Palavras-chave
Sumário

Palavras-chave

1. Acordos internacionais – Acordos da Comunidade – Convenção sobre o Direito do Mar

(Artigo 175.º, n.º 1, CE e 176.º CE)

2. Acordos internacionais – Acordos da Comunidade – Convenção sobre o Direito do Mar

(Artigos 220.º CE, 227.º CE e 292.º CE)

3. Estados‑Membros – Obrigações

(Artigos 227.º CE e 292.º CE; artigos 142.º EA e 193.º EA)

4. Estados‑Membros – Obrigações – Obrigação geral que decorre do artigo 10.º CE

(Artigos 10.º CE e 292.º CE)

5. Estados‑Membros – Obrigações – Dever de cooperação

(Artigos 10.º CE; artigo 192.º EA)

Sumário

1. O artigo 175.°, n.° 1, CE, constitui a base jurídica apropriada para a celebração de acordos internacionais em matéria de protecção do ambiente em nome da Comunidade. Tal como precisa o artigo 176.° CE, esta competência externa da Comunidade em matéria de protecção do ambiente, não é exclusiva, mas, em princípio, partilhada entre a Comunidade e os seus Estados‑Membros. Contudo, a questão de saber se uma disposição de um acordo misto é da competência da Comunidade diz respeito à atribuição e, portanto, à própria existência dessa competência externa da Comunidade no domínio em causa e não à sua natureza exclusiva ou partilhada. Decorre que a existência da competência externa da Comunidade em matéria de protecção do meio marinho não depende, em princípio, da adopção de actos de direito derivado que abranjam a matéria em causa e sejam susceptíveis de ser afectados no caso de participação dos Estados‑Membros no procedimento de celebração do acordo em causa. A Comunidade pode, com efeito, concluir acordos no domínio da protecção do ambiente, mesmo que as matérias específicas cobertas por esses acordos não sejam ainda, ou sejam apenas parcialmente, objecto de uma regulamentação no plano comunitário que, por isso mesmo, não é susceptível de ser afectada.

Contudo, no contexto específico da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, a verificação de uma transferência de competências partilhadas para a Comunidade depende da existência, nas matérias a que respeitam as disposições da convenção em causa, de regras comunitárias, quaisquer que sejam o seu alcance e a sua natureza. Ora, as matérias abrangidas pelas disposições da convenção relativas à prevenção da poluição marítima, especialmente pelos artigos 123.º, 192.º, 193.º, 194.º, 197.º, 206.º, 207.º, 211.º e 213.º da Convenção, estão amplamente regulamentadas por actos comunitários, muitos dos quais são expressamente mencionados no apêndice da declaração de competências da Comunidade anexa à Decisão 98/392 do Conselho, pela qual a convenção foi aprovada em nome da Comunidade. Daqui decorre que as referidas disposições da Convenção estão abrangidas pela competência que a Comunidade escolheu exercer ao aderir à convenção, de forma que essas disposições fazem parte integrante da ordem jurídica comunitária. Por consequência, o Tribunal de Justiça é competente para conhecer dos diferendos relativos à interpretação e à aplicação das referidas disposições, bem como para apreciar o respeito das mesmas por parte de um Estado‑Membro.

(cf. n. os  90, 92-95, 108, 110, 120-121)

2. Um acordo internacional, como a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, não pode violar a ordem das competências estabelecida pelos Tratados, e, portanto, a autonomia do sistema jurídico comunitário, cuja observância o Tribunal de Justiça assegura, por força do artigo 220.° CE. Esta competência exclusiva do Tribunal de Justiça é confirmada pelo artigo 292.° CE, nos termos do qual os Estados‑Membros se comprometem a não submeter qualquer diferendo relativo à interpretação ou aplicação do Tratado CE a um modo de resolução diferente dos que nele estão previstos. Além disso, a convenção em questão permite precisamente evitar que se cometa tal violação da competência exclusiva do Tribunal de Justiça de forma a preservar a autonomia do sistema jurídico comunitário. Com efeito, decorre do artigo 282.° da convenção que o regime de resolução de conflitos previsto no Tratado CE, uma vez que prevê procedimentos que conduzem a decisões obrigatórias para dirimir diferendos entre Estados‑Membros, prevalece, em princípio, sobre o previsto na parte XV da convenção.

Daqui decorre que os artigos 220.º e 292.º CE se opõem ao recurso a um tribunal arbitral constituído em conformidade com o anexo VII da convenção, para resolução de um diferendo relativo à interpretação ou à aplicação de disposições da convenção que estão abrangidas pela competência que a Comunidade exerceu ao aderir à convenção, de forma que essas disposições fazem parte integrante da ordem jurídica comunitária. Além disso, o diferendo que opõe dois Estados‑Membros acerca do pretenso desrespeito de obrigações do direito comunitário contidas nas referidas disposições da convenção, está manifestamente abrangido por um dos modos de resolução dos diferendos instituídos pelo Tratado CE, na acepção do artigo 292.° CE, ou seja, o procedimento previsto no artigo 227.° CE.

(cf. n. os  123-126, 128, 133)

3. A submissão por um Estado‑Membro dos actos de direito comunitário abrangidos pelo Tratado CE e pelo Tratado CEEA a um órgão jurisdicional que não seja o Tribunal de Justiça, como um tribunal arbitral constituído em conformidade com o anexo VII da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar para a sua interpretação e aplicação no âmbito de um processo destinado a obter a declaração de uma violação dos referidos actos por um outro Estado‑Membro é contrária ao dever imposto aos Estados‑Membros, respectivamente, pelos artigos 292.° CE e 193.° EA, de respeitar a natureza exclusiva da competência do Tribunal de Justiça para conhecer dos diferendos relativos à interpretação e à aplicação de disposições do direito comunitário, designadamente recorrendo aos processos previstos nos artigos 227.° CE e 142.° EA, com o objectivo de obter a declaração de aquelas disposições foram violadas por parte de outro Estado‑Membro. Além disso, nestas circunstâncias, a instauração e a prossecução de um processo no tribunal arbitral, comportam um risco manifesto de infracção à ordem de competências estabelecida nos Tratados e, por consequência, à autonomia do sistema jurídico comunitário.

(cf. n. os  151-152, 154)

4. A obrigação dos Estados‑Membros, prevista no artigo 292.° CE, de recorrerem ao sistema jurisdicional comunitário e de respeitarem a competência exclusiva do Tribunal de Justiça que constitui um elemento fundamental desse sistema deve ser entendida como uma manifestação específica do seu dever mais geral de lealdade que decorre do artigo 10.° CE. Portanto, não há que declarar um incumprimento das obrigações gerais previstas no artigo 10.° CE se já foi declarado o incumprimento de obrigações comunitárias mais específicas a que um Estado‑Membro está vinculado por força do artigo 292.° CE.

(cf. n. os  169, 171)

5. Os Estados‑Membros e as instituições comunitárias estão vinculados a uma obrigação de cooperação estreita na execução dos compromissos que assumiram por força de uma competência partilhada para celebrar um acordo misto. É assim especialmente no caso de um diferendo que diz essencialmente respeito a compromissos decorrentes de um acordo misto que fazem parte de um domínio em que as competências da Comunidade e dos Estados‑Membros são susceptíveis de estar estritamente imbricadas. O facto de se submeter um diferendo desta natureza a um órgão jurisdicional como um tribunal arbitral constituído em conformidade com o anexo VII da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar implica o risco de que um tribunal diferente do Tribunal de Justiça se pronunciar sobre o alcance de obrigações decorrentes, para os Estados‑Membros, do direito comunitário.

Nestas condições, a obrigação de cooperação estreita no quadro de um acordo misto implica para um Estado‑Membro o dever de informação e de consulta prévias das instituições comunitárias competentes antes de desencadear um processo de resolução do diferendo no quadro da convenção.

(cf. n. os  175-177, 179)