitar a protecção das indicações geográficas para vinhos, realizar‑se‑ão, no Conselho para TRIPS, negociações relativas ao estabelecimento de um sistema multilateral de notificação e registro de indicações geográficas para vinhos passíveis de protecção nos Membros participantes desse sistema.»

3        O artigo 24.°, n.° 5, do acordo ADPIC prevê o seguinte:

«As medidas adoptadas para implementar esta Secção não prejudicarão a habilitação ao registro, a validade do registro, nem o direito ao uso de uma marca, com base no facto de que essa marca é idêntica ou similar a uma indicação geográfica, quando essa marca tiver sido solicitada ou registrada de boa‑fé, ou quando os direitos a essa marca tenham sido adquiridos de boa‑fé mediante uso:

[…]

b)      antes que a indicação geográfica estivesse protegida no seu país de origem.»

 Regulamentação comunitária

4        O artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento (CE) n.° 40/94, do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO L 11, p. 1), foi introduzido pelo Regulamento (CE) n.° 3288/94 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1994, que altera o Regulamento (CE) n.° 40/94 sobre a marca comunitária, com vista à aplicação dos acordos concluídos no âmbito do «Uruguay Round (JO L 349, p. 38). Este artigo, que passou a artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1), dispõe:

«Será recusado o registo: […] j) De marcas de vinhos que contenham ou consistam em indicações geográficas que identifiquem vinhos […] que não tenham essa origem;»

5        O quarto considerando do Regulamento n.° 3288/94 precisa:

«[O] n.° 2 do artigo 23.° do Acordo TRIPS dispõe a recusa ou a nulidade de marcas de vinhos e bebidas espirituosas que contenham ou consistam em indicações geográficas falsas sem exigir que […] sejam susceptíveis de enganar o público; há que aditar uma alínea i) ao n.° 1 do artigo 7.° do Regulamento (CE) n.° 40/94.»

6        O artigo 50.°, n.os 1 e 2, do Regulamento (CE) n.° 1493/1999 do Conselho, de 17 de Maio de 1999, que estabelece a organização comum do mercado vitivinícola (JO L 179, p. 1), na sua versão aplicável ao litígio, enuncia o seguinte:

«1.      Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para permitir que os interessados evitem, nos termos dos artigos 23.° e 24.° do Acordo [ADPIC], a utilização na Comunidade de uma indicação geográfica associada aos produtos referidos no n.° 2, alínea b), do artigo 1.° [do Regulamento n.° 1493/1999] para produtos que não sejam originários do local mencionado na indicação geográfica em causa, ainda que a verdadeira origem dos produtos seja referida ou que a indicação geográfica seja utilizada na tradução ou acompanhada de menções como ‘género’, ‘tipo’, ‘estilo’, ‘imitação’, ou outras menções análogas.

2.      Na acepção do presente artigo, entende‑se por ‘indicação geográfica’ uma indicação que identifique um produto como originário do território de um país terceiro membro da [OMC] ou de uma região ou localidade situada nesse território, nos casos em que determinada qualidade, reputação ou outra característica do produto possa ser atribuída, essencialmente, a essa origem geográfica.»

7        O artigo 52.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 1493/1999 dispõe:

«Se um Estado‑Membro atribuir o nome de uma região determinada a um vqprd [vinho de qualidade produzido numa região determinada] e, eventualmente, a um vinho destinado a ser transformado nesse vqprd, esse nome não pode ser utilizado para a designação de produtos do sector vitivinícola não provenientes dessa região e/ou aos quais não tenha sido atribuído esse nome nos termos das regulamentações comunitária e nacional aplicáveis. O mesmo se verifica se um Estado‑Membro tiver atribuído o nome de um município, de uma parte de município ou de um lugar apenas a um vqprd bem como, eventualmente, a um vinho destinado a ser transformado nesse vqprd.»

8        O artigo 54.° do Regulamento n.° 1493/1999 dispõe:

«1.      Entende‑se por ‘vinhos de qualidade produzidos em regiões determinadas’ (‘vqprd’), os vinhos que cumpram o disposto no presente título e na legislação comunitária e nacional adoptada na matéria.

[…]

4.      Os Estados‑Membros transmitirão à Comissão a lista dos vqprd por si reconhecidos, indicando, em relação a cada um deles, as disposições nacionais aplicáveis à sua produção e elaboração

5.      A Comissão publicará essa lista no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, série C.»

9        Foi publicada pela Comissão uma lista de vinhos de qualidade produzidos em regiões determinadas (v.q.p.r.d.), nos termos do artigo 54.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1493/1999, pela primeira vez no Jornal Oficial das Comunidades Europeias de 19 de Fevereiro de 1999 (JO C 46, p. 113). Essa lista – que anulava e substituía a lista publicada anteriormente no Jornal Oficial de 15 de Novembro de 1996 (JO C 344, p. 110), em conformidade com o artigo 1.°, n.° 3, do Regulamento (CEE) n.° 823/87 do Conselho, de 16 de Março de 1987, que estabelece disposições especiais relativas aos vinhos de qualidade produzidos em regiões determinadas (JO L 84, p. 59) – menciona, no que respeita a Espanha, a denominação de origem protegida «Valencia» bem como a referência aos decretos ministeriais de 13 de Junho de 1987 publicado no Boletín Oficial del Estado (jornal oficial espanhol) (BOE de 3 de Julho de 1987), de 11 de Março de 1991 (BOE de 14 de Março de 1991) e de 29 de Novembro de 1995 (BOE de 8 de Dezembro de 1995).

10      Uma nova lista de v.q.p.r.d. foi publicada pela Comissão no Jornal oficial de 14 de Abril de 2004 (JO C 90, p. 1). Nela é feita menção, no que respeita a Espanha e à região de Valencia (Valência), à sub‑região de Clariano, bem como ao decreto ministerial de 19 de Outubro de 2000 (BOE de 3 de Novembro de 2000) e ao Decreto ministerial APA/1815/2002 (BOE de 16 de Julho de 2002).

11      Novas lista foram seguidamente publicadas pela Comissão no Jornal Oficial em 2006 (JO C 41, p. 1) e em 2007 (JO C 106, p. 1). Estas listas contêm as mesmas menções, no que respeita à região de Valência e à sub‑região de Clariano, bem como as mesmas referências aos decretos ministeriais que as que figuram no Jornal Oficial C 90, de 14 de Abril de 2004

 Regulamentação nacional

12      O artigo 2.°, n.os 1 e 2, do novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador, ratificado pelo decreto ministerial de 19 de Outubro de 2000 e publicado no Boletín oficial del Estado de 3 de Novembro de 2000, dispõe:

«1.      A protecção conferida pela presente denominação de origem é a contemplada no artigo 81.° da Lei n.° 25/1970, de 2 de Dezembro de 1970, e na restante legislação aplicável e estende‑se à expressão ‘Valencia’ e a todas as denominações das sub‑regiões, circunscrições, municípios, localidades e domínios que compõem as zonas de produção e de envelhecimento enunciadas no artigo 4.°

2.      É proibida a utilização, em outros vinhos, de nomes, marcas, palavras, expressões e sinais que, pela sua semelhança fonética ou gráfica com os protegidos pela denominação de origem protegida, possam levar a confundi‑los com os que são objecto da presente regulamentação, mesmo que precedidos das palavras ‘tipo’, ‘estilo’, ‘engarrafado em’, ‘conservado em cave em’, e outros análogos.»

13      O artigo 4.°, n.° 1, do novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador prevê o seguinte:

«A zona de produção protegida pela denominação de origem ‘Valencia’ é constituída pelas terras situadas na província de Valência que o conselho regulador considere aptas para a produção de uva das cepas indicadas no artigo quinto e formada pelas sub‑regiões e autarquias a seguir enumeradas: […] sub‑região de Clariano: […] Palomar […].»

14      O artigo 4.°, n.° 1, do novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador foi modificado pelo Decreto ministerial APA/1815/2002, de 4 de Julho de 2002 (BOE n.° 169, de 16 de Julho de 2002, p. 25958). Nesse decreto, as palavras «el palomar» substituem a palavra «Palomar».

 Antecedentes do litígio

15      Em 27 de Novembro de 2006, a recorrente, Abadia Retuerta, SA, apresentou um pedido de registo da marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento n.° 40/94.

16      A marca cujo registo foi requerido é o sinal nominativo CUVÉE PALOMAR.

17      Os produtos para os quais o registo da marca foi requerido integram a classe 33 do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição: «vinhos».

18      Por entender que a marca solicitada incorre no motivo absoluto de recusa visado no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, o examinado rejeitou o pedido de registo por decisão de 5 de Junho de 2007.

19      A recorrente recorreu da decisão do examinador.

20      A Primeira Câmara de Recurso negou provimento ao recurso e condenou a recorrente nas despesas efectuadas para efeitos do processo por decisão de 2 de Abril de 2008 (a seguir «decisão recorrida»).

21      A Câmara de Recurso recorda que, de acordo com a jurisprudência (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2004, Anjeuser‑Busch, C‑245/02, Colect., p. I‑10989, n.° 42 e jurisprudência citada), uma vez que a Comunidade é parte no acordo ADPIC, deve, na medida do possível, interpretar a sua legislação sobre marcas à luz da letra e da finalidade deste acordo (n.° 13 da decisão recorrida).

22      A Câmara de Recurso precisa que resulta da comparação das disposições do artigo 22.°, n.° 3, e do artigo 23.°, n.° 2, do acordo APDIC que esta última disposição, cujo teor foi incorporado no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, constitui uma lex specialis, que prevê uma proibição especial de registo das indicações geográficas destinadas a identificar os vinhos e vinhos espirituosos. Trata‑se, segundo alega, de uma proibição, porquanto não está subordinada à condição de que o uso da indicação geográfica na marca para os referidos produtos seja susceptível de induzir o público em erro acerca do verdadeiro local de origem, condição esta a que, em contrapartida, está explicitamente sujeita a proibição de registo geral das indicações geográficas visada no artigo 22.°, n.° 3, do acordo APDIC (pontos 16 e 17).

23      A Câmara de Recurso conclui, no essencial, que «el Palomar» é o nome de um município da sub‑região de Clariano e constitui, por força da regulamentação comunitária e nacional aplicável, uma zona de produção protegida pela denominação de origem protegida «Valencia».

24      A Câmara de Recurso entende que existe uma grande semelhança entre o nome do município de «el Palomar», protegido pela denominação de origem protegida «Valencia», e o nome «Palomar», incluído na marca pedida (ponto 26 da decisão recorrida).

25      A Câmara de Recurso considera que a sua utilização é, por conseguinte, proibida por força do artigo 2.°, n.° 2, do decreto ministerial de 19 de Outubro de 2000, porquanto a marca comunitária não foi pedida para designar os vinhos da referida zona de origem (ponto 26 da decisão recorrida).

26      A Câmara de Recurso salienta, além disso, que embora seja verdade que o nome oficial do município seja «el Palomar», o elemento «palomar» é que identifica essa zona determinada e constitui o elemento essencial em que assenta a indicação geográfica, não podendo esse reconhecimento depender da presença ou não do artigo «el». Acresce que o município em causa foi identificado com o nome «Palomar», sem artigo, no decreto ministerial de 19 de Outubro de 2000 (ponto 29 da decisão recorrida).

27      Uma vez que a protecção da denominação de origem se estende aos nomes dos municípios, no caso vertente «Palomar», e às palavras que, pela sua semelhança, possam criar confusão, como acontece com a palavra «palomar», incluída na marca pedida, a Câmara de Recurso indica que a presença desta palavra na marca comunitária pedida deve ser entendida, segundo a regulamentação aplicável, como uma indicação geográfica destinada a identificar um vinho. Atendendo a que os produtos em causa não têm essa origem, a Câmara de Recurso considera que não há que admitir o registo da marca comunitária pedida para designar os vinhos, nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, porquanto contém uma indicação geográfica falsa (ponto 30 da decisão recorrida).

28      Por último, a Câmara de Recurso precisa que esta apreciação é igualmente válida à luz do enunciado modificado dos produtos objecto do pedido, a saber, «vinhos provenientes de um domínio agrícola conhecido sob o nome de ‘Pago Palomar’, situado no município de Sardón de Duero (Valladolid, Espanha)». A Câmara de Recurso considera que esta limitação mais não faz que reforçar o facto de a marca pedida conter uma indicação geográfica que não corresponde à origem dos produtos que designa, o que é contrário às disposições visadas no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 (ponto 31 da decisão recorrida).

 Tramitação processual e pedidos das partes

29      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão recorrida;

–        condenar o IHMI nas despesas

30      O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Argumentos das partes

31      A recorrente aduz um fundamento único para o seu recurso, baseado na violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94.

32      Primeiro, a recorrente alega, no essencial, que o artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 deve ser interpretado de forma restritiva, pois contém uma proibição de registo. Por consequência, entende que esta disposição não é aplicável no caso vertente, porquanto a marca pedida CUVÉE PALOMAR não contém o nome da denominação de origem protegida «el Palomar»

33      Com efeito, o nome do município é «el Palomar», e não «Palomar», nos termos do artigo 4.°, n.° 1, do novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador, conforme modificado pelo Decreto ministerial APA/1815/2002.

34      Segundo, a recorrente alega que a falta de oposição ao pedido de marca por parte dos organismos competentes para a defesa da denominação de origem protegida «Valencia» demonstra a inexistência de conflito entre a referida marca e o nome do município.

35      Terceiro, a recorrente alega que o município de «el Palomar» conta com uma população de pouco mais de 500 habitantes. Trata‑se, consequentemente, de um município muito pequeno, totalmente desconhecido do consumidor médio espanhol e europeu, que ignora que vinhos da denominação de origem protegida «Valencia» são produzidos em «el Palomar». O nome «el Palomar» é, portanto, um nome geográfico completamente desconhecido dos meios interessados.

36      A recorrente alega, no essencial, que a jurisprudência relativa ao artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 [actual artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009] segundo a qual não há que aplicar o motivo absoluto de recusa daquela disposição no caso de marcas compostas por um nome que designa zonas geográficas não conhecidas (acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Maio de 1999, Windsurfing Chiemsee, C‑108/97 e C‑109/97, Colect., p. I‑2779, n.os 31 a 33), deveria igualmente aplicar‑se, mutatis mutandis, ao motivo absoluto de recusa visado no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94.

37      Quarto, a recorrente sustenta que, para que a proibição absoluta de registo seja aplicável, o artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 deve ser interpretado no sentido de que implica que a marca pedida contenha ou seja composta por uma indicação geográfica errada.

38      Ora, segundo a recorrente, a marca CUVÉE PALOMAR objecto do pedido não contém nem é composta por uma indicação geográfica errada. Pelo contrário, identifica a origem geográfica dos vinhos da recorrente. Com efeito, na marca CUVÉE PALOMAR, o termo «palomar» identifica uma vinha Palomar, que existe desde o século XIX e está situada no domínio Retuerta, propriedade de Abadia Retuerta, no município espanhol de Sardón de Duero (Valladolid).

39      Ora, segundo a recorrente, é evidente que, na sua qualidade de proprietário da vinha Palomar, está no seu pleno direito de identificar os vinhos elaborados nessa vinha com a marca CUVÉE PALOMAR. Esta é a razão pela qual, a fim de ultrapassar as objecções suscitadas pelo IHNI e a fim de evitar qualquer erro a respeito da origem geográfica dos seus produtos, aceitou, em 16 de Fevereiro de 2007, limitar o pedido de marca aos «vinhos provenientes de uma vinha conhecida como ‘vinha Palomar’, situada no território do município de Sardón de Duero (Valladolid, Espanha)».

40      No essencial, a recorrente considera que, em consequência, o pedido de marca CUVÉE PALOMAR não contém qualquer falsa indicação geográfica, uma vez que a vinha Palomar existe e que lhe pertence, e que a marca pedida não devia, portanto, ser objecto da proibição absoluta de registo prevista no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94.

41      Quinto, a recorrente alega que o nome da vinha Palomar, propriedade sua, cuja menção está, como foi indicado no n.° 38 supra, acreditada desde o século XIX, é muito anterior ao reconhecimento, em 2002, do município de «el Palomar» como zona de produção protegida pela denominação de origem «Valencia». Por conseguinte, a recusa de registo da marca CUVÉE PALOMAR constitui uma violação do princípio de direito contido na máxima latina prior tempore, potior jure. A recorrente chama a atenção para o facto de que o decreto ministerial de 19 de Outubro de 2000 que conduziu ao reconhecimento do município de «el Palomar» como produção protegida pela denominação de origem «Valencia» é mesmo posterior à marca espanhola n.° 2.085.129 CUVÉE EL PALOMAR, que data, por seu turno, de 1997.

42      Sexto, a recorrente sustenta, no essencial, que a palavra «palomar» é uma palavra polissémica, que significa, segundo o dicionário da Real Academia Española: «1. nom. Local onde são criadas pombas. 2 Adj. Diz‑se de uma espécie de corda: mais fina e retorcida que a corda clássica».

43      Entende que este facto atenua o suposto carácter de indicação geográfica do município de «el Palomar».

44      Considera que, quando o sinal compreendido pela marca, possui, além do seu sentido geográfico, um outro sentido que prevalece sobre o primeiro, há que atender ao seu significado principal. Uma vez realizada esta avaliação, deve ser aplicado o regime jurídico correspondente. Ora, segundo a recorrente, o termo «palomar» possui um sentido principal, conhecido de todos os consumidores, que é o «local onde se criam pombas».

45      A recorrente invoca o argumento de que o alegado carácter geográfico da palavra «palomar» pode preencher as funções próprias de uma marca. Consequentemente, considera que a decisão recorrida constitui uma interpretação errada do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94. Com efeito, a protecção de um suposto interesse colectivo, que justifica a recusa de marcas que coincidam com indicações geográficas, não pode, segundo a recorrente, ir até à situação absurda que consiste em rejeitar marcas que possuem outros sentidos ou que designam, como acontece no caso vertente, a zona de origem dos produtos em causa.

46      Sétimo, a recorrente alega, no essencial, que é titular de diversas marcas comunitárias – PAGO PALOMAR, ABADIA RETUERTA CUVÉE PALOMAR – que designam vinhos incluídos na classe 33, bem como uma marca espanhola CUVÉE EL PALOMAR – que contém o nome do município «el Palomar» na íntegra.

47      A este respeito, a recorrente invoca a letra do artigo 24.°, n.° 5, do acordo APDIC (v. n.° 3 supra).

48      Ora, segundo ela, a marca espanhola n.° 2.085.129 CUVÉE EL PALOMAR data de 1997, sendo, consequentemente, anterior à protecção do nome do município «el Palomar» no quadro da denominação de origem protegida «Valencia», que foi regulada em 2002.

49      A recorrente considera, por conseguinte, que a validade das marcas CUVÉE EL PALOMAR (registada em 1997) e CUVÉE PALOMAR (por ela solicitada de boa‑fé) não pode ser contestada com o simples fundamento de que estas marcas são semelhantes a uma indicação geográfica reconhecida posteriormente.

50      Além disso, a recorrente sublinha que a marca CUVÉE EL PALOMAR está igualmente protegida em vários países da União Europeia pela marca internacional n.° 699.977, registada em 23 de Setembro de 1998.

51      No que diz respeito à apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual os registos precedentes não são pertinentes, pois é jurisprudência assente que as decisões nacionais não são vinculativas para o IHMI e não o dispensam de aplicara regulamentação comunitária ao caso precisamente estudado, a recorrente contrapõe que a Câmara de Recurso omite que dois dos registos anteriores (a saber, as marcas comunitárias n.° 4.827.978 PAGO PALOMAR e n.° 5.501.978 ABADÍA RETUERTA CUVÉE PALOMAR) foram examinadas pelo próprio IHMI e não são, portanto, decisões nacionais.

52      A recorrente entende que o facto dos institutos das marcas alemão, espanhol, francês, italiano, austríaco ou do Reino Unido terem aceite o registo da marca CUVÉE EL PALOMAR deveria ter sido tomado em conta pelo IHMI como um exemplo claro de que a marca comunitária CUVÉE PALOMAR não recai no âmbito de aplicação de qualquer motivo absoluto de recusa de registo, ainda mais quando o próprio IHMI admitiu o registo das marcas comunitárias PAGO PALOMAR e ABADÍA RETUERTA CUVÉE PALOMAR.

53      Oitavo, a recorrente alega, no essencial, que o IHMI registou marcas como CUVÉE MEDITERRANEO, CUVÉE DU GOLFE DE SAINT‑TROPEZ e CUVÉE OCCITANE.

54      Ora, segundo a recorrente, estas marcas têm uma ligação directa e evidente com uma zona geográfica conhecida no meio vitícola, atendendo a que o público europeu em geral é capaz de identificar geograficamente o Mediterrâneo, o golfo de Saint‑Tropez e a Occitânia.

55      Segundo a recorrente, resulta daqui que a recusa de registar a marca CUVÉE PALOMAR constitui uma ofensa ao princípio da igualdade e uma decisão arbitrária por parte do IHMI.

56      Por último, na audiência, a recorrente invocou, no essencial, o facto de a lista dos v.q.p.r.d. publicada pela Comissão no Jornal Oficial em 2007 não incluir o nome «el Palomar», limitando‑se a indicar a referência das disposições regulamentares nacionais em que esta menção figura. Ora, segundo ela, a publicação da lista no Jornal Oficial constitui uma condição de oponibilidade das denominações geográficas protegidas pelas legislações nacionais. Uma vez que não foi publicada no Jornal Oficial, a indicação geográfica «el palomar» não pode, por conseguinte, ser oponível à recorrente.

57      Além disso, a recorrente alegou, na audiência, que a publicação da lista no Jornal Oficial só foi efectuada em 2007, isto é, posteriormente ao pedido de marca, apresentado em 27 de Novembro de 2006. Ora, o facto gerador da oponibilidade das denominações geográficas protegidas é, segundo ela, a publicação da lista no Jornal Oficial pela Comissão. Consequentemente, caso o Tribunal de Justiça venha a considerar que a publicação, no Jornal Oficial, de uma lista que apenas menciona as referências das disposições regulamentares nacionais onde figura «el Palomar» é suficiente para garantir a publicidade dessa menção, impõe‑se referir que a publicação teve lugar após a entrega do pedido de marca e, portanto, essa denominação geográfica protegida não é oponível à recorrente.

58      O IHMI contesta esta afirmação e entende, no essencial, que a Câmara de Recurso fez uma apreciação correcta dos factos e do direito na decisão recorrida.

 Apreciação do Tribunal

59      O artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 prevê que será recusado o registo de marcas que contenham ou consistam em indicações geográficas que identifiquem vinhos que não possuem essa origem.

60      Para efeitos da aplicação desta disposição, há que determinar o alcance do conceito de «indicação geográfica que identifique vinhos».

61      O Regulamento n.° 40/94 não define o conceito de indicação geográfica destinada a identificar os vinhos.

62      Importa, porém, sublinhar que o artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 foi introduzido pelo Regulamento n.° 3288/94.

63      Com efeito, o quarto considerando do Regulamento n.° 3288/94 precisa que «o n.° 2 do artigo 23.° do Acordo [APDIC] dispõe a recusa ou a nulidade de marcas de vinhos e bebidas espirituosas que contenham ou consistam em indicações geográficas falsas sem exigir que […] sejam susceptíveis de enganar o público» e que «há que aditar uma alínea i) ao n.° 1 do artigo 7.° do Regulamento (CE) n.° 40/94».

64      Ora, imposta recordar que, visto ser parte no acordo APDIC, a Comunidade está obrigada a interpretar a sua legislação sobre as marcas, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade deste acordo (v. acórdão Anheuser‑Busch, já referido no n.° 21 supra, n.° 42 e jurisprudência citada).

65      De acordo com jurisprudência constante, uma disposição de um acordo concluído pela Comunidade com países terceiros deve ser considerada directamente aplicável, sempre que, atendendo aos seus termos bem como ao objecto e à natureza do acordo, se puder concluir que engloba uma obrigação clara, precisa e incondicional que não esteja subordinada, na sua execução ou nos seus efeitos, à intervenção de qualquer acto posterior (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 2000, Dior e o., C‑300/98 e C‑392/98, Colect., p. I‑11307, n.° 42).

66      Todavia, o Tribunal de Justiça declarou, por um lado, que, tendo em atenção a sua natureza e a sua economia, o acordo OMC e os seus anexos não figuram, em princípio, entre as normas tomadas em conta pelo Tribunal para fiscalizar a legalidade dos actos das instituições comunitárias no quadro de recurso de anulação (acórdão Dior e o., já referido no n.° 65 supra, n.° 42) e, por outro, que as disposições do acordo APDIC, que constitui um anexo do acordo OMC, não são susceptíveis de criar, para os particulares, direitos que estes possam invocar directamente num tribunal por força do direito comunitário (acórdão Dior e o., já referido no n.° 65 supra, n.° 43).

67      Resulta desta jurisprudência que, embora as disposições do acordo APDIC não tenham efeito directo, há que interpretar a legislação sobre as marcas, isto é, no caso vertente, o artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade desse acordo.

68      Importa observar que o conceito de «indicação geográfica que identifique vinhos», que figura no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, difere, na versão francesa, da que figura no artigo 23.° do acordo APDIC, citado no n.° 2 supra.

69      Todavia, duas outras línguas fazem fé, nos termos da Acta final que consagra os resultados das negociações comerciais multilaterais do Uruguay Round, assinada em Marraquexe em 15 de Abril de 1994 (JO L 336, p. 253), cujo texto foi redigido em francês, inglês e espanhol.

70      Assim, há que sublinhar que a expressão «geographical indication identifying wines» é utilizada tanto no artigo 23.° do acordo APDIC como no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, na versão inglesa destas disposições.

71      Por outro lado, a expressão «indicación geográfica que identifique el vino» é utilizada na versão espanhola do artigo 23.° do acordo APDIC, e a expressão «indicación geográfica que identifique el vino» na versão espanhola do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94

72      Consequentemente, deve considerar‑se que o artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 visa as indicações geográficas que identifiquem os vinhos e não as indicações geográficas «destinadas a identificar vinhos».

73      A determinação e a protecção das indicações geográficas no que respeita aos vinhos estão estabelecidas no Regulamento n.° 1493/1999, aplicável ratione temporis ao caso vertente.

74      Além disso, o conceito de indicação geográfica que identifique vinhos, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, deve ser lida à luz das disposições pertinentes do direito comunitário em matéria de determinação e de protecção das indicações geográficas no que diz respeito aos vinhos. Consequentemente, há que referir o Regulamento n.° 1493/1999, destinado também a garantir a conformidade da legislação comunitária com as disposições do acordo APDIC, como resulta dos considerandos 56 a 80 desse regulamento.

75      O artigo 50.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1493/1999 diz respeito à protecção das indicações geográficas para os produtos originários dos países terceiros no quadro da aplicação dos artigos 23.° e 24.° do acordo APDIC.

76      Todavia, o artigo 50.°, n.° 2, do referido regulamento apenas define o conceito de indicação geográfica para efeitos da aplicação do n.° 1 desta disposição.

77      Consequentemente, há que referir outras disposições do Regulamento n.° 1493/1999 para determinar o conteúdo do conceito de indicação geográfica na acepção deste regulamento

78      O artigo 47.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1493/1999 dispõe:

«As normas relativas à designação, denominação e apresentação de determinados produtos abrangidos pelo presente regulamento, bem como à protecção de determinadas indicações, menções e termos, constam do presente capítulo e dos anexos VII e VIII.»

79      Nos termos do artigo 47.°, n.° 2, alínea e), do Regulamento n.° 1493/1999, as normas visadas no n.° 1 desse artigo contêm, nomeadamente, disposições que regulam a utilização das indicações geográficas.

80      O ponto A do Anexo VI do Regulamento n.° 1493/1999 prevê o seguinte:

«1.      Por ‘região determinada’ entende‑se uma área ou um conjunto de áreas vitícolas que produzam vinhos com características qualitativas especiais e cujo nome é utilizado para designar os v.q.p.r.d.

2.      Cada região determinada será objecto de uma delimitação precisa, tanto quanto possível com base na vinha ou parcela de vinha. Essa delimitação, que será efectuada por cada um dos respectivos Estados‑Membros, terá em conta os elementos que concorrem para a qualidade dos vinhos produzidos na região em causa e, nomeadamente, a natureza do solo e do subsolo, do clima, e da situação das vinhas ou das parcelas de vinha.

3.      A região determinada é destinada pelo seu nome geográfico […]

4.      A denominação geográfica que designa uma região determinada deve ser suficientemente precisa e estar nitidamente ligada à área de produção, e modo a evitar confusões devidas às situações existentes.»

81      O ponto B, 1, alínea c), primeiro travessão, do Anexo VII do Regulamento n.° 1493/1999 prevê o seguinte:

«A rotulagem dos produtos elaborados na Comunidade pode ser completada com as indicações seguintes, em condições a determinar: […] Para os v.q.p.r.d.: […] a indicação de uma unidade geográfica mais pequena do que a região determinada, segundo regras previstas pelo Estado‑Membro produtor.»

82      O artigo 52.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 1493/1999 precisa que, se Estado‑Membro atribuir o nome de uma região determinada a um v.q.p.r.d., esse nome não pode ser utilizado para a designação de produtos do sector vitivinícola não provenientes dessa região e/ou aos quais não tenha sido atribuído nos termos das regulamentações comunitária e nacional aplicáveis. O mesmo se verifica se um Estado‑Membro tiver atribuído o nome de um município, de uma parte de município ou de um lugar apenas a um v.q.p.r.d.

83      Noutros termos, os Estados‑Membros são competentes, nos termos do Regulamento n.° 1493/1999, para atribuir o nome de um município, de uma parte de município ou de um lugar apenas a um v.q.p.r.d. Nestes casos, esse nome não poderá ser utilizado para designar produtos do sector vitivinícola que não provenham desse município, dessa parte de município ou desse lugar e/ou aos quais não tenha sido atribuído nos termos das regulamentações comunitária e nacional aplicáveis.

84      Por conseguinte, importa concluir que, no quadro da aplicação do Regulamento n.° 1493/1999, cabe aos Estados‑Membros determinar, nos territórios respectivos, as indicações geográficas que pretendem proteger.

85      O artigo 2.°, n.° 1, do novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador, adoptado pelo legislador espanhol, prevê que a protecção conferida por esta denominação de origem se estende à expressão «Valencia» e a todas as denominações das sub‑regiões, municípios, localidades e domínios que compõem as zonas de produção e de envelhecimento enunciadas no artigo 4.°

86      O artigo 4.°, n.° 1, do novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador, conforme modificado pelo Decreto ministerial APA/1815/2002, de 4 de Julho de 2002, prevê que a zona de produção protegida pela denominação de origem «Valencia» é constituída, nomeadamente, pela sub‑região de Clariano, que compreende, entre outros, o município de nome «el Palomar».

87      O nome «el Palomar» constitui, portanto, uma indicação geográfica para um v.q.p.r.d. nos termos da legislação espanhola e, por consequência, do artigo 52.° do Regulamento n.° 1493/1999, o que não é posto em causa pela recorrente, que, de resto, na audiência, confirmou não ter contestado a validade dessa legislação perante os órgãos jurisdicionais espanhóis.

88      Uma vez que constitui, portanto, uma indicação geográfica para um v.q.p.r.d., o nome «el Palomar» constitui, consequentemente, uma indicação geográfica que identifica vinhos na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94.

89      Importa referir que a recorrente não sustenta, por outro lado, que a indicação geográfica «el Palomar» não é utilizada para identificar um vinho produzido no município com esse nome. Com efeito, limita‑se a sustentar, no essencial, que tem o direito de utilizar o nome «Palomar», não obstante a existência da indicação geográfica «el Palomar».

90      Em contrapartida, a recorrente contesta a oponibilidade da indicação geográfica «el Palomar» em razão do facto de a lista publicada pela Comissão no Jornal Oficial em aplicação do artigo 54.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1493/1999, não mencionar «el Palomar» ou «Palomar».

91      A este respeito, o artigo 54.°, n.os 4 e 5, do Regulamento n.° 1493/1999 dispõe, por um lado, que os Estados‑Membros transmitirão à Comissão a lista dos v.q.p.r.d. por si reconhecidos, indicando, em relação a cada um deles, as disposições nacionais aplicáveis à sua produção e elaboração e, por outro, que a Comissão publicará essa lista no Jornal Oficial (série C).

92      Por um lado, deve recordar‑se que o novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador foi publicado no BOE em 3 de Novembro de 2000. o Decreto ministerial APA/1815/2002 foi publicado no BOE em 16 de Julho de 2002.

93      Por outro lado, foi publicada pela primeira vez uma lista dos v.q.p.r.d. no Jornal Oficial, em conformidade com o artigo 54.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1493/1999, em 19 de Fevereiro de 1999 (JO C 46, p. 113).

94      Como recordado no n.° 10 supra, uma nova lista dos v.q.p.r.d. foi publicada pela Comissão no Jornal Oficial em 14 de Abril de 2004. Relativamente a Espanha e à região de Valencia, a referida lista menciona a sub‑região de Clariano, o decreto ministerial de 19 de Outubro de 2000 e o Decreto ministerial APA/1815/2002, bem como as referências de publicação destes dois decretos ministeriais no BOE.

95      Além disso, tal como indicado no n.° 11 supra, novas listas foram posteriormente publicadas pela Comissão no Jornal Oficial, em 2006, e mais tarde, em 2007. Estas listas contêm menções idênticas às que figuram na lista publicada pela Comissão em 2004 no que respeita à região de Valencia e à sub‑região de Clariano.

96      A recorrente não pode, portanto, sustentar que a lista dos v.q.p.r.d. com a menção da indicação geográfica «Clariano» e a referência às disposições pertinentes do direito espanhol só foi publicada pela primeira vez no Jornal Oficial em 2007.

97      Por outro lado, há que considerar que a protecção comunitária das indicações geográficas estabelecida perlo Regulamento n.° 1493/1999 assenta nas indicações geográficas tal como foram determinadas pela legislação dos Estados‑Membros no respeito das disposições pertinentes do referido regulamento. Com efeito, essa protecção não resulta de um processo comunitário autónomo nem mesmo de um mecanismo no termo do qual as indicações geográficas reconhecidas pelos Estados‑Membros tivessem sido aprovadas por uma acto comunitário de carácter vinculativo.

98      As únicas obrigações que decorrem do artigo 54.°, n.os 4 e 5, do Regulamento n.° 1493/1999 são, para os Estados‑Membros, transmitir a lista dos v.q.p.r.d. por si reconhecidos, indicando, em relação a cada um deles, as disposições nacionais que regulam a sua produção e a sua elaboração e, para a Comissão, publicar essa lista na série C – e não na série L – do Jornal Oficial.

99      Uma vez que a protecção das indicações geográficas tem a sua origem na legislação dos Estados‑Membros, a oponibilidade a terceiros das medidas nacionais pelas quais um Estado‑Membro atribui a um v.q.p.r.d. o nome de uma região determinada, ou o nome de um município, de uma parte de um município ou de um lugar, nos termos do artigo 52.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 1493/1999, resulta da publicação dessa disposições no jornal oficial do Estado‑Membro que as adopta.

100    Ora, é dado assente que o novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador, assim como o Decreto ministerial APA/1815/2002, foram publicados no BOE respectivamente em 2000 e em 2002, numa data anterior ao pedido de marca apresentado em 27 de Novembro de 2006.

101    Resulta indicações geográficas do facto de a protecção das indicações geográficas ter a sua origem na legislação dos Estados‑Membros que a publicação da lista dos v.q.p.r.d. e das referências às disposições nacionais na série C do Jornal Oficial da União Europeia constitui apenas uma medida de informação do público sobre a protecção das indicações geográficas instituída por cada um dos Estados‑Membros no quadro da sua legislação nacional.

102    É verdade que a forma adoptada pela Comissão para publicar as informações transmitidas pelo Reino de Espanha não parece de todo eficaz para garantir uma informação plena e inteira do público, na medida em que o nome dos municípios que beneficiam de uma indicação de origem no que respeita, nomeadamente, à região de Valencia e à sub‑região de Clariano – incluindo o nome do município de el Palomar – não figura na lista publicada pela Comissão.

103    Todavia, impõe‑se, por um lado, concluir que esta forma de publicar as informações nacionais respeita as disposições do artigo 54.°, n.° 5, do Regulamento n.° 1493/1999 e, por outro, considerar que não põe em causa a protecção concedida pelo Regulamento n.° 1493/1999 às indicações geográficas que beneficiam de protecção ao abrigo da legislação nacional, incluindo a indicação geográfica «el Palomar».

104    A título exaustivo, deve ainda referir‑se que, nos termos do artigo 8.° do Acordo entre a Comunidade Europeia e a República da África do Sul sobre o Comércio de Vinho (JO 2002 L 28, p. 4), são protegidas, no que respeita aos vinhos originários da Comunidade, as indicações geográficas mencionadas no anexo II.

105    O anexo II («Lista de indicações geográficas») do acordo, ponto A («Indicações geográficas de vinhos originários da Comunidade Europeia»), III («Vinhos originários do Reino de Espanha»), ponto 1 («[v.q.p.r.d.]»], subponto 1.2.48 («Região determinada Valencia»), alínea d) («Sub‑região Clariano»), menciona o nome «Palomar».

106    A menção «Palomar» aparece igualmente nos anexos do Acordo entre a Comunidade Europeia e a Confederação Suíça relativo ao comércio de produtos agrícolas (JO 2002, L 114, p. 132).

107    Cabe observar que estes acordos são anteriores à modificação do artigo 4.°, n.° 1, do novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador pelo Decreto ministerial APA/1815/2002, de 4 de Julho de 2002, que introduziu o nome «el Palomar» em substituição do nome «Palomar».

108    O nome «Palomar» aparece igualmente nos anexos do Acordo entre a Comunidade Europeia e a Austrália sobre o comércio de vinho (JO 1994, L 86, p. 3), o que leva a considerar que a protecção conferida pelo Reino de Espanha à indicação geográfica «el Palomar» é anterior às disposições do novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador, conforme modificado pelo Decreto ministerial APA/1815/2002, de 4 de Julho de 2002.

109    No termo deste exame, importa recordar que, nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo de marcas de vinhos que contenham ou consistam em indicações geográficas que identifiquem vinhos que não têm essa origem.

110    É dado assente que o vinho para o qual a recorrente apresentou um pedido de registo, como marca comunitária, do sinal nominativo CUVÉE PALOMAR não é originário do município de el Palomar mencionado no novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador, publicado no BOE anteriormente ao pedido de registo.

111    Consequentemente, a marca objecto do pedido de registo consiste numa indicação geográfica que identifica um v.q.p.r.d. quando o vinho para o qual a marca é pedida não tem essa origem.

112    Por conseguinte, deve considerar‑se que a Câmara de Recurso teve razão ao considerar que a marca pedida incorria no motivo absoluto de recusa de registo prevista no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94.

113    Esta conclusão não pode ser posta em causa pelos argumentos apresentados pela recorrente como fundamento único do seu recurso.

114    Primeiro, a recorrente alega, no essencial, que, visto uma parte do seu domínio ter o nome de «Palomar», o facto de este nome figurar na marca pedida não constitui uma falsa indicação ou uma indicação errada.

115    Todavia, é indiferente que a referida menção seja correcta, uma vez que a única condição exigida para a aplicação do motivo absoluto de recusa previsto pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 é que o nome do vinho contenha ou seja composto por uma indicação geográfica que identifique um vinho quando aquele vinho não tenha essa origem.

116    Ora, a recorrente reconhece que a parte do seu domínio denominada de «Palomar» não está situada no município de el Palomar mencionado no novo regulamento da denominação de origem protegida «Valencia» e do seu conselho regulador.

117    Por conseguinte, este argumento invocado pela recorrente improcede.

118    Segundo, a recorrente sustenta, no essencial, que, para que a proibição absoluta de registo seja aplicável, o artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 deve ser interpretado no sentido de que implica que a marca pedida contenha ou seja composta por uma indicação geográfica errada que designe vinhos com uma origem diferente daquela que os consumidores associam a essa indicação.

119    Ora, o quarto considerando do Regulamento n.° 3288/94 precisa que o n.° 2 do artigo 23.° do Acordo TRIPS prevê a recusa ou a nulidade de marcas de vinhos e bebidas espirituosas que contenham ou consistam em indicações geográficas falsas, independentemente da condição de serem susceptíveis de enganar o público.

120    Portanto, o motivo de recusa previsto pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 aplica‑se sem que seja necessário atender à questão de saber as marcas cujo registo é pedido são ou não susceptíveis de enganar o público ou se comportam um risco de confusão no que respeita à origem do produto.

121    Por conseguinte, a argumentação da recorrente quanto a este ponto improcede.

122    Terceiro, a recorrente sustenta, no essencial, que a marca pedida não contém o nome «el Palomar», que beneficia da protecção concedida pelo direito espanhol, mas apenas a palavra «palomar». Ora, segundo ela, a homonímia deve ser perfeita para que o motivo absoluto de recusa previsto pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 se aplique. Consequentemente, na inexistência do artigo «el» na marca cujo registo foi pedido, o registo não pode ser recusado pelo IHMI.

123    Importa observar, a título ilustrativo, que, caso procedesse, a argumentação da recorrente conduziria a permitir o registo de uma marca como a «Baux de Provence» ou a «Clos Vougeot», quando existem as indicações geográficas para v.q.p.r.d. «Les Baux de Provence» e «Clos Vougeot».

124    Ora, essa interpretação do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 iria colidir manifestamente com o objectivo de protecção das indicações geográficas para v.q.p.r.d. prosseguido pela regulamentação nacional e pela regulamentação comunitária.

125    Deve considerar‑se que, para aplicar o motivo absoluto de recusa visado no artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, basta que as referidas marcas contenham ou sejam compostas por elementos que permitam identificar com um grau de certeza a indicação geográfica em causa, sem ter que atender aos artigos definidos ou indefinidos que possam eventualmente fazer parte delas.

126    Só assim não seria se a indicação geográfica fosse composta por o nome de um local que incluísse um artigo indissociável desse nome e que lhe desse um significado próprio e autónomo.

127    Ora, no caso vertente, cabe constatar que o nome «el Palomar» não tem significado próprio e autónomo que o distinga do nome «Palomar».

128    Por conseguinte, deve considerar‑se que a marca cujo registo é pedido, isto é, CUVÉE PALOMAR, contém ou é composta por elementos que permitem identificar com um grau de certeza a indicação geográfica «el Palomar», a saber, o nome «palomar».

129    Por conseguinte, o argumento da recorrente segundo o qual o artigo «el» tem uma influência determinante na aplicação, no caso vertente, do motivo absoluto de recusa previsto pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 improcede.

130    Quarto, a recorrente alega, no essencial, que se deve atender ao facto de o nome «el Palomar», que beneficia da denominação de origem protegida pelo direito espanhol, ser desconhecido do grande público ou dos meios interessados e possuir um carácter polissémico que atenua o seu carácter de indicação geográfica.

131    Todavia, na medida em que o registo da marca deve ser recusado pelo simples motivo de que esta marca contém ou é composta por uma indicação geográfica que identifica vinhos quando os vinhos em causa não têm essa origem, decorre daí que o facto de o nome que beneficia de uma denominação de origem protegida ser desconhecido do grande público ou dos meios interessados, ou possuir um carácter polissémico que lhe atenua o carácter de indicação geográfica é indiferente para efeitos da aplicação do motivo absoluto de recusa previsto pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94.

132    Decorre daí igualmente que não pode ser acolhida a argumentação da recorrente de que se deve aplicar, por analogia, a jurisprudência relativa ao artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, nos termos da qual o Tribunal de Justiça considera que não há lugar ao motivo absoluto de recusa desta disposição no caso de marcas compostas por um nome que designa zonas geográficas desconhecidas.

133    Com efeito, essa jurisprudência não é aplicável no que respeita ao motivo absoluto de recusa previsto pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94, porquanto esta disposição não reclama qualquer análise de um eventual risco de confusão.

134    Com efeito, basta que uma marca destinada a identificar um vinho contenha ou seja composta por uma indicação geográfica que identifica vinhos, quando o vinho para o qual o registo da marca foi pedido não tem essa origem, para que o registo seja recusado.

135    Quinto, no que respeita ao argumento da recorrente relativo à inexistência de oposição dos organismos competentes para a defesa da denominação «Valencia», deve considerar‑se que, visto o pedido de marca não ter sido publicado, perante a recusa do registo da marca, os terceiros, entre os quais se contam o conselho regulador da denominação de origem protegida e as administrações central e autónomas, não tiveram necessidade de apresentar observações sobre a marca pedida.

136    Em qualquer dos casos, mesmo admitindo que esses organismos tivessem tido a possibilidade de se opor à marca pedida e não o tenham feito, não se pode deduzir utilmente dessa falta de oposição que a marca é susceptível de ser validamente registada não obstante as disposições do artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94.

137    Sexto, no que respeita ao argumento da recorrente segundo o qual o registo da marca pedida não é mais que o prolongamento comunitário de registos nacionais e internacionais de que dispõe, cabe recordar que, segundo jurisprudência assente, a possibilidade de registo de um sinal como marca comunitária deve ser apreciada apenas com base na regulamentação comunitária pertinente. O IHMI e, se for caso disso, o juiz comunitário não estão vinculados por uma decisão adoptada num Estado‑Membro ou num país terceiro que admita o possibilidade de registo desse mesmo sinal como marca nacional [acórdãos do Tribunal Geral de 27 de Fevereiro de 2002, Streamserve/IHMI (STREAMSERVE), T‑106/00, Colect., p. II‑723, n.° 47, e de 22 de Junho de 2005, Metso Paper Automation/IHMI (PAPERLAB), T‑19/04, Colect., p. II‑2383, n.° 37].

138    Os registos existentes nos Estados‑Membros não são mais do que um facto que pode ser tomado em consideração no âmbito do registo de uma marca comunitária, devendo a marca pedida ser apreciada com base na regulamentação comunitária pertinente. Decorre daqui que o IHMI não é obrigado a tomar como suas as exigências e a apreciação da autoridade competente em matéria de marcas do país de origem nem a registar a marca pedida pelo facto de existir uma decisão de registo do instituto espanhol das marcas (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 125 de Outubro de 2007, Develey/IHMI, C‑238/06 P, Colect., p. I‑9375, n.os 66 a 73).

139    Consequentemente, o facto de se dispor de registos nacionais e internacionais não é de natureza a impedir a recusa do registo de uma marca em aplicação da regulamentação comunitária.

140    Decorre daí que a argumentação da recorrente relativa a este ponto também improcede.

141    Sétimo, no que respeita à alegação da recorrente de que, no essencial, não pode haver obstáculos para o registo da marca CUVÉE PALOMAR porquanto o IHMI aceitou registar as suas marcas PAGO PALOMAR e ABADÍA RETUERTA CUVÉE PALOMAR, cabe recordar que, segundo jurisprudência assente, as decisões relativas ao registo de um sinal como marca comunitária que as Câmaras de Recurso são chamadas a tomar por força do Regulamento n.° 40/94 resultam do exercício de uma competência vinculada e não de um poder discricionário. Assim, a legalidade das referidas decisões das Câmaras de Recurso só deve ser apreciada com base nesse regulamento, na interpretação dada pelo juiz comunitário, e não com base numa prática decisória anterior a essas decisões (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 2007, Alcon/IHMI, C‑412/05 P, Colect., p. I‑3569, n.° 65 e jurisprudência citada).

142    Decorre daqui que a acusação da recorrente não procede.

143    Oitavo, a recorrente sustenta, no essencial, que o artigo 7.°, n.° 1, alínea j), do Regulamento n.° 40/94 deve ser interpretado à luz das disposições pertinentes do acordo APDIC, em especial do seu artigo 24.°, n.° 5. Ora, uma vez que é titular da marca espanhola CUVÉE EL PALOMAR desde 1997, importa ter em conta a anterioridade desta marca relativamente à protecção do nome do município de el Palomar, no quadro da denominação de origem protegida «Valencia», que foi regulada em 2000.

144    No essencial, a recorrente entende que, uma vez que, em aplicação das disposições do artigo 24.° do acordo APDIC, o reconhecimento da denominação de origem protegida em 2000 não invalida a marca nacional CUVÉE EL PALOMAR registada anteriormente e a existência dessa marca nacional anterior permite o registo, solicitado de boa‑fé, da marca CUVÉE PALOMAR, esse registo não pode ser recusado com o simples fundamento de a marca em causa conter uma indicação geográfica reconhecida posteriormente ao registo da marca nacional.

145    Nos termos da jurisprudência recordada nos n.os 64 a 67 supra, embora as disposições do acordo APDIC não sejam de natureza a criar, para os particulares, direitos que estes possam invocar directamente num tribunal por força do direito comunitário há que interpretar o Regulamento n.° 40/94, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade desse acordo.

146    De acordo com o artigo 24.°, n.° 5, do acordo APDIC, nos casos em que uma marca de fabrico ou de comércio tenha sido solicitada ou registada de boa‑fé, antes que a indicação geográfica esteja protegida no seu país de origem, as medidas adoptadas para implementar as disposições da secção 1 do acordo APDIC – onde figura o artigo 24.° – não prejudicarão a habilitação ao registo ou a validade do registo de uma marca de fabrico ou de comércio ou o direito ao uso de uma marca de fabrico ou de comércio, com base no facto de que essa marca ser idêntica ou similar a uma indicação geográfica.

147    Por conseguinte, esta disposição pressupõe que a marca tenha sido solicitada ou registada de boa‑fé antes que a indicação geográfica esteja protegida no seu país de origem, ou que a marca cujo registo é pedido tenha sido usada de boa‑fé antes de a indicação geográfica ser protegida no seu país de origem.

148    No caso vertente, cabe referir que o pedido de registo da marca CUVÉE PALOMAR foi apresentado em 2006, isto é, após a indicação geográfica «el Palomar» estar protegida no seu país pelo novo regulamento da denominação de origem «Valencia» e do seu conselho regulador, conforme modificado pelo Decreto ministerial APA/1815/2002, de 4 de Julho de 2002.

149    Por outro lado, a recorrente não faz prova de que tenha usado, de boa‑fé, o nome CUVÉE PALOMAR antes de a indicação geográfica «el Palomar» estar protegida no país de origem.

150    Por último, mesmo admitindo que a recorrente possa reivindicar o benefício de uma anterioridade no que respeita à sua marca CUVÉE PALOMAR registada em 1997 em Espanha, só pode, contudo, fazê‑lo, sendo caso disso, para esta marca existente, e não para registar novas marcas, inexistentes no momento em que foi decidida a protecção da indicação geográfica, as quais são também compostas por a referida indicação.

151    Por conseguinte, a recorrente não pode reivindicar o benefício do artigo 24.°, n.° 5, do acordo APDIC a fim de obter o registo da marca pedida.

152    A titulo exaustivo, o Tribunal observa que a Comissão publicou uma lista de v.q.p.r.d. no Jornal Oficial de 19 de Fevereiro de 1999, em aplicação das disposições do artigo 1.°, n.° 3, do Regulamento n.° 8323/87. Essa lista menciona o decreto ministerial de 19 de Outubro de 2000 relativo à denominação de origem protegida «Valencia» e ao seu conselho regulador de 13 de Junho de 1987, conforme modificado pelo regulamento de 29 de Novembro de 1995, publicado no BOE em 8 de Dezembro de 1995. Ora, o referido regulamento, conforme modificado, menciona o município de Palomar como fazendo parte da sub‑região de Clariano, que, por seu turno, faz parte da zona geográfica que beneficia da denominação de origem protegida «Valencia». Decorre daí que, em 1995, isto é, antes do registo da marca nacional CUVÉE EL PALOMAR, o município de Palomar constituía uma indicação geográfica protegida pelo direito nacional e o direito comunitário.

153    Nono, no que respeita à argumentação da recorrente segundo a qual, no essencial, o IHMI registou marcas como CUVÉE MEDITERRANEO, CUVÉE DU GOLFE DE SAINT‑TROPEZ e CUVÉE OCCITANE pelo que, consequentemente, nada se opõe a que a marca CUVÉE PALOMAR seja registada, deve referi‑se que a recorrente não demonstrou, nem sequer sustentou, que «Mediterraneo», «Golfe de Saint‑Tropez» e «Occitane» fossem indicações geográficas destinadas a identificar um vinho.

154    Por conseguinte, a argumentação da recorrente é, uma vez mais, desprovida de pertinência e improcede.

155    Resulta do exposto que deve ser negado provimento ao recurso na íntegra.

 Quanto às despesas

156    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

157    Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas efectuadas pelo IHMI, em conformidade com o pedido deste.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Abadía Retuerta, SA é condenada nas despesas.

Azizi

Cremona

Frimodt Nielsen

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 11 de Maio de 2010.

Assinaturas


** Língua do processo: espanhol.