CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

JULIANE KOKOTT

apresentadas em 28 de Janeiro de 2010 1(1)

Processo C‑533/08

TNT Express Nederland B.V.

contra

AXA Versicherung AG

(pedido de decisão prejudicial apresentado Hoge Raad der Nederlanden)

«Cooperação judiciária em matéria civil – Competência, reconhecimento e execução de decisões – Regulamento (CE) n.° 44/2001 – Âmbito de aplicação – Convenções em matérias especiais celebradas pelos Estados‑Membros – Convenção CMR – Litispendência»





I –    Introdução

1.        Este pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Hoge Raad der Nederlanden diz respeito à relação entre o Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (2), e a Convenção relativa ao contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada, assinada em Genebra em 19 de Maio de 1956 (CMR) (3).

2.        O artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 permite que, em determinadas condições, continuem a ser aplicadas as convenções em que os Estados‑Membros são partes e que, em matérias especiais, regulam a competência judiciária, o reconhecimento ou a execução de decisões. O tribunal de reenvio pretende ver esclarecida a relação que existe entre algumas disposições da Convenção CMR e do Regulamento. A esta questão acrescem as questões de saber se o Tribunal de Justiça tem competência para interpretar a Convenção CMR e, se for esse o caso, de como devem ser interpretadas as disposições sobre litispendência (lis pendens) e sobre execução de decisões estrangeiras previstas no artigo 31.° da mesma convenção.

II – Quadro jurídico (4)

A –    Convenção CMR

3.        A Convenção CMR prevê uma regulamentação especial do contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada e contém quer disposições substantivas quer regras processuais. A Convenção CMR era já reconhecida como convenção especial durante a vigência da Convenção antecessora do Regulamento n.° 44/2001 – a Convenção de Bruxelas de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (5) – no sentido da disposição antecessora do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 (6). A Convenção foi entretanto ratificada por todos os Estados‑Membros.

4.        O artigo 31.° da Convenção CMR prescreve o seguinte:

«1.      Para todos os litígios provocados pelos transportes sujeitos à presente Convenção, o autor poderá recorrer, além das jurisdições dos países contratantes designados de comum acordo pelas partes, para a jurisdição do país no território do qual:

a)      O réu tiver a sua residência habitual, a sua sede principal ou a sucursal ou agência por intermédio da qual se estabeleceu o contrato de transporte, ou

b)      Estiver situado o lugar do carregamento da mercadoria ou o lugar previsto para a entrega,

E só poderá recorrer a essas jurisdições.

2.      Quando num litígio previsto no parágrafo 1 do presente artigo estiver em instância uma acção numa jurisdição competente nos termos desse parágrafo, ou quando tal jurisdição pronunciar sentença em tal litígio, não poderá ser intentada mais nenhuma acção pela mesma causa entre as mesmas partes, a não ser que a decisão da jurisdição perante a qual foi intentada a primeira acção não possa ser executada no país onde é intentada a nova acção.

3.      Quando num litígio previsto no parágrafo 1 do presente artigo uma sentença pronunciada por uma jurisdição de um país contratante se tornou executória nesse país, toma‑se também executória em cada um dos outros países contratantes imediatamente após o cumprimento das formalidades prescritas para esse efeito no país interessado. Essas formalidades não podem comportar nenhuma revisão do caso.

4.      As disposições do parágrafo 3 do presente artigo aplicam‑se às sentenças contraditórias, às sentenças omissas e às transacções judiciais, mas não se aplicam às sentenças somente executórias por provisão nem às condenações em perdas e danos que venham a ser impostas além das despesas contra um queixoso em virtude da rejeição total ou parcial da sua queixa.

[…]

5.        O artigo 47.° da Convenção CMR regula a competência para a interpretação da Convenção:

«Qualquer litígio entre duas ou mais Partes Contratantes acerca da interpretação ou aplicação da presente Convenção, que as Partes não possam resolver por meio de negociação ou outro modo de solução, poderá ser submetido à decisão do Tribunal Internacional de Justiça, a pedido de qualquer das Partes Contratantes interessadas.»

B –    Direito da União Europeia

6.        O primeiro e segundo parágrafos do artigo 351.° TFUE (ex‑artigo 307.° CE) estabelecem o seguinte:

«As disposições dos Tratados não prejudicam os direitos e obrigações decorrentes de convenções concluídas antes de 1 de Janeiro de 1958 ou, em relação aos Estados que aderem à Comunidade, anteriormente à data da respectiva adesão, entre um ou mais Estados‑Membros, por um lado, e um ou mais Estados terceiros, por outro.

Na medida em que tais convenções não sejam compatíveis com os Tratados, o Estado ou os Estados‑Membros em causa recorrerão a todos os meios adequados para eliminar as incompatibilidades verificadas. Caso seja necessário, os Estados‑Membros auxiliar‑se‑ão mutuamente para atingir essa finalidade, adoptando, se for caso disso, uma atitude comum.»

7.        Os considerandos 16, 17 e 25 do Regulamento n.° 44/2001 referem:

«(16) A confiança recíproca na administração da justiça no seio da Comunidade justifica que as decisões judiciais proferidas num Estado‑Membro sejam automaticamente reconhecidas, sem necessidade de recorrer a qualquer procedimento, excepto em caso de impugnação.

(17)      A mesma confiança recíproca implica a eficácia e a rapidez do procedimento para tornar executória num Estado‑Membro uma decisão proferida noutro Estado‑Membro. Para este fim, a declaração de executoriedade de uma decisão deve ser dada de forma quase automática, após um simples controlo formal dos documentos fornecidos, sem a possibilidade de o tribunal invocar por sua própria iniciativa qualquer dos fundamentos previstos pelo presente regulamento para uma decisão não ser executada.

[…]

(25)      O respeito dos compromissos internacionais subscritos pelos Estados‑Membros implica que o presente regulamento não afecte as convenções em que são parte os Estados‑Membros e que incidam sobre matérias especiais.»

8.        O artigo 27.° do Regulamento n.° 44/2001 prevê o seguinte regime para a coordenação das situações em que estejam pendentes ao mesmo tempo os mesmos pedidos em tribunais de vários Estados‑Membros (litispendência):

«1.      Quando acções com o mesmo pedido e a mesma causa de pedir e entre as mesmas partes forem submetidas à apreciação de tribunais de diferentes Estados‑Membros, o tribunal a que a acção foi submetida em segundo lugar suspende oficiosamente a instância, até que seja estabelecida a competência do tribunal a que a acção foi submetida em primeiro lugar.

2.      Quando estiver estabelecida a competência do tribunal a que a acção foi submetida em primeiro lugar, o segundo tribunal declara‑se incompetente em favor daquele.»

9.        O artigo 34.° do Regulamento n.° 44/2001 prevê as seguintes possibilidades de recusa de reconhecimento de uma sentença estrangeira:

«Uma decisão não será reconhecida:

1.      Se o reconhecimento for manifestamente contrário à ordem pública do Estado‑Membro requerido;

[…]

3.      Se for inconciliável com outra decisão proferida quanto às mesmas partes no Estado‑Membro requerido.»

10.      O artigo 35.° do Regulamento n.° 44/2001 acrescenta mais motivos de recusa; o seu n.° 3 prescreve:

«Sem prejuízo do disposto nos primeiros e segundo parágrafos, não pode proceder‑se ao controlo da competência dos tribunais do Estado‑Membro de origem. As regras relativas à competência não dizem respeito à ordem pública a que se refere o ponto 1 do artigo 34.°»

11.      Se, nos termos dos artigos 43.° e 44.°, for interposto um recurso da decisão de executoriedade, são aplicáveis, nos termos do artigo 45.°, n.° 1, do Regulamento n.° 44/2001, os fundamentos de recusa já mencionados.

12.      O artigo 71.° regula a relação do Regulamento n.° 44/2001 com as convenções de que os Estados‑Membros são partes da seguinte forma:

«1.      O presente regulamento não prejudica as convenções em que os Estados‑Membros são partes e que, em matérias especiais, regulem a competência judiciária, o reconhecimento ou a execução de decisões.

2.      Para assegurar a sua interpretação uniforme, o n.° 1 será aplicado do seguinte modo:

a)      O presente regulamento não impede que um tribunal de um Estado‑Membro que seja parte numa convenção relativa a uma matéria especial se declare competente, em conformidade com tal convenção, […];

b)      As decisões proferidas num Estado‑Membro por um tribunal cuja competência se funde numa convenção relativa a uma matéria especial serão reconhecidas e executadas nos outros Estados‑Membros, nos termos do presente regulamento.

Se uma convenção relativa a uma matéria especial, de que sejam partes o Estado‑Membro de origem e o Estado‑Membro requerido, tiver estabelecido as condições para o reconhecimento e execução de decisões, tais condições devem ser respeitadas. Em qualquer caso, pode aplicar‑se o disposto no presente regulamento, no que respeita ao processo de reconhecimento e execução de decisões.»

III – Matéria de facto e questões prejudiciais

13.      Em Abril de 2001, a Siemens Nederland N.V. (a seguir «Siemens») e a TNT Express Nederland B.V. (a seguir «TNT») celebraram um contrato de transporte rodoviário relativo a mercadorias no valor de 103 540 DEM e com um peso de 12 kg a transportar de Zoetermeer, nos Países Baixos, para Unterschleissheim, na Alemanha, onde nunca chegaram. Segundo o tribunal de reenvio, a Convenção CMR era aplicável ao contrato.

14.      Em 6 de Maio de 2002, a TNT intentou contra a AXA Versicherung AG (a seguir «AXA»), seguradora da Siemens, no Rechtbank te Rotterdam, uma acção destinada a obter a declaração de que a TNT não é responsável perante a AXA por quaisquer danos superiores ao limite estabelecido no artigo 23.° da Convenção CMR (8,33 direitos de saque especiais [então correspondentes a 8,98 EUR]) por quilograma de peso). O Rechtbank indeferiu o pedido por decisão de 4 de Maio de 2005. A TNT interpôs recurso desta decisão para o Gerechtshof te ‘s Gravenhage.

15.      A AXA, por sua vez, em 20 de Agosto de 2004, intentou contra a TNT, no Landgericht München I, uma acção de indemnização pelos danos que a sua segurada Siemens sofreu em consequência da perda das mercadorias.

16.      Neste processo, a TNT invocou a excepção de litispendência, nos termos do artigo 31.°, n.° 2, da Convenção CMR. No entanto, o Landgericht considerou‑se competente, porque o pedido de declaração negativa da TNT e o pedido de indemnização apresentado pela AXA, segundo jurisprudência constante do Bundesgerichthof (BGH), não são «a mesma causa» na acepção do artigo 31.°, n.° 2, da Convenção CMR e condenou a TNT, por decisões de 4 de Abril e de 7 de Setembro de 2006, no pagamento de uma indemnização.

17.      Em 6 de Março de 2007, a AXA pediu no Rechtbank Utrecht a declaração de executoriedade das decisões do Landgericht München I nos Países Baixos. Este pedido foi deferido sob a forma de uma providência cautelar em 28 de Março de 2007. O recurso interposto desta decisão ao abrigo do artigo 43.° do Regulamento n.° 44/2001 não obteve provimento.

18.      A TNT manteve a sua pretensão em recurso de cassação interposto para o Hoge Raad. Como fundamento do recurso, alega que o artigo 31.° da Convenção CMR derroga a proibição do controlo da competência do tribunal de origem prevista no artigo 35.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 44/2001. No momento em que foi interposto o recurso de cassação, o Gerechtshof te ‘s‑Gravenhage não tinha ainda decidido o recurso interposto pela TNT da decisão do Rechtbank Rotterdam que indeferiu o seu pedido de declaração negativa.

19.      Neste contexto, o Hoge Raad decidiu apresentar ao Tribunal de Justiça as seguintes questões para decisão a título prejudicial:

1)         O artigo 71.°, n.° 2, proémio e alínea b), segundo parágrafo, do Regulamento (CE) n.° 44/2001 deve ser interpretado no sentido

i)      de que o regime de reconhecimento e de execução do Regulamento (CE) n.° 44/2001 só deve ceder perante o mesmo regime previsto na convenção especial, se este for de aplicação exclusiva, ou

ii)      de que, no caso de serem simultaneamente aplicáveis as condições para o reconhecimento e execução da convenção especial e as do Regulamento (CE) n.° 44/2001, as condições da convenção especial devem ser sempre aplicadas e as do Regulamento (CE) n.° 44/2001 afastadas, mesmo que a convenção especial não seja de aplicação exclusiva relativamente a outras normas internacionais em matéria de reconhecimento e execução?

2)         Para evitar decisões divergentes sobre o concurso de normas referido na primeira questão, o Tribunal de Justiça é competente para a interpretação vinculativa para os órgãos jurisdicionais dos Estados‑Membros da Convenção relativa ao contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada, assinada em Genebra em 19 de Maio de 1956 (a seguir «Convenção CMR»), no que diz respeito à matéria regulada no artigo 31.° dessa convenção?

3)         Em caso de resposta afirmativa à segunda questão e também à primeira questão, alínea (i), o regime de reconhecimento e de execução previsto no artigo 31.°, n.os 3 e 4, da Convenção CMR deve ser interpretado no sentido de que não é de aplicação exclusiva e permite a aplicação de outras normas de execução internacionais que possibilitam o reconhecimento ou a execução, tal como o Regulamento (CE) n.° 44/2001?

Em caso de resposta afirmativa pelo Tribunal de Justiça à primeira questão, alínea (ii), assim como à segunda questão, tendo em vista a apreciação da restante matéria do recurso de cassação, o Hoge Raad submete ainda as seguintes três questões:

4)         No caso de um pedido de declaração de executoriedade, o artigo 31.°, n.os 3 e 4, da Convenção CMR permite ao órgão jurisdicional do Estado Membro requerido verificar se o órgão jurisdicional do Estado de origem dispunha de competência internacional para conhecer do litígio?

5)         O artigo 71.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 44/2001 deve ser interpretado no sentido de que, em caso de concurso do regime da litispendência da Convenção CMR com o do Regulamento (CE) n.° 44/2001, o regime da litispendência previsto na Convenção CMR prevalece sobre o regime da litispendência do Regulamento (CE) n.° 44/2001?

6)         A declaração solicitada no presente processo, nos Países Baixos, e a acção de indemnização intentada na Alemanha referem se à «mesma causa» na acepção do artigo 31.°, n.° 2, da Convenção CMR?

20.      Tomaram posição no presente processo no Tribunal de Justiça a TNT, os governos dos Países Baixos, da República Checa e da Alemanha e a Comissão Europeia.

IV – Apreciação

A –    Observações preliminares

21.      Em caso de danos causados pelo transporte ou de perdas de mercadorias são possíveis acções de ambas as partes: uma acção de indemnização do interessado no transporte (expedidor ou destinatário) e, por outro lado, uma acção do transportador para obter a declaração de que não é responsável pelos prejuízos ou, em qualquer caso, só responde até um certo limite (a chamada acção declarativa negativa).

22.      No entanto, as normas sobre indemnizações da Convenção CMR são interpretadas de forma diferente pelos tribunais dos Estados que são partes dessa Convenção. O grau de culpa de que depende a ultrapassagem do limite de responsabilidade estabelecido no artigo 29.° da Convenção CMR é interpretado umas vezes restritiva, outras, extensivamente (7). Esta situação pode provocar, de parte a parte, uma corrida ao tribunal que siga a interpretação mais favorável (8). A consequência é frequentemente existirem processos paralelos em tribunais de Estados diferentes.

23.      É certo que o artigo 31.°, n.° 2, da Convenção CMR estabelece que, quando já estiver pendente uma acção, não pode ser intentada uma nova acção «pela mesma causa entre as mesmas partes» (princípio da litispendência). Mas como a interpretação deste princípio da litispendência também não reúne o consenso dos tribunais dos Estados contratantes da Convenção (9), não se pode excluir a existência de processos paralelos.

24.      Os tribunais de alguns Estados contratantes da Convenção CMR, como os tribunais alemães, interpretam restritivamente o conceito de «mesma causa». São de opinião de que as acções acima mencionadas não dizem respeito à «mesma causa», pois uma acção é de simples apreciação (negativa) e a outra de condenação. O objectivo da acção de condenação vai para além do pedido de declaração, pelo que não existe identidade do pedido nos dois litígios. Assim, a pendência de uma acção de simples apreciação negativa não obsta a que seja proposta uma acção de indemnização (10).

25.      Assim, o Landgericht München I considerou‑se competente para decidir o pedido de indemnização da AXA embora já estivesse pendente nos Países Baixos o pedido de declaração negativa da TNT.

26.      O Hoge Raad, pelo contrário, é de opinião, em consonância com os tribunais de outros Estados contratantes da Convenção (11), que, segundo o artigo 31.°, n.° 2, da Convenção CMR, uma acção de declaração negativa interposta em primeiro lugar prevalece sobre a acção de indemnização posteriormente interposta. Neste contexto, remete para a jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o princípio da litispendência consagrado no artigo 21.° da Convenção de Bruxelas (12).

27.      No caso vertente, o processo principal encontra‑se já numa fase avançada. Já não se trata simplesmente de saber se o tribunal em que foi proposta a acção de indemnização é competente embora a parte contrária tenha proposto já uma acção de simples apreciação negativa no tribunal de outro Estado‑Membro, pois o Landgericht München I já proferiu uma decisão exequível. Os tribunais neerlandeses têm apenas que decidir se essa decisão deve ser reconhecida e executada nos Países Baixos. Uma das questões centrais do presente processo é saber se a competência do tribunal que proferiu a sentença ainda pode ser discutida.

28.      O artigo 45.°, n.° 1, em conjugação com o artigo 35.°, n.° 3, do Regulamento n.° 44/2001, proíbe a fiscalização da competência do tribunal do Estado de origem como condição do reconhecimento e execução da decisão. Mesmo que o tribunal que proferiu a decisão se tenha considerado competente incorrectamente na perspectiva do tribunal de exequatur, esse facto não pode, nos termos do Regulamento n.° 44/2001, levá‑lo a recusar o reconhecimento. A questão de saber se o artigo 31.° da Convenção CMR exclui essa fiscalização da competência nesta fase do processo carece ainda de esclarecimento no presente processo.

29.      Por conseguinte, para a execução da decisão do Landgericht München I nos Países Baixos é relevante saber como se delimitam entre si os campos de aplicação da Convenção CMR e do Regulamento n.° 44/2001. Só no caso de a Convenção CMR prevalecer sobre o regime do Regulamento sobre reconhecimento e execução é que o tribunal de exequatur poderia provavelmente fiscalizar a competência do tribunal que proferiu a decisão a executar.

B –    Quanto à primeira questão prejudicial

30.      Com a sua primeira questão, o tribunal de reenvio solicita a interpretação do artigo 71.° do Regulamento no que se refere à relação deste com as convenções em que os Estados‑Membros são partes e que, em matérias especiais, regulam a competência judiciária, o reconhecimento ou a execução de decisões (a seguir «convenções especiais»). Em resumo, pretende saber se, para se dar prevalência a uma convenção especial, é necessário que essa convenção seja de aplicação exclusiva.

31.      Para responder a esta questão é necessário fazer algumas observações gerais sobre o sentido do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001.

32.      Como, com razão, observou o advogado‑geral G. Tesauro no processo Tatry, a disposição anterior correspondente, o artigo 57.° da Convenção de Bruxelas, é uma disposição especial de coordenação entre a Convenção de Bruxelas e o Regulamento n.° 44/2001, por um lado, e as anteriores convenções dos Estados‑Membros relativas à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução das decisões em domínios especiais, por outro (13).

33.      O artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 permite a aplicação destas convenções em que os Estados‑Membros são partes, ao restringir o âmbito de aplicação do Regulamento sob determinadas condições.

34.      Como declarou o Tribunal de Justiça no acórdão Tatry, o objectivo desta excepção é o de fazer respeitar as regras de competência previstas em convenções especiais, pois essas regras foram aprovadas tendo em conta as especificidades das matérias que regulam (14). Como aliás resulta do considerando 25 do Regulamento n.° 44/2001, o artigo 71.° do Regulamento visa permitir aos Estados‑Membros respeitar os seus compromissos internacionais.

35.      Contudo, há uma certa tensão entre esta restrição do âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001 e a pretensão essencial de validade do direito da União e do seu primado sobre o direito interno dos Estados, incluindo os tratados de que os Estados‑Membros são partes. Para ter em conta a pretensão de validade do Regulamento, ele deve ser sempre aplicado quando não estiver em contradição com uma convenção especial. As restrições ao âmbito de aplicação do Regulamento devem portanto ser interpretadas restritivamente e apenas devem ser admitidas quando o respeito pelas convenções especiais assim o exija.

36.      Do que precede resultam duas consequências:

–        O artigo 71.° do Regulamento só reconhece o primado a disposições do direito internacional pontualmente e relativamente a questões reguladas nos acordos especiais (15). Se a Convenção não regular uma matéria ou só a regular incompletamente, aplicam‑se as disposições do Regulamento, eventualmente a título subsidiário.

–        Mesmo que determinada matéria esteja regulada numa convenção, se esse regime não for exclusivo, mas apenas subsidiário ou supletivo relativamente a outros regimes, as disposições do Regulamento não são afastadas (16). Pelo contrário, podem ser aplicadas em vez das disposições da convenção especial.

37.      Estes princípios encontraram também a sua expressão nas disposições do artigo 71.°, n.° 2, do Regulamento, que em certa medida constituem disposições de aplicação ou de concretização do n.° 1 do mesmo artigo (17).

38.      Resulta assim do artigo 71.°, n.° 2, alínea b), segundo parágrafo, que as disposições da Convenção sobre reconhecimento e execução também são aplicáveis quando a competência para a decisão resultar de uma convenção especial. É certo que uma convenção que contém normas sobre competência judiciária se aplica em vez das disposições do capítulo II do Regulamento n.° 44/2001. Mas daí não resulta o afastamento total do Regulamento, com a consequência de que para as matérias não reguladas na Convenção (em especial, as matérias de reconhecimento e execução) fosse possível aplicar o direito interno dos Estados. Pelo contrário, continuam a ser aplicáveis as disposições do Regulamento sobre reconhecimento e execução – sem prejuízo do segundo parágrafo dessa disposição.

39.      O artigo 71.°, n.° 2, alínea b), segundo parágrafo, tem uma importância central para o caso em apreço. Segundo o primeiro período desta disposição, se uma convenção relativa a uma matéria especial, de que sejam partes o Estado‑Membro de origem e o Estado‑Membro requerido, tiver estabelecido as condições para o reconhecimento e execução de decisões, tais condições devem ser respeitadas. Desta formulação resulta, a contrario, que o Regulamento pode ser aplicado se tal convenção não regular essa matéria ou só a regular parcialmente.

40.      No entanto, a letra da disposição não esclarece completamente se o regime da convenção especial deve também ser de aplicação exclusiva. No entanto, uma vez que as restrições ao âmbito de aplicação do Regulamento devem ser interpretadas restritivamente, seria contrário aos seus objectivos que as suas disposições não se aplicassem mesmo que as convenções especiais não exijam imperativamente que apenas se apliquem as suas disposições (18).

41.      A favor de uma interpretação restritiva do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 em matéria de reconhecimento e execução está também o princípio do favor executionis (19), princípio fundamental do Regulamento. Assim, o Tribunal de Justiça salientou no acórdão Tatry que o objectivo da Convenção de Bruxelas consiste «em reforçar na Comunidade a protecção jurídica das pessoas estabelecidas no seu território e em facilitar o reconhecimento das decisões a fim de garantir a sua execução» (20).

42.      Se a convenção em causa não exigir que a decisão estrangeira apenas possa ser executada nas condições previstas na própria convenção, mas deixar a alternativa de aplicação de outras disposições, o princípio do favor executionis implica que possam ser aplicadas as regras mais favoráveis à execução.

43.      Deste ponto de vista, as regras do Regulamento n.° 44/2001 normalmente facilitam mais a execução do que as convenções internacionais. Com base no princípio da confiança recíproca, que está na base da cooperação estreita dos tribunais dos Estados‑Membros, o Regulamento estabelece, em geral, em matéria de reconhecimento e execução, menores exigências do que as previstas nos instrumentos internacionais. Consequência disto é, por exemplo, o facto de, nos termos do artigo 35.°, n.° 3, do Regulamento, não poder proceder‑se ao controlo da competência dos tribunais do Estado de origem.

44.      Tendo em conta as observações que precedem, deve dar‑se a seguinte resposta à primeira questão prejudicial:

O segundo parágrafo da alínea b) do n.° 2 do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 deve ser interpretado no sentido de que as suas disposições que estabelecem as condições de reconhecimento e execução de decisões de tribunais de outro Estado‑Membro só podem ser afastadas por disposições correspondentes de convenções especiais de que sejam partes o Estado de origem e o Estado requerido se as disposições da convenção forem completas e exclusivas, no sentido de que obstam à aplicação do Regulamento.

C –    Quanto à segunda questão prejudicial

45.      Com a sua segunda questão prejudicial, o Hoge Raad pretende saber se o Tribunal de Justiça tem competência para a interpretar a Convenção CMR. Vista mais de perto, esta questão tem duas vertentes.

46.      Por um lado, visa esclarecer se o Tribunal de Justiça, no quadro da aplicação do artigo 71.°, n.° 2, alínea b), segundo parágrafo, do Regulamento, pode apreciar a Convenção CMR para determinar o âmbito de aplicação do Regulamento.

47.      Por outro lado, com esta questão o Hoge Raad tem ainda outro objectivo, que é o de esclarecer se o Tribunal de Justiça pode interpretar, em geral, uma convenção de que os Estados‑Membros são partes para conseguir uma interpretação uniforme das disposições sobre litispendência da Convenção e do Regulamento n.° 44/2001.

48.      Se, no entanto, resultasse de análise mais aprofundada que a Convenção CMR não estabelece regras de reconhecimento e execução que afastem as disposições do Regulamento, a segunda vertente da questão prejudicial teria um carácter hipotético. Pois, nesse caso, os tribunais dos Países Baixos, nos termos do artigo 35.°, n.° 3, do Regulamento n.° 44/2001, não teriam competência para controlar a competência do tribunal de origem. Nesse caso também não haveria lugar a apreciar a questão de saber se esse tribunal interpretou correctamente o princípio da litispendência consagrado no artigo 31.° da Convenção CMR.

49.      Para se determinar se a Convenção CMR contém disposições que afastem a aplicação das disposições sobre reconhecimento e execução do Regulamento só pode resultar da sua interpretação. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça tem de se pronunciar sobre a questão de saber se lhe cabe ele ou aos tribunais nacionais proceder a essa interpretação. Da resposta a esta questão depende portanto a questão de saber se o Tribunal de Justiça pode interpretar directamente a Convenção CMR ou se apenas pode interpretar o Regulamento em conexão com a Convenção CMR.

1.      Convenções de que a União é parte

50.      Segundo o artigo 267.° TFUE (ex‑artigo 234.° CE), o Tribunal de Justiça é competente para decidir sobre a interpretação dos Tratados e sobre a validade e a interpretação dos actos adoptados pelas instituições, os órgãos ou os organismos da União; segundo jurisprudência constante, incluem‑se nos actos adoptados pelas instituições também as convenções internacionais de que a União se tenha tornado parte, segundo o processo previsto no artigo 218.° TFUE (ex‑artigo 300.° CE). Estas convenções são parte integrante da ordem jurídica da União e, neste âmbito, o Tribunal de Justiça tem competência para interpretar o direito por via de pedido de decisão prejudicial (21).

51.      A União, enquanto tal, não é parte na Convenção CMR, mas apenas os Estados‑Membros, pelo que a competência do Tribunal de Justiça para interpretar esta Convenção não se pode fundar directamente na participação da União nesta.

2.      Existe analogia com os Tratados mistos?

52.      A Convenção CMR também não é uma convenção mista – uma convenção que, devido a existir uma competência partilhada dos Estados‑Membros e da União relativamente às matérias reguladas, é concluída pelos Estados‑Membros e pela União. Todavia, o tribunal de reenvio, invocando o acórdão Hermès (22), que versou a questão da interpretação do Acordo sobre os aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio (TRIPs), interroga‑se se não existe analogia com a competência interpretativa no quadro dos tratados mistos.

53.      Os tratados mistos são, em qualquer caso, tratados da União, que o Tribunal de Justiça pode interpretar no quadro das competências da União (23). Simplesmente, nem sempre é possível distinguir claramente os respectivos âmbitos de competência. Assim, o Tribunal de Justiça, na sua jurisprudência sobre o artigo 50.° do TRIPS, reconheceu que pode interpretar esta disposição sobre o processo de medidas provisórias de protecção dos direitos da propriedade intelectual se as medidas se destinarem a ser aplicadas concretamente não para protecção de uma marca comunitária mas de uma marca nacional (24). O Tribunal de Justiça fundamentou a sua decisão no facto de, independentemente do tipo de marca, existirem as mesmas disposições nacionais para transposição do artigo 50.° da Convenção TRIPS, sendo portanto desejável a sua interpretação uniforme (25).

54.      O tribunal de reenvio interroga‑se sobre se o Tribunal de Justiça pode interpretar o princípio da litispendência da Convenção CMR, embora ele não esteja previsto numa convenção da União. Da mesma forma, pode existir a necessidade de proceder a uma interpretação uniforme do artigo 31.° da Convenção CMR e do artigo 27.° do Regulamento n.° 44/2001.

55.      O Tribunal de Justiça salientou no acórdão Hermès que existe um verdadeiro interesse comunitário em que, para evitar divergências de interpretação futuras, a referida disposição – que é aplicável a uma situação regulada pelo direito interno e pelo direito comunitário – seja interpretada uniformemente, quaisquer que sejam as condições em que se deva aplicar (26).

56.      Mas daqui não se pode inferir que, no plano no direito da União, os regimes da litispendência da Convenção CMR e do Regulamento n.° 44/2001 devam ser uniformemente interpretados. Pois, no caso do Acordo TRIPS, trata‑se de um acordo de que a União é parte. As suas disposições foram transpostas para o direito da União, de modo que a sua interpretação nesse contexto é importante.

57.      Pelo contrário, a Convenção CMR e o Regulamento n.° 44/2001 são instrumentos jurídicos diferentes, que, nos termos do artigo 71.° do Regulamento, são independentes um do outro: o Regulamento não prejudica as disposições da Convenção CMR sobre competência judiciária. Ao contrário do domínio TRIPS ou do direito da concorrência (27), no caso da relação aqui em causa entre o Regulamento n.° 44/2001 e a Convenção CMR não existe qualquer sobreposição entre as disposições que se aplicam a situações reguladas pelo direito da União Europeia e as que estão fora do âmbito de aplicação do direito da União Europeia. Por conseguinte, não existe um interesse comparável da União numa interpretação uniforme das disposições aplicáveis que poderia justificar a extensão da competência interpretativa do Tribunal de Justiça às disposições da Convenção CMR.

3.      Interpretação de Convenções de que a União não faz parte.

58.      As convenções que só foram celebradas pelos Estados‑Membros, não integram normalmente a ordem jurídica da União Europeia e não a vinculam (28). Por conseguinte, também não é atribuição do Tribunal de Justiça interpretar essas convenções (29). Existe, no entanto, uma categoria de convenções relativamente às quais o Tribunal de Justiça considerou ter competência interpretativa, embora não tenham sido celebradas pela União (ou pela então Comunidade Europeia).

a)      Competência interpretativa em consequência de sucessão funcional

59.      O Tribunal de Justiça considerou, a título excepcional, ter competência interpretativa relativamente ao Acordo GATT então em vigor («GATT 1947») antes de a Comunidade aderir à OMC. Fundamentou essa sua competência no facto de a Comunidade, mesmo não sendo subscritora do Tratado, ter ficado investida nas obrigações dos Estados‑Membros decorrentes desse Acordo. As competências respectivas foram transmitidas pelos Estados‑Membros nos artigos 11.° e 113.° do Tratado CEE. Designadamente, a Comunidade passou a partir de então a celebrar os acordos em matéria aduaneira e comercial, com base no artigo 114.° do Tratado CEE, «em nome da Comunidade» (30).

60.      Com efeito, em matéria de processo civil internacional, a Comunidade tem competência, nos termos do artigo 81.°, n.° 2, alínea a), TFUE (ex-artigo 65.° CE), para tomar medidas destinadas a assegurar o reconhecimento mútuo entre os Estados‑Membros das decisões judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial e a respectiva execução. Além disso, o Tribunal de Justiça declarou no seu parecer 1/03 que a União tem competência externa exclusiva para a celebração de acordos internacionais neste domínio (31).

61.      No entanto, a Convenção CMR regula as questões de processo civil apenas incidentalmente. Nela estão em primeiro plano as normas sobre o contrato de transporte de mercadorias por estrada. Mesmo que a União, nesta matéria, por exemplo com base nas disposições sobre transportes (artigos 90.° e segs., TFUE) ou sobre a aproximação de legislações (artigo 114.° TFUE), possa ter uma competência concorrente, não se vê que já a tenha utilizado amplamente. A sucessão funcional da União nas competências dos Estados‑Membros no domínio da Convenção CMR está portanto, desde logo, excluída (32).

62.      Aliás, como já expus mais detalhadamente nas minhas conclusões no processo Intertanko (33), é duvidoso – independentemente do âmbito das competências da União – que a simples atribuição de competências seja suficiente para estabelecer uma ligação entre as obrigações internacionais dos Estados‑Membros e uma correspondente competência interpretativa do Tribunal de Justiça. O GATT constitui um caso especial, porque a transmissão das competências em matéria de política comercial foi expressamente prevista no Tratado CEE. Além disso, devido ao facto de o sistema do comércio mundial ter um carácter evolutivo, existia uma necessidade especial dessa transmissão funcional de competências.

63.      Pelo contrário, a Convenção CMR, que prevê normas de processo civil, só foi celebrada pelos Estados‑Membros. Não tem um carácter tão evolutivo como o GATT.

64.      No domínio da competência judiciária e do reconhecimento e execução de sentenças judiciais, sobretudo o artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 opõe‑se a que a União seja colocada na posição dos Estados‑Membros como parte em convenções em domínios especiais. Com efeito, segundo esta disposição, as convenções em que sejam partes os Estados‑Membros continuam a ser aplicáveis, apesar da actividade legislativa da União.

b)      Competência para interpretar o direito consuetudinário internacional consagrado em convenções internacionais

65.      O Tribunal de Justiça tem também competência para interpretar as disposições de tratados internacionais que a União não subscreveu, se eles forem a expressão de normas consuetudinárias do direito internacional geral vinculativas para a União e, por isso, puderem ser invocadas como critério da validade de actos dos órgãos da União (34). Só que as disposições da Convenção CMR não têm essa qualificação.

c)      Competência interpretativa em virtude de atribuição especial

66.      O Tribunal de Justiça é ainda competente para interpretar um acordo internacional que esteja em conexão com o objecto dos Tratados, se as partes contratantes expressamente lhe atribuírem tal competência. Exemplos deste tipo de casos são o Protocolo à Convenção de Bruxelas e o Protocolo à Convenção Europeia sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (35).

67.      A Convenção CMR não prevê expressamente qualquer atribuição de competências ao Tribunal de Justiça; ao invés, o artigo 47.° da Convenção CMR atribui ao Tribunal Internacional de Justiça competência para interpretar as suas disposições. Esta competência refere‑se exclusivamente a litígios entre as partes contratantes e não exclui a competência dos tribunais nacionais para interpretarem a Convenção CMR em casos concretos nem a competência – se for esse o caso – do Tribunal de Justiça da União Europeia.

d)      Competência interpretativa por remissão

68.      Segundo a jurisprudência, o Tribunal de Justiça pode interpretar disposições concretas de convenções internacionais se as normas da União para elas remeterem (36) ou se o direito da União tiver sido aprovado para transpor disposições desses tratados internacionais (37).

69.      O artigo 71.°, não pode, no entanto ser considerado uma norma remissiva desse tipo. Com efeito, o artigo 71.° refere‑se às convenções especiais de que os Estados‑Membros sejam partes, mas nem por isso as suas disposições passaram a integrar o direito da União. Pelo contrário, o artigo 71.° restringe o âmbito de aplicação do Regulamento para permitir que a Convenção continue a ser aplicada enquanto instrumento jurídico dos Estados‑Membros.

70.      O tribunal de reenvio, pelo contrário, parece admitir a inclusão das convenções referidas no artigo 71.° do Regulamento no próprio Regulamento, subscrevendo as declarações do Relatório Schlosser (38), segundo o qual as normas de competência das convenções especiais devem ser consideradas fundamentalmente como regras de competência da Convenção de Bruxelas.

71.      Contudo, esta declaração visa apenas clarificar que as regras de competência previstas em convenções especiais têm o mesmo grau hierárquico das da Convenção de Bruxelas. Uma competência que resulta de uma convenção especial não pode impedir o reconhecimento e execução de uma sentença noutro Estado‑Membro, mesmo que o Estado‑Membro requerido não seja parte dessa convenção especial (39).

72.      Da passagem citada do Relatório Schlosser não decorre portanto que todas as regras das convenções especiais tenham sido incorporadas no Regulamento n.° 44/2001, tornando‑se assim direito da União, o que seria incompatível com a letra do artigo 71.°, segundo o qual o Regulamento não prejudica as convenções especiais.

e)      Conclusão intercalar

73.      Como conclusão intercalar pode portanto declarar‑se que a Convenção CMR não é um tratado internacional que tenha integrado a ordem jurídica da União Europeia, em sentido amplo. Por isso, o Tribunal de Justiça não tem competência directa para interpretar esta Convenção dos Estados‑Membros.

4.      Interpretação do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 à luz das disposições da Convenção CMR

74.      As partes no processo estão de acordo em que o Tribunal de Justiça, no quadro da delimitação dos âmbitos de aplicação, respectivamente, do Regulamento n.° 44/2001 e das convenções especiais dos Estados‑Membros tem de ter competência para analisar o conteúdo das normas dessas convenções especiais.

75.      Assim, no acórdão Tatry, relativo ao artigo 57.° da Convenção de Bruxelas, disposição antecessora do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001, o Tribunal de Justiça analisou a questão de saber se a aplicação da «Convenção Internacional para Unificação das Regras sobre o Arresto de Navios de Mar» era prejudicada pela aplicação da regra da litispendência prevista no artigo 21.° da Convenção de Bruxelas (40). No entanto, o Tribunal de Justiça não fundamentou mais detalhadamente a sua competência para interpretar aquele tratado internacional dos Estados‑Membros.

76.      Considero o procedimento do Tribunal de Justiça substantivamente correcto e partilho igualmente da opinião das partes no presente processo de que o Tribunal de Justiça tem de ter competência para conhecer do conteúdo de uma convenção dos Estados‑Membros num domínio especial, no quadro da aplicação do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001. De contrário, não estaria em condições de determinar o âmbito de aplicação do Regulamento e, dessa forma, de garantir a aplicação uniforme do direito da União.

77.      Contudo, não se trata de uma interpretação originária da convenção internacional de que os Estados‑Membros são partes, mas de uma interpretação do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001, mas de uma interpretação do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 à luz da aplicação pelos tribunais nacionais das disposições daquela convenção. O conteúdo normativo da convenção constitui portanto também a base de facto e de direito da interpretação concreta do direito da União.

78.      O Tribunal de Justiça encontra‑se neste caso numa situação análoga à de um processo prejudicial, em que é colocada a questão da «compatibilidade» de uma disposição interna com o direito da União. Com efeito, nesse contexto processual, o Tribunal de Justiça não tem competência para declarar com força vinculativa qual o conteúdo da disposição interna do Estado‑Membro e, portanto, para a apreciar definitivamente do ponto de vista do direito da União. Pelo contrário, o Tribunal de Justiça interpreta o direito da União na perspectiva de uma norma formulada nos mesmos termos de uma concreta disposição do direito interno do Estado‑Membro.

79.      O que, à primeira vista, parece um puro formalismo, tem no entanto bons fundamentos jurídicos. O Tribunal de Justiça garante assim a competência originária dos tribunais do Estado‑Membro para a interpretação do seu direito interno, incluindo os tratados internacionais celebrados por esse Estado‑Membro. Cabe portanto ao tribunal de reenvio apreciar definitivamente a disposição do direito interno à luz da interpretação fornecida pelo Tribunal de Justiça, não a devendo aplicar, se ela contrariar o direito da União.

80.      Daqui resulta para a questão da interpretação da Convenção CMR que o Tribunal de Justiça pode conhecer o seu conteúdo para efeitos de interpretação do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001. No entanto, a interpretação que o Tribunal de Justiça fizer das disposições pertinentes da Convenção CMR não vincula os tribunais nacionais – mas estes estão obrigados a respeitar a interpretação do artigo 71.° do Regulamento feita pelo Tribunal de Justiça com base na sua interpretação das disposições da Convenção CMR.

81.      Este entendimento da repartição de competências entre o tribunal de reenvio e o Tribunal de Justiça no quadro do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 tem um paralelo na jurisprudência relativa ao artigo 351.° TFUE (ex‑artigo 307.° CE).

82.      Também esta disposição regula a coordenação das obrigações decorrentes de tratados anteriormente celebrados pelos Estados‑Membros com o direito da União. Sobre este aspecto, o Tribunal de Justiça declarou no acórdão Levy (41) que não é ao Tribunal de Justiça, no âmbito de um processo prejudicial, mas ao juiz nacional, que compete verificar quais as obrigações que incumbem, por força de uma convenção internacional anterior, ao Estado‑Membro em causa, e traçar os seus limites, por forma a determinar em que medida essas obrigações impedem a aplicação da legislação da (então) Comunidade.

83.      Na sua jurisprudência sobre o artigo 351.° TFUE, o Tribunal de Justiça declarou o dever de os Estados‑Membros interpretarem dentro do possível os tratados anteriores à sua adesão em conformidade com o direito da União (42). Há que ponderar, portanto, se tal dever de interpretação conforme se aplica também à harmonização dos Tratados dos Estados‑Membros com o Regulamento n.° 44/2001, tal como regulado no seu artigo 71.° Isso pode ser relevante para a questão de saber se a regra de litispendência do artigo 31.° deve ser interpretada em conformidade com o artigo 27.° do Regulamento n.° 44/2001.

84.      As soluções diferentes das normas de conflitos plasmadas no artigo 351.° TFUE e no artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 levam a assumir uma posição contrária à existência de um dever de interpretação conforme no quadro do artigo 71.° do Regulamento.

85.      Sobre este ponto há que considerar, em primeiro lugar, que, segundo jurisprudência constante, o artigo 351.° TFUE, não se aplica às relações entre Estados‑Membros (43). Assim, esta disposição não tem relevância directa para o caso em apreço, em que as disposições da Convenção CMR devem ser aplicadas num processo relacionado com dois Estados‑Membros.

86.      Mas, independentemente disso, o artigo 351.° TFUE não seria aplicável à matéria de facto. Esta disposição parte do pressuposto de que os Estados‑Membros devem assegurar a vigência do TUE e do TFUE, na medida do que for juridicamente possível, adaptando ou eventualmente denunciando as suas obrigações decorrentes de tratados internacionais que sejam incompatíveis com o direito da União (44). A interpretação conforme aparece neste contexto como a obrigação mais minimalista.

87.      Um conflito entre uma obrigação dos Estados‑Membros decorrente de uma convenção internacional – neste caso, da Convenção CMR – e uma obrigação decorrente do direito da União – aqui o Regulamento n.° 44/2001 – como pressupõe o artigo 351.° TFUE, está excluído à partida pela delimitação do âmbito de aplicação do Regulamento no seu artigo 71.° Através desta norma, o legislador deixou intencionalmente subsistir paralelamente o Regulamento e os regimes especiais das convenções mesmo nas relações entre os Estados‑Membros, dando primazia aos regimes especiais (45). Por consequência, não é necessária qualquer adaptação ou uma interpretação conforme das convenções especiais para evitar, dentro do possível, incompatibilidades com o direito da União.

5.      Conclusão sobre a segunda questão prejudicial

88.      Em conclusão, há que responder à segunda questão prejudicial que o Tribunal de Justiça não tem competência para interpretar a Convenção CMR. Mas cabe ao Tribunal de Justiça interpretar o artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 à luz da aplicação pelos tribunais nacionais das disposições da Convenção CMR que são relevantes para a definição do âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001, e, neste contexto, conhecer do conteúdo das disposições da Convenção CMR.

D –    Quanto à terceira e quarta questões

89.      Com a terceira questão, o Hoge Raad pretende saber se os n.os 3 e 4 do artigo 31.° da Convenção CMR não constituem um regime completo de execução de decisões, de modo que possa ser paralelamente aplicado o regime correspondente do Regulamento n.° 44/2001. Esta questão deve ser analisada em conjunto com a quarta questão, que se refere concretamente ao controlo da competência do tribunal do Estado‑Membro de origem como condição possível da execução segundo a Convenção CMR.

90.      À luz da resposta à segunda questão prejudicial, estas questões têm de ser reformuladas. Assim, deve apreciar‑se a questão de saber se as disposições dos n.os 3 e 4 do artigo 31.° da Convenção CMR prevêem um regime incompleto das condições do reconhecimento e execução, no sentido do primeiro período do segundo parágrafo da alínea b) do n.° 2 do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001, de modo que as disposições correspondentes do Regulamento continuam a ser aplicáveis e, especialmente, a que exclui o controlo da competência do tribunal de origem no processo de exequatur.

91.      Segundo o artigo 31.°, n.° 3, da Convenção CMR, uma sentença de um tribunal de um país contratante que se torne executória nesse país, toma‑se também executória em cada um dos outros países contratantes imediatamente após o cumprimento das formalidades prescritas para esse efeito no país interessado. O n.° 4 do artigo 31.° da Convenção CMR precisa ainda a que sentenças se aplica o n.° 3.

92.      O segundo período do n.° 3 do artigo 31.° estabelece ainda, como condição negativa, que essas formalidades «não podem comportar nenhuma revisão do caso» («aucune revision de l’affaire»; «shall not permit the merits of the case to be re‑opened»).

93.      Assim, não parece que as disposições citadas da Convenção CMR prevejam um regime completo das condições da execução, mas parece remeterem para as disposições nacionais. A única condição colocada ao tribunal de exequatur é a proibição da revisão de fundo. Perante a inexistência de outros requisitos na Convenção CMR pode partir‑se do princípio de que a remissão para o «cumprimento das formalidades» no Estado do exequatur se refere em sentido amplo às disposições nele aplicáveis ao reconhecimento e execução das sentenças estrangeiras, isto é, ao processo de exequatur, incluindo a verificação das condições materiais da execução, como a compatibilidade da decisão exequenda com a ordem pública.

94.      Esta opinião é apoiada pelo contexto histórico desta Convenção. No momento em que a Convenção foi celebrada, em 1956, era ainda normal, nalguns Estados contratantes, proceder à revisão de fundo da sentença estrangeira no quadro do seu reconhecimento e execução. Neste contexto, a remissão para as «formalidades exigíveis» deve ser entendida como uma indicação da natureza puramente «formal» da revisão («contrôle de la régularité formelle»), com renúncia à revisão material, expressamente proibida no artigo 31.°, n.° 3, segundo parágrafo, da Convenção CMR (46). As «formalidades exigíveis», neste sentido, são todas as condições do exequatur segundo o direito nacional, com excepção da correcção material da decisão.

95.      Assim, deve partir‑se do princípio de que disposições como as indicadas da Convenção CMR não regulam as condições do exequatur de forma completa. Nos termos do primeiro período do segundo parágrafo do n.° 2 do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001, tais disposições não se opõem à aplicação dos artigos 38.° a 52.° do Regulamento nas relações entre os Estados‑Membros.

96.      Uma vez que o artigo 31.° da Convenção CMR trata das condições do exequatur, o seu regime não é específico da situação do transporte de mercadorias por estrada (47), o que significa que as disposições do Regulamento sobre reconhecimento e execução não são afastadas.

97.      Resta apurar se as disposições como as da Convenção CMR que divergem do artigo 35.°, n.° 3, do Regulamento n.° 44/2001 impõem como condição imperativa do exequatur a verificação da competência do tribunal de origem.

98.      Esta opinião resulta em parte do contexto do artigo 31.°, n.os 1 e 3, da Convenção CMR. Como o artigo 31.° se refere aos litígios previstos no n.° 1, este artigo exige implicitamente que o tribunal de exequatur também verifique a competência do tribunal de origem, regulada no n.° 1 (48). Esta interpretação é fundamentada na necessidade de protecção das partes perante as regras da Convenção CMR sobre exequatur, consideradas excessivas (49).

99.      Parece contudo mais convincente, segundo a letra do artigo 31.° da Convenção CMR, entender a remissão do n.° 3 do artigo 31.° para os litígios referidos no n.° 1 como remissão para «para todos os litígios provocados pelos transportes sujeitos à presente Convenção» (50). Além do mais, o n.° 1 só regula a competência territorial, mas não a proibição da litispendência, regulada no n.° 2.

100. Por conseguinte, as disposições da Convenção CMR não obrigam ao controlo da competência do tribunal de origem. Mas se as disposições internas sobre reconhecimento e execução o previrem, as disposições da Convenção CMR também não o impedem.

101. Na União Europeia, o controlo da competência, nos termos do artigo 35.°, n.° 3, do Regulamento n.° 44/2001, está excluído. De acordo com o artigo 71.°, n.° 2, alínea b), o Regulamento, que é orientado pelo princípio do favor executionis, não é afastado, uma vez que não existe, no presente contexto, uma regulamentação completa alternativa.

102. Há que responder portanto à terceira e à quarta questões que disposições como os n.os 3 e 4 do artigo 31.° da Convenção CMR não constituem uma regulamentação completa das condições do reconhecimento e execução no sentido do primeiro período do segundo parágrafo da alínea b) do n.° 2 do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 e, em especial, não exigem o controlo da competência do tribunal de origem, de modo que são aplicáveis as normas correspondentes do Regulamento n.° 44/2001.

E –    Quanto à quinta e sexta questões

103. Considerando as respostas dadas às questões primeira a quarta, não tem de ser dada uma resposta à quinta e sexta questões, apresentadas a título subsidiário.

V –    Conclusão

104. Com base nas considerações que precedem, proponho que se responda às questões do Hoge Raad da seguinte forma:

1.      O segundo parágrafo da alínea b) do n.° 2 do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, deve ser interpretado no sentido de que as suas disposições que estabelecem as condições de reconhecimento e execução de decisões de tribunais de outro Estado‑Membro só podem ser afastadas por disposições correspondentes de convenções especiais de que sejam partes o Estado de origem e o Estado requerido se as disposições da convenção forem completas e exclusivas, no sentido de que obstam à aplicação do Regulamento.

2.      O Tribunal de Justiça não tem competência para interpretar a Convenção relativa ao contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada (CMR), concluída em Genebra a 18 de Maio de 1956. Mas cabe ao Tribunal de Justiça interpretar o artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 à luz da aplicação pelos tribunais nacionais das disposições da Convenção CMR que são relevantes para a definição do âmbito de aplicação do Regulamento n.° 44/2001, e, neste contexto, conhecer do conteúdo das disposições da Convenção CMR.

3.      Disposições como os n.os 3 e 4 do artigo 31.° da Convenção CMR não constituem uma regulamentação completa das condições do reconhecimento e execução no sentido do primeiro período do segundo parágrafo da alínea b) do n.° 2 do artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001 e, em especial, não exigem o controlo da competência do tribunal de origem, de modo que são aplicáveis as normas correspondentes do Regulamento n.° 44/2001.


1 – Língua original: alemão.


2 – JO L 12, p. 1, na versão aplicável ao caso em apreço, alterada em último lugar pelo Regulamento (CE) n.° 1791/2006 do Conselho, de 20 de Novembro de 2006 (JO L 363, p. 1).


3 – As versões vinculativas da CMR são as versões inglesa e francesa (publicadas no Recueil des traités des Nations unies 1961, n.° 5742, p. 190). A tradução utilizada nestas conclusões é a tradução oficial alemã, publicada em Bundesgesetzblatt 1961 II, p. 1120. A abreviatura oficial «CMR» deriva do título francês da Convenção («Convention relative au contrat de transport international de Marchandises par Route»). [A versão oficial portuguesa aqui reproduzida é a constante do Decreto‑Lei n.° 46235, de 18 de Março de 1965, Diário do Governo, n.° 65, I.ª série, de 18/03/65 – NT].


4 – Uma vez que o Tratado CE foi substituído com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, em 1 de Dezembro de 2009, pelo Tratado da União Europeia (TUE) e pelo Tratado Sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), nestas conclusões citarei as disposições legais com a numeração dos tratados actualmente em vigor, desde que não sejam aplicáveis as disposições do Tratado CE. No que toca à jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às disposições anteriores, parto do princípio que ela é aplicável às novas disposições, desde que não tenham sido substancialmente alteradas. Além disso, passo a utilizar as designações utilizadas nos novos tratados (em especial União em vez de Comunidade).


5 – JO L 1972, L 299, p. 32; versão consolidada in JO L 1998, C 27, p. 1.


6 – V. a lista constante do Relatório sobre as convenções sobre competência judiciária e a execução de decisões judiciais em matéria civil e comercial de P. Jenard (JO 1979 C 59, p. 1, n.° 60).


7 – V. o resumo de Jesser‑Huß, H., Münchener Kommentar zum Handelsgesetzbuch, 2.ª edição, Munique, 2009, artigo 29.° da Convenção CMR, n.os 8 a 13.


8 – V. as conclusões do advogado‑geral junto do Hoge Raad der Nederlanden, Strikwerda, de 5 de Setembro de 2008, juntas aos autos do processo principal, p. 4, n.° 9, com outras remissões.


9 – V. as indicações de Haubold, J., «CMR und europäisches Zivilverfahrensrecht – Klarstellungen zu internationaler Zuständigkeit und Rechtshängigkeit», Praxis des Internationalen Privat‑ und Verfahrensrechts – IPRax 2006, 224, 227 e notas 24 e 25.


10 – BGH, acórdãos de 20 de Novembro, 2003 I ZR 102/02 e I ZR 294/02, consultável em www.bundesgerichtshof.de.


11 – V., por exemplo, os acórdãos do Österreichischer Oberster Gerichtshof (OGH), de 17 de Fevereiro de 2006 (10 Ob 147/05Y) e do Court of Appeal of England and Wales (Reino Unido) de 23 de Janeiro de 2001, Andrea Merzario Ltd contra Internationale Spedition Leitner Gesellschaft GmbH ([2001] EWCA civ. 61, n.os 80 a 98 e 103 a 109).


12 – V. acórdãos de 8 de Dezembro de 1987, Gubisch Maschinenfabrik (144/86, Colect., p. 4861, n.os 14 a 19) e de 6 de Dezembro de 1994, Tatry (C‑406/92, Colect., p. I‑5439, n.os 37 a 45).


13 – Conclusões do advogado‑geral G. Tesauro de 13 de Julho de 1994, Tatry (já referido na nota 12, n.° 8).


14 – Acórdão Tatry (citado na nota 12, n.° 24), que versou sobre o artigo 54.° da Convenção de Bruxelas. Esta declaração pode transpor‑se para o artigo 71.° do Regulamento n.° 44/2001, que tem quase o mesmo teor literal, já que, segundo o considerando 19 do regulamento, há que assegurar a continuidade entre a Convenção de Bruxelas e o regulamento (v. acórdãos de 23 de Abril de 2009, Draka NK Cables e o. (C‑167/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 20) e de 10 de Setembro de 2009, German Graphics (C‑292/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 27).


15 – Neste sentido, acórdão Tatry (já referido na nota 12, n.° 25).


16 – Assim o prevê, por exemplo, o artigo 23.° da Convenção sobre a Lei Aplicável às Obrigações Alimentares, concluída na Haia em 2 de Outubro de 1973 (consultável em www.hcch.net.), que não se opõe à aplicação de normas de outros instrumentos de reconhecimento e execução.


17 – Conclusões do advogado‑geral G. Tesauro no processo Tatry (já referido na nota 12, n.° 8).


18 – Neste sentido, v. o exemplo da Convenção para a Navegação no Reno in Relatório sobre a Convenção relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte à Convenção de P. Schlosser (JO 1979, C 59, p. 71, n.° 243).


19 – V. considerandos 16 e 17.


20 – Acórdão Tatry (já referido na nota 12, n.° 25).


21 – V. acórdãos de 30 de Abril de 1974, Haegeman (181/73, Recueil, p. 449, n.os 2 a 6); de 30 de Setembro de 1987, Demirel (12/86, Colect., p. 3719, n.° 7); de 10 de Janeiro de 2006, IATA e ELFAA (C‑344/04, Colect., p. I‑403, n.° 36); de 3 de Junho de 2008, Intertanko (C‑308/06, Colect., p. I‑4057, n.° 53), e de 22 de Outubro de 2009, Bogiatzi (C‑301/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 23 e segs).


22 – Acórdão de 16 de Junho de 1998, Hermès (C‑53/96, Colect., p. I‑3603).


23 – V. acórdãos Haegeman (já referido na nota 21, n.os 2 a 6); Demirel (já referido na nota 21, n.° 7); Hermès (já referido na nota 22, n.° 29); de 14 de Dezembro de 2000, Dior e o. (C‑300/98 e C‑392/98, Colect., p. I‑11307, n.° 33), e de 30 de Maio de 2006, Comissão/Irlanda (C‑459/03, Colect., p. I‑4635, n.° 84).


24 – Acórdãos Hermès (já referido na nota 22, n.° 32) e Dior e o.(já referido na nota 23, n.os 47 e segs.).


25 – Acórdãos Hermès (já referido na nota 22, n.° 32) e Dior e o.(já referido na nota 23, n.os 47 e segs.).


26 _ Acórdão Hermès (já referido na nota 22, n.° 32).


27 – V. acórdãos de 14 de Dezembro de 2006, Confederación Española de Empresarios de Estaciones de Servicio (C‑217/05, Colect., p. I‑11987, n.° 20), e de 11 de Dezembro 2007, Ente Tabacchi Italiani (C‑280/06, Colect. 2007, p. I‑10893, n.° 26).


28 – Neste sentido, acórdãos de 14 de Julho de 1994, Peralta (C‑379/92, Colect. 1994, p. I‑3453, n.° 16); de 24 de Junho de 2008, Commune de Mesquer (C‑188/07, Colect. p. I‑4501, n.° 85), e ainda o n.° 84 das minhas conclusões de 13 de Março de 2008 nesse processo.


29 – V. acórdãos de 27 de Novembro de 1973, Vandeweghe (130/73, Colect. 1973, p. 515, n.° 2); de 2 de Agosto de 1993, Levy (C‑158/91, Colect., p. I‑4287, n.° 21); Peralta (já referido na nota 27, n.° 16), e Bogiatzi (já referido na nota 21, n.° 24).


30 – Acórdão de 12 de Dezembro de 1972, International Fruit Company (21‑24/72, Recueil, p. 1219, n.os 15 a 18). V. ainda acórdãos Peralta, (já referido na nota 27, n.° 16); Intertanko e o. (já referido na nota 21, n.° 48); Commune de Mesquer (já referido na nota 27, n.° 85), e Bogiatzi (já referido na nota 21, n.° 25).


31 – Parecer 1/03 de 7 de Fevereiro de 2006 (Colect., p. I‑1145).


32 – Neste sentido, acórdãos Intertanko e o. (já referido na nota 21, n.° 49), e Bogiatzi (já referido na nota 21, p. 33).


33 – Conclusões de 20 de Novembro de 2007 no processo Intertanko e o. (já referido na nota 21, n.os 40 e segs.).


34 – Acórdãos de 24 de Novembro de 1992, Poulsen e Diva Navigation (C‑286/90, Colect., p. I‑6019, n.os 9 e segs.); de 16 de Junho de 1998, Racke (C‑162/96, Colect., p. I‑3655, n.° 45), e Intertanko (já referido na nota 21, n.° 51).


35 – V. Protocolo relativo à interpretação pelo Tribunal de Justiça da Convenção de 27 de Setembro de 1968, relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, assinado no Luxemburgo em 3 de Junho de 1971 (JO L 204, p. 28) e o Primeiro Protocolo relativo à interpretação pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias da Convenção sobre a lei aplicável às obrigações contratuais, aberta à assinatura em Roma em 19 de Junho de 1980 (JO 1989, L 48, p. 1).


36 – V. as remissões do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO L 11, p. 1) para a Convenção de Paris para a protecção da propriedade industrial. As disposições desta convenção foram interpretadas pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 11 de Março de 2003, Ansul (C‑40/01, Colect., p. I‑2439, n.os 32 e segs.). Além disso, por exemplo, o artigo 11.° do Regulamento (CE) n.° 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.° 1347/2000 (JO L 338, p. 1) está ligado ao desencadeamento de um processo para obter o regresso de uma criança nos termos da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980 sobre os aspectos civis do rapto internacional de crianças.


37 – Acórdãos de 22 de Junho de 1989, Fediol/Comissão (70/87, Colect., p. 1781, n.° 19), e de 7 de Maio de 1991, Nakajima/Conselho (C‑69/89, Colect., p. I‑2069, n.° 31).


38 – Já referido na nota 18, n.° 240.


39 – V. a excepção relativamente ao reconhecimento e execução de uma sentença proferida com base numa regra de competência apenas reconhecida no Estado Membro de origem, no artigo 57.°, n.° 4, na Convenção relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, celebrada em Lugano em 16 de Setembro de 1988 (JO L 319, p. 9).


40 – Já referido na nota 12, n.° 27.


41 – Acórdão Levy (já referido na nota 28, n.° 21). No acórdão de 18 de Novembro de 2003, Budejovický Budvar (C‑216/01, Colect., p. I‑13617), o Tribunal de Justiça desenvolve extensas considerações sobre a validade de um acordo bilateral (n.os 148 e segs.), deixando no entanto para o tribunal de reenvio a competência para tirar as conclusões definitivas (n.° 163).


42 – V. acórdão Budejovický Budvar (já referido na nota 40, n.° 169).


43 – Acórdão de 22 de Setembro de 1988, Deserbais (286/86, Colect., p. 4907, n.° 8) e Bogiatzi (já referido na nota 21, n.° 19).


44 _ Acórdão de 4 de Julho de 2000, Comissão/Portugal (C‑84/98, Colect., p. I‑5215, n.° 58).


45 _ Em sentido contrário, os artigos 59.° e 60.° do Regulamento n.° 2201/2003 (já referido na nota 36), que concedem a este regulamento primazia sobre os instrumentos de direito internacional nas relações entre Estados‑Membros.


46 – Loewe, R., «Erläuterungen zum Übereinkommen vom 19. Mai 1956 über den Beförderungsvertrag im internationalen Straßengüterverkehr (CMR)», European Transport Law 11 (1976), 503, 583; H. Jesser‑Huß (citado na nota. 7, artigo 31.° CMR, n.° 37).


47 – V. de Meij, P., Samenloop EEX‑Verordening met bijzondere verdragen, Deventer 2003, pp. 251 e 287.


48 – Sobre este ponto, v. as indicações in Messent A. / Glass, D. A., Hill & Messent–CMR: Contracts for the International Carriage of Goods by Road, 3.ª edição, Londres 2000, n.° 10.48 e nota 103.


49 – V. as observações de H. Jesser‑Huß (já referido na nota 7, artigo 31.° CMR, n.° 36 e notas 116 e 117).


50 – Neste sentido, também H. Jesser‑Huß (já referido na nota 7, artigo 31.° CMR, n.° 36).