ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

13 de Março de 2008 ( *1 )

«Regulamento (CE) n.o 615/98 — Directiva 91/628/CEE — Restituições à exportação — Recusa — Inobservância da Directiva 91/628/CEE — Afectação do bem-estar dos animais — Ónus da prova — Falta de provas»

No processo C-96/06,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.o CE, apresentado pelo Finanzgericht Hamburg (Alemanha), por decisão de 23 de Janeiro de 2006, entrado no Tribunal de Justiça em 17 de Fevereiro de 2006, no processo

Viamex Agrar Handels GmbH

contra

Hauptzollamt Hamburg-Jonas,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: A. Rosas, presidente de secção, J. N. Cunha Rodrigues, J. Klučka (relator), A. Ó Caoimh e P. Lindh, juízes,

advogado-geral: P. Mengozzi,

secretário: B. Fülöp, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 1 de Março de 2007,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Viamex Agrar Handels GmbH, por W. Schedl, Rechtsanwalt,

em representação do Hauptzollamt Hamburg-Jonas, por G. Seber, na qualidade de agente,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por F. Erlbacher, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 15 de Novembro de 2007,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 615/98 da Comissão, de 18 de Março de 1998, que estabelece normas especiais de execução do regime das restituições à exportação no que respeita ao bem-estar dos animais vivos da espécie bovina durante o transporte (JO L 82, p. 19).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Viamex Agrar Handels GmbH (a seguir «Viamex») ao Hauptzollamt Hamburg-Jonas (a seguir «Hauptzollamt»), a respeito de restituições à exportação de bovinos vivos para o Líbano.

Quadro jurídico

Regulamento n.o 615/98

3

O artigo 13.o, n.o 9, segundo parágrafo, do Regulamento (CEE) n.o 805/68 do Conselho, de 27 de Junho de 1968, que estabelece a organização comum de mercado no sector da carne de bovino (JO L 148, p. 24; EE 03 F2 p. 157), na redacção dada pelo Regulamento (CE) n.o 2634/97 do Conselho, de 18 de Dezembro de 1997 (JO L 356, p. 13), dispõe que o pagamento da restituição à exportação de animais vivos está sujeito ao cumprimento da legislação comunitária relativa ao bem-estar dos animais, nomeadamente à protecção dos animais durante o transporte.

4

As normas de execução do Regulamento n.o 805/68, na redacção dada pelo Regulamento n.o 2634/97, foram precisadas pelo Regulamento n.o 615/98.

5

O artigo 1.o do Regulamento n.o 615/98 dispõe que o pagamento das restituições à exportação de animais vivos da espécie bovina está sujeito, durante o transporte dos animais até ao primeiro local de descarregamento no país terceiro de destino final, ao respeito do disposto na Directiva 91/628/CEE do Conselho, de 19 de Novembro de 1991, relativa à protecção dos animais durante o transporte e que altera as Directivas 90/425/CEE e 91/496/CEE (JO L 340, p. 17), na redacção dada pela Directiva 95/29/CE do Conselho, de 29 de Junho de 1995 (JO L 148, p. 52, a seguir «Directiva 91/628»), e do disposto no referido regulamento.

6

Nos termos do artigo 2.o deste regulamento, deve proceder-se a um controlo dos animais à saída do território aduaneiro da Comunidade. Um veterinário oficial deve verificar e certificar que os animais estão aptos para efectuar a viagem prevista em conformidade com o disposto na Directiva 91/628, que o meio de transporte em que os animais deixarão o território aduaneiro da Comunidade está em conformidade com o disposto nesta directiva e que foram adoptadas disposições para tratar os animais durante a viagem em conformidade com o disposto na referida directiva.

7

O artigo 2.o, n.o 3, desse regulamento dispõe:

«Se o veterinário oficial do ponto de saída considerar que as exigências estabelecidas no n.o 2 estão satisfeitas, certificará esse facto através da menção:

[…]

Controlos satisfatórios nos termos do artigo 2.o do Regulamento (CE) n.o 615/98

[…]

e da aposição do seu carimbo e da sua assinatura no documento que prova a saída do território aduaneiro da Comunidade, quer na casa J da cópia de controlo T 5 quer no sítio mais adequado do documento nacional. Se for caso disso, o veterinário oficial indicará:

o número de animais que deixaram de estar aptos para prosseguir a viagem prevista e que, em consequência, foram retirados do lote,

e/ou

a menção referida no n.o 3 do artigo 3.o»

8

O artigo 3.o, n.o 2, do Regulamento n.o 615/98 dispõe:

«A pessoa encarregada do controlo deve elaborar um relatório que indique:

o número de animais vivos descarregados do meio de transporte,

o número de animais, de entre os referidos no travessão precedente, cujo estado físico e/ou de saúde justifica a conclusão de que as disposições comunitárias sobre a protecção dos animais durante o transporte não foram respeitadas,

se os animais vivos entraram em quarentena.»

9

O artigo 5.o, n.o 1, desse regulamento dispõe:

«1.   O exportador comunicará à autoridade competente do Estado-Membro em que a declaração seja aceite todas as informações necessárias relativas à viagem o mais tardar aquando da apresentação da declaração de exportação.

Simultaneamente, ou o mais tardar quando dela tiver conhecimento, o exportador comunicará qualquer eventual alteração do meio de transporte à autoridade competente.»

10

Nos termos do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 615/98, o pedido de pagamento das restituições à exportação deve ser completado com a prova de que as disposições do artigo 1.o foram respeitadas, prova essa que será feita pela apresentação do exemplar de controlo T5 e do relatório de uma sociedade de controlo, acompanhado de um certificado veterinário.

11

O artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98 dispõe, todavia, que a restituição à exportação não será paga no que respeita aos animais que tenham morrido durante o transporte ou relativamente aos quais a autoridade competente considere, atendendo aos documentos referidos no n.o 2 do mesmo artigo 5.o, aos relatórios de controlo referidos no artigo 4.o desse regulamento e/ou a qualquer outro elemento de que disponha relativamente à observância do disposto no artigo 1.o do referido regulamento, que a Directiva 91/628 não foi respeitada.

12

O artigo 5.o, n.o 6, do Regulamento n.o 615/98 dispõe:

«Quando, na sequência de circunstâncias não imputáveis ao exportador, o controlo referido no n.o 1 do artigo 3.o não tenha sido efectuado, a autoridade competente pode, mediante pedido fundamentado do exportador, aceitar outros documentos que constituam prova suficiente perante ela própria de que a Directiva [91/628] foi respeitada.»

Directiva 91/628

13

Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, alíneas b) e c), da Directiva 91/628, os Estados-Membros diligenciarão por que todas as pessoas singulares e colectivas que procedam ao transporte de animais com fins lucrativos utilizem para o transporte dos animais referidos nessa directiva meios de transporte conformes com as disposições previstas no seu anexo e não transportem nem mandem transportar animais em condições em que estes possam ficar feridos ou ter sofrimentos inúteis.

14

O n.o 17 do referido anexo dispõe que o equipamento dos navios deve permitir o transporte dos animais sem que estes estejam expostos a ferimentos ou sofrimentos evitáveis.

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

15

Resulta da decisão de reenvio que a Viamex, em 8 de Março de 1999, declarou ao Hauptzollamt Kiel a exportação de 35 bovinos vivos para o Líbano, a bordo do navio Al Haijj Moustafa II (a seguir «navio»), tendo, por esse motivo, pedido ao Hauptzollamt uma restituição à exportação.

16

Por decisão de 1 de Fevereiro de 2001, o Hauptzollamt indeferiu esse requerimento, pelo facto de o navio constar, no momento do transporte, de uma lista negativa de barcos considerados impróprios para o transporte de gado vivo, elaborada pela Comissão das Comunidades Europeias (a seguir «lista negativa»). Com efeito, numa inspecção efectuada a bordo do navio em 18 e 19 de Fevereiro de 1997, o Serviço Alimentar e Veterinário da Comissão considerou que este apresentava graves deficiências e que não preenchia os requisitos da Directiva 91/628.

17

O Serviço Alimentar e Veterinário desempenha um papel importante na execução e aplicação da legislação comunitária sobre segurança dos alimentos, sanidade animal, fitossanidade e bem-estar animal.

18

Tem nomeadamente por missão, através das inspecções nos Estados-Membros e das avaliações a que procede, promover sistemas de controlo eficazes no domínio da segurança e da qualidade dos géneros alimentícios, assim como nos domínios veterinário e fitossanitário, e verificar a observância do disposto na legislação comunitária nesses domínios na União Europeia e nos países que exportam para a União. Tem ainda por missão contribuir para a elaboração da política comunitária nos referidos domínios.

19

Na inspecção efectuada por esse serviço no navio, verificou-se, por um lado, que as passadeiras, os acessos aos corredores e os parques se encontravam num estado que podia causar ferimentos aos animais e, por outro, que não permitiam que se impedisse que os animais fugissem. Além disso, essas mesmas passadeiras, acesso aos corredores e parques estavam em mau estado, enferrujados e o seu estado dificultava qualquer limpeza ou desinfecção.

20

A este respeito, resulta dos autos que a Viamex juntou ao seu requerimento de restituição à exportação, por um lado, uma declaração escrita do comandante do navio, datada de 16 de Outubro de 1997, também assinada pelo chefe do posto de controlo veterinário fronteiriço de Koper (Eslovénia), onde se referia que tinham sido efectuadas reparações, e, por outro, um relatório do gabinete de peritos em avarias Kähler & Prinz AG, de 22 de Setembro de 1998.

21

Contudo, o navio só deixou de constar da lista negativa da Comissão em 24 de Janeiro de 2000, na sequência de uma inspecção efectuada durante o mês de Novembro de 1999, isto é, quase oito meses após a exportação em causa.

22

Por decisão de 18 de Maio de 2001, o Hauptzollamt indeferiu a reclamação que a Viamex interpôs da decisão de 1 de Fevereiro de 2001.

23

A Viamex recorreu dessa decisão com o fundamento de que nenhuma disposição relativa às restituições nem nenhuma disposição da Directiva 91/628 exige que um navio seja autorizado a transportar gado vivo.

24

O Hauptzollamt salienta, no seu entender, que nos termos do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98, basta que a autoridade competente disponha de elementos que permitam concluir pela inobservância da Directiva 91/628 para poder recusar a restituição. Considera, assim, que essa disposição não exige à autoridade competente que prove a inobservância desta directiva.

25

De qualquer modo, o Hauptzollamt indica que, em 3 de Dezembro de 1999, recebeu uma actualização da lista negativa, segundo a qual, uma vez mais, o navio não preenchia as condições impostas pela Directiva 91/628.

26

Essa actualização foi feita por ocasião de uma inspecção levada a cabo durante o mês de Novembro de 1999 por agentes do Ministério da Agricultura, das Pescas e da Alimentação britânico. Resulta, nomeadamente, da inspecção das autoridades britânicas que o navio só tinha sido autorizado a título provisório e apenas para o transporte de ovinos. Ora, tendo em conta a diferença de tamanho entre um ovino e um bovino, a aptidão para transportar ovinos não permite concluir que o navio também podia transportar bovinos.

27

Por conseguinte, o Hauptzollamt considerou, em face dessas informações, que a Directiva 91/628 não tinha sido respeitada no transporte em causa e que estavam reunidas as condições para a recusa da restituição à exportação previstas no artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98.

28

Considerando que a decisão da causa depende da interpretação do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98, o Finanzgericht Hamburg suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

«1)

O artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98 contém uma norma de exclusão, com a consequência de que cabe ao Hauptzollamt o ónus de […] prova dos pressupostos estabelecidos neste artigo?

2)

Em caso de resposta afirmativa à questão anterior: a conclusão, na acepção do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98, de que a Directiva [91/628] não foi respeitada exige que seja feita prova da violação [dessa directiva] no caso concreto ou a autoridade competente satisfaz o seu ónus de alegação e de prova se indicar e fizer prova de circunstâncias que, globalmente consideradas, demonstram com uma margem de probabilidade considerável que, (também) no que diz respeito à exportação em questão, a Directiva [91/628] não foi respeitada?

3)

Independentemente da resposta dada às primeira e segunda questões: pode a autoridade competente, com base no artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98, recusar (totalmente) a um exportador a restituição à exportação se não existirem indícios de que, no que se refere à exportação em questão, o bem-estar dos animais durante o transporte tenha sido prejudicado devido à (eventual) violação da Directiva [91/628]?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto às primeira e segunda questões

29

Com as suas primeira e segunda questões, que há que apreciar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se, no caso de todos os documentos exigidos pelo artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 615/98 terem sido apresentados pelo exportador, cabe a este ou à autoridade competente fazer prova do preenchimento dos requisitos previstos no n.o 3 desse artigo. Se o ónus da prova couber à autoridade competente, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber em que elementos se pode essa autoridade basear para considerar que a Directiva 91/628 não foi respeitada e se lhe basta referir esses elementos ou se tem que fazer prova de uma violação concreta dessa directiva.

30

A esse respeito, segundo jurisprudência assente, uma vez que o sistema das restituições à exportação assenta em declarações facultativas, quando o exportador tiver decidido livremente beneficiar delas, deve prestar as informações necessárias à prova do direito à restituição e à determinação do respectivo montante. O Tribunal de Justiça, no contexto do Regulamento (CEE) n.o 3665/87 da Comissão, de 27 de Novembro de 1987, que estabelece regras comuns de execução do regime das restituições à exportação para os produtos agrícolas (JO L 351, p. 1), e do sistema de sanções estabelecido por este regulamento, já declarou que, num regime de ajudas comunitário, a concessão da ajuda está necessariamente subordinada à condição de o seu beneficiário apresentar todas as garantias de probidade e de fiabilidade (v., neste sentido, acórdãos de 11 de Julho de 2002, Käserei Champignon Hofmeister, C-210/00, Colect., p. I-6453, n.o 41, e de 1 de Dezembro de 2005, Fleisch-Winter, C-309/04, Colect., p. I-10349, n.o 31).

31

Além disso, o Tribunal de Justiça já declarou que um exportador, ao declarar um produto no quadro do processo de restituição à exportação, deixa subentendido que esse produto reúne todas as condições necessárias a essa restituição. Caso a declaração seja posta em causa pela autoridade competente, cabe ao exportador demonstrar, de acordo com as regras do direito nacional em matéria de prova, que essas condições estão efectivamente preenchidas (v., neste sentido, acórdão Fleisch-Winter, já referido, n.os 32 e 35).

32

Esse sistema está previsto no âmbito do regime das restituições à exportação no que respeita ao bem-estar dos animais vivos da espécie bovina durante o transporte e cabe ao exportador, nos termos do artigo 5.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 615/98, fazer prova de que estão reunidas as condições para a concessão da restituição à exportação.

33

Para isso, o exportador deve, por um lado, até ao momento da apresentação da declaração de exportação, prestar as informações úteis relativas à viagem à autoridade competente do Estado-Membro em que a declaração é recebida. Por outro, para obter o pagamento da restituição à exportação, deve fazer prova do respeito do disposto no artigo 1.o do Regulamento n.o 615/98 e, por conseguinte, na Directiva 91/628, apresentando os documentos a que se referem, respectivamente, os artigos 2.o, n.o 3, e 3.o, n.o 2, desse regulamento. Além disso, o artigo 5.o, n.o 6, desse regulamento permite, em certas condições, que o exportador apresente outros documentos comprovativos de que foi respeitado o disposto na Directiva 91/628.

34

Contudo, tal como resulta da finalidade dos artigos 3.o e 5.o do Regulamento n.o 615/98, a apresentação desses documentos pelo exportador não constitui uma prova irrefutável da observância do artigo 1.o desse regulamento nem da Directiva 91/628. Com efeito, essa prova só é suficiente na medida em que a autoridade competente não disponha de elementos que lhe permitam considerar que a referida directiva não foi respeitada.

35

Essa interpretação é confirmada pela redacção do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98, segundo a qual a autoridade competente pode não pagar a restituição à exportação no que respeita a animais relativamente aos quais considere, atendendo aos documentos referidos no n.o 2 do referido artigo 5.o, aos relatórios dos controlos referidos no artigo 4.o desse regulamento e/ou a qualquer outro elemento de que disponha relativamente à observância do disposto no artigo 1.o do referido regulamento, que a Directiva 91/628 não foi respeitada.

36

Assim, não pode deixar de se observar que, não obstante os documentos apresentados pelo exportador nos termos do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 615/98, a autoridade competente pode considerar que o exportador não observou o disposto no artigo 1.o desse regulamento nem o disposto na Directiva 91/628, sem prejuízo de que estejam reunidas, nomeadamente, as condições previstas no artigo 5.o, n.o 3, desse regulamento.

37

Tendo em conta que cabe ao exportador, nos termos do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 615/98, fazer prova da observância do disposto no artigo 1.o desse regulamento, o dever da autoridade competente consiste em analisar essas provas e qualquer outro elemento de que disponha para chegar à conclusão de que o disposto na Directiva 91/628 foi ou não observado e decidir se há ou não que conceder a restituição à exportação.

38

Contudo, o artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98 não pode ser interpretado no sentido de que permite à autoridade competente pôr arbitrariamente em causa os elementos de prova juntos pelo exportador ao seu pedido de restituição à exportação. A esse respeito, o Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que a margem de apreciação de que a autoridade competente dispõe não é ilimitada, uma vez que se enquadra no artigo 5.o do Regulamento n.o 615/98 (v., neste sentido, acórdão de17 de Janeiro de 2008, Viamex Agrar Handel e ZVK, C-37/06 e C-58/06, Colect., p. I-69, n.o 39). Essa margem de apreciação é, em especial, limitada quanto à natureza e ao valor probatório dos elementos que essa autoridade invoca.

39

Em primeiro lugar, quanto à natureza desses elementos, há que lembrar que o Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que, só atendendo aos documentos relativos à saúde dos animais, referidos no artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 615/98, aos relatórios dos controlos referidos no artigo 4.o desse regulamento e/ou a qualquer outro elemento com influência no bem-estar dos animais de que disponha relativamente à observância do disposto no artigo 1.o do referido regulamento, é que a autoridade competente pode considerar que a Directiva 91/628 não foi respeitada (v. acórdão Viamex Agrar Handel e ZVK, já referido, n.os 39 a 41).

40

Em segundo lugar, quanto ao valor probatório dos elementos que poderão ser tomados em conta, há que considerar que a autoridade competente não se pode limitar a alegar meras suposições ou dúvidas quanto ao respeito da Directiva 91/628 para pôr em causa as provas apresentadas pelo exportador nos termos do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 615/98. Essa interpretação deixaria sem qualquer efeito útil o referido artigo 5.o, n.o 2, e causaria insegurança jurídica nos exportadores quanto aos requisitos exigidos para o pagamento da restituição à exportação.

41

A autoridade competente deve, portanto, nos termos do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98, basear-se em elementos objectivos e concretos relativos ao bem-estar dos animais susceptíveis de demonstrar que os documentos juntos pelo exportador ao seu pedido de restituição à exportação não permitem provar a observância do disposto na Directiva 91/628 durante o transporte, devendo o exportador, se for esse o caso, demonstrar de que modo são irrelevantes as provas invocadas pela autoridade competente para concluir pela inobservância do Regulamento n.o 615/98 e da Directiva 91/628 (v., por analogia, acórdão Fleisch-Winter, já referido, n.o 35).

42

De qualquer forma, a autoridade competente tem o dever de fundamentar a sua decisão, apresentando as razões pelas quais entende que as provas apresentadas pelo exportador não permitem concluir que as disposições da Directiva 91/628 foram observadas. A referida autoridade tem obrigação, para esse efeito, de apreciar objectivamente os documentos que lhe são apresentados e demonstrar que os elementos que invoca são adequados para demonstrar que a documentação junta ao pedido de restituição à exportação não é susceptível de provar que as disposições pertinentes da Directiva 91/618 foram respeitadas. Uma decisão fundamentada desse género é indispensável ao exportador, nomeadamente, para que possa recorrer dessa decisão de indeferimento total ou parcial do seu pedido de restituição à exportação.

43

Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar na lide principal se, à luz, nomeadamente, dos documentos juntos pela Viamex ao seu pedido de restituição à exportação e da lista negativa, referida nos n.os 16, 21 e 25 do presente acórdão, o navio estava em conformidade com o disposto na Directiva 91/628 no momento do transporte dos animais.

44

Em face do exposto, há que responder às primeira e segunda questões que, não obstante os documentos apresentados pelo exportador nos termos do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 615/98, a autoridade competente pode considerar que a Directiva 91/628 não foi respeitada nos termos previstos no artigo 5.o, n.o 3, desse regulamento. Contudo, a autoridade competente só pode chegar a essa conclusão baseando-se nos documentos a que se refere o artigo 5.o do Regulamento n.o 615/98, nos relatórios a que se refere o artigo 4.o do mesmo regulamento relativos à saúde dos animais ou em qualquer outro elemento objectivo, com influência no bem-estar dos referidos animais, susceptíveis de pôr em causa os documentos apresentados pelo exportador, devendo este, se for esse o caso, demonstrar de que modo são irrelevantes as provas invocadas pela autoridade competente para concluir pela inobservância da Directiva 91/628.

Quanto à terceira questão

45

Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se a autoridade competente pode recusar a restituição à exportação por aplicação do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98, embora nenhum elemento permita considerar concretamente que o bem-estar dos animais transportados foi afectado pela inobservância do disposto na Directiva 91/628.

46

A este respeito, há que lembrar que, tendo em conta a redacção dos artigos 1.o e 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98 e a finalidade desse regulamento, a observância do disposto na Directiva 91/628 relativamente à saúde dos animais constitui uma condição prévia para o pagamento das restituições à exportação (v. acórdão Viamex Agrar Handel e ZVK, já referido, n.o 37).

47

Além disso, tal como referiu o advogado-geral no n.o 44 das suas conclusões, resulta claramente da redacção do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98 que o legislador comunitário sujeitou o pagamento das restituições à exportação ao respeito do disposto na Directiva 91/628, independentemente de se apurar um dano concreto sofrido pelos animais durante o transporte.

48

Com efeito, verifica-se que o legislador comunitário considerou, com base em estudos científicos e veterinários e em avaliações da aplicação da legislação comunitária efectuadas no domínio da protecção dos animais, que o bem-estar destes últimos pode ser posto em perigo e deixar de estar garantido a partir do momento em que o disposto na Directiva 91/628 relativamente à saúde dos animais deixar de ser respeitado.

49

De resto, este critério justifica-se plenamente pelo facto de, na prática, nem sempre ser possível a autoridade competente verificar se, em concreto, os animais sofreram ou ficaram feridos devido à inobservância dessas disposições.

50

Nestas condições, uma autoridade competente que considere que, em violação nomeadamente do disposto no ponto 17 do anexo da Directiva 91/628, o equipamento de um navio não permitia o transporte dos animais sem que estes estivessem expostos a ferimentos ou sofrimentos evitáveis pode recusar a restituição à exportação.

51

Cabe à autoridade competente apreciar se a violação de uma disposição da Directiva 91/628 teve um impacto no bem-estar dos animais, se essa violação pode, eventualmente, ser sanada e se deve levar à perda, à redução ou à manutenção da restituição à exportação. Cabe igualmente a essa mesma autoridade decidir se a restituição à exportação deve ser reduzida na proporção do número de animais que considera terem sido afectados pela inobservância da Directiva 91/628 ou se não deve ser paga essa restituição, na medida em que a inobservância de uma disposição da referida directiva teve inevitavelmente impacto no bem-estar de todos os animais (v. acórdão Viamex Agrar Handel e ZVK, já referido, n.o 44).

52

Por conseguinte, há que responder à terceira questão que, nos termos do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98, a autoridade competente pode recusar a restituição à exportação devido à inobservância do disposto na Directiva 91/628 relativamente à saúde dos animais, mesmo que nenhum elemento permita considerar que o bem-estar dos animais transportados foi concretamente afectado.

Quanto às despesas

53

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

1)

Não obstante os documentos apresentados pelo exportador nos termos do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 615/98 da Comissão, de 18 de Março de 1998, que estabelece normas especiais de execução do regime das restituições à exportação no que respeita ao bem-estar dos animais vivos da espécie bovina durante o transporte, a autoridade competente pode considerar que a Directiva 91/628/CEE do Conselho, de 19 de Novembro de 1991, relativa à protecção dos animais durante o transporte e que altera as Directivas 90/425/CEE e 91/496/CEE, na redacção dada pela Directiva 95/29/CE do Conselho, de 29 de Junho de 1995, não foi respeitada nos termos previstos no artigo 5.o, n.o 3, desse regulamento. Contudo, a autoridade competente só pode chegar a essa conclusão baseando-se nos documentos a que se refere o artigo 5.o do Regulamento n.o 615/98, nos relatórios a que se refere o artigo 4.o do mesmo regulamento relativos à saúde dos animais ou em qualquer outro elemento objectivo, com influência no bem-estar dos referidos animais, susceptíveis de pôr em causa os documentos apresentados pelo exportador, devendo este, se for esse o caso, demonstrar de que modo são irrelevantes as provas invocadas pela autoridade competente para concluir pela inobservância da Directiva 91/628, na redacção dada pela Directiva 95/29.

 

2)

Nos termos do artigo 5.o, n.o 3, do Regulamento n.o 615/98, a autoridade competente pode recusar a restituição à exportação devido à inobservância do disposto na Directiva 91/628, na redacção dada pela Directiva 95/29, relativamente à saúde dos animais, mesmo que nenhum elemento permita considerar que o bem-estar dos animais transportados foi concretamente afectado.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.