Processo C‑15/04

Koppensteiner GmbH

contra

Bundesimmobiliengesellschaft mbH

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesvergabeamt)

«Contratos de direito público – Directiva 89/665/CEE – Processo de recurso em matéria de adjudicação de contratos de direito público – Decisão de retirada de um anúncio de concurso após abertura das propostas apresentadas – Fiscalização jurisdicional – Alcance – Princípio da efectividade»

Conclusões da advogada‑geral C. Stix‑Hackl apresentadas em 16 de Dezembro de 2004 

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 2 de Junho de 2005 

Sumário do acórdão

Aproximação das legislações – Processos de recurso em matéria de adjudicação de contratos de direito público de fornecimentos e de obras – Directiva 89/665 – Anulação de um convite para apresentação de propostas – Obrigação de os Estados‑Membros preverem um processo de recurso – Inexistência de tal processo no direito nacional – Inadmissibilidade – Efeito directo dos artigos 1.°, n.° 1, e 2.°, n.° 1, alínea b), da directiva – Obrigações dos órgãos jurisdicionais nacionais

[Directiva 89/665 do Conselho, artigos 1.°, n.° 1, e 2.°, n.° 1, alínea b)]

Os artigos 1.°, n.° 1, e 2.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/665, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos, exigem que a decisão da entidade adjudicante de retirar o anúncio de concurso para um contrato de direito público possa ser objecto de recurso e ser anulada, tal sendo o caso, com fundamento em violação do direito comunitário em matéria de contratos de direito público ou das regras nacionais que transpõem esse direito.

Consequentemente, na medida em que, por força do direito nacional, mesmo interpretado em conformidade com as exigências do direito comunitário, não seja possível a um proponente contestar uma decisão de retirada de um anúncio de concurso por ser contrário ao direito comunitário e pedir, por essa razão, a sua anulação, o direito nacional não respeita as exigências dos artigos 1.°, n.° 1, e 2.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/665.

Nestas condições, o órgão jurisdicional competente é obrigado a não aplicar as normas nacionais que o impedem de respeitar a obrigação que decorre das referidas disposições.

Efectivamente, estas são incondicionais e suficientemente precisas para fundamentar um direito de um particular que pode, tal sendo o caso, invocá‑lo contra uma entidade adjudicante.

(cf. n.os 30, 31, 38, 39, disp.)




ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

2 de Junho de 2005 (*)

«Contratos de direito público – Directiva 89/665/CEE – Processo de recurso em matéria de adjudicação de contratos de direito público – Decisão de retirada de um anúncio de concurso após abertura das propostas apresentadas – Fiscalização jurisdicional – Alcance – Princípio da efectividade»

No processo C‑15/04,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Bundesvergabeamt (Áustria), por decisão de 12 de Janeiro de 2004, entrado no Tribunal de Justiça em 19 de Janeiro de 2004, no processo

Koppensteiner GmbH

contra

Bundesimmobiliengesellschaft mbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, R. Silva de Lapuerta, C. Gulmann (relator), P. Kūris e G. Arestis, juízes,

advogada‑geral: C. Stix‑Hackl,

secretário: R. Grass,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–       em representação da Koppensteiner GmbH, por D. Benko e T. Anker, Rechtsanwälte,

–       em representação da Bundesimmobiliengesellschaft mbH, por O. Sturm, Rechtsanwalt,

–       em representação do Governo austríaco, por M. Fruhmann, na qualidade de agente,

–       em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por K. Wiedner, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral apresentadas na audiência de 16 de Dezembro de 2004,

profere o presente

Acórdão

1       O pedido de decisão prejudicial incide sobre a interpretação do artigo 1.° e do n.° 1, alínea b), do artigo 2.° da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos (JO L 395, p. 33), alterada pela Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1, a seguir «Directiva 89/665»).

2       Este pedido foi apresentado no quadro de um litígio que opõe a sociedade Koppensteiner GmbH (a seguir «Koppensteiner») à sociedade Bundesimmobiliengesellschaft mbH (a seguir «BIG»), relativamente à decisão tomada por esta de retirar o anúncio de concurso para um contrato de direito público de serviços no termo do prazo estabelecido para apresentação de propostas.

 Enquadramento jurídico

 Regulamentação comunitária

3       O n.° 1 do artigo 1.° da Directiva 89/665 dispõe:

«Os Estados‑Membros tomarão [...], no que se refere aos processos de adjudicação abrangidos pelo âmbito de aplicação das Directivas 71/305/CEE, 77/62/CEE e 92/50/CEE [...], as medidas necessárias para garantir que as decisões tomadas pelas entidades adjudicantes possam ser objecto de recursos eficazes e, sobretudo, tão rápidos quanto possível, nas condições previstas nos artigos seguintes e, [nomeadamente], no n.° 7 do artigo 2.°, com o fundamento de que essas decisões tenham violado o direito comunitário em matéria de contratos públicos ou as regras nacionais que transpõem esse direito.»

4       Nos termos dos n.os 1 e 6 do artigo 2.° da Directiva 89/665,

«1.      Os Estados‑Membros velarão por que as medidas tomadas para os efeitos dos recursos referidos no artigo 1.° prevejam os poderes que permitam:

a)      Tomar o mais rapidamente possível, através de um processo de urgência, medidas provisórias destinadas a corrigir a alegada violação ou a impedir que sejam causados outros danos aos interesses em causa [...];

b)      Anular ou fazer anular as decisões ilegais, incluindo suprimir as especificações técnicas, económicas ou financeiras discriminatórias que constem dos documentos do concurso, dos cadernos de encargos ou de qualquer outro documento relacionado com o processo de adjudicação do contrato em causa;

c)      Conceder indemnizações às pessoas lesadas por uma violação.

[...]

6.      Os efeitos do exercício dos poderes referidos no n.° 1 sobre o contrato celebrado na sequência da atribuição de um contrato de direito público serão determinados pelo direito nacional.

Além disso, excepto se a decisão tiver de ser anulada antes da concessão de indemnizações, os Estados‑Membros podem prever que, após a celebração do contrato na sequência da atribuição de um contrato de direito público, os poderes da instância de recurso responsável se limitem à concessão de indemnizações a qualquer pessoa que tenha sido lesada por uma violação.»

 Regulamentação nacional

5       A Lei federal de 2002, relativa à celebração dos contratos de direito público (Bundesvergabegesetz 2002, BGBl. I, 99/2002, a seguir «BVergG»), prevê, nomeadamente, uma distinção entre as decisões que podem ser impugnadas em separado e aquelas que o não podem.

6       Segundo o § 20, n.° 13, alínea a), aa), da BVergG, as decisões que podem ser impugnadas em separado no procedimento de adjudicação público são o anúncio de concurso, diversas verificações ocorridas durante o prazo de apresentação de propostas e a decisão de atribuição.

7       O § 20, n.° 13, alínea b), da BVergG dispõe:

«As decisões que não podem ser impugnadas em separado são todas as outras que precedem no tempo as decisões que podem ser impugnadas em separado. As decisões que não podem ser impugnadas em separado apenas podem sê‑lo conjuntamente com decisões posteriores susceptíveis de ser impugnadas em separado.»

8       Segundo o § 166, n.° 2, ponto 1, da BVergG, um recurso é inadmissível na medida em que não seja dirigido contra uma decisão susceptível de ser impugnada em separado.

9       Resulta do § 162, n.° 5, da BVergG que, após a retirada de um anúncio de concurso, o Bundesvergabeamt é competente unicamente para verificar se essa retirada foi ilegal.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

10     A BIG, sociedade encarregada da gestão das construções e dos bens imóveis do Estado Federal da Áustria, da qual este detém 100% das participações sociais, é a entidade adjudicante no processo principal. Em 26 de Setembro de 2003, abriu um concurso público relativo a um lote de «obras de demolição» no quadro da construção de uma escola primária e de três ginásios. O custo da totalidade do projecto estava avaliado em 8 600 000 EUR. As obras de demolição controvertidas no processo principal estavam avaliadas em 95 000 EUR.

11     A Koppensteiner apresentou uma proposta em relação a este lote no referido procedimento de adjudicação.

12     Por carta de 29 de Outubro de 2003, a BIG informou a Koppensteiner de que o anúncio de concurso tinha sido retirado no termo do prazo estabelecido para apresentação de propostas por motivos graves na acepção do § 105 da BVergG.

13     Em 6 de Novembro de 2003, a BIG convidou a Koppensteiner a participar num procedimento por negociação sem anúncio de concurso prévio relativo a obras de demolição que comportavam, em substância, as mesmas prestações que o primeiro procedimento. Nesse segundo procedimento, o valor do contrato relativo a esse lote passou a ser calculado em 90 000 EUR.

14     A Koppensteiner apresentou uma proposta também neste segundo procedimento.

15     Em 13 de Novembro de 2003, a Koppensteiner interpôs recurso para o Bundesvergabeamt pedindo, no que respeita ao primeiro procedimento, a anulação da retirada do anúncio de concurso e a proibição de novo anúncio de concurso no quadro de um novo procedimento de adjudicação bem como, a título subsidiário, a declaração do carácter ilegal da retirada. Pediu simultaneamente a anulação do segundo procedimento de adjudicação.

16     Por decisão do Bundesvergabeamt de 20 de Novembro de 2003, a BIG foi proibida de abrir as propostas do segundo procedimento de adjudicação na pendência do recurso, o mais tardar até 13 de Janeiro de 2004.

17     Em 28 de Janeiro de 2004, a BIG atribuiu o contrato a outra empresa no quadro do segundo procedimento de adjudicação e as obras de demolição foram a seguir executadas por essa mesma empresa.

18     Perante o Bundesvergabeamt, a BIG alegou, como fundamento da retirada, que todas as propostas se tinham revelado muito superiores ao valor calculado para o contrato. Assim, o lote «obras de demolição» tinha sido calculado em 95 000 EUR para o primeiro procedimento de adjudicação. Ora, a proposta mais barata era de 304 150 EUR, o que se afigurou demasiado elevado.

19     A Koppensteiner alegou, nomeadamente, que, em conformidade com o acórdão de 18 de Junho de 2002, HI (C‑92/00, Colect., p. I‑5553), a decisão da entidade adjudicante de retirar o anúncio de concurso deve também poder ser objecto de recurso e ser anulada, tal sendo o caso, por violar o direito comunitário em matéria de contratos de direito público.

20     Na decisão de reenvio, o Bundesvergabeamt lembra que o sistema estabelecido pela BVergG não permite examinar e, tal sendo o caso, anular, no quadro de um recurso, a retirada do anúncio de concurso após a abertura das propostas num procedimento de adjudicação por concurso público. Este órgão jurisdicional apenas é competente, após a retirada de um anúncio de concurso, para verificar se essa retirada foi ilegal devido a uma violação da BVergG, permitindo a declaração dessa ilegalidade aos proponentes eliminados fundamentar uma acção de indemnização contra a entidade adjudicante.

21     Ora, na opinião do Bundesvergabeamt, o n.° 1 do artigo 1.° e o n.° 1, alínea b), do artigo 2.° da Directiva 89/665 exigem, como o Tribunal de Justiça interpretou no acórdão HI, já referido, que a ordem jurídica nacional preveja a possibilidade de anular uma retirada ocorrida após a abertura das propostas num procedimento de adjudicação. A competência do órgão de fiscalização para declarar a ilegalidade de uma retirada, com a possibilidade de, em seguida, se poder pedir uma indemnização, não é, portanto, suficiente.

22     Nestas condições, o Bundesvergabeamt decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      As normas do artigo 1.°, em conjugação com o artigo 2.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/665 [...] são de tal modo incondicionais e suficientemente precisas que um particular, em caso de anulação do procedimento de concurso após a abertura das propostas, pode invocar directamente essas disposições perante os órgãos jurisdicionais nacionais e tem legitimidade para interpor recurso?

2)      Em caso de resposta negativa à primeira questão, deve o artigo 1.°, em conjugação com o artigo 2.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/665 [...] ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros são obrigados a garantir que a decisão que precede a anulação do procedimento de concurso, através da qual a entidade adjudicante manifesta a sua intenção neste sentido (decisão de anulação que é análoga à decisão de adjudicação do contrato), possa ser objecto de um recurso que permita ao proponente, independentemente da possibilidade de exigir uma indemnização após a anulação, obter a anulação da decisão desde que os respectivos pressupostos se encontrem preenchidos?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à admissibilidade

23     O Governo austríaco alega, nomeadamente, que o contrato em causa no processo principal foi atribuído, após o segundo procedimento de adjudicação, a outra empresa que não a Koppensteiner e que as obras de demolição já estão terminadas. Por isso, a resposta às questões já não terá qualquer interesse pois que a Koppensteiner poderá apenas obter uma indemnização, o que está, de qualquer forma, previsto na BVergG. Além disso, este governo especifica que o órgão jurisdicional de reenvio não é competente para anular a decisão de retirada e que a resposta às questões não lhe será útil para resolver o litígio no processo principal.

24     A BIG considera que a segunda questão é puramente hipotética e, portanto, inadmissível. Em sua opinião, dado que o referido contrato foi atribuído, a questão carece de pertinência para a solução do litígio no processo principal, uma vez que é impossível à entidade adjudicante tomar, a posteriori, a decisão de retirar este anúncio de concurso.

25     A esse propósito, há que recordar que compete apenas aos órgãos jurisdicionais nacionais a quem os litígios são submetidos, e que devem assumir a responsabilidade das decisões judiciais a proferir, apreciar, face às particularidades de cada caso, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para estarem em condições de proferir a sua decisão como a pertinência das questões que colocam ao Tribunal. Consequentemente, uma vez que as questões submetidas se referem à interpretação do direito comunitário, o Tribunal é, em princípio, obrigado a decidir (v., nomeadamente, acórdão de 27 de Fevereiro de 2003, Adolf Truley, C‑373/00, Colect., p. I‑1931, n.° 21).

26     Se bem que o Governo austríaco e a BIG recordem, com razão, que o Tribunal de Justiça deve recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial quando seja manifesto que a interpretação do direito comunitário solicitada não tem qualquer relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, ou quando o problema seja de natureza hipotética (v., nomeadamente, acórdão Adolf Truley, já referido, n.° 22), as questões submetidas no presente processo não apresentam manifestamente tais características.

27     Com efeito, no caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio expôs no seu despacho que as questões são submetidas para lhe permitir tomar posição sobre a questão de saber se o pedido de anulação da retirada do primeiro anúncio de concurso é inadmissível ou não, e, tal sendo o caso, quais serão os fundamentos da eventual inadmissibilidade.

28     Daqui resulta que o pedido prejudicial é admissível.

 Quanto ao mérito

29     Antes de examinar as questões, que devem ser apreciadas conjuntamente, há que recordar que, no acórdão HI, já referido, o Tribunal de Justiça salientou que:

–       a decisão de retirada de um anúncio de concurso para um contrato de direito público faz parte das decisões relativamente às quais os Estados‑Membros estão obrigados, por força da Directiva 89/665, a instituir processos de recurso de anulação, a fim de garantir o respeito das normas do direito comunitário em matéria de contratos de direito público, bem como das regras nacionais de transposição desse direito (n.° 54);

–       a realização completa do objectivo prosseguido pela mesma directiva ficaria comprometida caso fosse permitido às entidades adjudicantes proceder à retirada de um anúncio de concurso para um contrato de direito público de serviços sem ficarem sujeitas aos processos de fiscalização jurisdicional destinados a assegurar cabalmente a efectividade do respeito das directivas que fixam as normas substantivas referentes aos contratos de direito público e os princípios que lhes subjazem (n.° 53).

30     Assim, nesse mesmo acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que os artigos 1.°, n.° 1, e 2.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/665 exigem que a decisão da entidade adjudicante de retirar o anúncio de concurso para um contrato de direito público possa ser objecto de recurso e ser anulada, tal sendo o caso, com fundamento em violação do direito comunitário em matéria de contratos de direito público ou das regras nacionais que transpõem esse direito.

31     Decorre do que precede que, na medida em que, por força do direito nacional, mesmo interpretado em conformidade com as exigências do direito comunitário, não seja possível a um proponente contestar uma decisão de retirada de um anúncio de concurso por ser contrário ao direito comunitário e pedir, por essa razão, a sua anulação, o direito nacional não respeita as exigências dos artigos 1.°, n.° 1, e 2.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/665.

32     Um tribunal nacional perante o qual um proponente peça a anulação de uma decisão de retirada de um anúncio de concurso por esta ser contrária ao direito comunitário, e cujo direito nacional não permita conhecer desse pedido, será, por isso, confrontado com a questão de saber se e, eventualmente, em que condições é obrigado, por força do direito comunitário, a declarar admissível tal recurso de anulação.

33     A este propósito, deve salientar‑se que a obrigação dos Estados‑Membros, decorrente de uma directiva, de atingir o resultado previsto por esta bem como o seu dever, resultante do artigo 10.° CE, de tomar todas as medidas gerais ou especiais capazes de assegurar o cumprimento dessa obrigação se impõem a todas as autoridades dos Estados‑Membros, incluindo, no âmbito das suas competências, às autoridades jurisdicionais (v., nomeadamente, acórdão de 4 de Março de 1999, HI, C‑258/97, Colect., p. I‑1405, n.° 25).

34     Se bem que caiba à ordem jurídica de cada Estado‑Membro designar as instâncias de recurso dos Estados‑Membros competentes em matéria de procedimentos de adjudicação de contratos de direito público para decidir os litígios que ponham em causa direitos individuais decorrentes da ordem jurídica comunitária (v., nomeadamente, acórdãos de 24 de Setembro de 1998, Tögel, C‑76/97, Colect., p. I‑5357, n.° 28, e de 28 de Outubro de 1999, Alcatel Austria e o., C‑81/98, Colect., p. I‑7671, n.° 49), não se afigura que, no litígio do processo principal, seja levantado um problema de competência jurisdicional dessa natureza.

35     Com efeito, no caso em apreço, é pacífico que, segundo a legislação nacional aplicável, o Bundesvergabeamt é competente para conhecer dos recursos relativos a «decisões», na acepção do n.° 1 do artigo 1.° da Directiva 89/665, tomadas por entidades adjudicantes em procedimentos de adjudicação de contratos de direito público de serviços.

36     Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio indicou (v. n.° 20 do presente acórdão) que a legislação nacional aplicável exclui o exame e, tal sendo o caso, a anulação, no quadro de um recurso interposto para o Bundesvergabeamt, de decisões de retirada de anúncios de concurso após abertura das propostas num procedimento de adjudicação por concurso público.

37     Ora, como foi recordado no n.° 30 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça já decidiu que os artigos 1.°, n.° 1, e 2.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/665 se opõem a tal exclusão.

38     As referidas disposições da Directiva 89/665 são incondicionais e suficientemente precisas para fundamentar um direito de um particular que pode, tal sendo o caso, invocá‑lo contra uma entidade adjudicante como a BIG.

39     Nestas condições, o órgão jurisdicional competente é obrigado a não aplicar as normas nacionais que o impedem de respeitar a obrigação que decorre dos artigos 1.°, n.° 1, e 2.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/665.

 Quanto às despesas

40     Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

O órgão jurisdicional competente é obrigado a não aplicar as normas nacionais que o impedem de respeitar a obrigação que decorre dos artigos 1.°, n.° 1, e 2.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos, alterada pela Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.