26.11.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 347/2


Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 4 de Outubro de 2011 [pedidos de decisão prejudicial da High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division (Administrative Court) — Reino Unido] — Football Association Premier League Ltd, NetMed Hellas SA, Multichoice Hellas SA/QC Leisure, David Richardson, AV Station plc, Malcolm Chamberlain, Michael Madden, SR Leisure Ltd, Philip George Charles Houghton, Derek Owen (C-403/08), Karen Murphy/Media Protection Services Ltd (C-429/08)

(Processos apensos C-403/08 e C-429/08) (1)

(Radiodifusão por satélite - Difusão de jogos de futebol - Recepção através de cartões descodificadores de satélite - Cartões descodificadores de satélite legalmente colocados no mercado de um Estado-Membro e utilizados noutro Estado-Membro - Proibição de comercialização e de utilização num Estado-Membro - Visualização de emissões em violação dos direitos exclusivos concedidos - Direitos de autor - Direito de difusão televisiva - Licenças exclusivas para a radiodifusão no território de um só Estado-Membro - Livre prestação de serviços - Artigo 56.o TFUE - Concorrência - Artigo 101.o TFUE - Restrição da concorrência como objecto - Protecção dos serviços de acesso condicional - Dispositivo ilícito - Directiva 98/84/CE - Directiva 2001/29/CE - Reprodução de obras na memória de um descodificador de satélite e num écran de televisão - Excepção ao direito de reprodução - Comunicação ao público das obras em pubs - Directiva 93/83/CEE)

2011/C 347/02

Língua do processo: inglês

Órgão jurisdicional de reenvio

High Court of Justice (England & Wales), Chancery Division, High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division (Administrative Court)

Partes no processo principal

Demandantes: Football Association Premier League Ltd, NetMed Hellas SA, Multichoice Hellas SA (C-403/08), Karen Murphy (C-429/08)

Demandadas: QC Leisure, David Richardson, AV Station plc, Malcolm Chamberlain, Michael Madden, SR Leisure Ltd, Philip George Charles Houghton, Derek Owen (C-403/08), Media Protection Services Ltd (C-429/08)

Objecto

Pedidos de decisão prejudicial — High Court of Justice (Chancery Division), Queen's Bench Division (Administrative Court) — Interpretação dos artigos 28.o, 30.o, 49.o e 81.o CE e dos artigos 2.o, alíneas a) e e), 4.o, alínea a), e 5.o da Directiva 98/84/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Novembro de 1998, relativa à protecção jurídica dos serviços que se baseiem ou consistam num acesso condicional (JO L 320, p. 54), dos artigos 2.o, 3.o e 5.o, n.o 1, da Directiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO L 167, p. 10), do artigo 1.o, alíneas a) e b), da Directiva 89/552/CEE do Conselho, de 3 de Outubro de 1989, relativa à coordenação de certas disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros relativas ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva (JO L 298, p. 23) e interpretação da Directiva 93/83/CEE do Conselho, de 27 de Setembro de 1993, relativa à coordenação de determinadas disposições em matéria de direito de autor e direitos conexos aplicáveis à radiodifusão por satélite e à retransmissão por cabo (JO L 248, p. 15) — Concessão, mediante remuneração, de direitos exclusivos para assegurar a retransmissão por satélite de jogos de futebol — Comercialização, no Reino Unido, de descodificadores, legalmente colocados no mercado de outro Estado-Membro, que permitem visualizar esses jogos em violação dos direitos exclusivos concedidos

Dispositivo

1.

A noção de «dispositivo ilícito», na acepção do artigo 2.o, alínea e), da Directiva 98/84/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Novembro de 1998, relativa à protecção jurídica dos serviços que se baseiem ou consistam num acesso condicional, deve ser interpretada no sentido de que não abrange nem os dispositivos de descodificação estrangeiros — que dão acesso aos serviços de radiodifusão e são fabricados e comercializados com a autorização desse organismo mas são utilizados, à revelia deste, fora da zona geográfica para a qual foram fornecidos — nem os obtidos ou activados mediante a indicação de um nome e de uma morada falsos, nem os que são utilizados em violação de uma limitação contratual de utilização para fins exclusivamente privados.

2.

O artigo 3.o, n.o 2, da Directiva 98/84 não obsta a uma legislação nacional que impede a utilização de dispositivos de descodificação estrangeiros, incluindo os obtidos ou activados mediante a indicação de um nome e de uma morada falsos ou os utilizados em violação de uma limitação contratual de utilização para fins exclusivamente privados, uma vez que essa legislação não é abrangida pelo domínio coordenado por essa directiva.

3.

O artigo 56.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que:

se opõe à legislação de um Estado-Membro que torna ilícita a importação, a venda e a utilização nesse Estado de dispositivos de descodificação estrangeiros que permitem o acesso a um serviço codificado de radiodifusão por satélite proveniente de outro Estado-Membro e que inclui objectos protegidos pela legislação do primeiro Estado,

esta conclusão não é infirmada nem pelo facto de o dispositivo de descodificação estrangeiro ter sido obtido ou activado mediante a indicação de uma identidade e de uma morada falsas, com a intenção de contornar a restrição territorial em causa, nem pelo facto de ser utilizado para fins comerciais, apesar de ter sido destinado a uma utilização de carácter privado.

4.

As cláusulas de um contrato de licença exclusiva celebrado entre o titular dos direitos de propriedade intelectual e um organismo de radiodifusão constituem uma restrição da concorrência proibida pelo 101.o TFUE, uma vez que proíbem a esse organismo o fornecimento de dispositivos de descodificação que permitam o acesso aos objectos protegidos desse titular com vista à sua utilização fora do território abrangido pelo contrato de licença.

5.

O artigo 2.o, alínea a), da Directiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação, deve ser interpretado no sentido de que o direito de autor abrange os fragmentos transitórios das obras na memória de um descodificador de satélite e num écran de televisão, desde que tais fragmentos contenham elementos que sejam a expressão da criação intelectual dos autores em causa, devendo ser analisado o conjunto constituído pelos fragmentos simultaneamente reproduzidos para se verificar se contêm esses elementos.

6.

Os actos de reprodução como os que estão em causa no processo C-403/08, efectuados na memória de um descodificador de satélite e num écran de televisão, preenchem as condições enunciadas no artigo 5.o, n.o 1, da Directiva 2001/29 e podem, assim, ser realizados sem a autorização dos titulares dos direitos de autor em causa.

7.

A noção de «comunicação ao público», na acepção do artigo 3.o, n.o 1, da Directiva 2001/29 deve ser interpretada no sentido de que abrange a transmissão de obras radiodifundidas através de um écran de televisão e de altifalantes aos clientes que se encontrem presentes num pub.

8.

A Directiva 93/83/CE do Conselho, de 27 de Setembro de 1993, relativa à coordenação de determinadas disposições em matéria de direito de autor e direitos conexos aplicáveis à radiodifusão por satélite e à retransmissão por cabo, deve ser interpretada no sentido de que não tem relevância sobre a licitude dos actos de reprodução efectuados na memória de um descodificador de satélite e num écran de televisão.


(1)  JO C 301, de 22.11.2008.