ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

14 de Maio de 2009 ( *1 )

«Livre circulação de mercadorias — Trânsito comunitário — Transportes efectuados ao abrigo de uma caderneta TIR — Infracções ou irregularidades — Prazo de notificação — Prazo para apresentar a prova do lugar onde a infracção ou a irregularidade foi cometida»

No processo C-161/08,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.o CE, apresentado pelo hof van beroep te Antwerpen (Bélgica), por decisão de 8 de Abril de 2008, entrado no Tribunal de Justiça em , no processo

Internationaal Verhuis- en Transportbedrijf Jan de Lely BV

contra

Belgische Staat,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: A. Rosas (relator), presidente de secção, A. Ó Caoimh, J. N. Cunha Rodrigues, U. Lõhmus e A. Arabadjiev, juízes,

advogada-geral: E. Sharpston,

secretário: R. Grass,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Internationaal Verhuis- en Transportbedrijf Jan de Lely BV, por S. Sablon, advocaat,

em representação do Governo belga, por J.-C. Halleux, na qualidade de agente,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por S. Schønberg e F. Ronkes Agerbeek, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada-geral, de julgar o processo sem conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 2.o, n.os 1 a 3, do Regulamento (CEE) n.o 1593/91 da Comissão, de 12 de Junho de 1991, que estabelece as normas de execução do Regulamento (CEE) n.o 719/91 do Conselho relativo à utilização na Comunidade das cadernetas TIR e dos livretes ATA como documentos de trânsito (JO L 148, p. 11, a seguir «regulamento de execução»), em conjugação com o artigo 11.o da Convenção Aduaneira relativa ao Transporte Internacional de Mercadorias ao abrigo de cadernetas TIR, assinada em Genebra, em (a seguir «Convenção TIR»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a sociedade Internationaal Verhuis- en Transportbedrijf Jan de Lely BV (a seguir «Jan de Lely») ao Belgische Staat, relativamente à cobrança de direitos e taxas devidos em razão de um transporte internacional efectuado ao abrigo de uma caderneta TIR.

Quadro jurídico

Disposições aplicáveis ao trânsito TIR

3

O Reino da Bélgica é parte na Convenção TIR, tal como a Comunidade Europeia que a aprovou pelo Regulamento (CEE) n.o 2112/78 do Conselho, de 25 de Julho de 1978 (JO L 252, p. 1; EE 02 F5 p. 46). A referida Convenção entrou em vigor, em relação à Comunidade, em (JO L 31, p. 13).

4

A Convenção TIR prevê, nomeadamente, que as mercadorias transportadas ao abrigo do regime TIR que estabelece não serão sujeitas ao pagamento ou ao depósito de direitos e taxas de importação ou de exportação nas estâncias aduaneiras de passagem.

5

Para a aplicação dessas facilidades, a Convenção TIR exige que as mercadorias sejam acompanhadas, ao longo do seu transporte, de um documento uniforme, a saber, a caderneta TIR, que serve para controlar a regularidade da operação. A Convenção requer igualmente que os transportes tenham lugar com a garantia de associações aprovadas pelas Partes contratantes, em conformidade com as disposições do seu artigo 6.o

6

Assim, o artigo 6.o, n.o 1, da Convenção TIR prevê:

«Sob as condições e garantias que determinar, cada Parte contratante poderá autorizar associações a emitir cadernetas TIR, quer directamente quer por intermédio de associações correspondentes, e a servirem de fiadores.»

7

A caderneta TIR é composta por uma série de folhas que compreendem um talão n.o 1 e um talão n.o 2, com as correspondentes matrizes, nos quais figuram todas as informações necessárias, sendo utilizado um par de talões por cada território atravessado. No início da operação de transporte, o talão n.o 1 é depositado na estância aduaneira de partida. A liquidação ocorre a partir do retorno do talão n.o 2 da estância aduaneira de saída situada no mesmo território aduaneiro. Este procedimento repete-se para cada território atravessado, utilizando os diferentes pares de talões que se encontram na mesma caderneta.

8

Nos termos do artigo 8.o da Convenção TIR:

«1.   A associação responsável comprometer-se-á a pagar os direitos e taxas de importação ou de exportação devidos, acrescidos, se for caso disso, de juros de mora que deveriam ter sido pagos por virtude das leis e dos regulamentos aduaneiros do país em que tiver sido constatada uma irregularidade relativamente a uma operação TIR. A referida associação será responsabilizada, conjunta e solidariamente com as pessoas devedoras das quantias acima mencionadas, pelo pagamento dessas quantias.

2.   Quando as leis e regulamentos de uma Parte contratante não prevejam o pagamento dos direitos e taxas de importação ou de exportação nos casos referidos no parágrafo 1 acima, a associação responsável comprometer-se-á a pagar, nas mesmas condições, uma soma igual ao montante dos direitos e taxas de importação ou de exportação, acrescidos, se for casa disso, dos juros de mora.

3.   Cada Parte contratante determinará a quantia máxima, por caderneta TIR, que poderá ser exigida à associação responsável nos termos das disposições dos parágrafos 1 e 2 acima.

4.   A responsabilidade da associação responsável perante as autoridades do país onde está situada a estância aduaneira de partida, começará a partir do momento em que a caderneta TIR for aceite pela estância aduaneira. Nos países seguintes, atravessados no decorrer de uma operação de transporte de mercadorias ao abrigo do regime TIR, essa responsabilidade começará quando as mercadorias forem importadas […]

[…]

7.   Quando as quantias visadas nos parágrafos 1 e 2 deste artigo se tornarem exigíveis, as autoridades competentes devem, na medida do possível, intimar a (ou as) pessoa(s) directamente responsáveis por essas quantias a efectuar o pagamento antes de apresentarem a reclamação à associação responsável.»

9

O artigo 11.o da Convenção TIR tem a seguinte redacção:

«1.   Quando não tiver sido passado certificado de quitação relativamente a uma caderneta TIR ou quando esse certificado tiver sido passado com reservas, as autoridades competentes não terão o direito de exigir à associação responsável o pagamento das quantias visadas nos parágrafos 1 e 2 do artigo 8.o se, no prazo de um ano, a contar da data em que aceitarem a caderneta TIR, não tiverem avisado, por escrito, a associação da não quitação ou da quitação com reservas. Esta disposição será igualmente aplicável se a quitação tiver sido obtida abusiva ou fraudulentamente, mas, neste caso, o prazo será de dois anos.

2.   O pedido de pagamento das quantias visadas nos parágrafos 1 e 2 do artigo 8.o será dirigido à associação nunca antes de três meses, contados a partir da data em que essa associação tiver sido avisada da não quitação, da quitação com reservas ou da quitação obtida abusiva ou fraudulentamente, e nunca depois de dois anos a contar da mesma data. Todavia, relativamente aos casos que forem apresentados em juízo no prazo de dois anos atrás indicado, o pedido de pagamento será feito no prazo de um ano, a contar da data em que a decisão judiciária se tornou executória.

3.   Para pagar as importâncias exigidas, a associação responsável disporá de um prazo de três meses, a contar da data em que lhe foi feito o pedido de pagamento. A associação obterá o reembolso das quantias pagas se, nos dois anos seguintes à data do pedido de pagamento, se provar, a contento das autoridades aduaneiras, que não foi cometida nenhuma irregularidade relativamente à operação de transporte em causa.»

10

O artigo 19.o da Convenção TIR dispõe:

«As mercadorias e o veículo rodoviário, o conjunto de veículos ou o contentor serão apresentados juntamente com a caderneta TIR na estância aduaneira de partida. As autoridades aduaneiras do país de partida tomarão as medidas necessárias para se assegurarem da exactidão do manifesto das mercadorias e para a aposição dos selos aduaneiros, ou para o controlo dos selos aduaneiros apostos sob a responsabilidade das referidas autoridades aduaneiras por pessoas devidamente autorizadas.»

11

Nos termos do artigo 21.o da mesma Convenção:

«Em cada estância aduaneira de passagem, assim como nas estâncias aduaneiras de destino, o veículo, o conjunto de veículos ou o contentor serão apresentados para controlo às autoridades aduaneiras com o carregamento e a respectiva caderneta TIR.»

12

O artigo 37.o da Convenção TIR enuncia:

«Quando não for possível determinar o território onde a irregularidade foi cometida, considerar-se-á ter sido cometida no território da Parte contratante onde foi constatada.»

Direito comunitário

13

O artigo 1.o do Regulamento (CEE) n.o 719/91 do Conselho, de 21 de Março de 1991, relativo à utilização na Comunidade das cadernetas TIR e dos livretes ATA, enquanto documentos de trânsito (JO L 78, p. 6), estabelece:

«Quando, nos termos das disposições em vigor, o transporte de uma mercadoria de um local para outro da Comunidade for efectuado nos termos do regime do transporte internacional das mercadorias ao abrigo de cadernetas TIR (Convenção TIR), considera-se que a Comunidade, no respeitante às modalidades de utilização da caderneta TIR para efeitos desse transporte, forma um único território, o qual é definido no Regulamento (CEE) n.o 2151/84 do Conselho, de 23 de Julho de 1984, relativo ao território aduaneiro da Comunidade […], com a última redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CEE) n.o 4151/88 […]»

14

O artigo 10.o do Regulamento n.o 719/91 prevê:

«1.   O presente artigo é aplicado sem prejuízo das disposições específicas da Convenção TIR e da Convenção ATA relativas à responsabilidade das associações garantes na utilização da caderneta TIR ou do livrete ATA.

2.   Quando se verificar que durante ou por ocasião de um transporte efectuado ao abrigo de uma caderneta TIR, ou de uma operação de trânsito efectuada ao abrigo de um livrete ATA, foi cometida uma infracção ou uma irregularidade num determinado Estado-Membro, a cobrança dos direitos e demais imposições eventualmente exigíveis será realizada por esse Estado-Membro, nos termos das disposições comunitárias ou nacionais sem prejuízo da aplicação de sanções penais.

3.   Quando não for possível determinar o território em que tenha sido cometida a infracção ou a irregularidade, considerar-se-á que essa infracção ou irregularidade foi cometida no Estado-Membro onde a mesma foi verificada[,] a menos que, num prazo a determinar, seja feita prova suficiente da regularidade da operação ou do lugar onde a infracção [ou a irregularidade] foi efectivamente cometida.

No caso de, por falta de tal prova, se considerar que a referida infracção ou irregularidade foi cometida no Estado-Membro onde a mesma foi verificada, esse Estado cobrará os direitos e outras imposições respeitantes às mercadorias em causa de acordo com as disposições comunitárias ou nacionais.

Se, posteriormente, vier a ser determinado o Estado-Membro onde a referida infracção ou irregularidade foi efectivamente cometida, os direitos e outras imposições — com excepção dos direitos e outras imposições cobrados, nos termos do segundo parágrafo, a título de recursos próprios da Comunidade — respeitantes às mercadorias em causa ser-lhe-ão restituídos pelo Estado-Membro que procedera à sua cobrança inicial. Neste caso, os eventuais excedentes serão reembolsados à pessoa que liquidou inicialmente os direitos ou imposições.

Se o montante dos direitos e outras imposições inicialmente cobrados e restituídos pelo Estado-Membro que tinha procedido à sua cobrança for inferior ao montante dos direitos e outras imposições exigíveis no Estado-Membro onde a infracção ou irregularidade foi efectivamente cometida, este Estado-Membro cobrará a diferença em conformidade com as disposições comunitárias ou nacionais.

Os Estados-Membros tomarão as disposições necessárias para lutar contra quaisquer infracções ou irregularidades e para as punir eficazmente.»

15

O artigo 2.o do regulamento de execução dispõe:

«1.   Quando se verificar que, durante ou aquando de um transporte efectuado ao abrigo da caderneta TIR ou de uma operação de trânsito efectuada ao abrigo de um livrete ATA, foi cometida uma infracção ou uma irregularidade, as autoridades competentes notificá-la-ão ao titular da caderneta TIR ou do livrete ATA e à associação garante no prazo previsto, consoante o caso, no n.o 1 do artigo 11.o da Convenção TIR ou no n.o 4 do artigo 6.o da Convenção ATA.

2.   A prova da regularidade da operação efectuada ao abrigo de uma caderneta TIR ou de um livrete ATA na acepção do n.o 3, primeiro parágrafo, do artigo 10.o do Regulamento (CEE) n.o 719/91 deve ser apresentada no prazo previsto, consoante o caso, no n.o 2 do artigo 11.o da Convenção TIR ou nos n.os 1 e 2 do artigo 7.o da Convenção ATA.

3.   A referida prova pode, nomeadamente, ser apresentada a contento das autoridades competentes de um dos seguintes modos:

a)

Através da apresentação de um documento certificado pelas autoridades aduaneiras, que demonstre que as mercadorias em causa foram apresentadas na estância de destino. Este documento deve comportar a identificação das referidas mercadorias;

b)

Através da apresentação de um documento aduaneiro de introdução no consumo emitido num país terceiro ou da sua cópia ou fotocópia; esta cópia ou fotocópia deve ser certificada conforme, quer pelo organismo que visou o documento original quer pelos serviços oficiais do país terceiro em causa quer ainda pelos serviços oficiais de um dos Estados-Membros. Este documento deve comportar a identificação das mercadorias em causa; ou

c)

No que respeita à Convenção ATA, pelos meios de prova previstos no artigo 8.o da referida convenção.»

16

O Regulamento n.o 719/91 e o regulamento de execução foram revogados, respectivamente, pelo Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de Outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO L 302, p. 1), e pelo Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de , que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento n.o 2913/92 (JO L 253, p. 1), as quais são aplicáveis a partir de .

17

O artigo 454.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 2454/93, na sua versão inicial, prevê:

«Quando não for possível determinar o território em que foi cometida a infracção ou a irregularidade, considerar-se-á que essa infracção ou irregularidade foi cometida no Estado-Membro onde foi verificada, salvo se, no prazo previsto no n.o 1 do artigo 455.o, for apresentada prova, a contento das autoridades aduaneiras, da regularidade da operação ou do local onde a infracção ou a irregularidade foi efectivamente cometida.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

18

Em 26 de Novembro de 1992, a caderneta TIR-TABAK 9445594 foi aceite na kantoor der douane en accijnzen te Antwerpen (Estância Aduaneira e de Impostos Especiais de Consumo de Antuérpia) (Bélgica) para o transporte de cigarros com destino à Macedónia. O titular da caderneta era Jan de Lely. A associação responsável por esse transporte era a Fédération royale belge des transporteurs (Febetra).

19

Em 27 de Novembro de 1992, ou à volta dessa data, o reboque utilizado para esse transporte e o carregamento de cigarros foram roubados em Limburg an der Lahn (Alemanha).

20

Após ter verificado que não tinha sido dada quitação à caderneta TIR, aceite em Antuérpia, o Belgische Staat reclamou os direitos de importação e os impostos especiais de consumo relativos ao referido transporte e ordenou medidas de coacção. A esse propósito, a não quitação da caderneta TIR foi notificada à Febetra, por carta de 4 de Março de 1993.

21

Em contrapartida, foi apenas em 17 de Novembro de 1994 que o titular da caderneta TIR foi avisado da não quitação desta.

22

Jan de Lely deduziu oposição contra as medidas de coacção perante o rechtbank van eerste aanleg te Antwerpen (Tribunal de Primeira Instância de Antuérpia).

23

Perante esse tribunal, Jan de Lely pediu a anulação da referida medida de coacção.

24

No decurso do processo perante o juiz de primeira instância, Jan de Lely apresentou, por um lado, a participação feita em 13 de Fevereiro de 1993 pela polícia municipal de Kerkrade (Países Baixos), da qual resulta que o roubo teve lugar aproximadamente em , na Alemanha, e, por outro, as sentenças proferidas pelo Tribunal de Círculo de Maastricht, no mês de Outubro de 1993, pelas quais os autores do roubo foram condenados.

25

Por decisão com data de 17 de Outubro de 2003, o rechtbank van eerste aanleg te Antwerpen indeferiu o pedido de Jan de Lely.

26

Em seguida, Jan de Lely interpôs recurso de apelação dessa decisão para o hof van beroep te Antwerpen (Tribunal de Apelação de Antuérpia).

27

Nestas circunstâncias, o hof van beroep te Antwerpen decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes três questões prejudiciais:

«1)

O artigo 2.o, n.o 1, do [regulamento de execução], lido em conjugação com o artigo 11.o, n.o 1, da [Convenção TIR], deve ser interpretado no sentido de que o prazo de caducidade previsto no artigo 11.o, n.o 1, da Convenção TIR só se aplica em benefício da associação responsável, mas não em benefício do titular da caderneta, tendo a inobservância do prazo de um ano a contar da aceitação da caderneta TIR, relativamente ao titular da mesma, influência sobre a exigibilidade da dívida aduaneira ou dos impostos especiais sobre o consumo e sobre a sua responsabilidade, e comprometendo o decurso do prazo de um ano o direito de as autoridades aduaneiras competentes procederem à cobrança da dívida?

2)

O artigo 2.o, n.os 2 e 3, do [regulamento de execução], lido em conjugação com o artigo 11.o, n.os 1 e 2, da [Convenção TIR], deve ser interpretado no sentido de que o prazo previsto nessa disposição apenas se aplica à prova da regularidade do transporte, e não à prova do lugar da infracção ou da irregularidade?

3)

O artigo 2.o, n.os 2 e 3, do [regulamento de execução], lido em conjugação com o artigo 11.o, n.os 1 e 2, da [Convenção TIR], deve ser interpretado no sentido de que, na medida em que o prazo previsto na disposição referida também se aplique à prova do lugar da infracção ou da irregularidade, esse prazo não é um prazo de caducidade e o titular da caderneta pode apresentar essa prova mesmo após o termo do referido prazo?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

28

Com a sua primeira questão, o juiz de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução, em conjugação com o artigo 11.o, n.o 1, da Convenção TIR, deve ser interpretado no sentido de que a inobservância do prazo de notificação da não quitação da caderneta TIR em relação ao titular dessa caderneta tem por consequência que as autoridades aduaneiras competentes percam o direito de proceder à cobrança dos direitos e taxas devidos em razão de um transporte internacional de mercadorias efectuado ao abrigo da referida caderneta.

Observações das partes

29

A recorrente no processo principal observa, antes de mais, que resulta expressamente das disposições do artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução, em conjugação com o artigo 11.o, n.o 1, da Convenção TIR, que as autoridades competentes são obrigadas a avisar o titular da caderneta TIR, bem como a associação responsável, da infracção ou da irregularidade, dentro do prazo de um ano a contar da data da aceitação da caderneta TIR. Essa notificação permite ao titular da caderneta TIR comunicar os elementos de prova de que dispõe com vista a determinar rapidamente o Estado encarregado de cobrar os direitos aduaneiros. A recorrente no processo principal precisa, em seguida, que a ultrapassagem desse prazo acarreta a caducidade da exigibilidade da dívida aduaneira se o interessado estiver em condições de apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi efectivamente cometida. Ora, tal acontece no caso do processo principal. Finalmente, sustenta que decorre das disposições da Convenção TIR, em particular, do seu artigo 8.o, n.os 1 e 7, que deve, em primeiro lugar, ser pedido o pagamento ao titular da caderneta TIR antes de o solicitar à associação responsável. Portanto, não é lógico que o crédito esteja prescrito em relação à associação responsável quando não o está em relação ao referido titular.

30

O Governo belga é de opinião que o prazo previsto no artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução remete para o prazo de um ano que corre a partir da data da aceitação da caderneta TIR, como é fixado no artigo 11.o, n.o 1, da Convenção TIR. Segundo esse governo, o prazo previsto no referido artigo 2.o, n.o 1, não deve, contudo, ser considerado como um prazo de caducidade. Com efeito, nem o artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução, nem o seu regulamento de base, concretamente, o Regulamento n.o 719/91, nem outras disposições comunitárias prevêem indicações nesse sentido. Em contrapartida, resulta da própria redacção do artigo 11.o, n.o 1, da Convenção TIR assim como da finalidade desta Convenção que o prazo que prevê é um prazo de caducidade, mas unicamente em relação à associação responsável. A Convenção TIR não diz respeito às modalidades de cobrança das somas devidas ao titular da caderneta TIR.

31

Da mesma forma, a Comissão das Comunidades Europeias considera que o prazo que figura no artigo 11.o, n.o 1, da Convenção TIR é com toda a evidência um prazo de caducidade, quanto à associação responsável. Em contrapartida, tal conclusão não se impõe quando estiverem em causa relações jurídicas entre o titular da caderneta TIR e as autoridades competentes. Com efeito, resulta da redacção das disposições controvertidas, bem como de toda a Convenção TIR, que o titular de uma caderneta TIR está sujeito a um dever de diligência no que se refere ao transporte efectuado ao abrigo da caderneta TIR. Ao invés da associação responsável, o referido titular é, por isso, reputado estar informado de eventuais infracções ou irregularidades cometidas no decurso do transporte e pode, por isso, prever que as autoridades competentes procederão, em relação a si, à cobrança das quantias devidas.

32

A Comissão acrescenta que o prazo de notificação ao titular da caderneta TIR visa muito simplesmente incitar as autoridades competentes a encetar, em tempo oportuno, o procedimento que deve conduzir ao pagamento da dívida aduaneira. Esse prazo protege, por conseguinte, o interesse da Comunidade numa rápida disponibilização dos seus recursos próprios. A ultrapassagem do prazo de notificação em relação ao titular da caderneta TIR não tem, por isso, qualquer incidência sobre a exigibilidade da dívida aduaneira. Tal interpretação corresponde, por outro lado, ao estado da legislação actual em vigor.

Resposta do Tribunal de Justiça

33

Deve observar-se, em primeiro lugar, que, se se verificar, no decurso ou por ocasião de um transporte efectuado ao abrigo de uma caderneta TIR, que foi cometida uma infracção ou uma irregularidade, o prazo de notificação da não quitação de uma caderneta TIR em relação ao titular dessa caderneta é determinado pelo artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução.

34

Nos termos deste artigo 2.o, n.o 1, as autoridades competentes devem notificar a infracção ou a irregularidade ao titular da caderneta TIR e à associação responsável, no prazo previsto no artigo 11.o, n.o 1, da Convenção TIR.

35

O referido artigo 11.o, n.o 1, prevê que as autoridades competentes não terão o direito de exigir à associação responsável o pagamento das quantias visadas nos parágrafos 1 e 2 do artigo 8.o da Convenção TIR se, no prazo de um ano, a contar da data em que aceitarem a caderneta TIR, não tiverem avisado, por escrito, a associação da não quitação (v., a este propósito, acórdão de 19 de Março de 2009, Comissão/Itália, C-275/07, Colect., p. I-2005, n.o 92).

36

Embora daí resulte que o prazo de notificação em relação ao titular da caderneta TIR é de um ano a contar da aceitação da caderneta TIR por essas autoridades (v. acórdão de 5 de Outubro de 2006, Comissão/Países Baixos, C-312/04, Colect., p. I-9923, n.o 50), continua, no entanto, em aberto a questão de saber se a remissão do artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução para o prazo previsto no artigo 11.o, n.o 1, da Convenção TIR incide apenas na própria duração desse prazo ou se, pelo contrário, incide também nas consequências da sua extinção, a saber, que a inobservância do referido prazo acarreta a caducidade da dívida. Com efeito, o referido artigo 11.o, n.o 1, prevê a caducidade da dívida aduaneira em caso de inobservância desse prazo apenas no que se refere à associação responsável.

37

Quanto ao titular da caderneta TIR, deve, antes de mais, observar-se que nem o artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução nem qualquer outra disposição desse regulamento indicam as consequências que podem resultar da inobservância do prazo de notificação (v., neste sentido, acórdão de 14 de Novembro de 2002, SPKR, C-112/01, Colect., p. I-10655, n.o 28).

38

Há que salientar, em seguida, que um regulamento de execução deve ser objecto, se possível, de uma interpretação conforme ao regulamento de base, bem como aos acordos internacionais celebrados pela Comunidade (v., designadamente, acórdãos de 10 de Setembro de 1996, Comissão/Alemanha, C-61/94, Colect., p. I-3989, n.o 52; SPKR, já referido, n.o 29; e de , Petrotub e Republica, C-76/00 P, Colect., p. I-79, n.o 57).

39

Portanto, os efeitos da inobservância do prazo referido no artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução devem ser apreciados tendo em conta o Regulamento n.o 719/91, por um lado, e a Convenção TIR, por outro.

40

Ora, nenhuma disposição do Regulamento n.o 719/91 ou da Convenção TIR permite concluir que a inobservância do prazo de notificação em relação ao titular da caderneta TIR, previsto no artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução, acarrete a extinção da sua dívida e o exonere, por isso, da obrigação de pagar essa dívida (v., neste sentido, acórdão SPKR, já referido, n.o 30).

41

Pelo contrário, como alega justamente a Comissão, resulta da economia da Convenção TIR que, em relação ao titular da caderneta TIR, o prazo de notificação, como resulta do regulamento de execução, não é um prazo de caducidade.

42

Com efeito, as obrigações que a Convenção TIR impõe ao titular dessa caderneta demonstram que o titular da caderneta TIR é reputado estar informado de uma infracção ou de uma irregularidade cometida no decurso de um transporte efectuado sob o regime TIR.

43

Assim, decorre nomeadamente dos artigos 19.o e 21.o da Convenção TIR que o titular da caderneta TIR deve velar pela apresentação do veículo rodoviário e das mercadorias à estância aduaneira de partida e pela apresentação do veículo com a carga e a caderneta a ela atinente em cada estância aduaneira de passagem, bem como na estância aduaneira de destino. Segue-se que o titular da caderneta TIR é, contrariamente à associação responsável, reputado estar ao corrente do desenrolar do transporte ao abrigo dessa caderneta.

44

Nestas condições, a inobservância do prazo de um ano resultante do regulamento de execução não tem nenhuma incidência na própria exigibilidade dos direitos e taxas atinentes ao transporte e não afecta o direito das autoridades competentes de proceder à sua cobrança ao titular da caderneta TIR.

45

Contrariamente ao que sustenta a recorrente no processo principal, a questão de saber se o titular da caderneta TIR, no caso da ultrapassagem do prazo, está em condições de apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi efectivamente cometida é desprovida de pertinência para determinar se esse prazo de notificação é um prazo de caducidade.

46

É verdade que, no acórdão SPKR, já referido, o Tribunal de Justiça foi convidado a interpretar uma disposição que incide igualmente sobre a inobservância de um prazo de notificação, a saber, o estabelecido no artigo 379.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2454/93 e relativo ao regime do trânsito externo. O Tribunal de Justiça declarou, a esse propósito, que a inobservância do prazo de onze meses previsto no referido artigo não exonera o principal responsável da obrigação de pagar uma dívida aduaneira desde que, nomeadamente, o montante dessa dívida lhe tenha sido notificado no prazo de prescrição previsto e que o interessado não tenha estado em condições de apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida, tal como é prevista por outro artigo do mesmo regulamento (v. acórdão SPKR, já referido, n.o 32).

47

Segundo a recorrente no processo principal, resulta desse acórdão que a ultrapassagem do prazo não acarreta a caducidade da exigibilidade da dívida aduaneira se o interessado não conseguiu apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida. Daí deduz, a contrario, que a ultrapassagem desse prazo acarreta a caducidade da exigibilidade dessa dívida se o interessado conseguir apresentar tal prova.

48

Ora, o Tribunal de Justiça, no acórdão SPKR, já referido, julgou no sentido de que a inobservância do prazo de notificação em causa nesse processo não impede, só por si, a cobrança da dívida aduaneira (v. acórdão de 14 de Abril de 2005, Comissão/Países Baixos, C-460/01, Colect., p. I-2613, n.o 60). Com efeito, o Tribunal de Justiça, no n.o 32 do referido acórdão SPKR, lembrou que, após a extinção do prazo de notificação, a exigibilidade dessa dívida fica subordinada a outras condições, tal como, nomeadamente, a falta de prova do local onde a infracção ou irregularidade foi cometida.

49

Ao invés do que sustenta a recorrente no processo principal, o Tribunal de Justiça não associou, por isso, de forma alguma a caducidade do prazo de notificação à possibilidade de apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida.

50

Importa, finalmente, precisar que o objectivo do artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução é assegurar uma aplicação uniforme e diligente das disposições em matéria de cobrança dos direitos e taxas no interesse de uma rápida e eficaz disponibilização dos recursos próprios das Comunidades (v. acórdão de 5 de Outubro de 2006, Comissão/Países Baixos, já referido, n.o 54, e, por analogia, acórdão de , Comissão/Países Baixos, já referido, n.o 60).

51

À luz desse objectivo, o prazo de um ano em relação ao titular da caderneta TIR deve, portanto, como observa a Comissão, ser considerado como constituindo uma regra de processo que se dirige somente às autoridades administrativas com vista a incitá-las a intervir o mais rapidamente possível (v., neste sentido, acórdão SPKR, já referido, n.o 34).

52

Tendo em conta tudo o que precede, há que responder à primeira questão que o artigo 2.o, n.o 1, do regulamento de execução, em conjugação com o artigo 11.o, n.o 1, da Convenção TIR, deve ser interpretado no sentido de que a inobservância do prazo de notificação da não quitação da caderneta TIR em relação ao titular dessa caderneta não tem por efeito que as autoridades aduaneiras competentes percam o direito de proceder à cobrança dos direitos e taxas devidos em razão de um transporte internacional de mercadorias efectuado ao abrigo da referida caderneta.

Quanto à segunda questão

53

Através da sua segunda questão, o juiz de reenvio pergunta se o artigo 2.o, n.os 2 e 3, do regulamento de execução, em conjugação com o artigo 11.o, n.os 1 e 2, da Convenção TIR, deve ser interpretado no sentido de que determina apenas o prazo para a produção da prova da regularidade do transporte e não o prazo para apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida.

Observações das partes

54

A recorrente no processo principal considera que o princípio da segurança jurídica se opõe a que o artigo 2.o, n.os 2 e 3, do regulamento de execução seja interpretado como fixando igualmente o prazo para a produção da prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida.

55

O Governo belga considera, por sua vez, que cabe ao juiz nacional aplicar as disposições nacionais relativas à produção dos elementos de prova, uma vez que o artigo 2.o, n.o 2, do regulamento de execução fixa um prazo apenas para apresentar a prova da regularidade da operação e não para demonstrar o local onde a infracção ou a irregularidade foi efectivamente cometida. Esta interpretação é, aliás, confirmada, por um lado, pelo artigo 2.o, n.o 3, do regulamento de execução que prevê apenas provas que atestem a regularidade do transporte ao abrigo de uma caderneta TIR e, por outro, pela entrada em vigor do artigo 454.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 2454/93 pelo qual o legislador comunitário previu expressamente a partir de então um prazo para apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida.

56

O Governo belga indica que é necessário, de qualquer forma, proceder com alguma flexibilidade a fim de se dar tempo para determinar o local onde se produziu efectivamente a infracção ou a irregularidade.

57

A Comissão é igualmente de opinião que incumbe ao juiz nacional, na falta de uma prazo fixado na legislação comunitária, determinar, segundo os princípios do seu direito nacional aplicáveis em matéria de prova, se, no caso concreto que lhe é submetido e face ao conjunto das circunstâncias, a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida foi feita dentro dos prazos. Na sua apreciação, o juiz nacional deverá ter em conta o facto de que, por um lado, o titular da caderneta TIR não deve estar na impossibilidade material de apresentar a prova supramencionada e que, por outro, o prazo não deve ser demasiado longo a fim de tornar jurídica e materialmente possível a cobrança dos montantes devidos em outro Estado-Membro.

Resposta do Tribunal de Justiça

58

Quanto ao prazo para produzir a prova do local onde a infracção foi cometida, importa lembrar que o artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento n.o 719/91 prevê que, quando não for possível determinar o território em que tenha sido cometida a infracção ou a irregularidade, considerar-se-á que essa infracção ou irregularidade foi cometida no Estado-Membro onde a mesma foi verificada, a menos que, num prazo a determinar, seja feita prova suficiente da regularidade da operação ou do lugar onde a infracção ou a irregularidade foi efectivamente cometida.

59

Ora, o referido artigo 10.o, n.o 3, foi executado pelo artigo 2.o, n.o 2, do regulamento de execução que determina — por remissão para o artigo 11.o, n.o 2, da Convenção TIR — o prazo para apresentar a prova da regularidade da operação. No entanto, o referido artigo 2.o, n.o 2, nada prevê quanto ao prazo aplicável para apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida.

60

Segundo a sua redacção, o artigo 2.o, n.o 2, do regulamento de execução aplica-se, por isso, apenas ao prazo para apresentar a prova da regularidade da operação, e não ao prazo para apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida.

61

Esta conclusão, como observa o Governo belga, é confirmada pela redacção do n.o 3 do mesmo artigo 2.o, que prevê a produção de meios de prova somente no que diz respeito à regularidade do transporte.

62

Cumpre salientar, em seguida, que o artigo 2.o, n.o 2, do regulamento de execução não pode ser interpretado no sentido de que o prazo que nele é previsto corresponde igualmente ao prazo em que a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida deve ser feita.

63

Com efeito, incumbe ao legislador determinar o prazo para apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida. A este propósito, o prazo para apresentar essa prova foi, aliás, posteriormente determinado pelo artigo 454.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 2454/93, a saber, o regulamento de aplicação do Regulamento n.o 2913/92. Todavia, o Regulamento n.o 2454/93 não é, no caso em apreço, aplicável ratione temporis.

64

É verdade que, no que diz respeito à associação responsável, o Tribunal de Justiça, no acórdão de 23 de Setembro de 2003, BGL (C-78/01, Colect., p. I-9543), julgou no sentido de que o prazo de que a associação dispõe para apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida é de dois anos, começando esse prazo a correr a partir da data em que o pedido de pagamento lhe foi dirigido.

65

Todavia, importa observar que, no acórdão BGL, já referido, o Tribunal de Justiça manifestou-se num contexto bem preciso, nomeadamente o dos artigos 454.o e 455.o do Regulamento n.o 2454/93 como eram aplicáveis aos factos que deram origem a esse processo. Ora, como é exposto no n.o 63 do presente acórdão, esses artigos previam explicitamente um prazo para apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida, ao passo que não existe um diploma comunitário neste caso concreto, não sendo os referidos artigos aplicáveis ratione temporis.

66

Como sustentam o Governo belga e a Comissão, não existindo regulamentação comunitária relativa ao prazo para apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida, incumbe ao juiz nacional determinar, segundo os princípios do seu direito nacional aplicáveis em matéria de prova, se, no caso concreto que lhe é submetido e face ao conjunto das circunstâncias, a prova foi feita dentro dos prazos (v., por analogia, acórdão de 23 de Março de 2000, Met-Trans e Sagpol, C-310/98 e C-406/98, Colect., p. I-1797, n.os 29 e 30).

67

Todavia, incumbe ao Tribunal de Justiça indicar certos critérios ou princípios comunitários que devem ser respeitados no exercício dessa apreciação (v., por analogia, acórdão de 10 de Abril de 2008, Marks & Spencer, C-309/06, Colect., p. I-2283, n.o 61).

68

Assim, o juiz nacional deve, em primeiro lugar, ter em conta o facto de que a prova do local onde a infracção ou a irregularidade é cometida tem por objectivo contestar a competência do Estado-Membro que procede à cobrança dos direitos e taxas indicando ao mesmo tempo qual o Estado-Membro competente para reclamar esses direitos, quando a presunção relativa ao local da infracção ou da irregularidade seja ilidida (acórdão BGL, já referido, n.o 54).

69

Esse outro Estado-Membro deve ser determinado rapidamente, a fim de que possa tomar as medidas necessárias para proceder à cobrança dos montantes devidos. O pleno efeito do direito comunitário seria, por isso, prejudicado se o direito nacional previsse um prazo demasiado longo que já não permitisse tornar jurídica e materialmente possível a cobrança dos montantes devidos noutro Estado-Membro (v. acórdão BGL, já referido, n.o 55).

70

Em segundo lugar, deve recordar-se que o respeito dos direitos de defesa, em qualquer processo instaurado contra uma pessoa e susceptível de redundar num acto que lhe cause prejuízo, e nomeadamente num processo que pode conduzir a sanções, constitui um princípio fundamental do direito comunitário. Esse princípio exige que qualquer pessoa a quem possa ser aplicada uma sanção seja posta em condições de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista quanto aos elementos retidos para aplicar a sanção e de apresentar qualquer prova pertinente para a sua defesa (v. acórdãos de 21 de Março de 1990, Bélgica/Comissão, dito «Tubemeuse», C-142/87, Colect., p. I-959, n.os 46 e 47; de , Fiskano/Comissão, C-135/92, Colect., p. I-2885, n.os 39 e 40; e BGL, já referido, n.o 52).

71

Daqui resulta que o juiz nacional, quando apreciar o prazo para apresentar a prova do local onde a infracção ou a irregularidade foi cometida num caso como o do processo principal, deve velar por que o titular da caderneta TIR não fique na impossibilidade material de produzir essa prova (v., neste sentido, acórdão BGL, já referido, n.o 66).

72

Tendo em conta o que precede, há que responder à segunda questão que o artigo 2.o, n.os 2 e 3, do regulamento de execução, em conjugação com o artigo 11.o, n.os 1 e 2, da Convenção TIR, deve ser interpretado no sentido de que apenas determina o prazo para a produção da prova da regularidade do transporte e não o prazo em que a prova do local onde foi cometida a infracção ou a irregularidade deve ser feita. Incumbe ao juiz nacional determinar, segundo os princípios do seu direito nacional aplicáveis em matéria de prova, se, no caso concreto que lhe foi submetido e face ao conjunto das circunstâncias, esta última prova foi feita dentro dos prazos. Todavia, o juiz nacional apreciará esse prazo no respeito do direito comunitário e, nomeadamente, tendo em conta o facto de que, por um lado, o prazo não deverá ser demasiado longo, isto para tornar jurídica e materialmente possível a cobrança dos montantes devidos noutro Estado-Membro, e, por outro, que esse prazo não coloque o titular da caderneta TIR na impossibilidade material de produzir a prova supramencionada.

Quanto à terceira questão

73

Tendo em conta a resposta dada à segunda questão, não há que responder à terceira questão.

Quanto às despesas

74

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

1)

O artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 1593/91 da Comissão, de 12 de Junho de 1991, que estabelece as normas de execução do Regulamento (CEE) n.o 719/91 do Conselho relativo à utilização na Comunidade das cadernetas TIR e dos livretes ATA como documentos de trânsito, em conjugação com o artigo 11.o, n.o 1, da Convenção Aduaneira relativa ao Transporte Internacional de Mercadorias ao abrigo de cadernetas TIR, assinada em Genebra, em , deve ser interpretado no sentido de que a inobservância do prazo de notificação da não quitação da caderneta TIR em relação ao titular dessa caderneta não tem por efeito que as autoridades aduaneiras competentes percam o direito de proceder à cobrança dos direitos e taxas devidos em razão de um transporte internacional de mercadorias efectuado ao abrigo da referida caderneta.

 

2)

O artigo 2.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 1593/91, em conjugação com o artigo 11.o, n.os 1 e 2, da Convenção Aduaneira relativa ao Transporte Internacional de Mercadorias ao abrigo de cadernetas TIR, assinada em Genebra, em 14 de Novembro de 1975, deve ser interpretado no sentido de que apenas determina o prazo para a produção da prova da regularidade do transporte e não o prazo em que a prova do local onde foi cometida a infracção ou irregularidade deve ser feita. Incumbe ao juiz nacional determinar, segundo os princípios do seu direito nacional aplicáveis em matéria de prova, se, no caso concreto que lhe foi submetido e face ao conjunto das circunstâncias, esta última prova foi feita dentro dos prazos. Todavia, o juiz nacional apreciará esse prazo no respeito do direito comunitário e, nomeadamente, tendo em conta o facto de que, por um lado, o prazo não deverá ser demasiado longo, isto para tornar jurídica e materialmente possível a cobrança dos montantes devidos noutro Estado-Membro, e, por outro, que esse prazo não coloque o titular da caderneta TIR na impossibilidade material de produzir a prova supramencionada.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.