ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

3 de Julho de 2008 ( *1 )

«Incumprimento de Estado — Não avaliação dos efeitos no ambiente de projectos abrangidos pelo âmbito de aplicação da Directiva 85/337/CEE — Regularização a posteriori»

No processo C-215/06,

que tem por objecto uma acção por incumprimento nos termos do artigo 226.o CE, entrada em 11 de Maio de 2006,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por D. Recchia e D. Lawunmi, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

Irlanda, representada por D. O’Hagan, na qualidade de agente, assistido por J. Connolly, SC, e G. Simons, BL, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandada,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, L. Bay Larsen, J. Makarczyk (relator), P. Kūris e J.-C. Bonichot, juízes,

advogado-geral: J. Mazák,

secretário: B. Fülöp, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 14 de Fevereiro de 2008,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Na sua petição, a Comissão das Comunidades Europeias pede ao Tribunal de Justiça que declare que a Irlanda,

não tendo adoptado todas as disposições necessárias para garantir que, antes da sua execução total ou parcial, os projectos abrangidos pelo âmbito de aplicação da Directiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de Junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente (JO L 175, p. 40; EE 15 F6 p. 9), tanto na versão anterior como na posterior às alterações introduzidas pela Directiva 97/11/CE do Conselho, de 3 de Março de 1997 (JO L 73, p. 5), sejam objecto de um exame destinado a determinar se há necessidade de efectuar uma avaliação do impacto ambiental, e, em seguida, quando, pela sua natureza, dimensão ou localização, possam ter efeitos significativos no meio ambiente, sejam sujeitos a uma avaliação relativamente a esses efeitos, em conformidade com o disposto nos artigos 5.o a 10.o da Directiva 85/337, e

não tendo adoptado as disposições necessárias para garantir que a aprovação da construção de um parque eólico e das actividades conexas, em Derrybrien, no condado de Galway, assim como a execução das obras sejam precedidas de uma avaliação do impacto ambiental do projecto, em conformidade com o disposto nos artigos 5.o a 10.o da Directiva 85/337,

não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.o, 4.o e 5.o a 10.o da referida directiva.

Quadro jurídico

Regulamentação comunitária

2

Com a sua acção, a Comissão pretende obter a declaração de que a Irlanda não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Directiva 85/337, tanto na versão inicial como na resultante das alterações introduzidas pela Directiva 97/11.

A Directiva 85/337

3

O artigo 1.o, n.os 2 e 3, da Directiva 85/337 está redigido nos seguintes termos:

«2.   Na acepção da presente directiva, entende-se por:

 

projecto:

a realização de obras de construção ou de outras instalações ou obras,

outras intervenções no meio natural ou na paisagem, incluindo as intervenções destinadas à exploração dos recursos do solo;

 

dono da obra:

 

o autor de um pedido de aprovação de um projecto privado, ou a autoridade pública que toma a iniciativa relativa a um projecto;

 

aprovação:

 

a decisão da autoridade ou das autoridades competentes que confere ao dono da obra o direito de realizar o projecto.

3.   A autoridade ou autoridades competentes serão as que os Estados-Membros designarem como responsáveis pelo desempenho das tarefas resultantes da presente directiva.»

4

Nos termos do artigo 2.o, n.os 1, 2 e 3, primeiro parágrafo, da Directiva 85/337:

«1.   Os Estados-Membros tomarão as disposições necessárias para que, antes d[a] concessão da aprovação, os projectos que possam ter um impacto significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização, sejam submetidos à avaliação dos seus efeitos.

Estes projectos são definidos no artigo 4.o:

2.   A avaliação do impacto no ambiente pode ser integrada nos processos de aprovação dos projectos existentes nos Estados-Membros, ou na falta deles, noutros processos ou em processos a estabelecer para responder aos objectivos da presente directiva.

3.   Em casos excepcionais, os Estados-Membros podem isentar um projecto específico, na totalidade ou em parte, das disposições previstas na presente directiva.»

5

O artigo 3.o da Directiva 85/337 determina:

«A avaliação dos efeitos no ambiente identificará, descreverá e avaliará, de modo adequado, em função de cada caso particular e nos termos dos artigos 4.o a 11.o, os efeitos directos e indirectos de um projecto sobre os seguintes factores:

o homem, a fauna e a flora,

o solo, a água, o ar, o clima e a paisagem,

a interacção entre os factores referidos nos primeiro e segundo travessões,

os bens materiais e o património cultural.»

6

O artigo 4.o da referida directiva está redigido nos seguintes termos:

«1.   Sem prejuízo do disposto no n.o 3 do artigo 2.o os projectos que pertencem às categorias enumeradas no anexo I são submetidos a uma avaliação, nos termos dos artigos 5.o a 10.o

2.   Os projectos pertencentes às categorias enumeradas no anexo II são submetidos a uma avaliação nos termos dos artigos 5.o a 10.o, sempre que os Estados-Membros considerarem que as suas características assim o exigem.

Para este fim, os Estados-Membros podem nomeadamente especificar determinados tipos de projectos a submeter a uma avaliação ou fixar critérios e/ou limiares a reter para poderem, de entre os projectos pertencentes às categorias enumeradas no anexo II, determinar quais os que devem ser submetidos a uma avaliação nos termos dos artigos 5.o a 10.o»

7

Nos termos do artigo 5.o da Directiva 85/337:

«1.   No caso de projectos que, nos termos do disposto no artigo 4.o, devem ser submetidos à avaliação dos efeitos no ambiente, nos termos dos artigos 5.o a 10.o, os Estados-Membros adoptarão as medidas necessárias para assegurar que o dono da obra forneça, de uma forma adequada, as informações especificadas no anexo III, na medida em que:

a)

Os Estados-Membros considerem que essas informações são adequadas a uma determinada fase do processo de aprovação e às características específicas de um projecto determinado ou de um tipo de projecto e dos elementos do ambiente que possam ser afectados;

b)

Os Estados-Membros considerem que se pode exigir razoavelmente que um dono da obra reúna os dados, atendendo, nomeadamente, aos conhecimentos e aos métodos de avaliação existentes.

2.   As informações a fornecer pelo dono da obra nos termos do n.o 1 devem incluir pelo menos:

uma descrição do projecto com informações relativas à sua localização, concepção e dimensões,

uma descrição das medidas previstas para evitar, reduzir e, se possível, remediar os efeitos negativos significativos,

os dados necessários para identificar e avaliar os efeitos principais que o projecto possa ter sobre o ambiente,

um resumo não técnico das informações referidas nos primeiro, segundo e terceiro travessões.

3.   Sempre que o considerem necessário, os Estados-Membros providenciarão para que as autoridades que possuem informações adequadas as coloquem à disposição do dono da obra.»

8

O artigo 6.o da Directiva 85/337 está redigido nos seguintes termos:

«1.   Os Estados-Membros tomam as medidas necessárias para que as autoridades a quem o projecto possa interessar, em virtude da sua responsabilidade específica em matéria de ambiente, tenham a possibilidade de dar o seu parecer sobre o pedido de aprovação. Para o efeito, os Estados-Membros designarão as autoridades a consultar, em geral ou para cada caso, na altura da apresentação do pedido de aprovação. As informações reunidas nos termos do artigo 5.o devem ser transmitidas a essas autoridades. As modalidades desta consulta são fixadas pelos Estados-Membros.

2.   Os Estados-Membros devem assegurar que:

todos os pedidos de aprovação, bem como as informações recolhidas nos termos do artigo 5.o, sejam colocados à disposição do público,

seja dada ao público interessado a possibilidade de exprimir a sua opinião antes de o projecto ser iniciado.»

9

O artigo 7.o da Directiva 85/337 dispõe:

«Sempre que um Estado-Membro verificar que um projecto pode ter um impacto significativo no ambiente de outro Estado-Membro, ou a pedido expresso de um Estado-Membro em cujo território está prevista a realização do projecto, transmitirá ao outro Estado-Membro as informações recolhidas nos termos do artigo 5.o, colocando-as simultaneamente à disposição dos seus próprios nacionais. Essas informações servirão de base para todas as consultas necessárias no âmbito das relações bilaterais dos dois Estados-Membros numa base de reciprocidade e de equivalência.»

10

Nos termos do artigo 8.o da Directiva 85/337:

«As informações reunidas nos termos dos artigos 5.o, 6.o e 7.o devem ser tomadas em consideração no âmbito do processo de aprovação.»

11

O artigo 9.o da referida directiva está redigido nos seguintes termos:

«Logo que tenha sido tomada uma decisão, a autoridade ou autoridades competentes porão à disposição do público interessado:

o teor da decisão e as condições que eventualmente a acompanhem,

os motivos e considerações em que se baseia a decisão, sempre que a legislação dos Estados-Membros assim o preveja.

As modalidades de informação são definidas pelos Estados-Membros.

Se um outro Estado-Membro tiver sido informado nos termos do artigo 7.o, será igualmente informado da decisão em questão.»

12

O artigo 10.o da referida directiva estatui:

«As disposições da presente directiva não prejudicam a obrigação [de as] autoridades competentes respeitarem os limites impostos pelas disposições regulamentares e administrativas nacionais e pelas práticas jurídicas estabelecidas em matéria de segredo industrial e comercial, bem como em matéria de protecção do interesse público.

Nos casos em que o artigo 7.o for aplicável a transmissão de informações a outro Estado-Membro e a recepção de informações doutro Estado-Membro estão sujeitas às restrições em vigor no Estado-Membro onde o projecto foi proposto.»

13

O anexo II da Directiva 85/337 enumera os projectos a que se refere o artigo 4.o, n.o 2, da directiva, ou seja, aqueles para os quais só é necessária uma avaliação dos efeitos no ambiente quando os Estados-Membros considerarem que as suas características assim o exigem. Encontram-se assim referidos, no ponto 2, alínea a), desse anexo, os projectos de extracção de turfa e, no mesmo ponto 2, alínea c), os projectos de extracção de minerais não metálicos nem produtores de energia, como o mármore, a areia, o cascalho, o xisto, o sal, os fosfatos e a potassa.

14

No ponto 10, alínea d), do referido anexo, figuram, designadamente, os projectos de construção de estradas.

Directiva 97/11

15

O artigo 3.o da Directiva 97/11 está redigido nos seguintes termos:

«1.   Os Estados-Membros porão em vigor, o mais tardar em 14 de Março de 1999, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente directiva. Do facto informarão imediatamente a Comissão.

[…]

2.   Para todos os pedidos de aprovação apresentados a uma autoridade competente até ao final do prazo fixado no n.o 1, continua a ser aplicável o disposto na Directiva 85/337/CEE, na versão anterior à presente alteração.»

Directiva 85/337, alterada pela Directiva 97/11 (a seguir «Directiva 85/337 alterada»)

16

Com uma preocupação de clareza, só serão mencionadas as alterações à Directiva 85/337 que tenham relevância directa na perspectiva do incumprimento alegado. Por conseguinte, não serão referidas as alterações que a Directiva 97/11 introduziu nos artigos 5.o a 10.o da Directiva 85/337, porquanto não são susceptíveis de influenciar a apreciação que, no presente caso, o Tribunal de Justiça é chamado a fazer.

17

Nos termos do artigo 2.o, n.os 1, 2 e 3, primeiro parágrafo, da Directiva 85/337 alterada:

«1.   Os Estados-Membros tomarão as disposições necessárias para garantir que, antes de concedida a aprovação, os projectos que possam ter um impacte significativo no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensão ou localização, fiquem sujeitos a um pedido de aprovação e a uma avaliação dos seus efeitos. Estes projectos são definidos no artigo 4.o

2.   A avaliação do impacto no ambiente pode ser integrada nos processos de aprovação dos projectos existentes nos Estados-Membros, ou na falta deles, noutros processos ou em processos a estabelecer para responder aos objectivos da presente directiva.

[…]

3.   Sem prejuízo do disposto no artigo 7.o, os Estados-Membros podem, em casos excepcionais, isentar um projecto específico, na totalidade ou em parte, das disposições previstas na presente directiva.»

18

O artigo 3.o da referida directiva estabelece:

«A avaliação de impacte ambiental identificará, descreverá e avaliará de modo adequado, em função de cada caso particular e nos termos dos artigos 4.o a 11.o, os efeitos directos e indirectos de um projecto sobre os seguintes factores:

o homem, a fauna e a flora,

o solo, a água, o ar, o clima e a paisagem,

os bens materiais e o património cultural,

a interacção entre os factores referidos nos primeiro, segundo e terceiro travessões.»

19

O artigo 4.o da Directiva 85/337 alterada prevê:

«1.   Sem prejuízo do disposto no n.o 3 do artigo 2.o, os projectos incluídos no anexo I serão submetidos a uma avaliação nos termos dos artigos 5.o a 10.o

2.   Sem prejuízo do disposto no n.o 3 do artigo 2.o, os Estados-Membros determinarão, relativamente aos projectos incluídos no anexo II:

a)

Com base numa análise caso a caso;

ou

b)

Com base nos limiares ou critérios por eles fixados;

se o projecto deve ser submetido a uma avaliação nos termos dos artigos 5.o a 10.o

Os Estados-Membros podem decidir aplicar os dois procedimentos referidos nas alíneas a) e b).

3.   Quando forem efectuadas análises caso a caso ou fixados limiares ou critérios para efeitos do disposto no n.o 2, serão tidos em conta os critérios de selecção relevantes fixados no anexo III.

4.   Os Estados-Membros assegurarão que a decisão adoptada pelas autoridades competentes ao abrigo do n.o 2 seja disponibilizada ao público.»

20

No ponto 3, alínea i), do anexo II da Directiva 85/337, são referidas as instalações para aproveitamento da energia eólica para a produção de electricidade (centrais eólicas).

21

Nos termos do ponto 13 desse mesmo anexo, qualquer alteração ou ampliação de projectos incluídos no anexo I ou no anexo II, já autorizados, executados ou em execução, que possa ter um impacto negativo importante no ambiente (alteração ou ampliação não incluída no anexo I), deve ser considerada um projecto abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 4.o, n.o 2, da Directiva 85/337 alterada.

22

No anexo III da Directiva 85/337 alterada, relativo aos critérios de selecção referidos no n.o 3 do artigo 4.o dessa directiva, está especificado que as características dos projectos devem ser consideradas especialmente em relação à poluição e aos incómodos causados e ao risco de acidentes, atendendo sobretudo às tecnologias utilizadas. No mesmo anexo, refere-se que a sensibilidade ambiental das zonas geográficas susceptíveis de serem afectadas pelos projectos deve ser considerada, tendo nomeadamente em conta a capacidade de absorção do ambiente natural, com especial atenção para determinadas zonas, designadamente as zonas montanhosas e florestais.

Legislação nacional

23

As exigências definidas na Directiva 85/337 alterada foram transpostas para o direito interno, designadamente, pela Lei sobre o ordenamento territorial e o desenvolvimento de 2000 (Planning and Development Act 2000), conforme alterada (a seguir «PDA»), e pelos regulamentos sobre o ordenamento territorial e o desenvolvimento de 2001 (Planning and Development Regulations 2001).

24

O artigo 32.o, n.o 1, alínea a), do PDA determina, com carácter geral, que é obrigatório, para qualquer projecto de ordenamento territorial abrangido pelos anexos I e II da Directiva 85/337 alterada, receber a sua aprovação, devendo o respectivo pedido ser apresentado e a correspondente aprovação obtida antes do início das obras. Por outro lado, o artigo 32.o, n.o 1, alínea b), do mesmo diploma prevê que pode ser obtida uma licença para regularizar um ordenamento não autorizado.

25

A autoridade responsável pelo ordenamento do território, sempre que lhe seja apresentado um pedido de aprovação, deve determinar se o projecto proposto deve ser objecto de uma avaliação de impacto ambiental.

26

O artigo 151.o do PDA determina que comete uma infracção quem executar ou realizar um projecto não aprovado.

27

Dos artigos 152.o e 153.o do mesmo diploma decorre que as autoridades responsáveis pelo urbanismo, quando lhes seja apresentada uma queixa, devem, em princípio, enviar uma carta de aviso e, em seguida, pronunciar-se sobre a oportunidade de proceder a uma notificação para cumprir. O não cumprimento das exigências constantes da notificação consubstancia uma infracção.

28

Nos termos do artigo 160.o do PDA:

«1.   Quando um projecto não aprovado tiver sido executado, estiver a ser executado, em vias de ser executado ou prosseguido, a High Court ou a Circuit Court podem, a pedido da autoridade responsável pelo ordenamento do território ou de qualquer pessoa, independentemente de ter ou não um interesse relativamente ao terreno em causa, por despacho, ordenar a qualquer pessoa que execute, se abstenha de executar ou cesse de executar, conforme o caso, tudo o que o tribunal considerar necessário e especificar no despacho, a fim de garantir, se for esse o caso:

a)

que o projecto não aprovado não seja executado ou não prossiga;

b)

se possível, que o terreno seja colocado no estado em que se encontrava antes do início do projecto não aprovado;

c)

que o projecto seja executado de acordo com a aprovação concedida e com as condições nela previstas.

2.   Quando for necessário, o tribunal pode, no despacho que proferir nos termos do n.o 1, exigir a realização de quaisquer obras, incluindo a colocação no estado em que se encontrava, a reconstrução, a retirada, a demolição ou a modificação de qualquer estrutura ou outro elemento.»

29

O artigo 162.o do PDA precisa que o pedido de licença de regularização não implica a suspensão ou o termo do processo coercivo instaurado.

Procedimento pré-contencioso

30

No seguimento de uma notificação para cumprir de 5 de Abril de 2001, a Comissão enviou à Irlanda um parecer fundamentado em 21 de Dezembro de 2001.

31

Em 7 de Julho de 2004, a Comissão enviou a esse Estado-Membro uma notificação para cumprir complementar.

32

Em 5 de Janeiro de 2005, foi enviado à Irlanda um parecer fundamentado complementar, que foi formulado na sequência das observações que este Estado apresentou por ofício de 6 de Dezembro de 2004.

33

A Comissão, considerando que não era satisfatória a posição que a Irlanda defendeu nos seus ofícios de 8 de Março, 17 de Junho e 1 de Dezembro de 2005, em resposta ao referido parecer fundamentado, intentou a presente acção, ao abrigo do artigo 226.o, segundo parágrafo, CE.

Quanto à acção

Quanto à primeira acusação

34

A Comissão acusa a Irlanda de não ter adoptado todas as disposições necessárias para dar cumprimento aos artigos 2.o, 4.o e 5.o a 10.o da Directiva 85/337, tanto da versão inicial como da versão alterada pela Directiva 97/11. Esta acusação será apreciada, em primeiro lugar, à luz da Directiva 85/337 alterada.

35

A primeira acusação, segundo a qual a transposição da Directiva 85/337 alterada foi incompleta e conduz à sua aplicação incorrecta, baseia-se em três fundamentos.

36

Em primeiro lugar, a Comissão alega que a Irlanda não adoptou as disposições necessárias para garantir que se proceda a um exame com vista a determinar, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, da Directiva 85/337 alterada, se os projectos em causa podem ter um impacto significativo no ambiente e, em seguida, se for caso disso, para obrigar a realizar o processo de avaliação do impacto ambiental, previsto na referida disposição, antes da concessão da aprovação.

37

Em segundo lugar, a Comissão considera que as normas legais irlandesas que permitem que seja requerida a regularização de um projecto não aprovado, após a sua execução total ou parcial, contrariam os objectivos de prevenção da Directiva 85/337 alterada.

38

Em terceiro lugar, a Comissão sustenta que as medidas de carácter repressivo adoptadas pela Irlanda não garantem a aplicação efectiva da referida directiva, pelo que a Irlanda não cumpre assim a obrigação geral que lhe incumbe por força do artigo 249.o CE.

39

Em apoio deste último fundamento, a Comissão apresenta alguns exemplos que, em seu entender, ilustram as deficiências existentes na aplicação do regime de sanções.

Quanto aos dois primeiros fundamentos

— Argumentos das partes

40

A Comissão alega que, como, ao abrigo da legislação nacional, é possível cumprir as obrigações impostas pela Directiva 85/337 alterada, durante ou após a execução de um projecto, isto significa que não existe uma obrigação clara de submeter os projectos, antes da sua execução, a um estudo do respectivo impacto no ambiente.

41

Ao aceitar que o controlo dos projectos, no quadro de um estudo de impacto ambiental, possa ser efectuado após a sua execução, quando o objectivo principal da Directiva 85/337 alterada é ter em conta, no mais breve prazo, o impacto no ambiente de todos os processos de planificação e decisão, a legislação nacional em causa reconhece uma possibilidade de regularização que põe em causa o efeito útil dessa directiva.

42

A Comissão acrescenta que as regras relativas à licença de regularização se integram nas disposições gerais aplicáveis à aprovação normal em matéria de urbanismo, não havendo nada que indique que os pedidos de licença de regularização e a concessão dessa licença só podem ter lugar em casos excepcionais.

43

A Irlanda alega que a Comissão não interpreta com exactidão a legislação irlandesa que transpõe a Directiva 85/337 alterada. Assim, esclarece que o direito irlandês determina expressamente que, para todos os projectos novos, é necessária a obtenção de uma licença antes do início das obras e que, para os projectos que devem ser sujeitos a um estudo de impacto ambiental, o referido estudo se realize antes das obras. De resto, o incumprimento destas obrigações configura uma infracção penal e pode conduzir à aplicação de medidas coercivas.

44

Além disso, a Irlanda defende que a licença de regularização, instituída pelo PDA e pelos regulamentos sobre o ordenamento territorial e o desenvolvimento de 2001, constitui uma excepção à regra geral que determina que os projectos devem estar aprovados antes de serem iniciados e cumpre fielmente os objectivos da Directiva 85/337 alterada, bem como, em especial, o objectivo geral de protecção do ambiente, na medida em que a retirada de um projecto não aprovado pode não ser a medida mais adequada do ponto de vista da referida protecção.

45

Segundo este Estado-Membro, a Directiva 85/337 alterada, cujas exigências são de natureza puramente processual, não se pronuncia sobre a existência de uma excepção por força da qual a avaliação do impacto ambiental pode, em determinados casos, ser efectuada após o início das obras. Sublinha, a este respeito, que na directiva não é expressamente indicado que uma avaliação só pode ser efectuada antes da execução do projecto e, com base na definição que essa directiva dá do conceito de «aprovação», sustenta que a utilização do termo «realizar» é significativa, dado que este termo não se limita apenas a fixar o início das obras, visando também a prossecução de um projecto de ordenamento do território.

46

Além disso, a Irlanda defende que a licença de regularização é um mecanismo de recuperação razoável que pode ser utilizado em circunstâncias excepcionais, que visa tomar em consideração o facto de ser inevitável que alguns projectos comecem, por variadas razões, antes da aprovação na acepção da Directiva 85/337 alterada.

47

A este propósito, a Irlanda invoca o acórdão de 7 de Janeiro de 2004, Wells (C-201/02, Colect., p. I-723), para sustentar que, a título de excepção ao princípio geral de que a avaliação deve ser feita no mais curto prazo durante o processo decisório, é possível ser efectuada uma correcta avaliação numa fase posterior.

48

Este Estado-Membro também considera ser desproporcionado exigir a retirada de determinadas estruturas em circunstâncias em que, após exame do pedido de licença de regularização, esta regularização seja considerada compatível com o correcto ordenamento do território e um desenvolvimento sustentável.

— Apreciação do Tribunal

49

Os Estados-Membros devem dar cumprimento à Directiva 85/337 alterada, de uma forma que corresponda plenamente às exigências que ela impõe tendo em conta o seu objectivo essencial que, como decorre do seu artigo 2.o, n.o 1, consiste em os projectos susceptíveis de ter impacte significativo no ambiente, nomeadamente, em razão da sua natureza, das suas dimensões ou da sua localização, serem submetidos, antes da concessão de uma autorização, a um procedimento de pedido de aprovação e a uma avaliação no que respeita aos seus efeitos (v., neste sentido, acórdão de 19 de Setembro de 2000, Linster, C-287/98, Colect., p. I-6917, n.o 52, e de 23 de Novembro de 2006, Comissão/Itália, C-486/04, Colect., p. I-11025, n.o 36).

50

Por outro lado, a aprovação é, nos termos do artigo 1.o, n.o 2, da Directiva 85/337 alterada, a decisão da autoridade ou das autoridades competentes que confere ao dono da obra o direito de realizar o projecto.

51

Como a expressão «confere […] o direito» é inequívoca, o artigo 2.o, n.o 1, da referida directiva deve, necessariamente, ser interpretado no sentido de que, quando o requerente não tenha solicitado e obtido a aprovação necessária e não tenha previamente procedido ao estudo de impacto ambiental quando este é exigido, também não pode começar as obras relativas ao projecto em causa, sob pena de violar as exigências da Directiva 85/337 alterada.

52

Esta análise é válida para todos os projectos que se enquadram no âmbito da Directiva 85/337 alterada, quer sejam abrangidos pelo anexo I dessa directiva e, por conseguinte, estejam sujeitos a uma avaliação sistemática nos termos dos artigos 2.o, n.o 1, e 4.o, n.o 1, da directiva, quer sejam abrangidos pelo anexo II e, só a esse título e em conformidade com o disposto no artigo 4.o, n.o 2, da mesma directiva, estejam sujeitos a um estudo de impacto se, na perspectiva dos limiares ou critérios fixados pelo Estado-Membro e/ou com base numa análise caso a caso, puderem ter um impacto significativo no ambiente.

53

De resto, esta análise literal do referido artigo 2.o, n.o 1, corresponde ao objectivo prosseguido pela Directiva 85/337 alterada, evocado designadamente no quinto considerando da Directiva 97/11, segundo o qual «os projectos para os quais é necessária uma avaliação deverão ser sujeitos ao requisito de autorização de construção [e] que a avaliação deverá ser efectuada antes da concessão dessa autorização».

54

Na situação actual da legislação irlandesa, é certo que a avaliação do impacto ambiental e a licença de urbanização devem, em princípio, respectivamente, ser efectuada e obtida, quando necessárias, antes da realização das obras. A violação destas obrigações constitui, em direito irlandês, uma infracção às normas de urbanismo.

55

Todavia, também é certo que a referida legislação institui uma licença de regularização, cujos efeitos são equiparados aos da licença normal de urbanização prévia à realização das obras e de ordenamentos do território. Essa licença pode ser emitida mesmo que já tenha sido executado o projecto a que se refere, relativamente ao qual seja obrigatório um estudo de impacto ambiental nos termos dos artigos 2.o e 4.o da directiva 85/337 alterada.

56

Além disso, a concessão dessa licença de regularização, a que a Irlanda reconhece recorrer-se habitualmente em matéria de urbanismo, mesmo sem ser em circunstâncias excepcionais, conduz a que, no direito irlandês, se considere que as obrigações impostas pela Directiva 85/337 alterada foram efectivamente respeitadas.

57

Ora, embora o direito comunitário não possa impedir que as normas nacionais aplicáveis permitam, em determinados casos, regularizar operações ou actos que, na perspectiva do direito comunitário, são irregulares, esta possibilidade deve estar subordinada à condição de não proporcionar aos interessados a oportunidade de contornarem as normas comunitárias, ou de não as aplicarem, e de ser excepcional.

58

Na verdade, um regime de regularização como o que vigora na Irlanda pode ter por efeito incentivar os donos das obras a não verificar se os projectos a executar preenchem os critérios definidos no artigo 2.o, n.o 1, da Directiva 85/377 alterada e, por conseguinte, a não encetar as diligências necessárias à identificação das incidências desses projectos no ambiente e à sua avaliação prévia. Ora, de acordo com o primeiro considerando da Directiva 85/337, é necessário que, no processo decisório, a autoridade competente tenha em conta, no mais breve prazo, o impacto de todos os processos técnicos de planificação e de decisão no ambiente, já que o objectivo é mais o de evitar a criação de poluições ou de perturbações na origem do que combater posteriormente os seus efeitos.

59

Por último, a Irlanda também não pode invocar utilmente o acórdão Wells, já referido. Com efeito, o referido acórdão, nos n.os 64 e 65, recorda que, por força do princípio da cooperação leal previsto no artigo 10.o CE, os Estados-Membros são obrigados a eliminar as consequências ilícitas de uma violação do direito comunitário. Assim, as autoridades competentes são obrigadas a adoptar as medidas necessárias para sanar a omissão da avaliação do impacto ambiental, nomeadamente, através da revogação ou da suspensão de uma aprovação já dada, para que essa avaliação seja efectuada, isto dentro dos limites da autonomia processual de que gozam os Estados-Membros.

60

Daqui não se pode inferir que o estudo corrector de impacto ambiental, efectuado para sanar a omissão da avaliação, como prevista e organizada pela Directiva 85/337 alterada, visto o projecto já ter sido executado, equivale ao estudo de impacto ambiental, anterior à aprovação, imposto pela directiva e regulado por esta.

61

Do que precede decorre que a Irlanda, ao atribuir à licença de regularização, que pode ser concedida mesmo que não se verifiquem todas as circunstâncias excepcionais provadas, os mesmos efeitos que atribui à licença de urbanização prévia à execução das obras e de ordenamentos do território, quando os projectos para os quais se exige uma avaliação das incidências no ambiente devem, por força dos artigos 2.o, n.o 1, e 4.o, n.os 1 e 2, da Directiva 85/337 alterada, ser identificados e, em seguida, antes da aprovação e, por consequência, necessariamente, antes da sua execução, ser objecto de um pedido de aprovação e submetidos à referida avaliação, não cumpriu as exigências dessa directiva.

62

Por conseguinte, os dois primeiros fundamentos devem ser julgados procedentes.

Quanto ao terceiro fundamento

— Argumentos das partes

63

Segundo a Comissão, a legislação irlandesa e a prática adoptada em matéria de medidas repressivas comportam lacunas que comprometem a transposição e a execução correctas da Directiva 85/337 alterada, quando este diploma impõe a instituição de um sistema de controlo e repressão efectivo.

64

Em primeiro lugar, a Comissão alega que as medidas repressivas previstas na legislação irlandesa em matéria de urbanismo não compensam a falta de normas que obriguem ao respeito das exigências em matéria de avaliação das incidências no ambiente antes da execução dos projectos.

65

Em segundo lugar, a Comissão alega que a prática em matéria de medidas repressivas compromete a transposição correcta da Directiva 85/337 alterada. A Comissão evoca, assim, situações específicas que, em seu entender, ilustram as lacunas da legislação irlandesa em matéria de controlo do respeito das regras previstas nessa directiva.

66

Quanto ao processo adoptado em matéria de sanções, a Irlanda sustenta que a questão da escolha e da forma destas é da competência dos Estados-Membros, tanto mais que os controlos relativos ao ordenamento do território e ao ambiente não foram harmonizados a nível comunitário.

67

De qualquer modo, a Irlanda sublinha que o regime de sanções previsto na legislação irlandesa é completo e efectivo. A este respeito, este Estado-Membro precisa que, em matéria de direito do ambiente, as disposições aplicáveis são juridicamente vinculativas.

68

Assim, esta legislação obriga as autoridades responsáveis pelo ordenamento do território a enviar uma carta de aviso quando se apercebam que um projecto não aprovado está a ser executado, salvo se considerarem que esse projecto é pouco importante.

69

Uma vez enviada a carta de aviso, as autoridades responsáveis pelo urbanismo devem pronunciar-se sobre a oportunidade de uma notificação para cumprir.

70

A carta de aviso destina-se a permitir às pessoas responsáveis por projectos não aprovados encetarem diligências com vista à reposição da legalidade antes da notificação para cumprir ou das outras fases do processo punitivo.

71

Se houver lugar à notificação para cumprir, esta fixará obrigações e o seu incumprimento constitui uma infracção.

72

A Irlanda acrescenta que o regime de sanções deve atender aos diversos direitos em presença de que são titulares os donos das obras, os proprietários dos terrenos, o público e os particulares directamente afectados pelo referido projecto, devendo todos estes direitos ser ponderados para se chegar a um resultado equitativo.

73

Por último, a Irlanda contesta os exemplos evocados pela Comissão. Entende que o incumprimento alegado não foi provado porquanto a Comissão se limitou a fazer afirmações de carácter genérico.

— Apreciação do Tribunal

74

É um dado adquirido que, na Irlanda, a falta do estudo das incidências no ambiente, exigido pela Directiva 85/337 alterada, pode ser sanada através da obtenção de uma licença de regularização que permite, em especial, que um projecto não aprovado regularmente prossiga, desde que o respectivo pedido de licença seja apresentado antes do início do processo punitivo.

75

Esta possibilidade pode, como de resto a Irlanda reconhece, conduzir as autoridades competentes a não actuarem para suspender ou mandar parar um projecto abrangido pelo âmbito da Directiva 85/337 alterada, em vias de execução ou já executado em violação das exigências relativas à aprovação e à avaliação do impacto no ambiente que deve anteceder a concessão da referida aprovação, e a não instaurarem o processo coercivo previsto no PDA, sublinhando a Irlanda, a este respeito, que a competência nesta matéria é discricionária.

76

Está assim demonstrada a insuficiência do sistema coercivo instituído pela Irlanda, na medida em que a existência da licença de regularização o priva de qualquer eficácia, dado que a referida insuficiência é a consequência directa do incumprimento que se concluiu existir quando da análise dos dois anteriores fundamentos.

77

Esta conclusão não é posta em causa pelo facto de, segundo a Irlanda, o regime de sanções dever atender aos diversos direitos em presença de que são titulares os donos das obras, os proprietários dos terrenos, o público e os particulares directamente afectados pelo projecto em causa. Com efeito, a necessidade da ponderação desses interesses não pode justificar, em si mesma, que um sistema de controlo e repressão não seja eficaz.

78

Assim, não há que analisar, por serem irrelevantes, os diferentes exemplos que a Comissão apresentou para ilustrar as lacunas na aplicação das medidas de carácter repressivo, pois essas lacunas decorrem directamente das insuficiências da própria legislação irlandesa.

79

Por conseguinte, também o terceiro fundamento é procedente e, consequentemente, a primeira acusação deve ser integralmente acolhida.

80

Por último, cabe referir que a procedência do primeiro fundamento é válida à luz tanto da Directiva 85/337 alterada como da Directiva 85/337. Com efeito, tanto na versão inicial desta directiva como na sua versão alterada, os projectos susceptíveis de ter um impacto significativo no ambiente devem ser sujeitos à avaliação do impacto ambiental antes da sua aprovação, já que, de resto, a definição deste conceito não sofreu alterações. Além disso, as características da licença de regularização definidas na legislação irlandesa também continuam a ser as mesmas.

81

Do que precede decorre que a Irlanda, não tendo adoptado todas as disposições necessárias para garantir que, antes da sua execução total ou parcial, os projectos abrangidos pelo âmbito de aplicação da Directiva 85/337, tanto na versão anterior como na posterior às alterações introduzidas pela Directiva 97/11, sejam objecto de um exame destinado a determinar se há necessidade de efectuar uma avaliação do impacto ambiental, e, em seguida, quando, pela sua natureza, dimensão ou localização, possam ter efeitos notáveis no meio ambiente, sejam sujeitos a uma avaliação relativamente a esses efeitos, em conformidade com o disposto nos artigos 5.o a 10.o dessa directiva, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.o, 4.o e 5.o a 10.o da referida directiva.

Quanto à segunda acusação

82

Esta acusação é relativa às condições de construção de um parque eólico em Derrybrien, no condado de Galway, sendo importante recordar, a título liminar, as diferentes aprovações de que foi objecto.

83

Como resulta dos elementos dos autos, os pedidos de aprovação relativos às duas primeiras fases do projecto, em que estavam em causa, em ambos os casos, 23 turbinas eólicas, foram apresentados em 4 e 18 de Dezembro de 1997. Em 23 de Janeiro de 1998, foram apresentados novos pedidos, pois os anteriores não foram considerados válidos. Foi emitida uma licença em 12 de Março de 1998. Em 5 de Outubro de 2000, foi apresentado um pedido de aprovação para uma terceira fase das obras, relativa, nomeadamente, a 25 turbinas e às vias de serviço, que foi deferido em 15 de Novembro de 2001. Em 20 de Junho de 2002, o dono da obra pediu autorização para alterar as duas primeiras fases do projecto, autorização que lhe foi concedida em 30 de Julho de 2002. Em Outubro de 2003, como a autorização concedida para as duas primeiras fases das obras tinha caducado, o dono da obra requereu a sua renovação, que foi deferida em Novembro de 2003.

Argumentos das partes

84

Com esta acusação, a Comissão defende que a Irlanda não adoptou todas as disposições necessárias para garantir que a concessão das aprovações relativas ao parque eólico e às actividades conexas, assim como à execução das respectivas obras, fossem precedidas de uma avaliação do impacto ambiental do projecto, em conformidade com o disposto nos artigos 5.o a 10.o da Directiva 85/337 e da Directiva 85/337 alterada.

85

A este respeito, a Comissão alega que, embora, por força da legislação irlandesa, se tivessem realizado estudos de impacto ambiental relativamente a diversos elementos constitutivos do projecto em causa, os referidos estudos revelavam algumas lacunas.

86

Em especial, o estudo do impacto ambiental realizado em 1998 não tinha tratado correctamente os riscos ambientais associados à execução dos diversos elementos constitutivos desse projecto. O estudo de impacto relativo à terceira fase do referido projecto contém as mesmas insuficiências.

87

Além disso, a Comissão refere que o parque eólico é o maior projecto de exploração terrestre de energia eólica até agora apresentado na Irlanda e também um dos maiores da Europa.

88

A Comissão também alega que a construção do parque eólico implicou a eliminação de vastas zonas de floresta de coníferas, com uma área de 263 ha, e que a autorização para o abate dessas árvores foi dada em 20 de Maio de 2003. Contudo, relativamente a esta operação e contrariamente às exigências da própria legislação irlandesa, não se procedeu a uma avaliação do impacto ambiental.

89

A Comissão acrescenta que, na sequência do deslizamento de terras ocorrido em 16 de Outubro de 2003 e da catástrofe ecológica que isto originou — a massa de turfa que se soltou de uma zona de construção do parque eólico poluiu o rio Owendalulleegh, provocou a morte de cerca de 50000 peixes e danificou por muito tempo os locais de reprodução das espécies —, a Irlanda não efectuou uma nova avaliação do impacto ambiental dessa construção antes de o dono da obra ter prosseguido com as obras no local, em 2004.

90

A Irlanda esclarece que, quando foram requeridas as aprovações, em 1997 e, depois, em 1998, para as duas primeiras fases de construção do parque eólico, nem o anexo I nem o anexo II da Directiva 85/337 referiam esse tipo de projecto entre os abrangidos pelo seu âmbito de aplicação. Assim, a aprovação não foi precedida da avaliação do impacto ambiental, como regulada pela referida directiva. Acrescenta que, aos pedidos apresentados em 1998, foi anexa, contudo, nos termos da legislação irlandesa, uma declaração de impacto ambiental.

91

Considera, por outro lado, que é artificial tentar sugerir que actividades relacionadas com aspectos conexos do projecto de construção do parque eólico, como a construção de uma estrada, a extracção de turfa, a exploração de pedreiras ou o transporte de electricidade, eram de uma importância tal que obrigavam a uma avaliação dos efeitos no ambiente, na acepção da Directiva 85/337.

92

A Irlanda considera, além disso, que o pedido de prorrogação do prazo de validade de uma licença não constitui uma «aprovação» na acepção da Directiva 85/337 alterada.

93

Por último, a Irlanda alega que o deslizamento de terras foi provocado pelos métodos de construção utilizados e que não estavam em causa dificuldades que poderiam ter sido detectadas antecipadamente graças a um estudo dos efeitos no ambiente, mesmo de acordo com as exigências comunitárias. Este Estado-Membro esclarece, de resto, que, para assegurar a concretização do parque eólico com toda a segurança, foram modificados os métodos de construção após terem sido suspensas as obras de construção e de ter sido realizado um inquérito.

Apreciação do Tribunal

94

Em primeiro lugar, quanto às condições em que foram concedidas, em 12 de Março de 1998, as aprovações relativas às duas primeiras fases de execução do projecto do parque eólico pedidas em 23 de Janeiro de 1998, importa, a título preliminar, examinar a aplicabilidade da Directiva 85/337.

95

A este respeito, resulta do artigo 3.o da Directiva 97/11 que se um pedido de aprovação for apresentado a uma autoridade competente até 14 de Março de 1999, continua a ser aplicável o disposto na Directiva 85/337.

96

Além disso, embora seja um facto que as instalações que se destinam à exploração da energia eólica para a produção de energia não figuram no anexo I nem no anexo II da Directiva 85/337, a Irlanda também não contesta que as duas primeiras fases da construção do parque eólico obrigaram a inúmeras obras, designadamente, extracção de turfa e de minerais não metálicos nem produtores de energia, bem como à construção de estradas, obras essas que figuram no referido anexo II, respectivamente, nos seus pontos 2, alíneas a) e c), e 10, alínea d).

97

Assim, a Directiva 85/337 era aplicável às duas primeiras fases de construção do parque eólico, na medida em que essas duas fases implicavam, em especial, o recurso a projectos de obras mencionados no anexo II dessa directiva.

98

Conclui-se que a Irlanda era obrigada a submeter os projectos de obras a um estudo de impacto ambiental, se os referidos projectos fossem susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente, nomeadamente pela sua natureza, dimensões ou localização (v., neste sentido, acórdãos de 24 de Outubro de 1996, Kraaijeveld e o., C-72/95, Colect., p. I-5403, n.o 50, e de 28 de Fevereiro de 2008, Abraham e o., C-2/07, Colect., p. I-1197, n.o 37).

99

Todavia, a Irlanda afirma que as autoridades competentes consideraram que a situação não se enquadrava no âmbito do anexo II da Directiva 85/337, na medida em que as obras conexas de extracção de turfa e de construção de estradas eram menos importantes do que o projecto de construção do parque eólico propriamente dito.

100

Assim, as autoridades competentes consideraram que não tinham de indagar se os projectos em causa eram susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente e, por conseguinte, que também não tinham de actuar de forma a que a aprovação fosse precedida de uma avaliação dos efeitos no ambiente que satisfizesse as exigências impostas na Directiva 85/377.

101

Ora, o facto de os projectos abrangidos pelo anexo II da referida directiva, supra-referidos, serem secundários relativamente ao projecto de construção do parque eólico considerado no seu conjunto não significa que, por essa razão, os referidos projectos não pudessem ter efeitos significativos no ambiente.

102

A este propósito, importa sublinhar que os projectos de extracção de turfa e de minerais bem como de construção de estradas em causa não eram insignificantes em termos de dimensão relativamente à área global do projecto de parque eólico, que abrangia cerca de 200 ha de turfeiras e constituía o maior projecto deste tipo na Irlanda, e, por outro lado, eram indispensáveis à instalação das turbinas e ao bom desenrolar de todas as obras de construção. Também se deve sublinhar que as referidas obras foram efectuadas na encosta do monte Cashlaundrumlahan, onde se encontram depósitos de turfa que podem atingir 5,5 m de profundidade e que estão, em larga medida, cobertos de floresta.

103

Resulta destes elementos, não contestados pela Irlanda, que a localização e a dimensão dos projectos de trabalhos de extracção de turfa e de minerais bem como de construção de estradas e o facto de se situarem nas proximidades de um rio constituem características concretas comprovativas de que se deve considerar que os referidos projectos, indissociáveis da instalação de 46 turbinas eólicas, podem ter efeitos significativos no ambiente, devendo, por conseguinte, ser sujeitos a um estudo dos seus efeitos no ambiente.

104

Com efeito, a realização dos estudos de impacto ambiental, nos termos da Directiva 85/337, destina-se a identificar, descrever e avaliar adequadamente os efeitos directos e indirectos de um projecto em factores como a fauna, a flora, o solo e a água, bem como a interacção desses vários factores entre si. No presente caso, pode ser sublinhado, a este respeito, que as declarações de impacto ambiental prestadas pelo dono da obra revelavam algumas lacunas e não contemplavam, designadamente, a questão da estabilidade do solo, todavia, essencial quando se pondera proceder a trabalhos de escavação.

105

Por conseguinte, a Irlanda, não tendo adoptado todas as disposições necessárias para garantir que a aprovação das duas primeiras fases de construção do parque eólico fosse precedida de um estudo de impacto ambiental, em conformidade com o disposto nos artigos 5.o a 10.o da Directiva 85/337, e limitando-se a juntar aos pedidos de aprovação declarações de impacto ambiental que não satisfazem essas exigências, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da referida directiva.

106

Em segundo lugar, quanto ao pedido de aprovação relativo à terceira fase de construção do parque eólico, apresentado em 5 de Outubro de 2000, e ao pedido de autorização para modificar as duas primeiras fases de construção inicialmente aprovadas, apresentado em 20 de Junho de 2002, é à luz da Directiva 85/337 alterada que se deve examinar a acusação, pois esses pedidos foram apresentados depois de 14 de Março de 1999.

107

Está apurado que, por um lado, as autoridades competentes deram o seu acordo à alteração do tipo de turbinas eólicas inicialmente previsto, sem exigirem a avaliação dos efeitos no ambiente, nos termos da Directiva 85/337 alterada, e, por outro, que a aprovação da terceira fase de construção também não foi precedida dessa avaliação. Além disso, a operação de desarborização, aprovada em Maio de 2003, também não foi precedida dessa avaliação, contrariamente ao exigido na legislação irlandesa.

108

Ora, no anexo II da Directiva 85/337 alterada, encontram-se referidas, no ponto 3, alínea i), as instalações para aproveitamento da energia eólica para a produção de electricidade (centrais eólicas) e, no ponto 13, qualquer alteração ou ampliação de projectos incluídos no mesmo anexo, já autorizados, executados ou em execução, que possam ter um impacto negativo importante no ambiente.

109

Além disso, entre os critérios de selecção pertinentes referidos no anexo III da Directiva 85/337 alterada, aplicáveis aos projectos enumerados no anexo II dessa directiva e para os quais remete o artigo 4.o, n.o 3, da mesma directiva, figura o risco de acidentes, atendendo sobretudo às tecnologias utilizadas. Entre esses critérios figura também a sensibilidade ambiental da zona geográfica, que deve ser considerada tendo nomeadamente em conta «a capacidade de absorção do ambiente natural», devendo prestar-se especial atenção às zonas montanhosas e florestais.

110

A instalação de 25 novas turbinas, a construção de novas vias de serviço, bem como a alteração do tipo de turbinas eólicas inicialmente aprovado, com vista ao aumento da produção de electricidade, enquanto projectos contemplados no anexo II da Directiva 85/337 alterada e que podiam, atentas as especificidades do local evocadas no n.o 102 do presente acórdão e os critérios indicados no número anterior do presente acórdão, ter efeitos significativos no ambiente, deviam, por essa razão, antes de serem aprovados, ter sido objecto de um processo de aprovação e sujeitos a um estudo de impacto ambiental, nos termos definidos nos artigos 5.o a 10.o da Directiva 85/337 alterada.

111

Por conseguinte, a Irlanda, não tendo adoptado todas as disposições necessárias para garantir que a aprovação das modificações e da relativa à terceira fase de construção do parque eólico fosse precedida desse estudo, e limitando-se a juntar aos pedidos de aprovação declarações de impacto ambiental que não satisfazem essas exigências, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Directiva 85/337 alterada.

112

Resulta do que precede que a Irlanda, não tendo adoptado todas as disposições necessárias para garantir que a aprovação da construção de um parque eólico e das actividades conexas em Derrybrien, no condado de Galway, assim como a execução das obras sejam precedidas de uma avaliação do impacto ambiental do projecto, em conformidade com o disposto nos artigos 5.o a 10.o da Directiva 85/337, tanto na versão anterior como na posterior às alterações introduzidas pela Directiva 97/11, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.o, 4.o e 5.o a 10.o da referida directiva.

Quanto às despesas

113

Por força do disposto no artigo 69.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da Irlanda e tendo esta sido vencida nos seus fundamentos, há que condená-la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

 

1)

A Irlanda, não tendo adoptado todas as disposições necessárias para garantir que:

antes da sua execução total ou parcial, os projectos abrangidos pelo âmbito de aplicação da Directiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de Junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente, tanto na versão anterior como na posterior às alterações introduzidas pela Directiva 97/11/CE do Conselho, de 3 de Março de 1997, sejam objecto de um exame destinado a determinar se há necessidade de efectuar uma avaliação do impacto ambiental e, em seguida, quando, pela sua natureza, dimensão ou localização, possam ter efeitos notáveis no meio ambiente, sejam sujeitos a uma avaliação relativamente a esses efeitos, em conformidade com o disposto nos artigos 5.o a 10.o da Directiva 85/337, e

a aprovação da construção de um parque eólico e das actividades conexas em Derrybrien, no condado de Galway, assim como a execução das obras sejam precedidas de uma avaliação do impacto ambiental do projecto, em conformidade com o disposto nos artigos 5.o a 10.o da Directiva 85/337, tanto na versão anterior como na posterior às alterações introduzidas pela Directiva 97/11,

não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.o, 4.o e 5.o a 10.o da referida directiva.

 

2)

A Irlanda é condenada nas despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.