Palavras-chave
Sumário

Palavras-chave

1. Concorrência – Procedimento administrativo – Obrigações da Comissão

(Regulamento n.° 17 do Conselho)

2. Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Fundamentos – Apreciação errada dos factos – Inadmissibilidade – Fiscalização pelo Tribunal de Justiça da apreciação dos elementos de prova – Exclusão excepto em caso de desvirtuação

(Artigo 225.° CE; Estatuto do Tribunal de Justiça, artigo 58.°, primeiro parágrafo)

3. Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Fundamentos – Fundamentação insuficiente ou contraditória

4. Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Proibição – Infracções – Prova

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

5. Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Proibição – Infracções – Acordos e práticas concertadas que podem ser tratados como constituindo uma infracção única

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

6. Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância – Competência do Tribunal de Justiça

(Artigo 81.° CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°)

Sumário

1. A observância de um prazo razoável na tramitação dos procedimentos administrativos em matéria de política da concorrência constitui um princípio geral do direito comunitário cujo respeito é assegurado pelos órgãos jurisdicionais comunitários.

Contudo, a verificação da duração excessiva do procedimento, não imputável às empresas em questão, só pode conduzir à anulação, por violação do referido princípio, de uma decisão que declare a existência de uma infracção se essa duração, ao prejudicar os direitos de defesa das empresas, tiver tido influência no resultado do procedimento.

Na sua análise, o órgão jurisdicional comunitário deve tomar em conta o procedimento na sua totalidade, desde o início das investigações da Comissão até à adopção da decisão final.

Importa, com efeito, evitar que os direitos de defesa possam ser irremediavelmente comprometidos em virtude da duração excessiva da fase de instrução que antecede o envio da comunicação das acusações e que esta duração seja susceptível de obstar à produção de provas destinadas a refutar a existência de comportamentos susceptíveis de implicar a responsabilidade das empresas envolvidas. Por esta razão, o exame dos eventuais obstáculos ao exercício dos direitos de defesa resultante da duração excessiva do procedimento administrativo não deve limitar‑se apenas à segunda fase do mesmo, mas deve também incidir sobre a fase anterior à comunicação das acusações e, em especial, determinar se a sua duração foi susceptível de afectar as possibilidades futuras de defesa das empresas em causa.

(cf. n. os  35, 42, 43, 49‑51)

2. Resulta dos artigos 225.° CE e 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça que o Tribunal de Primeira Instância tem competência exclusiva para, por um lado, apurar a matéria de facto, excepto em casos em que a inexactidão material das suas conclusões resulte dos documentos dos autos que lhe foram apresentados e, por outro, para apreciar esses factos. Quando o Tribunal de Primeira Instância tenha apurado ou apreciado os factos, o Tribunal de Justiça é competente, por força do artigo 225.° CE, para exercer uma fiscalização da qualificação jurídica desses factos e das consequências jurídicas daí retiradas pelo Tribunal de Primeira Instância.

O Tribunal de Justiça não tem, pois, competência para apurar os factos nem, em princípio, para examinar as provas que o Tribunal de Primeira Instância tenha considerado determinantes no apuramento de tais factos. Com efeito, tendo estas provas sido obtidas regularmente e tendo sido respeitados os princípios gerais de direito e as regras de processo aplicáveis em matéria de ónus e de produção da prova, compete exclusivamente ao Tribunal de Primeira Instância apreciar o valor a atribuir aos elementos que lhe foram submetidos. Esta apreciação não constitui por isso, excepto no caso de desvirtuamento desses elementos, uma questão de direito sujeita, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça.

(cf. n. os  69, 70)

3. A questão de saber se a fundamentação de um acórdão do Tribunal de Primeira Instância é contraditória ou insuficiente é uma questão de direito que pode, como tal, ser invocada no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância.

A este respeito, o dever de fundamentação não impõe ao Tribunal de Primeira Instância que apresente uma exposição que acompanhe exaustiva e individualmente todos os passos do raciocínio articulado pelas partes no litígio. A fundamentação pode, portanto, ser implícita, na condição de permitir aos interessados conhecerem as razões consideradas determinantes para a decisão e ao Tribunal de Justiça dispor dos elementos suficientes para exercer a sua fiscalização.

(cf. n. os  71, 72)

4. Na maior parte dos casos, a existência de uma prática ou de um acordo anticoncorrencial deve ser inferida de um determinado número de indícios e de coincidências que, considerados no seu todo, podem constituir, na falta de outra explicação coerente, a prova de uma violação das regras da concorrência.

Com efeito, esses indícios e coincidências não apenas permitem revelar a existência de práticas ou acordos anticoncorrenciais, mas também a duração de um comportamento anticoncorrencial continuado ou o período de aplicação de acordos concluídos em violação das regras da concorrência.

O Tribunal de Primeira Instância pode, por isso, sem cometer um erro de direito, basear a sua apreciação da existência e da duração de uma prática ou de um acordo anticoncorrencial numa avaliação global de todas as provas e indícios pertinentes. A questão de saber qual o valor probatório atribuído pelo Tribunal de Primeira Instância a cada elemento destas provas e indícios apresentados pela Comissão constitui, todavia, uma questão de facto que, como tal, escapa ao controlo jurisdicional do Tribunal de Justiça no âmbito deste recurso.

A circunstância de a prova da existência de uma infracção continuada não ter sido produzida relativamente a determinados períodos não obsta a que a infracção seja considerada praticada durante um período global mais extenso do que estes, desde que tal conclusão assente em indícios objectivos e concordantes. No âmbito de uma infracção desse tipo que se estende por vários anos, o facto de as manifestações do acordo ocorrerem em períodos diferentes, podendo ser separados por lapsos de tempo mais ou menos longos, não tem incidência quanto à existência desse acordo, desde que as diferentes acções que fazem parte dessa infracção prossigam uma única finalidade e se inscrevam no âmbito de uma infracção com carácter único e continuado.

(cf. n. os  94‑96, 98, 135)

5. Uma violação do artigo 85.°, n.° 1, CE pode resultar não apenas de um acto isolado, mas igualmente de uma série de actos ou mesmo de um comportamento continuado. Esta interpretação não pode ser contestada com o fundamento de que um ou diversos elementos desta série de actos ou desse comportamento continuado também podem constituir, por si sós e considerados isoladamente, uma violação da referida disposição. Quando as diferentes acções se inscrevem num «plano de conjunto», em razão do seu objecto idêntico que falseia o jogo da concorrência no interior do mercado comum, a Comissão pode imputar a responsabilidade por essas acções em função da participação na infracção considerada no seu todo.

A tomada em consideração dos efeitos concretos dessas acções é, a este respeito, supérflua, uma vez que se verifica que estas, que consistem em acordos ou práticas concertadas, têm por objectivo impedir, restringir ou falsear o jogo da concorrência no interior do mercado comum. Com efeito, decorre da própria redacção do artigo 81.°, n.° 1, CE que, como no caso dos acordos entre empresas e das decisões de associações de empresas, as práticas concertadas são proibidas, independentemente de qualquer efeito, quando têm um objectivo anticoncorrencial. Por outro lado, embora o próprio conceito de prática concertada pressuponha um comportamento no mercado das empresas que nela participam, não implica necessariamente que esse comportamento tenha por efeito concreto restringir, impedir ou falsear a concorrência.

(cf. n. os  110, 125, 136‑139, 160, 161, 179)

6. O Tribunal de Primeira Instância tem competência exclusiva para fiscalizar o modo como a Comissão aprecia num caso particular a gravidade dos comportamentos ilícitos à luz das regras de concorrência do Tratado. No âmbito do recurso de decisões do Tribunal de Primeira Instância, a fiscalização do Tribunal de Justiça tem por objecto, por um lado, apreciar em que medida o Tribunal de Primeira Instância tomou em consideração, de modo juridicamente correcto, todos os factores essenciais para apreciar a gravidade de um determinado comportamento à luz dos artigos 85.° CE e 15.° do Regulamento n.° 17 e, por outro lado, verificar se o Tribunal de Primeira Instância respondeu satisfatoriamente a todos os argumentos invocados em apoio do pedido de anulação da coima ou de redução do montante da mesma.

(cf. n.° 217)