Processo C‑273/05 P

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI)

contra

Celltech R&D Ltd

«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Marca comunitária – Artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento (CE) n.° 40/94 – Pedido de marca nominativa CELLTECH – Motivos absolutos de recusa – Falta de carácter distintivo – Carácter descritivo»

Conclusões da advogada‑geral E. Sharpston apresentadas em 14 de Dezembro de 2006 

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 19 de Abril de 2007 

Sumário do acórdão

1.     Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Fundamentos – Fundamento apresentado pela primeira vez no âmbito do recurso – Inadmissibilidade – Fundamento que tem apenas por objectivo contestar a solução legal dada pelo Tribunal de Primeira Instância no acórdão recorrido – Admissibilidade

2.     Marca comunitária – Disposições processuais – Exame oficioso dos factos – Alcance

(Artigo 225.° CE; Estatuto do Tribunal de Justiça, artigo 58.°; Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 74.°)

3.     Marca comunitária – Definição e aquisição da marca comunitária – Motivos absolutos de recusa – Marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que podem servir para designar as características de um produto

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.°, n.° 1, alínea c)]

1.     Permitir que uma parte invoque no Tribunal de Justiça, pela primeira vez, fundamentos que não invocou no Tribunal de Primeira Instância, equivaleria a permitir‑lhe apresentar ao Tribunal de Justiça, cuja competência em segunda instância é limitada, um litígio com um objecto mais lato do que o submetido ao Tribunal de Primeira Instância. No âmbito de um recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância, a competência do Tribunal de Justiça encontra‑se limitada à apreciação da solução legal dada aos fundamentos debatidos em primeira instância.

Todavia, dado que, por um lado, uma Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) recusou o registo da marca pedida, baseando‑se apenas no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária e que, por outro, o recurso interposto pela Celltech contra essa decisão no Tribunal de Primeira Instância se baseou na violação desta mesma disposição, foi apenas na fase do recurso para o Tribunal de Primeira Instância que o IHMI teve a possibilidade de contestar a interpretação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, que o Tribunal de Primeira Instância acolheu no acórdão recorrido para anular a decisão controvertida. Nestas condições, e na medida em que se destina apenas a contestar a solução legal dada pelo Tribunal de Primeira Instância no acórdão recorrido, o recurso para o Tribunal de Justiça que invoca a violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, deve ser declarado admissível.

(cf. n.os 21‑24)

2.     Nos termos do artigo 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária, os examinadores do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) e, em sede de recurso, as Câmaras de Recurso do Instituto devem proceder ao exame oficioso dos factos para determinar se a marca cujo registo é pedido é ou não abrangida por um dos motivos de recusa de registo enunciados no artigo 7.° do mesmo regulamento. Por conseguinte, os órgãos competentes do Instituto podem ser levados a basear as suas decisões em factos que não foram invocados pelo requerente. Embora, em princípio, compita a esses órgãos demonstrar, nas suas decisões, a exactidão desses factos, isso não acontece quando estejam em causa factos notórios. A apreciação, pelo Tribunal de Primeira Instância, do carácter notório ou não dos factos constitui uma apreciação de natureza factual que, salvo em caso de desvirtuação, está excluída da fiscalização do Tribunal de Justiça em sede de recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância.

(cf. n.os 38, 39, 45)

3.     Para que uma marca constituída por uma palavra resultante de uma combinação de elementos seja considerada descritiva, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária, não basta que se comprove um eventual carácter descritivo relativamente a cada um desses elementos. Tal carácter deve ser verificado em relação à própria palavra. Regra geral, a simples combinação de elementos, cada um dos quais descreve as características dos produtos ou dos serviços para os quais o registo é pedido, é ela própria descritiva das referidas características, na acepção do referido artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

Contudo, tal combinação pode não ser descritiva, na acepção da mesma disposição, desde que crie uma impressão suficientemente afastada da que é produzida pela simples reunião dos referidos elementos. Por conseguinte, embora, quando se trata de uma marca composta por palavras, um eventual carácter descritivo possa ser analisado, em parte, relativamente a cada um dos seus elementos, considerados separadamente, tal carácter deve, em qualquer caso, depender de uma análise do conjunto que eles compõem. A este propósito, não pode ser afirmado que a análise prévia de cada um dos elementos de que uma marca é composta constitua uma etapa obrigatória. Em contrapartida, as Câmaras de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) e, em recurso, o Tribunal de Primeira Instância têm de proceder à apreciação do carácter descritivo da marca, considerada no seu conjunto.

(cf. n.os 76‑80)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

19 de Abril de 2007 (*)

«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Marca comunitária – Artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento (CE) n.° 40/94 – Pedido de marca nominativa CELLTECH – Motivos absolutos de recusa – Falta de carácter distintivo – Carácter descritivo»

No processo C‑273/05 P,

que tem por objecto o recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância, nos termos do artigo 56.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, entrado em 30 de Junho de 2005,

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. Folliard‑Monguiral, na qualidade de agente,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Celltech R & D Ltd, com sede em Slough (Reino Unido), representada por D. Alexander e G. Hobbs, QC, mandatados por N. Jenkins, solicitor,

recorrente em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: P. Jann, presidente de secção, K. Lenaerts, E. Juhász, K. Schiemann e M. Ilešič (relator), juízes,

advogada‑geral: E. Sharpston,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 17 de Maio de 2006,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 14 de Dezembro de 2006,

profere o presente

Acórdão

1       Através do presente recurso, o Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias, de 14 de Abril de 2005, Celltech/IHMI (CELLTECH) (T‑260/03, Colect., p. II‑1215, a seguir «acórdão recorrido»), pelo qual o Tribunal de Primeira Instância deu provimento ao recurso da Celltech R&D Ltd (a seguir «Celltech») e anulou a decisão da Segunda Câmara de Recurso do IHMI, de 19 de Maio de 2003 (processo R 659/2002‑2) que recusou o registo da marca nominativa CELLTECH (a seguir «decisão controvertida»).

 Quadro jurídico

2       O artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), dispõe:

«Será recusado o registo:

[…]

b)      De marcas desprovidas de carácter distintivo;

c)      De marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes.»

3       Nos termos do artigo 73.° do mesmo regulamento:

«As decisões do [IHMI] serão fundamentadas. Essas decisões só se podem basear em motivos a respeito dos quais as partes tenham podido pronunciar‑se.»

4       Nos termos do artigo 74.°, n.° 1, do referido regulamento, «[n]o decurso do processo, o [IHMI] procederá ao exame oficioso dos factos».

 Antecedentes do litígio

5       Em 30 de Junho de 2000, a Celltech apresentou ao IHMI, ao abrigo do Regulamento n.° 40/94, um pedido de registo como marca comunitária da marca nominativa CELLTECH.

6       Os produtos e serviços para os quais o registo foi pedido são os «produtos, compostos e substâncias farmacêuticos, veterinários e higiénicos», os «aparelhos e instrumentos cirúrgicos, médicos, dentários e veterinários» e os «serviços de investigação e de desenvolvimento; serviços de consultoria, todos relacionados com as ciências biológica, médica e química», incluídos, respectivamente, nas classes 5, 10 e 42 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, na versão revista e alterada.

7       Por decisão de 4 de Junho de 2002, o examinador do IHMI indeferiu o pedido de registo, com fundamento no artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94. Considerou que a marca em causa era composta pela combinação, gramaticalmente correcta, dos dois termos «cell» (célula) e «tech» [abreviatura de «technical» (técnico) ou de «technology» (tecnologia)] e que não podia, por consequência, servir de indicador de origem para os produtos e serviços para os quais o registo era pedido, uma vez que todos pertenciam à área da tecnologia celular.

8       Através da decisão impugnada, a Segunda Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso interposto pela Celltech contra a decisão do examinador. No essencial, a Câmara de Recurso considerou que, como a marca pedida era susceptível de ser percebida, imediatamente e sem ambiguidade, como um termo designando actividades da área da tecnologia celular, bem como produtos, aparelhos e material utilizados no âmbito destas actividades ou delas resultantes, o nexo entre os produtos e serviços abrangidos pelo pedido de registo e a referida marca não era suficientemente indirecto para conferir a esta última o grau mínimo de carácter distintivo intrínseco, exigido pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

 A tramitação processual no Tribunal de Primeira Instância e o acórdão recorrido

9       A Celltech interpôs no Tribunal de Primeira Instância um recurso de anulação da decisão controvertida.

10     Tendo verificado, nos n.os 25 e 26 do acórdão recorrido, que a Câmara de Recurso tinha decidido que a marca pedida era desprovida de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, por ser percebida pelo público‑alvo como um termo descritivo do tipo de produtos e serviços referidos no pedido de registo, o Tribunal de Primeira Instância considerou, no n.° 27 do mesmo acórdão, que devia verificar, em primeiro lugar, se a Câmara de Recurso tinha demonstrado que essa marca era descritiva dos referidos produtos ou dos serviços, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento.

11     Nos n.os 29 a 31 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância decidiu que o público‑alvo era simultaneamente constituído por todos os especialistas da área da medicina que têm um conhecimento dos termos científicos na sua área de actividade, independentemente da sua língua materna, e pelo consumidor médio anglófono.

12     Nos n.os 32 e 33 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância considerou que pelo menos um dos significados da marca CELLTECH é «cell technology» (tecnologia celular).

13     Tendo verificado, no n.° 34 do acórdão recorrido, que a Câmara de Recurso tinha considerado que o termo «celltech» «designa[va] actividades na área da tecnologia celular e produtos, aparelhos e material utilizados no âmbito destas actividades ou resultantes destas», o Tribunal de Primeira Instância averiguou, nos n.os 35 a 41 do mesmo acórdão, se a Câmara de Recurso tinha demonstrado que a marca pedida era descritiva dos produtos e dos serviços objecto do pedido de registo. E concluiu pela negativa, pelos seguintes motivos:

«36      A este propósito, há que observar que nem a Câmara de Recurso nem o IHMI expuseram o significado científico de tecnologia celular. Com efeito, o IHMI apenas forneceu, em anexo à contestação, um extracto do Collins English Dictionary com as definições das palavras ‘cell’ e ‘tech’.

37      Ora, nem a Câmara de Recurso nem o IHMI explicaram em que é que estes termos dão uma informação quanto ao destino e à natureza dos produtos e dos serviços visados pelo pedido de registo, designadamente o modo como estes produtos e serviços são aplicados à tecnologia celular ou como dela resultam.

38      Na verdade, os produtos e os serviços visados pelo pedido de registo são em geral produtos e serviços farmacêuticos e, por esse facto, existe uma ligação com os corpos, que são compostos de células. Contudo, a Câmara de Recurso não demonstrou que o público‑alvo estabelecesse imediatamente e sem outra reflexão um nexo concreto e directo entre os produtos e os serviços farmacêuticos reivindicados e o sentido do sinal nominativo CELLTECH [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Junho de 2001, DKV/IHMI (EuroHealth), T‑359/99, Colect., p. II‑1645, n.° 35].

39      Além disso, mesmo admitindo que os produtos e os serviços em causa possam ser utilizados num contexto funcional que implique tecnologia celular, este facto não é suficiente para concluir que o sinal nominativo CELLTECH pode servir para designar o seu destino. Com efeito, tal utilização constituiria, quando muito, um dos múltiplos domínios de aplicação, mas não uma funcionalidade técnica (acórdão [do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Março de 2002, DaimlerChrysler/IHMI] CARCARD [T‑356/00, Colect., p. II‑1963], n.° 40).

40      Resulta das considerações que precedem que a Câmara de Recurso não demonstrou que o termo ‘celltech’, mesmo tomado como significando tecnologia celular, seja susceptível de ser percebido, imediatamente e sem ambiguidade, como um termo que designa actividades no âmbito da tecnologia celular e produtos, aparelhos e material utilizados no quadro destas actividades ou resultantes das mesmas. Também não demonstrou que o público‑alvo o concebe unicamente como uma indicação do tipo de produtos e de serviços que o sinal designa.

41      Por conseguinte, há que considerar que a Câmara de Recurso não demonstrou que o sinal nominativo CELLTECH é descritivo dos produtos e dos serviços para os quais o registo foi pedido.»

14     Nos n.os 42 a 44 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância averiguou, em segundo lugar, se a Câmara de Recurso tinha adiantado outros argumentos no sentido de demonstrar que o sinal nominativo em causa era desprovido de carácter distintivo, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, e concluiu que não.

15     Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância anulou a decisão impugnada e condenou o IHMI nas despesas.

 O presente recurso

16     No presente recurso, em que invoca cinco fundamentos, o IHMI conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–       anular o acórdão recorrido;

–       a título principal, negar provimento ao recurso interposto pela Celltech em primeira instância e condená‑la nas despesas, tanto no Tribunal de Primeira Instância como no Tribunal de Justiça;

–       a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância.

17     A Celltech pede ao Tribunal de Justiça que negue provimento ao recurso e condene o IHMI nas despesas.

18     Antes de mais, há que referir que nem o IHMI nem a Celltech contestam a apreciação efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância nos n.os 25 a 27 do acórdão recorrido, segundo a qual, se a Câmara de Recurso decidiu que a marca CELLTECH não era distintiva na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, foi por esta marca ser percebida pelo público‑alvo como um termo descritivo, na acepção da alínea c) do mesmo número, dos produtos e dos serviços referidos no pedido de registo.

 Quanto à admissibilidade do presente recurso

19     A Celltech alega que a Câmara de Recurso recusou o registo da marca pedida, baseando‑se apenas no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, e que, no Tribunal de Primeira Instância, as objecções suscitadas pelo IHMI contra o registo dessa marca foram igualmente baseadas nessa disposição. Em contrapartida, o IHMI funda doravante o seu recurso, quase exclusivamente, no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento.

20     Segundo a Celltech, uma vez que uma parte não tem o direito de suscitar um fundamento, pela primeira vez, perante o Tribunal de Justiça, o recurso do IHMI deve ser julgado inadmissível.

21     A este respeito, é jurisprudência assente que permitir que uma parte invoque no Tribunal de Justiça, pela primeira vez, fundamentos que não invocou no Tribunal de Primeira Instância equivaleria a permitir‑lhe apresentar ao Tribunal de Justiça, cuja competência em segunda instância é limitada, um litígio com um objecto mais lato do que o submetido ao Tribunal de Primeira Instância. No âmbito do recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância, a competência do Tribunal de Justiça está limitada à apreciação da solução legal dada aos fundamentos debatidos em primeira instância (v., nomeadamente, acórdãos de 11 de Novembro de 2004, Ramondín e o./Comissão, C‑186/02 P e C‑188/02 P, Colect., p. I‑10653, n.° 60, e de 22 de Junho de 2006, Storck/IHMI, C‑25/05 P, Colect., p. I‑5719, n.° 61).

22     No entanto, há que referir que, no caso vertente, o recurso interposto pelo IHMI se destina apenas a contestar a solução legal dada pelo Tribunal de Primeira Instância no acórdão recorrido.

23     Com efeito, por um lado, a Câmara de Recurso recusou o registo da marca pedida, baseando‑se apenas no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 e, por outro, o recurso interposto pela Celltech contra a decisão controvertida baseou‑se na violação desta mesma disposição. Nestas condições, foi apenas na fase do presente recurso que o IHMI teve a possibilidade de contestar a interpretação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, que o Tribunal de Primeira Instância acolheu no acórdão recorrido para anular a decisão controvertida.

24     Por conseguinte, o presente recurso deve ser declarado admissível.

 Quanto ao primeiro fundamento

 Argumentos das partes

25     Segundo o IHMI, foi erradamente que o Tribunal de Primeira Instância exigiu à Câmara de Recurso e ao próprio IHMI que expusessem o significado científico da expressão «cell technology», de modo a demonstrar «em que é que estes termos dão uma informação quanto ao destino e à natureza dos produtos e dos serviços visados pelo pedido de registo, designadamente o modo como estes produtos e serviços são aplicados à tecnologia celular ou como dela resultam».

26     Em primeiro lugar, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito, no n.° 36 do acórdão recorrido, ao censurar a Câmara de Recurso por não ter explicado o significado científico da expressão «cell technology» e ao fazer desta explicação uma condição para poder recusar a marca pedida por ser descritiva.

27     Segundo o IHMI, embora a Câmara de Recurso deva indicar as razões por que considera que uma marca nominativa é descritiva, tal exigência de fundamentação não a obrigava a apresentar, no caso vertente, uma definição científica da expressão «cell technology».

28     Resulta da leitura conjugada dos artigos 73.°, primeiro período, e 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 que, embora os órgãos do IHMI sejam obrigados a fundamentar as suas decisões, não são, em contrapartida, obrigados a mencionar os factos que tomaram em consideração. Por conseguinte, um raciocínio, mesmo abstracto, basta, se for correcto e não for infirmado por uma prova contrária apresentada por uma parte. Esta interpretação é confirmada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça (acórdão de 21 de Outubro de 2004, KWS Saat/IHMI, C‑447/02 P, Colect., p. I‑10107, n.os 44 a 49) e do Tribunal de Primeira Instância [acórdão de 8 de Junho de 2005, Wilfer/IHMI (ROCKBASS), T‑315/03, Colect., p. II‑1981, n.° 21].

29     O raciocínio jurídico da Câmara de Recurso, nos termos do qual, por um lado, a marca pedida significa «cell technology» e, por outro, este significado será entendido pelo consumidor pertinente como «designa[ndo] actividades na área da tecnologia celular e produtos, aparelhos e material utilizados no âmbito destas actividades ou resultantes destas actividades», bastava para fundamentar a recusa de registo com base no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

30     De resto, a expressão «cell technology», que significa a aplicação prática da investigação científica sobre as células, é suficientemente explícita para ser entendida tanto pelo consumidor médio como pelos especialistas, que constituem o público‑alvo. Qualquer explicação suplementar, designadamente, uma explicação científica, teria sido supérflua.

31     Em segundo lugar, o Tribunal de Primeira Instância cometeu também um erro de direito ao censurar a Câmara de Recurso, no n.° 37 do acórdão recorrido, por não ter explicado de que forma a expressão «cell technology» dava uma informação quanto ao destino e à natureza dos produtos e dos serviços visados no pedido de registo.

32     Segundo o IHMI, com efeito, se o Tribunal de Primeira Instância quis dizer que a Câmara de Recurso tinha de fazer referência a uma definição científica dessa expressão, cometeu um erro de direito nos termos dos fundamentos expostos nos n.os 26 a 30 do presente acórdão.

33     Se, pelo contrário, quis dizer que a Câmara de Recurso tinha de demonstrar que os produtos comercializados e os serviços prestados pela Celltech eram verdadeiramente aplicados à tecnologia celular ou resultavam verdadeiramente desta, também cometeu um erro de direito. A forma como o requerente de uma marca comunitária tem a intenção de comercializar ou comercializa os seus produtos e os seus serviços não tem pertinência quando se trata de apreciar se a marca é ou não descritiva ou desprovida de carácter distintivo, devendo essa apreciação ser efectuada no âmbito de um exame a priori, sem referência a uma utilização efectiva.

34     A Celltech reconhece que o IHMI não tem de produzir a prova do significado de um termo em todos os processos que lhe são submetidos. No entanto, tem de o fazer quando está em causa uma expressão composta por vários termos, em especial uma expressão de ordem técnica, que não é normal e habitualmente utilizada de forma descritiva.

35     É o que acontece no presente processo. A Celltech alega que a expressão «cell technology» – que recorda ser diferente da marca pedida CELLTECH – não tem um significado científico estabelecido. Não se trata de uma expressão técnica. A inexistência de definição desta expressão nos dicionários demonstra que a tecnologia celular não existe no plano científico. A referida expressão não é, assim, definida nem utilizada em lado algum. Foi a isto que o Tribunal de Primeira Instância fez alusão ao referir que o IHMI não forneceu nenhuma explicação científica para a expressão «cell technology».

36     A Celltech contesta a afirmação do IHMI segundo a qual o significado desta expressão é claro, a saber, a aplicação prática da investigação científica sobre as células. Não foi de forma alguma demonstrado que qualquer pessoa do público‑alvo entenderia a marca CELLTECH neste sentido. Com efeito, não há razão para supor que o consumidor médio decomporia a marca pedida de modo a considerá‑la desta forma.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

37     Em primeiro lugar, contrariamente à leitura que o IHMI faz do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância não anulou a decisão controvertida por falta de fundamentação, mas pelo facto de o IHMI não ter demonstrado que a marca CELLTECH, entendida no sentido de significar «cell technology», era descritiva dos produtos e dos serviços visados no pedido de registo.

38     Nos termos do artigo 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, os examinadores do IHMI e, em sede de recurso, as Câmaras de Recurso do IHMI devem proceder ao exame oficioso dos factos para determinar se a marca pedida é ou não abrangida por um dos motivos de recusa de registo enunciados no artigo 7.° do mesmo regulamento. Por conseguinte, os órgãos competentes do IHMI podem ser levados a basear as suas decisões em factos que não foram invocados pelo requerente (acórdão Storck/IHMI, já referido, n.° 50).

39     Embora, em princípio, compita a esses órgãos demonstrar, nas suas decisões, a exactidão desses factos, isso não acontece quando estejam em causa factos notórios (acórdão Storck/IHMI, já referido, n.° 51).

40     No caso vertente, no n.° 12 da decisão controvertida, a Câmara de Recurso indicou que «o consumidor em causa apreenderá o sintagma ‘CELLTECH’, imediatamente e sem ambiguidade, como um termo que designa actividades na área da tecnologia celular e produtos, aparelhos e material utilizados no âmbito destas actividades ou resultantes destas actividades».

41     A Câmara de Recurso considerou assim implicitamente, por um lado, que a tecnologia celular é uma realidade científica notória e, por outro, que as actividades abrangidas por esse método científico ou que o executam permitem produzir ou fabricar produtos, compostos ou substâncias farmacêuticos, veterinários e higiénicos, assim como aparelhos ou instrumentos cirúrgicos, médicos, dentários ou veterinários, e/ou que estas actividades necessitam da utilização desses produtos, compostos ou substâncias bem como de tais aparelhos ou instrumentos.

42     Ao pronunciar‑se deste modo, a Câmara de Recurso baseou a sua decisão em factos que analisou oficiosamente.

43     O Tribunal de Primeira Instância referiu, nos n.os 36 a 38 do acórdão recorrido, que, por não ter produzido a prova de que a tecnologia celular tem o significado científico que lhe é atribuído na decisão controvertida, a Câmara de Recurso não demonstrou a exactidão das verificações, resumidas nos n.os 40 e 41 do presente acórdão, com base nas quais concluiu pelo carácter descritivo da marca CELLTECH. Efectivamente, há que referir que a Câmara de Recurso não tentou de forma alguma demonstrar a procedência destas verificações, por exemplo, referindo‑se à literatura científica.

44     O IHMI alega que a expressão «cell technology» é suficientemente explícita e que, portanto, qualquer explicação suplementar, designadamente uma explicação científica, era supérflua.

45     No entanto, considerando que a existência e a natureza da tecnologia celular não constituem um facto notório e que compete portanto à Câmara de Recurso demonstrar a exactidão das suas declarações a este respeito, o Tribunal de Primeira Instância efectuou uma apreciação de natureza factual que, salvo em caso de desvirtuação, está excluída da fiscalização do Tribunal de Justiça em sede de recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância (v., neste sentido, acórdão Storck/IHMI, já referido, n.° 53).

46     Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância não cometeu nenhum erro de direito ao considerar que, por não ter demonstrado o significado científico da tecnologia celular, a Câmara de Recurso não demonstrou que a marca CELLTECH era descritiva dos produtos e dos serviços visados no pedido de registo.

47     Em segundo lugar, nada no acórdão recorrido é susceptível de servir de base à interpretação alternativa que o IHMI efectua do n.° 37 do acórdão recorrido, exposta no n.° 33 do presente acórdão. Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância não cometeu, a esse respeito, o erro de direito de que o IHMI o acusa.

48     Por conseguinte, há que afastar o primeiro fundamento.

 Quanto ao terceiro fundamento

 Argumentos das partes

49     O IHMI alega que o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito ao decidir, no n.° 39 do acórdão recorrido, que, por princípio, um domínio de aplicação de produtos ou de serviços não faz parte das características desses produtos ou desses serviços, cuja descrição, por uma marca cujo registo é pedido para os referidos produtos ou serviços, é proibida por força do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

50     Com efeito, esta disposição não procede a uma distinção entre, por um lado, o «destino» ou a «funcionalidade técnica», que são características dos produtos e dos serviços, e, por outro, o «domínio de aplicação», que não o é. Pelo contrário, a referência, na referida disposição, às «outras características» demonstra que todas as características eventuais dos produtos e dos serviços em causa se incluem na proibição que ela decreta. Esta análise é confirmada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual pouco importa que as características descritas sejam essenciais ou acessórias (acórdão de 12 de Fevereiro de 2004, Koninklijke KPN Nederland, C‑363/99, Colect., p. I‑1619, n.os 101 e 102).

51     Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância deveria averiguar se a marca CELLTECH é susceptível de ser percebida, imediatamente e sem ambiguidade, pelo consumidor‑alvo como um termo que designa actividades na área da tecnologia celular e/ou dos produtos utilizados no âmbito destas actividades.

52     A Celltech responde que o Tribunal de Primeira Instância de forma alguma decidiu que um domínio de aplicação não pode fazer parte das características de produtos ou de serviços cuja descrição por uma marca é proibida por força do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94. Nos n.os 39 e 40 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância limitou‑se a decidir que a Câmara de Recurso não demonstrou que o termo «celltech» é susceptível de ser percebido, imediatamente e sem ambiguidade, como designando as características dos produtos e dos serviços para os quais o registo foi pedido.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

53     Nos n.os 36 a 38 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância censurou a Câmara de Recurso por não ter demonstrado a existência e a natureza da tecnologia celular.

54     Nestas condições, o Tribunal de Primeira Instância não tinha, a fortiori, a possibilidade de apreciar se os produtos e os serviços visados no pedido de registo podem ser utilizados num contexto funcional implicando a tecnologia celular.

55     Por conseguinte, é de forma hipotética que, no n.° 39 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância admitiu que tal pudesse ocorrer, como demonstra o emprego dos termos «mesmo admitindo» no primeiro período deste número.

56     Por conseguinte, o terceiro fundamento está dirigido contra um fundamento superabundante do acórdão recorrido e, portanto, ainda que seja fundado, não pode conduzir à anulação deste acórdão.

57     Em consequência, há que afastar este fundamento por inoperante.

 Quanto ao quarto fundamento

 Argumentos das partes

58     Segundo o IHMI, o Tribunal de Primeira Instância não fundamentou a afirmação, constante do n.° 40 do acórdão recorrido, segundo a qual a marca pedida não é susceptível de ser percebida, imediatamente e sem ambiguidade, como um termo que designa actividades na área da tecnologia celular, ou produtos, aparelhos e material relacionados com estas actividades. Com efeito, o acórdão recorrido não permite compreender a razão pela qual os termos «celltech» ou «cell technology» não descrevem a característica que consiste no método científico seguido para a obtenção dos produtos e dos serviços em causa.

59     A Celltech responde, por um lado, que é ao IHMI que compete demonstrar que o consumidor médio entenderá o termo «celltech» (ou mesmo a expressão «cell technology») como descrevendo essa característica. Por outro lado, o Tribunal de Primeira Instância fundamentou correctamente a sua apreciação nos n.os 35 a 41 do acórdão recorrido.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

60     Como resulta da análise do primeiro fundamento, o Tribunal de Primeira Instância fundamentou suficientemente do ponto de vista jurídico, nos n.os 35 a 38 do acórdão recorrido, a sua apreciação, formulada no n.° 40 do mesmo acórdão, segundo a qual a Câmara de Recurso não demonstrou que a marca pedida era descritiva dos produtos e dos serviços em causa.

61     Por conseguinte, o quarto fundamento deve ser afastado.

 Quanto ao quinto fundamento

 Argumentos das partes

62     Segundo o IHMI, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito ao negar que a designação de um método científico para a obtenção de produtos ou de serviços é descritiva, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

63     O termo «celltech», no sentido de «cell technology», será apreendido como dizendo respeito aos produtos e aos serviços cujas características derivam de progressos nas biociências que utilizam ou modificam células, a saber, no sector da investigação sobre a tecnologia celular. Por conseguinte, o método científico para a produção dos produtos ou a prestação de serviços será compreendido como sendo uma característica importante, concreta e directa do ponto de vista do consumidor‑alvo.

64     A Celltech alega que o Tribunal de Primeira Instância teve razão ao rejeitar a proposta segundo a qual a expressão «cell technology» descreve o processo científico de fabrico dos produtos ou de prestação dos serviços em causa. O IHMI não pôde apresentar a mínima referência a esta expressão na literatura científica, ou outra, uma vez que não é utilizada por nenhum cientista para descrever o que quer que seja. Por conseguinte, ela não pode dar a menor informação sobre os produtos em causa.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

65     Contrariamente ao que alega o IHMI, o Tribunal de Primeira Instância de forma alguma decidiu que um termo ou uma expressão que designe um método científico que permita fabricar produtos, compostos ou substâncias farmacêuticos, veterinários ou higiénicos, ou prestar serviços relativos às ciências biológica, médica e química não são descritivos dos produtos e dos serviços obtidos através desse método.

66     Como foi referido no âmbito da análise do primeiro fundamento, o Tribunal de Primeira Instância anulou a decisão impugnada pelo facto de a Câmara de Recurso não ter demonstrado, designadamente, que a tecnologia celular constitui um método de produção dos produtos ou de prestação dos serviços visados no pedido de registo.

67     Por conseguinte, há que afastar o quinto fundamento.

 Quanto ao segundo fundamento

 Argumentos das partes

68     Segundo o IHMI, resulta do n.° 98 do acórdão Koninklijke KPN Nederland, já referido, que se presume que uma marca nominativa constituída pela simples combinação de elementos em que cada um é descritivo das características dos produtos ou dos serviços para os quais o registo é pedido é ela própria descritiva dessas características, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, e que a referida presunção só pode ser ilidida se a referida combinação introduzir uma alteração não habitual, designadamente, de ordem sintáctica ou semântica.

69     Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância tinha de verificar se os termos «cell» e «tech», considerados individualmente, eram intrinsecamente descritivos dos produtos e dos serviços em causa e, se tivesse concluído que era assim, deveria ter explicado de que forma a combinação desses dois termos descritivos introduzia uma alteração não habitual na sintaxe ou no sentido do termo «celltech», que permitisse a este último não ser ele próprio descritivo dos referidos produtos e serviços. Por conseguinte, ao não proceder a essa verificação, o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

70     O IHMI acrescenta que a análise do Tribunal de Primeira Instância não pode ser justificada com base no acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Setembro de 2004, SAT.1/IHMI (C‑329/02 P, Colect., p. I‑8317), referido no n.° 43 do acórdão recorrido. Com efeito, no acórdão SAT.1/IHMI, já referido, está em causa o carácter distintivo de uma marca constituída pela combinação de um elemento descritivo e de um elemento não distintivo, e não, como no caso vertente, o carácter descritivo de uma marca constituída pela combinação de dois elementos susceptíveis, cada um, de ser descritivos. Além disso, esse acórdão diz respeito à interpretação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, e não à interpretação da alínea c) do mesmo número.

71     A Celltech contesta que o Tribunal de Justiça tenha enunciado uma presunção de inexistência de carácter distintivo de uma marca constituída pela combinação de dois elementos não distintivos. No acórdão Koninklijke KPN Nederland, já referido, o Tribunal de Justiça apenas indicou que, «regra geral», a simples combinação de elementos em que cada um é descritivo das características dos produtos permanece, ela própria, descritiva das referidas características. No entanto, resulta de jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, designadamente, do seu acórdão SAT.1/IHMI, já referido, que há que apreciar a marca na sua totalidade, uma vez que o consumidor médio não a decompõe nos diferentes elementos que a compõem.

72     Por conseguinte, foi com razão que o Tribunal de Primeira Instância apreciou a marca CELLTECH no seu conjunto.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

73     Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo de marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes.

74     Há que interpretar os diferentes motivos de recusa enumerados no artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, à luz do interesse geral que está na base de cada um deles (acórdão de 15 de Setembro de 2005, BioID/IHMI, C‑37/03 P, Colect., p. I‑7975, n.° 59 e jurisprudência aí referida).

75     O artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 prossegue um objectivo de interesse geral, que exige que os sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar características dos produtos ou dos serviços para os quais é pedido o registo possam ser livremente utilizados por todos. Esta disposição impede, portanto, que esses sinais ou indicações sejam reservados a uma única empresa com base no seu registo como marca (acórdão de 12 de Janeiro de 2006, Deutsche SiSi‑Werke/IHMI, C‑173/04 P, Colect., p. I‑551, n.° 62 e jurisprudência aí referida).

76     Para que uma marca constituída por uma palavra resultante de uma combinação de elementos, como a marca pedida, seja considerada descritiva, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, não basta que se comprove um eventual carácter descritivo relativamente a cada um desses elementos. Tal carácter deve ser verificado em relação à própria palavra [v., a respeito do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), disposição que é idêntica, no essencial, ao artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, os acórdãos Koninklijke KPN Nederland, já referido, n.° 96, e de 12 de Fevereiro de 2004, Campina Melkunie, C‑265/00, Colect., p. I‑1699, n.° 37].

77     Como o IHMI recordou, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, regra geral, a simples combinação de elementos, cada um dos quais descreve as características dos produtos ou dos serviços para os quais o registo é pedido, é ela própria descritiva das referidas características, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 (acórdãos, já referidos, Koninklijke KPN Nederland, n.° 98, e Campina Melkunie, n.° 39).

78     Contudo, o Tribunal de Justiça acrescentou que tal combinação pode não ser descritiva, na acepção da mesma disposição, desde que crie uma impressão suficientemente afastada da que é produzida pela simples reunião dos referidos elementos (acórdãos, já referidos, Koninklijke KPN Nederland, n.° 99, e Campina Melkunie, n.° 40).

79     Por conseguinte, embora, quando se trata de uma marca composta por palavras, um eventual carácter descritivo possa ser analisado, em parte, relativamente a cada um dos seus elementos, considerados separadamente, tal carácter deve, em qualquer caso, depender de uma análise do conjunto que eles compõem [v., por analogia, no que respeita ao artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do regulamento, acórdãos, já referidos, SAT.1/IHMI, n.° 28, e BioID/IHMI, n.° 29].

80     Resulta das considerações expostas que, contrariamente ao que alega o IHMI, não resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a análise prévia de cada um dos elementos de que uma marca é composta constitua uma etapa obrigatória. Em contrapartida, as Câmaras de Recurso do IHMI e, em recurso, o Tribunal de Primeira Instância têm de proceder à apreciação do carácter descritivo da marca, considerada no seu conjunto.

81     No caso vertente, é forçoso considerar que o Tribunal de Primeira Instância procedeu efectivamente à apreciação do carácter descritivo da marca CELLTECH, considerada no seu conjunto, e concluiu que não estava demonstrado que essa marca, entendida no sentido de significar «cell technology», era descritiva dos produtos e dos serviços visados no pedido de registo. Por conseguinte, não violou o artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

82     Por conseguinte, há que afastar o segundo fundamento e negar provimento ao recurso do IHMI.

 Quanto às despesas

83     Por força do disposto no artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de decisões do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118.° do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Celltech pedido a condenação do IHMI e tendo este sido vencido no seu recurso, há que condená‑lo nas despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      O Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) é condenado nas despesas.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.