Processos apensos C‑208/06 e C‑209/06

Medion AG

contra

Hauptzollamt Duisburg
e
Canon Deutschland GmbH
contra
Hauptzollamt Krefeld

(pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Finanzgericht Düsseldorf)

«Pauta aduaneira comum – Classificação pautal – Nomenclatura combinada – Câmaras de vídeo»

Sumário do acórdão

Pauta aduaneira comum – Posições pautais – Câmaras de vídeo com função DV que pode ser activada depois do desalfandegamento


Uma câmara de vídeo só pode ser classificada na subposição 8525 40 99 da Nomenclatura Combinada constante do Anexo I do Regulamento n.° 2658/87, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum, se a função de gravação de imagens e de sons provenientes de fontes diferentes da câmara ou do microfone integrados (função DV‑in), que constitui a característica essencial de uma câmara vídeo, estiver activa quando do desalfandegamento ou se, mesmo que o fabricante não tenha pretendido destacar essa característica, a referida função puder ser activada posteriormente àquela data, mediante a manipulação fácil do aparelho por um utilizador que não dispõe de competências específicas, sem que a câmara de vídeo sofra alterações materiais. No caso de activação posterior, é também necessário, por um lado, que, uma vez efectuada a activação, a câmara de vídeo tenha um funcionamento análogo ao de outra câmara de vídeo cuja função de gravação de imagens e de sons provenientes de fontes diferentes da câmara ou do microfone integrados nomeadamente a função DV‑in esteja activa quando do desalfandegamento e, por outro, que essa câmara de vídeo tenha um funcionamento autónomo. A existência destes requisitos deve poder ser verificada no momento do desalfandegamento. Compete ao juiz nacional apreciar se esses requisitos estão preenchidos. Se esses requisitos não estiverem preenchidos, essas câmaras de vídeo deverão ser classificadas na subposição 8525 40 91 da Nomenclatura Combinada.

(cf. n.os 35, 44, disp.)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

27 de Setembro de 2007 (*)

«Pauta aduaneira comum – Classificação pautal – Nomenclatura combinada – Câmaras de vídeo»

Nos processos apensos C‑208/06 e C‑209/06,

que têm por objecto dois pedidos de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.º CE, apresentados pelo Finanzgericht Düsseldorf (Alemanha), por decisões de 4 de Maio de 2006, entrados no Tribunal de Justiça em 8 de Maio de 2006, nos processos

Medion AG (C-208/06)

contra

Hauptzollamt Duisburg,

e

Canon Deutschland GmbH (C-209/06)

contra

Hauptzollamt Krefeld,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: A. Rosas, presidente de secção, J. N. Cunha Rodrigues, U. Lõhmus, A. Ó Caoimh e P. Lindh (relator), juízes,

advogado‑geral: Y. Bot,

secretário: J. Swedenborg, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 21 de Março de 2007,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Medion AG e da Canon Deutschland GmbH, por H. Nehm, Rechtsanwalt,

–        em representação do Governo francês, por G. de Bergues e A.‑L. During, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por J. Hottiaux, na qualidade de agente, assistida por B. Wägenbaur, Rechtsanwalt,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        Os pedidos de decisão prejudicial têm por objecto a interpretação das subposições 8525 40 91 e 8525 40 99 da Nomenclatura Combinada constante do Anexo I do Regulamento (CEE) n.° 2658/87 do Conselho, de 23 de Julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (JO L 256, p. 1), na redacção dada pelos Regulamentos (CE) n.° 2263/2000 da Comissão, de 13 de Outubro de 2000 (JO L 264, p. 1), (CE) n.° 2031/2001 da Comissão, de 6 de Agosto de 2001 (JO L 279, p. 1), e (CE) n.° 1789/2003 da Comissão, de 11 de Setembro de 2003 (JO L 281, p. 1, a seguir «NC»).

2        Estes pedidos foram apresentados no âmbito de dois litígios que opõem, por um lado, a Medion AG (a seguir «Medion») ao Hauptzollamt Duisburg e, por outro, a Canon Deutschland GmbH (a seguir «Canon») ao Hauptzollamt Krefeld, a propósito da classificação, na NC, das câmaras de vídeo que essas duas sociedades importaram para a Alemanha.

 Quadro jurídico

3        A NC, estabelecida pelo Regulamento n.° 2658/87, baseia‑se no Sistema Harmonizado Mundial de Designação e Codificação de Mercadorias (a seguir «SH»), elaborado pelo Conselho de Cooperação Aduaneira, actual Organização Mundial das Alfândegas, e instituído pela Convenção Internacional celebrada em Bruxelas em 14 de Junho de 1983 e aprovada em nome da Comunidade pela Decisão 87/369/CEE do Conselho, de 7 de Abril de 1987 (JO L 198, p. 1). A NC reproduz as posições e subposições com seis algarismos do SH e só o sétimo e o oitavo algarismo formam subdivisões próprias.

4        A segunda parte da NC compreende a secção XVI, que contém o capítulo 85, sob a epígrafe «Máquinas, aparelhos e materiais eléctricos e suas partes; aparelhos de gravação ou de reprodução de som, aparelhos de gravação ou de reprodução de imagens e de som em televisão, e suas partes e acessórios».

5        A posição 8525 40, sob a epígrafe «Câmaras de vídeo de imagens fixas e outras câmaras (camcorders); aparelhos fotográficos digitais», compreende a subposição 8525 40 91, sob a epígrafe «Outras câmaras: que permitem unicamente o registo de som e de imagens obtidos pela câmara de televisão» e a subposição 8525 40 99, sob a epígrafe «Outras câmaras: outros».

6        Importa esclarecer que a redacção das subposições 8525 40 91 e 8525 40 99 é idêntica nos Regulamentos n.° 2263/2000, n.° 2031/2001 e n.° 1789/2003.

7        As câmaras de vídeo classificadas na subposição 8525 40 91 estão sujeitas a um direito aduaneiro de 4,9%, ao passo que esse direito ascende, para as câmaras classificadas na subposição 8525 40 99, a uma taxa de 14%.

8        As regras gerais para a interpretação da NC, que constam da sua primeira parte, título I, A, dispõem designadamente:

«A classificação das mercadorias na Nomenclatura Combinada rege‑se pelas seguintes regras:

[…]

2.      a)     Qualquer referência a um artigo em determinada posição abrange esse artigo mesmo incompleto ou inacabado, desde que apresente, no estado em que se encontra, as características essenciais do artigo completo ou acabado. Abrange igualmente o artigo completo ou acabado, ou como tal considerado nos termos das disposições precedentes, mesmo que se apresente desmontado ou por montar;

[…]»

9        A Comissão das Comunidades Europeias publica no Jornal Oficial da União Europeia, com regularidade e nos termos do artigo 9.º, n.º 1, do Regulamento n.º 2658/87, notas explicativas da nomenclatura combinada das Comunidades Europeias (a seguir «notas explicativas»). As referidas notas respeitantes ao Regulamento n.° 2263/2000 (JO 2000, C 199, p. 1), parcialmente aplicáveis ao processo C‑209/06, precisam, quanto à subposição 8525 40 99:

«Outros

Classificam‑se nesta subposição os conjuntos de aparelhos denominados camescopes      (camco[r]ders), constituídos por uma câmara video e um aparelho de registo ou de reprodução videofónico e que permite gravar não só as imagens captadas pela câmara mas também os programas de televisão. As imagens gravadas podem ser reproduzidas por um aparelho [...] receptor externo de televisão.

Por outro lado, os camescopes      (camcorders) que apenas permitam gravar as imagens captadas pela câmara video, e reproduzi-las através de um aparelho receptor de televisão externo, classificam‑se na subposição 8525 40 91.»

10      As notas explicativas foram alteradas na sequência de uma comunicação da Comissão de 6 de Julho de 2001 (JO C 190, p. 10). Para a subposição 8525 40 99, foi retomada a redacção anterior, tendo sido intercalado o parágrafo seguinte:

«Esta subposição inclui câmaras de vídeo (camcorders) nas quais a entrada de vídeo é obstruída por uma placa ou por qualquer outro meio ou nas quais a interface de vídeo possa ser posteriormente activada como entrada de vídeo através de software. No entanto, estes aparelhos estão concebidos para gravar programas de televisão ou outros sinais de vídeo provenientes do exterior.»

11      A redacção das notas explicativas manteve‑se inalterada na sequência dos Regulamentos n.° 2031/2001 e n.° 1789/2003.

 Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

 Dados fácticos comuns aos dois processos

12      A Medion e a Canon importaram para a Alemanha câmaras de vídeo digitais equipadas com um «interface IEEE 1394» que permite a transferência de dados digitais. Esses aparelhos estão equipados com um menu composto por uma série de teclas e um pequeno ecrã «LCD» a cores.

13      Resulta dos descritivos desses produtos e dos respectivos manuais de instruções que o comprador pode optar por visionar as gravações de vídeo realizadas, graças à câmara no ecrã «LCD» a cores, ou de as transferir, por meio de cabos adequados, para outros aparelhos, por exemplo, um televisor, que oferecem uma imagem muito maior e de melhor qualidade. Esta função é habitualmente designada pela expressão «DV‑out».

14      Algumas outras câmaras têm a possibilidade de receber dados a partir de outros aparelhos, sendo então utilizadas como videogravadores para registar sequências digitais provenientes de um computador, por exemplo, uma montagem de vídeo. Esta função, designada habitualmente por «DV-in», não foi evocada pela Medion nem pela Canon quando da importação das câmaras de vídeo em causa no processo principal.

15      Por outro lado, nem os fabricantes das referidas câmaras de vídeo, nem a Medion nem a Canon propunham, nos descritivos dessas câmaras de vídeo ou nos respectivos manuais de instruções, activar posteriormente uma função DV‑in ou permitir a terceiros efectuar essa activação. Ao invés, essas duas sociedades importaram, nos mesmos períodos, câmaras de vídeo relativamente às quais foi indicado, com clareza, que possuíam a função DV‑in.

 Processo C-208/06

16      Em Fevereiro de 2004, a Medion requereu à estância aduaneira competente de Essen‑Stadthafen (Alemanha) o desalfandegamento, para introdução em livre prática, de uma câmara de vídeo digital do tipo MD 9069, declarando que esta se classificava na subposição 8525 40 91 da NC. A referida estância classificou essa câmara de vídeo como mercadoria da subposição 8525 40 99 da NC.

17      Na acção que propôs no Finanzgericht Düsseldorf, a Medion sustentou, no essencial, que, no momento determinante da aceitação da declaração aduaneira, a câmara de vídeo não executava a função DV‑in. A Medion esclareceu também que o fabricante dessa câmara a tinha informado de que o aparelho só podia adquirir a função DV‑in mediante a reprogramação da «memória morta programável apagável», o que exige um novo equipamento ou que um engenheiro qualificado substitua a placa‑mãe. Além disso, a Medion alegou que tinha recebido informações pautais vinculativas de uma estância aduaneira neerlandesa que tinha classificado as mesmas câmaras de vídeo na subposição 8525 40 91 da NC.

18      O Finanzgericht Düsseldorf ordenou uma peritagem para saber se e, eventualmente, como é que a câmara de vídeo pode ser adaptada, sem alterações do material, para também poder gravar imagens e sons captados por aparelhos externos.

19      Após a apresentação do relatório do perito, o órgão jurisdicional de reenvio questionou‑se sobre a classificação da câmara de vídeo controvertida. Esse órgão verificou que, à data do facto gerador da dívida aduaneira, a referida câmara ainda não apresentava as características relevantes para efeitos da classificação, mas só as tinha adquirido ou só as podia adquirir posteriormente, através de uma adaptação.

20      O órgão jurisdicional de reenvio notou também que a questão da classificação das mercadorias que não apresentam determinadas características à data do desalfandegamento, mas que as adquirem posteriormente através de uma adaptação, não tem uma resposta uniforme no ordenamento jurídico comunitário. Alude, quanto a este ponto, às informações pautais vinculativas neerlandesas invocadas pela Medion e a uma decisão da Commission de conciliation et d’expertise douanière [comissão aduaneira de conciliação e de peritagens] francesa, de 7 de Outubro de 2003. Consequentemente, esse órgão jurisdicional questionou‑se sobre a influência das adaptações posteriores na classificação da mercadoria.

21      Nestas circunstâncias, o Finanzgericht Düsseldorf decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Uma câmara de vídeo que, no momento da sua importação, não está preparada para gravar sinais de vídeo provenientes do exterior deve ser classificada na subposição 8525 40 99, quando o interface de vídeo pode ser posteriormente activado como entrada de vídeo através do accionamento de determinadas teclas, apesar de o fabricante e o vendedor não terem referido esta possibilidade nem a garantirem?»

 Processo C-209/06

22      Entre Julho de 2001 e Fevereiro de 2002, a Canon introduziu em livre prática câmaras de vídeo dos modelos MV 400, MV 425 e MV 3 MC. A Canon declarou que essas câmaras de vídeo se classificavam na subposição 8525 40 91 da NC. Quando de uma inspecção, a estância aduaneira de Krefeld (Alemanha) chegou à conclusão de que essas câmaras de vídeo deviam ser classificadas na subposição 8525 40 99 da NC. Foi proposta uma acção no Finanzgericht Düsseldorf.

23      Para fundamentar a acção, a Canon sublinhou a diferença entre os modelos de câmara de vídeo que importa, consoante os mesmos estejam dotados da função DV-in ou não, e alegou que, para as câmaras de vídeo em questão, a referida função só pode ser activada efectuando alterações ao material. A Canon sustentou igualmente que admitir a classificação na subposição 8525 40 99 quando a função DV-in é activada posteriormente ao desalfandegamento é contrário ao princípio fundamental essencial da classificação pautal. O facto de se basear numa activação posterior ao desalfandegamento leva à incerteza quanto à própria existência dessa activação e, portanto, sobre a classificação da mercadoria.

24      O órgão jurisdicional de reenvio ordenou uma peritagem idêntica à efectuada no litígio respeitante à Medion.

25      Após a apresentação do relatório do perito, o Finanzgericht Düsseldorf decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Uma câmara de vídeo que, no momento da sua importação, não está preparada para gravar sinais de vídeo provenientes do exterior deve ser classificada na subposição 8525 40 99, quando o interface de vídeo pode ser posteriormente activado como entrada de vídeo através da utilização de software determinado, apesar de o fabricante e o vendedor não terem referido esta possibilidade nem a garantirem?»

26      Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 26 de Junho de 2006, os processos C‑208/06 e C‑209/06 foram apensos para efeitos da fase escrita, da fase oral e do acórdão.

 Quanto às questões prejudiciais

 Observações apresentadas no Tribunal

27      Segundo a Medion e a Canon, há que dar uma resposta negativa às questões prejudiciais. Invocam vários motivos pelos quais as câmaras de vídeo em causa no processo principal devem ser classificadas na subposição 8525 40 91, e não na subposição 8525 40 99.

28      Antes de mais, sublinham que, à data do desalfandegamento, nenhuma dessas câmaras de vídeo podia gravar sinais de vídeo provenientes do exterior. A Canon entende que só pode ser considerada característica objectiva do material a funcionalidade do software que estava operacional à data do desalfandegamento.

29      A Medion e a Canon alegam também que qualquer alteração, incluindo a manipulação de códigos e de parâmetros do software que controla a função DV, que seja efectuada sem o acordo do fabricante, constitui, por isso, para essas duas sociedades, uma violação dos respectivos direitos de propriedade industrial.

30      Por último, a Medion e a Canon precisaram que o perito nomeado pelo órgão jurisdicional de reenvio deveria ter envidado esforços especiais para activar a função DV-in. Na audiência, acrescentaram que, após a activação dessa função, as câmaras de vídeo em causa no processo principal só podem funcionar como gravadores de vídeo se estiverem ligadas a um computador pessoal, e não de forma autónoma.

31      O Governo francês considera que as câmaras de vídeo em causa no processo principal devem ser classificadas na subposição 8525 40 99. As características e as propriedades objectivas de uma mercadoria não se podem reduzir apenas às funções dessa mercadoria que estão prontas a operar num momento determinado, antes abrangendo todas as funções potenciais da referida mercadoria. Assim, uma função como a função DV-in, mesmo desactivada, deve ser considerada uma característica e uma propriedade objectiva dessas câmaras de vídeo, desde que seja possível activá‑la sem alteração do material.

32      A Comissão entende que as referidas câmaras de vídeo pertencem à categoria «outros», na acepção da subposição 8525 40 99. Segundo afirma, a classificação na NC depende das funções que as câmaras de vídeo estão em condições de executar à data da importação, isto é, das funções potenciais de que dispõem objectivamente nessa data.

 Resposta do Tribunal

33      Decorre da redacção das questões, que importa tratar conjuntamente, que o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se, para a classificação das câmaras de vídeo, pode ou deve ter‑se em conta a possibilidade de se activar a função DV-in, quando essa activação não tiver sido efectuada à data do desalfandegamento, mas se o puder ser posteriormente mediante manipulação ou adicionamento de software. Além disso, o órgão jurisdicional interroga‑se sobre a importância que pode ter o facto de o fabricante não ter assinalado nem garantido a referida possibilidade à data do desalfandegamento.

34      Recorde‑se, antes de mais, que é jurisprudência assente que, no interesse da segurança jurídica e da facilidade dos controlos, o critério decisivo para a classificação pautal das mercadorias deve ser procurado, de uma forma geral, nas suas características e propriedades objectivas, tal como definidas no texto da posição da NC e das notas de secção ou de capítulo (v., nomeadamente, acórdãos de 26 de Setembro de 2000, Eru Portuguesa, C‑42/99, Colect., p. I‑7691, n.° 13; de 16 de Fevereiro de 2006, Proxxon, C‑500/04, Colect., p. I‑1545, n.° 21, e de 15 de Fevereiro de 2007, RUMA, C‑183/06, ainda não publicado na Colectânea, n.º 27).

35      A esse respeito, é irrelevante que o fabricante tenha decidido destacar ou não uma determinada característica do referido produto.

36      Por outro lado, o Tribunal já decidiu que o critério decisivo para a classificação aduaneira das mercadorias na NC deve ser procurado nas características e propriedades objectivas dos produtos, tais como se apresentam para desalfandegamento (v. acórdãos de 17 de Março de 1983, Dinter, 175/82, Recueil, p. 969, n.º 10, e de 27 de Maio de 1993, Gausepohl‑Fleisch, C‑33/92, Colect., p. I‑3047, n.º 9). Essas características e propriedades objectivas dos produtos devem poder ser verificadas no momento do desalfandegamento (v., neste sentido, acórdãos de 8 de Fevereiro de 1990, van de Kolk, C‑233/88, Colect., p. I‑265, n.º 12; de 12 de Dezembro de 1996, Foods Import, C‑38/95, Colect., p. I‑6543, n.º 17; e de 13 de Julho de 2006, Anagram International, C‑14/05, Colect., p. I‑6763, n.º 26).

37      Além disso, o destino do produto pode constituir um critério objectivo de classificação, desde que seja inerente ao produto em questão, inerência esta que deve poder ser apreciada em função das características e propriedades objectivas deste (v. acórdãos de 1 de Junho de 1995, Thyssen Haniel Logistic, C‑459/93, Colect., p. I‑1381, n.° 13, e de 11 de Janeiro de 2007, B. A. S. Trucks, C‑400/05, ainda não publicado na Colectânea, n.º 29).

38      Por último, o Tribunal de Justiça decidiu que decorre do artigo 2.º, alínea a), das regras gerais para a interpretação da NC que, para efeitos da classificação pautal, um produto incompleto ou inacabado deve ser equiparado a um produto completo ou acabado, desde que apresente as suas características essenciais (v. acórdão de 9 de Fevereiro de 1999, ROSE Elektrotechnic, C‑280/97, Colect., p. I‑689, n.º 18). A parte do produto deve ser suficientemente grande ou importante para conferir ao produto a sua característica essencial (v., nesse sentido, acórdão de 5 de Outubro de 1994, Voogd Vleesimport en -export BV, C‑151/93, Colect., p. I‑4915, n.º 20, e de 15 de Dezembro de 1994, GoldStar Europe, C‑401/93, Colect., p. I‑5587, n.os 26 a 28).

39      Resulta das notas explicativas que o que diferencia as câmaras de vídeo classificadas na subposição 8525 40 91 das classificadas na subposição 8525 40 99 é a capacidade de estas últimas, além de gravarem sons e imagens através da câmara ou do microfone integrados, poderem gravar os mesmos elementos quando estes provêm de fontes diferentes da referida câmara ou do referido microfone. A característica essencial de uma câmara de vídeo pertencente à subposição 8525 40 99 é, pois, concretamente, a função DV‑in, isto é, a sua capacidade de gravar sinais de vídeo provenientes de fontes exteriores.

40      Esta capacidade pode estar directamente acessível ao utilizador quando o fabricante tiver previsto a activação fácil da função DV‑in, estando essa activação explicada no manual de instruções fornecido ao comprador do aparelho. Se o procedimento não constar do referido manual, é necessário, para que a função DV‑in possa constituir a característica essencial da câmara de vídeo, que a manipulação possa ser efectuada facilmente por um utilizador que não dispõe de competências específicas, sem que a câmara de vídeo sofra alterações materiais. Assim, é indispensável que as câmaras de vídeo disponham, antes da activação da função DV‑in, de uma estrutura que contenha o essencial das características da referida função e que os elementos que permitem que esta fique activa não necessitem de equipamento externo.

41      Por outro lado, para que a câmara de vídeo possa ser classificada na subposição 8525 40 99, é necessário que, depois de a manipulação ter sido efectuada e de a função DV‑IN ter sido activada, ela tenha um funcionamento análogo ao de uma câmara de vídeo expressamente concebida para a função DV‑in. Em especial, é necessário que a câmara de vídeo possa, à semelhança desta última, ser utilizada para gravar sinais de vídeo provenientes de fontes exteriores, de modo autónomo e sem depender de equipamento ou software externo.

42      Nos processos principais, resulta dos autos, nomeadamente das peritagens ordenadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, que a manipulação das câmaras de vídeo para activar a função DV‑in é relativamente complexa. Essa manipulação necessitou da pesquisa de um protocolo de manipulação das teclas (para as câmaras de vídeo Medion), na Internet, ou da compra de um programa (para as câmaras de vídeo Canon), e, para todos os aparelhos, da conexão com um computador pessoal e da utilização de determinados acessórios, como um cabo «LANC». Por outro lado, a Medion e a Canon alegaram na audiência que, mesmo depois de activada a função DV‑in, é ainda necessário ligar a câmara de vídeo a um computador pessoal para a fazer funcionar nesse modo.

43      Face ao exposto, competirá ao juiz nacional apreciar o grau de complexidade das manipulações a efectuar para activar a função DV‑in e verificar a analogia e a autonomia de funcionamento das câmaras de vídeo em causa nos processos principais em relação às apresentadas como tendo a função DV‑in. Caso o órgão jurisdicional de reenvio venha a concluir que a activação da função DV‑in pode ser facilmente efectuada por um utilizador que não dispõe de competências específicas e sem que a câmara de vídeo sofra alterações materiais, e caso se verifiquem as características de analogia e de autonomia de funcionamento, a câmara de vídeo deve ser classificada na subposição 8525 40 99. Se esses requisitos não estiverem preenchidos, essas câmaras de vídeo deverão ser classificadas na subposição 8525 40 91.

44      Consequentemente, há que responder às questões submetidas que uma câmara de vídeo só pode ser classificada na subposição 8525 40 99 da NC se a função de gravação de imagens e de sons provenientes de fontes diferentes da câmara ou do microfone integrados estiver activa quando do desalfandegamento ou se, mesmo que o fabricante não tenha pretendido destacar essa característica, a referida função puder ser activada posteriormente àquela data, mediante a manipulação fácil do aparelho por um utilizador que não dispõe de competências específicas, sem que a câmara de vídeo sofra alterações materiais. No caso de activação posterior, é também necessário, por um lado, que, uma vez efectuada a activação, a câmara de vídeo tenha um funcionamento análogo ao de outra câmara de vídeo cuja função de gravação de imagens e de sons provenientes de fontes diferentes da câmara ou do microfone integrados esteja activa quando do desalfandegamento e, por outro, que essa câmara de vídeo tenha um funcionamento autónomo. A existência destes requisitos deve poder ser verificada no momento do desalfandegamento. Compete ao juiz nacional apreciar se esses requisitos estão preenchidos. Se esses requisitos não estiverem preenchidos, essas câmaras de vídeo deverão ser classificadas na subposição 8525 40 91 da Nomenclatura Combinada.

 Quanto às despesas

45      Revestindo o processo, quanto às partes nas causas principais, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

Uma câmara de vídeo só pode ser classificada na subposição 8525 40 99 da Nomenclatura Combinada constante do Anexo I do Regulamento (CEE) n.° 2658/87 do Conselho, de 23 de Julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum, na redacção dada pelos Regulamentos (CE) n.° 2263/2000 da Comissão, de 13 de Outubro de 2000, (CE) n.° 2031/2001 da Comissão, de 6 de Agosto de 2001, e (CE) n.° 1789/2003 da Comissão, de 11 de Setembro de 2003, se a função de gravação de imagens e de sons provenientes de fontes diferentes da câmara ou do microfone integrados estiver activa quando do desalfandegamento ou se, mesmo que o fabricante não tenha pretendido destacar essa característica, a referida função puder ser activada posteriormente àquela data, mediante a manipulação fácil do aparelho por um utilizador que não dispõe de competências específicas, sem que a câmara de vídeo sofra alterações materiais. No caso de activação posterior, é também necessário, por um lado, que, uma vez efectuada a activação, a câmara de vídeo tenha um funcionamento análogo ao de outra câmara de vídeo cuja função de gravação de imagens e de sons provenientes de fontes diferentes da câmara ou do microfone integrados esteja activa quando do desalfandegamento e, por outro, que essa câmara de vídeo tenha um funcionamento autónomo. A existência destes requisitos deve poder ser verificada no momento do desalfandegamento. Compete ao juiz nacional apreciar se esses requisitos estão preenchidos. Se esses requisitos não estiverem preenchidos, essas câmaras de vídeo deverão ser classificadas na subposição 8525 40 91 da Nomenclatura Combinada.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.