Palavras-chave
Sumário

Palavras-chave

1. Recurso de anulação - Pessoas singulares ou colectivas - Actos que lhes dizem directa e individualmente respeito - Regulamento que prevê a retirada da autorização de comercialização do aditivo nifursol na alimentação animal - Admissibilidade

(Artigo 230.° , quarto parágrafo, CE; Regulamento n.° 1756/2002 do Conselho)

2. Agricultura - Política agrícola comum - Execução - Tomada em consideração do princípio da precaução - Inexistência de referência expressa - Não incidência - Aplicação do princípio - Alcance - Limites

[Artigos 152.° CE e 174.° CE; Regulamento n.° 1756/2002 do Conselho; Regulamento n.° 2430/1999 da Comissão; Directiva 70/524 do Conselho, artigo 3.° -A, alínea b)]

3. Agricultura - Política agrícola comum - Reavaliação de um aditivo na alimentação animal expressamente não sujeito a reavaliação - Renovação da autorização de comercialização - Retirada da autorização - Obrigação de a Comissão interpelar o responsável pela colocação em circulação do aditivo - Limites

[Directivas do Conselho 70/524, artigos 9.° -M, segundo e quinto travessões, 3.° -A, alínea b), e 9.° -H, e 96/51]

4. Processo de medidas provisórias - Suspensão da execução - Medidas provisórias - Condições de concessão - Urgência - Critérios de apreciação - Decisão de julgar o pedido principal segundo uma tramitação acelerada nos termos do artigo 76.° -A do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância - Não incidência

(Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 76.° -A, n.° 1)

5. Processo de medidas provisórias - Suspensão da execução - Suspensão da execução de um regulamento que prevê a retirada da autorização de comercialização de um aditivo na alimentação animal - Condição de concessão - Prejuízo grave e irreparável - Prejuízo de ordem financeira - Alcance - Limites

6. Processo de medidas provisórias - Suspensão da execução - Condições de concessão - Ponderação de todos os interesses em jogo - Preponderância da protecção da saúde pública relativamente às considerações económicas - Preponderância da protecção da saúde humana relativamente à protecção da saúde animal

(Artigo 30.° CE; Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 108.° )

Sumário

1. O objectivo do artigo 230.° , quatro parágrafo, CE é especialmente evitar que, pela simples escolha da forma de regulamento, as instituições comunitárias possam excluir o recurso de um particular contra uma decisão que lhe diz directa e individualmente respeito e precisar assim que a escolha da forma não pode mudar a natureza do acto.

Dado que o Regulamento n.° 1756/2002, que altera, no que respeita à retirada da autorização de um aditivo, a Directiva 70/524, relativa aos aditivos na alimentação para animais, e o Regulamento n.° 2430/1999 têm por objecto exclusivo a retirada da autorização de colocação no mercado do aditivo nifursol, de que o operador económico é o único titular, e que este é igualmente, tal como resulta do Anexo I do Regulamento n.° 2430/1999, o «responsável pela colocação em circulação», resulta, à primeira vista, que, mesmo que esse regulamento deva ser visto como um acto de carácter geral, diz directa e individualmente respeito a esse operador.

( cf. n.os 56-57 )

2. Em conformidade com o disposto no artigo 174.° CE, o princípio da precaução constitui um dos princípios em que se baseia a política da Comunidade no domínio do ambiente, de que faz parte a relativa à protecção da saúde das pessoas. O princípio é igualmente previsto no artigo 152.° CE como uma das componentes das outras políticas da Comunidade, entre as quais a política agrícola comum.

A ausência de referência expressa a este princípio nos considerandos do Regulamento n.° 1756/2002, que altera, no que respeita à retirada da autorização de um aditivo, a Directiva 70/524, relativa aos aditivos na alimentação para animais, e o Regulamento n.° 2430/1999 não basta para excluir a pertinência do referido princípio na interpretação, feita no caso em apreço, do conceito de «influência negativa» a que se refere o artigo 3.° -A, alínea b), da Directiva 70/524, alterada. Daqui resulta, prima facie, que as instituições comunitárias podem, no quadro da aplicação da Directiva 70/524, na nova redacção, adoptar medidas na base da alínea b) do artigo 3.° -A, que tenham em conta esse princípio, sem que sejam necessariamente obrigadas, na altura da sua adopção, a fazer-lhe explicitamente referência.

Todavia, uma medida preventiva só pode ser tomada se o risco, sem que a sua existência e o seu alcance tenham sido demonstrados «plenamente» por dados científicos concludentes, estiver, no entanto, suficientemente documentado com base nos dados científicos existentes no momento da tomada dessa medida. Mesmo se o acórdão de 24 de Outubro de 2002, Hahn, C-121/00, aceitava que o legislador escolhesse uma tolerância igual a ou próxima de zero, tal pressuporia que o risco em causa estivesse bem demonstrado. Se bem que o facto de os dados científicos quanto à extensão de um risco continuarem incertos não exclua, em direito comunitário, que o risco seja considerado demonstrado, parece que continua a ser exigível um nível mínimo de conhecimento científico.

( cf. n.os 71, 72, 80, 81 )

3. A interpretação do segundo e quinto travessões do artigo 9.° -M e da alínea b) do artigo 3.° -A, por um lado, e do artigo 9.° -H, por outro, da Directiva 70/524, relativa aos aditivos na alimentação para animais, na redacção dada pela Directiva 96/51, não permite excluir, à primeira vista, que a Comissão, quando procede à reavaliação de um aditivo expressamente não sujeito a reavaliação pelo legislador comunitário, na Directiva 96/51 e, posteriormente, renova a autorização por um período de dez anos em aplicação das alterações introduzidas pela referida directiva, esteja obrigada, com reserva de casos urgentes em que um risco novo, claro e sério se manifeste subitamente, ela própria, ou por intermédio do Estado-Membro relator do processo, a interpelar o responsável pela colocação em circulação do aditivo em causa. A interpelação deve conter uma indicação sumária mas precisa das dúvidas de carácter científico que justificam a reavaliação e ser efectuada quando do processo de reavaliação ou, pelo menos, antes de a Comissão propor a retirada de autorização do aditivo. Por conseguinte, na falta de qualquer comunicação semelhante a tal interpelação, o juiz das medidas provisórias não pode excluir que o regulamento que retira a autorização de um aditivo expressamente não submetido a reavaliação seja ilegal por violação do quinto travessão do artigo 9.° -M da Directiva 70/524, na nova redacção, quando do procedimento que precedeu a sua adopção.

( cf. n.os 85-87 )

4. O facto de o Tribunal de Primeira Instância ter decidido indeferir o pedido da requerente tendente a julgar o processo principal segundo uma tramitação acelerada não pode influenciar nem a apreciação da urgência nem a ponderação dos interesses, se tal for necessário, pelo juiz das medidas provisórias. Os critérios pertinentes da existência de «especial urgência» exigida pelo n.° 1 do artigo 76.° -A do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância para decidir segundo uma tramitação acelerada e os que regem a apreciação do requisito de urgência que deve estar preenchido para que o juiz das medidas provisórias possa decretar as medidas provisórias são apenas parcialmente idênticos. Por outro lado, a concessão do benefício do tratamento segundo tramitação acelerada releva da discricionariedade do Tribunal, tal como resulta da palavra «pode» no n.° 1, primeiro parágrafo, do artigo 76.° -A do referido regulamento, e obriga a ter igualmente em conta outras circunstâncias, incluindo os efeitos que tal concessão tem sobre o tempo de tratamento de outros processos.

( cf. n.° 104 )

5. Um prejuízo de ordem financeira não pode, salvo circunstâncias excepcionais, ser considerado irreparável ou mesmo dificilmente reparável, uma vez que pode ser objecto de compensação financeira posterior. Em aplicação destes princípios, a suspensão da execução de um regulamento que retira a autorização de um aditivo na alimentação animal só se justificaria se se afigurasse que, na ausência de tal medida, a requerente ficaria numa situação susceptível de pôr em perigo a sua própria existência ou de alterar de modo irremediável as suas partes de mercado.

Quanto à primeira dessas hipóteses, a apreciação da situação material da requerente pode ser efectuada tomando nomeadamente em consideração as características do grupo a que está ligada pelas suas participações.

Quanto à segunda hipótese, o risco da introdução de uma proibição de comercialização semelhante à introduzida pelo regulamento controvertido em certos mercados de países terceiros europeus não pode ser validamente invocado para demonstrar a urgência em suspender um acto comunitário. Na ausência de obstáculos de natureza estrutural ou jurídica que impeçam o fabricante de um produto, sujeito à obrigação de ter uma autorização de colocação no mercado, de reconquistar uma fracção apreciável das suas quotas de mercado com a ajuda, nomeadamente, de medidas adequadas de publicidade, o carácter essencialmente financeiro da perda provocada por uma retirada da sua autorização não poderá excluir-se. Seria esse o caso da perda provocada pela retirada da autorização do nifursol na alimentação animal. No entanto, o juiz das medidas provisórias não pode excluir totalmente que tal argumentação subestime as dificuldades que a requerente encontrará, provavelmente a cada nível da cadeia de produção e, sobretudo, ao nível dos criadores e da grande distribuição, ao relançar o seu produto dentro de, pelo menos, dois anos. Além disso, e a título mais significativo, é difícil de excluir que a estrutura do mercado comunitário para a venda de carne de peru não seja definitivamente alterada e de uma maneira não negligenciável, até à data da prolação do acórdão no processo principal, através de um aumento das importações provenientes de países terceiros.

Nestas circunstâncias, não se pode excluir o risco de prejuízo sério e, em parte, irreparável ou dificilmente reparável em consequência da retirada do nifursol durante a tramitação do processo principal.

( cf. n.os 106-108, 110, 113-120 )

6. Quando do exame dos interesses em jogo, cabe ao juiz das medidas provisórias determinar se a anulação da decisão controvertida aquando da apreciação de mérito permitirá inverter a situação provocada pela sua execução imediata e, inversamente, se a suspensão da execução desse acto será de natureza a impedir o seu pleno efeito no caso de ser negado provimento ao recurso principal.

A este respeito, às exigências ligadas à protecção da saúde pública deve incontestavelmente ser reconhecido um carácter preponderante relativamente às considerações económicas. Decorre daí que, quando for invocado pela instituição comunitária requerida um risco sério para a saúde pública, o juiz das medidas provisórias, não obstante a sua soberania formal na ponderação dos interesses, penderá quase inevitavelmente a favor da protecção da saúde pública. Tal sucede mesmo quando é evidente a urgência que justifica a concessão da medida provisória pedida.

Além disso, a protecção dos interesses dos produtores comunitários de carne de peru, se bem que louvável, não pode prevalecer sobre o dano susceptível de ser provocado pela suspensão do Regulamento n.° 1756/2002, que altera, no que respeita à retirada da autorização de um aditivo, a Directiva 70/524, relativa aos aditivos na alimentação para animais, e o Regulamento n.° 2430/1999, no caso de se confirmar a concretização do risco em que o Conselho se baseou ao adoptar o regulamento. O possível recurso do Conselho (ou da Comissão) ao disposto no artigo 108.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, no caso de a suspensão pedida ser concedida e de surgirem mais elementos científicos, antes de proferido acórdão no processo principal, para justificar a retirada ordenada pelo regulamento controvertido em nada modificaria tal situação. Este não é suficiente, com efeito, para eliminar os riscos entretanto existentes de transmissão aos consumidores de resíduos potencialmente genotóxicos.

Quanto à protecção da saúde animal, se é verdade que um aumento da morbilidade e da mortalidade nas produções de perus da Comunidade provocada por erupções mais frequentes e calamitosas da histomonose é doravante previsível, a protecção da saúde animal, cuja importância é, por certo, reconhecida em direito comunitário, nomeadamente no artigo 30.° CE, não pode sobrepor-se ao carácter preponderante das exigências ligadas à protecção da saúde do ser humano.

( cf. n.os 122-127 )