Processos apensos C‑187/05 a C‑190/05

Georgios Agorastoudis e o.

contra

Goodyear Hellas ABEE

(pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Areios Pagos)

«Despedimentos colectivos – Directiva 75/129/CEE – Artigo 1.°, n.° 2, alínea d) – Cessação das actividades do estabelecimento resultante de uma decisão judicial – Cessação das actividades do estabelecimento por exclusiva vontade do empregador»

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 7 de Setembro de 2006 

Sumário do acórdão

Política social – Aproximação das legislações – Despedimentos colectivos – Directiva 75/129

[Directiva 75/129 do Conselho, artigo 1.°, n.° 2, alínea d)]

A Directiva 75/129, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos colectivos, deve ser interpretada no sentido de que é aplicável em casos de despedimentos colectivos resultantes da cessação definitiva do funcionamento de uma empresa ou de um estabelecimento, decidida por iniciativa exclusiva do empregador, sem uma decisão judicial prévia, não podendo a derrogação prevista no artigo 1.°, n.° 2, alínea d), dessa directiva afastar a sua aplicação.

(cf. n.° 45, disp.)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

7 de Setembro de 2006 (*)

«Despedimentos colectivos – Directiva 75/129/CEE – Artigo 1.°, n.° 2, alínea d) – Cessação das actividades do estabelecimento resultante de uma decisão judicial – Cessação das actividades do estabelecimento por exclusiva vontade do empregador»

Nos processos apensos C‑187/05 a C‑190/05,

que têm por objecto pedidos de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentados pelo Areios Pagos (Grécia), por decisões de 17 de Março de 2005, entrados no Tribunal de Justiça em 27 de Abril de 2005, nos processos

Georgios Agorastoudis e o. (C‑187/05),

Ioannis Pannou e o. (C‑188/05),

Kostandinos Kotsabougioukis e o. (C‑189/05),

Georgios Akritopoulos e o. (C‑190/05)

contra

Goodyear Hellas ABEE,

sendo intervenientes:

Geniki Synomospondia Ergaton Elládas (GSEE),

Ergatoypalliliko kentro Thessalonikis (C‑187/05 e C‑189/05),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: P. Jann, presidente de secção, K. Schiemann, N. Colneric, E. Juhász (relator) e E. Levits, juízes,

advogado‑geral: D. Ruiz‑Jarabo Colomer,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 27 de Abril de 2006,

vistas as observações apresentadas:

–       em representação de G. Agorastoudis e o., por A. Kazakos, dikigoros,

–       em representação de I. Pannou e o., por A. Kazakos, dikigoros,

–       em representação de K. Kotsabougioukis e o., por A. Kazakos, dikigoros,

–       em representação de G. Akritopoulos e o., por A. Kazakos, dikigoros,

–       em representação da Goodyear Hellas ABEE, por K. Kremalis e I.‑D. Filiotis, dikigori,

–       em representação do Geniki Synomospondia Ergaton Elládas (GSEE), por A. Kazakos, dikigoros,

–       em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por M. Condou‑Durande e G. Rozet, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1       Os pedidos de decisão prejudicial têm por objecto a interpretação do artigo 1.°, n.° 2, alínea d), da Directiva 75/129/CEE do Conselho, de 17 de Fevereiro de 1975, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos colectivos (JO L 48, p. 29; EE 05 F2 p. 54).

2       Esses pedidos foram apresentados no quadro de litígios que opõem trabalhadores despedidos ao seu antigo empregador relativamente à regularidade do seu despedimento colectivo ocorrido na sequência da cessação das actividades do estabelecimento decidida por exclusiva vontade desse empregador.

 Quadro jurídico

 Regulamentação comunitária

3       A Directiva 75/129, que se baseia no artigo 100.° do Tratado CEE (que passou a artigo 100.° do Tratado CE, ele próprio actual artigo 94.° CE), visa, em conformidade com o seu primeiro considerando, «reforçar a protecção dos trabalhadores em caso de despedimento colectivo, tendo em conta a necessidade de um desenvolvimento económico e social equilibrado na Comunidade». No segundo considerando desta directiva, declara‑se que, «apesar de uma evolução convergente, subsistem diferenças entre as disposições em vigor nos Estados‑Membros da Comunidade no que respeita às modalidades e ao processo dos despedimentos colectivos, bem como às medidas susceptíveis de atenuar as consequências destes despedimentos para os trabalhadores». Por essa razão, enuncia‑se no quinto considerando da referida directiva que é necessário promover numa via de progresso, na acepção do artigo 117.° do Tratado CEE [que passou a artigo 117.° do Tratado CE (os artigos 117.° a 120.° do Tratado CE foram substituídos pelos artigos 136.° CE a 143.° CE)], a aproximação das disposições em vigor nos Estados‑Membros.

4       O artigo 1.° da Directiva 75/129 determina o âmbito de aplicação desta da seguinte forma:

«1.      Para efeitos da aplicação da presente directiva:

a)      Entende‑se por ‘despedimentos colectivos’ os despedimentos efectuados por um empregador, por um ou vários motivos não inerentes à pessoa dos trabalhadores, quando o número de despedimentos abranger, segundo a escolha efectuada pelos Estados‑Membros:

–       ou, num período de 30 dias:

1.      No mínimo 10 trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente mais de 20 (e) menos de 100;

2.      No mínimo 10% do número dos trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente no mínimo 100 e menos de 300 trabalhadores;

3.      No mínimo 30 trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente no mínimo 300;

–       ou, num período de 90 dias, no mínimo 20 trabalhadores, qualquer que seja o número de trabalhadores habitualmente empregados nos estabelecimentos em questão;

[…]

2.      A presente directiva não é aplicável:

a)      Aos despedimentos colectivos efectuados no âmbito de contratos de trabalho a prazo ou à tarefa, salvo se estes despedimentos forem efectuados antes do termo ou do cumprimento destes contratos;

b)      Aos trabalhadores das administrações públicas ou dos estabelecimentos de direito público (ou das entidades equivalentes nos Estados‑Membros que não conheçam esta noção);

c)      Às tripulações dos navios de mar;

d)      Aos trabalhadores afectados pela cessação das actividades do estabelecimento, quando esta resultar de uma decisão judicial.»

5       A Directiva 75/129 prevê, no seu artigo 2.°, certas obrigações para o empregador que tenciona fazer despedimentos colectivos. Em primeiro lugar, deve proceder a consultas aos representantes dos trabalhadores que incidirão, pelo menos, sobre as possibilidades de evitar ou de reduzir os despedimentos bem como sobre os meios de atenuar as suas consequências. Além disso, para lhes permitir formular propostas construtivas, deve comunicar a esses representantes todas as informações úteis e, em qualquer caso, por escrito, os motivos de despedimento, o número de trabalhadores a despedir, o número de trabalhadores habitualmente empregados e o período no decurso do qual se pretende efectuar os despedimentos.

6       O artigo 3.°, n.° 1, dessa directiva dispõe:

«O empregador deve notificar por escrito a autoridade pública competente de qualquer projecto de despedimento colectivo.

A notificação deve conter todas as informações úteis respeitantes ao projecto de despedimento colectivo e às consultas aos representantes dos trabalhadores previstas no artigo 2.°, nomeadamente, os motivos do despedimento, o número de trabalhadores a despedir, o número dos trabalhadores habitualmente empregados e o período no decurso do qual se pretende efectuar os despedimentos.»

7       O artigo 4.°, n.° 1, da referida directiva prevê:

«Os despedimentos colectivos, de cujo projecto tenha sido notificada a autoridade pública competente, não podem produzir efeitos antes de decorridos 30 dias após a notificação prevista no n.° 1 do artigo 3.° [...]

[…]»

8       O artigo 5.° dessa mesma directiva dispõe, finalmente, que esta «não prejudica a faculdade que os Estados‑Membros têm de aplicar ou de introduzir disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis aos trabalhadores».

9       A Directiva 75/129 foi alterada pela Directiva 92/56/CEE do Conselho, de 24 de Junho de 1992 (JO L 245, p. 3), na sequência da adopção da Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores na reunião do Conselho Europeu realizada em Estrasburgo em 9 de Dezembro de 1989. Essa alteração comporta essencialmente um reforço das obrigações do empregador em matéria de informação e de consulta dos representantes dos trabalhadores previstas no artigo 2.° da Directiva 75/129, bem como, através do aditamento de um artigo 5.°‑A a esta última directiva, a obrigação de os Estados‑Membros preverem que os representantes dos trabalhadores e/ou os trabalhadores disponham de procedimentos administrativos e/ou judiciais para fazer cumprir as obrigações instituídas pela Directiva 75/129.

10     No quadro dessas alterações, foi suprimida a alínea d) do artigo 1.°, n.° 2, da Directiva 75/129.

11     Nesse mesmo quadro, foi aditado ao artigo 3.°, n.° 1, da Directiva 75/129 o seguinte parágrafo após o primeiro parágrafo:

«No entanto, os Estados‑Membros podem prever que, no caso de um projecto de despedimento colectivo resultante da cessação das actividades de um estabelecimento na sequência de uma decisão judicial, o empregador seja obrigado a notificar por escrito a autoridade pública competente apenas se esta o solicitar.»

12     A Directiva 92/56 previu também o aditamento ao artigo 4.° da Directiva 75/129 de um n.° 4 que está redigido da seguinte forma:

«Os Estados‑Membros não são obrigados a aplicar o presente artigo em caso de despedimentos colectivos resultantes da cessação das actividades de um estabelecimento, quando esta resultar de uma decisão judicial.»

 Legislação nacional

13     A Directiva 75/129 foi transposta para direito helénico pela Lei n.° 1387/1983.

14     Essa lei prevê, no seu artigo 3.°, que o empregador dê uma informação completa, por escrito, aos trabalhadores sobre os despedimentos colectivos projectados e os seus motivos, bem como a obrigação de o empregador proceder a consultas aos representantes dos trabalhadores e de comunicar a estes qualquer informação que lhes permita formular propostas construtivas. Prevê igualmente a obrigação de o empregador comunicar essas informações à autoridade pública competente. Além disso, essa lei contém no seu artigo 5.°, n.° 3, uma disposição favorável aos trabalhadores de acordo com a qual, se as partes não chegarem a acordo, o prefeito ou o Ministro do Trabalho podem, em função da situação do mercado e da empresa em questão, prolongar as consultas durante 20 dias adicionais ou não aprovar a totalidade ou uma parte dos despedimentos projectados.

15     O artigo 1.°, n.° 2, alínea d), da Directiva 75/129 foi transposto para direito interno pelo artigo 2.°, n.° 2, alínea c), da Lei n.° 1387/1983, nos termos do qual:

«As disposições desta lei não se aplicam aos trabalhadores despedidos devido à cessação das actividades da empresa ou do estabelecimento na sequência de uma decisão judicial de primeira instância.»

16     As alterações introduzidas pela Directiva 92/56 foram transpostas para direito nacional pelas Leis n.os 2736/1999 e 2874/2000, ou seja, posteriormente aos factos do processo principal, que ocorreram em Julho de 1996. O prazo de transposição das referidas alterações para direito interno, fixado no artigo 2.° da Directiva 92/56, tinha expirado em 24 de Junho de 1994, isto é, anteriormente a esses factos.

 Litígios nos processos principais e questão prejudicial

17     Resulta das decisões de reenvio que os demandantes no processo principal trabalhavam, no quadro de contratos de trabalho por tempo indeterminado, no sector industrial da sociedade Goodyear Hellas SA, situado na zona industrial de Salónica. A actividade dessa fábrica consistia essencialmente na produção de pneus e de câmaras‑de‑ar para automóveis, bem como de materiais para a reparação e a recauchutagem dos pneus. A referida fábrica, que constituía um conjunto organizado de meios humanos e tecnológicos, formava o sector industrial da empresa em questão, era distinta do ramo comercial desta, com sede em Atenas, e era economicamente autónoma em relação a este.

18     Em 19 de Julho de 1996, a assembleia‑geral de accionistas da sociedade‑mãe Goodyear, com sede nos Estados Unidos da América, decidiu interromper a actividade industrial e a cessação definitiva da actividade da fábrica de Salónica a partir de 22 de Julho de 1996. Os contratos de trabalho do pessoal empregado pelo sector industrial da empresa, ou seja, cerca de 340 pessoas, foram rescindidos a partir dessa mesma data, sem terem sido respeitadas as regras e o procedimento de despedimento colectivo previstos pela Lei n.° 1387/1983 então em vigor. O desmantelamento desse sector industrial começou em Outubro de 1996.

19     As acções intentadas pelos assalariados despedidos impugnando as decisões tomadas na sequência dessa cessação de actividade foram julgadas improcedentes em primeira instância bem como, em sede de recurso, pelo Efeteio (Tribunal de Segunda Instância de Atenas). Esse órgão jurisdicional considerou que, em conformidade com a jurisprudência constante dos órgãos jurisdicionais helénicos, uma vez que o direito helénico não prevê que uma decisão judicial seja proferida em caso de cessação definitiva das actividades de um empresa devida exclusivamente à vontade do empregador, este não está sujeito às obrigações previstas pela Directiva 75/129 e pela lei nacional de transposição.

20     Foi nestas condições que o Areios Pagos, chamado a conhecer de recursos de cassação, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça, nos quatro processos principais, a seguinte questão prejudicial:

«Tendo em conta que o direito grego não prevê a adopção de uma decisão judicial antes da cessação definitiva da actividade da empresa ou do estabelecimento por exclusiva vontade da entidade patronal, nos termos do artigo 1.°, n.° 2, alínea d), da Directiva 75/129, as disposições desta aplicam‑se aos despedimentos colectivos resultantes da cessação definitiva da actividade de uma empresa ou de um estabelecimento, decidida exclusivamente pela entidade patronal, na falta de uma decisão judicial prévia?»

21     Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 9 de Junho de 2005, os presentes processos foram apensos para efeitos das fases escrita e oral, bem como do acórdão.

 Quanto à questão prejudicial

22     Através da sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se, em caso de despedimentos colectivos provocados pela cessação definitiva do funcionamento de uma empresa ou de um estabelecimento, decidida por iniciativa exclusiva do empregador, sem uma decisão judicial prévia, a Directiva 75/129 é ou não aplicável e, mais concretamente, se a derrogação prevista no seu artigo 1.°, n.° 2, alínea d), pode ou não justificar que a aplicação dessa directiva seja afastada.

23     A questão submetida ao Tribunal de Justiça tem origem na jurisprudência constante dos órgãos jurisdicionais helénicos em matéria de aplicação da Directiva 75/129 e da lei nacional que a transpõe.

24     Em conformidade com essa jurisprudência, se a decisão de cessação definitiva das actividades de uma empresa ocorrer por exclusiva vontade do empregador, no uso da liberdade económica e financeira que lhe é constitucionalmente garantida, independentemente de uma decisão judicial, a Directiva 75/129 não é aplicável. Segundo essa jurisprudência, a aplicação desta está, com efeito, subordinada à manutenção em actividade da empresa em questão.

25     Esta interpretação não encontra fundamento na redacção da Directiva 75/129 nem no objectivo e na finalidade prosseguidos por esta, nem ainda na jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa a essa directiva.

26     Em primeiro lugar, a redacção da Directiva 75/129, nomeadamente do seu artigo 1.°, n.os 1, alínea a), e 2, alínea d), é claro e não deixa qualquer dúvida razoável quanto ao âmbito e às condições de aplicação da referida directiva.

27     Em conformidade com o disposto no artigo 1.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 75/129, «entende‑se por ‘despedimentos colectivos’ os despedimentos efectuados por um empregador, por um ou vários motivos não inerentes à pessoa dos trabalhadores […]». Esta definição é, em si, suficientemente precisa e não comporta qualquer ambiguidade.

28     O Tribunal de Justiça explicitou este conceito de «despedimento» salientando que ele reveste alcance comunitário e deve ser interpretado no sentido de que engloba qualquer cessação do contrato de trabalho não pretendida pelo trabalhador e, portanto, sem o seu consentimento (acórdão de 12 de Outubro de 2004, Comissão/Portugal, C‑55/02, Colect., p. I‑9387, n.os 49 e 50).

29     Tendo em conta a regra estabelecida pelo artigo 1.°, n.° 1, alínea a), da Directiva 75/129, deve considerar‑se que os quatro casos de não aplicação dessa directiva, citados no seu artigo 1.°, n.° 2, são enumerados de maneira limitativa e exaustiva. Além disso, enquanto derrogações à referida regra, devem ser interpretados de forma estrita (v., neste sentido, acórdão de 17 de Dezembro de 1998, Lauge e o., C‑250/97, Colect., p. I‑8737, n.° 19).

30     A quarta derrogação, isto é, a prevista no artigo 1.°, n.° 2, alínea d), da Directiva 75/129, à qual se refere a questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio, diz respeito à não aplicação da referida directiva aos despedimentos provocados pela cessação das actividades do estabelecimento «quando esta resultar de uma decisão judicial».

31     Esta disposição só pode ser interpretada no sentido de que a não aplicação da referida directiva é permitida unicamente quando a cessação das actividades do estabelecimento resultar de uma decisão judicial, por exemplo, de decisões que decretem a insolvência ou a dissolução de uma empresa.

32     Em todos os outros casos, nomeadamente quando a cessação definitiva das actividades da empresa em causa resultar da exclusiva vontade do empregador e assentar em apreciações de natureza económica ou outras, as obrigações deste, decorrentes da Directiva 75/129, continuam intactas. O facto de as disposições de direito nacional, às quais se refere o órgão jurisdicional de reenvio, não preverem que uma decisão judicial seja proferida antes da cessação definitiva da empresa ou do estabelecimento devida à exclusiva vontade do empregador não é, a este respeito, pertinente.

33     Deve recordar‑se que a disposição derrogatória que figura no artigo 1.°, n.° 2, alínea d), da Directiva 75/129 foi suprimida, com efeitos a 24 de Junho de 1994, pela Directiva 92/56, que assim reforçou o objectivo prosseguido. Portanto, à data dos factos no processo principal, em todos os casos de despedimentos colectivos consecutivos à cessação das actividades de um estabelecimento, mesmo quando esta resultasse de uma decisão judicial, o empregador tinha a obrigação de informar e de consultar os trabalhadores.

34     Em segundo lugar, no que respeita ao objectivo prosseguido pela Directiva 75/129, há que salientar, tal como enuncia o seu primeiro considerando, que esta directiva visa reforçar a protecção dos trabalhadores em caso de despedimentos colectivos. Essa finalidade de protecção dos trabalhadores foi reiteradamente lembrada pelo Tribunal de Justiça (v. acórdãos de 7 de Dezembro de 1995, Rockfon, C‑449/93, Colect., p. I‑4291, n.° 29, e Lauge e o., já referido, n.° 19).

35     O Tribunal de Justiça sublinhou que a Directiva 75/129 não prejudica a liberdade de o empregador proceder ou não proceder a despedimentos colectivos e que o seu único objectivo é fazer preceder esses despedimentos de uma consulta dos sindicatos e da informação da autoridade pública competente (acórdão de 12 de Fevereiro de 1985, Nielsen & Søn, 284/83, Recueil, p. 553, n.° 10).

36     Assim acontece, sem qualquer dúvida, quando o empregador tenciona pôr fim, por razões que lhe são próprias, à actividade do seu estabelecimento. Por outro lado, como a Comissão das Comunidades Europeias observou com razão, a Directiva 75/129 harmoniza não as modalidades da cessação definitiva das actividades de uma empresa, isto é, as situações em que uma decisão judicial é necessária ou não, mas o procedimento a seguir nos despedimentos colectivos.

37     À luz do objectivo prosseguido pela Directiva 75/129, o Tribunal de Justiça deu uma definição muito ampla do conceito de «estabelecimento» que nela figura, a fim de limitar na medida do possível os casos de despedimentos colectivos que não estariam sujeitos à referida directiva em razão da qualificação jurídica desse conceito ao nível nacional (v. acórdão Rockfon, já referido, n.os 31 e 32). 

38     O Tribunal de Justiça tem também salientado que a Directiva 75/129 foi adoptada com base nos artigos 100.° e 117.° do Tratado CEE, estabelecendo esta última disposição a necessidade de os Estados‑Membros promoverem a melhoria das condições de vida e de trabalho da mão‑de‑obra, permitindo a sua equiparação no progresso (v. acórdão Rockfon, já referido, n.° 29).

39     Deve sublinhar‑se, em terceiro lugar, que a interpretação acima exposta e as considerações a ela relativas já resultam da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

40     No seu acórdão de 28 de Março de 1985, Comissão/Bélgica (215/83, Recueil, p. 1039, n.os 13 a 19), o Tribunal de Justiça reconheceu precisamente que o Estado‑Membro em causa não tinha cumprido as suas obrigações pelo facto de não ter assegurado a protecção prevista pela Directiva 75/129 em todos os casos de despedimentos colectivos consecutivos a encerramentos de empresas não resultantes de uma decisão judicial. Pelo menos a partir da data desse acórdão, o sentido da disposição derrogatória prevista no artigo 1.°, n.° 2, alínea d), da Directiva 75/129 já não devia dar lugar a qualquer dúvida.

41     As disposições derrogatórias que figuram nos artigos 3.°, n.° 1, segundo parágrafo, e 4.°, n.° 4, da Directiva 75/129, aditados pela Directiva 92/56, foram objecto de clarificação pelo Tribunal de Justiça no acórdão Lauge e o., já referido (n.° 18), segundo o qual, para que as derrogações em questão sejam aplicáveis, a cessação das actividades do estabelecimento e os despedimentos colectivos não devem ter lugar antes de ser proferida a decisão judicial em que seja declarada a insolvência.

42     Além disso, no acórdão Comissão/Portugal, já referido (n.° 66 e parte decisória), o Tribunal de Justiça declarou que o Estado‑Membro em causa não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força da Directiva 75/129, uma vez que restringia o conceito de despedimentos colectivos a despedimentos por razões de natureza estrutural, tecnológica ou conjuntural e não alargava esse conceito a despedimentos por todas as razões não inerentes à pessoa dos trabalhadores.

43     Por último, deve recordar‑se que, em conformidade com jurisprudência constante, a obrigação de os Estados‑Membros alcançarem o resultado previsto por uma directiva, a fim de darem cumprimento ao artigo 249.°, terceiro parágrafo, CE, impõe‑se a todas as autoridades nacionais, incluindo às autoridades judiciais. Estas, chamadas a interpretar e a aplicar a lei nacional, são obrigadas a fazê‑lo na medida do possível à luz do texto e da finalidade desta directiva, para atingir o resultado por ela prosseguido (v., neste sentido, em último lugar, acórdão de 5 de Outubro de 2004, Pfeiffer e o., C‑397/01 a C‑403/01, Colect., p. I‑8835, n.° 113, e jurisprudência citada).

44     Ora, a abordagem seguida pelos órgãos jurisdicionais helénicos subtrai à protecção pretendida pela Directiva 75/129 numerosos casos de cessação das actividades de empresas que têm por consequência despedimentos em massa de trabalhadores e nos quais a necessidade de protecção desses trabalhadores é justamente mais importante, ignorando o objectivo prosseguido pela referida directiva. Tal abordagem, que atenta igualmente contra a exigência de aplicação uniforme da Directiva 75/129, é susceptível de esvaziar em larga medida essa directiva do seu conteúdo.

45     Resulta do que precede que deve responder‑se à questão submetida que a Directiva 75/129 deve ser interpretada no sentido de que é aplicável em casos de despedimentos colectivos resultantes da cessação definitiva do funcionamento de uma empresa ou de um estabelecimento, decidida por iniciativa exclusiva do empregador, sem uma decisão judicial prévia, não podendo a derrogação prevista no artigo 1.°, n.° 2, alínea d), dessa directiva afastar a sua aplicação.

 Quanto às despesas

46     Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

A Directiva 75/129/CEE do Conselho, de 17 de Fevereiro de 1975, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos colectivos, deve ser interpretada no sentido de que é aplicável em casos de despedimentos colectivos resultantes da cessação definitiva do funcionamento de uma empresa ou de um estabelecimento, decidida por iniciativa exclusiva do empregador, sem uma decisão judicial prévia, não podendo a derrogação prevista no artigo 1.°, n.° 2, alínea d), dessa directiva afastar a sua aplicação.

Assinaturas


* Língua do processo: grego.