CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

JULIANE KOKOTT

apresentadas em 17 de Setembro de 2009 1(1)

Processo C‑441/07 P

Comissão das Comunidades Europeias

contra

Alrosa Company Ltd.

«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Concorrência – Abuso de posição dominante (Artigo 82.° CE e artigo 54.° EEE) – Mercado mundial da exploração e fornecimento de diamantes em bruto – Compromissos obrigatórios da empresa em posição dominante – Decisão da Comissão pela qual os compromissos foram tornados obrigatórios [artigo 9.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003] – Princípio da proporcionalidade – Liberdade contratual – Direito de ser ouvido»





I –    Introdução

1.        Que exigências resultam do princípio da proporcionalidade quando a Comissão Europeia, na sua qualidade de autoridade da concorrência (2), aceita e torna obrigatórios compromissos oferecidos por uma empresa, que têm efeitos sobre os interesses de uma outra empresa? Esta questão, que tem importância significativa para o desenvolvimento futuro do direito da concorrência europeu, constitui o ponto central do presente recurso. Da resposta que lhe for dada depende decisivamente qual o âmbito da nova competência para adoptar decisões obrigatórias sobre compromissos, atribuída à Comissão pelo artigo 9.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003 (3). O acórdão do Tribunal de Justiça poderá, no entanto, ter impacto sobre outros domínios do direito da concorrência, nomeadamente sobre o direito dos auxílios estatais e do controlo das concentrações.

2.        A origem deste litígio é um compromisso que a empresa De Beers assumiu em 2006 perante a Comissão, para afastar de si a acusação de abuso de posição dominante (artigo 82.° CE). Ocupando a primeira posição no mercado mundial dos diamantes, a De Beers comprometeu‑se, no futuro, a não comprar mais diamantes brutos à Alrosa, a segunda maior produtora, o que significava o termo de uma relação comercial de longos anos entre ambos os grupos. A Comissão declarou vinculativo este compromisso da De Beers, através de uma decisão adoptada nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 (4). A Alrosa considera isto desproporcionado e afirma que o seu direito de ser ouvida foi violado. A Alrosa obteve a declaração de nulidade da decisão impugnada pelo Tribunal de Primeira Instância (5). A Comissão interpôs o presente recurso do acórdão desse Tribunal.

3.        O litígio entre a Comissão e a Alrosa ilustra como pode ser difícil, num caso concreto, equilibrar numa ponderação justa os interesses individuais das empresas, quando da efectiva implementação do direito da concorrência e, neste caso, sem reduzir os direitos processuais destas e sem afectar a economia processual.

II – Enquadramento jurídico

4.        O quadro jurídico deste caso é determinado, para além do artigo 82.° CE e do artigo 54.° EEE, por várias disposições do Regulamento (CE) n.° 1/2003 e do Regulamento (CE) n.° 773/2004 (6).

A –    O Regulamento n.° 1/2003

5.        Pelo Regulamento n.° 1/2003, que está em vigor desde 1 de Maio de 2004 (7), foi modernizado o direito processual da concorrência e as competências da Comissão como autoridade da concorrência da Comunidade foram alargadas.

6.        As novas competências da Comissão encontram‑se, em especial, no artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 que, sob a epígrafe «Compromissos», que tem a seguinte redacção:

«1.      Quando a Comissão tencione aprovar uma decisão que exija a cessação de uma infracção e as empresas em causa assumirem compromissos susceptíveis de dar resposta às objecções expressas pela Comissão na sua apreciação preliminar, esta pode, mediante decisão, tornar estes compromissos obrigatórios para as empresas. Esta decisão pode ser aprovada por um período de tempo determinado e deve concluir pela inexistência de fundamento para que a Comissão tome medidas.

2.      A Comissão pode, a pedido ou oficiosamente, voltar a dar início ao processo se:

a)      tiver ocorrido uma alteração substancial da situação de facto em que a decisão se fundou;

b)      as empresas em causa não cumprirem os seus compromissos; ou

c)      a decisão se basear em informações incompletas, inexactas ou deturpadas prestadas pelas partes».

7.        A este respeito deve‑se referir o artigo 7.° do Regulamento n.° 1/2003; esta disposição tem a epígrafe «Verificação e cessação da infracção» e dispõe, no seu n.° 1:

«1. Se, na sequência de uma denúncia ou oficiosamente, a Comissão verificar uma infracção ao disposto nos artigos 81.° ou 82.° do Tratado, pode, mediante decisão, obrigar as empresas e associações de empresas em causa a porem termo a essa infracção. Para o efeito, a Comissão pode impor‑lhes soluções de conduta ou de carácter estrutural proporcionadas à infracção cometida e necessárias para pôr efectivamente termo à infracção [...]».

8.        O artigo 27.° do Regulamento n.° 1/2003, que regula a audição das partes, dos autores das denúncias e de outras pessoas tem a seguinte redacção:

«1.      Antes de tomar as decisões previstas nos artigos 7.°, 8.° e 23.° e no n.° 2 do artigo 24.°, a Comissão dá às empresas ou associações de empresas sujeitas ao processo instruído pela Comissão oportunidade de se pronunciarem sobre as acusações por ela formuladas. A Comissão deve basear as suas decisões apenas em acusações sobre as quais as partes tenham tido oportunidade de apresentar as suas observações. Os autores das denúncias são estreitamente associados ao processo.

2.      Os direitos da defesa das partes interessadas serão plenamente acautelados no desenrolar do processo. As partes têm direito a consultar o processo em poder da Comissão, sob reserva do interesse legítimo das empresas na protecção dos seus segredos comerciais [...]

3.      Se a Comissão o considerar necessário, pode ouvir outras pessoas singulares ou colectivas. Caso solicitem ser ouvidas pessoas singulares ou colectivas que demonstrem ter um interesse suficiente, deve ser dado seguimento ao seu pedido. […]

4.      Sempre que a Comissão tencionar aprovar uma decisão nos termos dos artigos 9.° ou 10.°, deve publicar um resumo conciso do processo e do conteúdo essencial dos compromissos ou da actuação que se propõe seguir. Quaisquer terceiros interessados podem apresentar as suas observações num prazo fixado pela Comissão no acto de publicação, que não poderá ser inferior a um mês. A publicação deve ter em conta o interesse legítimo das empresas na protecção dos seus segredos comerciais».

B –    O Regulamento n.° 773/2004

9.        Pelo Regulamento n.° 773/2004, que entrou em vigor em 1 de Maio de 2004, a Comissão adoptou as regras de execução do Regulamento n.° 1/2003 (8).

10.      Na altura em que foi proferida a decisão impugnada, o artigo 10.° do Regulamento n.° 773/2004 tinha a seguinte redacção:

«1.      A Comissão comunicará aos interessados directos, por escrito, as objecções contra elas deduzidas. A comunicação de objecções deve ser notificada a cada um deles.

2.      Sempre que a Comissão notifique uma comunicação de objecções aos interessados directos deve fixar um prazo para que possam informá‑la por escrito das suas observações. A Comissão não é obrigada a tomar em consideração observações escritas recebidas após o termo daquele prazo.

[...]».

11.      O artigo 15.°, n.° 1, do Regulamento n.° 773/2004 prevê, além disso:

«1. Se solicitado, a Comissão facultará o acesso ao processo aos interessados directos a quem tiver sido enviada uma comunicação de objecções. O acesso será facultado após a notificação da comunicação de objecções».

12.      As modificações entretanto introduzidas no Regulamento n.° 773/2004 (9) só entraram em vigor depois de adoptada a decisão impugnada, não sendo, por isso, aplicáveis ao caso sub iudice.

III – A origem do litígio e o procedimento administrativo

13.      De acordo com a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal (10), os factos na origem do presente litígio e o procedimento administrativo perante a Comissão apresentam‑se como segue:

14.      A Alrosa Company Ltd (11), é uma sociedade com sede em Mirny (Rússia). Opera, nomeadamente, no mercado mundial da produção e fornecimento de diamantes brutos, onde ocupa a segunda posição em importância. Actua essencialmente na Rússia. Exerce nesse país actividades de exploração, extracção, avaliação e fornecimento, bem como uma actividade de joalharia.

15.      O grupo De Beers (12), cuja sociedade holding mais importante é a De Beers SA, com sede no Luxemburgo, opera no mercado mundial da produção e fornecimento de diamantes brutos, onde ocupa a primeira posição em importância. Está representada nomeadamente na África do Sul, no Botswana, na Namíbia e na Tanzânia, bem como no Reino Unido. Exerce nestes países actividades de exploração, extracção, avaliação, fornecimento, negócio e fabrico, bem como uma actividade de joalharia, abrangendo, pois, todas as actividades no ramo dos diamantes.

16.      Em 5 de Março de 2002, a Alrosa e a De Beers notificaram à Comissão um acordo celebrado em 17 de Dezembro de 2001 entre a Alrosa e duas filiais do grupo De Beers. Com esta notificação pretendiam obter um certificado negativo ou uma isenção ao abrigo do Regulamento n.° 17 (13), ao tempo ainda em vigor.

17.      Este acordo notificado, que se inscreve no quadro das relações comerciais tecidas de longa data pela Alrosa e a De Beers, versava essencialmente sobre a actividade de fornecimento de diamantes brutos. Foi celebrado por um período de cinco anos a contar da data da confirmação aos co‑contratantes pela Comissão de que não infringia os artigos 81.° e 82.° CE.

18.      Durante este período, a Alrosa comprometia‑se a vender diamantes brutos naturais produzidos na Rússia à De Beers até ao limite de 800 milhões USD por ano, enquanto a De Beers assumia a obrigação de lhos comprar. Todavia, nos quarto e quinto anos de execução do acordo notificado, a Alrosa ficava autorizada a reduzir este valor para 700 milhões de USD. O valor de 800 milhões de USD, estabelecido em função dos preços em vigor à data da celebração do acordo notificado, correspondia a cerca de metade da produção anual da Alrosa e à totalidade da sua produção exportada para fora da Comunidade de Estados Independentes (CEI).

19.      Na sequência desta notificação, a Comissão abriu dois processos paralelos, um com base no artigo 81.° CE e outro com base no artigo 82.° CE.

20.      Em 14 de Janeiro de 2003, a Comissão enviou, por um lado, uma comunicação de objecções à recorrente e à De Beers (processo COMP/E‑3/38.381), na qual considerava que o acordo notificado podia constituir um acordo anticoncorrencial proibido pelo artigo 81. °, n.° 1, CE, insusceptível de ficar isento ao abrigo do artigo 81.°, n.° 3, CE. Por outro lado, no mesmo dia, enviou uma comunicação de objecções distinta à De Beers (processo COMP/E‑2/38.381), na qual considerava que o acordo podia constituir um abuso de posição dominante proibido pelo artigo 82.° CE.

21.      Em 31 de Março de 2003, a recorrente e a De Beers enviaram observações escritas conjuntas à Comissão, em resposta à comunicação de objecções emitida no processo COMP/E‑3/38.381.

22.      Em 1 de Julho de 2003, a Comissão enviou uma comunicação de objecções complementar à Alrosa e à De Beers, na qual considerava que o acordo também podia constituir um acordo anticoncorrencial proibido pelo artigo 53. °, n.° 1, do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE), insusceptível de ser isento ao abrigo do artigo 53. °, n.° 3, do acordo EEE. Além disso, no mesmo dia, enviou uma comunicação de objecções complementar distinta à De Beers, nos termos da qual o acordo notificado também podia constituir um abuso de posição dominante proibido pelo artigo 54.° do acordo EEE.

23.      Em 7 de Julho de 2003, a recorrente e a De Beers foram ouvidas pela Comissão em audição oral.

24.      Em 12 de Setembro de 2003, a recorrente propôs compromissos (14) que consistiam em reduzir progressivamente a quantidade de diamantes brutos vendidos à De Beers a partir do sexto ano de execução do acordo notificado e, a partir de 2013, em deixar de vender diamantes brutos à De Beers. A Alrosa retirou posteriormente estes compromissos.

25.      Em 14 de Dezembro de 2004, a Alrosa e a De Beers apresentaram compromissos conjuntos (15)destinados a dar resposta às preocupações de que a Comissão as tinha informado. Estes compromissos conjuntos previam a redução progressiva das vendas de diamantes brutos pela Alrosa à De Beers, cujo valor devia passar de 700 milhões de USD em 2005 para 275 milhões de USD em 2010, e a sua subsequente fixação a este nível para o futuro.

26.      Em 3 de Junho de 2005, a Comissão publicou uma comunicação no Jornal Oficial da União Europeia sobre estes compromissos conjuntos da Alrosa e da De Beers (16). Convidava os terceiros interessados a apresentarem‑lhe as suas observações no prazo de um mês e dava a conhecer a sua intenção de adoptar uma decisão para tornar obrigatórios os compromissos conjuntos, sob reserva do resultado desta consulta ao mercado.

27.      Na sequência desta publicação, vinte e um terceiros interessados apresentaram observações à Comissão, que disso informou a Alrosa e a De Beers em 27 de Outubro de 2005. Ao mesmo tempo, a Comissão convidou ainda ambas as empresas a apresentarem‑lhe, antes do fim do mês de Novembro de 2005, à luz do resultado dessa consulta ao mercado, novos compromissos conjuntos que fossem no sentido da cessação completa das suas relações comerciais a partir de 2009.

28.      Em 25 de Janeiro de 2006, a De Beers apresentou individualmente compromissos (17) destinados a responder às preocupações manifestadas pela Comissão à luz dos resultados da consulta ao mercado (18). Os compromissos individuais da De Beers previam a redução progressiva das compras de diamantes brutos à Alrosa; o valor destas compras devia passar de 600 milhões de USD em 2006 para 400 milhões de USD em 2008; a partir daí, as compras seriam completamente suprimidas.

29.      Em 26 de Janeiro de 2006, a Comissão comunicou à Alrosa um extracto dos compromissos individuais da De Beers e convidou‑a a apresentar observações sobre eles. Transmitiu‑lhe ainda uma cópia das versões não confidenciais dos comentários formulados pelos terceiros.

30.      Seguidamente, houve uma troca de pontos de vista entre a Alrosa e a Comissão sobre certos aspectos do procedimento previsto pelo artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 e das suas implicações para o caso em apreço. Estavam principalmente em causa a questão do acesso ao processo e a questão dos direitos de defesa e, mais especificamente, do direito de ser ouvido. Além disto, na sua carta de 6 de Fevereiro de 2006, a Alrosa fez comentários sobre os compromissos individuais da De Beers e sobre as observações dos terceiros.

31.      Em 22 de Fevereiro de 2006, a Comissão adoptou a decisão em litígio, cujo artigo 1.° dispunha: «Os compromissos enumerados no anexo são obrigatórios para a De Beers»; e o artigo 2.° da mesma decisão estabelecia: «o processo aberto no presente caso é encerrado». A decisão impugnada foi tomada no processo instaurado ao abrigo dos artigos 82.° CE e 54.° EEE. O processo paralelo com base nos artigos 81.° CE e 53.° EEE tornou‑se, assim, inútil (19).

IV – O processo judicial

32.      Em 29 de Junho de 2006, a Alrosa interpôs recurso da decisão impugnada para o Tribunal de Primeira Instância, pedindo que a mesma fosse declarada nula e a Comissão fosse condenada nas despesas do processo. Por seu lado, a Comissão pediu que o recurso fosse julgado improcedente e a Alrosa condenada a suportar as despesas. Em aplicação do artigo 76.° A do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, foi deferida a tramitação acelerada do processo (20).

33.      No acórdão recorrido, de 11 de Julho de 2007, o Tribunal decidiu que o recurso da Alrosa era procedente. Anulou a decisão impugnada e condenou a Comissão a suportar as suas próprias despesas e as efectuadas pela Alrosa.

34.      No seu recurso, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 24 de Setembro de 2007 (21), a Comissão pede agora que o Tribunal se digne:

–        anular o acórdão do Tribunal de Primeira Instância;

–        decidir definitivamente o litigio, julgando improcedente o pedido de anulação formulado no processo T‑170/06;

–        condenar a demandante no processo T‑170/06 a pagar as despesas da Comissão, tanto na primeira instância como no presente recurso.

35.      A Alrosa pede, por seu lado, que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a Comissão a suportar as despesas e encargos judiciais e extrajudiciais da Alrosa em relação com este processo, e

–        adoptar as medidas necessárias que o Tribunal de Justiça considere adequadas.

36.      O recurso foi tramitado perante o Tribunal de Justiça primeiro na fase escrita e, seguidamente, na audiência de 3 de Junho de 2009.

V –    Apreciação dos fundamentos do recurso

37.      A Comissão invoca dois fundamentos de recurso contra o acórdão da Primeira Instância, o primeiro dos quais coloca questões de direito substantivo relativas à aplicação do princípio da proporcionalidade, enquanto o segundo diz respeito ao direito de audição no procedimento administrativo.

A –    Primeiro fundamento: questões de direito substantivo relativas à aplicação do princípio da proporcionalidade

38.      No seu primeiro fundamento, a Comissão critica o Tribunal, no essencial, por uma interpretação e uma aplicação erradas do princípio da proporcionalidade, no caso sub iudice. A este propósito, alega que o Tribunal interpretou erradamente o artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 e o artigo 82.° CE, tendo cometido erros de fundamentação, desvirtuado factos e ultrapassados os limites da fiscalização jurisdicional.

39.      Na origem deste litígio coloca‑se a questão de se saber se o Tribunal, no caso sub iudice, considerou correctamente as possibilidades de soluções alternativas que existiam em relação aos compromissos individuais da De Beers – nomeadamente os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa – os quais seriam menos prejudiciais para os interesses da Alrosa e que a Comissão não poderia ter deixado de ter em consideração.

1.      Observação preliminar relativa à aplicabilidade do princípio da proporcionalidade

40.      Nos procedimentos em matéria de cartéis, a Comissão prossegue o fim de garantir que a concorrência não seja falseada no mercado interno (artigo 3.°, n.° 1, alínea g), CE). Com este objectivo a Comissão actua contra acordos, decisões e práticas concertadas que tenham por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência, por um lado (artigo 81.°,CE, artigo 53.° EEE) e, por outro, contra a exploração de forma abusiva de uma posição dominante (artigo 82.° CE, artigo 54.° EEE). Para superar as preocupações da Comissão em matéria de concorrência, é lícito às empresas aceitarem compromissos que a Comissão, por decisão nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, pode tornar obrigatórios.

41.      No fundamental, as partes estão de acordo em que as decisões da Comissão nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 devem respeitar o princípio da proporcionalidade.

42.      É certo que, no artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, ao contrário do que acontece no seu artigo 7.°, não se encontra qualquer referência expressa ao princípio da proporcionalidade. Porém, enquanto princípio geral do direito comunitário, o princípio da proporcionalidade é um critério para apreciação da legalidade de qualquer actuação das instituições comunitárias (22), incluindo as decisões da Comissão na sua qualidade de autoridade da concorrência (23).

43.      Portanto, se os compromissos de uma ou mais empresas em relação ao objectivo da Comissão de garantir que a concorrência não seja falseada se revelam desproporcionados, esta não deve tornar estes compromissos obrigatórios. Antes pelo contrário, deve chamar a atenção das empresas para a desproporcionalidade dos compromissos e, sendo caso disso, sugerir modificações aos mesmos. Na medida em que um conjunto de compromissos seja divisível, não há nada que impeça a Comissão de tornar obrigatória apenas uma parte dos compromissos (24).

44.      Em todo o caso, é fortemente debatida entre as partes a determinação das exigências concretas que resultam do princípio da proporcionalidade para as decisões sobre compromissos na acepção do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003.

2.      As exigências quanto à proporcionalidade das decisões sobre compromissos (primeira parte do primeiro fundamento)

45.      Saber se o Tribunal aplicou os critérios correctos no exame da proporcionalidade da decisão impugnada, é uma questão de direito que pode ser invocada no âmbito de um recurso (25).

46.      Da jurisprudência constante resulta que o princípio geral da proporcionalidade exige que os actos das instituições comunitárias não ultrapassem os limites do que é adequado e necessário à realização dos objectivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa, entendendo‑se que, quando se proporcione uma escolha entre várias medidas adequadas, deve recorrer‑se à menos limitativa, e que os inconvenientes causados não devem ser desproporcionados relativamente aos objectivos visados (26).

47.      O acórdão recorrido parece assentar na presunção de que o princípio da proporcionalidade, no âmbito de uma decisão sobre os compromissos nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, actua da mesma maneira que no quadro de uma decisão de proibição nos termos do artigo 7.° deste regulamento (27). Os artigos 7.° e 9.° têm, no entendimento do Tribunal, o mesmo fim; a única particularidade do artigo 9.° é que, neste caso, a Comissão está dispensada de prosseguir o procedimento regulamentar imposto pelo artigo 85.° CE e, mais especificamente, de fazer prova da infracção (28).

48.      A Comissão contesta, com razão, esta abordagem do Tribunal de Primeira Instância.

49.      O Tribunal reconhece diferenças fundamentais entre os artigos 9.° e 7.° do Regulamento n.° 1/2003, que são de grande importância para a análise da proporcionalidade de cada uma das decisões da Comissão.

50.      Diferentemente do artigo 7.°, o artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 não constitui um instrumento para verificação das infracções ao direito da concorrência (29), limitando‑se a abrir à Comissão a mera possibilidade de resolver preocupações em matéria de concorrência, com eficácia para o futuro.

51.      Do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, o que resulta é o esforço no sentido da economia processual. A Comissão resolve os problemas de concorrência por ela identificados sem uma prévia verificação de uma infracção (30) em colaboração com as empresas participantes e apoia‑se para isso nos seus compromissos voluntariamente assumidos. Em contrapartida, no âmbito de uma decisão nos termos do artigo 7.°, deve encontrar ela própria, sendo caso disso, as soluções de conduta, o que lhe exige investigações sérias, mais amplas e mais longas, e também uma apreciação abrangente da situação de facto.

52.      As particularidades do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 afectam em dois aspectos a análise da proporcionalidade quanto às decisões de compromisso adoptadas segundo esta disposição.

53.      Em primeiro lugar, são colocadas no âmbito do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 exigências elevadas quanto à aptidão dos compromissos tornados obrigatórios. A Comissão tem o direito de recusar os compromissos que não forem manifestamente adequados para eliminar os problemas de concorrência por ela identificados. Só assim consegue garantir o objectivo do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, de obter de forma correcta uma solução rápida e eficaz dos problemas de concorrência, evitando esforços enormes de investigação e avaliação por parte da Comissão. A Comissão não tem que admitir compromissos cuja adequação apenas possa ser determinada após uma apreciação minuciosa.

54.      Em segundo lugar, no exame da necessidade dos compromissos para eliminar os problemas de concorrência identificados pela Comissão, deve distinguir‑se consoante sejam atingidos os interesses da empresa que apresentou os compromissos ou os interesses de terceiros.

55.      Enquanto a necessidade, do ponto de vista dos interesses da empresa que apresentou os compromissos (neste caso, a De Beers), pode ser presumida sem mais (31), semelhante presunção não pode ser admitida na medida em que os interesses de terceiros (neste caso, a Alrosa) sejam atingidos, uma vez que os compromissos não provêm dela. Também o carácter voluntário da oferta de compromissos não pode ser qualquer garantia para a protecção dos interesses desta. Antes pelo contrário, do ponto de vista dos interesses de terceiros é, desde logo, de verificar se os compromissos vão além daquilo que é necessário para a eliminação daqueles problemas de concorrência.

56.      É certo que, em relação às decisões adoptadas nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, a Comissão não está obrigada ela própria a procurar alternativas menos gravosas em relação aos compromissos que lhe foram apresentados. Em todo o caso, tem de verificar se todas as alternativas que conhece a esses compromissos – aqui, em particular, os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa – apresentam meios menos onerosos para a solução dos problemas de concorrência identificados, graças aos quais os interesses de terceiros não sejam, ou sejam menos fortemente, afectados.

57.      Quanto a isto, porém, a Comissão deve ter em conta apenas aquelas alternativas que são igualmente adequadas para a solução dos problemas de concorrência identificados, tal como constam dos compromissos que lhe foram apresentados. Tanto os compromissos efectivamente apresentados, como também as eventuais alternativas a estes devem, por isso, ser manifestamente adequados para solução dos problemas da concorrência (32).

58.      Portanto, o Tribunal critica incorrectamente a Comissão, afirmando que «existiam soluções alternativas menos gravosas para as empresas [...] e que ela não podia deixar de as ter em consideração ao invocar a pretensa dificuldade» da sua determinação (33). De acordo com o fim e o objectivo do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, a apreciação de alternativas não deve exigir, nomeadamente, quaisquer investigações ou avaliações extensas e complicadas. No procedimento nos termos do artigo 9.°, a Comissão pode não levar em conta alternativas cuja adequação não seria determinável com suficiente segurança sem semelhante esforço.

59.      Ao contrário do que entende o Tribunal de Primeira Instância (34), pode acontecer que a Comissão, no âmbito da procura de determinadas soluções nos termos do artigo 9.°, rejeite aquelas que devia ter seguido no âmbito do artigo 7.° do Regulamento n.° 1/2003. Com base na economia processual procurada, a escolha dos meios em consideração para a resolução de um problema de concorrência no âmbito do artigo 9.° será tendencialmente mais reduzida do que seria possivelmente no âmbito do artigo 7.°

60.      O interesse geral em encontrar uma solução o mais possível rápida e processualmente económica para os problemas da concorrência justifica a limitação da escolha das medidas a considerar no âmbito do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003. As empresas que assumem compromissos têm a consciência de que, possivelmente, as suas concessões vão além do que a própria Comissão lhes poderia exigir depois de uma análise detalhada, mediante uma decisão nos termos do artigo 7.° do Regulamento n.° 1/2003. Em contrapartida, com o arquivamento do procedimento por acordos e práticas concertadas instaurado contra elas, obtêm rapidamente segurança jurídica e podem evitar a constatação, para elas desvantajosa, de uma violação da concorrência bem como, possivelmente, a ameaça iminente de uma coima.

61.      Na maior parte dos casos, os terceiros também podem beneficiar do facto de uma empresa fazer concessões relativamente amplas à Comissão, a fim de evitar uma decisão de proibição. Contudo, como o presente litígio claramente mostra, ocasionalmente os compromissos nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 podem também prejudicar os interesses de um terceiro. É nomeadamente o caso quando um terceiro alimentou expectativas legítimas quanto à continuação de uma prática susceptível de suscitar preocupações de concorrência por parte de uma empresa em posição dominante. No entanto, tendo em consideração o interesse geral numa concorrência não falseada, essas expectativas merecem, quando muito, uma protecção limitada.

62.      Na medida em que o Tribunal não teve em consideração estas particularidades do processo nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, e aplicou à decisão impugnada uma medida excessivamente restrita quanto à proporcionalidade, cometeu, assim, um erro de direito. Este erro de direito foi causal para declarar nula a decisão impugnada. Em consequência, a primeira parte do primeiro fundamento do recurso é procedente e justifica a revogação do acórdão recorrido.

3.      Verificação concreta da proporcionalidade da decisão sobre os compromissos conjuntos (segunda parte do primeiro fundamento do recurso)

63.      Além disso, a Comissão desenvolve uma série de críticas mais detalhadas contra o acórdão recorrido, relativas à aplicação concreta do princípio da proporcionalidade ao caso sub iudice. Objecto da crítica é a avaliação, pelo Tribunal, das alternativas aos compromissos individuais da De Beers tornados obrigatórios. O Tribunal inclinou‑se para o entendimento de que a Comissão não podia deixar de ter em consideração essas alternativas (35).

64.      A Alrosa contesta primeiramente, de forma categórica, a admissibilidade das alegações da Comissão no seu conjunto, pois, segundo ela, estas limitam‑se a pôr em causa a apreciação dos factos pelo Tribunal de Primeira Instância.

65.      É correcta a afirmação de que o recurso está limitado a questões de direito e de que o Tribunal de Justiça não pode substituir pela sua própria apreciação dos factos e das provas, a apreciação feita pelo Tribunal de Primeira Instância (36). Além disso, resulta dos artigos 225. °, n.° 1, CE e 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, que o Tribunal de Primeira Instância é o único competente para, por um lado, apurar a matéria de facto, excepto nos casos em que a inexactidão material das suas conclusões resulta dos documentos dos autos que lhe foram apresentados, e, por outro, para apreciar esses factos (37).

66.      De facto, à primeira vista, parece que a Comissão, nesta segunda parte do seu primeiro fundamento, pretendeu meramente tomar como pretexto o recurso para pôr em causa a avaliação dos factos e das provas pelo Tribunal, o que é inadmissível nesta sede.

67.      Numa análise mais precisa, porém, deixam‑se perceber as críticas da Comissão – muito circunstanciadamente formuladas – entre outras, a crítica de que, no exame da proporcionalidade da decisão impugnada, o Tribunal ultrapassou os limites da fiscalização jurisdicional. Esta questão, que agora considerarei o ponto fulcral (v. Secção a) é uma questão de direito (38), que é admissível para exame na fase do recurso. Abordarei seguidamente, de forma resumida, as restantes críticas da Comissão (v. Secção b).

a)      Quanto à ultrapassagem dos limites da fiscalização jurisdicional pelo Tribunal

68.      A Comissão alega que o Tribunal ultrapassou os limites da fiscalização jurisdicional, na medida em que sobrepôs à avaliação da Comissão a sua própria avaliação da situação do mercado. Esta crítica dirige‑se, em particular, aos n.os 134, 135, 138 e 153 do acórdão recorrido, nos quais o Tribunal se ocupa das alternativas possíveis aos compromissos individuais da De Beers. Aí trata‑se, por um lado, dos compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa e, por outro lado, da proposta da Alrosa de vender anualmente uma parte dos seus diamantes brutos em leilão.

69.      Para determinar se esta crítica é fundamentada deve‑se, por um lado, averiguar se a Comissão, no caso sub iudice, na avaliação dos compromissos apresentados pela De Beers, dispunha de uma margem de apreciação e, por outro, se o Tribunal desrespeitou esta margem de apreciação.

i)      Existência de uma margem de apreciação da Comissão

70.      A análise da questão de saber se determinadas medidas são adequadas e necessárias para resolver o problema de concorrência identificado pela Comissão exige a avaliação de circunstâncias económicas complexas. Para isso, a Comissão dispõe de uma margem de apreciação (39).

71.      Ao contrário do que o Tribunal afirma (40), não existe, do ponto de vista da avaliação dos compromissos das empresas, qualquer diferença fundamental entre os processos nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 e os processos de controlo das concentrações. Tanto num como noutro caso a Comissão é, designadamente, chamada a proferir uma decisão com carácter de prognose na qual se trata de avaliar como se apresentará o funcionamento do mercado no futuro, tendo em conta os compromissos. O facto de, no quadro do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, «as práticas existentes» constituirem a oportunidade para o processo, em nada modifica a necessidade de um «uma apreciação económica prospectiva» dos efeitos esperados dos compromissos sobre o funcionamento do mercado.

72.      Por isso, o Tribunal estava obrigado a reconhecer à Comissão, no quadro do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, a mesma margem de apreciação de que esta goza, de acordo com a jurisprudência, em relação à avaliação dos compromissos propostos no caso de controlo das concentrações (41).

73.      Neste aspecto, também não altera em nada a afirmação do Tribunal de que a Comissão em qualquer caso «não procedeu a uma análise económica complexa» (42). Esta afirmação do Tribunal refere‑se, nomeadamente, apenas à «identificação de soluções alternativas» que a Comissão, no entendimento do Tribunal, não fez. Como já se referiu, porém, a Comissão não está de modo algum obrigada a identificar, ela própria, no quadro do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, as alternativas aos compromissos assumidos que lhe foram apresentados.

74.      Decisivo é – e isto o Tribunal ignorou‑o – que a Comissão, antes da adopção de qualquer decisão nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, tenha efectuado uma análise da situação do mercado em que se enquadrem os compromissos que lhe foram oferecidos. Tem de verificar que efeitos estes compromissos irão ter no funcionamento futuro do mercado e se as alternativas de que tem conhecimento são adequadas a resolver os problemas de concorrência identificados. Só isto já exige a apreciação de uma situação económica complexa. O Tribunal não determinou que a Comissão, no caso sub iudice, tenha omitido proceder a uma tal avaliação do funcionamento do mercado e das alternativas aos compromissos individuais da De Beers de que tinha conhecimento.

75.      Por isso, fica assente quanto a este ponto que, no caso sub iudice, existia uma margem de apreciação da Comissão e que esta foi por ela esgotada. A seguir analisarei se o Tribunal, como a Comissão alega, violou esta margem de apreciação.

ii)    Violação da margem de apreciação da Comissão, pelo Tribunal de Primeira Instância

76.      O Tribunal de Primeira Instância concluiu «que a decisão enferma de erro de apreciação, o qual, de resto, assume carácter manifesto» (43). Convém examinar se, com esta afirmação, o Tribunal satisfaz as exigências jurídicas ou se, porém, ultrapassou os limites da fiscalização jurisdicional das decisões da Comissão.

77.      A existência de uma margem de apreciação nas questões económicas não significa que o juiz comunitário deva omitir qualquer fiscalização da interpretação de dados económicos pela Comissão. Pelo contrário, ele é competente para examinar a legalidade substantiva das decisões da Comissão quanto à verificação da exactidão dos factos e à inexistência de erros manifestos de apreciação (44). Nesse aspecto, deve verificar não só a exactidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também se estes elementos constituem a totalidade dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são susceptíveis de fundamentar as conclusões que deles se retiram (45).

78.      O Tribunal podia, por isso, examinar se a situação de facto investigada pela Comissão permitia apoiar a conclusão a que esta chegou, a saber, que os compromissos individuais da De Beers não só eram adequados mas também necessários para resolver os problemas de concorrência identificados.

79.      Como o Tribunal afirmou, com razão, a este respeito, o princípio da proporcionalidade exige que a Comissão, antes da decisão sobre o compromisso, examine a aptidão das medidas menos gravosas que sejam do seu conhecimento; apenas quando estas medidas menos gravosas se revelem inadequadas para responder às preocupações que identificou em matéria de concorrência, pode optar pela fórmula mais gravosa (46).

80.      No caso sub iudice não é objecto de controvérsia o facto de que a Comissão tinha conhecimento de soluções alternativas com efeitos menos gravosos para os interesses da Alrosa, em particular, os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa (47). Contudo, a Comissão – pelo menos tendo em conta os resultados da consulta ao mercado por ela conduzida – chegou à conclusão de que tais soluções alternativas não eram adequadas para resolver os problemas de concorrência por ela identificados (48).

81.      Apenas se a última conclusão da Comissão não se pudesse apoiar na matéria de facto por ela investigada, teria podido o Tribunal concluir pela existência de um erro de apreciação manifesto.

82.      Estas exigências não foram respeitadas pelo acórdão recorrido.

83.      Em lugar algum o Tribunal apurou que a conclusão retirada pela Comissão não é apoiada pelos factos averiguados. O Tribunal exprime meramente a sua própria avaliação divergente em relação à aptidão das possibilidades de solução alternativa para os problemas de concorrência identificados pela Comissão.

84.      Para se considerar que houve erro manifesto de apreciação não basta apenas, no entanto, que o Tribunal seja de opinião diferente da Comissão. Se, nomeadamente, a matéria de facto e a base probatória mostram que são defensáveis diferentes apreciações, não se pode do ponto de vista jurídico criticar que a Comissão se tenha decidido por uma delas, que pode não ser aquela que o Tribunal considera preferível. Apenas existe um manifesto erro de apreciação quando as conclusões retiradas pela Comissão, face à situação de facto e às provas, não sejam de todo defensáveis (49), isto é, quando não se possa considerar que existe qualquer base razoável para as mesmas (50).

85.      No acórdão recorrido, o Tribunal não demonstra que as conclusões retiradas pela Comissão fossem indefensáveis. Antes pelo contrário, o Tribunal limita‑se, no essencial, a vagas presunções e a avaliações provisórias. Assim, conclui que os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa podiam, «prima facie, revelar‑se aptos a responder às preocupações expressas pela Comissão» (51) e que a De Beers «dificilmente» poderia influenciar os preços fixados pela Alrosa e que seria «dificilmente concebível» a De Beers e a Alrosa coordenarem as respectivas políticas de preços (52).

86.      Das afirmações do Tribunal não resulta claro se os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa eram manifestamente adequados a resolver os problemas de concorrência identificados pela Comissão, nem sequer se eles eram tão adequados para isso como os compromissos individuais da De Beers tornados obrigatórios pela Comissão. Pelo contrário, parece que o Tribunal se contentou com que, através de uma solução alternativa, se tivessem «diminuído os riscos de distorção da concorrência» (53) e «não [tivessem] sido necessariamente postos em perigo» os objectivos visados pela Comissão (54). Para decidir correctamente, no entanto, o Tribunal deveria ter concluído afirmativamente que os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa eram suficientes para excluir os riscos de uma distorção da concorrência e para alcançar os fins da Comissão em vista à protecção da concorrência.

87.      Deste modo, as afirmações do Tribunal não satisfazem as exigências já referidas para um exame da proporcionalidade no quadro do artigo 9.°, do Regulamento n.° 1/2003 (55).

88.      De resto, com as suas afirmações quanto aos compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa o Tribunal abandona o terreno do controlo da legalidade de uma decisão da Comissão e, na verdade, assume a sua própria avaliação de uma situação económica complexa. Assim se comporta, por exemplo, quando afirma que uma diminuição das vendas de diamantes brutos pela Alrosa à De Beers, a partir de 2009, para 35% da quantidade vendida em 2004 (com um valor de 275 milhões de USD), permitia aos terceiros um acesso efectivo a uma fonte de abastecimento alternativa e independente (56). O mesmo vale para a avaliação da proposta da Alrosa de vender anualmente uma parte dos seus diamantes brutos em leilão (57). Semelhantes afirmações, para que pudessem ser mais do que simples opiniões, necessitavam de uma análise aprofundada das especificidades do mercado para a qual, no entanto, não é competente o Tribunal mas sim a Comissão.

89.      Não compete agora ao Tribunal de Justiça, neste recurso, constituir‑se em árbitro dos entendimentos económicos contraditórios do Tribunal e da Comissão, e decidir qual das apreciações, de um ou da outra, do ponto de vista da adequação das possibilidades de solução alternativas, deve ser preferida. Se o fizesse, isto significaria, nomeadamente, que o Tribunal de Justiça, por seu lado, substituiria de forma inadmissível pela sua própria apreciação a apreciação feita pela Comissão e pelo Tribunal e efectuaria uma análise de uma situação económica complexa.

90.      O que é decisivo é apenas o facto de o Tribunal, no caso sub iudice, ter imposto a sua própria apreciação em substituição da avaliação da Comissão e, deste modo, ter violado de forma juridicamente incorrecta a margem de apreciação da Comissão (58). A crítica da Comissão é, por consequência, procedente. Uma vez que este erro de direito do Tribunal foi uma das causas para declarar nula a decisão impugnada, esse erro justifica, por isso, a revogação do acórdão recorrido.

b)      Quanto às restantes críticas da Comissão quanto à abordagem feita pelo Tribunal

91.      A seguir abordarei as restantes críticas da Comissão no quadro desta segunda parte do primeiro fundamento.

i)      Quanto à alegada «desvirtuação da amplitude da investigação provisória»

92.      A Comissão critica que o Tribunal tenha «desvirtuado a amplitude da sua investigação provisória». Este teria ignorado a circunstância de que, entre a De Beers e a Alrosa, de modo completamente independente dos planeados acordos contratuais, também tinham lugar as chamadas vendas ad hoc segundo o princípio do «comprador voluntário/vendedor voluntário». O Tribunal tinha meramente considerado tais vendas ad hoc como prática passada entre ambas as empresas e, portanto, não teve em consideração os seus actuais efeitos.

93.      Esta crítica é admissível porque nela é feita a afirmação de uma desvirtuação de factos ou de provas (59).

94.      A crítica de desvirtuação de factos ou de provas é, no entanto, infundada. Semelhante desvirtuação só se verifica, nomeadamente, quando, sem recorrer a novos elementos de prova, a apreciação dos elementos de prova existentes é manifestamente incorrecta (60). Não é este aqui o caso.

95.      É certo que o Tribunal, no acórdão recorrido, em relação às vendas ad hoc, invocou em parte as «relações históricas» entre a De Beers e a Alrosa e teve em consideração as «práticas anteriores» de ambas as empresas (61). O acórdão, no entanto, não contém qualquer ponto de apoio inequívoco para se considerar que o Tribunal considerou as vendas ad hoc exclusivamente como um fenómeno do passado e não também como uma prática subsistente de ambas as empresas.

96.      Deste modo, esta crítica da Comissão deve ser julgada improcedente.

ii)    Quanto à tomada em consideração individual das alegações e dos interesses da Alrosa

97.      A Comissão alega, além disso, que o acórdão recorrido esqueceu os resultados da consulta ao mercado. Em sua opinião, o Tribunal considerou unilateralmente os interesses e as tomadas de posição da Alrosa, e atribuiu‑lhes um peso demasiado, mas ignorando os interesses da concorrência. O acórdão não atenta nos numerosos argumentos da Comissão e apoia‑se, no essencial, na afirmação de que o controlo da proporcionalidade tem um carácter objectivo (62).

98.      Como a Comissão claramente expõe na sua réplica, a mesma quer que esta alegação seja entendida como invocação de uma falta de fundamentação. Considera o acórdão recorrido fundamentado de forma contraditória e insuficiente.

99.      A questão de saber se a fundamentação de um acórdão do Tribunal de Primeira Instância é contraditória ou insuficiente constitui uma questão de direito que, enquanto tal, pode ser invocada no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância (63).

100. Do ponto de vista substantivo, isto significa a obrigação do Tribunal de Primeira Instância de fundamentar as suas decisões mas não significa que seja obrigado a responder em pormenor a cada argumento invocado por uma parte (64). Pelo contrário, deve considerar‑se suficiente que a fundamentação de um acórdão evidencie de forma clara e inequívoca o raciocínio do Tribunal de Primeira Instância, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões da decisão tomada e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização jurisdicional (65).

101. Estas exigências foram satisfeitas pelo Tribunal no caso sub iudice. Para o leitor é reconhecível sem dificuldade em que fundamentos o Tribunal se baseou para julgar procedente o recurso da Alrosa. Também a Comissão não teve quaisquer dificuldades em perceber a fundamentação do acórdão e em atacá‑lo com uma argumentação muito desenvolvida.

102. Na verdade, a crítica da Comissão parece‑me menos dirigida à fundamentação regular e, por isso, à legalidade formal do acórdão recorrido, do que à justeza do seu conteúdo. A mera circunstância de o Tribunal, quanto ao conteúdo, ter chegado a um resultado diferente do da recorrente não pode, no entanto, constituir qualquer falta de fundamentação do acórdão recorrido (66).

103. A crítica de falta de fundamentação é, por conseguinte improcedente.

iii) Quanto à errada qualificação jurídica da comunicação feita nos termos do artigo 27.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003

104. Além disso, a Comissão alega que o Tribunal ignorou a comunicação que ela publicou no Jornal Oficial nos termos do artigo 27.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003 (67). A sua crítica dirige‑se contra os números 136 e 192 do acórdão recorrido. Aí o Tribunal conclui pela simples existência dessa comunicação no Jornal Oficial que a própria Comissão considerava os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa prima facie adequados para responder às suas preocupações quanto à concorrência. A Comissão considera isto ou uma desvirtuação dos factos ou uma qualificação errada da sua comunicação no Jornal Oficial.

105. Tanto uma eventual desvirtuação de factos como uma errada qualificação são admissíveis no exame em sede de recurso (68). Portanto, a presente crítica da Comissão é admissível.

106. Nesta crítica a Comissão também tem razão quanto ao mérito.

107. Nos n.os 136, 192 e 194 do acórdão recorrido, o Tribunal tenta vincular a Comissão à apreciação inicial dos compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa. Considera esta apreciação como elemento confirmativo de que os compromissos conjuntos teriam sido adequados para resolver os problemas de concorrência identificados pela Comissão.

108. Com isto, o Tribunal esquece que uma comunicação no Jornal Oficial nos termos do artigo 27.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003 pode sempre assentar numa apreciação preliminar da Comissão. O sentido e o fim desta comunicação é dar oportunidade a terceiros interessados, no quadro de uma consulta ao mercado, para uma tomada de posição quanto a uma proposta de compromissos. À luz dos resultados desta consulta ao mercado, a Comissão tem de reexaminar a sua apreciação preliminar da situação do mercado e a aptidão dos compromissos para a resolução dos problemas de concorrência por ela identificados. Para isso, a consulta ao mercado não tem necessariamente de revelar novos factos ou preocupações; também dos resultados da consulta ao mercado pode derivar uma avaliação diferente de factos já conhecidos e, em última análise, da situação da concorrência. Se a consulta ao mercado fosse uma farsa não poderia conduzir a uma modificação da posição anterior da Comissão.

109. Se o Tribunal nem sequer pode fazer da comunicação de objecções um critério para o exame da legalidade da decisão da Comissão (69), o mesmo se aplica, por maioria de razão, a uma comunicação da Comissão nos termos do artigo 27.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003, pois essa comunicação contém apenas uma apreciação preliminar da Comissão, muito menos detalhada e baseada apenas numa análise sumária do caso.

110. No caso sub iudice é possível reconhecer também da letra da comunicação no Jornal Oficial (70) que a Comissão ainda não tinha feito qualquer avaliação final dos compromissos conjuntos que lhe tinham sido apresentados pela De Beers e pela Alrosa. Embora tenha tomado conhecimento do teor destes (71), o Tribunal não retirou no acórdão recorrido as conclusões necessárias, em vista do carácter provisório das avaliações contidas na comunicação da Comissão.

111. Assim, o Tribunal qualificou os factos de forma juridicamente errónea quando considera a comunicação da Comissão no Jornal Oficial como indício de que os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa eram adequados.

112. A crítica feita pela Comissão relativa à comunicação publicada no Jornal Oficial é, por isso, procedente. Tomado por si só, este erro de direito não pode, no entanto, conduzir à anulação do acórdão recorrido, porque a tomada em consideração dessa comunicação constitui apenas um dos vários argumentos em que o Tribunal apoiou as suas conclusões quanto à existência e adequação de soluções alternativas (72).

iv)    Quanto à alegada violação do artigo 82.° CE

113. Por último, a Comissão critica o Tribunal por, no quadro da sua análise da proporcionalidade, ter violado de duas formas o artigo 82.° CE.

114. O objecto destas críticas são as afirmações do Tribunal em relação às alternativas possíveis aos compromissos individuais da De Beers tornados obrigatórios. A Comissão visa, em especial, os n.os 152 e 153 do acórdão recorrido, nos quais o Tribunal tomou posição quanto à proposta da Alrosa de leiloar anualmente uma parte dos seus diamantes brutos. Em primeiro lugar, o Tribunal deixou completamente fora de consideração que a De Beers não é apenas o maior comprador no mercado dos diamantes brutos mas também é o maior produtor no mesmo mercado. Em segundo lugar, o Tribunal ignorou que os leilões também não podem impedir o abuso de posição dominante de uma empresa por ocasião da apresentação de ofertas.

115. Diferentemente da Alrosa, não considero estas críticas inadmissíveis. Não se trata de modo algum de um mero pretexto para pôr em causa a avaliação dos factos e das provas feita pelo Tribunal. Antes pelo contrário, com estas alegações suscita‑se a questão de saber se o Tribunal, na interpretação e na aplicação do artigo 82.° CE, aplicou os critérios correctos (73) e se deixou de considerar pontos de vista relevantes do ponto de vista jurídico.

–       Quanto à desconsideração da posição da De Beers como produtor

116. A primeira crítica assente no artigo 82.° CE dirige‑se em especial contra o n.° 153 do acórdão recorrido, em que o Tribunal descreve a De Beers como «o mais importante comprador presente no mercado» sem, no entanto, analisar a circunstância de que a De Beers é também o maior produtor no mesmo mercado.

117. A Comissão critica, com razão, esta forma de abordar a questão.

118. É certo que o Tribunal estava perfeitamente consciente de que, tanto no caso da De Beers como no da Alrosa, se tratava de produtores de diamantes brutos (74). Ignorou, no entanto, completamente esta circunstância no exame das alternativas aos compromissos individuais da De Beers tornados obrigatórios. Nos pontos decisivos na fundamentação do acórdão, a De Beers é exclusivamente referida como o mais importante ou o maior comprador no mercado, ao qual a Alrosa, no entendimento do Tribunal, deveria ter acesso no futuro (75).

119. Deste modo, o Tribunal ignorou que, para a apreciação jurídica de uma relação de fornecimento estabelecida a longo prazo de duas empresas para efeitos da concorrência, faz uma grande diferença se entre ambas as empresas existe ou não uma actual ou potencial relação de concorrência.

120. Se, designadamente, ambas as empresas operam como produtores no mesmo mercado então não corresponde fundamentalmente a um comportamento concorrencial normal que uma delas compre regularmente a produção da outra ou, em qualquer caso, uma parte significativa desta – em particular quando o comprador dispõe de uma posição dominante. Isto reconheceu também a Alrosa em resposta a uma pergunta na audiência no Tribunal de Justiça.

121. É certo que uma empresa em posição dominante também tem o direito de proteger os seus próprios interesses comerciais. O artigo 82.° CE proíbe‑lhe, no entanto, qualquer comportamento que tenha por objectivo reforçar essa posição dominante e abusar dela (76).

122. É exactamente de temer esse abuso quando uma empresa em posição dominante compra totalmente a produção de outro produtor que opera no mesmo mercado. Este outro produtor fica então desobrigado nomeadamente da necessidade de construir o seu próprio sistema de distribuição e de entrar em concorrência com a empresa em posição dominante. Isto pode ter consequências desvantajosas para a estrutura do mercado e finalmente também para o consumidor, tanto mais que a concorrência no mercado de referência, dada a presença da empresa dominante, já está enfraquecida sem isso. Existe a ameaça de que a empresa dominante através do açambarcamento da produção do outro produtor influencie as transacções e com isso, finalmente, os preços no mercado de referência, em prejuízo do consumidor. Semelhante comportamento não tem nada que ver com a protecção – em princípio admissível – dos legítimos interesses da empresa dominante.

123. No caso sub iudice, o Tribunal não referiu circunstâncias especiais que pudessem excluir excepcionalmente a existência de um abuso de posição dominante. Pelo contrário: o Tribunal omitiu completamente a análise da dupla posição da De Beers como o maior produtor mundial e o mais importante comprador no mercado dos diamantes brutos, apesar de a Comissão ter feito referência a isto (77). A tomada em consideração desta dupla posição era, porém, incontornável para poder apreciar com sentido se o leilão anual de uma parte dos diamantes da Alrosa pela melhor oferta podia ser adequada para resolver os problemas de concorrência identificados pela Comissão à luz do artigo 82.° CE.

124. Ao ignorar esta circunstância importante, o Tribunal cometeu um erro de direito na sua análise da proporcionalidade. Este erro de direito justifica a anulação do acórdão recorrido, porque o mesmo assenta na convicção do Tribunal de que existiam no caso sub iudice possibilidades de solução alternativa adequadas que seriam menos gravosas para as empresas em causa.

–       Quanto à desconsideração da possibilidade de um comportamento abusivo dos licitantes no quadro de leilões

125. A segunda crítica assente no artigo 82.° CE, visa os n.os 152 e 153 do acórdão recorrido, nos quais o Tribunal afirma que as vendas ad hoc da Alrosa em leilão, pela melhor oferta, não constituiriam, per se, uma infracção às regras da concorrência mesmo quando tivessem como efeito permitir à de Beers manter ou reforçar o seu papel de líder do mercado.

126. A Comissão critica, com razão, esta argumentação do Tribunal.

127. No seu acórdão, o Tribunal de Primeira Instância limita‑se a constatar que não seria de temer um tratamento preferencial da De Beers pela Alrosa no quadro das vendas em leilão, pois nada demonstrava que a Alrosa pudesse aplicar critérios de adjudicação subjectivos («critérios diversos da qualidade da oferta de compra») (78).

128. Deste modo, o Tribunal ignora que os leilões podem dar lugar a comportamentos abusivos, não apenas do lado do vendedor mas também do lado do comprador. Se, nomeadamente, participar num leilão uma empresa que produz ela própria mercadorias concorrentes com os produtos leiloados e os comercializa, e além disso tem no mercado relevante uma posição dominante, isso pode conduzir a uma distorção da concorrência. Pode resultar uma situação em que a empresa dominante eleva artificialmente as ofertas para garantir para si, através do afastamento de outros interessados, o controlo sobre a produção do seu – actual ou potencial – rival; isto pode conduzir a uma redução da oferta no mercado e finalmente a um nível de preços artificialmente inflacionado, em prejuízo do consumidor. Este comportamento é abusivo na acepção do artigo 82.° CE e não tem nada a ver com a protecção dos legítimos interesses da empresa dominante no mercado (79).

129. Naturalmente, a questão de saber se é de recear efectivamente esse comportamento abusivo por parte de uma empresa em posição dominante enquanto licitante depende da apreciação global das circunstâncias do caso concreto. O acórdão recorrido, no entanto, não contém qualquer indicação de que o Tribunal se tenha ocupado desta questão, ainda que apenas de forma incidental, apesar de as afirmações da Comissão darem motivo para isso. Assim a Comissão salientou várias vezes o papel da De Beers como «criador do mercado» e referiu‑se aos anteriores esforços da De Beers para controlar a produção no mercado dos diamantes (80).

130. O Tribunal, no caso sub iudice, considerou suficiente que, na realização das vendas em leilão propostas pela Alrosa não existisse qualquer perigo de abuso do lado do vendedor na atribuição das adjudicações. Só por isso, não se pode excluir, no entanto, um comportamento abusivo do lado do comprador quando o licitante é uma empresa em posição dominante.

131. Através da omissão deste ponto de vista essencial, o Tribunal cometeu um erro de direito no seu exame da proporcionalidade. Este erro de direito justifica a anulação do acórdão recorrido, porque nele assenta a afirmação do Tribunal de que existiam, no caso sub iudice, soluções alternativas possíveis, que eram menos gravosas para as empresas em causa.

B –    Segundo fundamento do recurso: direito de audição no procedimento administrativo

132. No seu segundo fundamento, a Comissão imputa ao Tribunal, no essencial, um erro de direito em relação ao direito a ser ouvido no procedimento administrativo. Além disso, alega que o Tribunal decidiu ultra petita, e critica de novo o acórdão recorrido por falta de fundamentação.

1.      Questão prévia: o segundo fundamento do recurso é inoperante?

133. A Alrosa entende que este segundo fundamento da Comissão é inoperante porque se dirige contra afirmações do acórdão recorrido, que o Tribunal apenas fez para ser exaustivo.

134. É certo que uma crítica do recorrente a um fundamento que não serve de suporte ao acórdão da primeira instância não pode conduzir à anulação do acórdão e, por isso, é de rejeitar como ineficaz ou como inoperante («inopérant») (81). No entanto, aqui não é este o caso.

135. É certo que o Tribunal, descreveu as suas afirmações quanto à violação do direito de ser ouvido de forma altamente equívoca, como tendo sido feita «para ser exaustivo» (82). Isto não significa, no entanto, que se tratasse de simples obiter dicta. Antes pelo contrário, estas considerações constituem um segundo pilar autónomo do acórdão no qual assenta a declaração de nulidade da decisão impugnada. Isto é particularmente claro quando se atenta no n.° 204 do acórdão recorrido, onde é expressamente referido como procedente o fundamento do recurso da Alrosa relativo à violação do direito de ser ouvida. Trata‑se, por isso, da afirmação do direito a ser ouvido como fundamento no qual a decisão do acórdão recorrido assenta.

136. Em consequência, a objecção da Alrosa segundo a qual o segundo fundamento do recurso é inoperante deve ser rejeitada.

2.      Exame do segundo fundamento do recurso

a)      Quanto à insuficiente fundamentação (primeira parte do segundo fundamento do recurso)

137. Em primeiro lugar, a Comissão critica o acórdão recorrido por estar insuficientemente fundamentado quanto à conclusão de que houvera violação do direito de audição. O Tribunal substitui uma fundamentação por simples suspeitas. Não esclarece, nos n.os 201 e 203 do acórdão recorrido, porque é que não tinha sido possível à Alrosa responder «de forma útil» após o exame dos documentos que lhe foram transmitidos (83) e «exercer plenamente» o seu direito a ser ouvida. Além disso, alega que não está demonstrado qualquer nexo causal entre a irregularidade verificada e o resultado do processo, isto é, a decisão sobre os compromissos.

138. Estes argumentos não me convencem.

139. A fundamentação de um acórdão da primeira instância pode também fazer‑se, em determinados pontos, de forma implícita, na medida que do conjunto das considerações do Tribunal resulte de modo claro e inequívoco que os interessados podem conhecer os fundamentos da decisão do Tribunal e o Tribunal de Justiça exercer a sua função de fiscalização (84).

140. No caso sub iudice, resulta com suficiente clareza do acórdão recorrido que o Tribunal considerou violado o direito da Alrosa a ser ouvida, devido à transmissão atrasada de documentos. Segundo as constatações do Tribunal, a Comissão só transmitiu uma versão não confidencial das observações de terceiros interessados «em 26 de Janeiro de 2006, ou seja, mais de seis semanas após a data do pedido formal apresentado [pela Alrosa] a esse propósito e mais de três meses após a reunião de 27 de Outubro de 2005»; o Tribunal censura o facto de que esses documentos «foram transmitidos [à Alrosa] simultaneamente com o extracto dos compromissos individuais propostos pela De Beers» (85). Daqui conclui o Tribunal que a Alrosa não beneficiou da possibilidade de «exercer plenamente» o seu direito de ser ouvida (86).

141. A Comissão pode ter uma opinião diferente da do Tribunal. Pode entender que os documentos referidos não foram transmitidos com atraso mas, em qualquer caso, atempadamente para possibilitar à Alrosa uma tomada de posição de forma útil. Diferentemente do Tribunal, a Comissão pode também entender que o direito da Alrosa a ser ouvida não foi violado ou que uma eventual violação não teve efeito quanto ao conteúdo da decisão impugnada. Com isto, porém, ela critica, na realidade, não a ilegalidade formal do acórdão recorrido por causa de uma falta de fundamentação, mas põe em causa a validade da fundamentação do Tribunal e desse modo a legalidade material (substantiva).

142. A mera circunstância de, do ponto de vista do conteúdo, o Tribunal ter chegado a outra conclusão diferente da da recorrente, não pode, por isso, constituir uma falta de fundamentação do acórdão recorrido (87).

143. Por isso, a crítica relativa à falta de fundamentação deve ser rejeitada.

b)      Quanto ao princípio ne ultra petita e quanto ao direito a um processo equitativo (segunda parte do segundo fundamento do recurso)

144. Além disso, a Comissão critica o acórdão recorrido por neste se ter declarado uma violação do direito de ser ouvida por fundamentos completamente diferentes dos que a Alrosa invocou no seu recurso de anulação na primeira instância. A Alrosa tinha meramente alegado na primeira instância que a Comissão não a tinha esclarecido quanto aos fundamentos para a sua mudança de posição na sequência da consulta ao mercado e não lhe tinha dado qualquer oportunidade para tomar posição quanto à modificação da sua avaliação do caso. As questões consideradas decisivas pelo Tribunal em relação com o direito de ser ouvida não foram sequer invocadas pela Alrosa. O acórdão recorrido não se apoia nas críticas da Alrosa perante o Tribunal de Primeira Instância mas, pelo contrário, até as rejeitou expressamente (88).

145. A Comissão é de opinião de que, deste modo, o Tribunal decidiu ultra petita, violando assim o princípio do direito a um processo equitativo.

i)      Quanto ao princípio ne ultra petita

146. Em primeiro lugar, não se contesta que o juiz do contencioso comunitário de anulação não pode decidir ultra petita (89). Este princípio é expressão do princípio do dispositivo, segundo o qual as partes determinam o objecto do litígio e o juiz não pode ir além deste objecto do litígio.

147. A Comissão parece agora, a partir daí, entender o princípio ne ultra petita no sentido de que o juiz comunitário só pode constatar uma violação do direito a ser ouvido quando os fundamentos invocados pelo recorrente na primeira instância são procedentes.

148. Este entendimento é, no entanto, excessivamente restritivo. É certo que, de acordo com o princípio ne ultra petita, a decisão de anulação não pode ir além do pedido formulado pelo recorrente (90). O juiz não pode estar limitado unicamente aos argumentos adiantados pelas partes em apoio das suas pretensões, sob pena de se ver eventualmente constrangido a basear a sua decisão em considerações jurídicas erradas (91). Como o advogado‑geral P. Léger acertadamente referiu, o papel do juiz não é, no entanto, passivo e não se lhe pode impor que seja apenas «a voz das partes» (92).

149. No caso presente, a Alrosa invocou, nos seus fundamentos do recurso na primeira instância, uma violação do seu direito a ser ouvida. Por conseguinte, ao contrário do entendimento da Comissão, o Tribunal, não concluiu pela violação do direito de audição a título oficioso, mas sim a pedido da recorrente. O facto de o Tribunal, na decisão sobre o referido fundamento do recurso, se ter apoiado noutros argumentos além dos alegados pela Alrosa não significa por si só qualquer afastamento do objecto do litígio no recurso na primeira instância e, por isso, não implica qualquer decisão ultra petita (93).

ii)    Quanto ao direito a um processo equitativo

150. Além disso, a Comissão alega que a falta de audição finalmente constatada pelo Tribunal nem sequer foi objecto de um debate entre as partes e, por isso, vê aí uma violação do princípio do processo equitativo.

151. Para garantir um processo equitativo, o Tribunal não pode deixar de ter em atenção os direitos de defesa das partes no litígio. O princípio do respeito dos direitos de defesa constitui um princípio fundamental do direito comunitário (94). Fundamentar uma decisão judicial em factos e documentos de que as próprias partes, ou uma delas, não puderam tomar conhecimento e sobre os quais, portanto, não estavam em condições de tomar posição violaria o referido princípio (95). Dito de outra forma, o respeito dos direitos de defesa garante que as partes não são confrontadas com uma decisão surpreendente do Tribunal (96).

152. Naturalmente, só se pode chegar a uma decisão surpreendente quando o Tribunal se apoia em factos ou meios de prova que não eram conhecidos pelas partes ou por uma delas. Também uma avaliação da matéria de facto efectuada pelo Tribunal pode ser uma surpresa para as partes quando o Tribunal se apoia para isso em factos que, embora conhecidos das partes, não tinham sido, como tal, objecto de discussão no processo judicial (97).

153. Assim aconteceu no caso sub iudice com a transmissão de determinados documentos à Alrosa. O momento em que estes documentos foram transmitidos é incontroverso. No entanto, resulta dos autos que esta transmissão atrasada, censurada pelo Tribunal no caso sub iudice, não foi tema debatido por qualquer das partes na fase escrita (98) do processo na primeira instância. Aliás, esta questão também não foi discutida na audiência, segundo as alegações da Comissão, não contestadas pela Alrosa. O tema também não foi objecto de questões escritas do Tribunal, nem este considerou necessário para o seu debate a reabertura da fase oral do processo (99).

154. Além disso, enquanto recorrida, a Comissão não estava obrigada por razões de mera cautela, a tomar posição por sua iniciativa sobre este problema. Isto é tanto mais assim quanto o processo acelerado tramitado na primeira instância implica especiais obrigações para as partes, tanto do ponto de vista das suas alegações como também do ponto de vista dos prazos que devem respeitar (100).

155. Nestas circunstâncias foi uma decisão surpreendente que o Tribunal fundamentasse especificamente o erro processual por ele constatado quanto ao direito de audição numa transmissão atrasada de documentos pela Comissão. O facto de o Tribunal não ter dado qualquer oportunidade à Comissão para se pronunciar sobre esse entendimento, antes de proferir o seu acórdão, constitui uma violação dos direitos de defesa e, por isso, um vício processual

156. A crítica relativa a esta questão formulada pela Comissão é, por consequência, procedente. Como não é de excluir que a Comissão, em caso de debate sobre a problemática do atraso na primeira instância, tivesse apresentado argumentos que tivessem levado o Tribunal a uma outra conclusão, o erro processual do Tribunal justifica a anulação do acórdão recorrido.

c)      Quanto aos efeitos sobre a decisão da Comissão do eventual erro relativo ao direito de ser ouvida (quarta parte do segundo fundamento do recurso)

157. A Comissão alega ainda que o Tribunal cometeu um erro de direito na medida em que não demonstrou que efeitos teve a eventual violação do direito da Alrosa a ser ouvida sobre a decisão impugnada.

158. Resulta da jurisprudência constante que um erro processual só justifica a declaração de nulidade de uma decisão da Comissão quando existe a possibilidade de que o procedimento administrativo, sem este erro processual, pudesse ter conduzido a outro resultado (101). Por outras palavras, não pode excluir‑se que o erro processual tenha tido efeitos sobre o conteúdo da decisão da Comissão e que, portanto, a decisão pudesse ter tido um outro conteúdo (102).

159. No caso sub iudice, o Tribunal constatou um erro quanto ao direito de ser ouvido mas ao mesmo tempo afirma «embora não se possa determinar claramente, no presente caso, em que medida esta irregularidade pôde afectar a decisão da Comissão» (103).

160. Na prática, esta formulação algo ambígua – pelo menos numa apreciação preliminar – deixa a dúvida de que o Tribunal anulou a decisão impugnada por causa de um erro processual sem antes avaliar suficientemente se este erro processual podia realmente influenciar o conteúdo da decisão.

161. Numa análise mais aprofundada, esta fórmula exprime a convicção do Tribunal de que o erro quanto ao direito de audição por ele constatado podia ter efeito sobre o resultado do procedimento administrativo. Segundo o entendimento do Tribunal, só a concreta medida destes efeitos não se pode determinar claramente.

162. Por conseguinte, o Tribunal atém‑se, apesar da fórmula equívoca por ele escolhida, aos requisitos jurídicos para a declaração de nulidade de uma decisão em razão de um erro processual. Uma tal declaração de nulidade não depende, em concreto, da relevância que o erro processual tenha tido no conteúdo da decisão.

163. Se o erro processual constatado pelo Tribunal consiste numa violação do direito de audição, é muito difícil constatar em que medida esta pôde afectar o conteúdo da decisão da Comissão. Nem sequer é de excluir completamente que, mesmo em caso de audição processualmente correcta, fosse adoptada uma decisão com o mesmo conteúdo.

164. Através da audição deve ser dada ao interessado oportunidade para tomar posição e, desse modo, influenciar, no processo de tomada de decisão da Comissão, o respectivo conteúdo. Desse modo, a anulação da mesma justifica‑se até pela simples possibilidade de que o erro quanto ao direito de audição tivesse influenciado o conteúdo da decisão.

165. A quarta parte do segundo fundamento do recurso é, por isso, improcedente.

d)      Quanto ao âmbito do direito de audição da Alrosa (terceira parte do segundo fundamento do recurso)

166. Por último, a Comissão afirma que o Tribunal, no caso presente, ignorou o âmbito do direito de audição da Alrosa.

i)      Nota prévia

167. De acordo com o artigo 41.°, n.° 2, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (104) é garantido o direito de qualquer pessoa ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afecte desfavoravelmente. Este direito fundamental deve ser respeitado na interpretação e aplicação do Regulamento n.° 1/2003 (105).

168. O direito a ser ouvido é ao mesmo tempo parte dos direitos de defesa, cujo respeito em qualquer processo instaurado contra uma pessoa e susceptível de culminar num acto que a afecte constitui um princípio fundamental do direito comunitário (106).

169. No procedimento em matéria de cartéis, o direito a ser ouvido é concretizado, entre outros, no artigo 27.° do Regulamento n.° 1/2003 bem como nos artigos 10.° e 15.° do Regulamento de execução n.° 773/2004.

ii)    Quanto às críticas da Comissão

170. No essencial, a Comissão critica o Tribunal por ter equiparado a Alrosa ilegitimamente a «uma empresa em causa».

171. Efectivamente, o Tribunal refere que, embora apenas a De Beers possa ser uma «empresa em causa» no processo relativo ao artigo 82.° CE, a Alrosa também não é um simples «terceiro interessado» (107). Na fundamentação, o Tribunal refere‑se ao modo como a Comissão instruiu os dois processos relativos ao acordo entre a De Beers e a Alrosa (108). Acentua, além disso, com indicação de exemplos, que ambos os processos paralelos conduzidos ao abrigo dos artigos 81.° CE e 82.° CE «foram sempre tratados de facto como um único processo, tanto pela Comissão como pela Alrosa e a De Beers» (109). Perante esta situação, o Tribunal chega à conclusão de que isto «deveria ter conduzido a reconhecer à Alrosa, para o processo considerado no seu todo, os direitos concedidos a uma ‘empresa em causa’ na acepção do Regulamento n.° 1/2003», apesar de a Alrosa, stricto sensu, não o ser no processo relativo ao artigo 82.° CE (110).

172. Estas afirmações não convencem.

173. Na configuração legalmente simples do direito a ser ouvido, o legislador comunitário, no artigo 27.° do Regulamento n.° 1/2003 bem como nos artigos 10.° e 15.° do Regulamento de execução n.° 773/2004, estabeleceu conscientemente níveis de hierarquização das diferentes pessoas que podem estar envolvidas num procedimento de defesa da concorrência. Os direitos das partes no procedimento administrativo (também designadas «empresas em causa») são mais amplos que os direitos de terceiros, que embora tenham um interesse na resolução do procedimento não são eles os próprios destinatários da decisão a ser proferida pela Comissão.

174. É incontroverso que, no caso presente, a Comissão conduzir dois procedimentos administrativos paralelos, um dos quais relativo ao artigo 81.° CE e o outro relativo ao artigo 82.° CE. No primeiro, a Alrosa, como parte do contrato notificado, tinha a posição de «empresa em causa», do mesmo modo que a De Beers. No outro processo, esta posição cabia, pelo contrário, apenas à De Beers como a presumida empresa dominante, mas não à Alrosa.

175. No procedimento relativo ao artigo 82.° CE, que terminou com a decisão impugnada, foram, consequentemente, reconhecidos à Alrosa apenas os direitos muito menos extensos de um terceiro interessado.

176. Só se pudesse demonstrar‑se que, no caso presente, a Comissão submetera arbitrariamente, isto é, sem razão substancial, a mesma situação de facto a dois procedimentos separados, é que deveria reconhecer‑se à Alrosa – para usar as mesmas palavras do Tribunal – os direitos concedidos a uma empresa em causa «para o processo considerado no seu todo» (111).

177. O Tribunal, no entanto, no caso presente, não constatou um tal desvio de poder por parte da Comissão. Realmente não existiam quaisquer fundamentos para isso. Antes pelo contrário, a tramitação de dois procedimentos administrativos separados estava objectivamente justificada, em vista dos seus fundamentos jurídicos substantivos diferentes: artigo 81.° CE (artigo 53.° EEE) por um lado e artigo 82.° CE (artigo 54.° EEE) por outro. Do ponto de vista do artigo 82.° CE (artigo 54.° EEE) só a De Beers, como presumida empresa dominante, podia ser destinatária da comunicação de objecções e da decisão da Comissão de encerramento do processo.

178. Por isso, o Tribunal cometeu um erro de direito quando assumiu que, no procedimento respeitante ao artigo 82.° CE, a Alrosa deveria ter sido equiparada a uma empresa em causa.

179. A Alrosa argumenta que a decisão impugnada é equivalente nos seus efeitos práticos a uma decisão de proibição dirigida contra ela nos termos do artigo 7.° do Regulamento n.° 1/2003. Foi impedida, de no futuro, ter relações comerciais com a De Beers.

180. Quanto a isto deve notar‑se que a parte dispositiva da decisão impugnada só se dirige à De Beers e declara obrigatória a sua renúncia voluntária a compras à Alrosa. As repercussões sobre as suas futuras relações comerciais a que a Alrosa se refere resultam indirectamente da decisão impugnada. Tais efeitos reflexos de decisões sobre compromissos não são, porém, exactamente típicos para as empresas em causa (partes) mas para terceiros interessados.

181. Ao contrário do que entende a Alrosa, esta empresa também não pode ser considerada como empresa em causa do ponto de vista do artigo 82.° CE, porque a Comissão rejeitou anteriormente compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa. Esta rejeição dos compromissos conjuntos ocorreu, nomeadamente, não no procedimento relativo ao artigo 82.° CE, que aqui nos interessa, mas no procedimento paralelo relativo ao artigo 81.° CE. Consequentemente, a rejeição dos compromissos conjuntos não é objecto da decisão impugnada no procedimento relativo ao artigo 82.° CE; antes pelo contrário, os compromissos conjuntos eram meramente um dos pontos de vista a ter em consideração pela Comissão para o seu exame da proporcionalidade, em vista dos interesses da Alrosa como terceiro interessado.

182. Consequentemente, o Tribunal cometeu um erro de direito na medida em que equiparou a Alrosa a uma empresa em causa. Este erro de direito interfere, também, com a restante argumentação do Tribunal no acórdão recorrido, que conduziu à declaração de nulidade da decisão impugnada (112). Em especial assenta nele a afirmação do Tribunal de que a Comissão deveria ter garantido à Alrosa o acesso ao processo (113). A consulta do processo é garantida apenas às partes no procedimento administrativo (artigo 27.°, n.° 2, segunda frase, do Regulamento n.° 1/2003) e só pode ser facultada após a notificação da comunicação de objecções (artigo 15.°, n.° 1, segunda frase do Regulamento n.° 773/2004). Como a Alrosa não é parte no procedimento que aqui nos interessa, relativo ao artigo 82.° CE, mas apenas no procedimento administrativo tramitado em paralelo relativo ao artigo 81.° CE, não tinha qualquer direito de acesso ao processo no quadro da adopção da decisão impugnada.

183. Nestas circunstâncias, a terceira parte do segundo fundamento do recurso é procedente e justifica a anulação do acórdão recorrido.

C –    Conclusão provisória

184. Ainda que algumas das críticas feitas pela Comissão não sejam fundamentadas, deve considerar‑se, no conjunto, que o recurso é procedente e conduz à anulação do acórdão recorrido, na sua totalidade.

VI – Apreciação do recurso da Alrosa na Primeira Instância

185. Segundo o artigo 61.°, primeiro parágrafo, do seu Estatuto, o Tribunal de Justiça pode decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado.

186. Assim acontece no caso presente. Todos os factos e questões jurídicas relevantes para uma decisão sobre o recurso da Alrosa já foram discutidos no Tribunal de Primeira Instância e as partes tiveram a oportunidade de trocar sobre eles os seus argumentos. Por isso, não é necessário remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância, e, antes pelo contrário, o próprio Tribunal de Justiça pode decidir ele próprio sobre o recurso da Alrosa em que se pede a declaração de nulidade da decisão impugnada.

A –    A legalidade formal da decisão impugnada (primeiro fundamento)

187. No seu primeiro fundamento do recurso na primeira instância, a Alrosa alega uma violação do seu direito a ser ouvida.

1.      O direito da Alrosa a ser ouvida

188. Na sua resposta ao recurso na primeira instância, a Comissão parece colocar em dúvida que a Alrosa, no caso presente, tenha realmente direito a ser ouvida.

189. Este entendimento não tem qualquer fundamento jurídico.

190. É certo que, como já foi referido, a Alrosa não era parte (114) («empresa em causa») no procedimento relativo ao artigo 82.° CE. Está, porém, fora de dúvida que a Alrosa tinha um interesse legítimo no resultado do processo, derivado do facto de a Alrosa ser o parceiro contratual tido em vista pela presumível empresa dominante. Um tal parceiro contratual deve ser ouvido a seu pedido pela Comissão, antes que esta adopte uma decisão sobre compromissos que torne obrigatória a cessação de qualquer relação de fornecimento entre a empresa dominante e o seu parceiro contratual.

191. Para os fins do presente litígio não é necessário esclarecer se a Alrosa devia ser ouvida como terceiro interessado na acepção do artigo 27.°, n.° 3, segunda frase, do Regulamento n.° 1/2003 (115), uma vez que, na jurisprudência, está estabelecido que o direito fundamental a ser ouvido deve ser garantido, mesmo na falta de regulamentação específica (116). Em todo o caso, uma vez que a decisão sobre compromissos constituía uma medida individual desfavorável à Alrosa, esta devia ter sido ouvida, em qualquer caso, a seu pedido. Nesse sentido aponta também o entendimento do legislador que encontrou expressão no artigo 27.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1/2003.

192. Também está demonstrado que a Alrosa, como terceiro interessado, não tinha direitos tão amplos quantos os de uma «empresa em causa» ou de uma parte, na acepção do artigo 9.°, n.° 1 e do artigo 27.°, n.os 1 e 2, do Regulamento n.° 1/2003. Em especial, a Alrosa não tinha qualquer direito de acesso à comunicação das objecções ou a um documento comparável nem à consulta do processo (v. artigo 27.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003 bem como artigo 10.°, n.os 1 e 2 e artigo 15.°, n.° 1, do Regulamento n.° 773/2004).

2.      Substância do direito da Alrosa a ser ouvida

193. A controvérsia entre as partes gira, sobretudo, em torno do direito da Alrosa a ser ouvida.

194. A Alrosa solicita informações sobre os fundamentos para a rejeição dos seus compromissos conjuntos apresentados com a De Beers e pretende tomar posição a esse respeito.

195. No entanto, os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa não foram apresentados no procedimento relativo ao artigo 82.° CE, mas sim no procedimento paralelo, relativo ao artigo 81.° CE. Portanto, não são objecto da decisão impugnada e não foram nela rejeitados mas meramente analisados pela Comissão do ponto de vista do direito da concorrência. Os compromissos individuais da De Beers, que a Comissão tornou obrigatórios, são o único objecto da decisão impugnada.

196. Seguidamente, a Alrosa devia ser ouvida apenas sobre os compromissos individuais da De Beers bem como sobre a intenção da Comissão de os tornar obrigatórios. Destes compromissos individuais resultava também, em última análise, a desvantagem alegada pela Alrosa: o fim de qualquer relação de venda de diamantes brutos à De Beers.

197. No entanto, tudo isto não significa de forma alguma que, com a audição da Alrosa, os compromissos da De Beers e da Alrosa fossem irrelevantes para a decisão impugnada.

198. Com efeito, para permitir a terceiros interessados como a Alrosa uma tomada de posição com algum significado, a Comissão deve informá‑los – pelo menos nas grandes linhas – sobre o conteúdo da decisão que tenciona adoptar. Isto inclui informações não só sobre o conteúdo essencial dos compromissos que deverão ser tornados obrigatórios, mas também sobre as principais razões que levaram a Comissão a aceitar estes compromissos.

199. Consequentemente, no caso presente, a Comissão devia ter esclarecido a Alrosa sobre o conteúdo essencial dos compromissos individuais da De Beers – que consistiam numa redução gradual das compras de diamantes brutos à Alrosa bem como na suspensão completa dessas compras a partir do ano de 2009 – e sobre as principais razões pelas quais tencionava tornar obrigatórios esses compromissos individuais.

200. É manifesto que a Comissão também devia ter esclarecido que os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa, que tinham sido previamente comunicados, não eram suficientes para eliminar os problemas de concorrência por ela identificados, pois só assim a Alrosa podia ser colocada em situação de razoavelmente se pronunciar sobre a proporcionalidade da decisão prevista em relação aos seus próprios interesses comerciais. Desta perspectiva, a Alrosa tem razão quando alega que a decisão impugnada está em íntima conexão com a anterior rejeição dos compromissos conjuntos pela Comissão.

201. Perante estas circunstâncias, deve a seguir examinar‑se se a Comissão satisfez o direito da Alrosa a ser ouvida.

3.      Inexistência da violação do direito da Alrosa a ser ouvida

202. A Alrosa alega que a Comissão não a informou sobre a sua mudança de opinião relativamente aos factos em que esta acabou por basear a sua decisão de rejeição dos compromissos conjuntos e a sua aceitação dos compromissos individuais da De Beers. A Alrosa afirma também que não teve qualquer oportunidade de tomar posição de forma significativa sobre a nova avaliação dos factos por parte da Comissão.

203. Como resulta das conclusões em matéria de facto do Tribunal de Primeira Instância (117), a Comissão informou a Alrosa e a De Beers, logo em 27 de Outubro de 2005, a propósito de uma reunião sobre os resultados da sua consulta do mercado. Ao mesmo tempo, a Comissão à luz dos resultados da consulta do mercado convidou as duas empresas a apresentarem antes do fim do mês de Novembro de 2005 novos compromissos conjuntos que fossem no sentido da cessação completa das suas relações comerciais a partir de 2009.

204. Assim, a Alrosa já tinha sido informada de que a Comissão deixara de considerar os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa suficientes para resolver os problemas de concorrência por ela identificados. A Alrosa sabia, desde esta reunião, que a Comissão (já) não considerava aceitável uma continuação das relações comerciais entre a Alrosa e a De Beers, tal como as mesmas estavam previstas no contrato notificado e nos compromissos conjuntos e que só estava disposta a aceitar compromissos no sentido de uma completa cessação das relações comerciais entre ambas as empresas.

205. Se se considerar que a Alrosa, como parte no procedimento relativo ao artigo 81.° CE tramitado em paralelo, estava totalmente a par das relações comerciais e dos antecedentes do procedimento, os esclarecimentos orais da Comissão podiam ser suficientes para que a Alrosa pudesse apresentar as suas observações de forma razoável, em defesa, por um lado, dos seus próprios interesses comerciais e, por outro, para discutir a proporcionalidade – do seu ponto de vista inexistente – de uma completa cessação das suas relações comerciais com a De Beers. No entanto, a Alrosa, como terceiro interessado, não tinha qualquer direito a uma informação escrita ou mesmo a um documento de âmbito comparável a uma comunicação de objecções.

206. Portanto, desde a reunião de 27 de Outubro de 2005, a Alrosa teve oportunidade de reafirmar a sua posição em relação a uma cessação completa das suas relações comerciais com a De Beers.

207. A Alrosa aproveitou esta oportunidade. Dos autos resulta que a empresa esclareceu a sua posição, por carta de 6 de Dezembro de 2005, ao membro da Comissão competente para as questões da concorrência (118). Além disto, na sua carta de 6 de Fevereiro de 2006 a Alrosa apresentou comentários sobre os compromissos individuais da De Beers e sobre as observações dos terceiros participantes na consulta ao mercado (119).

208. Como terceiro interessado, a Alrosa não podia exigir mais oportunidades além desta para exprimir a sua opinião.

209. Por isso, a crítica da Alrosa de que foi violado o seu direito a ser ouvida deve ser rejeitada, por infundamentada.

210. Apenas para ser exaustivo, deve assinalar‑se ainda que os direitos de audição de terceiros interessados não implicam qualquer espécie de direito de submeter novos compromissos à Comissão antes de esta adoptar a sua decisão. Apenas empresas em causa na acepção do artigo 9.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1/2003 podem efectivamente oferecer compromissos (120). Por conseguinte, não pode inferir‑se qualquer irregularidade da circunstância de a Alrosa – por exemplo, por razões de tempo – não ter podido «propor novos compromissos conjuntos com a De Beers» (121). O Tribunal de Primeira Instância enganou‑se a este respeito no n.° 201 do acórdão recorrido, bem como a Alrosa quando, neste ponto, adere à conclusão do Tribunal de Primeira Instância.

B –    A legalidade material da decisão impugnada (segundo e terceiro fundamentos do recurso)

211. A legalidade substantiva da decisão impugnada é objecto de outros dois fundamentos, nos quais a Alrosa, na primeira instância, denunciou violações do artigo 82.° CE e do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, bem como dos princípios da liberdade contratual e da proporcionalidade.

1.      Quanto à violação do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 (segundo fundamento do recurso)

212. Com o seu segundo fundamento na primeira instância, a Alrosa argumenta que o artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 não oferece qualquer fundamento jurídico suficiente para a decisão impugnada. Para tanto, a Alrosa apoia‑se numa interpretação restritiva desta disposição: por um lado, segundo a sua opinião, a Comissão só deveria aceitar compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa. Por outro lado, a decisão sobre compromissos deve ser limitada no tempo.

213. Nem um nem outro dos argumentos é convincente.

a)      Quanto ao direito de apresentar compromissos segundo o artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003

214. Os compromissos a que se refere o artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 só podem ser apresentados pelas «empresas em causa». Como já se referiu (122) estas são apenas as partes em cada procedimento por acordos, decisões e práticas concertadas. Num procedimento relativo ao artigo 82.° CE, como no caso presente, só se pode considerar empresa em causa a empresa (123) presumivelmente dominante. Apenas esta empresa pode apresentar compromissos juridicamente eficazes.

215. Consequentemente, a Comissão podia, no quadro do procedimento relativo ao artigo 82.° CE, aceitar compromissos individuais da De Beers, a presumível empresa dominante, e torná‑los obrigatórios de acordo com o artigo 9.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1/2003 (124). A Comissão não estava, de modo algum, limitada à aceitação de compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa. Antes pelo contrário, os compromissos conjuntos só podiam ser propostos no quadro do procedimento tramitado em paralelo, relativamente ao artigo 81.° CE.

216. Seria seguramente possível que, no quadro de um procedimento tramitado em paralelo, relativamente ao artigo 81.° CE, a Comissão prosseguisse os seus esforços, conjuntamente com ambas as empresas – De Beers e Alrosa – para encontrar uma solução para os problemas de concorrência por ela identificados. Em última análise, a questão de saber se era de prosseguir neste caminho ou no caminho dos compromissos individuais, no quadro do procedimento relativo ao artigo 82.° CE, não é uma questão jurídica mas uma questão de oportunidade cuja apreciação não cabe ao juiz comunitário.

b)      Quanto ao limite do prazo de validade de uma decisão sobre compromissos

217. No que diz respeito ao âmbito de aplicação no tempo da sua decisão de compromissos, a Comissão nos termos do artigo 9.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1/2003, não está obrigada a submetê‑la a qualquer limite temporal. Ao contrário do que a proposta da Comissão (125) relativa ao Regulamento n.° 1/2003 ainda previa, o artigo 9.°, n.° 1, não prevê especificamente que a decisão seja obrigatoriamente adoptada por um período de tempo determinado (126).

218. Se a cessação da posição dominante de uma empresa como a De Beers não é previsível a curto ou médio prazo, também faz pouco sentido uma limitação no tempo da decisão sobre compromissos.

219. Porém, no caso de uma decisão sobre compromissos por um período indeterminado, as empresas em causa e os terceiros não ficam, em todo o caso, destituídos de protecção. De acordo com o artigo 9.°, n.° 2, alínea a), do Regulamento n.° 1/2003, o procedimento pode ser reaberto se se verificarem alterações substanciais das situações de facto. Uma tal alteração substancial seria de admitir, por exemplo, quando a situação do mercado evolui de tal forma que a empresa outrora em posição dominante perde a hegemonia no mercado.

220. Segundo o princípio da boa administração (127), perante cada referência fundamentada a alterações substanciais das situações de facto, a Comissão está obrigada a estudá‑la imediatamente e a decidir sobre a reabertura do procedimento.

c)      Conclusão provisória

221. Assim, como a interpretação restritiva do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 que a Alrosa propõe não tem qualquer sucesso, o segundo fundamento do recurso da primeira instância é infundamentado.

2.      Quanto à violação do artigo 82.° CE, do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 e dos princípios da liberdade contratual e da proporcionalidade (terceiro fundamento do recurso)

222. No seu terceiro fundamento do recurso na primeira instância, a Alrosa argumenta que a «proibição absoluta e potencialmente ilimitada no tempo de a De Beers adquirir diamantes brutos directa ou indirectamente à Alrosa», que está na base da decisão impugnada, viola o artigo 82.° CE e o artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, em conjugação com os princípios fundamentais da liberdade contratual e da proporcionalidade.

223. É conveniente analisar estes fundamentos, por um lado, da perspectiva da liberdade contratual e, por outro, sob o ângulo da proporcionalidade.

a)      Quanto à liberdade contratual (primeira parte do terceiro fundamento do recurso)

224. A Alrosa argumenta que a decisão impugnada não pode apoiar‑se nos artigos 82.° CE e 9.° do Regulamento n.° 1/2003, porque viola o princípio da liberdade contratual. Na sua opinião, a Comissão ordenou, de facto, um boicote contra a Alrosa.

225. A liberdade contratual é um dos princípios fundamentais gerais do direito comunitário. É a expressão da liberdade de agir das pessoas. Além disso está indissoluvelmente ligada à liberdade de empresa (128), protegida como direito fundamental (129). Numa Comunidade que deve respeitar o princípio da economia de mercado aberta e de livre concorrência, é indispensável garantir a liberdade contratual (130). Também a jurisprudência do Tribunal de Justiça reconhece que os operadores económicos gozam da liberdade de contratar (131).

226. Na adopção de decisões em matéria de direito da concorrência, a Comissão deve ter em atenção o princípio da liberdade contratual ou da liberdade de empresa (132).

227. A liberdade contratual implica não apenas a liberdade de celebrar contratos (liberdade contratual positiva) mas também a de não celebrar contratos (liberdade contratual negativa).

228. Com os seus compromissos individuais perante a Comissão a De Beers faz uso da sua liberdade contratual negativa. A empresa renunciou voluntariamente a, de futuro, celebrar contratos com a Alrosa.

229. A circunstância de a De Beers ter oferecido os seus compromissos no âmbito de um procedimento por cartel em curso, a fim de evitar uma decisão de proibição – incluindo a declaração da sua posição dominante no mercado – não afecta de modo algum o carácter voluntário desta renúncia. O simples anúncio de um procedimento por cartel ou a sua continuação pela Comissão até à adopção da decisão de proibição e de uma possível coima não é um meio inadmissível mas sim um meio perfeitamente legal com o qual a Comissão prossegue o fim legítimo de proteger eficazmente a concorrência de distorções (133).

230. É certo que a Alrosa desta maneira perdeu o parceiro contratual que desejava para o futuro, mas este é um dos riscos que a Alrosa, como qualquer outro operador económico, tem que assumir numa economia de mercado aberto. Não se verifica aqui qualquer violação da liberdade contratual da Alrosa (134).

231. A Comissão também não violou o princípio da liberdade contratual quando tornou obrigatórios os compromissos individuais e, portanto, a renúncia da De Beers a futuras relações contratuais com a Alrosa. Com a decisão impugnada, a Comissão limitou‑se a concretizar os limites da liberdade contratual tal como os mesmos resultam para todos os operadores económicos das disposições directamente aplicáveis do Tratado CE e do Tratado EEE em matéria de concorrência. A liberdade contratual (positiva) das empresas termina, nomeadamente, no momento em que celebra um contrato com um objecto anticoncorrencial ou com efeitos anticoncorrenciais na acepção do artigo 81.° CE (artigo 53.° EEE) ou abusa da sua posição dominante no mercado através de um contrato na acepção do artigo 82.° CE (artigo 54.° EEE).

232. A Alrosa argumenta que, com a sua decisão a Comissão não actuou contra um comportamento abusivo mas sim contra um comportamento manifestamente legal. A simples compra ou venda de um produto, inclusivamente por uma empresa dominante, não pode considerar‑se por si só abusiva, excepto se na base do negócio estiverem condições desleais. Para reforçar a sua tese, a Alrosa cita a jurisprudência, em particular o acórdão Langnese‑Iglo/Comissão (135), segundo o qual a celebração de contratos de compra exclusiva não deve ser proibida de forma geral e por um tempo indefinido.

233. Esta argumentação é, no entanto, deficiente. A Alrosa ignora o facto de que a De Beers não é um mero comprador no mercado de diamantes brutos mas também o maior produtor mundial nesse mesmo mercado. As relações de fornecimento previstas no contrato notificado teriam sido, portanto, não apenas de natureza vertical mas também horizontal, isto é, um contrato entre concorrentes, o que constitui uma diferença substancial em relação caso Langnese‑Iglo no qual se tratava de contratos de compra exclusiva (136).

234. Como já foi acima referido, não corresponde em princípio a um comportamento concorrencial normal o facto de uma empresa comprar a totalidade da produção do seu maior concorrente – ou, em qualquer caso uma parte considerável da mesma – em particular quando o comprador tem uma posição dominante no mercado (137). Isto também foi aceite pela Alrosa em resposta a uma pergunta na audiência perante o Tribunal de Justiça.

235. A isto acrescem, no caso presente, o reconhecido papel desempenhado no passado pela De Beers como «criador de mercado» e os seus esforços para controlar a produção no mercado dos diamantes (138). Nestas circunstâncias era perfeitamente razoável que a Comissão presumisse que continuar uma relação de fornecimento entre a Alrosa e a De Beers podia conduzir a um abuso da posição dominante da De Beers. Para afastar este perigo para a concorrência, a Comissão tinha tido o direito de tornar obrigatórios os compromissos individuais da De Beers, que previam a cessação completa desta relação de fornecimento.

236. Além disso, a Alrosa queixa‑se de que lhe foram fechados os acessos ao maior comprador do mercado. Na sua opinião, a Comissão deveria ter‑lhe permitido, pelo menos, realizar vendas ad hoc à De Beers, por exemplo, através de leilões pela melhor oferta. Já anteriormente demonstrei que nenhum destes argumentos é sustentável (139).

237. Por outro lado, a Alrosa manifesta o receio de, sem a De Beers como compradora, perder toda e qualquer certeza de vender os seus diamantes brutos a preços economicamente atractivos. O poder de negociação dos restantes compradores aumentaria de tal maneira que só seria possível vender a preços mais baixos, o que conduziria a uma distorção da concorrência em prejuízo da Alrosa.

238. No entanto, numa economia de mercado aberto, cada operador deve suportar o risco de venda dos seus próprios produtos. Se se quisesse permitir a favor de uma determinada empresa a subsistência de uma relação de fornecimento duvidosa à luz do artigo 82.° CE, estariam a proteger‑se os concorrentes da concorrência e a dar primazia aos interesses das empresas participantes em prejuízo do interesse geral numa concorrência não falseada (artigo 3.°, n.° 1, alínea g) CE). O objectivo do direito europeu da concorrência tem forçosamente de ser a protecção da concorrência e não do concorrente, porque com isso beneficiam indirectamente os consumidores e o interesse geral (140).

239. O facto de que doravante a Alrosa tenha que ter negociações de preços mais intensivas com os compradores que permanecem no mercado de diamantes brutos, não é expressão de menos mas, pelo contrário, de mais concorrência. Como a Comissão afirma sobre este ponto – sem ser contestada – o mercado caracteriza‑se por um grande número de compradores comparativamente pequenos, cujo poder de negociação não pode ser sobrevalorizado.

240. Por último, a Alrosa afirma que a decisão impugnada influenciará desvantajosamente a concorrência porque, em consequência dela, existirá um sério risco de redução da produção, se a Alrosa não encontrar mais compradores para os seus diamantes brutos. Porém, como a Comissão contrapõe com razão, semelhante cenário é improvável se se tiver em consideração que a procura de diamantes permanece constante no mercado a jusante. A própria Alrosa nada alegou quanto ao que poderia indiciar um enfraquecimento da procura neste mercado a jusante.

241. No conjunto, é de constatar que a decisão impugnada não viola o princípio da liberdade contratual. A primeira parte do terceiro fundamento do recurso na primeira instância é, por isso, infundamentada.

b)      Quanto à proporcionalidade (segunda parte do terceiro fundamento do recurso)

242. A Alrosa afirma que a decisão impugnada não pode apoiar‑se no artigo 82.° CE e no artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003, porque viola o princípio da proporcionalidade.

243. No essencial, a Alrosa argumenta que uma proibição absoluta de a De Beers adquirir diamantes brutos à Alrosa não é necessária por duas razões: em primeiro lugar, o contrato notificado não reserva à De Beers, em caso algum, mais do que 50% da produção de diamantes da Alrosa. E, em segundo lugar, através dos compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa, a Comissão tinha uma solução alternativa menos restritiva do que a proibição total de venda.

244. Estes argumentos não justificam a declaração de nulidade da decisão impugnada.

245. Em primeiro lugar, importa recordar que o exame da adequação e da necessidade de compromissos com vista a uma decisão nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 exige à Comissão a apreciação de situações económicas complexas para a qual a Comissão dispõe da correspondente margem de apreciação (141).

246. No quadro desta margem de apreciação, a Comissão teve que decidir, no caso presente, em primeiro lugar se o contrato notificado suscita reservas quanto à concorrência e, em segundo, se os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa podiam ser considerados uma medida menos gravosa do que os compromissos individuais da De Beers.

247. Conforme já foi referido (142), o juiz comunitário é competente para examinar a legalidade de uma tal decisão da Comissão do ponto de vista substantivo, quanto à exactidão dos factos em que essa decisão assenta e quanto à inexistência de erros de apreciação manifestos. Para isso, deve verificar não só a exactidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também se estes elementos constituem a totalidade dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são susceptíveis de fundamentar as conclusões que deles se retiram.

248. No caso presente, só é controvertida a questão de saber se a situação de facto constatada pela Comissão permite chegar às conclusões que esta daí retirou, ou seja, por um lado, a conclusão de que o contrato notificado suscita dúvidas no que diz respeito à concorrência, face ao disposto no artigo 82.° CE e, por outro, a conclusão de que os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa não constituem uma alternativa adequada para os compromissos individuais tornados obrigatórios.

i)      Quanto à existência de um problema de concorrência

249. No que respeita, em primeiro lugar, à existência de um problema de concorrência, a Alrosa contentou‑se com uma referência lapidar ao facto de que, no passado, as suas relações exclusivas de fornecimentos exclusivos a empresas em posição dominante no mercado, de uma grandeza comparável às do contrato notificado (cerca de 50% da produção total da Alrosa) nunca suscitaram preocupações do ponto de vista do direito da concorrência.

250. No caso sub iudice, não precisa de se analisar se estas alegações pouco fundamentadas, apresentadas pela Alrosa, procedem, pois, de qualquer modo, o mesmo caracteriza‑se por uma série de especificidades.

251. Em primeiro lugar, os cerca de 50% de produção anual de diamantes da Alrosa que deveriam ser objecto do contrato notificado com a De Beers constituem a totalidade da sua produção destinada à exportação (143). Em segundo lugar, a De Beers não era um comprador qualquer das mercadorias da Alrosa, mas o principal produtor mundial de diamantes brutos, ou seja, um concorrente da Alrosa que, além disso, segundo a avaliação provisória da Comissão estava em posição dominante (144). Em terceiro lugar, segundo as constatações da Comissão havia indicações de que o contrato notificado possibilitaria à De Beers como «criador de mercado» controlar a produção no mercado dos diamantes (145).

252. Nestas circunstâncias não se pode pôr em causa a conclusão da Comissão de que o contrato notificado suscitava preocupações, do ponto de vista do direito da concorrência, sobre a sua compatibilidade com o artigo 82.° CE. A Comissão podia razoavelmente concluir que este contrato conduziria a um abuso de posição dominante da De Beers.

ii)    Quanto à adequação e necessidade dos compromissos individuais da De Beers

253. No que respeita à adequação e necessidade dos compromissos individuais da De Beers, tornados obrigatórios, que prevêem a completa cessação das relações comerciais com a Alrosa, deve dizer‑se o seguinte.

254. É certo que a Comissão contava com os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa como medida hipoteticamente menos gravosa. A Comissão estava, por isso, obrigada a averiguar se estes compromissos conjuntos eram tão adequados como os compromissos individuais da De Beers, que iam claramente mais longe, para resolver os problemas de concorrência por ela identificados. Para este exame, a Comissão apoiou‑se numa consulta ao mercado cujos resultados estão documentados na decisão impugnada, ainda que de forma sucinta (146).

255. Embora no procedimento administrativo a Alrosa tenha criticado os resultados da consulta ao mercado (147), não os impugnou no seu recurso no Tribunal de Primeira Instância. Só nesta fase do recurso para o Tribunal de Justiça a Alrosa alegou perante o juiz comunitário, pela primeira vez, que as tomadas de posição dos 21 terceiros interessados não tinham qualquer valor (148). Esta forma de proceder é inadmissível, porque o objecto do litígio num recurso não pode ser alargado em relação ao do processo na primeira instância através da dedução de novos fundamentos (artigo 42.°, n.° 2 em conjugação com o artigo 118.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça) (149). Em consequência, basear‑me‑ei seguidamente nas constatações da Comissão quanto aos resultados da consulta ao mercado que a Alrosa não impugnou atempadamente no Tribunal.

256. As observações de terceiros interessados no quadro da consulta ao mercado evidenciaram, entre outras coisas, que a continuação das relações de fornecimento, de longa data, da De Beers permitiria a esta última impedir que a Alrosa se tornasse um concorrente independente no mercado (150). A grande maioria dos terceiros interessados entendia quanto a isto que não deveria existir entre a De Beers e a Alrosa qualquer relação de compra e venda (151).

257. Nestas circunstâncias não se pode pôr em causa a conclusão da Comissão de que os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa, destinados a permitir a continuação de vendas quantitativamente limitadas da Alrosa à De Beers não eram adequados para resolver os problemas de concorrência identificados pela Comissão. Em todo o caso, era razoável presumir que os compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa eram tão adequados quanto os compromissos individuais da De Beers para resolver as preocupações relativamente ao artigo 82.° CE.

258. Ao contrário do caso Automec (152), para o qual a Alrosa várias vezes remete, não existiam no caso presente muitas possibilidades de solução de igual valor para o problema de concorrência identificado pela Comissão. Consequentemente, o acórdão Automec/Comissão não é transponível para o presente caso.

259. Em vista do que antecede, deve concluir‑se que mesmo o conhecimento dos compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa não podia impedir a Comissão de tornar obrigatórios os compromissos individuais da De Beers que iam mais longe.

iii) Quanto à proporcionalidade em sentido estrito

260. A Alrosa argumenta, além disso, que uma proibição de todas e quaisquer vendas à De Beers prejudica excessivamente os seus interesses. A liberdade da Alrosa de celebrar contratos com o seu actual mais importante cliente seria completamente anulada por um período potencialmente ilimitado.

261. Este argumento coincide com a primeira parte do segundo fundamento do recurso que é dedicado à liberdade contratual, e deve ser rejeitado, pelos argumentos aí desenvolvidos (153).

iv)    Quanto à alegada discriminação da Alrosa

262. Por último, a Alrosa argumenta que a decisão impugnada é arbitrária, discrimina a empresa face a outros fornecedores que podem no futuro continuar a vender diamantes brutos à De Beers sem terem que entrar em concorrência com a Alrosa.

263. A Alrosa não expôs circunstanciadamente se existem outros produtores que vendem quantidades significativas à De Beers. No entanto, essa informação teria sido necessária, dado que as vendas entre concorrentes não podem ser automaticamente consideradas simplesmente como um comportamento normal no mercado (154).

264. Mesmo admitindo que essas vendas se realizem, a Alrosa não é discriminada pela decisão impugnada face a outros produtores.

265. Segundo jurisprudência assente, o princípio da igualdade de tratamento ou da não discriminação exige que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de maneira igual, a não ser que tal tratamento seja objectivamente justificado (155).

266. No caso presente, a Alrosa e os outros produtores mundiais que operam no mercado mundial de diamantes brutos não se encontram necessariamente numa situação comparável. Segundo as constatações do Tribunal, a Alrosa (156) ocupa a segunda posição em importância no mercado mundial dos diamantes e desejava celebrar um contrato de fornecimento a longo prazo com a De Beers, que ocupava a primeira posição no mercado. Com base na situação hegemónica no mercado de ambas as empresas, uma relação de fornecimento entre a De Beers e a Alrosa pode, desde logo, ser qualificada como diferente de qualquer relação de fornecimento entre a De Beers e outros produtores claramente mais pequenos, de diamantes brutos.

267. Acresce a isto que, com o contrato notificado, se pretendia prosseguir uma relação de fornecimento exclusivo existente desde há décadas entre a Alrosa e a De Beers, que esta tinha utilizado para garantir a sua posição de «criador de mercado» e controlar a produção no mercado mundial (157). Este contexto histórico também diferencia a situação da Alrosa da dos outros produtores do mercado.

268. Em consequência, não existe qualquer violação do princípio geral da igualdade de tratamento e da não discriminação. Ao contrário das afirmações da Alrosa, a decisão impugnada também não era arbitrária mas sim baseada em considerações objectivas, entre as quais se contavam, em particular, os resultados de uma consulta ao mercado feita pela Comissão.

269. Apenas para esgotar a questão, acrescento que a decisão impugnada não pode ser entendida como uma autorização sem limites para todas as compras de diamantes brutos que a De Beers queira fazer a outros produtores que não a Alrosa. Antes pelo contrário, as relações de fornecimento da De Beers com outros fornecedores devem ser apreciadas, tendo em consideração as circunstâncias do caso concreto, pelos critérios dos artigos 81.° e 82.° CE, bem como dos artigos 53.° e 54.° EEE.

v)      Conclusão provisória

270. Pelo exposto, a segunda parte do terceiro fundamento do recurso da primeira instância não procede.

C –    Conclusão provisória

271. Uma vez que nenhum dos fundamentos invocados pela Alrosa na Primeira Instância é procedente, deve ser negado provimento ao recurso de anulação interposto por ela da decisão impugnada.

VII – Despesas

272. Nos termos do artigo 122.°, primeiro parágrafo, do seu Regulamento de Processo, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas quando o recurso é julgado procedente e decide ele próprio definitivamente sobre o litígio.

273. Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, em conjugação com o artigo 118.°, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Uma vez que a Comissão pediu que a Alrosa fosse condenada nas despesas e esta sucumbiu nos seus argumentos em ambas as instâncias, deve suportar as despesas dos processos nas duas instâncias.

VIII – Conclusão

274. Em vista das considerações que precedem, proponho ao Tribunal de Justiça que decida:

1)      anular o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Julho de 2007, no processo T‑170/06, Alrosa/Comissão.

2)      julgar improcedente o recurso em que a Alrosa pediu ao Tribunal de Primeira Instância a declaração de nulidade da Decisão 2006/520/CE da Comissão, de 22 de Fevereiro de 2006.

3)      condenar a Alrosa nas despesas do processo em ambas as instâncias.


1 – Língua original: alemão.


2 – Sem relevância para a versão em língua portuguesa.


3 – Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado (JO 2003 L 1, p. 1).


4 – Decisão 2006/520/CE da Comissão de 22 de Fevereiro de 2006, relativa a um processo de aplicação do artigo 82.° do Tratado CE e do artigo 54.° do Acordo EEE (Processo COMP/B‑2/38.381 – De Beers) notificada com o número C(2006) 521 e publicada resumidamente no JO L 205, p. 24, a seguir também «decisão impugnada».


5 – Acórdão do Tribunal de Primeira Instância, de 11 de Julho de 2007, Alrosa/Comissão (T‑170/06, Colect., p. II‑2601, corrigido por despacho do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Agosto de 2007 (a seguir também «acórdão recorrido» ou «acórdão da primeira instância»).


6 – Regulamento (CE) n.° 773/2004 da Comissão de 7 de Abril de 2004, relativo à instrução de processos pela Comissão para efeitos dos artigos 81.° e 82.° do Tratado CE (JO L 123, p. 18).


7 – Artigo 45.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003.


8 – O fundamento do Regulamento n.° 773/2004 é o artigo 33.° do Regulamento n.° 1/2003; quanto à entrada em vigor, v. artigo 20.° do Regulamento n.° 773/2004.


9 – O Regulamento n.° 773/2004 foi, por um lado, alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1792/2006 da Comissão, de 23 de Outubro de 2006 (JO L 362, p. 1) e, por outro, pelo Regulamento (CE) 622/2008 da Comissão, de 30 de Junho de 2008 (JO L 171, p. 3).


10 – N.os 8 a 26 e 179 do acórdão recorrido.


11 – A seguir «Alrosa».


12 – A seguir também «De Beers».


13 – Regulamento (CEE) n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962: Primeiro Regulamento de execução dos artigos 85.° e 86.° do Tratado (JO 13, p. 204). Este Regulamento contém as disposições transitórias relativas ao Regulamento n.° 1/2003 pelo qual foi substituído a partir de 1 de Maio de 2004.


14 – A seguir «compromissos individuais da Alrosa».


15 – A seguir «compromissos conjuntos da De Beers e da Alrosa».


16 – JO C 136, p. 32.


17 – A seguir «compromissos individuais da De Beers».


18 – A Comissão acentua, no seu requerimento do recurso, que se trata aí da versão final dos compromissos que já lhe tinham sido apresentados no fim de Novembro de 2005 ou no princípio de Dezembro de 2005, nos quais, até 26 de Janeiro de 2006, ainda foram introduzidas algumas modificações de redacção.


19 – Como resulta do n.° 185 do acórdão recorrido, a Comissão informou a Alrosa, por comunicação de 22 de Fevereiro de 2006, de que o processo que estava em causa «tinha sido encerrado».


20 – V. n.° 30 do acórdão recorrido.


21 – O original do requerimento do recurso, primeiramente enviado por fax, deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 26 de Setembro de 2007.


22 – V., em particular, os seguintes acórdãos, entre muitos outros: de 11 de Julho de 1989, Schräder (265/87, Colect., p. 2237, n.° 21), de 13 de Novembro de 1990, Fedesa e o. (C‑331/88, Colect., p. 4023, n.° 13), de 12 de Julho de 2001, Jippes e o. (C‑189/01, Colect., p. I‑5689, n.° 81), de 9 de Março de 2006, Zuid‑Hollandse Milieufederatie e Natuur en Milieu (C‑174/05, Colect., p. I‑2443, n.° 28), e de 24 de Maio de 2007, Maatschap Schonewille‑Prins (C‑45/05, Colect., p. I‑3997, n.° 45).


23 – V., por exemplo, acórdãos de 6 de Abril de 1995, RTE e ITP/Comissão («Magill», C‑241/91 P e C‑242/91 P, Colect., p. I‑743, n.° 93), e de 18 de Dezembro de 2007, Cementbouw Handel & Industrie BV/Comissão («Cementbouw», C‑202/06 P, Colect., p. I‑12129, n.° 52).


24 – Neste sentido, também n.os 88 e 139 do acórdão recorrido.


25 – Neste sentido, acórdãos de 25 de Janeiro de 2007, Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão (C‑403/04 P e C‑405/04 P, Colect., p. I‑729, n.° 40), de 10 de Julho de 2008, Bertelsmann e Sony Corporation of America/Impala («Impala», C‑413/06 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 117), e de 16 de Dezembro de 2008, Masdar (UK)/Comissão (C‑47/07 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 77).


26 – Quanto a este ponto, v. ainda, a jurisprudência citada na nota 22.


27 – V., em especial, n.os 101, 103 e 104, bem como o n.° 140 do acórdão recorrido.


28 – N.os 87 e 95 do acórdão recorrido.


29 – A afirmação, no n.° 87 do acórdão recorrido, de que uma decisão nos termos do artigo 9.° do Regulamento n.° 1/2003 tem por efeito «pôr termo ao processo de verificação e punição de uma infracção às regras da concorrência» é pelo menos equívoca.


30 – V., quanto a este ponto, a segunda frase do décimo terceiro considerando do Regulamento n.° 1/2003.


31 – Quanto a este ponto, v. em relação a um processo de controlo de concentrações, as minhas conclusões de 26 de Abril de 2007 no processo Cementbouw (referido na nota 23, n.° 69).


32 – Quanto a este ponto, v. ainda, supra, n.° 53 das presentes conclusões.


33 – N.° 154 do acórdão recorrido.


34 – V., em particular, n.os 101, 140 e 154 do acórdão recorrido.


35 – V., em particular, n.° 154 do acórdão recorrido.


36 – Acórdãos de 23 de Abril de 2002, Campogrande/Comissão (C‑62/01 P, Colect., p. I‑3793, n.° 24), de 22 de Junho de 2006, Storck/IHMI (C‑24/05 P, Colect., p. I‑5677, n.os 34 e 35) e de 15 de Março de 2007, British Airways/Comissão (C‑95/04 P, Colect., p. I‑2331, n.° 137).


37 – Jurisprudência constante; v. acórdãos de 7 de Janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., p. I‑123, n.° 48), de 6 de Abril de 2006, General Motors/Comissão (C‑551/03 P, Colect., p. I‑3173, n.° 51), de 10 de Maio de 2007, SGL Carbon/Comissão (C‑328/05 P, Colect., p. I‑3921, n.° 41), e de 2 de Abril de 2009, Bouygues e Bouygues Télécom SA/Comissão (C‑431/07 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 137).


38 – Acórdãos de 15 de Fevereiro de 2005, Comissão/Tetra Laval (C‑12/03 P, Colect., p. I‑987, n.os 37 a 49), de 22 de Novembro de 2007, Espanha/Lenzing (C‑525/04 P, Colect., p. I‑9947, n.os 56 a 61), e Impala (referido na nota 25, n.os 135 a 150, em especial o n.° 143).


39 – Fundamental quanto ao âmbito da margem de apreciação da Comissão nos processos sobre direito da concorrência é o acórdão de 11 de Julho de 1985, Remia B.V. e o. /Comissão (42/84, Colect., p. 2545, n.° 34); v. também os acórdãos de 17 de Novembro de 1987, British American Tobacco e R. J. Reynolds Industries Inc./Comissão (142/84 e 156/84, Colect., p. 4487, n.° 62), e Aalborg Portland e o./Comissão (referido na nota 37, n.° 279).


40 – N.os 108 a 110 do acórdão recorrido.


41 – Acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Abril de 2003, Royal Philips Electronics NV/Comissão (T‑119/02, Colect., p. II‑1433, n.° 78), e de 30 de Setembro de 2003, ARD/Comissão (T‑158/00, Colect., p. II‑3825, n.° 328); v., além disso, as minhas conclusões no processo Cementbouw (referido na nota 23, n.° 67).


42 – N.os 123 a 125, em particular o n.° 125 do acórdão recorrido.


43 – N.° 126 do acórdão recorrido.


44 – Acórdão Impala, já referido na nota 25, n.° 144.


45 – Acórdãos Comissão /Tetra Laval (referido na nota 38, n.° 39) e Impala (referido na nota 25, n.° 145). Esta jurisprudência, primeiramente desenvolvida em relação com o controlo de concentrações, alcançou posteriormente relevância para além desta área do direito e pode aplicar‑se sempre que se trate de verificar se as decisões da Comissão enfermam de erro manifesto: v. acórdãos Espanha/Lenzing (referido na nota 38 n.° 57) e de 6 de Novembro de 2008, Países Baixos/Comissão (C‑405/07 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 55), bem como o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Setembro de 2006, Dresdner Bank/Comissão (T‑44/02 OP, T‑54/02 OP e T‑56/02 OP, T‑60/02 OP e T‑61/02 OP, Colect., p. II‑3567, n.° 67).


46 – Neste sentido também o n.° 131 do acórdão recorrido.


47 – N.° 132 do acórdão recorrido.


48 – Neste sentido, quadragésimo primeiro e quadragésimo segundo considerandos da decisão em litígio.


49 – A este respeito, v. as minhas conclusões no processo Impala (referido na nota 25, n.° 240).


50 – V. as minhas conclusões de 10 de Março de 2009 no processo S.P.C.M. e o. (C‑558/07, ainda não publicadas na Colectânea, n.° 77); no mesmo sentido, o acórdão de 12 de Março de 2002, Omega Air e o. (C‑27/00 e C‑122/00, Colect., 2002, p. I‑2569, n.° 72), onde se conclui que não existe qualquer erro manifesto ou de apreciação quando a instituição em causa podia partir na sua decisão «razoavelmente» de determinadas assumpções; v., além disso, as minhas conclusões de 1 de Fevereiro de 2007 no processo Espanha /Lenzing (referido na nota 38, n.° 71), nas quais concluí que «um prognóstico só estaria manifestamente errado se não se justificasse com base em nenhum ponto de vista concebível».


51 – N.° 133 do acórdão recorrido.


52 – N.° 134 do acórdão recorrido.


53 – N.° 153, última frase, do acórdão recorrido.


54 – N.° 153, primeira frase, do acórdão recorrido.


55 – V. supra, n.° 57 das presentes conclusões.


56 – N.° 134 do acórdão recorrido.


57 – N.os 138 e 153 do acórdão recorrido.


58 – Neste sentido, acórdão Impala (referido na nota 25, n.° 145), segundo o qual, quando a Comissão dispõe de uma margem de apreciação o Tribunal de Primeira Instância não pode substituir a apreciação económica da Comissão pela sua própria.


59 – Acórdãos de 15 de Junho de 2000, Dorsch Consult/Conselho e Comissão (C‑237/98 P, Colect., p. I‑4549, n.° 36), de 18 de Janeiro de 2007, PKK e KNK/Conselho (C‑229/05 P, Colect., p. I‑439, n.° 35) e de 16 de Julho de 2009, Comissão/Schneider Electric (C‑440/07 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 104).


60 – Acórdãos PKK e KNK/Conselho (referido na nota 59, n.° 37), de 18 de Julho de 2007, Industrias Químicas del Vallés/Comissão (C‑326/05 P, Colect., p. I‑6557, n.° 60), de 22 de Novembro de 2007, Sniace/Comissão (C‑260/05 P, Colect., p. I‑10005, n.° 37) e de 8 de Maio de 2008, Eurohypo/IHMI (C‑304/06 P, Colect., p. I‑3297, n.° 34) bem como o despacho de 3 de Junho de 2009, Zipcar/IHMI (C‑394/08 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 40).


61 – N.os 115 e 150 do acórdão recorrido.


62 – No n.° 99 do acórdão recorrido, o Tribunal afirma: «a fiscalização da proporcionalidade de uma medida constitui uma fiscalização objectiva...».


63 – Acórdãos de 7 de Maio de 1998, Somaco/Comissão (C‑401/96 P, Colect., p. I‑2587, n.° 53), Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão (referido na nota 25, n.° 77) e de 16 de Julho de 2009, Der Grüne Punkt – Duales System Deutschland/Comissão (C‑385/07 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 71).


64 – Acórdãos de 6 de Março de 2001, Connolly/Comissão (C‑274/99 P, Colect., p. I‑1611, n.° 121), Aalborg Portland e o. /Comissão (referido na nota 37, n.° 372), de 2 de Abril de 2009, France Télécom/Comissão (C‑202/07 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 30) e Comissão/Schneider Electric (referido na nota 59, n.° 135).


65 – Acórdãos de 14 de Maio de 1998, Conselho/De Nil e Impens (C‑259/96 P, Colect., p. I‑2915, n.os 32 e 33), Aalborg Portland e o./Comissão (referido na nota 37, n.° 372), France Télécom/Comissão (referido na nota 64, n.° 29) e Comissão/Schneider Electric (referido na nota 59, n.° 135).


66 – Acórdão de 7 de Junho de 2007, Wunenburger/Comissão (C‑362/05 P, Colect., p. I‑4333, n.° 80).


67 – Quanto a esta comunicação, v. o n.° 26 das presentes conclusões.


68 – Quanto à desvirtuação dos factos, v. a jurisprudência indicada na nota 59; quanto à qualificação jurídica dos factos, v. o despacho de 17 de Setembro de 1996, San Marco/Comissão (C‑19/95 P, Colect., p. I‑4435, n.° 39), e ainda acórdãos Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão (referido na nota 25, n.° 39) e Comissão/Schneider Electric (referido na nota 59, n.° 191).


69 – Acórdão Impala (referido na nota 25, em particular os n.os 64, 65, 73 e 76); neste ponto o Tribunal de Justiça não seguiu as minhas conclusões de 13 de Dezembro de 2007 nesse processo (v. aí, em especial, n.os 171 a 176).


70 – No n.° 16 do texto da comunicação no Jornal Oficial encontra‑se a seguinte referência: «Sob reserva do resultado do presente teste de mercado, a Comissão tenciona adoptar uma decisão nos termos do n.° 1 do artigo 9.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003...» (sublinhado nosso).


71 – N.° 136, segunda frase e n.° 192, primeira frase, do acórdão recorrido.


72 – Trata‑se dos n.os 132 a 154 do acórdão recorrido.


73 – Quanto a este ponto, v. supra, n.° 45 das presentes conclusões e a jurisprudência referida na nota 25.


74 – Quanto a este ponto, v. a matéria de facto dada como provada nos n.os 8 e 9, bem como a citação da decisão impugnada no n.° 116 do acórdão recorrido onde se refere «relação comercial entre esta sociedade [De Beers] e o seu concorrente mais importante, a Alrosa».


75 – N.os 138 e 153 do acórdão recorrido.


76 – Acórdãos de 14 de Fevereiro de 1978, United Brands e United Brands Continentaal/Comissão (27/76, Colect., p. 207, n.° 189), de 16 de Setembro de 2008, Sot. Lélos kai Sia e o. (C‑468/06 a C‑478/06, ainda não publicado na Colectânea, n.° 50) e de 11 de Dezembro de 2008, Kanal 5 e TV 4 (C‑52/07, ainda não publicado na Colectânea, n.° 26).


77 – V., por exemplo, n.os 58, 63 e 68 da contestação da Comissão na Primeira Instância e n.° 74 do acórdão recorrido.


78 – N.° 153 do acórdão recorrido.


79 – Quanto a este ponto, v. ainda, o n.° 121 das presentes conclusões e a jurisprudência referida na nota 76.


80 – Considerandos vigésimo quinto, vigésimo sexto, vigésimo oitavo e trigésimo da decisão impugnada; v. também o n.° 83 do acórdão recorrido.


81 – Acórdãos de 18 de Março de 1993, Parlamento/Frederiksen (C‑35/92 P, Colect., p. I‑991, n.° 31), de 8 de Maio de 2003, T. Port/Comissão (C‑122/01 P, Colect., p. I‑4261, n.° 17), de 28 de Junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão (C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, Colect., p. I‑5425, n.° 148) e de 13 de Setembro de 2007, Common Market Fertilizers/Comissão (C‑443/05 P, Colect., p. I‑7209, n.° 137).


82 – V. n.os 158 e 204 do acórdão recorrido. Na língua de processo diz‑se que estas afirmações são feitas «for the sake of completeness».


83 – Nos documentos juntos trata‑se da tomada de posição de terceiros interessados no quadro da consulta do mercado e um extracto dos compromissos individuais da De Beers (v. n.° 29 das presentes conclusões).


84 – Acórdãos Aalborg Portland e o./Comissão (referido na nota 37, n.° 372), Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão (referido na nota 37, n.° 42) e Comissão/Schneider Electric (referido na nota 59, n.° 135).


85 – N.° 201 do acórdão recorrido (sublinhado nosso).


86 – N.° 203 do acórdão recorrido.


87 – Acórdão Wunenburger/Comissão (referido na nota 66, n.° 80).


88 – A Comissão refere‑se ao n.° 130 do acórdão recorrido.


89 – Acórdãos de 14 de Setembro de 1999, Comissão/AssiDomän Kraft Products e o. (C‑310/97 P, Colect., p. I‑5363, n.° 52), de 15 de Fevereiro de 2001, Nachi Europe (C‑239/99, Colect., p. I‑1197, n.° 24) e de 19 de Janeiro de 2006, Comunità montana della Valnerina/Comissão (C‑240/03 P, Colect., p. I‑731, n.° 43); v. também acórdão de 14 de Dezembro de 1962, Meroni/Alta Autoridade (46/59 e 47/59, Colect., págs. 837, 854).


90 – Acórdãos Comissão/AssiDomän Kraft Products e o. (referido na nota 89, n.° 52) e Comunità montana della Valnerina/Comissão (referido na nota 89, n.° 43).


91 – Despachos de 27 de Setembro de 2004, UER/M6 e o. (C‑470/02 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 69) e de 13 de Junho de 2006, Mancini/Comissão (C‑172/05 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 41).


92 – Conclusões do advogado‑geral P. Léger de 2 de Abril de 1998 apresentadas no processo Parlamento/Gutiérrez de Quijano y Lloréns (C‑252/96 P, Colect., p. I‑7421, n.° 36).


93 – Neste sentido, acórdão Parlamento/Gutiérrez de Quijano y Lloréns (processo referido na nota 92, n.° 34), e despacho UER/M6 e o. (referido na nota 91, n.° 74).


94 – Acórdãos de 10 de Julho de 1986, Bélgica/Comissão (234/84, Colect., p. I‑2263, n.° 27), de 24 de Outubro de 1996, Comissão /Lisrestal e o. (C‑32/95 P, Colect., p. I‑5373, n.° 21), de 8 de Março de 2007, Gerlach (C‑44/06, Colect., p. I‑2071, n.° 38) e de 13 de Setembro de 2007, Land Oberösterreich/Comissão e Áustria /Comissão (C‑439/05 P e C‑454/05 P, Colect., p. I‑7141, n.° 36); v., em especial, quanto ao respeito dos direitos de defesa nos processos judiciais, acórdão de 2 de Outubro de 2003, Corus UK/Comissão (C‑199/99 P, Colect., p. I‑11177, n.° 19).


95 – Acórdãos de 22 de Março de 1961, SNUPAT/Alta Autoridade (42/59 e 49/59, Colect., págs. 111, 169), de 10 de Janeiro de 2002, Plant e o./Comissão e South Wales Small Mines (C‑480/99 P, Colect., p. I‑265, n.° 24) e Corus UK/Comissão (referido na nota 94, n.° 19).


96 – Neste sentido, v. também as minhas conclusões de 27 de Setembro de 2006 no processo PKK e KNK/Conselho (referidas na nota 59, n.° 67).


97 – Do despacho UER/M6 e o. (referido na nota 91, n.° 74) posso concluir que o acórdão da Primeira Instância não se pode apoiar numa «nouvelle thèse inspirée par le Tribunal».


98 – Quanto a este ponto, v. ainda o n.° 201 do acórdão recorrido e o n.° 140 das presentes conclusões.


99 – Artigo 62.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.


100 – Quanto a este ponto, v. o artigo 76.°‑ A do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, bem como o acórdão Royal Philips Electronics NV/Comissão (referido na nota 41, n.° 205).


101 – Acórdãos de 10 de Julho de 1980, Distillers Company/Comissão (30/78, Colect., p. 2229, n.° 26) e de 14 de Fevereiro de 1990, França/Comissão (C‑301/87, Colect., p. I‑307, n.° 31); no mesmo sentido, acórdãos Aalborg Portland e o./Comissão (referido na nota 37, n.° 73) e de 29 de Junho de 2006, SGL Carbon/Comissão (C‑308/04 P, Colect., p. I‑5977, n.os 97 e 98).


102 – Acórdãos de 29 de Outubro de 1980, van Landewyck e o./Comissão (209/78 a 215/78 e 218/78, Colect., p. 3125, n.° 47) e de 23 de Abril de 1986, Bernardi/Parlamento (150/84, Colect., p. I‑1375, n.° 28).


103 – N.° 203 do acórdão recorrido.


104 – A Carta dos Direitos Fundamentais, foi solenemente proclamada primeiramente, em 7 de Dezembro de 2000, em Nice, (JO C 364, p. 1) e depois mais uma vez em 12 de Dezembro de 2007 em Estrasburgo (JO C 303, p. 1).


105 – Trigésimo sétimo considerando do Regulamento n.° 1/2003. É certo que a Carta dos Direitos Fundamentais enquanto tal não possui qualquer efeito jurídico vinculativo comparável ao direito primário, porém, como fonte de conhecimento do direito, dá indicações sobre os direitos fundamentais garantidos ao nível do direito comunitário, pelo menos quando um acto jurídico comunitário remete expressamente para a mesma; v. acórdão de 27 de Junho de 2006, Parlamento/Conselho («Reagrupamento familiar», C‑540/03, Colect., p. I‑5769, n.° 38) e n.° 108 das minhas conclusões de 8 de Setembro de 2005 nesse processo.


106 – V., a este respeito, a jurisprudência referida na nota 94; em especial, quanto ao respeito dos direitos de defesa nos procedimentos em matéria de concorrência, v. acórdãos de 18 de Outubro de 1989, Orkem/Comissão (374/87, Colect., p. I‑3283, n.° 32), e de 3 de Setembro de 2009, Prym e Prym Consumer/Comissão (C‑534/07 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 26).


107 – N.os 176 e 177 do acórdão recorrido.


108 – N.° 178 do acórdão recorrido.


109 – N.° 186 do acórdão recorrido.


110 – N.° 187 do acórdão recorrido.


111 – N.° 187 do acórdão recorrido.


112 – N.os 197 a 203 do acórdão recorrido.


113 – N.° 197 do acórdão recorrido.


114 – V. supra, n.os 174 e 175 das presentes conclusões.


115 – A colocação sistemática do n.° 3, do artigo 27.°, do Regulamento n.° 1/2003 depois do n.° 1 indica que aquele só se deve aplicar para efeitos da adopção de decisões de acordo com os artigos 7.°, 8.°, 23.° e 24.°, n.° 2 deste regulamento.


116 – Quanto a este ponto, v. os acórdãos referidos na nota 106.


117 – N.° 21 do acórdão recorrido; v. também n.° 27 das presentes conclusões.


118 – Esta comunicação foi junta pela Alrosa como anexo 14 da sua petição ao Tribunal de Primeira Instância.


119 – N.° 24 do acórdão recorrido; v. também n.° 30 das presentes conclusões.


120 – V., a este respeito, igualmente os n.os 214 a 216 das presentes conclusões.


121 – N.° 201 do acórdão recorrido.


122 – V. supra, n.os 174 e 175 das presentes conclusões.


123 – Também várias empresas podem ter uma posição dominante conjunta (a chamada posição dominante colectiva).


124 – V., também neste sentido, n.os 89 e 90 do acórdão recorrido.


125 – Proposta de Regulamento do Conselho relativo à execução das regras de concorrência aplicáveis às empresas previstas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado e que altera os Regulamentos (CEE) n.° 1017/68, (CEE) n.° 2988/74, (CEE) n.° 4056/86 e (CEE) n.° 3975/87 («Regulamento de execução dos artigo 81.° e 82.° do Tratado CE») apresentada pela Comissão em 27 de Setembro de 2000 (COM/2000/0582 final, publicada no JO C 365E de 19.12.2000, p. 284); v., em especial, o artigo 9.°, n.° 1, segunda frase, desta Proposta.


126 – V. também n.° 91 do acórdão recorrido.


127 – O direito a uma boa administração encontra assento no artigo 41.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia para o qual remete o trigésimo sétimo considerando do Regulamento n.° 1/2003.


128 – Artigo 16.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.


129 – O advogado‑geral F. G. Jacobs exprimiu isto nas suas conclusões de 28 de Maio de 1998 no processo Bronner (C‑7/97, Colect., p. I‑7791, n.° 56) da forma seguinte: «... [o] direito de escolher os seus parceiros contratuais e de dispor livremente da sua propriedade são princípios universalmente consagrados nos sistemas jurídicos dos Estados‑Membros, assumindo por vezes uma natureza constitucional. As intervenções nestes direitos necessitam ser cuidadosamente justificadas».


130 – Artigo 4.°, n.° 1, CE e artigo 98.° CE; quanto a este ponto, v. também o acórdão de 9 de Setembro de 2003, CIF (C‑198/01, Colect., p. I‑8055, n.° 47).


131 – Acórdão de 28 de Abril de 2009, Comissão/Itália (C‑518/06, ainda não publicado na Colectânea, n.° 66); v., além disso, acórdãos de 21 de Janeiro de 1999, Bagnasco e o. (C‑215/96 e C‑216/96, Colect., p. I‑135, n.os 45 e 46) e de 18 de Julho de 2007, Société thermale d’Eugénie‑les‑Bains (C‑277/05, Colect., p. I‑6415, n.° 21).


132 – Neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1992, Automec/Comissão (T‑24/90, Colect., p. II‑2223, n.os 51 a 53) e – em relação à liberdade de empresa – acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 26 de Outubro de 2000, Bayer/Comissão (T‑41/96, Colect., p. II‑3383, n.° 180).


133 – No mesmo sentido, v. as minhas conclusões apresentadas no processo Cementbouw (referido na nota 23, n.° 71).


134 – No caso presente não existe nenhum elemento que permita invocar uma eventual obrigação de celebrar um contrato, obrigação pela qual a De Beers continuaria a dever comprar determinadas quantidades de diamantes brutos à Alrosa. Desejo ainda indicar, que no decurso da audiência, o Tribunal de Justiça discutiu com as partes o que se costuma designar por «essential‑facilities doctrine» a propósito da rede de distribuição da De Beers. Ora, como a própria Alrosa reconheceu, uma tal rede de distribuição não pode ser considerada como sendo de tal modo essencial que constituísse um mecanismo indispensável (essential facility) ao qual a De Beers devesse necessariamente dar acesso aos outros operadores no mercado. De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a De Beers não teria qualquer obrigação de contratar, mesmo que a criação de um sistema próprio de distribuição não fosse rentável para a Alrosa (acórdão de 26 de Novembro de 1998, Bronner, C‑7/97, Colect., p. I‑7791, n.os 41 a 46, em particular o n.° 45; quanto à doutrina das «essential facilities» doutrina, v. acórdãos «Magill», referido na nota 23, n.os 49 a 57 e de 29 de Abril de 2004, IMS Health, C‑418/01, Colect., p. I‑5039).


135 – A Alrosa invoca, em particular, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Junho de 1995, Langnese‑Iglo/Comissão (T‑7/93, Colect., p. II‑1533, n.os 206 e 207), confirmado por acórdão do Tribunal de Justiça de 1 de Outubro de 1998, Langnese‑Iglo/Comissão (C‑279/95 P, Colect., p. I‑5609, n.° 74).


136 – Acórdão Langnese‑Iglo/Comissão (T‑7/93, referido na nota 135, n.os 4 e 5).


137 – V. supra, n.os 119 a 122 das presentes conclusões.


138 – Considerandos vigésimo quinto, vigésimo sexto, vigésimo oitavo e trigésimo da decisão impugnada, bem como n.os 64 e 65 da contestação da Comissão no processo na primeira instância; v. também o n.° 83 do acórdão recorrido.


139 – V. n.os 119 a 123 e 128 a 130 das presentes conclusões.


140 – V., a este respeito, o n.° 71 das minhas conclusões de 19 de Fevereiro de 2009 no processo T‑Mobile Netherlands e o. (C‑8/08, ainda não publicadas na Colectânea).


141 – V. supra, n.os 70 a 75 das presentes conclusões.


142 – V. supra, n.° 77 das presentes conclusões.


143 – N.° 13 do acórdão recorrido.


144 – N.os 9 e 14 do acórdão recorrido; vigésimo terceiro a vigésimo sétimo considerandos da decisão impugnada.


145 – Considerandos vigésimo oitavo e trigésimo da decisão impugnada.


146 – Considerandos quadragésimo primeiro e quadragésimo segundo da decisão impugnada.


147 – V. quadragésimo primeiro considerando da decisão impugnada.


148 – N.os 67 e 77 da resposta neste recurso e n.° 17 da tréplica da Alrosa. A Alrosa critica em particular que a maior parte das posições negativas de terceiros interessados assentam numa única resposta tipo e não suscitam qualquer problema relevante de concorrência para o caso sub iudice.


149 – Acórdãos de 1 de Junho de 1994, Comissão/Brazzelli Lualdi e o. (C‑136/92 P, Colect., p. I‑1981, n.° 59), Storck/IHMI (referido na nota 36, n.° 45), PKK e KNK/Conselho (referido na nota 59, n.° 61) e France Télécom/Comissão (referido na nota 64, n.° 60).


150 – Quadragésimo primeiro considerando, segundo travessão, da decisão impugnada.


151 – Quadragésimo primeiro considerando, terceiro travessão, da decisão impugnada.


152 – Acórdão Automec/Comissão (referido na nota 132, em particular o n.° 52).


153 – V. supra, n.os 224 a 241 das presentes conclusões.


154 – V. supra, n.os 119 a 122 e 234 das presentes conclusões.


155 – Acórdãos de 10 de Janeiro de 2006, IATA e ELFAA (C‑344/04, Colect., p. I‑403, n.° 95), de 3 de Maio de 2007, Advocaten voor de Wereld (C‑303/05, Colect., p. I‑3633, n.° 56) e de 7 de Julho de 2009, S.P.C.M. e o. (C‑558/07, ainda não publicado na Colectânea, n.° 74).


156 – N.os 8 e 9 do acórdão recorrido; v. também n.os 14 e 15 das presentes conclusões.


157 – Considerandos vigésimo quinto, vigésimo sexto, vigésimo oitavo e trigésimo da decisão impugnada, bem como os n.os 64 e 65 da contestação da Comissão no processo na primeira instância; v. também n.° 83 do acórdão recorrido.