Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Parte decisória
No processo C‑77/05,
que tem por objecto um recurso de anulação nos termos do artigo 230.° CE, entrado em 14 de Fevereiro de 2005,
Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por E. O’Neill e C. Gibbs, na qualidade de agentes, assistidas por A. Dashwood, barrister,
recorrente,
apoiado por:
Irlanda, representada por D. O’Hagan, na qualidade de agente, assistido por A. Collins, SC, e P. McGarry, BL, com domicílio escolhido no Luxemburgo,
República da Polónia, representada por J. Pietras, na qualidade de agente,
República da Eslováquia, representada por R. Procházka, J. Čorba e B. Ricziová, na qualidade de agentes,
intervenientes,
contra
Conselho da União Europeia, representado por J. Schutte e R. Szostak, na qualidade de agentes,
recorrido,
apoiado por:
Reino de Espanha, representado por J. M Rodríguez Cárcamo, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,
Comissão das Comunidades Europeias, representada por C. O’Reilly, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,
intervenientes,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),
composto por: V. Skouris, presidente, P. Jann, C. W. A. Timmermans, A. Rosas, K. Lenaerts e A. Tizzano, presidentes de secção, R. Schintgen (relator), J. N. Cunha Rodrigues, R. Silva de Lapuerta, J.‑C. Bonichot, T. von Danwitz, A. Arabadjiev e C. Toader, juízes,
advogada‑geral: V. Trstenjak,
secretário: J. Swedenborg, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 13 de Março de 2007,
ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 10 de Julho de 2007,
profere o presente
Acórdão
1. Com a sua petição, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte pede ao Tribunal de Justiça, por um lado, que anule o Regulamento (CE) n.° 2007/2004 do Conselho, de 26 de Outubro de 2004, que cria uma Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos Estados‑Membros da União Europeia (JO L 49, p. 1), e, por outro, que mantenha os efeitos deste regulamento até à adopção de um novo regulamento que o substitua, excepto na medida em que o Regulamento n.° 2007/2004 exclui da participação na sua aplicação o referido Estado‑Membro.
Quadro jurídico
Protocolo relativo à posição do Reino Unido e da Irlanda
2. O título IV da parte III do Tratado CE (a seguir «título IV») estabelece as bases jurídicas que permitem a adopção de medidas em matéria de vistos, asilo, imigração e outras políticas relacionadas com a livre circulação de pessoas.
3. O Protocolo relativo à posição do Reino Unido e da Irlanda, anexo ao Tratado UE e ao Tratado CE pelo Tratado de Amesterdão (a seguir «protocolo relativo ao título IV»), respeita à participação desses Estados‑Membros na adopção de medidas apresentadas nos termos das disposições que constam no título IV.
4. Por força do artigo 1.° do protocolo relativo ao título IV, sob reserva do artigo 3.° do mesmo protocolo, o Reino Unido e a Irlanda não participarão na adopção das medidas propostas em aplicação do título IV, e, nos termos do artigo 2.° do referido protocolo, estes Estados‑Membros não estão vinculados por estas medidas nem elas lhes são aplicáveis.
5. Nos termos do artigo 3.° do protocolo relativo ao título IV:
«1. O Reino Unido ou a Irlanda podem notificar por escrito o Presidente do Conselho, no prazo de três meses a contar da apresentação ao Conselho de uma proposta ou iniciativa ao abrigo do título IV […], de que desejam participar na adopção e na aplicação da medida proposta, ficando assim esse Estado habilitado a fazê‑lo. […]
[…]
2. Se, decorrido um prazo razoável, não tiver sido possível adoptar uma medida a que se refere o n.° 1 com a participação do Reino Unido ou da Irlanda, o Conselho pode adoptar essa medida nos termos do artigo 1.°, sem a participação do Reino Unido ou da Irlanda. Nesse caso, é aplicável o disposto no artigo 2.°»
6. O artigo 4.° do protocolo relativo ao título IV confere ao Reino Unido e à Irlanda o direito de aderir, a todo o tempo, às medidas existentes no quadro do título IV. Nesse caso, o procedimento previsto no artigo 11.°, n.° 3, CE é aplicável mutatis mutandis .
7. Nos termos do artigo 7.° do protocolo relativo ao título IV, «[o] disposto nos artigos 3.° e 4.° não prejudica o Protocolo que integra o acervo de Schengen no quadro da União Europeia».
Protocolo que integra o acervo de Schengen no âmbito da União Europeia
8. Nos termos do artigo 1.° do Protocolo que integra o acervo de Schengen no âmbito da União Europeia, anexo ao Tratado UE e ao Tratado CE pelo Tratado de Amesterdão (a seguir «protocolo de Schengen»), treze Estados‑Membros da União Europeia ficam autorizados a instaurar entre si uma cooperação reforçada no domínio abrangido pelo acervo de Schengen, como definido no anexo do referido protocolo.
9. Fazem parte do acervo de Schengen, assim definido, nomeadamente, o Acordo entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa, relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns, assinado em Schengen (Luxemburgo) em 14 de Junho de 1985 (JO 2000, L 239, p. 13, a seguir «acordo de Schengen»), e a Convenção de aplicação do Acordo de Schengen (JO 2000, L 239, p. 19, a seguir «CAAS»), assinada em 19 de Junho de 1990, também em Schengen. Estes dois actos constituem os «acordos de Schengen».
10. Nos termos do artigo 4.° do referido protocolo:
«A Irlanda e o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, que não se encontram vinculados pelo acervo de Schengen, podem, a todo o tempo, requerer a possibilidade de aplicar, no todo ou em parte, as disposições desse acervo.
O Conselho deliberará sobre esse pedido por unanimidade dos membros a que se refere o artigo 1.° e do representante do governo do Estado interessado.»
11. O artigo 5.° do protocolo de Schengen dispõe:
«1. As propostas e iniciativas baseadas no acervo de Schengen regem‑se pelas disposições pertinentes dos Tratados.
Neste contexto, caso a Irlanda ou o Reino Unido, ou ambos, não tenham, num prazo razoável, notificado por escrito o Presidente do Conselho de que desejam participar, considerar‑se‑á que a autorização prevista no artigo 11.° do Tratado que institui a Comunidade Europeia e no artigo 40.° do Tratado da União Europeia foi concedida aos Estados‑Membros a que se refere o artigo 1.° e à Irlanda ou ao Reino Unido, se qualquer destes Estados desejar tomar parte nas áreas de cooperação em causa.
2. As disposições pertinentes dos Tratados a que se refere o primeiro parágrafo do n.° 1 serão aplicáveis ainda que o Conselho não tenha adoptado as medidas a que se refere o n.° 1, segundo parágrafo, do artigo 2.°»
12. O artigo 8.° do protocolo de Schengen determina:
«Para efeitos das negociações de adesão de novos Estados‑Membros à União Europeia, o acervo de Schengen e as demais medidas adoptadas pelas instituições no seu âmbito de aplicação entendem‑se como sendo um acervo que deve ser aceite na totalidade por todos os Estados candidatos à adesão.»
Declarações relativas ao protocolo de Schengen
13. Na Declaração n.° 45 relativa ao artigo 4.° do Protocolo que integra o acervo de Schengen no âmbito da União Europeia (a seguir «declaração n.° 45»), as Altas Partes Contratantes convidam o Conselho a obter o parecer da Comissão das Comunidades Europeias, antes de decidir sobre um pedido formulado ao abrigo do referido artigo. Além disso, estas últimas «comprometem‑se igualmente a envidar todos os esforços no sentido de permitirem à Irlanda ou ao Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, se assim o desejarem, que façam uso das disposições do artigo 4.° do citado Protocolo por forma a que o Conselho possa deliberar, nos termos do mesmo artigo 4.°, na data de entrada em vigor daquele Protocolo, ou posteriormente, a todo o tempo».
14. Nos termos da Declaração n.° 46 relativa ao artigo 5.° do Protocolo que integra o acervo de Schengen no âmbito da União Europeia (a seguir «declaração n.° 46»), as Altas Partes Contratantes «comprometem‑se a envidar todos os esforços no sentido de tornar possível a acção de todos os Estados‑Membros nos domínios do acervo de Schengen, em especial quando a Irlanda e o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte tenham aceite, no todo ou em parte, as disposições desse acervo, nos termos do artigo 4.° do [protocolo de Schengen]».
Decisão 2000/365/CE
15. Nos termos do artigo 4.°, segundo parágrafo, do protocolo de Schengen, o Conselho adoptou, em 29 de Maio de 2000, a Decisão 2000/365/CE sobre o pedido do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte para participar em algumas das disposições do acervo de Schengen (JO L 131, p. 43).
16. O artigo 1.° da referida decisão enumera as disposições do acervo de Schengen em que o Reino Unido participa.
17. O artigo 8.°, n.° 2, da mesma decisão dispõe:
«A partir da data de aprovação da presente decisão, considera‑se irrevogavelmente que o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte notificou o Presidente do Conselho, nos termos do artigo 5.° do [p]rotocolo de Schengen, do seu desejo de participar em todas as propostas e iniciativas baseadas no acervo de Schengen, referidas no artigo 1.° Essa participação abrangerá os territórios a que se referem respectivamente os n. os 1 e 2 do artigo 5.°, na medida em que as propostas e iniciativas sejam baseadas nas disposições do acervo de Schengen vinculativas para esses territórios.»
Regulamento n.° 2007/2004
18. Como resulta dos seus considerandos, o Regulamento n.° 2007/2004 foi adoptado com base nos artigos 62.°, ponto 2, alínea a), CE e 66.° CE.
19. Os quatro primeiros considerandos do referido regulamento estão redigidos da seguinte forma:
«(1) A política comunitária relativa às fronteiras externas da União Europeia visa instituir uma gestão integrada que garanta um nível elevado e uniforme de controlo e vigilância, constituindo o corolário indispensável da livre circulação de pessoas na União Europeia e um elemento fundamental do espaço de liberdade, segurança e justiça. Para este efeito, prevê‑se a instituição de regras comuns relativas a normas e procedimentos de controlo nas fronteiras externas.
(2) A aplicação eficaz de normas comuns implica uma maior coordenação da cooperação operacional entre Estados‑Membros.
(3) Tendo em conta a experiência da instância comum de técnicos das fronteiras externas, que funciona no âmbito do Conselho, deverá ser criado um organismo especializado composto por peritos, encarregue de melhorar a coordenação da cooperação operacional entre Estados‑Membros em matéria de gestão das fronteiras externas, sob a forma de uma Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos Estados‑Membros da União Europeia (adiante designada ‘Agência’).
(4) O controlo e a vigilância das fronteiras externas é da responsabilidade dos Estados‑Membros. Cabe à Agência facilitar a aplicação de medidas comunitárias existentes ou futuras relativas à gestão das fronteiras externas, assegurando a coordenação das acções dos Estados‑Membros destinadas a aplicar essas medidas.»
20. Resulta dos considerandos 23 a 26 do Regulamento n.° 2007/2004 que este regulamento é suposto constituir um desenvolvimento das disposições do acervo de Schengen, tendo por consequência que:
– as delegações da República da Islândia e do Reino da Noruega devem participar enquanto membros no conselho de administração da Agência, dispondo, no entanto, de um direito de voto limitado;
– o Reino da Dinamarca, que não participa na aprovação do referido regulamento e não fica a ele vinculado nem sujeito à sua aplicação, dispõe de um prazo de seis meses, a contar da data da sua aprovação, para decidir se procede ou não à respectiva transposição para o seu direito interno;
– o Reino Unido e a Irlanda não participam na aprovação do referido regulamento e não ficam a ele vinculados nem sujeitos à sua aplicação.
21. O considerando 25 do Regulamento n.° 2007/2004, relativo ao Reino Unido, tem a seguinte redacção:
«O presente regulamento constitui um desenvolvimento das disposições do acervo de Schengen nas quais o Reino Unido não participa, de acordo com a Decisão 2000/365[…]. O Reino Unido não participa na aprovação do presente regulamento e não é, pois, por ele vinculado nem sujeito à sua aplicação.»
22. Nos termos do artigo 1.° do Regulamento n.° 2007/2004:
«1. É criada uma Agência […], tendo em vista uma gestão integrada das fronteiras externas dos Estados‑Membros da União Europeia.
2. Embora tendo em conta que a responsabilidade pelo controlo e vigilância das fronteiras externas incumbe aos Estados‑Membros, a Agência facilitará e tornará mais eficaz a aplicação das disposições comunitárias actuais e futuras em matéria de gestão das fronteiras externas, assegurando a coordenação das acções dos Estados‑Membros na aplicação dessas disposições e contribuindo, assim, para a eficácia, a qualidade e a uniformização do controlo de pessoas e da vigilância das fronteiras externas da União Europeia.
3. A Agência colocará à disposição da Comissão e dos Estados‑Membros a assistência técnica e os conhecimentos específicos necessários em matéria de gestão das fronteiras externas e promoverá a solidariedade entre Estados‑Membros.
4. Para fins do presente regulamento, as referências às fronteiras externas dos Estados‑Membros devem ser entendidas como as fronteiras terrestres e marítimas destes, bem como os seus aeroportos e portos marítimos a que as disposições do direito comunitário sobre a passagem das fronteiras externas por pessoas são aplicáveis.»
23. O artigo 2.° do Regulamento n.° 2007/2004 precisa as funções principais da Agência, que são, nomeadamente, coordenar a cooperação operacional entre os Estados‑Membros no âmbito da gestão das fronteiras externas, apoiar os Estados‑Membros na formação dos guardas de fronteiras nacionais, e inclusive na definição de normas de formação comuns, acompanhar a evolução da pesquisa em matéria de controlo e vigilância das fronteiras externas, apoiar os Estados‑Membros confrontados com circunstâncias que exijam uma assistência operacional e técnica reforçada nas fronteiras externas e facultar aos Estados‑Membros o apoio necessário no âmbito da organização de operações conjuntas de regresso.
24. Nos termos do n.° 2 do mesmo artigo 2.°, sem prejuízo das competências da Agência, os Estados‑Membros podem prosseguir a cooperação a nível operacional com outros Estados‑Membros e/ou com países terceiros nas fronteiras externas, sempre que essa cooperação complemente as actividades da Agência. Os Estados‑Membros abster‑se‑ão de qualquer actividade que possa comprometer o funcionamento ou a realização dos objectivos da Agência e informarão a Agência sobre as questões operacionais nas fronteiras externas, que não se enquadrem no âmbito da Agência.
25. De acordo com o artigo 3.° do Regulamento n.° 2007/2004, a Agência deve, além disso, avaliar, aprovar e coordenar propostas de operações conjuntas e de projectos‑piloto apresentadas pelos Estados‑Membros e pode, por sua própria iniciativa, lançar tais operações em cooperação com os Estados‑Membros. Pode igualmente decidir co‑financiar operações conjuntas e projectos‑piloto.
26. Nos termos do artigo 5.° do mesmo regulamento, a Agência definirá e desenvolverá um tronco comum de formação dos guardas de fronteiras e assegurará acções de formação de nível europeu para os instrutores dos guardas de fronteiras dos Estados‑Membros. A Agência proporcionará igualmente aos agentes dos serviços competentes dos Estados‑Membros estágios e seminários suplementares sobre matérias relacionadas com o controlo e a vigilância das fronteiras externas e o regresso dos nacionais de países terceiros.
27. Segundo o artigo 7.° do Regulamento n.° 2007/2004, a Agência estabelecerá e gerirá, a nível central, um inventário do equipamento técnico de controlo e de vigilância das fronteiras externas dos Estados‑Membros, que estes estejam dispostos a colocar, a título voluntário e temporário, à disposição de outros Estados‑Membros, após a análise das necessidades e dos riscos, efectuada pela Agência.
28. Nos termos do artigo 12.° do referido regulamento:
«1. A Agência facilitará a cooperação operacional dos Estados‑Membros com a Irlanda e com o Reino Unido em questões da sua competência e na medida do necessário para o desempenho das suas funções enumeradas no n.° 1 do artigo 2.°
2. O apoio a ser prestado pela Agência nos termos da alínea f) do n.° 1 do artigo 2.° abrangerá a organização de operações conjuntas de regresso dos Estados‑Membros nas quais também participem a Irlanda e/ou o Reino Unido.
3. A aplicação do presente regulamento às fronteiras de Gibraltar ficará suspensa até à data em que se chegar a acordo sobre o âmbito de aplicação das medidas relativas à passagem das pessoas pelas fronteiras externas dos Estados‑Membros.»
29. O artigo 21.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2007/2004 dispõe:
«Participarão na Agência os países associados à execução, à aplicação e ao desenvolvimento do acervo de Schengen. Cada um deles terá um representante e um suplente no conselho de administração. Ao abrigo das cláusulas pertinentes dos respectivos acordos de associação, serão tomadas disposições para, nomeadamente, especificar a natureza e o alcance da participação destes países nos trabalhos da Agência, bem como para definir com rigor as normas aplicáveis a essa participação, incluindo em matéria de contribuições financeiras e de pessoal.»
Factos na origem do recurso
30. Em 11 de Novembro de 2003, a Comissão apresentou ao Conselho uma proposta de regulamento relativo à criação da Agência.
31. Em 11 de Fevereiro de 2004, o Reino Unido informou o Conselho da sua intenção de participar na adopção do Regulamento n.° 2007/2004. Reportava‑se, a este respeito, ao procedimento de notificação previsto no artigo 5.°, n.° 1, segundo parágrafo, do protocolo de Schengen e ao que consta do protocolo relativo ao título IV.
32. Em 26 de Outubro de 2004, o Conselho adoptou o Regulamento n.° 2007/2004. Apesar da notificação de 11 de Fevereiro de 2004, não foi admitida a participação do Reino Unido na adopção deste regulamento, por este constituir um desenvolvimento das disposições do acervo de Schengen em que o Reino Unido não participa, nos termos da Decisão 2000/365.
33. Considerando que a recusa do Conselho de o autorizar a participar na adopção do Regulamento n.° 2007/2004 constitui uma violação do artigo 5.° do protocolo de Schengen, o Reino Unido interpôs o presente recurso.
Pedidos das partes
34. O Reino Unido pede ao Tribunal de Justiça que:
– anule o Regulamento n.° 2007/2004;
– decida, com base no artigo 231.° CE, que, na sequência da anulação do Regulamento n.° 2007/2004, e até à aprovação de nova legislação nesta matéria, as disposições deste regulamento devem continuar em vigor, excepto na medida em que tenham por consequência excluir o Reino Unido de participar na sua aplicação;
– condene o Conselho no pagamento das despesas.
35. O Conselho pede que seja negado provimento ao recurso e que o Reino Unido seja condenado nas despesas.
36. Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 17 de Agosto de 2005, foram admitidas as intervenções da Irlanda, da República da Polónia e da República da Eslováquia, em apoio dos pedidos do Reino Unido, e do Reino de Espanha e da Comissão das Comunidades Europeias, em apoio dos pedidos do Conselho.
Quanto ao recurso
Argumentos das partes
37. A título principal, o Reino Unido afirma que, ao excluí‑lo do procedimento de adopção do Regulamento n.° 2007/2004, o Conselho se baseou numa interpretação errada do protocolo de Schengen e violou o seu artigo 5.°
38. Com efeito, não se pode considerar que o sistema instituído pelo artigo 5.° do protocolo de Schengen esteja subordinado ao previsto no artigo 4.° do mesmo protocolo. Os artigos 4.° e 5.° deste protocolo são independentes um do outro, pelo que o Reino Unido, para poder participar nas medidas adoptadas com base no artigo 5.°, não tinha de ser admitido previamente, nos termos do referido artigo 4.°, a tomar parte no correspondente acervo de Schengen.
39. Em apoio da sua posição, o Reino Unido afirma, nomeadamente, que a interpretação dos artigos 4.° e 5.° do protocolo de Schengen preconizada pelo Conselho é contrariada pela sistemática e pela redacção dessas duas disposições, viola a própria natureza do mecanismo instituído por este artigo 5.° e não é compatível com a declaração n.° 46.
40. Além disso, segundo o mesmo Estado‑Membro, esta interpretação priva o artigo 5.° do protocolo de Schengen do seu efeito útil, que consiste, designadamente, em garantir uma participação máxima do Reino Unido e da Irlanda nas medidas baseadas no acervo de Schengen, não sendo necessária para salvaguardar o efeito útil do artigo 7.° do protocolo relativo ao título IV nem para preservar a integridade do acervo de Schengen. Seja como for, tal interpretação tem efeitos muito desproporcionados relativamente ao objectivo prosseguido e, uma vez que o Conselho tem, como resulta da sua prática actual, uma concepção «ampla e incerta» do que se deve entender por «propostas e iniciativas baseadas no acervo de Schengen», tem por consequência que o mecanismo previsto no referido artigo 5.° pode funcionar de modo incompatível com o princípio da segurança jurídica e com os princípios fundamentais que regulam as cooperações reforçadas.
41. A título subsidiário, o Reino Unido alega que se a interpretação dos artigos 4.° e 5.° do protocolo de Schengen preconizada pelo Conselho fosse correcta, a expressão «propostas e iniciativas baseadas no acervo de Schengen», constante do artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, desse protocolo, deveria considerar‑se destinada unicamente às medidas que estão intrinsecamente ligadas ao acervo de Schengen (medidas «integralmente Schengen»), como as medidas que alteram as disposições deste acervo e a que o Reino Unido não poderia aderir sem previamente se ter vinculado às disposições que deram lugar à alteração. Em contrapartida, não se incluiriam no âmbito de aplicação desta disposição as medidas simplesmente «relacionadas com Schengen», a saber, aquelas que, ainda que concebidas para desenvolver ou completar certos objectivos do acervo de Schengen, não estão tão indissociavelmente ligadas a este acervo que a sua integridade seria posta em perigo se um Estado‑Membro que não participou no referido acervo pudesse, todavia, tomar parte na adopção de tais medidas. Pelo que, na adopção de medidas desta última categoria, a posição do Reino Unido não seria regulada pelas disposições do referido protocolo, mas, consoante o caso, pelas do protocolo relativo ao título IV ou pelas disposições relevantes do «terceiro pilar». Ora, uma vez que o Regulamento n.° 2007/2004 devia ser considerado incluído nesta mesma categoria de medidas, o Reino Unido não deveria ter sido afastado da adopção desse regulamento.
42. O Conselho defende, em primeiro lugar, que o objectivo do artigo 5.° do protocolo de Schengen não é, contrariamente ao que afirma o Reino Unido, reconhecer um direito a este último, mas sim garantir aos Estados‑Membros que participam na totalidade do acervo de Schengen que as suas acções não serão postas em causa devido à reticência dos outros Estados‑Membros em tomarem parte nelas. A redacção da referida disposição confirma, aliás, esta interpretação na medida em que, ao contrário da redacção dos artigos 4.° do mesmo protocolo e 3.° do protocolo relativo ao título IV, não reconhece expressamente tal direito.
43. Segundo o Conselho, a interpretação do artigo 5.°, n.° 1, do protocolo de Schengen preconizada pelo Reino Unido é susceptível de esvaziar do seu efeito útil o procedimento de aprovação previsto no artigo 4.° do mesmo protocolo, uma vez que, no caso de ser recusado a um Estado‑Membro, ao abrigo deste artigo, o direito de participar na adopção de uma determinada medida, este Estado pode, não obstante, tomar parte em toda e qualquer medida que desenvolva a área em questão, recorrendo ao procedimento previsto no referido artigo 5.° A integridade do acervo de Schengen deixaria, portanto, de estar assegurada, e o artigo 7.° do protocolo relativo ao título IV, que prevê que o disposto nos artigos 3.° e 4.° do mesmo protocolo não prejudica as disposições do protocolo de Schengen, seria também privado de efeito útil.
44. Em segundo lugar, o Conselho afirma que a distinção operada pelo Reino Unido entre as medidas «integralmente Schengen» e as medidas ditas simplesmente «relacionadas com Schengen» não encontra apoio nem no direito primário nem no direito derivado. A este propósito, indica que a definição proposta pelo Reino Unido no que respeita às medidas «relacionadas com Schengen» se baseia numa compreensão errada daquilo que pode constituir uma ameaça para a integridade do acervo de Schengen e que a distinção em causa cria uma insegurança jurídica inútil na medida em que dá origem a uma divergência entre o que se deve entender por «medida que desenvolve o acervo de Schengen» quando se trata de adoptar uma medida aplicável à República da Islândia e ao Reino da Noruega, por um lado, ou ao Reino Unido e à Irlanda, por outro.
45. Em terceiro lugar, o Conselho salienta que a sua posição é perfeitamente compatível com o princípio da proporcionalidade e com as regras aplicáveis em matéria de cooperação reforçada. Efectivamente, por um lado, os autores do Tratado não estão vinculados pelo princípio da proporcionalidade. Por outro lado, as disposições dos Tratados UE e CE que regulam as cooperações reforçadas não prejudicam as do protocolo de Schengen.
46. A Irlanda considera que a interpretação dos artigos 4.° e 5.° do protocolo de Schengen preconizada pelo Reino Unido está de acordo com a redacção desses artigos e corresponde à prática actual do Conselho no atinente às medidas relativas ao acervo de Schengen, em que o Reino Unido e a Irlanda foram admitidos a participar. Esta interpretação é, aliás, corroborada pelas diversas declarações relativas ao protocolo de Schengen, anexas à Acta Final do Tratado de Amesterdão. Além disso, o Conselho não consegue demonstrar o risco concreto de prejuízo existente para o acervo de Schengen, caso o Reino Unido participasse na adopção do Regulamento n.° 2007/2004.
47. Segundo a República da Polónia, tendo em conta a imprecisão da noção de «acervo de Schengen», não se pode determinar com clareza se o Regulamento n.° 2007/2004 faz parte do referido acervo ou se constitui simplesmente um seu desenvolvimento. No entanto, considera que esse regulamento constitui sobretudo uma medida de desenvolvimento desse acervo. Ora, o direito de o Reino Unido participar nas medidas de desenvolvimento do acervo de Schengen resulta directamente do artigo 5.° do protocolo de Schengen e não está sujeito à aplicação prévia do artigo 4.° do mesmo protocolo. Além disso, não há nenhum obstáculo que impeça a admissão da participação do Reino Unido na adopção do referido regulamento, não constituindo essa participação uma ameaça para a integridade nem para o funcionamento do acervo de Schengen, nem tão‑pouco para a sua aplicação.
48. Segundo a República da Eslováquia, o direito de o Reino Unido participar na adopção do Regulamento n.° 2252/2004 depende da existência ou não de uma ameaça para a integridade e a coerência do acervo de Schengen já aplicado. Incumbe ao Conselho, uma vez que recusou esse direito ao Reino Unido, apresentar a prova de que a participação deste Estado‑Membro na aplicação desse regulamento constitui uma tal ameaça. Ora, no caso em apreço, esta ameaça não existe.
49. O Reino de Espanha considera que o recurso do Reino Unido não tem fundamento. Com efeito, por um lado, o pedido principal do Reino Unido assenta na atribuição a este último de um direito hipotético conferido por um artigo do protocolo de Schengen que este não lhe reconhece. A interpretação preconizada pelo Reino Unido implica um risco certo para as medidas já adoptadas graças à cooperação reforçada instituída por esse protocolo, uma vez que põe em perigo a integridade e a coerência do acervo de Schengen. Por outro lado, o pedido subsidiário do Reino Unido ignora o facto de que incumbe ao Conselho determinar quais as medidas que devem ser consideradas medidas baseadas no acervo de Schengen e de que não cabe a um Estado‑Membro que não seja parte nos acordos de Schengen proceder a essa determinação.
50. A Comissão salienta que a característica principal da cooperação reforçada, em geral, e do acervo de Schengen, em particular, é a sua integridade. A preservação e a protecção dessa integridade e a coerência do acervo de Schengen são, por conseguinte, preocupações essenciais. O protocolo de Schengen prevê, na verdade, uma participação parcial de um Estado‑Membro que não seja parte nos acordos de Schengen, mas não chega ao ponto de fazer uma escolha «à la carte» dos Estados‑Membros em causa, gerando um patchwork de participações e obrigações.
51. Segundo a Comissão, a interpretação dos artigos 4.° e 5.° do protocolo de Schengen preconizada pelo Reino Unido é contrária à sistemática e à lógica desse protocolo e é prejudicial para a coerência e a integridade do acervo de Schengen.
52. Considera, por outro lado, que a expressão «baseadas no acervo de Schengen», que consta do artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do protocolo de Schengen, não se destina a estabelecer uma noção «ampla e incerta» de medidas que podem ser adoptadas pelos Estados‑Membros que participam numa acção de cooperação reforçada, quando a decisão que consiste em qualificar uma proposta de «medida baseada no acervo de Schengen» não se distingue praticamente da destinada a determinar a base jurídica adequada para a adopção de um acto jurídico comunitário.
53. Por último, a Comissão indica que, tendo em conta a natureza especial da Agência, a criação desta é uma medida «integralmente Schengen», na acepção em que o Reino Unido entende esta expressão, e que esta criação está intrinsecamente ligada ao acervo de Schengen. Por outro lado, a Agência está ligada a uma área do referido acervo, de que o Reino Unido decidiu não fazer parte. Logo, é legítimo que não se admita a participação deste último na adopção do Regulamento n.° 2007/2004.
Apreciação do Tribunal de Justiça
54. Para decidir sobre a argumentação invocada a título principal pelo Reino Unido, importa analisar se o artigo 5.°, n.° 1, segundo parágrafo, do protocolo de Schengen deve ser interpretado no sentido de que só é aplicável às propostas e iniciativas baseadas numa área do acervo de Schengen em que foi admitida a participação do Reino Unido e/ou da Irlanda nos termos do artigo 4.° do mesmo protocolo, ou se, pelo contrário, como defende o primeiro Estado‑Membro, estas duas disposições devem ser consideradas independentes uma da outra.
55. Para tal, importa ter em conta não apenas a redacção das disposições em causa mas também a sua sistemática, o contexto em que se inserem, a finalidade que prosseguem e o seu efeito útil.
56. No caso em apreço, há que observar que o artigo 1.° do protocolo de Schengen autorizou treze Estados‑Membros a instaurar entre si uma cooperação reforçada nos domínios abrangidos pelo acervo de Schengen, tal como os vincula. Por outro lado, resulta do artigo 2.° desse protocolo que todas as medidas adoptadas no âmbito da aplicação desta cooperação reforçada devem ser consideradas parte integrante desse acervo, que deve, aliás, nos termos do artigo 8.° do mesmo protocolo, ser aceite na íntegra pelos Estados candidatos à adesão.
57. Na medida em que o Reino Unido e a Irlanda foram os únicos Estados‑Membros que não participaram nos acordos de Schengen que constituem o fundamento da referida cooperação reforçada, estes dois Estados encontravam‑se numa situação particular que o protocolo de Schengen teve duplamente em conta.
58. Por um lado, como prevê o artigo 4.° do protocolo de Schengen, reserva‑se a estes dois Estados‑Membros a faculdade de pedir, a todo o tempo, para participar apenas numa parte das disposições do acervo em vigor na data do pedido de participação. Por outro lado, esse mesmo protocolo reserva aos referidos Estados‑Membros, nos termos do artigo 5.°, n.° 1, segundo parágrafo, a faculdade de não tomar parte nas propostas e nas iniciativas baseadas no referido acervo.
59. Embora estas duas disposições incidam assim sobre dois aspectos diferentes do acervo de Schengen, não se pode daí inferir validamente que devem ser lidas de modo independente uma da outra.
60. Com efeito, como resulta da utilização da expressão «propostas e iniciativas baseadas no acervo de Schengen» no artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do protocolo de Schengen, as medidas referidas por esta disposição assentam no acervo de Schengen, na acepção do artigo 4.° do mesmo protocolo, do qual constituem uma simples aplicação ou um mero desenvolvimento posterior.
61. Ora, logicamente, tais medidas devem estar de acordo com as disposições que aplicam ou de que constituem um desenvolvimento, pelo que pressupõem a aceitação tanto dessas disposições como dos princípios que constituem o seu fundamento.
62. Daí resulta que a participação de um Estado‑Membro na adopção de uma medida de aplicação do artigo 5.°, n.° 1, do protocolo de Schengen só é concebível na medida em que este Estado se tenha vinculado à área do acervo de Schengen em que se insere a medida a adoptar ou de que constitui um desenvolvimento.
63. Nestas condições, uma vez que o artigo 4.° do protocolo de Schengen prevê a possibilidade de o Reino Unido e a Irlanda aderirem ao acervo de Schengen, não se pode admitir a participação destes Estados‑Membros na adopção de uma medida ao abrigo do artigo 5.°, n.° 1, do mesmo protocolo, sem terem sido previamente autorizados pelo Conselho a vincular‑se à área do acervo em que a referida medida encontra o seu fundamento.
64. De resto, esta interpretação está de acordo com a finalidade prosseguida tanto pelo artigo 4.° do protocolo de Schengen como pelo artigo 5.° do mesmo e é susceptível de assegurar plenamente o efeito útil de cada uma dessas duas disposições.
65. Efectivamente, esta interpretação em nada prejudica a possibilidade, dada ao Reino Unido e à Irlanda pelo artigo 5.°, n.° 1, segundo parágrafo, do protocolo de Schengen, de escolherem, apesar de se ter admitido a vinculação destes Estados‑Membros à totalidade ou a parte do acervo de Schengen, não participar na adopção de medidas de aplicação ou de desenvolvimento das partes do acervo às quais foi admitida a sua adesão.
66. Além disso, tal interpretação permite ter em conta tanto a redacção como o objectivo do artigo 4.° do protocolo de Schengen, uma vez que a flexibilidade assim oferecida pelo artigo 5.° do mesmo protocolo aos dois Estados‑Membros em causa, quanto à sua livre escolha de aderirem ou não às medidas de aplicação e de desenvolvimento do acervo de Schengen, é susceptível de afastar as reticências que estes Estados, na falta de tal escolha, poderiam ter em aceitar disposições do acervo de Schengen e, por isso, de os encorajar a utilizar tanto quanto possível a faculdade que lhes é dada pelo artigo 4.°
67. Em contrapartida, a interpretação defendida pelo Reino Unido teria por consequência esvaziar de todo o efeito útil o artigo 4.° do protocolo de Schengen, na medida em que o Reino Unido e a Irlanda poderiam participar em todas as propostas e iniciativas baseadas no acervo de Schengen, ao abrigo do artigo 5.°, n.° 1, do referido protocolo, apesar de estes Estados‑Membros não estarem vinculados às disposições relevantes desse acervo ou não terem sido admitidos a participar na aplicação do artigo 4.°, segundo parágrafo, do mesmo protocolo. Ora, como resulta da declaração n.° 45, o referido artigo 4.° tem uma importância essencial no quadro do sistema instituído pelo protocolo de Schengen, na medida em que pretende garantir uma participação máxima de todos os Estados‑Membros no acervo de Schengen.
68. Perante estas considerações, importa concluir que a interpretação do artigo 5.°, n.° 1, segundo parágrafo, do protocolo de Schengen defendida pelo Reino Unido não pode ser acolhida, devendo esta disposição ser entendida no sentido de que só é aplicável às propostas e às iniciativas baseadas numa área do acervo de Schengen em que foi admitida a participação do Reino Unido e/ou da Irlanda, nos termos do artigo 4.° do mesmo protocolo.
69. Esta interpretação é, aliás, corroborada pelo artigo 8.°, n.° 2, da Decisão 2000/365, da qual também resulta que a participação nas propostas e nas iniciativas baseadas no acervo de Schengen só é admissível se as disposições deste a que essas propostas ou iniciativas dizem respeito se aplicarem no Estado‑Membro que deseja participar, o que implica que esse Estado‑Membro esteja, previamente, vinculado ao referido acervo.
70. No caso em apreço, é pacífico que o Reino Unido não estava vinculado à área do acervo de Schengen em que se inscreve o Regulamento n.° 2007/2004, a saber, a relativa à passagem das fronteiras externas.
71. Nestas condições, há que observar que, ao recusar ao Reino Unido o direito de participar na adopção do Regulamento n.° 2007/2004 por não ter sido previamente admitida a sua participação na área da cooperação em que se inscreve esse regulamento, o Conselho não procedeu a uma interpretação e a uma aplicação erradas do artigo 5.°, n.° 1, segundo parágrafo, do protocolo de Schengen.
72. De onde resulta que a argumentação apresentada a título principal pelo Reino Unido, em apoio do presente recurso de anulação, deve ser julgada improcedente.
73. Quanto à argumentação apresentada a título subsidiário pelo Reino Unido, importa realçar, antes de mais, que a distinção feita por este Estado‑Membro entre as medidas que qualifica de «integralmente Schengen» e as que considera como simplesmente «relacionadas com Schengen» não encontra fundamento nos Tratados UE e CE nem no direito comunitário derivado.
74. Há, em seguida, que referir que, ainda que conteste a qualificação dada pelo Conselho, o próprio Reino Unido admite que o Regulamento n.° 2007/2004 apresenta uma ligação com disposições do acervo de Schengen, já que considera que se trata, não obstante, de uma medida «relacionada com Schengen».
75. Apesar destas considerações e da circunstância de, no caso em apreço, a qualificação alegadamente errada, atribuída ao Conselho, não estar directamente relacionada com a escolha da base jurídica para a adopção do Regulamento n.° 2007/2004, a saber, os artigos 62.°, ponto 2, alínea a), CE e 66.° CE, há que observar que, à semelhança da escolha da base jurídica de um acto comunitário, a qualificação, pelo Conselho, do Regulamento n.° 2007/2004 como medida que desenvolve disposições do acervo de Schengen teve uma influência directa na determinação das disposições que regulam o procedimento de adopção deste regulamento e, logo, também na possibilidade de o Reino Unido poder participar nesse procedimento.
76. Com efeito, na medida em que o exercício, pelo Reino Unido, da faculdade de participar na adopção de uma proposta apresentada nos termos das disposições do título IV não está sujeito, de acordo com o artigo 3.°, n.° 1, do protocolo relativo ao título IV, a nenhuma condição, a não ser a do prazo de notificação previsto nesta última disposição, a qualificação do Regulamento n.° 2007/2004 como medida que desenvolve disposições do acervo de Schengen teve uma influência directa nos direitos reconhecidos ao referido Estado‑Membro.
77. Tendo isto em conta e por analogia com o que vigora em matéria de escolha da base jurídica de um acto comunitário, há que considerar que, numa situação como a que está em causa no caso em apreço, a qualificação de um acto comunitário como proposta ou iniciativa baseada no acervo de Schengen, na acepção do artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do protocolo de Schengen, deve assentar em elementos objectivos, susceptíveis de fiscalização jurisdicional, entre os quais figuram, nomeadamente, a finalidade e o conteúdo do acto (v. acórdãos de 11 de Junho de 1991, Comissão/Conselho, dito «dióxido de titânio», C‑300/89, Colect., p. I‑2867, n.° 10; de 13 de Setembro de 2005, Comissão/Conselho, C‑176/03, Colect., p. I‑7879, n.° 45; e de 23 de Outubro de 2007, Comissão/Conselho, C‑440/05, ainda não publicado na Colectânea, n.° 61).
78. É à luz destas considerações que importa analisar se, como defende o Reino Unido, o Conselho não tinha razão ao qualificar o Regulamento n.° 2007/2004 como medida que desenvolve disposições do acervo de Schengen.
79. Quanto à finalidade do Regulamento n.° 2007/2004, resulta dos seus três primeiros considerandos e do artigo 1.°, n. os 1 e 2, que ele tem por objectivo melhorar a gestão integrada das fronteiras externas e tornar mais fácil e mais eficaz a aplicação das regras comuns relativas às normas e aos procedimentos de controlo nessas fronteiras.
80. No que diz respeito ao conteúdo do Regulamento n.° 2007/2004, importa referir que a Agência por este criada tem por função, como resulta do terceiro considerando e do artigo 2.° desse regulamento, nomeadamente, coordenar a cooperação operacional entre os Estados‑Membros no âmbito da gestão das fronteiras externas, apoiar os Estados‑Membros na formação dos guardas de fronteiras nacionais e prestar aos referidos Estados, nas circunstâncias que o exijam, uma assistência técnica e operacional reforçada nas fronteiras externas.
81. A este propósito, não se pode deixar de observar, por um lado, que as regras comuns a que o Regulamento n.° 2007/2004 faz referência e que devem ser aplicadas no âmbito da gestão integrada das fronteiras externas foram fixadas no Manual Comum adoptado pelo comité executivo instituído pela CAAS (JO 2002, C 313, p. 97).
82. Ora, como resulta do considerando 1 do Regulamento (CE) n.° 790/2001 do Conselho, de 24 de Abril de 2001, que reserva ao Conselho a competência de execução em relação a determinadas regras de execução e procedimentos práticos de aplicação do controlo e da vigilância das fronteiras (JO L 116, p. 5), o referido manual foi redigido com o intuito de executar as disposições do capítulo II, intitulado «Passagem das fronteiras externas», do título II da CAAS e faz parte do acervo de Schengen, na definição do artigo 1.° do protocolo de Schengen, nos termos do artigo 1.° da Decisão 1999/435/CE do Conselho, de 20 de Maio de 1999, relativa à definição do acervo de Schengen com vista a determinar, nos termos das disposições pertinentes do Tratado que institui a Comunidade Europeia e do Tratado da União Europeia, o fundamento jurídico de cada uma das disposições ou decisões que o constituem (JO L 176, p. 1).
83. Importa lembrar, por outro lado, que resulta tanto do título como do quarto parágrafo do preâmbulo do acordo de Schengen, assim como do seu artigo 17.°, que este acordo tem principalmente por objectivo a supressão dos controlos das pessoas nas fronteiras comuns dos Estados‑Membros e a transferência desses controlos para as fronteiras externas destes últimos. A importância deste objectivo no âmbito dos acordos de Schengen é salientada pelo lugar que ocupam as disposições relativas à passagem das fronteiras externas na CAAS e pela circunstância de, nos termos dos artigos 6.° e 7.° desta, os controlos nas fronteiras externas se deverem efectuar segundo princípios uniformes, devendo os Estados‑Membros praticar uma cooperação estreita e permanente a fim garantir a execução eficaz desses controlos.
84. Daí resulta que os controlos das pessoas nas fronteiras externas dos Estados‑Membros e, portanto, a aplicação eficaz das regras comuns relativas às normas e aos procedimentos desses controlos devem ser considerados elementos do acervo de Schengen.
85. Uma vez que, como resulta dos n. os 79 e 80 do presente acórdão, o Regulamento n.° 2007/2004 tem tanto por objectivo como por conteúdo a melhoria desses controlos, deve considerar‑se que este regulamento constitui uma medida baseada no acervo de Schengen, na acepção do artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do protocolo de Schengen.
86. Nestas condições, foi correctamente que o Conselho qualificou o Regulamento n.° 2007/2004 de medida que desenvolve disposições do acervo de Schengen.
87. Daí resulta que a argumentação invocada a título subsidiário pelo Reino Unido também não pode proceder.
88. Assim, o pedido do Reino Unido, de anulação do Regulamento n.° 2007/2004, não pode proceder e, por conseguinte, o Tribunal de Justiça não tem de se pronunciar sobre o pedido deste Estado‑Membro relativo à manutenção dos efeitos do referido regulamento.
89. Nestas condições, há que negar provimento ao recurso interposto pelo Reino Unido.
Quanto às despesas
90. Por força do disposto no artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o Conselho pedido a condenação do Reino Unido e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas despesas. Em conformidade com o disposto no artigo 69.°, n.° 4, primeiro parágrafo, do mesmo regulamento, os Estados‑Membros e as instituições que intervieram no litígio suportarão as respectivas despesas.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:
1) É negado provimento ao recurso.
2) O Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte é condenado nas despesas.
3) O Reino de Espanha, a Irlanda, a República da Polónia, a República da Eslováquia e a Comissão das Comunidades Europeias suportarão as suas próprias despesas.