Processo T‑66/01
Imperial Chemical Industries Ltd
contra
Comissão Europeia
«Concorrência – Abuso de posição dominante – Mercado do sódio no Reino Unido – Decisão que dá por provada uma infracção ao artigo 82.° CE – Prescrição do poder da Comissão de aplicar coimas ou sanções – Prazo razoável – Formalidades essenciais – Caso julgado – Existência da posição dominante – Exploração abusiva da posição dominante – Afectação do comércio entre Estados‑Membros – Coima – Gravidade e duração da infracção – Circunstâncias atenuantes»
Sumário do acórdão
1. Concorrência – Procedimento administrativo – Prescrição em matéria de procedimentos – Suspensão
(Regulamento n.° 2988/74 do Conselho, artigo 3.°)
2. Direito comunitário – Princípios – Respeito de um prazo razoável – Âmbito de aplicação – Concorrência – Procedimento administrativo – Processo judicial – Distinção para efeitos de apreciação do respeito do prazo razoável
(Regulamento n.° 17 do Conselho)
3. Concorrência – Procedimento administrativo – Obrigações da Comissão – Respeito de um prazo razoável
(Regulamento n.° 17 do Conselho)
4. Tramitação processual – Duração do processo no Tribunal Geral – Prazo razoável – Critérios de apreciação
5. Direito comunitário – Princípios – Direitos de defesa – Âmbito de aplicação – Concorrência – Procedimento administrativo – Alcance do princípio depois da anulação de uma primeira decisão da Comissão
(Artigos 81.° CE, 82.° CE e 233.° CE; Regulamento n.° 17 do Conselho)
6. Comissão – Princípio da colegialidade – Alcance – Decisão em matéria de concorrência
7. Recurso de anulação – Acórdão de anulação – Alcance – Efeito absoluto de caso julgado
8. Recurso de anulação – Acórdão de anulação – Efeitos
(Artigos 82.° CE, 230.° CE e 233.° CE)
9. Concorrência – Posição dominante – Caracterização através da detenção de uma quota de mercado muito significativa
(Artigo 82.° CE)
10. Concorrência – Posição dominante – Abuso – Desconto com efeito de encerramento do mercado – Descontos de fidelidade
(Artigo 82.° CE)
11. Concorrência – Posição dominante – Abuso – Descontos com base na quantidade – Admissibilidade – Requisitos – Carácter abusivo do sistema de descontos
(Artigo 82.° CE)
12. Concorrência – Posição dominante – Abuso – Contratos de exclusividade de fornecimento – Descontos de fidelidade
(Artigo 82.° CE)
13. Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Poder de apreciação da Comissão
(Artigos 81.° CE e 82.° CE; Regulamento n.° 2988/74 do Conselho)
14. Concorrência – Procedimento administrativo – Decisão da Comissão – Decisão que declara uma infracção e aplica uma coima – Anulação por vício de forma
(Regulamento n.° 17 do Conselho)
15. Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Infracção com particular gravidade
(Artigo 82.° CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)
16. Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Circunstâncias agravantes – Reincidência – Conceito de infracções do mesmo tipo – Infracções ao artigo 81.° CE, por um lado, e ao artigo 82.° CE, por outro – Exclusão
(Artigos 81.° CE e 82.° CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)
17. Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Obrigação de deduzir do montante da coima as despesas efectuadas para garantir a aplicação de uma decisão posteriormente anulada – Inexistência
(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)
18. Concorrência – Regras comunitárias – Infracções – Actuação deliberada – Conceito
(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°)
19. Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção
(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)
20. Concorrência – Coimas – Aplicação – Necessidade de um benefício retirado pela empresa da infracção – Inexistência – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Circunstâncias atenuantes – Inexistência de benefício – Exclusão
(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)
21. Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Circunstâncias agravantes – Dissimulação do acordo – Inexistência de carácter secreto que não constitui uma circunstância atenuante
(Artigos 81.° CE e 82.° CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°,n.° 2)
1. Nos termos do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, a prescrição de procedimentos suspende‑se enquanto a decisão da Comissão for objecto de um processo pendente no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, A referência no artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 a um «processo pendente no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias» deve ser entendida, desde a criação do então Tribunal de Primeira Instância, no sentido de que se refere, em primeiro lugar a um processo aí pendente, na medida em que os recursos de decisões que aplicam sanções ou coimas no domínio da concorrência são da sua competência.
A prescrição fica igualmente suspensa durante todo o tempo do processo no Tribunal de Justiça. Visto o artigo 60.° do Estatuto do Tribunal de Justiça e o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 terem um âmbito de aplicação diferente, a inexistência de efeito suspensivo de um recurso de segunda instância não é susceptível de privar de qualquer efeito útil o artigo 3.° do referido regulamento, que respeita a situações em que a Comissão tem que aguardar a decisão do tribunal comunitário. Por outro lado, o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 protege a Comissão contra o efeito da prescrição nas situações em que tenha que aguardar a decisão do tribunal comunitário, no âmbito de processos cuja tramitação não domina, antes de saber se o acto recorrido está ou não ferido de ilegalidade.
Não se pode acolher o argumento de que, na sequência de uma anulação da decisão da Comissão, esta não pode beneficiar da sua própria falta ao aplicar uma coima depois do termo do prazo de prescrição. Com efeito, qualquer anulação de um acto adoptado pela Comissão é‑lhe necessariamente imputável, na medida em que traduz um erro seu. Portanto, excluir a suspensão da prescrição do procedimento, quando o recurso leva a reconhecer um erro imputável à Comissão, deixaria sem qualquer sentido o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74. É o próprio facto de estar pendente um recurso no Tribunal Geral ou no Tribunal de Justiça que justifica a suspensão, e não as conclusões a que esses tribunais cheguem nos seus acórdãos.
Por último, se a Comissão tivesse que adoptar uma nova decisão na sequência da anulação de uma decisão pelo Tribunal Geral, sem aguardar o acórdão do Tribunal de Justiça, existiria o risco de coexistirem duas decisões com o mesmo objecto no caso de o Tribunal de Justiça anular o acórdão do Tribunal Geral. Vai contra as exigências da economia processual administrativa impor à Comissão que, unicamente para evitar a prescrição, adopte nova decisão antes de saber se a decisão inicial está ou não ferida de ilegalidade.
Uma vez que a prescrição prevista no artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 esteve suspensa durante todo o tempo do processo no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça, não se pode acusar a Comissão de ter violado o princípio do prazo razoável por ter aguardado que o Tribunal Geral e o Tribunal de Justiça decidissem, antes de adoptar nova decisão, uma vez que isso se justifica pelo respeito do processo jurisdicional e dos futuros acórdãos.
(cf. n.os 73 a 74, 77, 82, 85 a 86, 88 a 89 e 132)
2. Com efeito, no âmbito da análise de uma alegação de violação do princípio do prazo razoável, há que fazer uma distinção entre o procedimento administrativo em matéria de concorrência nos termos do Regulamento n.° 17 e o processo jurisdicional em caso de recurso da decisão da Comissão. O período em que o juiz comunitário analisou a legalidade da decisão e, em caso de recurso de segunda instância, a validade do acórdão de primeira instância não pode ser tido em conta na determinação da duração do procedimento na Comissão.
(cf. n.° 102)
3. A violação do princípio do respeito de um prazo razoável na adopção de uma decisão no termo do um procedimento administrativo em matéria de concorrência só justifica a anulação de uma decisão da Comissão se implicar também uma violação dos direitos de defesa da empresa em causa. Com efeito, quando não se prove que o decurso excessivo do tempo afectou a capacidade de as empresas em questão se defenderem efectivamente, o desrespeito do princípio de um prazo razoável não tem influência na validade do procedimento administrativo.
(cf. n.° 109)
4. O princípio geral de direito comunitário nos termos do qual qualquer pessoa tem direito a um processo equitativo, que se inspira no artigo 6.°, n.° 1, da CEDH, nomeadamente o direito a um processo num prazo razoável, é aplicável no âmbito do recurso judicial de uma decisão da Comissão que aplica a uma empresa coimas por violação do direito da concorrência.
O carácter razoável do prazo é apreciado em função das circunstâncias concretas de cada processo, designadamente, a importância do litígio para o interessado, a complexidade do processo, bem como o comportamento do recorrente e das autoridades competentes.
A esse respeito, a lista desses critérios não é taxativa e a apreciação do carácter razoável do prazo não exige uma análise sistemática das circunstâncias da causa à luz de cada um deles quando a duração do processo se revelar justificada à luz de apenas um. Assim, a complexidade do processo pode justificar um prazo à primeira vista demasiado longo.
Na falta de qualquer indício de que a duração do processo tivesse influenciado a decisão da causa, um eventual excesso do prazo razoável pelo tribunal comunitário, mesmo admitindo‑o demonstrado, não tem qualquer influência da legalidade da decisão recorrida. Poderá justificar o pagamento de uma indemnização se a empresa o pedir.
(cf. n.os 114, 116 a 117)
5. A anulação de um acto comunitário não afecta necessariamente os actos preparatórios, podendo, em princípio, o procedimento destinado a substituir o acto anulado ser retomado no ponto exacto em que a ilegalidade ocorreu.
Uma vez que o vício processual ocorreu na última fase da adopção de uma decisão que pune uma empresa por violação das normas da concorrência, a sua anulação não afecta a validade das medidas preparatórias dessa decisão, anteriores ao momento em que se verificou o vício. Quando adopta uma nova decisão, com um conteúdo substancialmente idêntico e com base nas mesmas acusações, a Comissão não tem que proceder a novas diligências processuais.
Em particular, não pode ser criticada por não ter procedido, antes de adoptar a nova decisão, a uma nova audição da empresa em causa, por não lhe ter dado a ocasião de apresentar novamente os seus argumentos, ou por não lhe ter dirigido uma nova comunicação de acusações.
Quanto às questões de direito susceptíveis de surgir no âmbito da aplicação do artigo 233.° CE, tal como as relativas ao decurso do tempo, à possibilidade de recomeço do procedimento, ao acesso ao processo que seria inerente a esse recomeço, à intervenção do consultor‑auditor e do comité consultivo e quanto a eventuais implicações do artigo 20.° do Regulamento n.° 17, não exigem novas audições, na medida em que não alteram o conteúdo das acusações, sendo unicamente passíveis de fiscalização jurisdicional posterior, se for esse o caso.
Por outro lado, uma vez que não é necessária nova audição, também não é necessária uma nova intervenção do consultor‑auditor. Com efeito, resulta do próprio conteúdo da missão confiada ao consultor‑auditor que a sua intervenção está necessariamente ligada à audição das empresas, na perspectiva de uma eventual decisão.
Além disso, na medida em que a nova decisão não contenha alterações substanciais face à decisão anulada, a Comissão, que não tem que ouvir novamente a empresa em causa, também não tem que proceder a uma nova consulta do comité consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes.
Pelas mesmas razões, o processo submetido ao colégio dos comissários não tem que conter, nomeadamente, um novo relatório do consultor‑auditor ou uma nova acta de consulta do comité consultivo.
(cf. n.os 125 a 126, 134 a 135, 151, 153 a 154, 161 a 162, 168, 174)
6. O princípio da colegialidade assenta na igualdade dos membros da Comissão no processo de decisão e implica, nomeadamente, que as decisões são tomadas em comum e que todos os membros do colégio são colectivamente responsáveis, no plano político, por todas as decisões. O respeito deste princípio e, em especial, a necessidade de as decisões serem tomadas em comum, interessa necessariamente aos sujeitos de direito afectados pelos seus efeitos jurídicos, devendo poder confiar que essas decisões foram efectivamente tomadas pelo colégio e correspondem exactamente à sua vontade. Em particular, é esse o caso dos actos, expressamente qualificados de decisões, que a Comissão pratica face às empresas ou associações de empresas com vista ao respeito das normas da de concorrência e que têm por objecto a declaração de uma infracção a essas normas, dirigir intimações a essas empresas e aplicar‑lhes sanções pecuniárias.
O simples facto de um comunicado de imprensa não emanado da Comissão e sem qualquer carácter oficial mencionar uma declaração de um porta‑voz da Comissão referindo em que data será tomada uma decisão em matéria de concorrência e o seu teor não basta para considerar que a Comissão violou o princípio da colegialidade. Uma vez que não está vinculado por essa declaração, o colégio dos comissários pode decidir, após deliberação em comum, não adoptar essa decisão.
(cf. n.os 175 a 178)
7. A fim de garantir tanto a estabilidade do direito e das relações jurídicas como uma boa administração da justiça, importa que as decisões jurisdicionais que tenham transitado em julgado após esgotamento das vias de recurso disponíveis ou após a extinção dos prazos previstos para tais recursos já não possam ser postas em causa.
O caso julgado de um acórdão pode obstar à admissibilidade de um recurso ou acção se o recurso ou acção que lhe deu origem tiver oposto as mesmas partes, tiver tido o mesmo objecto e se tiver baseado na mesma causa, sendo esses pressupostos necessariamente cumulativos. O caso julgado está ligado apenas aos pontos de facto e de direito que tenham sido efectivamente ou necessariamente decididos pela decisão judicial em causa.
(cf. n.os 196 a 198)
8. A instituição que praticou o acto anulado só está vinculada nos limites do necessário para assegurar a execução do acórdão de anulação O procedimento destinado a substituir esse acto pode assim ser retomado no ponto exacto em que a ilegalidade ocorreu.
Quando uma decisão da Comissão que pune uma empresa por abuso de posição dominante é anulada pelo Tribunal Geral pelo facto de a sua autenticação ter sido efectuada depois da respectiva notificação, o que constitui uma preterição de formalidade essencial, na acepção do artigo 230.° CE, a Comissão pode retomar a sua análise na fase da autenticação sem ter que analisar se as conclusões relativas ao mercado em causa que extraiu na adopção da primeira decisão ainda são válidas à luz das circunstâncias de facto e de direito existentes no momento da adopção da segunda decisão. A consideração de que a verificação da existência de uma posição dominante resulta de uma análise da estrutura do mercado e da concorrência aí reinante no momento em que a Comissão adopta cada decisão não implica que a Comissão deva proceder em todos os casos a uma nova análise do mercado em causa no momento da adopção da decisão recorrida. A Comissão não tem que proceder a essa análise, uma vez que isso não é necessário para assegurar a execução do acórdão que anula a decisão.
(cf. n.os 243 a 245)
9. A posição dominante referida no artigo 82.° CE diz respeito a uma situação de poder económico detido por uma empresa, que lhe dá o poder de impedir a manutenção de uma concorrência efectiva no mercado em questão, ao possibilitar‑lhe a adopção de comportamentos independentes, numa medida apreciável, relativamente aos seus concorrentes, aos seus clientes e, por fim, relativamente aos consumidores. Essa posição, ao contrário de uma situação de monopólio ou de quase monopólio, não exclui a existência de alguma concorrência, mas permite à empresa que dela desfruta, se não determinar, pelo menos ter uma influência considerável nas condições em que se desenvolve a concorrência e, de qualquer modo, agir em grande medida em seu desrespeito e sem que isso lhe cause prejuízo.
A existência de uma posição dominante resulta geralmente da reunião de vários factores, que, isoladamente, não seriam necessariamente determinantes. A análise da existência de uma posição dominante no mercado em causa deve ser feita examinando primeiro a sua estrutura e, seguidamente, a situação da concorrência nesse mercado.
As grandes quotas de mercado constituem por si só, e salvo circunstâncias excepcionais, a prova da existência de uma posição dominante. Com efeito, a posse de uma quota de mercado extremamente importante coloca a empresa que a detém durante um certo período, em razão do volume de produção e de oferta que representa – sem que os detentores de quotas sensivelmente mais reduzidas tenham a possibilidade de satisfazer rapidamente a procura que pretenda afastar‑se da empresa que detém a quota mais importante –, numa situação de força, transformando‑a num parceiro obrigatório e que, só por isso, lhe assegura, pelo menos durante períodos relativamente longos, a independência de comportamento característica da posição dominante.
Assim, uma quota de mercado de 70 a 80% constitui, só por si, um indício claro da existência de uma posição dominante. Do mesmo modo, uma quota de mercado de 50% constitui, só por si, e salvo circunstâncias excepcionais, a prova da existência de uma posição dominante.
(cf. n.os 254 a 257)
10. Um sistema de descontos que tenha um efeito de encerramento do mercado será considerado contrário ao artigo 82.° CE se for aplicado por uma empresa em posição dominante. É esse o caso de um desconto de fidelidade concedido como contrapartida de um compromisso de um cliente se abastecer exclusivamente ou quase exclusivamente junto da empresa em posição dominante. Com efeito, esse desconto destina‑se a impedir, através da concessão de vantagens económicas, o abastecimento dos clientes nos produtores concorrentes. Ao barrar o acesso de concorrentes ao mercado, a conduta da recorrente pode ter repercussões nos fluxos comerciais e na concorrência no mercado comum.
(cf. n.os 296 a 297, 337)
11. Considera‑se geralmente que os sistemas de descontos pela quantidade, ligados apenas ao volume de compras efectuadas a uma empresa na situação de posição dominante não têm o efeito de encerramento proibido pelo artigo 82. Se o aumento da quantidade fornecida se traduzir num custo inferior para o fornecedor, este tem o direito de fazer o seu cliente beneficiar dessa redução através de uma tarifa mais favorável. É suposto, portanto, que os descontos pela quantidade reflictam os ganhos de eficiência e as economias de escala realizados pela empresa em posição dominante.
Daí resulta que um sistema de descontos cuja taxa de redução aumente em função do volume comprado não viola o artigo 82.° CE, a não ser que os critérios e as modalidades de concessão dos descontos demonstrem que o sistema não assenta numa contrapartida economicamente justificada, antes se destinando, como no caso de um desconto de fidelização e de objectivo, a impedir o abastecimento dos clientes na concorrência.
Para determinar o eventual carácter abusivo de um sistema de descontos pela quantidade, há que analisar, portanto, todas as circunstâncias, nomeadamente os critérios e as modalidades da concessão de descontos e apurar se esses descontos se destinam, através de uma vantagem que não assenta em qualquer prestação económica que a justifique, a suprimir ou restringir a possibilidade de o comprador escolher as suas fontes de abastecimento, impedir o acesso ao mercado dos concorrentes, aplicar a parceiros comerciais condições desiguais para prestações equivalentes ou reforçar a posição dominante através de uma concorrência falseada.
(cf. n.os 298 a 300)
12. O facto de uma empresa em posição dominante num mercado vincular compradores – ainda que a seu pedido – por uma obrigação ou uma promessa de se abastecerem na totalidade ou em parte considerável das suas necessidades exclusivamente junto dela constitui uma exploração abusiva de uma posição dominante na acepção do artigo 82.° CE, quer essa obrigação tenha sido estipulada sem mais, quer tenha a sua contrapartida na concessão de descontos. Isto vale também quando essa empresa, sem vincular os compradores por uma obrigação formal, aplica, quer por força de acordos celebrados com esses compradores, quer unilateralmente, um sistema de descontos de fidelidade, isto é, descontos ligados à condição de o cliente se abastecer exclusivamente, na totalidade ou em parte considerável das suas necessidades, na empresa em posição dominante. Com efeito, os compromissos de abastecimento exclusivo dessa natureza, com ou sem contrapartida de reduções ou de descontos de fidelidade com o fim de incentivar o comprador a abastecer‑se junto da empresa em posição dominante, são incompatíveis com o objectivo de uma concorrência não falseada no mercado comum, pois não assentam numa prestação económica que justifique esse encargo ou essa vantagem, antes se destinam a eliminar ou a restringir a possibilidade de o comprador escolher as suas fontes de abastecimento e a barrar o acesso dos outros produtores ao mercado.
(cf. n.° 315)
13. Na determinação do montante das coimas por infracção ao direito da concorrência, a Comissão deve não só ter em consideração a gravidade da infracção e as circunstâncias específicas do caso concreto, mas também o contexto em que a infracção foi cometida e zelar pelo carácter dissuasivo da sua acção, sobretudo para os tipos de infracção particularmente nocivos para a realização dos objectivos da Comunidade. Por outro lado, quando a Comissão adopta uma decisão em observância do Regulamento n.° 2988/74, relativo à prescrição quanto a procedimentos e execução de sanções no domínio do direito dos transportes e da concorrência e do princípio do prazo razoável, não pode ser acusada de ter demorado a adoptar a decisão recorrida. Nestas circunstâncias, não há que anular uma coima, aplicada por uma decisão adoptada na sequência da anulação de uma primeira decisão, por causa do tempo decorrido entre a adopção das duas decisões.
(cf. n.os 354 a 355)
14. Quando uma decisão da Comissão em matéria de concorrência é anulada por vício de forma, a Comissão pode adoptar nova decisão sem abrir novo procedimento administrativo. Uma vez que o conteúdo da nova decisão é quase idêntico ao da anterior e ambas têm os mesmos fundamentos, a nova decisão está sujeita, no âmbito da fixação do montante da coima, às normas em vigor no momento da adopção da primeira decisão. Com efeito, a Comissão retoma o procedimento na fase em que foi cometido o erro procedimental e adopta uma nova decisão, sem proceder a uma nova apreciação do caso à luz de normas que não existiam à data da adopção da primeira decisão.
(cf. n.os 366 a 368)
15. Para apreciar a gravidade das infracções às normas comunitárias da concorrência imputáveis a uma empresa, a fim de determinar um montante de coima que lhe seja proporcional, a Comissão pode ter em conta a duração particularmente longa de certas infracções, o número e a diversidade das infracções, que abrangeram a totalidade ou a quase totalidade dos produtos da empresa em causa, alguns dos quais afectando todos os Estados Membros, a gravidade particular de infracções integradas numa estratégia deliberada e coerente com vista, através de diversas práticas eliminatórias dos concorrentes e de uma política de fidelização dos clientes, a manter artificialmente ou a reforçar a posição dominante da empresa em mercados onde a concorrência já era limitada, os efeitos de abuso particularmente nefastos no plano da concorrência e a vantagem obtida pela empresa com as suas infracções.
A Comissão pode qualificar de particularmente graves as práticas de uma empresa em posição dominante que, ao conceder descontos dobre a tonelagem marginal aos seus clientes e ao celebrar acordos de fidelização com eles, fecha durante muito tempo as possibilidades de venda a todos os seus concorrentes e lesa duradouramente a estrutura do mercado, em prejuízo dos consumidores.
(cf. n.os 370, 372 e 374)
16. A análise da gravidade de uma infracção às normas comunitárias da concorrência deve ter em conta uma eventual reincidência. O conceito de reincidência, tal como entendido num certo número de ordenamentos jurídicos nacionais, implica que uma pessoa tenha cometido novas infracções após ter sido punida por infracções semelhantes. As orientações para o cálculo das coimas por força do n.° 2 do artigo 15.°, do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA vão no mesmo sentido quando se referem a uma «infracção do mesmo tipo». A Comissão não pode, portanto, imputar a circunstância agravante de reincidência a uma empresa que explora de forma abusiva a posição dominante que detém num mercado, na acepção do artigo 82.° CE por práticas de colusão anteriores ligadas ao artigo 81.° CE, aliás muito diferentes das que deram origem à infracção ao artigo 82 CE.°
(cf. n.os 377 a 381)
17. Em matéria de concorrência, quando uma empresa efectua despesas com a constituição das garantias para o pagamento das coimas aplicadas por uma decisão que vem a ser anulada pelo julgador comunitário e para demonstrar que essa decisão era ilegal, a Comissão não tem que tomar em conta essas despesas ao fixar a coima na decisão adoptada na sequência do acórdão, podendo a empresa pedir o seu reembolso em sede de acção de indemnização.
(cf. n.° 383)
18. Para se poder considerar que uma infracção às normas de concorrência do Tratado foi cometida deliberadamente, não é necessário que a empresa tenha tido consciência de infringir uma proibição aprovada por essas normas, basta que não pudesse ignorar que essa conduta tinha por objecto restringir a concorrência no mercado comum.
(cf. n.° 412)
19. Os elementos que integram o objectivo de um comportamento podem ter mais importância para efeitos de fixação do montante da coima do que os relativos aos seus efeitos.
(cf. n.° 435)
20. Embora o montante da coima aplicada por infracção às normas da concorrência deva ser proporcionado à duração da infracção e aos outros elementos que influem na apreciação da gravidade da infracção, tais como o proveito que a empresa em causa possa ter retirado das suas práticas, o facto de uma empresa não ter retirado qualquer benefício da infracção não pode obstar à aplicação de coimas, sob pena de as mesmas perderem a sua natureza dissuasora. Daí resulta que a Comissão não é obrigada, para fixar o montante das coimas, a tomar em consideração a inexistência de benefícios decorrentes da infracção. Além disso, a inexistência de benefícios financeiros ligados à infracção não pode ser considerada uma circunstância atenuante.
(cf. n.° 443)
21. A Comissão pode qualificar o carácter secreto como circunstância agravante na apreciação da gravidade da infracção 81.° CE ou 82.° CE. Não é por isso que se pode inferir que a inexistência de carácter secreto constitui uma circunstância atenuante.
(cf. n.os 446 a 447)
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)
25 de Junho de 2010 (*)
«Concorrência – Abuso de posição dominante – Mercado do sódio no Reino Unido – Decisão que dá por provada uma infracção ao artigo 82.° CE – Prescrição do poder da Comissão de aplicar coimas ou sanções – Prazo razoável – Formalidades essenciais – Caso julgado – Existência da posição dominante – Exploração abusiva da posição dominante – Afectação do comércio entre Estados‑Membros – Coima – Gravidade e duração da infracção – Circunstâncias atenuantes»
No processo T‑66/01,
Imperial Chemical Industries Ltd, anteriormente Imperial Chemical Industries plc, com sede em Londres (Reino Unido), representada inicialmente por D. Vaughan, D. Anderson, QC, S. Lee, barrister, S. Turner, S. Berwick e R. Coles, solicitors, e em seguida por M. Vaughan, Lee, Berwick e S. Ford, barrister,
recorrente,
contra
Comissão Europeia, representada por J. Currall e P. Oliver, na qualidade de agentes, assistidos por J. Flynn, QC, e C. West, barrister,
recorrida,
que tem por objecto, a título principal, um pedido de anulação da Decisão 2003/7/CE da Comissão, de 13 de Dezembro de 2000, relativa a um processo nos termos do artigo 82.° do Tratado CE (COMP/33.133 – D: Carbonato de sódio – ICI) (JO L 10, p. 33), e, a título subsidiário, um pedido de anulação ou de redução da coima aplicada à recorrente,
O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção),
composto por: A. W. H. Meij, presidente, V. Vadapalas (relator) e A. Dittrich, juízes,
secretário: K. Pocheć, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 26 de Junho de 2008,
profere o presente
Acórdão
Factos na origem do litígio
1 A recorrente, Imperial Chemical Industries Ltd, anteriormente Imperial Chemical Industries plc, é uma sociedade de direito do Reino Unido com actividade no sector químico. Na época dos factos, produzia, nomeadamente, carbonato de sódio.
2 O carbonato de sódio encontra‑se na natureza sob a forma de minério de trona (sódio natural) ou é obtido por processo químico (sódio sintético). O sódio natural é obtido pela trituração, purificação e calcinação do minério de trona. O sódio sintético resulta da reacção do sal comum e da pedra calcária pelo processo «amónia – sódio», criado pelos irmãos Solvay em 1863.
3 Em Abril de 1989, a Comissão das Comunidades Europeias procedeu a investigações aos diversos produtores de carbonato de sódio da Comunidade, nos termos do artigo 14, n.° 3, do Regulamento n.° 17, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos [81.° CE] e [82.° CE] (JO 1962, 13, p. 204), na versão aplicável à data dos factos.
4 Em 19 de Junho de 1989, a Comissão enviou um pedido de informações à recorrente nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17, ao qual ela respondeu em 14 de Setembro de 1989.
5 Em 19 de Fevereiro de 1990, a Comissão abriu oficiosamente um processo contra a recorrente, a Solvay e a Chemische Fabrik Kalk (a seguir «CFK»), ao abrigo do artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento n.° 17.
6 Em 13 de Março de 1990, a Comissão dirigiu uma comunicação de acusações à recorrente, à Solvay e à CFK. Cada uma delas recebeu unicamente as partes da comunicação de acusações relativas às infracções a elas respeitantes, às quais eram juntas as respectivas provas acusatórias.
7 A Comissão instruiu um único processo para todas as infracções objecto da comunicação de acusações
8 No que respeita ao presente processo, a Comissão concluiu, sob o título V da comunicação de acusações que a recorrente tinha abusado da sua posição dominante no mercado do carbonato de sódio no Reino Unido.
9 Em 31 de Maio de 1990, a recorrente apresentou as suas observações escritas em resposta às acusações da Comissão. Foi ouvida pela Comissão em 26 e 27 de Junho de 1990.
10 Em 19 de Dezembro de 1990, a Comissão adoptou a Decisão 91/300/CEE, relativa a um processo de aplicação do artigo [82.° CE] (IV/33.133 – D: Carbonato de sódio – ICI) (JO 1991, L 152, p. 40), em que deu por provado que a «ICI [tinha violado] o disposto no artigo [82.° CE] desde aproximadamente 1983 até ao presente através de um comportamento destinado a excluir ou a limitar seriamente a concorrência e que consistiu em: [c]onceder grandes descontos e outros incentivos financeiros relativos à tonelagem marginal com o objectivo de levar os clientes a comprarem[‑lhe] a totalidade, ou a quase totalidade, das quantidades necessárias à cobertura das suas necessidades; [a]ssegurar o acordo por parte dos clientes de que [lhe] comprariam a totalidade, ou a quase totalidade, das quantidades necessárias à satisfação das suas necessidades […]e/ou limitariam as suas compras de material a concorrentes a uma tonelagem específica; e [p]elo menos num caso, fazer depender a concessão dos descontos e de outros benefícios financeiros da condição de o cliente acordar em comprar[‑lhe] a totalidade das quantidades necessárias à satisfação das suas necessidades».
11 Nos termos do artigo 3.° da Decisão 91/300, «[foi] imposta a coima de 10 milhões de ecus à [recorrente] na sequência da infracção [apurada]».
12 Na mesma data, a Comissão adoptou a Decisão 91/297/CEE, relativa a um processo de aplicação do artigo [81.° CE] (IV/33.133 – A: Carbonato de sódio – Solvay, ICI) (JO 1991, L 152, p. 1), onde dava por provado que «a Solvay e [a recorrente] [tinham violado] o disposto no artigo [81.° CE] ao participarem desde 1 de Janeiro de 1973, e pelo menos até ao início do presente processo, numa prática concertada através da qual limitaram as suas vendas de carbonato de sódio na CEE aos respectivos mercados internos, nomeadamente, à Europa Ocidental Continental quanto à Solvay e ao Reino Unido e à Irlanda, quanto à [recorrente]». A Solvay e a recorrente foram condenadas numa coima de sete milhões de ecus, respectivamente.
13 Na mesma data ainda, a Comissão adoptou também a Decisão 91/298/CEE da Comissão, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CEE (IV/33.133 – B: Carbonato de sódio – Solvay, CFK) (JO 1991, L 152, p. 16). Nessa decisão, notificada por ofício de 1 de Março de 1991, considerou provado que «a Solvay e a CFK [tinham violado] o disposto no artigo [81.° CE] ao participar, desde aproximadamente 1987 até pelo menos final de 1990, num acordo de repartição dos mercados, nos termos do qual a Solvay garantia à CFK uma tonelagem mínima de vendas anuais de carbonato de sódio na Alemanha, calculada em função das vendas realizadas pela CFK em 1986, e compensava a CFK por qualquer défice, através da aquisição junto desta das tonelagens necessárias para que as suas vendas se situassem ao nível mínimo garantido». A Solvay e a CFK foram condenadas numa coima de três milhões de ecus e de um milhão de ecus, respectivamente.
14 Ainda na mesma data, a Comissão adoptou ainda a Decisão 91/299/CEE, relativa a um processo de aplicação do artigo [82.° CE] (IV/33.133 –C: Carbonato de sódio – Solvay) (JO 1991, L 152, p. 21), onde deu por provado que «a Solvay [tinha violado] o disposto no artigo [82.° CE] a partir aproximadamente de 1983 até ao presente através de um comportamento destinado a excluir ou a limitar significativamente a concorrência e que consistia: [na] conclusão de acordos com os clientes com a obrigação por parte destes de [lhe] comprarem a totalidade, ou uma grande percentagem, das quantidades necessárias à satisfação das suas necessidades em carbonato de sódio […] durante um período indeterminado ou excessivamente longo; [na] concessão de grandes descontos e de outros incentivos financeiros relativos à tonelagem marginal que vai para além da tonelagem contratual de base do cliente, com o objectivo de assegurar que este [lhe compraria] a totalidade, ou a quase totalidade, das quantidades necessárias à cobertura das suas necessidades […]; [e em] fazer depender a concessão dos descontos da condição de o cliente acordar em comprar[‑lhe] a totalidade das quantidades necessárias à cobertura das suas necessidades […]. A Solvay foi condenada numa coima de 20 milhões de ecus.
15 Em 2 de Maio de 1991, a Solvay pediu a anulação das Decisões 91/297, 91/298 e 91/299. Em 14 de Maio de 1991, a recorrente recorreu para o Tribunal Geral, pedindo a anulação das Decisões 91/297 e 91/300.
16 Pelo acórdão de 29 de Junho de 1995, ICI/Comissão (T‑37/91, Colect., p. II‑1901, a seguir «acórdão ICI II»), o Tribunal Geral julgou integralmente improcedente o fundamento relativo à violação do acesso ao processo, tendo depois anulado a Decisão 91/300 pelo facto de a autenticação da decisão ter sido efectuada depois da sua notificação, o que constitui uma preterição de uma formalidade essencial, na acepção do artigo 230.° CE.
17 Na mesma data, o Tribunal Geral anulou também a Decisão 91/297 (acórdãos Solvay/Comissão, T‑30/91, Colect., p. II‑1775, a seguir «acórdão Solvay I» e ICI/Comissão, T‑36/91, Colect., p. II‑1847, a seguir «acórdão ICI I»), na parte respeitante aos recorrentes nesses dois processo, por violação de acesso ao processo. Por outro lado, o Tribunal Geral anulou a Decisão 91/298 (acórdão Solvay/Comissão, T‑31/91, Colect., p. II‑1821, a seguir «acórdão Solvay II»), na parte respeitante à Solvay, e a Decisão 91/299 (acórdão Solvay/Comissão, T‑32/91, Colect., p. II‑1825, a seguir «acórdão Solvay III»), por autenticação irregular das decisões recorridas.
18 Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal de Justiça em 30 de Agosto de 1995, a Comissão recorreu dos acórdãos ICI II, referido no n.° 16, supra, Solvay II e Solvay III, referidos no n.° 17, supra.
19 Por acórdãos de 6 de Abril de 2000, Comissão/ICI (C‑286/95 P, Colect., p. I‑2341), e Comissão/Solvay (C‑287/95 P e C‑288/95 P, Colect., p. I‑2391), o Tribunal de Justiça negou provimento aos recursos interpostos dos acórdãos ICI II, referido no n.° 16, supra, Solvay II e Solvay III, referidos no n.° 17, supra.
20 Na terça‑feira 12 de Dezembro de 2000, uma agência noticiosa publicou um comunicado de imprensa com o seguinte teor:
«A Comissão Europeia aplicará uma coima às sociedades da indústria química Solvay SA e Imperial Chemical Industries plc […] quarta‑feira, por violação do direito da concorrência da União Europeia, declarou um porta‑voz esta terça‑feira.
As coimas pelo alegado abuso de posição dominante no mercado do carbonato de sódio tinham sido aplicadas originariamente há dez anos, tendo, porém sido anuladas pelo mais alto Tribunal de Justiça europeu, por razões processuais.
A Comissão adoptará novamente a mesma decisão na quarta‑feira, mas da forma correcta, declarou o porta‑voz.
A substância da decisão nunca foi impugnada pelas sociedades. Adoptaremos a mesma decisão, declarou.»
21 Em 13 de Dezembro de 2000, a Comissão adoptou a Decisão 2003/7/CE, relativa a um processo nos termos do artigo 82.° [CE] (COMP/33.133 – D: Carbonato de sódio – ICI) (JO L 10, p. 33), (a seguir «decisão recorrida»).
22 Na mesma data, a Comissão adoptou ainda as Decisões 2003/5/CE, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] COMP/33.133 – B: Carbonato de sódio Solvay, CFK) (JO 2003, L 10, p. 1) e 2003/6/CE, relativa a um processo de aplicação do artigo 82.° [CE] (COMP/33.133 – C: Carbonato de sódio – Solvay) (JO 2003, L 10, p. 10).
23 A decisão recorrida contém o seguinte dispositivo:
«Artigo 1.°
A [recorrente] violou o disposto no artigo [82.° CE] desde aproximadamente 1983 até, pelo menos, ao final de 1989 através de um comportamento destinado a excluir ou a limitar seriamente a concorrência e que consistiu em:
a) Conceder grandes descontos e outros incentivos financeiros relativos à tonelagem marginal com o objectivo de levar os clientes a comprarem[‑lhe] a totalidade, ou a quase totalidade, das quantidades necessárias à cobertura das suas necessidades;
b) Assegurar o acordo por parte dos clientes de que [lhe] comprariam a totalidade, ou a quase totalidade, das quantidades necessárias à satisfação das suas necessidades […] e/ou limitariam as suas compras de material a concorrentes a uma tonelagem específica;
c) Pelo menos num caso, fazer depender a concessão dos descontos e de outros benefícios financeiros da condição de o cliente acordar em [lhe] comprar […] a totalidade das quantidades necessárias à satisfação das suas necessidades.
Artigo 2.°
É aplicada uma coima de 10 milhões de euros à ICI na sequência da infracção especificada no artigo 1.°
[…]»
24 A decisão recorrida está redigida praticamente nos mesmos termos da Decisão 91/300. A Comissão unicamente introduziu algumas modificações de redacção e acrescentou uma nova parte intitulada «Processos perante o Tribunal de Primeira Instância e o Tribunal de Justiça».
25 Nessa nova parte da decisão recorrida, a Comissão, baseando‑se no acórdão do Tribunal Geral de 20 de Abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão (T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colect., p. II‑931, a seguir «acórdão PVC II do Tribunal Geral»), considerou que tinha «o direito de adoptar novamente uma decisão que [tivesse] sido anulada por vícios meramente processuais, […] sem dar início a um novo processo administrativo» e que «não [era] obrigada a realizar uma nova audição oral se o texto da nova decisão não [incluísse] outras objecções para além das formuladas na primeira decisão» (considerando 164).
26 A Comissão esclareceu também na decisão recorrida que o prazo de prescrição deveria ser prorrogado pelo período da pendência do recurso da Decisão 91/300 no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça, de acordo com o artigo 3.° do Regulamento (CEE) n.° 2988/74 do Conselho, de 26 de Novembro de 1974, relativo à prescrição quanto a procedimentos e execução de sanções no domínio do direito dos transportes e da concorrência da Comunidade Económica Europeia (JO L 319, p. 1; EE 08 F2 p. 41) (considerandos 169 e 170). Assim, tendo em conta as circunstâncias do caso, a Comissão considerou que tinha até ao final de 2003 para aprovar nova decisão (considerando 172). Indicou ainda que não existia qualquer violação do direito de defesa se a nova decisão fosse aprovada num prazo razoável (considerando 164).
27 No que respeita à infracção propriamente dita, a Comissão indicou na decisão recorrida que «[o] produto e a área geográfica em relação aos quais [devia] ser feita a análise do poder económico da [recorrente eram], pois, o mercado do carbonato de sódio no Reino Unido» (considerando 125).
28 Para apreciar o poder de mercado da recorrente para efeitos do presente processo, a Comissão referiu que a quota de mercado da recorrente no mercado em causa era tradicionalmente superior a 90% no período em causa, o que constituía por si só um indício de um grau significativo de poder de mercado (considerando 127). Seguidamente, analisou os factores económicos relevantes e concluiu na decisão recorrida que, em todos os momentos essenciais, a recorrente tinha ocupado uma posição dominante na acepção do artigo 82.° CE (considerandos 128 a 136).
29 Quanto ao abuso de posição dominante, a Comissão indicou na decisão recorrida que a recorrente tinha instituído uma «vinculação» de clientes através de um certo número de mecanismos, todos eles ao serviço do mesmo objectivo de exclusão (considerando 138). A esse respeito, referiu no considerando 139 da decisão recorrida que os descontos sobre a tonelagem marginal [«top slice»] se destinavam a excluir qualquer hipótese de concorrência efectiva, pelos meios seguintes:
– incentivar os clientes a comprar à recorrente a tonelagem marginal que poderiam obter se assim não fosse junto de um segundo fornecedor.
– minimizar ou neutralizar o impacto concorrencial da General Chemical ao conter a sua presença no mercado em termos de preços, quantidades e clientes dentro de limites que assegurassem a continuação do monopólio efectivo da recorrente;
– eliminar a Brenntag do mercado ou, pelo menos, minimizar o seu efeito concorrencial;
– minimizar o risco de os clientes se virarem para outras fontes de abastecimento,
– manter ou reforçar a situação de quase monopólio da recorrente no mercado do carbonato de sódio do Reino Unido.
30 Além disso, no considerando 147 da decisão recorrida, a Comissão precisou que os «acordos com estes grandes clientes significavam que estes estavam vinculados à [recorrente] em relação à quase totalidade das suas necessidades (e, pelo menos num caso, às suas necessidades totais), resultando diminuídos quaisquer efeitos concorrenciais da actuação de outros fornecedores».
31 A Comissão precisou também na decisão recorrida que outros incentivos financeiros consolidavam a posição dominante da recorrente de uma forma incompatível com o conceito de concorrência inerente ao artigo 82.° CE (considerando 149).
32 Quanto ao efeito no comércio entre Estados‑Membros, a Comissão indicou na decisão recorrida que, embora as medidas tomadas pela recorrente para assegurar a continuação da sua posição dominante e do seu verdadeiro monopólio no Reino Unido se dirigissem em primeiro lugar à concorrência directa proveniente do exterior da Comunidade (Estados Unidos e Polónia) e não tanto à dos outros produtores comunitários, os descontos sobre a tonelagem marginal e os outros mecanismos de exclusão de concorrentes tinham de ser examinados no contexto global do fenómeno da estrita separação entre mercados nacionais na Comunidade. A esse respeito, referiu que a recorrente tinha especial empenho em que a General Chemical permanecesse no Reino Unido enquanto alternativa de abastecimento e que se essa empresa se retirasse totalmente do mercado, os seus clientes poderiam ser encorajados a orientarem‑se para outras fontes de abastecimento, eventualmente mais baratas, na Europa Ocidental Continental. Além disso, referiu que a manutenção e o reforço da posição dominante da recorrente no mercado do Reino Unido afectavam a estrutura global da concorrência no mercado comum e asseguravam a conservação do status quo baseado na repartição dos mercados (considerandos 151 a 154).
33 Na decisão recorrida, a Comissão precisou que as infracções tinham sido especialmente graves, na medida em que «faziam parte de uma política deliberada destinada a consolidar o controlo da [recorrente] sobre o mercado do carbonato de sódio do Reino Unido numa medida que estava em absoluto conflito com os objectivos fundamentais do Tratado» e que «tinham especificamente por objectivo restringir ou prejudicar a actividade de certos concorrentes» (considerando 156).
34 A Comissão indicou ainda na decisão recorrida que a infracção tinha começado por volta de 1983 e que tinha prosseguido pelo menos até ao final de 1989. Finalmente, precisou ter tido em conta o facto de a recorrente ter abandonado o sistema de descontos pela tonelagem marginal a partir de 1 de Janeiro de 1990 (considerandos 160 e 161).
35 Por cartas de 18 de Janeiro, de 26 de Janeiro e 8 de Fevereiro de 2001, a recorrente apresentou à Comissão um pedido de acesso ao processo. Por ofício de 14 de Fevereiro de 2001, a Comissão indeferiu o pedido
Tramitação do processo
36 Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de Março de 2001, a recorrente interpôs o presente recurso.
37 Na sua petição, o recorrente pede ao Tribunal que ordene à Comissão que apresente os documentos que constam do seu processo, sob o n.° COMP/33.133.
38 Em 4 de Maio de 2001, o processo foi distribuído à Quarta Secção do Tribunal Geral, tendo sido nomeado um juiz relator..
39 Autorizadas pelo Tribunal Geral, a recorrente e a Comissão apresentaram as suas observações, respectivamente, em 18 e 23 de Dezembro de 2002, quanto às consequências que, para o presente processo, se poderiam extrair do acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Outubro de 2002, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão (C‑238/99 P, C‑244/99 P, C‑245/99 P, C‑247/99 P, C‑250/99 P a C‑252/99 P e C‑254/99 P, Colect., p. I‑8375, a seguir «acórdão PVC II do Tribunal de Justiça»). Nas suas observações, a recorrente informou o Tribunal Geral de que desistia da alegação de violação do princípio non bis in idem.
40 Tendo sido alterada a composição das Secções do Tribunal Geral a contar de 1 de Outubro de 2003, o juiz relator foi afectado à Primeira Secção, à qual, consequentemente, o presente processo foi distribuído em 8 de Outubro de 2003.
41 Tendo a composição das secções do Tribunal sido modificada a partir de 13 de Setembro de 2004, o juiz‑relator foi afectado à Quarta Secção, na sua nova composição, à qual, por conseguinte, o presente processo foi distribuído em 19 de Outubro de 2004.
42 Em 11 de Janeiro de 2005, o Tribunal Geral convidou a Comissão a apresentar na secretaria uma lista enumerativa detalhada de todos os documentos do procedimento administrativo. Essa lista deveria conter uma indicação sucinta que permitisse identificar o autor, a natureza e o conteúdo de cada documento. O Tribunal Geral pediu ainda à Comissão que lhe indicasse a quais desses documentos tinha sido facultado acesso à recorrente, precisando, se fosse esse o caso, quais os motivos que, no seu entender, se opunham à sua divulgação.
43 Por ofícios de 28 de Janeiro de 2005, a Comissão juntou na secretaria a lista enumerativa pedida pelo Tribunal Geral e indicou que os documentos a que a recorrente tinha tido acesso no procedimento administrativo eram os documentos em que ela tinha baseado as suas acusações e que já estavam, portanto, junto à comunicação de acusações. Indicou ainda que «lamentava informar o Tribunal Geral de que se [verificava então] que, seguramente depois de várias mudanças de instalações nos últimos dez anos, e não obstante aprofundadas buscas, lhe era impossível encontrar certos documentos» e que entendia ser seu dever informar de imediato o Tribunal Geral e a recorrente de que, «embora a lista junta às […] observações enumere todos os documentos do processo que estava na sua posse, os documentos em falta não se [encontravam] aí». Segundo a Comissão, o procedimento seguido em 1990 dizia respeito à jurisprudência então aplicável ao direito de acesso ao processo. Acrescentou que nada indicava nessa fase que havia documentos no processo que poderiam ter tido uma influência real na Decisão 91/300, mesmo tendo em conta a evolução da jurisprudência desde 1990.
44 Por carta de 13 de Abril de 2005, o Tribunal Geral convidou a recorrente a indicar os documentos da lista enumerativa que não lhe tivessem sido facultados no procedimento administrativo e que, na sua opinião, fossem susceptíveis de conter elementos que pudessem ser úteis à sua defesa.
45 Por carta de 9 de Maio de 2005, a recorrente salientou que alguns dos documentos em falta teriam sido úteis para a sua defesa. Indicou também quais dos documentos repertoriados na lista lhe pareciam úteis à sua defesa e que desejaria consultar. Afirma que esses documentos lhe poderiam ter permitido desenvolver a sua argumentação sobre a definição do mercado geográfico relevante, a existência da posição dominante, a exploração abusiva dessa posição dominante e a afectação do comércio entre Estados‑Membros.
46 Por carta de 7 de Junho de 2005, o Tribunal Geral convidou a Comissão a apresentar na secretaria do Tribunal Geral os documentos do procedimento administrativo contidos nos «sub‑processo» 2 a 38, 50 a 59 e 60 a 65, com excepção dos documentos internos. A Comissão foi também convidada a juntar versões não confidenciais ou resumos não confidenciais em vez dos documentos com segredos de negócios, das informações que lhe foram comunicadas no procedimento administrativo sob reserva de confidencialidade ou outras informações confidenciais. Além disso, a Comissão foi convidada a apresentar a versão completa, incluindo os elementos confidenciais, dos referidos documentos para efeitos de verificação da sua confidencialidade.
47 Em 21 de Junho de 2005, a Comissão pediu ao Tribunal Geral, tendo em conta a extensão dos documentos, para apresentar um único original, acompanhado de CD‑ROM. O pedido foi deferido em 4 de Julho de 2005.
48 Por ofício de 20 de Julho de 2005, a Comissão juntou na secretaria os documentos pedidos pelo Tribunal Geral. A secretaria enviou então à recorrente os CD‑ROM juntos pela Comissão.
49 Em 13 de Outubro de 2005, a recorrente apresentou as suas observações sobre a utilidade dos documentos do procedimento administrativo para a sua defesa. A Comissão respondeu às observações da recorrente em 26 de Outubro de 2007.
50 Por cessação de funções do juiz‑relator inicialmente designado, o presidente do Tribunal Geral, por decisão de 22 de Junho de 2006, nomeou um novo juiz‑relator.
51 Tendo sido alterada a composição das Secções do Tribunal de Primeira Geral a contar de 25 de Setembro de 2007, o juiz‑relator foi afectado à Sexta Secção, à qual, consequentemente, o presente processo foi atribuído em 8 de Novembro de 2007.
52 Em 13 de Fevereiro de 2008, por impedimento do juiz T. Tchipev, o presidente do Tribunal Geral, nos termos do artigo 32.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, nomeou o juiz A. Dittrich para completar a Secção.
53 Com base no relatório do juiz relator, o Tribunal (Sexta Secção) decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, colocou determinadas perguntas por escrito à recorrente e à Comissão. Ambas responderam no prazo fixado.
54 Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas orais do Tribunal na audiência de 26 e 27 de Junho de 2008.
55 Na audiência, o Tribunal Geral autorizou a recorrente a apresentar observações sobre as respostas escritas da Comissão de 16 de Junho de 2008. A recorrente apresentou as suas observações em 9 de Julho de 2008, tendo‑lhes a Comissão respondido em 3 de Setembro de 2008.
Pedidos das partes
56 A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:
– julgar admissível o recurso;
– declarar que, devido ao decurso do tempo, a Comissão não tinha competência para adoptar a decisão recorrida ou, a título subsidiário, que não tinha competência para lhe aplicar uma coima;
– anular a decisão recorrida;
– anular ou reduzir a coima aplicada no artigo 2.° da decisão recorrida;
– ordenar que a Comissão apresente todos os documentos internos relativos à adopção da decisão recorrida, nomeadamente a acta da reunião do colégio de comissários e todos os documentos anexos, bem como todos os documentos apresentados ao colégio de comissários nessa ocasião;
– ordenar que a Comissão apresente os documentos que constam do seu processo, sob o n.° COMP/33.133;
– condenar a Comissão nas despesas, incluindo os custos, com juros incluídos, de todas as garantias prestadas pela recorrente relacionadas com a coima aplicada na decisão recorrida.
57 A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:
– negar provimento ao recurso, por improcedente,
– indeferir o pedido de acesso ao processo apresentado pela recorrente;
– julgar inadmissível o pedido de prolação de despacho específico que a condene a pagar as despesas da recorrente, incluindo os custos e juros gerados pela constituição de qualquer garantia prestada pela coima ou, de qualquer forma, julgá‑lo improcedente;
– condenar a recorrente nas despesas.
Questão de direito
58 Os pedidos da recorrente visam, a título principal, a anulação da decisão recorrida e, a título subsidiário, a anulação ou a redução da coima que lhe foi aplicada por essa decisão.
1. Quanto ao pedido de anulação da decisão recorrida
59 A recorrente invoca, no essencial, seis fundamentos de anulação da decisão recorrida. Consistem, em primeiro lugar, em incompetência da Comissão para adoptar a decisão recorrida, em segundo, preterição de formalidades essenciais, em terceiro, errada apreciação do mercado em causa, em quarto, inexistência de posição dominante, em quinto, inexistência de abuso de posição dominante e, em sexto, não afectação do comércio entre Estados‑Membros.
Quanto ao primeiro fundamento, relativo a incompetência da Comissão para adoptar a decisão recorrida
60 O primeiro fundamento articula‑se em duas partes, relativas, respectivamente, à aplicação errada das regras da prescrição previstas no Regulamento n.° 2988/74 e à violação do princípio do prazo razoável.
Quanto à primeira parte, aplicação errada das regras da prescrição
– Argumentos das partes
61 A recorrente assinala que, mesmo que o prazo de prescrição previsto no Regulamento (CEE) n.° 2988/74 só seja aplicável à parte da decisão em que é aplicada a coima, é uma parte muito significativa dessa decisão.
62 Segundo a recorrente, o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 não tem por efeito prorrogar o prazo de prescrição num processo jurisdicional que tenha por objecto uma decisão final da Comissão. Entende que, com efeito, a prescrição só se suspende nos casos de recursos de decisões adoptadas durante o procedimento administrativo, isto é, as medidas de instrução, incluindo a dedução de uma comunicação de acusações ou a adopção de medidas ao abrigo dos poderes gerais de investigação conferidos pelo Regulamento n.° 17. A interpretação seguida pela Comissão na decisão recorrida é contrária à letra do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74. Afirma que a Comissão interpretou mal a expressão «quanto a procedimentos» que consta dos artigos 1.° a 3.° do Regulamento n.° 2988/74 e ignorou o facto de a sua decisão final ter que ser tomada antes do termo do prazo de prescrição. Além disso, a interpretação da Comissão deixa sem sentido o artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2988/74 e é a prova de uma má compreensão da estrutura desse regulamento, pois as implicações da prescrição de uma decisão são tratadas nos artigos 4.° a 6.°, e não nos artigos 1.° a 3.° Por último, essa interpretação é contrária ao princípio de que, para garantir a segurança jurídica, a Comissão deve pôr termo ao procedimento num prazo definido e adoptar a decisão final num prazo absoluto de dez anos contados do fim da infracção, salvo se tiver sido impedida de concluir as sua investigações por causa de recursos jurisdicionais interpostos das decisões preliminares. Ora, no caso, nada impediu a Comissão de concluir as suas investigações.
63 A recorrente entende que o critério seguido no acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, é incompatível com a afirmação acima feita no n.° 25 desse acórdão, segundo a qual o objectivo do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 é permitir a suspensão do prazo de prescrição quando a Comissão estiver impedida de intervir por uma razão objectiva que não lhe seja imputável. Com efeito, um recurso interposto de uma decisão final que aplica uma coima não impede a Comissão de agir, uma vez que essa decisão final é plenamente executória até ao momento em que seja anulada ou declarada inexistente pelo Tribunal Geral.
64 De qualquer forma, o entendimento de que a Comissão esteve impedida de agir não é aplicável ao recurso de segunda instância interposto do acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra. Com efeito, a Comissão teve toda a liberdade de adoptar novamente a Decisão 91/300 logo a seguir à prolação do acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra. O prazo suplementar resultante do recurso de segunda instância é, portanto, totalmente «imputável» à Comissão. Além disso, esse recurso é desprovido de objecto à luz do acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Junho de 1994, Comissão/BASF e o. (C‑137/92 P, Colect., p. I‑2555), e tendo em conta a intenção da Comissão de adoptar novamente a Decisão 91/300. Assim, a Comissão não pode beneficiar do seu «próprio erro de processo» e do atraso de cinco anos que causou.
65 Entende que a interpretação da Comissão é, de resto, contrária ao artigo 60.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, segundo o qual os recursos de segunda instância não têm efeito suspensivo. Segundo a recorrente, mesmo que se tome em consideração o processo no Tribunal Geral, o prazo de prescrição só teria ficado suspenso por um período de cerca de quatro anos, um mês e quinze dias. Consequentemente, a Comissão deveria ter adoptado novamente a Decisão 91/300 antes de Abril de 1999.
66 Além disso, resulta do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 que, em caso de recurso de segunda instância, não é a decisão da Comissão o objecto do processo, mas sim o acórdão do Tribunal Geral.
67 Por outro lado, no acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, não foi especificamente abordada a questão de saber se o recurso de segunda instância deve ser tomado em consideração para efeitos de suspensão do prazo de prescrição, na medida em que, no processo que deu origem a esse acórdão, a Comissão apenas tinha que determinar se o processo no Tribunal Geral suspendia o prazo de prescrição. Assim, as observações do Tribunal Geral quanto ao efeito do recurso de segunda instância na suspensão da prescrição mais não são do que um obiter dictum.
68 A recorrente acrescenta que uma decisão da Comissão que viole o seu próprio regulamento interno não pode ter o efeito de prorrogar o prazo de prescrição. Com efeito, a Comissão não autenticou correctamente a Decisão 91/300. Portanto, essa decisão não pode ter o efeito de estender a competência da Comissão para aplicar coimas depois do prazo de prescrição normal, fixado pelo Regulamento n.° 2988/74. Com efeito, esse resultado é contrário ao princípio segundo o qual uma parte não pode beneficiar com as suas próprias faltas e ao direito natural. Ora o atraso deve‑se inteiramente à acção da Comissão, pelo que, seja como for, esta não pode tentar beneficiar do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74.
69 Por último, entende que a interpretação dos artigos 2.° e 3.° do Regulamento n.° 2988/74 seguida no acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, permitiria à Comissão adoptar uma série de decisões sucessivas até meados do século XXI. Essa interpretação vai, portanto, contra a lei, na medida em que viola o direito a ser julgado num prazo razoável.
70 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
– Apreciação do Tribunal
71 A título preliminar, há que salientar que o Regulamento n.° 2988/74 institui uma regulamentação completa que rege em pormenor os prazos em que a Comissão, sem pôr em causa a exigência fundamental de segurança jurídica, pode aplicar coimas às empresas sujeitas a procedimentos de aplicação das normas comunitárias da concorrência (acórdãos do Tribunal Geral de 19 de Março de 2003, CMA CGM e o./Comissão, T‑213/00, Colect., p. II‑913, n.° 324, e de 18 de Junho de 2008, Hoechst/Comissão, T‑410/03, Colect., p. II‑881, n.° 223).
72 Assim, nos termos do artigo 1.°, n.° 1, alínea b), e n.° 2, e ainda do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2988/74, a prescrição dos procedimentos opera quando a Comissão não tenha aplicado uma coima ou uma sanção nos cinco anos seguintes ao ponto de partida do prazo de prescrição se não tiver entretanto ocorrido um acto interruptivo ou, no máximo, nos dez anos seguintes a esse mesmo ponto de partida se tiverem sido praticados actos interruptivos. Contudo, nos termos do artigo 2.°, n.° 3, desse regulamento, esse prazo de prescrição é prorrogado pelo período em que a prescrição tenha estado suspensa nos termos do artigo 3.° do mesmo regulamento (acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 140).
73 Nos termos do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, a prescrição de procedimentos suspende‑se enquanto a decisão da Comissão for objecto de um processo pendente no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias.
74 A referência no artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 a um «processo pendente no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias» deve ser entendida, desde a criação do então Tribunal de Primeira Instância, no sentido de que se refere, em primeiro lugar a um processo aí pendente, na medida em que os recursos de decisões que aplicam sanções ou coimas no domínio da concorrência são da sua competência.
75 No caso, a recorrente não contesta que, sem prejuízo da questão da prescrição nos termos do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, o período quinquenal de prescrição teria tido o seu termo em 1995.
76 Portanto, há que analisar unicamente se, nos termos do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, a Comissão podia adoptar a decisão recorrida em 13 de Dezembro de 2000.
77 A esse respeito, resulta do n.° 157 do acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, que, a prescrição, na acepção do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, suspende‑se enquanto a decisão em causa for objecto de um processo pendente «no Tribunal [Geral] e no Tribunal de Justiça». Por conseguinte, no caso, a prescrição ficou suspensa durante todo o tempo do processo no Tribunal Geral e durante todo o tempo do processo no Tribunal de Justiça, sem que seja necessário decidir sobre o período entre a prolação do acórdão do Tribunal Geral e o recurso para o Tribunal de Justiça.
78 Ora, na sequência do recurso interposto pela recorrente no Tribunal Geral em 14 de Maio de 1991 e do acórdão proferido em 29 de Junho de 1995, e, posteriormente, na sequência do recurso de segunda instância interposto no Tribunal de Justiça pela Comissão, em 30 de Agosto de 1995, e do acórdão proferido em 6 de Abril de 2000, a prescrição esteve suspensa por um período mínimo de oito anos, oito meses e vinte e dois dias, como acertadamente refere a Comissão no considerando 171 da decisão recorrida.
79 Consequentemente, após essa suspensão da prescrição, não correu nenhum período de mais de cinco anos desde o fim das infracções em causa ou desde uma qualquer interrupção da prescrição até à adopção da decisão recorrida em 13 de Dezembro de 2000.
80 Portanto, a decisão recorrida foi adoptada no respeito das regras da prescrição instituídas pelo Regulamento n.° 2988/74.
81 Nenhum dos argumentos da recorrente é susceptível de pôr isto em causa.
82 Em primeiro lugar, de modo nenhum resulta dos termos dos artigos 2.° e 3.° do Regulamento n.° 2988/74 que a «decisão da Comissão» a que se refere o artigo 3.°, objecto de um processo judicial que seja causa de suspensão da prescrição do procedimento, só pode ser um dos actos interruptivos dessa prescrição, referidos no artigo 2.° e cuja lista é taxativa (acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 141. Com efeito, o artigo 3.° protege a Comissão contra o efeito da prescrição nas situações em que tenha que aguardar a decisão do tribunal comunitário, no âmbito de processos cuja tramitação não domina, antes de saber se o acto recorrido está ou não ferido de ilegalidade. O artigo 3.° respeita, portanto, a casos em que a inacção da instituição não é consequência de falta de diligência. Ora, essas hipóteses concretizam‑se tanto em caso de recurso dos actos interruptivos enumerados no artigo 2.° do Regulamento n.° 2988/74 susceptíveis de impugnação como em caso de recurso de uma decisão que aplique uma coima ou uma sanção. Nestas condições, tanto a letra do artigo 3.° como a sua finalidade cobrem tanto os recursos interpostos dos actos a que se refere o artigo 2.° que sejam recorríveis como os recursos da decisão final da Comissão. Consequentemente, um recurso interposto da decisão final que aplica sanções suspende a prescrição em matéria de procedimento até que o tribunal julgue definitivamente a causa (acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.os 144 a 147).
83 Em segundo lugar, a recorrente alega que a interposição de recurso de uma decisão que aplica coimas em nada impede a Comissão de adoptar uma decisão desse tipo. Contudo, essa interpretação implica, a ser seguida, que a instituição revogue a decisão impugnada e a substitua por outra decisão que tenha em conta o conteúdo da impugnação. Equivaleria a negar à Comissão o próprio direito de obter do tribunal comunitário a eventual confirmação da legalidade da decisão recorrida (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 149).
84 Em terceiro lugar, a recorrente não pode alegar que uma decisão que aplica coimas é plenamente executória até ter sido anulada por via judicial. Por definição, os actos de execução de uma decisão que punem uma infracção não podem ser considerados actos de instrução ou de procedimento contra a infracção. Esses actos, cuja legalidade está, além disso, subordinada à da decisão objecto de recurso, não podem, portanto, produzir qualquer efeito interruptivo da prescrição do procedimento em caso de anulação da decisão impugnada judicialmente (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 150).
85 Em quarto lugar, refira‑se que o artigo 60.° do Estatuto do Tribunal de Justiça e o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 têm um âmbito de aplicação diferente. O facto de um recurso de segunda instância não ter efeito suspensivo não é susceptível de privar de qualquer efeito útil o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, que respeita a situações em que a Comissão tem que aguardar a decisão do tribunal comunitário. Não procede, pois, a tese da recorrente de que a Comissão não podia ter em conta o período da pendência de um recurso de segunda instância no Tribunal de Justiça, pois isso levaria a privar o acórdão do Tribunal de Justiça em segunda instância da sua razão de ser e dos seus efeitos.
86 Em quinto lugar, a recorrente não pode alegar que, na sequência da anulação da Decisão 91/300 por falta de autenticação, a Comissão não pode beneficiar da sua própria falta ao aplicar uma coima depois do termo do prazo de prescrição quinquenal fixado no Regulamento n.° 2988/74. Com efeito, qualquer anulação de um acto adoptado pela Comissão é‑lhe necessariamente imputável, na medida em que traduz um erro seu. Portanto, excluir a suspensão da prescrição do procedimento quando o recurso leva a reconhecer um erro imputável à Comissão deixaria sem qualquer sentido o artigo 3.° desse regulamento. É o próprio facto de estar pendente um recurso no Tribunal Geral ou no Tribunal de Justiça que justifica a suspensão, e não as conclusões a que esses tribunais cheguem nos seus acórdãos (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 153).
87 Em sexto lugar, o recurso de anulação destina‑se a que o Tribunal Geral verifique se o acto recorrido está ou não ferido de ilegalidade (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 144).
88 Em sétimo lugar, há que acrescentar que a interpretação do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 proposta pela recorrente conduz a sérias dificuldades práticas. Com efeito, se a Comissão tiver que adoptar uma nova decisão na sequência da anulação de uma decisão pelo Tribunal Geral, sem aguardar o acórdão do Tribunal de Justiça, existe o risco de coexistirem duas decisões com o mesmo objecto no caso de o Tribunal de Justiça anular o acórdão do Tribunal Geral.
89 Em oitavo lugar, vai contra as exigências da economia processual administrativa impor à Comissão que, unicamente para evitar a prescrição, adopte nova decisão antes de saber se a decisão inicial está ou não ferida de ilegalidade.
90 Resulta do exposto que não pode ser acolhida a primeira parte do primeiro fundamento.
Quanto à segunda parte, violação do princípio do prazo razoável
– Argumentos das partes
91 A recorrente afirma que, independentemente das questões de prescrição, o decurso do tempo desde as alegadas infracções afecta a competência da Comissão para adoptar toda a decisão recorrida e não apenas a parte relativa às coimas.
92 Baseando‑se no n.° 121 do acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, e no princípio do prazo razoável, a recorrente entende que é necessário verificar se a Comissão adoptou a decisão recorrida num prazo razoável no termo dos procedimentos administrativos em matéria de concorrência.
93 Segundo a recorrente, pode‑se presumir que a Comissão violou o princípio do prazo razoável quando decorreram mais de onze anos e meio num processo entre a abertura das investigação e a adopção da decisão recorrida.
94 A recorrente assinala que, se os processos no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça duraram 105 meses no total, a Comissão levou mais de 35 meses para a adopção da sua decisão, incluindo os 9 meses entre o acórdão Comissão/ICI, referido no n.° 19, supra, e a decisão recorrida. Além disso, é legítimo levar em conta a duração do processo judicial, em particular quando esse processo é relativo a uma decisão diferente e é anterior à decisão recorrida.
95 Segundo a recorrente, é particularmente inaceitável ter em consideração a duração do processo no Tribunal de Justiça. Na sequência dos acórdãos ICI II, referido no n.° 16, supra, e Comissão/BASF, referido no n.° 64, supra, a Comissão tinha consciência de que a Decisão 91/300 estava viciada por falta de autenticação. Se a Comissão tinha a intenção de adoptar novamente a sua decisão, deveria tê‑lo feito nesse momento, em vez de interpor recurso para o Tribunal de Justiça, que teve o efeito de atrasar a adopção da referida decisão em cinco anos e meio.
96 Baseando‑se no acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem Garyfallou AEBE c. Grécia de 27 de Setembro de 1997 (Colectânea dos acórdãos e decisões 1997‑V, p. 1821), a recorrente entende que é necessário analisar todo o processo para verificar se foi julgado num prazo razoável.
97 Por outro lado, a recorrente alega que o decurso do tempo desde as alegadas infracções a impede de exercer plenamente os seus direitos de defesa. Antes de mais, alega que vendeu a sua divisão «carbonato de sódio» a um comprador independente, em 6 de Outubro de 1991, e que já não tem actividade no mercado do carbonato de sódio no Reino Unido. Seguidamente, alega que os membros do seu pessoal encarregues desse assunto nessa época deixaram a empresa e já não estão disponíveis para lhe prestar a assistência necessária. Além disso, o decurso do tempo desde as alegadas infracções agrava o seu prejuízo financeiro, aumentando, por exemplo, os custos suportados para garantir as despesas e/ou os efeitos dos juros de mora. De qualquer forma, o acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, é contrário à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, segundo a qual a protecção do artigo 6.°, n.° 1, da Convenção para a protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), não depende da prova de que o prazo causou um dano efectivo aos interesses do recorrente. A violação de um dever fundamental da CEDH só pode levar à anulação da decisão recorrida e não apenas ao pagamento de uma indemnização.
98 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
– Apreciação do Tribunal Geral
99 A título preliminar, há que lembrar que o princípio do prazo razoável tem que ser respeitado em matéria de concorrência, nos procedimentos administrativos abertos nos termos do Regulamento n.° 17 susceptíveis de conduzir à aplicação das sanções previstas nesse diploma e no processo jurisdicional (acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 179).
100 Em primeiro lugar, a recorrente alega que a duração do procedimento administrativo, no seu conjunto, isto é, entre a abertura da investigação e a adopção da decisão recorrida, excedeu o prazo razoável.
101 Este argumento deve ser rejeitado.
102 Com efeito, no âmbito da análise de uma alegação de violação do princípio do prazo razoável, há que fazer uma distinção entre o procedimento administrativo e o processo jurisdicional. Assim, o período em que o juiz comunitário analisou a legalidade da Decisão 91/300 e a validade do acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, não pode ser tido em conta na determinação da duração do procedimento na Comissão (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, n.° 123).
103 Em segundo lugar, a recorrente critica a duração do procedimento administrativo entre a prolação do acórdão Comissão/ICI, referido no n.° 19, supra, e a adopção da decisão recorrida.
104 A esse respeito, há que lembrar que esse período começou em 6 de Abril de 2000, data da prolação do acórdão Comissão/ICI, referido no n.° 19, supra, e teve o seu termo em 13 de Dezembro de 2000, com a adopção da decisão recorrida. Essa etapa do procedimento administrativo durou, portanto, oito meses e sete dias.
105 Nesse período, a Comissão apenas procedeu a modificações de forma da Decisão 91/300, nomeadamente com a introdução de uma nova passagem relativa aos «Processos perante o Tribunal de Primeira Instância e o Tribunal de Justiça», sobre a apreciação dos prazos de prescrição. Por outro lado, a adopção da decisão recorrida não foi precedida de qualquer acto de instrução suplementar, tendo‑se a Comissão baseado nos resultados do inquérito levado a cabo dez anos antes. Contudo, há que admitir que, mesmo nessas condições, certas investigações e concertações na administração podem ser indispensáveis para se chegar a esse resultado.
106 Nessa perspectiva, não há que considerar que o prazo de oito meses e sete dias decorrido entre a prolação do acórdão Comissão/ICI, referido no n.° 19, supra, e a adopção da decisão recorrida não é razoável.
107 Em terceiro lugar, a recorrente critica, no essencial, a duração do procedimento administrativo que levou à adopção da Decisão 91/300 (v. n.° 94, supra).
108 Com efeito, mesmo embora se deva ter em conta a fase do procedimento administrativo posterior e anterior à comunicação de acusações (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Setembro de 2006, Nederlandse Federatieve Vereniging voor de Groothandel op Elektrotechnisch Gebied/Comissão, C‑105/04 P, Colect., p. I‑8725, n.° 51), refira‑se que esse período não é excessivamente longo, à luz das investigações efectuadas a partir de Abril de 1989, dos pedidos de informações efectuados na sequência disso e da abertura oficiosa do procedimento em 19 de Fevereiro de 1990. Nestas condições, a duração do procedimento administrativo que levou à Decisão 91/300 não pode ser considerada não razoável.
109 Diga‑se ainda que, de qualquer forma, a violação do princípio do respeito de um prazo razoável só justifica a anulação de uma decisão tomada no termo de um procedimento administrativo em matéria de concorrência se implicar também uma violação dos direitos de defesa da empresa em causa. Com efeito, quando não se prove que o decurso excessivo do tempo afectou a capacidade de as empresas em questão se defenderem efectivamente, o desrespeito do princípio de um prazo razoável não tem influência na validade do procedimento administrativo (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, n.° 122).
110 A esse respeito, a recorrente alega ter‑lhe sido difícil exercer os seus direitos de defesa, uma vez que vendeu a sua divisão «carbonato de sódio» a um comprador independente, em 6 de Outubro de 1991, já não tem actividade no mercado do carbonato de sódio no Reino Unido e não pode contactar os membros do seu pessoal encarregues do assunto nessa época por terem deixado a empresa, para obter a assistência necessária.
111 Contudo, a Comissão não procedeu a qualquer acto de instrução entre a prolação do acórdão Comissão/ICI, referido no n.° 19, supra, e a decisão recorrida.
112 Portanto, relativamente ao primeiro período que levou à Decisão 91/300 e que não apresentou qualquer inconveniente do ponto de vista do exercício dos direitos de defesa, a Comissão não teve em conta nenhum elemento novo que necessitasse do exercício de um direito de defesa.
113 Nestas circunstâncias, os direitos de defesa da recorrente não foram violados.
114 Em quarto lugar, quanto ao processo jurisdicional, há que lembrar que o princípio geral de direito comunitário nos termos do qual qualquer pessoa tem direito a um processo equitativo, que se inspira no artigo 6.°, n.° 1, da CEDH, nomeadamente o direito a um processo num prazo razoável, é aplicável no âmbito do recurso judicial de uma decisão da Comissão que aplica a uma empresa coimas por violação do direito da concorrência. O carácter razoável do prazo é apreciado em função das circunstâncias concretas de cada processo, designadamente, a importância do litígio para o interessado, a complexidade do processo, bem como o comportamento do recorrente e das autoridades competentes. A lista destes critérios não é taxativa e a apreciação do carácter razoável do prazo não exige uma análise sistemática das circunstâncias da causa à luz de cada um deles quando a duração do processo se revelar justificada à luz de apenas um. Assim, a complexidade do processo pode justificar um prazo à primeira vista demasiado longo (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Janeiro de 2007, Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão, C‑403/04 P e C‑405/04 P, Colect., p. I‑729, n.os 115 a 117 e jurisprudência aí referida).
115 Por outro lado, no acórdão de 17 de Dezembro de 1998, Baustahlgewebe/Comissão (C‑185/95 P, Colect., p. I‑8417), depois de verificar que o Tribunal Geral tinha violado as exigências ligadas ao respeito do prazo razoável, o Tribunal de Justiça, por razões de economia processual e para garantir uma solução imediata e efectiva contra tal irregularidade processual, julgou procedente o fundamento relativo à duração excessiva do processo, para efeitos da anulação do acórdão recorrido, na medida em que fixava o montante da coima aplicada à recorrente em 3 milhões de ecus. Sem qualquer indício de que a duração do processo tivesse influenciado a decisão da causa, o Tribunal de Justiça considerou que esse fundamento não podia levar à anulação integral do acórdão recorrido, mas que um montante de 50 000 ecus constituía uma satisfação equitativa, em razão da excessiva duração do processo, pelo que reduziu o montante da coima aplicada à empresa em causa.
116 Por conseguinte, na falta de qualquer indício de que a duração do processo tivesse influenciado a decisão da causa, um eventual excesso do prazo razoável pelo tribunal comunitário no caso presente, mesmo admitindo‑o demonstrado, não tem qualquer influência da legalidade da decisão recorrida. Esta solução foi aplicada no n.° 140 do acórdão do Tribunal Geral de 17 de Dezembro de 2009, Solvay/Comissão, T‑57/01, não publicado na Colectânea).
117 Diga‑se ainda que, na petição, a recorrente não formulou qualquer pedido de indemnização.
118 Portanto, há que julgar improcedente a segunda parte do primeiro fundamento e, consequentemente, todo o primeiro fundamento.
Quanto ao segundo fundamento, preterição de formalidades essenciais
119 O segundo fundamento articula‑se, no essencial, em cinco partes, relativas, em primeiro lugar, à ilegalidade das fases preparatórias da Decisão 91/300, em segundo lugar, ao excesso de tempo entre o procedimento administrativo e a adopção da decisão recorrida, em terceiro lugar, à obrigação de proceder a novas diligências processuais, em quarto lugar, à violação do direito de acesso ao processo e, em quinto lugar, a uma violação do artigo 253.° CE.
Quanto à primeira parte, ilegalidade das fases preparatórias da Decisão 91/300
– Argumentos das partes
120 A recorrente alega que as diligências processuais efectuadas pela Comissão antes da adopção de uma decisão representam apenas fases preparatórias e não são, só por si, susceptíveis de recurso de anulação. Resulta da natureza acessória das fases processuais anteriores à adopção dessa decisão que, ao contrário do que refere o n.° 189 do acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, a anulação dessa decisão deve levar igualmente à anulação dessas fases processuais anteriores. No caso, a Comissão não pode, pois, invocar essas fases processuais anteriores à Decisão 91/300 como fases processuais anteriores necessárias à adopção da decisão recorrida.
121 Além disso, segundo a recorrente, a Comissão abriu um único procedimento administrativo para as presumíveis infracções aos artigos 81.° CE e 82.° CE. Os dois processos foram separados unicamente na fase da adopção das Decisões 91/297 e 91/300. A recorrente lembra igualmente que, no acórdão ICI I, referido no n.° 17, supra, o Tribunal Geral considerou que os direitos de defesa tinham sido violados na fase do procedimento administrativo. Ora, essa decisão teve consequências na Decisão 91/300, pois a Comissão seguiu exactamente o mesmo procedimento administrativo. Assim, no processo que deu origem ao acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, o Tribunal Geral deveria ter concluído pela anulação da Decisão 91/300 por violação dos direitos de defesa.
122 Na réplica, a recorrente acrescenta que, no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, o Tribunal Geral se revelou muito crítico face à análise do mercado em causa feita pela Comissão, que consistiu em dissociar os elementos de prova das alegações relativas ao artigo 81.° CE e ao artigo 82.° CE, e a abrir processos distintos.
123 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
– Apreciação do Tribunal Geral
124 A título preliminar, há que lembrar que a Decisão 91/300 foi anulada por vício de forma, isto é, a falta de autenticação, que respeitava exclusivamente às modalidades de adopção definitiva dessa decisão pela Comissão.
125 Ora, segundo jurisprudência assente, a anulação de um acto comunitário não afecta necessariamente os actos preparatórios, podendo, em princípio, o procedimento destinado a substituir o acto anulado ser retomado no ponto exacto em que a ilegalidade ocorreu (acórdão do Tribunal de Justiça de 12 de Novembro de 1998, Espanha/Comissão, C‑415/96, Colect., p. I‑6993, n.os 31 e 32, e acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 73).
126 No caso, uma vez que o vício processual ocorreu na última fase da adopção da Decisão 91/300, a anulação não afectou a validade das medidas preparatórias dessa decisão, anteriores ao momento em que se verificou o vício (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 75).
127 Além disso, quanto ao argumento da recorrente de que, no acórdão ICI I, referido no n.° 17, supra, o Tribunal Geral anulou a Decisão 91/297 por violação dos direitos de defesa, há que lembrar que, no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, na origem da presente lide, o Tribunal Geral analisou também de forma detalhada o fundamento relativo à violação dos direitos de defesa e que o julgou integralmente improcedente (v. n.° 73). Seguidamente o Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso interposto desse acórdão.
128 Além disso, mesmo embora o procedimento administrativo seja comum aos processos COMP/33.133, as Decisões 91/297 e 91/300 respeitam a infracções diferentes, em mercados diferentes. Ora, a violação dos direitos de defesa deve ser examinada em função das circunstâncias específicas de cada caso concreto, uma vez que depende essencialmente das acusações em que a Comissão se baseia para demonstrar a infracção imputada à empresa em causa (acórdãos ICI I, n.° 17, supra, referido no n.° 70, e ICI II, referido no n.° 25, supra, n.° 50; v. ainda, acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., p. I‑123, n.° 127).
129 Assim, há que julgar improcedente a primeira parte do segundo fundamento.
Quanto à segunda parte, excesso de tempo entre o procedimento administrativo e a adopção da decisão recorrida
– Argumentos das partes
130 A recorrente alega que decorreu um período de dez anos entre as fases processuais anteriores à adopção das Decisões 91/297 e 91/300, por um lado, a e decisão recorrida, por outro, o que constitui uma denegação da protecção dos direitos de defesa. Entende que as empresas devem ter a oportunidade de exprimir o seu ponto de vista e de defender efectivamente os seus interesses. Assim, só é possível adoptar decisões, em particular as que aplicam coimas, num prazo razoável após as empresas terem podido dar a conhecer as suas observações, o que não é aqui o caso.
131 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
– Apreciação do Tribunal Geral
132 Em primeiro lugar, como referido na análise da primeira parte do primeiro fundamento, a prescrição prevista no artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 esteve suspensa durante todo o tempo do processo no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça na sequência da interposição do recurso do acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra. Portanto, não se pode criticar a Comissão por ter aguardado que o Tribunal Geral e o Tribunal de Justiça decidissem para adoptar a decisão recorrida. A esse respeito, o facto de a Comissão não ter adoptado a decisão recorrida na pendência do processo no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça justifica‑se pelo respeito do processo jurisdicional e dos futuros acórdãos.
133 Em segundo lugar, tal como resulta da análise da segunda parte do primeiro fundamento, a Comissão não violou o princípio do prazo razoável ao adoptar a decisão recorrida em 13 de Dezembro de 2000.
134 Em terceiro lugar, resulta da análise da terceira parte do segundo fundamento, adiante efectuada (n.os 151, 153, e 168), que, no caso, a Comissão não tinha que efectuar novas diligências processuais após a anulação da Decisão 91/300, devida a um vício de forma exclusivamente relativo às modalidades de adopção definitiva da referida decisão.
135 Portanto, não se pode criticar a Comissão por não ter dado à recorrente a oportunidade de apresentar novamente os seus argumentos após a anulação da Decisão 91/300.
136 Consequentemente, há que julgar improcedente a segunda parte do segundo fundamento.
Quanto à terceira parte, violação do dever de proceder a novas diligências processuais
– Argumentos das partes
137 A recorrente alega que a Comissão deveria ter procedido a novas diligências processuais antes da adopção da decisão recorrida.
138 Em primeiro lugar, afirma que a Comissão lhe deveria ter dirigido uma nova comunicação de acusações. Entende que as alegações contidas na comunicação de acusações de 1990 foram feitas no âmbito da «acusação segundo a qual ‘a compartimentação dos mercados’ entre o Reino Unido e a Europa Ocidental continental e o princípio do ‘mercado nacional’ [eram] a consequência de um acordo ou de uma prática concertada entre a Solvay e [ela]». Ora, a recorrente assinala que a decisão da Comissão sobre esse cartel foi anulada pelo Tribunal Geral e que não foi objecto de quaisquer outros procedimentos a esse respeito. Portanto, a recorrente entende que tinha o direito de receber, antes da adopção da decisão recorrida, uma comunicação de acusações que não reproduzisse a alegação de concertação. Essa comunicação de acusações deveria expor igualmente as acusações da Comissão à luz da evolução do direito entre 1990 e 2000, nomeadamente no que respeita à definição do mercado em causa.
139 Em segundo lugar, a recorrente afirma que a Comissão deveria tê‑la ouvido novamente e dado a oportunidade de desenvolver os seus argumentos. Entende que, no acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, este não podia invocar o facto de nenhuma nova acusação ter sido formulada. Com efeito, as empresas deveriam ter a oportunidade de apresentar as suas observações sobre todas as acusações que lhe são feitas, nomeadamente à luz de novas questões que pudessem ser importantes para a sua defesa.
140 Segundo a recorrente, o direito de audiência não respeita só aos factos mas também ao direito, como reconheceu o Tribunal Geral nos acórdãos ICI I, referido no n.° 17, supra, e PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra. Além disso, nos acórdãos de 3 de Outubro de 1991, Itália/Comissão (C‑261/89, Colect., p. I‑4437), e de 4 de Fevereiro de 1992, British Aerospace e Rover/Comissão (C‑294/90, Colect., p. I‑493), o Tribunal de Justiça reconheceu que o direito de audiência se aplica antes da adopção de uma segunda decisão substancialmente idêntica à primeira. Ora, no caso, vários elementos, a saber, o facto de ter deixado o mercado em causa em 1991, a anulação da Decisão 91/297 e as conclusões da decisões antidumping nos anos 90, teriam influência na forma de analisar as acusações.
141 Por outro lado, o direito de nova audiência resulta das normas de processo do Tribunal Geral. Com efeito, no caso de o Tribunal de Justiça remeter um processo ao Tribunal Geral, o artigo 119.°, n.° 1, do Regulamento de Processo dá às partes o direito de apresentar observações escritas, não obstante a fase escrita ter sido encerrada. Do mesmo modo, o artigo 4.° do protocolo n.° 7 à CEDH dispõe que uma nova decisão, adoptada na sequência de uma decisão final anterior, só pode ser adoptada se o processo for reaberto de acordo com a lei e o processo penal do Estado em causa.
142 A recorrente infere daí que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar que os seus direitos de defesa tinham sido adequadamente protegidos pela faculdade que lhe tinha sido dada de ser ouvida no procedimento administrativo.
143 Em terceiro lugar, a recorrente lembra o papel essencial do consultor‑auditor, que se assegura de que, antes da adopção de uma decisão, as partes puderam exercer plenamente os seus direitos de defesa e que os elementos essenciais de direito ou de facto que suscitaram foram comunicados ao Director‑Geral da concorrência, aos membros da Comissão e ao comité consultivo. Alega ainda que, visto os seus direitos de defesa envolverem a faculdade de ser novamente ouvida antes da adopção da decisão recorrida, deveria também ter beneficiado do direito à intervenção do consultor‑auditor, de que foi privada.
144 Em quarto lugar, a recorrente entende que, tendo em conta o seu direito a ser novamente ouvida antes da adopção da decisão recorrida, a Comissão deveria ter também consultado novamente o comité consultivo. No seu acórdão PVC II, referido no n.° 25, supra, o Tribunal Geral decidiu erradamente que a consulta do comité consultivo só era necessária nas situações em que as empresas tivessem que ser ouvidas. Além disso, resulta do Regulamento n.° 17 que é necessária uma consulta separada por cada decisão distinta, independentemente da questão de saber se as empresas foram também ouvidas e do grau de semelhança das decisões. Por conseguinte, mesmo que a decisão recorrida apenas tivesse alterações de redacção face à Decisão 91/300, a Comissão deveria ter consultado novamente o comité consultivo antes da adopção da decisão recorrida. Além disso, a composição do comité consultivo foi indubitável e substancialmente alterada e o seu parecer em 2000 não teria coincidido necessariamente com o de 1990.
145 Em quinto lugar, a recorrente alega que, na adopção da decisão recorrida, o colégio dos comissários deveria ter tido a oportunidade de analisar todos os factos, circunstâncias e questões jurídicas relevantes nesse momento. Contudo, não o pôde fazer pois a Comissão não ouviu novamente as empresas nem consultou novamente o comité consultivo. A recorrente infere daí que se o colégio dos comissários tivesse tido conhecimento de todos os factos, poderia não ter chegado à mesma decisão.
146 Em sexto lugar, a recorrente assinala que a porta‑voz da Comissão, cujas declarações estão reproduzidas no comunicado de imprensa da agência Reuters de 12 de Dezembro de 2000, indicou que a decisão recorrida seria adoptada na reunião do colégio dos comissários em 13 de Dezembro de 2000. Resulta dessas declarações que a decisão recorrida já tinha sido adoptada antes da referida reunião, em violação do regulamento interno da Comissão e do princípio da colegialidade.
147 Por último, a recorrente pede que o Tribunal ordene a apresentação do processo submetido ao colégio dos comissários e da acta da reunião com todos os documentos anexos.
148 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
– Apreciação do Tribunal Geral
149 Refira‑se, em primeiro lugar, que a recorrente alega, no essencial, que deveria ter recebido uma nova comunicação de acusações em 2000, uma vez que as imputações constantes da comunicação de acusações que lhe fora notificada em 1990 assentavam na existência de uma compartimentação dos mercados, que era a consequência de um acordo ou de uma prática concertada entre a Solvay e ela própria, acordo esse punido pela Decisão 91/297, que veio a ser anulada pelo acórdão ICI I, referido no n.° 17, supra.
150 Contudo, tal como resulta do n.° 126, supra, a anulação da Decisão 91/300 não afectou a validade dos actos procedimentais anteriores nem da comunicação de acusações, em particular.
151 Assim, só por essa anulação, a Comissão não tinha que dirigir nova comunicação de acusações à recorrente.
152 Além disso, refira‑se que, no âmbito da comunicação de acusações notificada à recorrente em 1990, a Comissão tinha formulado várias imputações e que as acusações de violação do artigo 81.° CE, por um lado, e do artigo 82.° CE, por outro, eram autónomas e assentavam em elementos de prova diferentes. Por conseguinte, o facto de o Tribunal Geral ter anulado a Decisão 91/297 por violação do direito de acesso ao processo não põe em causa as imputações de abuso de posição dominante pela recorrente no mercado em causa.
153 Em segundo lugar, quanto ao argumento da recorrente de que a Comissão deveria tê‑la ouvido de novo, há que lembrar que, quando a Comissão, depois da anulação de uma decisão que aplica sanções a empresas que infringiram o artigo 81.°, n.° 1, CE, com fundamento em vício de forma relativo exclusivamente às modalidades da sua adopção definitiva pelo colégio dos comissários, adopta uma nova decisão, com um conteúdo substancialmente idêntico e com base nas mesmas acusações, não tem que proceder a nova audição das empresas em causa (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, n.os 246 a 253, confirmado pelo acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38, supra, n.os 83 a 111).
154 Quanto às questões de direito susceptíveis de surgir no âmbito da aplicação do artigo 233.° CE, tal como as relativas ao decurso do tempo, à possibilidade de recomeço do procedimento, ao acesso ao processo que seria inerente a esse recomeço, à intervenção do consultor‑auditor e do comité consultivo e quanto a eventuais implicações do artigo 20.° do Regulamento n.° 17, não exigem novas audições, na medida em que não alteram o conteúdo das acusações, sendo unicamente passíveis de fiscalização jurisdicional posterior, se for esse o caso (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 93).
155 No caso presente, a Comissão reproduziu a quase totalidade do conteúdo da Decisão 91/300. Apenas completou a decisão recorrida com uma passagem relativa ao processo no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça.
156 Assim, há que observar que a decisão recorrida e a Decisão 91/300 têm um conteúdo substancialmente idêntico e se baseiam nos mesmos fundamentos.
157 Consequentemente, de acordo com a jurisprudência acima referida nos n.os 153 e 154, a Comissão não tinha que ouvir de novo a recorrente antes de adoptar a decisão recorrida.
158 Em terceiro lugar, quanto ao argumento da recorrente de que deveria ter beneficiado da intervenção do consultor auditor antes da adopção da decisão recorrida, há que lembrar que a Comissão criou a função de consultor‑auditor, para vigorar a partir de 1 de Setembro de 1982, segundo uma comunicação intitulada «Informação relativa aos procedimentos de aplicação das regras da concorrência dos Tratados CEE e CECA (artigos [81.° CE] e [82.° CE]; artigos 65.° [CA] e 66.° [CA])» (JO C 251, p. 2).
159 Na comunicação acima referida no n.° 158, a Comissão definiu a função do consultor‑auditor na seguinte forma:
«O consultor‑auditor tem por atribuição garantir a correcta tramitação da audição e, desse modo, contribuir para o carácter objectivo tanto da audição como da eventual decisão posterior. Zela, nomeadamente, por que todos os elementos pertinentes, independentemente de serem favoráveis ou desfavoráveis para os interessados, sejam devidamente tomados em consideração na elaboração dos projectos de decisão da Comissão em matéria de concorrência.
No exercício das suas funções, zela pelo respeito do direito de defesa, embora tenha em conta a necessidade de uma aplicação eficaz das regras da concorrência, em conformidade com os regulamentos em vigor e os princípios fixados pelo Tribunal de Justiça.»
160 As funções de consultor‑auditor foram precisadas numa decisão de 24 de Novembro de 1990, cujo artigo 2.° tinha uma redacção idêntica à definição inicial, depois na Decisão 94/810/CECA, CE: da Comissão, de 12 de Dezembro de 1994, relativa ao mandato dos conselheiros auditores no âmbito dos processos de concorrência que correm perante a Comissão (JO L 330, p. 67). Essa decisão, em vigor no momento da adopção da decisão recorrida, substituiu e anulou as duas anteriores decisões. O seu artigo 2.° estava redigido em termos semelhantes aos da própria definição inicial.
161 Por conseguinte, resulta do próprio teor da missão confiada ao consultor‑auditor que interveio no processo antes da adopção da decisão recorrida que a intervenção em causa estava necessariamente ligada à audição das empresas, na perspectiva de uma eventual decisão.
162 Nestas condições, há que considerar que, como não era necessária uma nova audição após a anulação da Decisão 91/300, também não era necessária uma nova intervenção do consultor‑auditor nas condições previstas na decisão de 24 de Novembro de 1990, que entretanto tinha entrado em vigor (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, 127).
163 Em quarto lugar, quanto ao argumento da recorrente de que o comité consultivo deveria ter sido consultado antes da adopção da decisão recorrida, há que lembrar que o artigo 10.° do Regulamento n.° 17, na versão aplicável à data dos factos, prevê o seguinte:
«3. Será consultado um Comité Consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes antes de tomada qualquer decisão na sequência de um processo nos termos do n.° 1, e de qualquer decisão respeitante à renovação, modificação ou revogação de uma decisão tomada nos termos do n.° 3 do artigo [81.° CE].
[…]
5. A consulta realizar‑se‑á durante uma reunião conjunta, convocada pela Comissão e realizada catorze dias, o mais tardar, após o envio da convocatória. A esta serão anexados uma exposição do processo com indicação dos elementos mais importantes e um anteprojecto de decisão para cada caso a examinar.»
164 Por outro lado, o artigo 1.° do Regulamento n.° 99/63/CEE da Comissão, de 25 de Julho de 1963, relativo às audições referidas nos n.os 1 e 2 do artigo 19.° do Regulamento n.° 17 (JO 1963, 127, p. 2268; EE 08 F1 p. 62) dispõe:
«Antes de consultar o Comité Consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes, a Comissão procederá a uma audição, nos termos do n.° 1 do artigo 19.° do Regulamento n.° 17.»
165 Segundo jurisprudência assente, resulta do artigo 1.° do Regulamento n.° 99/63 que a audição das empresas em causa e a consulta do comité são necessárias nas mesmas situações (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Setembro de 1989, Hoechst/Comissão, 46/87 e 227/88, Colect., p. 2859, n.° 54, e acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 115).
166 O Regulamento n.° 99/63 foi substituído pelo Regulamento (CE) n.° 2842/98 da Comissão, de 22 de Dezembro de 1998, relativo às audições dos interessados directos em certos processos, nos termos dos artigos [81.° CE] e [82.° CE] (JO L 354, p. 18), em vigor no momento da adopção da decisão recorrida, cujo artigo 2.°, n.° 1, está redigido em termos próximos dos do artigo 1.° do Regulamento n.° 99/63.
167 No caso, há que observar que, nos termos da decisão recorrida, o Comité Consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes foi consultado previamente à Decisão 91/300. A recorrente não impugna a existência ou a regularidade dessa consulta.
168 Assim, visto a decisão recorrida não conter alterações substanciais face à Decisão 91/300, a Comissão, que não tinha que ouvir novamente a recorrente antes de adoptar a decisão recorrida, também não tinha que proceder a uma nova consulta do comité consultivo (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 118).
169 Por outro lado, nos termos do artigo 10.°, n.° 4, do Regulamento n.° 17, na versão aplicável à data dos factos:
«O Comité Consultivo será composto por funcionários competentes em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes. Cada Estado‑Membro designará um funcionário que o representa e que pode ser substituído, em caso de impedimento, por outro funcionário.»
170 Segundo a jurisprudência, a alteração da composição de uma instituição não afecta a continuidade da própria instituição, cujos actos definitivos ou preparatórios mantêm, em princípio, todos os seus efeitos (acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Novembro de 1990, Fedesa e o., C‑331/88, Colect., p. I‑4023, n.° 36).
171 Além disso, não existe nenhum princípio geral de direito comunitário que imponha a continuidade da composição do órgão administrativo ao qual esteja submetido um procedimento que possa levar à aplicação de uma coima (acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, n.os 322 e 323).
172 Em quinto lugar, quanto ao argumento da recorrente de que, na adopção da decisão recorrida, o colégio dos comissários deveria ter tido a oportunidade de analisar todos os factos, circunstâncias e questões jurídicas relevantes nesse momento, há que lembrar que a Comissão não cometeu qualquer erro de direito ao não proceder, após a anulação da Decisão 91/300, a uma nova audição das empresas envolvidas, antes da adopção da decisão recorrida.
173 Além disso, como acima se observa nos n.os 162 e 167, no caso presente não se impunha uma nova intervenção do consultor‑auditor nem uma nova consulta do comité consultivo.
174 Nestas condições, e ao contrário do que sustenta a recorrente, do processo submetido à apreciação do colégio dos comissários não tinha que constar um novo relatório do consultor‑auditor nem uma nova acta de consulta do comité consultivo. Consequentemente, a premissa do raciocínio da recorrente a respeito do conteúdo do processo está errada, de modo que o raciocínio é destituído de fundamento (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.os 130 a 133).
175 Em sexto lugar, quanto ao argumento da recorrente de que a decisão recorrida teria sido adoptada antes da reunião do colégio dos comissários, há que lembrar que, segundo jurisprudência assente, o princípio da colegialidade assenta na igualdade dos membros da Comissão no processo de decisão e implica, nomeadamente, que as decisões são tomadas em comum e que todos os membros do colégio são colectivamente responsáveis, no plano político, por todas as decisões (acórdãos do Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 1998, Comissão/Alemanha, C‑191/95, Colect., p. I‑5449, n.° 39, e de 13 de Dezembro de 2001, Comissão/França, C‑1/00, Colect., p. I‑9989, n.° 79).
176 O princípio da colegialidade e, em especial, a necessidade de as decisões serem tomadas em comum, interessa necessariamente aos sujeitos de direito afectados pelos seus efeitos jurídicos, devendo poder confiar que essas decisões foram efectivamente tomadas pelo colégio e correspondem exactamente à sua vontade. Em particular, é esse o caso dos actos, expressamente qualificados de decisões, que a Comissão pratica face às empresas ou associações de empresas com vista ao respeito das normas da de concorrência e que têm por objecto a declaração de uma infracção a essas normas, dirigir intimações a essas empresas e aplicar‑lhes sanções pecuniárias (acórdão Comissão/BASF e o., referido no n.° 65, supra, n.os 64 e 65).
177 No caso, a recorrente invoca o facto de, segundo um comunicado de imprensa de uma agência noticiosa de 12 de Dezembro de 2000, a porta‑voz da Comissão ter anunciado que esta iria adoptar novamente a mesma decisão em 13 de Dezembro de 2000.
178 Contudo, admitindo que a porta‑voz da Comissão tenha feito as afirmações referidas pela recorrente, o simples facto de um comunicado de imprensa de uma sociedade privada mencionar uma declaração que não tem qualquer carácter oficial não basta para considerar que a Comissão violou o princípio da colegialidade. Com efeito, o colégio dos comissários em nada estava vinculado por essa declaração e, na reunião de 13 de Dezembro de 2000, também poderia decidir, após deliberação em comum, não adoptar a decisão recorrida.
179 Consequentemente, não há que ordenar que a Comissão apresente todos os seus documentos internos relativos à adopção da decisão recorrida, nomeadamente a acta da reunião do colégio dos comissários e todos os documentos anexos ou todos os documentos submetidos ao colégio dos comissários nessa ocasião.
180 Resulta do exposto que a terceira parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente.
Quanto à quarta parte, relativa a uma violação do direito de acesso ao processo
– Argumentos das partes
181 A recorrente alega que, depois de ter recebido a decisão recorrida, pediu para ter acesso ao processo no início de 2001, o que a Comissão recusou. Esse acesso tinha‑lhe sido igualmente negado em 1990.
182 A recorrente salienta que a Comissão lhe deveria ter dado acesso ao processo não obstante o facto de a decisão recorrida já ter sido adoptada, por várias razões. Primeiro, a Comissão tinha‑a privado de uma nova ocasião de pedir o acesso ao processo ao adoptar a decisão recorrida sem reabrir o procedimento administrativo e sem mesmo lhe indicar a sua intenção. Segundo, a Comissão, que tinha recusado conceder‑lhe acesso ao processo em 1990, poderia ter rectificado esse erro no momento da adopção da decisão recorrida. Terceiro, a Comunicação da Comissão relativa às regras de procedimento interno para o tratamento dos pedidos de consulta do processo nos casos de aplicação dos artigos [81.° CE] e [82.° CE], dos artigos 65.° [CA] e 66.° [CA] e do Regulamento (CEE) n.° 4064/89 do Conselho (JO 1997, C 23, p. 3, a seguir «comunicação sobre o acesso ao processo»), instituiu normas mais favoráveis às empresas no que respeita ao acesso ao processo. A recorrente entende, assim, que, como qualquer outro destinatário de uma decisão adoptada em 2000, deveria ter beneficiado das novas regras.
183 A recorrente reconhece que os seus argumentos relativos ao acesso ao processo foram rejeitados no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra. Contudo, alega que isso não impede o Tribunal de formular neste processo uma apreciação que lhe seja mais favorável.
184 Segundo a recorrente, seguramente o processo continha correspondência e documentos dos seus clientes do Reino Unido, nomeadamente fabricantes de vidro, dos seus concorrentes no Reino Unido e de importadores americanos. As respostas escritas e os documentos de produtores vidreiros e de clientes do Reino Unido poderiam tê‑la ajudado na sua defesa quanto às alegações de posição dominante e de exploração abusiva dessa posição. Do mesmo modo, poderia haver informações dos seus concorrentes que lhe fornecessem um esclarecimento sobre elementos da decisão recorrida. Além disso, os documentos de produtores da Europa Ocidental continental poderiam tê‑la ajudado na análise do mercado em causa, nomeadamente quanto à questão do efeito considerável na concorrência ou no comércio entre Estados‑Membros. Daí resulta que o Tribunal Geral cometeu um erro no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, ao considerar que os seus direitos de defesa não tinham sido violados.
185 Acresce que a recorrente alega que pode arguir novamente a questão do acesso ao processo. Por um lado, quando o Tribunal analisou a questão do acesso ao processo no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, fê‑lo com base na lista enumerativa apresentada pela Comissão. Ora, essa lista não identificava completamente os documentos contidos no processo. Por outro lado, no seguimento da anulação da Decisão 91/300, não havia razões para afectar tempo e dinheiro na interposição de um recurso subordinado sobre a questão do acesso ao processo, tanto mais que entendia nessa época que o acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, seria provavelmente confirmado em segunda instância. A recorrente entende que, «se a Comissão tivesse ganho, [a recorrente] poderia então ter interposto recurso para o Tribunal de Justiça sobre [essa questão], após ter sido novamente ouvida pelo Tribunal Geral quanto ao mérito».
186 Na réplica, a recorrente acrescenta que a questão do acesso ao processo não faz caso julgado. Afirma que essa questão não foi efectiva ou necessariamente decidida no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra. Alega que, mesmo que tivesse tido a possibilidade de interpor recurso subordinado sobre essa questão, não poderia ser criticada por não o ter feito, uma vez que esse recurso subordinado não era necessário, tendo em conta o acórdão Comissão/BASF, referido no n.° 64, supra. Além disso, baseando‑se nas conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs apresentadas no processo que deu origem ao acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Março de 1994, TWD Textilwerke Deggendorf (C‑188/92, Colect., p. I‑833), a recorrente alega que não era manifestamente indubitável ou evidente que um recurso subordinado fosse necessário ou que tivesse alguma utilidade. A esse respeito precisa que, se a tese da Comissão sobre o caso julgado fosse aceite, isso encorajaria a interposição de numerosos recursos subordinados e aumentaria inutilmente o volume de trabalho do Tribunal de Justiça.
187 Por outro lado, é errada a apreciação feita pelo Tribunal Geral no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, sobre o acesso ao processo. Segundo a recorrente, basta demonstrar que os documentos não divulgados podiam ter uma importância que não deveria ser negligenciada, tal como declarou o Tribunal Geral no acórdão ICI I, referido no n.° 17, supra. Além disso, devido à evolução do direito, se o Tribunal Geral tivesse que se pronunciar hoje sobre a questão do acesso ao processo em causa no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, não seria totalmente garantido que chegasse à mesma conclusão a que chegou nesse acórdão. A esse respeito, a recorrente invoca nomeadamente a comunicação sobre o acesso ao processo.
188 A recorrente alega ainda que, no seguimento da diligência de instrução ordenada pelo Tribunal Geral que lhe deu acesso ao processo, pôde observar consideráveis falhas na gestão dos documentos pela Comissão, que tiveram várias consequências.
189 Em primeiro lugar, a recorrente alega que era impossível a Comissão adoptar a sua decisão após um exame completo e leal de todas as provas ao seu dispor.
190 Em segundo lugar, a recorrente assinala que a Comissão perdeu pelo menos cinco sub‑processos. Afirma que um sub‑processo e meio deviam conter correspondência trocada nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17 entre ela e a Comissão e três sub‑processos e meio deviam conter correspondência entre os seus clientes e os seus concorrentes no Reino Unido e a Comissão. A perda dessas pastas teve a consequência de limitar gravemente a sua defesa no Tribunal Geral. A recorrente alega que, se tivesse tido acesso a informações independentes provenientes dos seus clientes no Reino Unido, teria disposto de provas suplementares da sua tese, tendo a Comissão provavelmente chegado a uma conclusão diferente, nomeadamente quanto à questão da existência de uma posição dominante, da exploração abusiva dessa posição dominante, do efeito no comércio entre Estados‑Membros e da coima.
191 E terceiro lugar, a recorrente indica que certos documentos existentes que consultou lhe teriam igualmente permitido reforçar a sua tese e pôr em causa várias conclusões a que a Comissão chegou na decisão recorrida.
192 A Comissão responde que «o direito de acesso ao processo faz caso julgado contra a [recorrente]». Entende que qualquer pedido de acesso ao processo depois da adopção de uma decisão não tem objecto.
193 Quanto às observações da recorrente formuladas na sequência da diligência de instrução ordenada pelo Tribunal Geral, a Comissão assinala que essa diligência permitiu confirmar que as afirmações feitas pela recorrente no procedimento administrativo e nos actos processuais sobre as violações dos seus direitos de defesa não tinham nenhum fundamento. Tendo tomado conhecimento de um processo com quase 25 000 documentos, a recorrente apenas encontrou 60 documentos que suportariam a sua argumentação. Contudo, segundo a Comissão, nenhum deles teve a mínima utilidade para ela.
194 Quanto à perda dos sub‑processos, verificada no seguimento da diligência de instrução ordenada pelo Tribunal Geral, a Comissão entende que não teve qualquer influência na legalidade da decisão recorrida e que não se deve sobrevalorizar o facto de terem sido perdidos 5 sub‑processos em 71. Afirma que a recorrente não avança qualquer razão que permita pensar que esses sub‑processos conteriam elementos de prova a seu favor que não lhe teriam sido revelados, mas que a teriam ajudado a refutar as alegações feitas na comunicação de acusações. A Comissão acrescenta que, mesmo que os sub‑processos perdidos contivessem correspondência com os clientes e concorrentes da recorrente, como esta afirma, isso não teria utilidade para ela, pois nesse caso só poderiam ser elementos sem qualquer interesse, e que não poderiam, portanto, ser utilizados, ou, na melhor das hipóteses, semelhantes aos que tinha visto e nos quais não tinha conseguido basear qualquer argumento.
195 Quanto à incoerência na numeração e à má gestão dos documentos alegada pela recorrente, a Comissão afirma que o critério para determinar se os direitos de defesa foram respeitados é o de saber se uma parte viu o documento e, em caso contrário, se o documento lhe teria permitido apresentar um argumento que não pôde invocar na altura. Isso depende exclusivamente da consulta do documento e não da pasta em que a Comissão o colocou, nem da forma pela qual ela numera as suas pastas.
– Apreciação do Tribunal Geral
196 A título preliminar, há que lembrar que o Tribunal de Justiça reconheceu a importância que reveste, tanto no ordenamento jurídico comunitário como nos ordenamentos jurídicos nacionais, o princípio do caso julgado. Com efeito, a fim de garantir tanto a estabilidade do direito e das relações jurídicas como uma boa administração da justiça, importa que as decisões jurisdicionais que tenham transitado em julgado após esgotamento das vias de recurso disponíveis ou após a extinção dos prazos previstos para tais recursos já não possam ser postas em causa (acórdãos de 30 de Setembro de 2003, Köbler, C‑224/01, Colect., p. I‑10239, n.° 38, e de 16 de Maio de 2006, Kapferer, C‑234/04, Colect., p. I‑2585, n.° 20).
197 Segundo jurisprudência assente, o caso julgado de um acórdão pode obstar à admissibilidade de um recurso ou acção se o recurso ou acção que lhe deu origem tiver oposto as mesmas partes, tiver tido o mesmo objecto e se tiver baseado na mesma causa (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 19 de Setembro de 1985, Hoogovens Groep/Comissão, 172/83 e 226/83, Recueil, p. 2831, n.° 9, e de 22 de Setembro de 1988, França/Parlamento, 358/85 e 51/86, Colect., p. 4821, n.° 12; acórdão do Tribunal Geral de 8 de Março de 1990, Maindiaux e o./CES, T‑28/89, Colect., p. II‑59, n.° 23), sendo esses pressupostos necessariamente cumulativos (acórdão do Tribunal Geral de 5 de Junho de 1996, NMB France e o./Comissão, T‑162/94, Colect., p. II‑427, n.° 37).
198 O caso julgado está ligado apenas aos pontos de facto e de direito que tenham sido efectivamente ou necessariamente decididos pela decisão judicial em causa (acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de Fevereiro de 1991, Itália/Comissão, C‑281/89, Colect., p. I‑347, n.° 14, e despacho do Tribunal de Justiça de 28 de Novembro de 1996, Lenz/Comissão, C‑277/95 P, Colect., p. I‑6109, n.° 50).
199 No acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, o Tribunal Geral analisou o fundamento relativo à violação dos direitos de defesa resultante da recusa da Comissão de facultar à recorrente o acesso ao processo.
200 A fim de saber se o fundamento era procedente, o Tribunal Geral procedeu, no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, a um exame sumário das acusações de fundo que a Comissão deu por provadas na comunicação de acusações e na Decisão 91/300.
201 A primeira parte do fundamento, no processo que deu origem ao acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, era relativa à não divulgação à recorrente de documentos eventualmente ilibatórios. Em primeiro lugar, quanto ao argumento de que a recusa da Comissão de facultar o acesso aos documentos dos produtores tinha podido afectar a sua defesa, o Tribunal Geral entendeu que as considerações feitas na Decisão 91/300 quanto à posição dominante, ao abuso de posição dominante e à afectação do comércio entre Estados‑Membros não eram susceptíveis de ser postas em causa pelos documentos não comunicados. Em segundo lugar, quanto à recusa de acesso às pastas provenientes da própria recorrente, o Tribunal Geral considerou que ela podia invocar documentos com origem nela própria. O Tribunal Geral concluiu daí que, nas circunstâncias do caso, a Comissão tinha decidido bem ao recusar conceder à recorrente o acesso a essas pastas e fornecer‑lhe uma lista dos documentos que delas constavam.
202 A segunda parte do fundamento, no processo que deu origem ao acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, era relativo ao facto de não terem sido divulgados à recorrente certos documentos acusatórios. O Tribunal Geral considerou que, quanto às considerações da Comissão relativas ao desconto especial oferecido por uma sociedade no Reino Unido, o modo de proceder da Comissão era dificilmente conciliável com os direitos de defesa, mas que esse vício não tinha afectado no caso concreto o exercício dos direitos de defesa pela recorrente. Por outro lado, os outros argumentos da recorrente deviam ser analisados em sede de mérito e eram alheios ao fundamento relativo a uma violação dos direitos de defesa.
203 Consequentemente, o Tribunal Geral julgou integralmente improcedente o fundamento relativo à violação dos direitos de defesa.
204 Seguidamente, o Tribunal Geral analisou o fundamento relativo à autenticação irregular da Decisão 91/300 e concluiu pela anulação dessa decisão.
205 Com a negação de provimento ao recurso de segunda instância pelo acórdão Comissão/ICI, referido no n.° 19, supra, o acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, passou a ser uma decisão transitada em julgado.
206 De acordo com a jurisprudência acima referida no n.° 197, para determinar se a questão do acesso ao processo faz caso julgado, há que analisar, portanto, se o recurso que deu origem ao acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, e o presente recurso opõem as mesmas partes, têm o mesmo objecto e se baseiam na mesma causa.
207 Quanto ao pressuposto da identidade das partes nas duas causas, não se pode deixar de observar que no caso presente está preenchido. Com efeito, tal como o recurso que deu origem ao acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, o presente recurso opõe a recorrente à Comissão. Quanto aos pressupostos da identidade do objecto e da causa, refira‑se desde logo que, formalmente, a Comissão adoptou duas decisões, a Decisão 91/300 e a decisão recorrida. Contudo, resulta do exposto (v. nomeadamente, n.os 24, 111, 112 e 156, supra) que, por um lado, o conteúdo da decisão recorrida é idêntico ao da Decisão 91/300, com excepção de uma parte nova intitulada «Processos perante o Tribunal de Primeira Instância e o Tribunal de Justiça» e, por outro, a decisão recorrida se baseou nos mesmo fundamentos que a Decisão 91/300. Com efeito, a Comissão podia adoptar a decisão recorrida nos mesmos termos da Decisão 91/300 sem ter que efectuar novas diligências na sequência da anulação da Decisão 91/300, na medida em que o vício de forma respeitava exclusivamente às modalidades de adopção definitiva dessa decisão e a anulação não tinha afectado a validade das respectivas medidas preparatórias.
208 Uma vez que a Comissão não praticou qualquer acto de instrução entra a prolação do acórdão Comissão/ICI, referido no n.° 19, supra, e a adopção da decisão recorrida, que o conteúdo da decisão recorrida é idêntico ao da Decisão 91/300, com excepção da passagem correspondente ao processo no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça, e que a recorrente pede novamente o acesso ao processo, verifica‑se que a lide tem o mesmo objecto e se baseia na mesma causa.
209 Visto estarem aqui cumulativamente preenchidos os pressupostos da identidade das partes, do objecto e da causa, de acordo com a jurisprudência acima referida no n.° 197, há que considerar que, a questão de direito relativa ao acesso ao processo COMP/33.133 – D: Carbonato de sódio – ICI foi efectivamente decidida em juízo e que, portanto, faz caso julgado.
210 Esse caso julgado obsta a que essa questão de direito seja de novo submetida ao Tribunal Geral e por ele examinada.
211 Daí resulta que a quarta parte do segundo fundamento deve ser julgada inadmissível.
212 Contudo, refira‑se por acréscimo que, admitindo que a questão de direito relativa ao acesso ao processo não fizesse caso julgado, as observações da recorrente, apresentadas em 13 de Outubro de 2005 na sequência da consulta do processo no âmbito de uma medida de organização do processo não põem em causa as conclusões a que chegou o Tribunal Geral no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra.
213 Quanto ao argumento da recorrente de que certos documentos lhe teriam permitido reforçar a sua tese e pôr em causa várias conclusões a que a Comissão chegou na decisão recorrida, refira‑se que a recorrente não demonstrou que a não‑divulgação desses documentos e informações poderá ter influenciado, em seu prejuízo, o procedimento administrativo e o conteúdo da decisão da Comissão, como exige a jurisprudência a respeito dos elementos de defesa (v., neste sentido, acórdão de 18 de Junho de 2008, Hoechst/Comissão, referido no n.° 71, supra, n.° 146 e jurisprudência aí referida).
214 Com efeito, a recorrente não demonstrou que, se tivesse podido invocar os documentos contidos na pasta no procedimento administrativo, teria podido invocar elementos não concordantes com as ilações tiradas nessa fase pela Comissão e teria podido influenciar de alguma forma as apreciações por ela feitas na eventual decisão, pelo menos no que respeita à gravidade e à duração da conduta que lhe era imputada, e, desse modo, ao montante da coima.
215 Quanto à existência de uma posição dominante, a recorrente alega que, se tivesse tido acesso no procedimento administrativo a certos documentos de que tomou conhecimento na consulta dos autos no âmbito de uma medidas de organização do processo, teria podido refutar a alegação da Comissão de que a recorrente detinha uma posição dominante no mercado em causa. A recorrente entende que teria podido invocar nomeadamente certos documentos da Solvay, de produtores alemães e dos seus clientes no Reino Unido para demonstrar a importância dos produtos de substituição, como a soda cáustica, o vidro partido reciclado ou a dolomite e ilustrar a pressão concorrencial exercida pelas importações provenientes dos Estados Unidos.
216 A esse respeito, refira‑se antes de mais que a Comissão se baseou essencialmente na quota de mercado de 90% tradicionalmente detida pela recorrente para determinar que esta ocupava uma posição dominante no mercado em causa. Ora, nenhum indício permite presumir que a recorrente teria podido descobrir nos sub‑processos em falta quaisquer documentos que desmentissem o facto de deter uma posição dominante no mercado no carbonato de sódio (v., neste sentido, acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, n.° 61). Além disso, segundo a jurisprudência, as quotas de mercado muito grandes constituem só por si, e salvo circunstâncias excepcionais, a prova da existência de uma posição dominante (acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Fevereiro de 1979, Hoffmann‑La Roche/Comissão, 85/76, Recueil p. 461, n.° 41, e acórdão do Tribunal Geral de 23 de Outubro de 2003, Van den Bergh Foods/Comissão, T‑65/98, Colect.,. p. II‑4653, n.° 154). Ora a recorrente não invoca qualquer facto susceptível de preencher essas circunstâncias excepcionais. Por último, mesmo admitindo que esses factos tivessem existido e fossem mencionados nos documentos contidos nos «sub‑processos» em falta, a recorrente não os podia ignorar nas circunstâncias do caso presente, pelo que, nesse aspecto, não foram lesados os seus direitos de defesa.
217 Seguidamente, quanto ao argumento relativo aos produtos de substituição, refira‑se que a Comissão nunca negou que a soda cáustica e o vidro partido reciclado pudessem substituir o carbonato de sódio em certa medida, tal como resulta dos considerandos 129 a 134 da decisão recorrida. Contudo, considerou que essa possibilidade de substituição limitada não excluía a posição dominante da recorrente no mercado em causa. Além disso, visto a recorrente ser na época dos factos o único produtor de carbonato de sódio no Reino Unido, estava em melhor posição para conhecer a situação no mercado em causa e para apresentar à Comissão os elementos necessários quanto à questão da possibilidade de substituição do carbonato de sódio pela soda cáustica ou pelo vidro partido reciclado. Assim, a recorrente, ao contrário do que alega, não tinha qualquer necessidade de documentos de produtores continentais relativas a outros mercados nem de documentos dos seus clientes no Reino Unido para tentar demonstrar que não dominava o mercado em causa, devido à possibilidade de substituição parcial do carbonato de sódio pela soda cáustica e pelo vidro partido reciclado. Quanto à possibilidade de substituição do carbonato de sódio pela dolomite, refira‑se que a recorrente se baseia num documento de um concorrente relativo a uma visita efectuada na sua própria fábrica. Por conseguinte, a recorrente não podia ignorar a existência desse documento ou, pelo menos, as informações que ele poderia conter. De qualquer modo, a recorrente não demonstra que havia elementos relativos à possibilidade de substituição pela dolomite que teriam podido influenciar as apreciações da Comissão quanto à sua posição dominante no mercado em causa.
218 Por último, quanto ao argumento de que os documentos dos seus clientes do Reino Unido ou de produtores continentais ilustram a pressão concorrencial exercida pelos produtores americanos no mercado em causa, refira‑se que o impacto exercido pelos concorrentes americanos é analisado em pormenor pela Comissão na decisão recorrida, que tem em conta essas importações e que explica que a concorrência americana estava contida por medidas antidumping (considerandos 51 a 54 e 128). De qualquer forma, tendo em conta que a recorrente era, na época dos factos, o único produtor de carbonato de sódio no Reino Unido, dispunha necessariamente das informações relativas ao mercado em causa e ao efeito das importações provenientes dos Estados Unidos nesse mercado para se defender no procedimento administrativo.
219 Assim, há que considerar que, nas suas observações de 13 de Outubro de 2005, a recorrente não apresenta qualquer elemento que permita demonstrar que o facto de não terem sido divulgados no procedimento administrativo os documentos consultados e os documentos alegadamente contidos nos «sub‑processos» em falta pode ter influenciado, em seu prejuízo, o decurso desse procedimento e o conteúdo da decisão recorrida quanto à existência da sua posição dominante no mercado em causa.
220 Quanto à exploração abusiva da posição dominante, a recorrente alega que, se tivesse tido acesso no procedimento administrativo a certos documentos de que tomou conhecimento na consulta do processo no âmbito de uma medida de organização do processo e às informações independentes provenientes de clientes e concorrentes no Reino Unido alegadamente contidas nos «sub‑processos» em falta, isso ter‑lhe‑ia permitido demonstrar que os seus descontos não eram por natureza destinados a excluir concorrentes e que eram essencialmente um modo legítimo de concorrência. Afirma que diversos documentos ilustrariam o facto de a concessão de descontos constituir uma prática habitual dos produtores continentais, o que teria sido um elemento importante para demonstrar que os seus descontos eram perfeitamente compatíveis com as práticas aceites na indústria. Alega ainda que certos documentos, nomeadamente da Akzo, que referiam a política da dupla fonte de aprovisionamento ou do segundo fornecedor, lhe teriam sido úteis para analisar a questão de saber se os descontos tinham o efeito de excluir concorrentes como alegava a Comissão.
221 A esse respeito, refira‑se antes de mais que o argumento da recorrente de que os descontos sobre a parte superior constituíam uma prática habitual não é susceptível de demonstrar que esses descontos, quando concedidos por uma empresa em posição dominante, respeitavam o artigo 82.° CE. Portanto, a consulta de documentos ilustrativos da existência dessa prática não teria tido qualquer utilidade para a recorrente.
222 Seguidamente, há que referir que o carácter fidelizador do sistema de descontos instituído pela recorrente resulta de provas documentais directas. Na parte da decisão recorrida dedicada aos «factos», a Comissão referiu, nos considerandos 61 a 82, numerosos documentos relativos aos descontos sobre a parte superior, dos quais resulta que não reflectiam ganhos de eficiência ou economias de escala e que, ao contrário de um desconto pela quantidade ligado unicamente ao volume de compras, apenas tinham em vista excluir os concorrentes do mercado. Ora, num caso em que, como neste, a Comissão se baseou, na decisão recorrida, unicamente em provas documentais directas para demonstrar as diversas infracções, a recorrente deve indicar em que medida outros elementos de prova poderiam ter posto em causa o carácter fidelizador desse sistema de descontos ou, pelo menos, que perspectiva diferente poderia ter sido dada às provas documentais directas, que não foram impugnadas.
223 Por último, quanto ao argumento relativo à política do segundo fornecedor, há que observar que a Comissão tinha conhecimento disso e que nunca o contestou, tal como resulta do considerando 23 da decisão recorrida. Portanto, mesmo que a recorrente tivesse tomado conhecimento de documentos ilustrativos dessa política, não era por isso que as conclusões da Comissão sobre a exploração abusiva da posição dominante teriam sido diferentes.
224 Assim, há que considerar que, nas suas observações de 13 de Outubro de 2005, a recorrente não apresenta qualquer elemento que permita demonstrar que o facto de não terem sido divulgados no procedimento administrativo os documentos consultados e os documentos alegadamente contidos nos «sub‑processos» em falta pode ter influenciado, em seu prejuízo, o decurso desse procedimento e o conteúdo da decisão recorrida quanto à exploração abusiva pela recorrente da sua posição dominante.
225 Quanto ao efeito no comércio entre Estados‑Membros, a recorrente alega que, se tivesse tido acesso no procedimento administrativo a certos documentos de que tomou conhecimento na consulta do processo no âmbito de uma medida de organização do processo e às informações provenientes de clientes do Reino Unido alegadamente contidas nos «sub‑processos» em falta, isso ter‑lhe‑ia permitido refutar a análise da Comissão quanto à afectação do comércio entre Estados‑Membros. Entende que diversos documentos teriam suportado a sua tese de que a compartimentação dos mercados nacionais não se devia ao seu alegado comportamento de exclusão dos concorrentes, mas sim a elementos como a importância dos custos de transporte, a flutuação das taxas de câmbio e as decisões unilaterais dos produtores de não abastecerem certos mercados para evitar o risco de vendas de represália.
226 A esse respeito, refira‑se que a análise da Comissão quanto à afectação do comércio entre Estados‑Membros se baseia nomeadamente em documentos da própria recorrente e, em particular, numa sua nota de estratégia de 28 de Junho de 1985, referida no considerando 66 da decisão recorrida, da qual resulta que ela pretendia impedir ou eliminar todas as importações de carbonato de sódio para o Reino Unido, com excepção das da General Chemical (considerandos 66 a 70 da decisão recorrida). Ora, num caso em que, como no presente, a Comissão se baseou, na decisão recorrida, unicamente em provas documentais directas para demonstrar a infracção, a recorrente deve tentar indicar em que medida poderiam outros elementos de prova pôr em causa a afectação do comércio entre Estados‑Membros ou, pelo menos, que perspectiva diferente se poderia ter dado às provas documentais directas, que não foram impugnadas.
227 Além disso, no que respeita à compartimentação dos mercados nacionais, refira‑se que a recorrente podia apresentar argumentos sobre a importância dos custos de transporte, a flutuação das taxas de câmbio e as vendas de represália no procedimento administrativo, à luz da sua própria experiência no mercado, sem ter que se basear em documentos de outros produtores.
228 Portanto, há que considerar que, nas suas observações de 13 de Outubro de 2005, a recorrente não apresenta qualquer elemento que permita demonstrar que o facto de não terem sido divulgados no procedimento administrativo os documentos consultados e os documentos alegadamente contidos nos «sub‑processos» em falta pode ter influenciado, em seu prejuízo, o decurso desse procedimento e o conteúdo da decisão recorrida quanto ao efeito do seu comportamento no comércio entre Estados‑Membros.
229 Quanto ao montante da coima, a recorrente afirma que, mesmo se os elementos referidos nas suas observações não tivessem podido influenciar a apreciação da Comissão quanto à violação do artigo 82.° CE, todos esses elementos poderiam ter influenciado a apreciação da Comissão sobre a coima. Alega que, se tivesse tido acesso no procedimento administrativo a certos documentos de que tomou conhecimento na consulta do processo no âmbito de uma medida de organização do processo e a informações provenientes de clientes do Reino Unido constantes dos «sub‑processos» em falta, isso ter‑lhe‑ia permitido invocar nomeadamente elementos «capazes de demonstrar que, na prática, nenhum concorrente foi significativamente privado de oportunidades de venda e que não houve quaisquer efeitos negativos no comércio interestatal».
230 A esse respeito, basta referir que a recorrente se baseia em argumentos que apresentou sobre as apreciações feitas pela Comissão na decisão recorrida quanto à exploração abusiva pela recorrente da sua posição dominante e à afectação do comércio entre Estados‑Membros, relativamente aos quais já acima se indicou nos n.os 218 a 226 que o acesso ao processo não lhe teria permitido invocar elementos que permitissem pôr em causa essas apreciações.
231 Portanto, há que considerar que, nas suas observações de 13 de Outubro de 2005, a recorrente não apresenta qualquer elemento que permita demonstrar que o facto de não terem sido divulgados no procedimento administrativo os documentos consultados e os documentos alegadamente contidos nos «sub‑processos» em falta pode ter influenciado, em seu prejuízo, o decurso desse procedimento e o conteúdo da decisão recorrida quanto ao montante da coima.
Quanto à quinta parte, violação do artigo 253.° CE
– Argumentos das partes
232 A recorrente alega que a Comissão não tinha a obrigação de adoptar uma nova decisão na sequência da anulação da Decisão 91/300. O procedimento seguido foi muito inusual, na medida em que a Comissão não lhe dirigiu uma nova comunicação de acusações nem realizou uma nova audição e nova consulta do comité consultivo. Nestas circunstâncias, a falta de explicações por parte da Comissão quanto à forma de proceder constitui uma violação do artigo 253.° CE.
233 A Comissão violou também o seu regulamento interno (JO 2000, L 308, p. 26) e o princípio da boa administração ao não fundamentar a decisão recorrida e «ao não adoptar outras decisões que tinham sido anuladas por razões [semelhantes às] do processo em 1990». A esse respeito, o código de boa conduta administrativa para o pessoal da Comissão nas suas relações com o público, que está anexo ao regulamento interno da Comissão, dispõe que qualquer diferença de tratamento em casos semelhantes deve ser expressamente justificada pela natureza específica de cada caso e que qualquer excepção a esse princípio deve ser devidamente justificada. Acresce que a falta de fundamentação da decisão em questões importantes, nomeadamente quanto à apreciação jurídica e à coima, demonstra que a Comissão violou o artigo 253.° CE.
234 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
– Apreciação do Tribunal Geral
235 Há que observar que a alegação da recorrente não tem suporte nos factos. Com efeito, nos considerandos 162 a 172 da decisão recorrida, a Comissão fundamentou a sua opção de adoptar uma nova decisão na sequência da anulação da Decisão 91/300.
236 O facto de a Comissão não ter dirigido uma nova comunicação de acusações à recorrente, não a ter ouvido de novo e não ter consultado novamente o comité consultivo não constitui uma falta de fundamentação da decisão recorrida. Com efeito, esses argumentos da recorrente, no essencial, apenas visam impugnar o mérito da apreciação da Comissão relativa a essas diversas questões, pelo que devem ser rejeitados (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25, supra, n.° 389).
237 Do mesmo modo, ao contrário do que sustenta a recorrente, a Comissão, ao decidir declarar numa nova decisão, após a anulação da Decisão 91/300, as infracções que julgou provadas, não se afastou da sua prática decisória constante. Limitou‑se a confirmar a sua opção inicial de punir essas infracções – ao que o artigo 233.° CE não se opunha, visto que só lhe impunha que tomasse as medidas exigidas para a execução do acórdão Comissão/ICI, referido no n.° 19, supra, ou seja, reparar a única ilegalidade por ele declarada (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 39, supra, n.° 451). Por outro lado, a recorrente não remete para nenhum outro processo que tenha sido semelhante ao presente e tratado de forma diferente pela Comissão.
238 Portanto, há que rejeitar a quinta parte do segundo fundamento e, consequentemente, o segundo fundamento na íntegra.
Quanto ao terceiro fundamento, má apreciação do mercado em causa
Argumentos das partes
239 Baseando‑se no acórdão do Tribunal Geral de 22 de Março de 2000, Coca‑Cola/Comissão (T‑125/97 e T‑127/97, Colect., p. II‑1733), a recorrente indica que, no recurso de anulação da Decisão 91/300, não impugnou a conclusão da Comissão de que o «mercado geográfico» em causa era o do Reino Unido nem de que o «mercado do produto» em causa era o do carbonato de sódio, denso e leve. Contudo, segundo a recorrente, a Comissão não se podia limitar a reproduzir na decisão recorrida as conclusões relativas aos produtos e aos mercados geográficos em causa com base numa análise efectuada dez anos antes. A Comissão deveria ter analisado se essas conclusões ainda eram válidas à luz da evolução do direito e da prática ao longo do período decorrido entre as duas decisões. A decisão recorrida está, por isso, ferida de erro quanto aos factos e falta de fundamentação. Por outro lado, nada na decisão recorrida indica que a Comissão efectuou, em 2000, uma das investigações referidas na sua Comunicação relativa à definição de mercado relevante para efeitos do direito comunitário da concorrência (JO 1997, C 372, p. 5).
240 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
Apreciação do Tribunal Geral
241 Em primeiro lugar, a recorrente não contesta que, no âmbito da adopção da Decisão 91/300, a Comissão analisou a estrutura do mercado e a concorrência. Do mesmo modo, não alega que, nessa decisão, a Comissão tivesse cometido um erro na definição do mercado geográfico e do mercado de produtos.
242 A recorrente indica unicamente que a Comissão deveria ter analisado se as suas conclusões ainda eram válidas à luz da evolução do direito e da prática ao longo do período decorrido entre a Decisão 91/300 e a decisão recorrida. Baseia‑se no acórdão Coca‑Cola/Comissão, referido no n.° 239, supra, em que o Tribunal Geral considerou nomeadamente que a afirmação pela Comissão da existência de uma posição dominante resulta da análise da estrutura do mercado em causa e da concorrência aí reinante no momento em que adopta cada decisão (n.° 81).
243 Contudo, há que lembrar que, segundo a jurisprudência, a instituição que praticou o acto anulado só está vinculada nos limites do necessário para assegurar a execução do acórdão de anulação, podendo assim o procedimento destinado a substituir esse acto ser retomado no ponto exacto em que a ilegalidade ocorreu (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Novembro de 2007, Itália/Comissão, C‑417/06 P, não publicado na Colectânea, n.° 52 e jurisprudência aí referida). Ora, no caso, a Decisão 91/300 foi anulada pelo Tribunal Geral pelo facto de a sua autenticação ter sido efectuada depois da respectiva notificação, o que constituía uma preterição de uma formalidade essencial, na acepção do artigo 230.° CE.
244 A Comissão podia, pois, retomar a sua análise na fase da autenticação sem ter que analisar se as conclusões relativas ao mercado em causa que tinha extraído na adopção da Decisão 91/300 ainda eram válidas à luz das circunstâncias de facto e de direito existentes no momento da adopção da decisão recorrida.
245 O argumento da recorrente baseado no n.° 81 do acórdão Coca‑Cola/Comissão, referido no n.° 239, supra, não põe isto em causa. Com efeito, a consideração de que a verificação da existência de uma posição dominante resulta de uma análise da estrutura do mercado e da concorrência aí reinante no momento em que a Comissão adopta cada decisão não implica que a Comissão deva proceder em todos os casos a uma nova análise do mercado em causa no momento da adopção da decisão recorrida. No caso, há que considerar que a Comissão não tinha que proceder a essa análise, uma vez que isso não era necessário para assegurar a execução do acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra. Portanto, os argumentos da recorrente relativos a erro sobre os factos e falta de fundamentação, acima apresentados no n.° 237, assentam numa premissa errada e devem também ser rejeitados.
246 Por conseguinte, há que julgar improcedente o terceiro fundamento.
Quanto ao quarto fundamento, inexistência de posição dominante
Argumentos das partes
247 Segundo a recorrente, admite‑se que uma empresa com mais de 90% do mercado de um produto é normalmente considerada dominante na acepção do artigo 82.° CE. Contudo, uma grande quota de mercado não basta para demonstrar a posição dominante. Ora, na decisão recorrida, a Comissão não analisou correctamente certos factores que impediram a recorrente de se comportar de forma consideravelmente independente dos seus concorrentes, dos seus clientes e, finalmente, dos consumidores, na acepção do acórdão Hoffmann‑La Roche/Comissão, referido no n.° 216, supra. Com efeito, durante muitos anos, os seus clientes estiveram em posição de determinar a quantidade de carbonato de sódio que lhe comprariam a ela e a importadores, bem como o montante dos produtos de substituição. Com efeito, os seus clientes criaram relações com fornecedores da Europa do Leste e dos Estados Unidos, a fim de disporem de fontes alternativas e de garantir que ela continuava competitiva nos preços e na qualidade, não obstante a sua grande quota de mercado. A esse respeito, os seus clientes, nomeadamente os fabricantes de vidro, dispunham de grande poder de compra, o que tinha a consequência de ela não estar em posição dominante. A recorrente salienta que a Comissão aplicou o princípio de um poder de compra compensatório na sua Decisão 1999/641/CE, de 25 de Novembro de 1998, que declara a compatibilidade de uma concentração com o mercado comum e com o funcionamento do Acordo EEE (Processo IV/M.1225 – Enso/Stora) (JO 1999, L 254, p. 9). No caso, a Comissão não reconheceu que o poder compensatório dos compradores constituía uma limitação ao seu poder no mercado. Além disso, a Comissão não teve em conta a disponibilidade de produtos de substituição nem que estes estão na origem da descida do seu volume de vendas desde 1979.
248 Do mesmo modo, a Comissão não teve em conta o facto de pelo menos um produtor de vidro da Europa Ocidental continental ter substituído o carbonato de sódio pela soda cáustica. A recorrente afirma ainda que a Comissão não apreciou a importância do vidro partido reciclado como factor limitador do seu poder no mercado nem a de outros substitutos, como a dolomite, que nem sequer menciona na decisão recorrida.
249 A recorrente admite que os seus clientes encaravam a General Chemical e a Brenntag como fornecedores secundários. Contudo, contesta que isso seja um factor indicativo do seu poder no mercado. Afirma que teria bastado um grande cliente transformar um fornecedor secundário em fornecedor principal ou vários clientes aumentarem as suas compras a um fornecedor secundário para que toda a sua margem de lucro desaparecesse.
250 Por outro lado, a afirmação da Comissão de que a recorrente manteve um nível de preços superior ao que existia noutros Estados‑Membros é errada e não é corroborada pelo mais pequeno elemento de prova. O facto de os seus preços tenderem a ser ligeiramente superiores reflecte nomeadamente o efeito da grande queda da procura de carbonato de sódio nos seus custos, que não se verificou na mesma medida noutros mercados. Reflecte ainda a influência de factores como a taxa de câmbio e os custos do combustível.
251 A recorrente admite que, para manter a viabilidade das suas duas unidades de produção de carbonato de sódio, a sua estratégia era manter um volume suficiente de vendas, o que implicava tentar aumentar as vendas e responder às ofertas dos fornecedores alternativos. Em contrapartida, nega ter tentado reduzir ao mínimo a presença ou a eficácia da General Chemical ou da Brenntag como concorrentes.
252 Por último, os vários regulamentos e decisões antidumping adoptados pela Comissão no período em causa concluíram pela existência de dumping e de um prejuízo substancial, como por exemplo, o Regulamento (CEE) n.° 2253/84, de 31 de Julho de 1984, que institui um direito antidumping provisório sobre certas importações de um certo tipo de carbonato de sódio originário dos Estados Unidos da América e relativo à aceitação de compromissos relativos a outras importações do mesmo produto (JO L 206, p. 15). Essa situação era incompatível com a existência de uma posição dominante. Segundo a recorrente, ao proceder à aplicação de medidas antidumping, a Comissão entendia indubitavelmente que estas não eram susceptíveis de reduzir significativamente a concorrência ou de criar um monopólio e que eram do interesse comunitário.
253 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
Apreciação do Tribunal Geral
254 Segundo jurisprudência assente, a posição dominante referida no artigo 82.° CE diz respeito a uma situação de poder económico detido por uma empresa, que lhe dá o poder de impedir a manutenção de uma concorrência efectiva no mercado em questão, ao possibilitar‑lhe a adopção de comportamentos independentes, numa medida apreciável, relativamente aos seus concorrentes, aos seus clientes e, por fim, relativamente aos consumidores (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 1978, United Brands e United Brands Continentaal/Comissão, 27/76, Recueil, p. 207, Colect., p. 77, n.° 65, e acórdão do Tribunal Geral de 17 de Setembro de 2007, Microsoft/Comissão, T‑201/04, Colect., p. II‑3601, n.° 229). Essa posição, ao contrário de uma situação de monopólio ou de quase monopólio, não exclui a existência de alguma concorrência, mas permite à empresa que dela desfruta, se não determinar, pelo menos ter uma influência considerável nas condições em que se desenvolve a concorrência e, de qualquer modo, agir em grande medida em seu desrespeito e sem que isso lhe cause prejuízo (acórdão Hoffmann‑La Roche/Comissão, n.° 39).
255 A existência de uma posição dominante resulta geralmente da reunião de vários factores, que, isoladamente, não seriam necessariamente determinantes (acórdão United Brands e United Brands Continentaal/Comissão, referido no n.° 254, supra, n.° 66). A análise da existência de uma posição dominante no mercado em causa deve ser feita examinando primeiro a sua estrutura e, seguidamente, a situação da concorrência nesse mercado (v., neste sentido, acórdão United Brands e United Brands Continentaal/Comissão, referido no n.° 254, supra, n.° 67).
256 As grandes quotas de mercado constituem por si só, e salvo circunstâncias excepcionais, a prova da existência de uma posição dominante. Com efeito, a posse de uma quota de mercado extremamente importante coloca a empresa que a detém durante um certo período, em razão do volume de produção e de oferta que representa – sem que os detentores de quotas sensivelmente mais reduzidas tenham a possibilidade de satisfazer rapidamente a procura que pretende afastar‑se da empresa que detém a quota mais importante –, numa situação de força, transformando‑a num parceiro obrigatório e que, só por isso, lhe assegura, pelo menos durante períodos relativamente longos, a independência de comportamento característica da posição dominante (acórdão Hoffmann‑La Roche/Comissão, referido no n.° 216, supra, n.° 41, e acórdão Van den Bergh Foods/Comissão, referido no n.° 216, supra, n.° 154). Assim, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, uma quota de mercado de 50% constitui, só por si, e salvo circunstâncias excepcionais, a prova da existência de uma posição dominante (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de Julho de 1991, AKZO/Comissão, C‑62/86, Colect., p. I‑3359, n.° 60).
257 Do mesmo modo, uma quota de mercado de 70 a 80% constitui, só por si, um indício claro da existência de uma posição dominante (acórdãos do Tribunal Geral de 12 de Dezembro de 1991, Hilti/Comissão, T‑30/89, Colect., p. II‑1439, n.° 92, e de 30 de Setembro de 2003, Atlantic Container Line e o./Comissão, T‑191/98, T‑212/98 a T‑214/98, Colect., p. II‑3275, n.° 907).
258 No caso, a Comissão indicou, no considerando 127 da decisão recorrida, que a recorrente tinha detido uma quota de mercado «já histórica de mais de 90%», «em relação à globalidade do período analisado». Na petição, a recorrente não nega ter detido essa enorme quota de mercado.
259 Resulta da detenção dessas quotas de mercado que, salvo em circunstâncias excepcionais específicas do caso concreto, a recorrente detinha uma posição dominante no mercado em causa.
260 No considerando 128 da decisão recorrida, a Comissão invoca diversos elementos que completam o seu exame das quotas de mercado da recorrente e vão no sentido da existência de uma posição dominante sua.
261 Por definição, esses elementos não podem ligar‑se a circunstâncias excepcionais que permitam concluir que a recorrente não está em posição dominante.
262 Por outro lado, a recorrente invoca seis argumentos que há que analisar para se determinar se, no caso, existiam essas circunstâncias excepcionais na acepção da jurisprudência do Tribunal de Justiça.
263 Em primeiro lugar, a recorrente alega uma grande pressão concorrencial de outros produtores de carbonato de sódio.
264 A esse respeito, há que lembrar antes de mais que a existência de um certo grau de concorrência não é incompatível com a existência de uma posição dominante no mercado em causa.
265 Além disso, note‑se que a recorrente não apresenta qualquer elemento de facto e de prova para pôr em causa «a ausência de qualquer concorrência por parte da Solvay e de outros produtores da Europa Ocidental» dada por provada pela Comissão. Muito pelo contrário, a recorrente reconhece que não houve vendas significativas de carbonato de sódio no Reino Unido por esses produtores continentais. De igual modo, admite «a improbabilidade de qualquer ‘novo’ produtor de carbonato de sódio sintético entrar no mercado e estabelecer instalações de produção na Comunidade» (considerando 128 da decisão recorrida).
266 Por outro lado, no considerando 128 da decisão recorrida, a Comissão referiu «a consideração da General Chemical e da Brenntag apenas como fornecedores secundários pelos seus clientes», o que a recorrente admite. Contudo, entende que bastaria um grande cliente transformar um fornecedor secundário num fornecedor principal ou vários clientes aumentarem as suas compras a um fornecedor secundário para que toda a sua margem de lucro desaparecesse. No entanto, essa afirmação revela‑se puramente hipotética, pois a recorrente não apresenta qualquer elemento em seu apoio. De qualquer forma, mesmo admitindo que essa afirmação era certa, o argumento da recorrente é inoperante, pois o simples facto de os clientes utilizarem essa ameaça não pode constituir uma circunstância excepcional que exclua a existência de uma posição dominante no mercado em causa.
267 Do mesmo modo, embora a recorrente impugne «o êxito da [sua] estratégia em minimizar a presença e/ou eficácia da General Chemical e da Brenntag como concorrentes e em conservar a sua quota de mercado predominante no Reino Unido», não apresenta o mais pequeno elemento concreto em apoio da sua argumentação.
268 Quanto aos documentos provenientes de fontes continentais e relativos a concorrentes americanos, dos quais a recorrente tomou conhecimento na consulta do processo no âmbito de uma medida de organização do processo, não podem modificar a apreciação feita pela Comissão sobre a existência de uma posição dominante da recorrente no mercado em causa. Com efeito, a recorrente referiu as importações americanas no procedimento administrativo e a Comissão teve isso em conta antes de adoptar a decisão recorrida.
269 Daí resulta que o argumento da recorrente relativo à existência de uma pressão concorrencial exercida pelos outros produtores de carbonato de sódio, que não tem qualquer suporte, não pode constituir uma circunstância excepcional que exclua a existência de uma posição dominante da recorrente no mercado em causa.
270 Em segundo lugar, a recorrente invoca a possibilidade de uma substituição do carbonato de sódio pela soda cáustica, pelo vidro partido reciclado e pela dolomite, o que constituía em seu entender uma pressão concorrencial na sua relação com a clientela.
271 Observe‑se, a esse respeito, que, nos considerandos 129 a 133 da decisão recorrida, a Comissão procedeu a uma análise detalhada da substituição pela soda cáustica e considerou que, na prática, essa possibilidade era muito limitada. Na petição, a recorrente não fornece qualquer elemento susceptível de pôr em causa essa análise.
272 Quanto ao vidro partido reciclado, a Comissão indicou, no considerando 134 da decisão recorrida, que as necessidades dos clientes em termos de carbonato de sódio na produção de vidro côncavo podiam ser reduzidas em 15% ou menos mediante a utilização do vidro partido reciclado. Essa percentagem não foi impugnada pela recorrente. A Comissão admite ainda a possibilidade de a utilização de vidro partido reciclado diminuir a dependência dos clientes em relação aos fornecedores de soda cáustica em geral, sem diminuir, no entanto, a possibilidade de um grande produtor excluir os pequenos produtores. Portanto, há que considerar que, ao contrário do que afirma a recorrente, a Comissão teve em conta essa possibilidade de substituição do carbonato de sódio pelo vidro partido reciclado. O argumento da recorrente não tem suporte nos factos.
273 Quanto à dolomite, a recorrente limita‑se a mencionar a sua existência, não apresenta qualquer argumento e não junta qualquer elemento de prova que permita medir a sua utilização como substituto do carbonato de sódio.
274 Com efeito, os documentos referidos pela recorrente nas suas observações apresentadas na sequência da consulta do processo no âmbito de uma medida de organização do processo unicamente permitem demonstrar que a soda cáustica e o vidro partido reciclado são parcialmente substituíveis ao carbonato de sódio e que este pode eventualmente ser substituído pela dolomite. Contudo, nada nesses documentos permite pôr em dúvida as conclusões da Comissão quanto ao facto de a possibilidade de substituição parcial do carbonato de sódio por outros produtos não excluir a posição dominante da recorrente no mercado em causa. Além disso, tal como a Comissão refere, a recorrente não afirma que a dolomite seja utilizada pelos produtores de vidro, os principais compradores de carbonato de sódio. Portanto, nada indica que a utilização da dolomite poderia ter tido influência na posição dominante da recorrente no mercado em causa.
275 Assim, a recorrente não demonstrou que a Comissão tinha cometido um erro manifesto de apreciação ao concluir que as possibilidades de substituição não constituíam uma limitação significativa do seu poder no mercado.
276 Em terceiro lugar, a recorrente alega que a Comissão deveria ter tido em conta a pressão concorrencial exercida pelos clientes.
277 Na petição, a recorrente indicou que os seus quatro maiores clientes representavam cerca de 50% das suas vendas. Contudo, não fornece qualquer precisão quanto à parte respectiva de cada um deles. Por outro lado, limita‑se a afirmar que os seus clientes, nomeadamente os fabricantes de vidro, dispunham de um «poder de compra considerável», sem fundamentar essa afirmação. Portanto, mesmo admitindo que a Comissão tivesse que tomar em conta o critério do poder compensatório dos clientes, a recorrente não demonstrou que os seus clientes tinham condições para contrabalançar o seu poder no mercado.
278 Em quarto lugar, a recorrente contesta a afirmação da Comissão de que manteve um nível de preços superior ao que existia noutros Estados‑Membros. A esse respeito, refira‑se que a recorrente reconhece, porém, que os seus preços «tendiam a ser ligeiramente superiores aos que [existiam] noutros Estados‑Membros». É certo que invoca a queda da procura do carbonato de sódio, que não teria tido a mesma dimensão noutros mercados, as taxas de câmbio e os custos de combustível. Contudo, a recorrente não sustenta a sua argumentação com elementos concretos que permitam ao Tribunal verificar o fundado das suas alegações.
279 Em quinto lugar, a recorrente alega que, para manter a viabilidade das suas duas unidades de produção de carbonato de sódio, a sua estratégia era manter um volume suficiente de vendas, o que implicava tentar aumentar as vendas e responder às ofertas dos fornecedores alternativos. Contudo, basta referir que esse argumento não é susceptível de pôr em causa a existência da posição dominante da recorrente no mercado em causa.
280 Em sexto lugar, a recorrente refere as medidas antidumping adoptadas pela Comissão. A esse respeito, refira‑se que, na decisão recorrida, a Comissão analisou em pormenor as medidas antidumping tomadas contra produtores americanos (considerandos 51 a 54) e concluiu, quanto ao poder de mercado da recorrente, que esta beneficiava da protecção contra os produtores americanos e da Europa do Leste proporcionada pelas medidas antidumping e pelas restrições em matéria de preços impostas à General Chemical pelos compromissos antidumping (considerando 128).
281 Em resposta a essas afirmações, a recorrente alega, antes de mais, que a existência demonstrada de um dumping até 1984 é incompatível com a conclusão de que gozava de uma posição dominante nessa época. Contudo, não explica de que modo a existência de um dumping dos produtores americanos permitia concluir que não estava em posição dominante. De qualquer forma, o Regulamento n.° 2253/84, adoptado num enquadramento jurídico totalmente diferente do artigo 82.° CE, não indica que a recorrente não estava em posição dominante no Reino Unido.
282 Seguidamente, a recorrente alega que a adopção das medidas antidumping implicava, para a Comissão, que estas não afectassem a situação concorrencial na Comunidade. Contudo, a recorrente não fundamenta esta afirmação, que é puramente hipotética, uma vez que o Regulamento n.° 2253/84 não faz qualquer referência à situação concorrencial na Comunidade.
283 Em conclusão, os argumentos da recorrente não levam a admitir a existência de circunstâncias excepcionais que justifiquem que se ponha em causa a consideração de que estava em posição dominante nesse mercado.
284 Por consequência, há que julgar improcedente o quarto fundamento.
Quanto ao quinto fundamento, inexistência de abuso de posição dominante
285 O quinto fundamento articula‑se, no essencial, em três partes relativas, primeiro, aos descontos sobre a tonelagem marginal, segundo, às cláusulas de fornecimento exclusivo e às restrições às compras a concorrentes, e terceiro, aos outros incentivos financeiros.
Quanto à primeira parte, relativa aos descontos sobre a tonelagem marginal
– Argumentos das partes
286 A recorrente contesta o entendimento de que as suas práticas de fixação de preços no período em causa constituíssem um abuso. As suas práticas foram sempre acções concorrenciais normais à luz dos factores económicos e comerciais. Os preços acordados pela recorrente em nenhum momento falsearam a estrutura concorrencial do mercado em causa ou causaram um prejuízo aos consumidores.
287 A recorrente alega que não é abusivo o facto de um fornecedor dominante negociar um desconto se o seu cliente estiver disposto a encomendar quantidades adicionais. O objectivo ou o efeito dos descontos sobre a tonelagem marginal não era excluir concorrentes do mercado. Foram introduzidos em resposta a pedidos de clientes que pretendiam obter preços inferiores por todas as quantidades adicionais encomendadas. A recorrente afirma que o objectivo dos descontos individualmente negociados era manter uma ocupação suficiente das suas capacidades de produção e uma certa rentabilidade para evitar mais fechos de fábricas. Esses descontos incentivavam os clientes a comprar quantidades de carbonato de sódio que pensavam não poder adquirir. A esse respeito, era particularmente importante tornar o carbonato de sódio atractivo face a produtos de substituição como a soda cáustica, o vidro partido reciclado e a dolomite.
288 Além disso, a recorrente alega que os seus preços em nenhum momento se desviaram da realidade económica e que os descontos foram totalmente transparentes, no sentido de que o cliente era informado da tonelagem que beneficiava de desconto e do respectivo cálculo preciso, por escrito, contrariamente à situação do processo que deu origem ao acórdão do Tribunal de Justiça 9 de Novembro de 1983, Nederlandsche Banden‑Industrie‑Michelin/Comissão (322/81, Recueil, p. 3461). O cliente não sofria qualquer pressão para lhe comprar mais nem era dissuadido de comprar quantidades adicionais a terceiros para não perder um desconto sobre o volume central. Além disso, os descontos sobre a tonelagem marginal apenas respeitavam a uma pequena proporção das suas vendas totais de carbonato de sódio, isto é 8%.
289 Com excepção de um único caso, os descontos não estavam ligados ao facto de o comprador lhe comprar todas ou uma determinada percentagem das suas necessidades. Esses descontos eram oferecidos sobre uma tonelagem adicional face à tonelagem central calculada que o cliente se propunha comprar a ela ou a vários fornecedores secundários, em proporções pré‑determinadas. Os clientes tinham em qualquer momento a liberdade de comprar a outros fornecedores as quantidades que desejassem. A situação era, portanto, diferente da que deu origem à Decisão 88/518/CEE da Comissão, de 18 de Julho de 1988, relativa a um processo de aplicação do artigo [82.° CE] (IV/30.178 Napier Brown – British Sugar) (JO L 284, p. 41).
290 A recorrente assinala ainda que, na presente lide, os descontos sobre a tonelagem marginal que concedia não se destinavam a fazer uma discriminação entre os seus clientes nem afectava a situação concorrencial entre eles. Com efeito, tendo em conta a variedade de clientes e os produtos de substituição, tinha que negociar individualmente com cada cliente. De qualquer forma, os descontos sobre a tonelagem marginal que concedia tinham um efeito insignificante na diferenciação dos custos dos seus clientes.
291 Por outro lado, os acordos de redução de preço não eram celebrados por tempo indeterminado, ao contrário dos que foram analisados no acórdão Hoffmann‑La Roche/Comissão, referido no n.° 216, supra. Com efeito, esses acordos eram decididos nas negociações anuais separadas. Além disso, segundo a recorrente, o montante ou a existência dos descontos não dependia de o cliente atingir determinado objectivo ou adquirido uma tonelagem adicional no ano anterior.
292 A recorrente acrescenta que os descontos foram acordados por compras adicionais de carbonato de sódio e não por referência à compra de uma gama de produtos pelo cliente. Assim, entende que não agiu abusivamente ao oferecer aos seus clientes um preço reduzido pelos volumes adicionais.
293 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
– Apreciação do Tribunal Geral
294 Segundo jurisprudência assente, o conceito de exploração abusiva é um conceito objectivo que se refere a comportamentos de uma empresa em posição dominante, susceptíveis de influenciar a estrutura de um mercado em que, precisamente pela presença dessa empresa, o grau de concorrência já está enfraquecido e que têm por efeito criar obstáculos, recorrendo a meios diferentes dos que regem uma concorrência normal entre produtos ou serviços com base nas prestações dos operadores económicos, à manutenção do grau de concorrência ainda existente no mercado ou ao desenvolvimento dessa concorrência (acórdão Hoffmann‑La Roche/Comissão, referido no n.° 216, supra, n.° 91, e acórdão do Tribunal Geral de 14 de Dezembro de 2005, General Electric/Comissão, T‑210/01, Colect., p. II‑5575, n.° 549).
295 Embora a verificação da existência de uma posição dominante não implique por si mesma qualquer censura em relação à empresa em causa, impõe‑lhe porém, independentemente das causas dessa posição, a responsabilidade especial de não prejudicar, pelo seu comportamento, uma concorrência efectiva e não falseada no mercado comum (acórdãos Nederlandsche Banden‑Industrie‑Michelin/Comissão, n.° 288, referido no, n.° 57, e Microsoft/Comissão, referido no n.° 254, supra, n.° 229). Do mesmo modo, embora a existência de uma posição dominante não prive uma empresa nessa posição do direito de preservar os seus interesses comerciais próprios quando estiverem ameaçados, e embora essa empresa tenha a faculdade, em termos razoáveis, de praticar os actos que julgue adequados à protecção dos seus interesses, esses comportamentos não são, porém, admissíveis quando tenham como objectivo reforçar essa posição dominante e abusar dela (acórdão United Brands e United Brands Continental/Comissão, referido no n.° 254, supra, n.° 189, e acórdão do Tribunal Geral de 30 de Setembro de 2003, Michelin/Comissão, T‑203/01, Colect., p. II‑4071, n.° 55).
296 Mais em particular, quanto à concessão de descontos por uma empresa em posição dominante, resulta de jurisprudência assente que um desconto de fidelidade, concedido como contrapartida de um compromisso de um cliente se abastecer exclusivamente ou quase exclusivamente na empresa em posição dominante, é contrário ao artigo 82.° CE. Com efeito, esse desconto destina‑se a impedir, através da concessão de vantagens económicas, o abastecimento dos clientes nos produtores concorrentes (acórdão Michelin/Comissão, referido no n.° 295, supra, n.° 56; v. ainda acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 1975, Suiker Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73 a 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, Colect., p. 1663, n.° 518).
297 Um sistema de descontos que tenha um efeito de encerramento do mercado será considerado contrário ao artigo 82.° CE se for aplicado por uma empresa em posição dominante. Por esta razão, o Tribunal de Justiça considerou que um desconto ligado à realização de um objectivo de compras violava também o artigo 82.° CE (acórdão Michelin/Comissão, referido no n.° 315, supra, n.° 57).
298 Em geral considera‑se que os sistemas de descontos pela quantidade, ligados apenas ao volume de compras efectuadas a uma empresa na situação de posição dominante, não têm o efeito de encerramento proibido pelo artigo 82.° CE. Com efeito, se o aumento da quantidade fornecida se traduzir num custo inferior para o fornecedor, este tem o direito de fazer o seu cliente beneficiar dessa redução através de uma tarifa mais favorável. É suposto, portanto, que os descontos pela quantidade reflictam os ganhos de eficiência e as economias de escala realizados pela empresa em posição dominante (acórdão Michelin/Comissão, referido no n.° 295, supra, n.° 58).
299 Daí resulta que um sistema de descontos cuja taxa de redução aumente em função do volume comprado não viola o artigo 82.° CE, a não ser que os critérios e as modalidades de concessão dos descontos demonstrem que o sistema não assenta numa contrapartida economicamente justificada, antes se destinando, como no caso de um desconto de fidelização e de objectivo, a impedir o abastecimento dos clientes na concorrência (acórdãos Hoffmann‑La Roche/Comissão, referido no n.° 216, supra, n.° 90, e Michelin/Comissão, referido no n.° 295, supra, n.° 59).
300 Para determinar o eventual carácter abusivo de um sistema de descontos pela quantidade, há que analisar, portanto, todas as circunstâncias, nomeadamente os critérios e as modalidades da concessão de descontos e apurar se esses descontos se destinam, através de uma vantagem que não assenta em qualquer prestação económica que a justifique, a suprimir ou restringir a possibilidade de o comprador escolher as suas fontes de abastecimento, impedir o acesso ao mercado dos concorrentes, aplicar a parceiros comerciais condições desiguais para prestações equivalentes ou reforçar a posição dominante através de uma concorrência falseada (acórdãos Hoffmann‑La Roche/Comissão, referido no n.° 216, supra, n.° 90, e Michelin/Comissão, referido no n.° 295, supra, n.° 60).
301 No caso, nos considerandos 139 a 141 da decisão recorrida, a Comissão refere o seguinte:
«139) É óbvio, tendo em conta tanto a natureza do próprio sistema como os termos constantes dos próprios documentos internos da ICI, que os descontos ‘top slice’; se destinavam a excluir qualquer hipótese de concorrência efectiva ao:
– incentivar os clientes a obter junto da [recorrente] a tonelagem marginal que poderiam obter se assim não fosse junto de um segundo fornecedor,
– minimizar ou neutralizar o impacte concorrencial da General Chemical ao conter a sua presença no mercado em termos de preços, tonelagem e clientes dentro de certos limites que asseguravam à [recorrente] a continuação do seu monopólio efectivo,
– eliminar a Brenntag do mercado ou, pelo menos, minimizar o seu efeito concorrencial,
– minimizar o risco de os clientes poderem virar‑se para fontes alternativas de abastecimento, quer se trate de produtores associados, de distribuidores ou de outros produtores da Comunidade,
– manter e reforçar a situação de quase monopólio da [recorrente] no mercado [em causa].
140) As grandes variações nas tonelagens que permitiam ‘accionar’ o desconto em relação a cada cliente demonstram que o sistema de descontos ‘top slice’ e as vantagens em termos de preço que aquele sistema conferia não dependiam das diferenças de custo para a [recorrente] em termos de quantidades fornecidas mas dependiam de o cliente comprar a sua tonelagem marginal à [recorrente].
141) Não existe qualquer necessidade, para que tais práticas sejam abrangidas pelo artigo 82.°, de que exista uma obrigação jurídica ou estipulação expressa que exija que o cliente se abasteça exclusivamente junto da empresa dominante. É suficiente que o incentivo obtido tenha por objecto ou efeito vincular os clientes ao produtor dominante.»
302 Além disso, nos considerandos 61 a 82 da decisão recorrida, a Comissão referiu também muitos documentos relativos aos descontos sobre a tonelagem marginal, dos quais resultava que a recorrente visava excluir os concorrentes do mercado.
303 Refira‑se ainda que a recorrente não impugna a existência nem o conteúdo dos documentos invocados pela Comissão na decisão recorrida. Ora, resulta desses documentos que os descontos concedidos pela recorrente não reflectiam ganhos de eficiência nem economias de escala. Ao contrário de um desconto pela quantidade ligado unicamente ao volume de compras, esses descontos destinavam‑se a impedir o abastecimento dos clientes junto de produtores concorrentes.
304 Por outro lado, nenhum dos argumentos da recorrente para demonstrar que os seus descontos sobre a tonelagem marginal não eram contrários ao artigo 82.° CE é susceptível de pôr em causa as conclusões da Comissão.
305 Em primeiro lugar, a recorrente alega que os seus descontos sobre a tonelagem marginal foram introduzidos a pedido dos clientes. Contudo, esse argumento é inoperante. Com efeito, resulta de jurisprudência assente que, o facto de uma empresa em posição dominante num mercado vincular compradores – mesmo que a seu pedido – através de uma obrigação ou uma promessa de se abastecerem totalmente ou em parte considerável das suas necessidades junto da referida empresa constitui uma exploração abusiva de uma posição dominante na acepção do artigo 82.° CE, quer tenha essa obrigação sido estipulada sem mais quer tenha como contrapartida a concessão de descontos (acórdão Hoffmann‑Laroche/Comissão, referido no n.° 216, supra, n.° 89).
306 Em segundo lugar, a recorrente alega que o seu objectivo era manter uma ocupação suficiente das suas capacidades de produção para evitar o encerramento de fábricas. A esse respeito, basta observar que a vontade de manter ou aumentar as capacidades de produção não constitui uma justificação objectiva que permita a uma empresa ficar isenta da aplicação do artigo 82.° CE.
307 Em terceiro lugar, a recorrente alega que o seu sistema era transparente, contrariamente à situação analisada no acórdão Nederlandsche Banden‑Industrie‑Michelin/Comissão, referido no n.° 288, supra. Contudo, refira‑se que a Comissão não imputa à recorrente a falta de transparência dos seus descontos sobre a tonelagem marginal. De qualquer forma, segundo a jurisprudência, um sistema de descontos de fidelidade é contrário ao artigo 82.° CE, seja transparente ou não (acórdão Michelin/Comissão, referido no n.° 295, supra, n.° 111).
308 Em quarto lugar, a recorrente alega que os seus descontos sobre a tonelagem marginal apenas respeitavam a 8% das suas vendas totais de carbonato de sódio. Ora, a esse respeito, há que lembrar que o efeito a que se refere a jurisprudência acima referida no n.° 295 não respeita necessariamente ao efeito concreto do comportamento abusivo. Para demonstração de uma violação do artigo 82.° CE, basta demonstrar que o comportamento abusivo da empresa em posição dominante tende a restringir a concorrência ou, por outras palavras, que o comportamento é adequado ou susceptível de ter tal efeito (acórdão Michelin/Comissão, referido no n.° 295, supra, n.° 239). Diga‑se ainda que, em qualquer caso, 8% das vendas totais de carbonato de sódio da recorrente não podem ser considerados uma quantidade negligenciável dessas vendas.
309 Em quinto lugar, a recorrente alega que os seus descontos sobre a tonelagem marginal não eram discriminatórios. Esse argumento improcede também. Com efeito, por um lado, a Comissão não imputa à recorrente o carácter discriminatório dos seus descontos sobre a tonelagem marginal e, por outro, mesmo não sendo discriminatórios, não é menos verdade que a recorrente não impugna a existência nem o conteúdo dos documentos invocados pela Comissão na decisão recorrida, dos quais resulta que esses descontos não assentavam numa contrapartida economicamente justificada e se destinavam a impedir o aprovisionamento dos clientes junto de produtores concorrentes. Ora, esses descontos, com um efeito de encerramento, são contrários ao artigo 82.° CE se forem aplicados por uma empresa em posição dominante (v. n.° 297, supra).
310 Em sexto lugar, a recorrente alega que os seus acordos em matéria de descontos não eram celebrados por tempo indeterminado. Contudo, mesmo admitindo que o fossem por curtos períodos, isso não demonstra que não tivessem por efeito excluir a concorrência.
311 Em conclusão, há que considerar que a recorrente não demonstrou que a Comissão tivesse cometido um erro ao concluir que o sistema de descontos por ela aplicado tinha como objectivo excluir a concorrência efectiva.
312 Resulta do exposto que a primeira parte do quinto fundamento deve ser julgada improcedente.
Quanto à segunda parte, relativa às cláusulas de fornecimento exclusivo e às restrições às compras a concorrentes
– Argumentos das partes
313 A recorrente nega que os seus acordos em matéria de preços fossem equivalente a uma cláusula de exclusividade. Alega que a Comissão não está longe de afirmar que o facto de um fornecedor dominante tentar obter a totalidade ou uma parte substancial das encomendas de um cliente ou fornecer todas ou parte das suas necessidades constitui um comportamento abusivo. Ora, isso equivale a dizer que, tendo em conta a sua quota de mercado, não tinha o direito de fazer concorrência no mercado para obter encomendas. Ora, não existe qualquer jurisprudência nesse sentido e essa afirmação seria incompatível com «a filosofia das normas da concorrência».
314 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
– Apreciação do Tribunal Geral
315 Resulta de jurisprudência assente que o facto de uma empresa em posição dominante num mercado vincular compradores – ainda que a seu pedido – por uma obrigação ou uma promessa de se abastecerem na totalidade ou em parte considerável das suas necessidades exclusivamente junto dela constitui uma exploração abusiva de uma posição dominante na acepção do artigo 82.° CE, quer essa obrigação tenha sido estipulada sem mais, quer tenha a sua contrapartida na concessão de descontos. Isto vale também quando essa empresa, sem vincular os compradores por uma obrigação formal, aplica, quer por força de acordos celebrados com esses compradores, quer unilateralmente, um sistema de descontos de fidelidade, isto é, descontos ligados à condição de o cliente – qualquer que seja o montante, grande ou pequeno, das suas compras – se abastecer exclusivamente, na totalidade ou em parte considerável das suas necessidades, na empresa em posição dominante (acórdão Hoffmann‑La Roche/Comissão, referido no n.° 216, supra, n.° 89). Com efeito, os compromissos de abastecimento exclusivo dessa natureza, com ou sem contrapartida de reduções ou de descontos de fidelidade com o fim de incentivar o comprador a abastecer‑se junto da empresa em posição dominante, são incompatíveis com o objectivo de uma concorrência não falseada no mercado comum, pois não assentam numa prestação económica que justifique esse encargo ou essa vantagem, antes se destinam a eliminar ou a restringir a possibilidade de o comprador escolher as suas fontes de abastecimento e a barrar o acesso dos outros produtores ao mercado (acórdão Hoffmann‑La Roche/Comissão, referido no n.° 216, supra, n.° 90).
316 No caso, na decisão recorrida, a Comissão referiu nomeadamente o seguinte quanto às cláusulas de fornecimento exclusivo:
«144) Os eventuais efeitos anticoncorrenciais das cláusulas relativas às quantidades constantes dos acordos de fornecimento da [recorrente] têm de ser apreciados à luz da [sua] política […] em relação à General Chemical e à Brenntag. Tal como o revelam os documentos descobertos nas instalações da [recorrente, esta] tinha a preocupação de não excluir inteiramente todos os concorrentes. Era do [seu] interesse […] ter a garantia de que pelo menos a General Chemical permaneceria no mercado [em causa] enquanto ‘presença’ estritamente controlada tanto quanto a preços como quanto a tonelagens que, indo ao encontro da necessidade da maioria dos grandes clientes de terem um fornecedor secundário, não representaria de facto qualquer ameaça concorrencial real para a posição de quase monopólio da [recorrente].
145) Ao ter a preocupação de apurar as necessidades totais de cada um dos grandes clientes, a [recorrente] podia estruturar o seu sistema de descontos ‘top slice’ de forma a excluir ou a reduzir ao mínimo a presença de concorrentes. Em muitos casos, obteve a garantia por parte do cliente de que reduziria as suas compras a concorrentes ou as restringiria a uma certa tonelagem. No caso da Beatson Clarke, foi expressamente estipulado que o cliente compraria as quantidades necessárias à satisfação da totalidade das suas necessidades à [recorrente].
146) Tais acordos restringem significativamente a liberdade contratual do cliente e impedem a entrada de concorrentes, traduzindo‑se, pois, numa cláusula de exclusividade.
147) Os acordos com estes grandes clientes significavam que estes estavam vinculados à [recorrente] em relação à quase totalidade das suas necessidades (e, pelo menos num caso, às suas necessidades totais), resultando diminuídos quaisquer efeitos concorrenciais da actuação de outros fornecedores.»
317 Nos considerandos 83 a 114 da decisão recorrida, a Comissão invocou também muitos documentos, relativos às sociedades Pilkington, Rockware, CWS, Redfearn e Beatson Clarke.
318 Ora, há que considerar que esses documentos demonstram que a recorrente pretendia restringir as compras dos seus clientes a concorrentes.
319 Com efeito, quanto à Beatson Clarke, a Comissão refere provas directas de que essa sociedade tinha um acordo com a recorrente para excluir a concorrência efectiva, por força do qual tinha que se abastecer anualmente junto da recorrente para a totalidade das suas necessidades.
320 Na petição, a recorrente não impugna a existência desse acordo. Admite mesmo que, «tal como expresso na sua correspondência, essa estipulação poderia eventualmente ser qualificada de desconto de fidelidade». Afirma que o acordo com a Beatson Clarke tinha por objectivo apoiar exportações não rentáveis. Contudo, esse argumento não põe em causa o facto apurado pela Comissão de que existia uma obrigação de aprovisionamento exclusivo.
321 Do mesmo modo, quanto à Redfearn, a Comissão apurou nomeadamente que «o acordo relativo a 1987 previa que a Redfearn compraria à [recorrente] pelo menos 45 000 toneladas do total previsto de 47 500 toneladas (isto é, cerca de 95% das suas necessidades)» e que «estava também previsto um incentivo suplementar para comprar qualquer tonelagem adicional à [recorrente] sob a forma de um desconto de 10 libras esterlinas [(GBP)]». Ora, a recorrente não impugna a existência dessa obrigação de a Redfearn se aprovisionar junto dela numa parte considerável das suas necessidades.
322 Portanto, sem que seja necessário analisar todos os documentos em que a Comissão se baseou na decisão recorrida, há que concluir que a Comissão considerou acertadamente que a recorrente tinha celebrado acordos de aprovisionamento contrários ao artigo 82.° CE.
323 Consequentemente, há que julgar improcedente a segunda parte do quinto fundamento.
Quanto à terceira parte, relativa aos outros incentivos financeiros
– Argumentos das partes
324 A recorrente alega que os outros incentivos financeiros foram geralmente feitos a pedido do cliente, para lhe permitir desenvolver‑se por exportações que de outro modo não seriam rentáveis ou manter a sua quota de mercado ou ainda enfrentar importações de bens baratos. Esses acordos não tinham tido por objectivo vincular os clientes.
325 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
– Apreciação do Tribunal Geral
326 Nos considerandos 148 a 150 da decisão recorrida, a Comissão indica o seguinte:
«148) Nas suas relações com a Beatson Clarke, a [recorrente] frisou que o ‘pacote de apoio’, suplementar ao desconto ‘top slice’, dependia de aquela empresa satisfazer a 100% as suas necessidades junto [dela], condição que foi confirmada por escrito. Este ‘incentivo’ especial tinha por objecto e efeito reforçar a posição da [recorrente] em relação ao cliente [e] excluir a concorrência.
149) Todas as medidas referidas nos considerandos 139 a 147 tinham por objectivo afastar ou restringir as oportunidades dos outros produtores ou fornecedores de carbonato de sódio de concorrerem com a [recorrente]. Devem ser apreciadas à luz da estratégia declarada da [recorrente] de conservar um verdadeiro monopólio (mas não a 100%) do mercado [em causa]. Aquelas medidas consolidaram, pois, a posição dominante da [recorrente] de um modo que é incompatível com o conceito de concorrência inerente ao artigo 82.° [CE].
150) Os descontos não reflectiam eventuais diferenças de custo em função da tonelagem fornecida, mas dependiam de o cliente se abastecer junto da [recorrente] para satisfazer a totalidade, ou a maior percentagem possível, das suas necessidades. O sistema de desconto ‘top slice’ envolvia, pois, variações consideráveis de cliente para cliente quanto à tonelagem que permitia ‘accionar’ o sistema. Verificavam‑se também diferenças quanto ao montante por tonelada do próprio desconto, entre 6 libras esterlinas [GBP] por tonelada e 30 libras esterlinas [GBP] ou mais.»
327 A esse respeito, há que referir que a recorrente não impugna a existência dos incentivos financeiros oferecidos aos seus clientes.
328 Como acima referido no n.° 305, o facto de os incentivos financeiros terem sido oferecidos aos clientes a seu pedido, de essas medidas terem por fim ajudá‑los a exportar ou a manter a sua quota de mercado ou ainda a enfrentar bens importados baratos e de essas medidas serem transparentes não são elementos relevantes para a apreciação da sua legalidade face ao artigo 82.° CE. Quanto ao argumento de os acordos não terem por objectivo nem por efeito a vinculação dos clientes, não pode ser aceite, pois resulta nomeadamente dos considerandos da decisão recorrida acima referidos que a recorrente tinha precisado, pelo menos quanto a um cliente, que as medidas de ajuda, que acresciam ao desconto sobre a parte superior, estavam sujeitas ao seu compromisso de se abastecer a 100% junto dela. Da mesma forma que os descontos sobre a tonelagem marginal, estes acordos destinavam‑se, portanto, pelo menos alguns deles, a impedir o aprovisionamento dos clientes junto de produtores concorrentes.
329 Assim, há que julgar improcedente a terceira parte do quinto fundamento e, consequentemente, o quinto fundamento na íntegra.
Quanto ao sexto fundamento, inexistência de afectação do comércio entre Estados‑Membros
Argumentos das partes
330 A recorrente assinala que as dificuldades da Comissão em demonstrar a afectação do comércio entre Estados‑Membros resultam da sua análise breve e contraditória dessa questão. Afirma que essa análise já foi criticada pelo Tribunal Geral no n.° 63 do acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra. Além disso, a Comissão não reproduziu na decisão recorrida um elemento importante que constava da comunicação de acusações, o facto de a política de fixação de preços da recorrente ter efeitos no comércio intracomunitário.
331 Do mesmo modo, a Comissão não explica o fenómeno de «fenómeno da estrita separação entre mercados nacionais na CEE», referido no considerando 152 da decisão recorrida nem estabelece a ligação entre essa separação e o alegado abuso. Com efeito, depois de ter entendido, no momento da adopção da Decisão 91/300, que a separação dos mercados se devia às práticas concertadas entre a recorrente e a Solvay, a Comissão não reproduziu a sua alegação de «estrita separação» na decisão recorrida. Por outro lado, a recorrente assinala que a Comissão não refuta a explicação da separação dos mercados que apresentou e que se baseia numa análise económica detalhada e não impugnada. Entende que a explicação dada é confirmada pelas próprias conclusões da Comissão nos processos antidumping.
332 Por outro lado, a alegação da Comissão de que a recorrente queria que a General Chemical ficasse no mercado em causa é «ilógica» e «não corroborada» por provas. Com efeito, a Comissão não apresentou qualquer análise económica de suporte a essa alegação. Além disso, esta é desmentida pelas próprias conclusões da Comissão na Decisão 91/301/CEE da Comissão, de 19 de Dezembro de 1990, relativa a um processo de aplicação do n.° 1 do artigo 85.° do Tratado CEE (IV/33.016 – ANSAC) (JO L 152, p. 54, a seguir «decisão ANSAC»). A Comissão também não tenta corroborar a sua afirmação de que, sem a General Chemical, os consumidores poderiam ser incentivados a procurar outras fontes de aprovisionamento, talvez a melhor preço, na Europa Ocidental continental. A esse respeito, a recorrente refere o Regulamento (CE) n.° 823/95 da Comissão, de 10 de Abril de 1995 que institui um direito anti‑dumping provisório sobre as importações de carbonato dissódico originário dos Estados Unidos da América (JO 1995, L 83, p. 8), nos termos do qual, durante pelo menos três anos e meio após a cessação das práticas alegadamente abusivas, não houve qualquer alteração da configuração das trocas entre o Reino Unido e a Europa continental.
333 A Comissão contesta os argumentos da recorrente.
Apreciação do Tribunal Geral
334 Segundo jurisprudência assente, a interpretação e a aplicação da condição relativa aos efeitos sobre o comércio entre Estados‑Membros, contida nos artigos 81.° CE e 82.° CE, devem basear‑se no objectivo dessa condição, que é definir, em matéria de regulamentação da concorrência, o domínio do direito comunitário face ao dos Estados‑Membros. Deste modo, o direito comunitário cobre qualquer acordo e qualquer prática susceptível de pôr em causa a liberdade de comércio entre os Estados‑Membros de uma forma que possa prejudicar a realização dos objectivos de um mercado único entre os Estados‑Membros, em particular através da compartimentação dos mercados nacionais ou modificando a estrutura da concorrência dentro do mercado comum (acórdãos de 31 de Maio de 1979, Hugin/Comissão, 22/78, Recueil, p. 1869, n.° 17, e de 25 de Janeiro de 2007, Dalmine/Comissão, C‑407/04 P, Colect., p. I‑829, n.° 89).
335 Para serem susceptíveis de afectar o comércio entre Estados‑Membros, uma decisão, um acordo ou uma prática devem, com base num conjunto de elementos de facto e de direito, permitir que se encare com um grau suficiente de probabilidade a sua influência directa ou indirecta, actual ou potencial, sobre as correntes comerciais entre Estados‑Membros, de modo a que se possa temer que entravem a realização de um mercado único entre Estados‑Membros. É, além disso, necessário que esta influência não seja insignificante (acórdãos de 28 de Abril de 1998, Javico, C‑306/96, Colect., p. I‑1983, n.° 16; de 21 de Janeiro de 1999, Bagnasco e o., C‑215/96 e C‑216/96, Colect., p. I‑135, n.° 47; e Dalmine/Comissão, referido no n.° 334, supra, n.° 90). A esse respeito, como acima se refere no n.° 308, 8% das vendas totais de carbonato de sódio da recorrente não podem ser considerados uma quantidade negligenciável dessas vendas.
336 No caso, refira‑se que a Comissão teve suficiente fundamento para considerar que as práticas imputadas à recorrente eram susceptíveis de afectar o comércio entre Estados‑Membros.
337 Com efeito, por um lado, os descontos sobre a tonelagem marginal têm um efeito de exclusão, na medida em que um desconto de fidelidade, concedido como contrapartida de um compromisso de um cliente se abastecer exclusivamente ou quase exclusivamente na empresa em posição dominante, se destina a impedir, através da concessão de vantagens económicas, o abastecimento dos clientes nos produtores concorrentes (acórdão Michelin/Comissão, referido no n.° 295, supra, n.° 56; v. ainda acórdão Suiker Unie e o./Comissão, referido no n.° 296, supra, n.° 518). Ora, ao barrar o acesso de concorrentes ao mercado, a conduta da recorrente pode ter repercussões nos fluxos comerciais e na concorrência no mercado comum (v., neste sentido, acórdão Nederlandsche Banden‑Industrie‑Michelin/Comissão, referido no n.° 288, supra, n.° 103).
338 Por outro lado, a Comissão baseia‑se num documento de estratégia da recorrente, de 28 de Junho de 1985, segundo o qual ela pretendia impedir ou eliminar todas as importações de carbonato de sódio denso no Reino Unido, com excepção das da General Chemical [antigamente Allied] (considerandos 66 a 70 da decisão recorrida). Com efeito, nos termos dessa nota da recorrente, referida no considerando 70 da decisão recorrida:
«A estratégia continua a ser a de oferecer preços competitivos em qualquer situação numa base de entrega com o objectivo de alcançar a tonelagem de base [da recorrente], e de oferecer negócios ‘top slice’ até 15 libras esterlinas por tonelada para obter da Allied uma tonelagem adicional. O objectivo é o de conservar a posição da Allied a um nível inferior a 30 Kt por ano. A nossa intenção não é a de obrigar a Allied a retirar‑se do mercado, uma vez que tal obrigaria a indústria vidreira a procurar abastecer‑se junto de fornecedores quer da Europa Ocidental, quer da Europa do Leste.»
339 Nos seus articulados, a recorrente não impugna a existência nem o conteúdo dessa nota de estratégia. Portanto, a própria recorrente admite que as suas práticas geraram, pelo menos potencialmente, correntes comerciais diferentes das que teriam resultado de um mercado aberto à concorrência. Quanto a esse ponto, há que esclarecer que o critério acima referido no n.° 335, segundo o qual a influência nas correntes comerciais entre Estados‑Membros não deve ser insignificante, está efectivamente preenchido no caso presente.
340 Nenhum argumento da recorrente é susceptível de pôr em causa a conclusão de que as práticas que lhe são imputadas eram susceptíveis de afectar o comércio entre Estados‑Membros.
341 Em primeiro lugar, a recorrente alega que, no acórdão ICI II, referido no n.° 16, supra, o Tribunal Geral criticou a análise da Comissão sobre a afectação do comércio entre Estados‑Membros. Contudo, resulta do n.° 63 desse acórdão que a ambiguidade referida pelo Tribunal era unicamente relativa ao facto de a Comissão ter dado por provado que as medidas tomadas pela recorrente afectavam e comércio interestatal em vez de dar por provado que eram susceptíveis de o afectar. Além disso, o Tribunal Geral não pôs em causa o facto de, nesse processo, as medidas aplicadas pela recorrente serem susceptíveis de afectar o comércio entre Estados‑Membros.
342 Em segundo lugar, a recorrente alega que a Comissão não reproduziu na decisão recorrida um elemento importante que figurava na comunicação de acusações, a saber, que a sua política de fixação de preços tinha efeitos no comércio intracomunitário. Contudo, refira‑se a esse respeito que a fiscalização do Tribunal Geral não tem por objecto uma parte da comunicação de acusações não reproduzida na decisão recorrida. O Tribunal deve unicamente analisar se a decisão recorrida, na parte dedicada à afectação do comércio, respeita o artigo 82.° CE, tal como interpretado pela jurisprudência.
343 Em terceiro lugar, a recorrente critica a Comissão por não ter explicado o fenómeno da «da estrita separação entre mercados nacionais na CEE» nem a ligação entre essa separação e o alegado abuso. Entende que a Decisão 91/300 se baseava no facto de a Comissão ter verificado uma separação dos mercados resultante das práticas concertadas existentes entre a recorrente e a Solvay, que foram objecto da Decisão 91/297, a qual foi posteriormente anulada pelo Tribunal Geral. Contudo, independentemente da questão de saber se a Comissão tinha que indicar na decisão recorrida as causas da separação dos mercados, refira‑se que, por um lado, a recorrente não nega que essa separação existia e, por outro, os elementos contidos na decisão recorrida justificam que se considere que os descontos sobre a tonelagem marginal aplicados pela recorrente eram susceptíveis, pelo seu efeito de exclusão, de afectar o comércio entre Estados‑Membros.
344 Em quarto lugar, a recorrente contesta a alegação da Comissão de que queria que a General Chemical ficasse no mercado em causa. A esse respeito, baseia‑se na decisão ANSAC, adoptada no mesmo dia da Decisão 91/300. Contudo, a recorrente não demonstra que a decisão ANSAC contradiz a Decisão 91/300. Com efeito, a passagem da decisão ANSAC citada pela recorrente na petição faz parte das conclusões da ANSAC e não da apreciação da Comissão, a qual, de resto, não aceitou essas conclusões.
345 Em quinto lugar, a recorrente invoca o Regulamento n.° 823/95, cujo considerando 45 refere o seguinte:
«Entre 1990 e o período de inquérito, o comércio entre Estados‑Membros de carbonato dissódico produzido na Comunidade aumentou apenas a uma taxa bastante reduzida. A posição dos diferentes operadores comunitários nos mercados nacionais não sofreu praticamente qualquer alteração relativa, não se verificando qualquer alteração na estrutura das trocas comerciais entre o Reino Unido e a Europa continental.»
346 Contudo, o facto de o comércio entre o Reino Unido e a Europa continental não ter sido alterado depois da data aceite da cessação das infracções não basta para considerar que as práticas imputadas à recorrente não eram susceptíveis de afectar o comércio entre Estados‑Membros.
347 Resulta do exposto que há que julgar improcedente o sexto fundamento e, consequentemente, o pedido de anulação da decisão recorrida.
2. Quanto ao pedido de supressão ou redução da coima
348 A título preliminar, a recorrente salienta que o seu pedido de supressão ou redução da coima não deve ser interpretado como qualquer reconhecimento da infracção ao artigo 82.° CE e que é deduzido a título subsidiário.
349 A recorrente apresenta, no essencial, quatro fundamentos em suporte do seu pedido de supressão ou de redução da coima. Consistem, primeiro, no decurso do tempo, segundo, na errada apreciação da gravidade da infracção, terceiro, na errada apreciação da duração da infracção e, quarto, na existência de circunstâncias atenuantes.
Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao decurso do tempo
Argumentos das partes
350 A recorrente alega que, mesmo se a Comissão fosse competente para lhe aplicar uma coima, o Tribunal Geral deveria, no caso presente, no âmbito da sua competência de plena jurisdição, suprimir a coima.
351 A recorrente invoca, antes de mais, o tempo decorrido entre a adopção da Decisão 91/300 e a da decisão recorrida.
352 A recorrente salienta, em seguida, que a Comissão não «articulou» correctamente os fundamentos relativos à coima nem teve em conta as alterações de circunstâncias relevantes ocorridas depois da adopção da Decisão 91/300. Afirma que não está esclarecido se o colégio dos comissários tinha consciência dessas alterações na data em que a decisão recorrida foi alegadamente adoptada.
353 A Comissão contesta os argumentos da recorrente
Apreciação do Tribunal Geral
354 Resulta da análise dos argumentos da recorrente no âmbito dos primeiro e segundo fundamentos do seu pedido de anulação integral da decisão recorrida que a Comissão adoptou a decisão recorrida em observância do Regulamento n.° 2988/74 e do princípio do prazo razoável. Portanto, não se pode acusar a Comissão de ter demorado a adoptar a decisão recorrida. Além disso, resulta da jurisprudência que, na determinação do montante das coimas por infracção ao direito da concorrência, a Comissão deve não só ter em consideração a gravidade da infracção e as circunstâncias específicas do caso concreto, mas também o contexto em que a infracção foi cometida e zelar pelo carácter dissuasivo da sua acção, sobretudo para os tipos de infracção particularmente nocivos para a realização dos objectivos da Comunidade (acórdão de 7 de Junho de 1983, Musique diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.° 106, e acórdão do Tribunal Geral de 5 de Abril de 2006, Degussa/Comissão, T‑279/02, Colect., p. II‑897, n.° 272).
355 Consequentemente, não há que anular a coima aplicada à recorrente em razão do tempo decorrido entre a adopção da Decisão 91/300 e a da decisão recorrida.
356 Assim, há que julgar improcedente o primeiro fundamento.
Quanto ao segundo fundamento, apreciação errada da gravidade da infracção
Argumentos das partes
357 A recorrente alega que o montante da coima aplicada pela Decisão 91/300 era manifestamente excessivo. Além disso, nenhum sistema de fixação de preços semelhante ao seu foi anteriormente objecto de uma «decisão pertinente» da Comissão ou dos tribunais comunitários. A Comissão cometeu, pois, um erro de princípio ao considerar, em 1990, que a alegada infracção tinha «particular gravidade». A recorrente alega ainda que, para determinar o montante da coima, a Comissão deveria ter tido também em conta em 1990 a coima aplicada pela alegada violação do artigo 81.° CE. Entende que a Comissão tratou as infracções como totalmente distintas, apesar de ter havido uma sobreposição dos efeitos na concorrência e no comércio na Comunidade, o que levou a uma duplicação e a coimas excessivas.
358 Por outro lado, a Comissão não se refere na decisão recorrida às Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.°, do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA (JO 1998, C 9, p. 3, a seguir «orientações para o cálculo das coimas»). Ora existem na decisão recorrida considerações incompatíveis com as orientações para o cálculo das coimas, nomeadamente quanto ao facto de unicamente as infracções repetidas do mesmo tipo deverem ser consideradas circunstâncias agravantes.
359 Além disso, a Comissão não teve em conta, na decisão recorrida, o facto de no período posterior à adopção da Decisão 91/300, nunca ter sido condenada por infracção aos artigos 81.° CE e 82.° CE.
360 Por último, a recorrente afirma que gastou 171 729,93 GBP para prestar garantias quanto à coima aplicada na Decisão 91/300 e 120 200 GBP quanto à coima aplicada na Decisão 91/297, duas decisões que foram anuladas pelo Tribunal Geral. Entende que a Comissão deveria ter tido em conta essas quantias ao fixar o montante da presente coima. Além disso, alega ter sofrido custos internos irrecuperáveis por causa das acções que efectuou para demonstrar que a Decisão 91/300 era ilegal e por causa do recurso de segunda instância supérfluo e sem objecto interposto pela Comissão. De qualquer forma, a coima deve ser reduzida, de acordo com o acórdão Baustahlgewebe/Comissão, referido no n.° 115, supra, devido ao excessivo período decorrido entre o início do inquérito em Abril de 1989 e a adopção da decisão recorrida.
361 A Comissão responde que a referência à Decisão 91/297 é «despropositada», pois foi anulada e que não adoptou qualquer nova decisão a esse respeito. Além disso, mesmo que a coima aplicada na Decisão 91/300 fosse equivalente a uma dada percentagem do volume de negócios da recorrente no carbonato de sódio durante determinado exercício, isso não seria relevante pois a coima foi aplicada para punir uma infracção cometida ao longo de vários anos. A Comissão lembra que o volume de negócios a que se refere o Regulamento n.° 17 é o volume de negócios mundial realizado com todos os produtos e que dez milhões de ecus representava uma percentagem extremamente pequena do volume de negócios total da recorrente.
362 Por outro lado, quanto ao argumento da recorrente de que não seguiu as orientações para o cálculo das coimas, a Comissão observa que a recorrente não alega que as devia ter aplicado. A esse respeito, a Comissão precisa que, se tivessem sido aplicados os níveis indicativos das coimas referidos nas orientações para o cálculo das coimas, teriam levado a uma coima superior por uma infracção tão grave como a cometida pela recorrente. De qualquer forma, não há qualquer incoerência entre a decisão recorrida e as orientações para o cálculo das coimas. Com efeito, é patente que a lista contida no ponto 2 das orientações para o cálculo das coimas é dada «unicamente a título de exemplo».
363 O facto de não ter sido imputada à recorrente qualquer infracção desde 1990 não é relevante para a determinação do montante da coima relativa a uma infracção cometida antes dessa data. Do mesmo modo, as despesas de constituição de garantias por causa da Decisão 91/300 não podem entrar em linha de conta na determinação do montante da coima na decisão recorrida.
Apreciação do Tribunal Geral
364 Em primeiro lugar, a recorrente critica a apreciação da Comissão quanto ao montante da coima que lhe foi aplicada na Decisão 91/300. Contudo, uma vez que essa decisão foi anulada pelo Tribunal Geral e a presente lide apenas tem por objecto um pedido de anulação da decisão recorrida e, a título subsidiário, a anulação ou redução da coima aplicada na decisão recorrida, não há que analisar os argumentos da recorrente relativos à coima aplicada na Decisão 91/300 acima referidos, nomeadamente no n.° 357.
365 Em segundo lugar, há que lembrar que, segundo jurisprudência assente, embora a Comissão disponha de um poder de apreciação na fixação do montante de cada coima, sem ter que aplicar uma fórmula matemática precisa, o Tribunal Geral decide, ao abrigo do artigo 17.° do Regulamento n.° 17, com competência de plena jurisdição, na acepção do artigo 229.° CE, os recursos interpostos das decisões em que a Comissão fixe uma coima, podendo, consequentemente, suprimir, reduzir ou aumentar a coima aplicada (acórdãos do Tribunal Geral de 29 de Abril de 2004, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑236/01, T‑239/01, T‑244/01 a T‑246/01, T‑251/01 e T‑252/01, Colect., p. II‑1181, n.° 165, e de 13 de Dezembro de 2006, FNCBV e o./Comissão, T‑217/03 e T‑245/03, Colect., p. II‑4987, n.° 358).
366 Quanto à aplicação das orientações para o cálculo das coimas, há que lembrar que, tendo a Decisão 91/300 sido anulada por vício de forma, a Comissão podia adoptar nova decisão sem abrir novo procedimento administrativo.
367 Uma vez que o conteúdo da decisão recorrida é quase idêntico ao da Decisão 91/300 e essas duas decisões se baseiam nos mesmos fundamentos, a decisão recorrida está sujeita, no âmbito da fixação do montante da coima, às normas em vigor no momento da adopção da Decisão 91/300.
368 Com efeito, a Comissão retomou o procedimento no ponto em que se produziu o erro procedimental e, sem proceder a uma nova apreciação do caso à luz de normas que não existiam na época da adopção da Decisão 91/300, adoptou uma nova decisão. Ora, a adopção de uma nova decisão exclui em qualquer caso a aplicação das orientações posteriores à primeira adopção.
369 Consequentemente, as orientações para o cálculo das coimas não são aplicáveis no caso presente.
370 Em terceiro lugar, refira‑se que a Comissão considerou que as infracções imputadas à recorrente tinham sido «especialmente graves» (considerando 156 da decisão recorrida).
371 A esse respeito, há que lembrar que, segundo a jurisprudência, o montante das coimas deve ser graduado em função das circunstâncias e da gravidade da infracção, devendo a apreciação dessa gravidade para esse efeito ser efectuada levando em conta a natureza das restrições causadas à concorrência (v. acórdão do Tribunal Geral de 23 de Fevereiro de 1994, CB e Europay/Comissão, T‑39/92 e T‑40/92, Colect., p. II‑49, n.° 143 e jurisprudência aí referida).
372 Assim, para apreciar a gravidade das infracções às normas comunitárias da concorrência imputáveis a uma empresa, a fim de determinar um montante de coima que lhe seja proporcional, a Comissão pode ter em conta a duração particularmente longa de certas infracções, o número e a diversidade das infracções, que abrangeram a totalidade ou a quase totalidade dos produtos da empresa em causa, alguns dos quais afectando todos os Estados‑Membros, a gravidade particular de infracções integradas numa estratégia deliberada e coerente com vista, através de diversas práticas eliminatórias dos concorrentes e de uma política de fidelização dos clientes, a manter artificialmente ou a reforçar a posição dominante da empresa em mercados onde a concorrência já era limitada, os efeitos de abuso particularmente nefastos no plano da concorrência e a vantagem obtida pela empresa com as suas infracções (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 6 de Outubro de 1994, Tetra Pak/Comissão, T‑83/91, Colect., p. II‑755, n.os 240 e 241).
373 No caso, há que considerar que as práticas imputadas à recorrente justificavam a qualificação feita pela Comissão.
374 Com efeito, ao conceder descontos sobre a tonelagem marginal aos seus clientes e ao celebrar acordos de fidelização com eles, a recorrente lesou gravemente a concorrência. Como acertadamente refere a Comissão
«[As infracções cometidas pela recorrente] faziam parte de uma política deliberada destinada a consolidar o [seu] controlo […] sobre o mercado [em causa] numa medida que estava em absoluto conflito com os objectivos fundamentais do Tratado. Além disso, tinham especificamente por objectivo restringir ou prejudicar a actividade de certos concorrentes […] Ao excluir durante um longo período oportunidades de vendas para os seus concorrentes, a [recorrente] causou um prejuízo duradouro à estrutura do mercado em causa, em detrimento dos consumidores.»
375 A título puramente indicativo, há que observar que as orientações para o cálculo das coimas, apesar de não serem aqui aplicáveis, referem que os descontos fidelizadores concedidos por uma empresa em posição dominante com o fim de excluir do mercado os seus concorrentes constituem uma infracção «grave», cujos possíveis montantes de partida para o cálculo da coima vão de 1 a 20 milhões de euros.
376 Em quarto lugar, quanto à reincidência, há que referir que, em resposta a uma questão escrita do Tribunal, a Comissão confirmou que a acusação feita no considerando 159 da decisão recorrida, a de que a recorrente já tinha sido objecto em diversas ocasiões de coimas substanciais por colusão na indústria química (peróxidos, polipropileno, PVC), constituía uma circunstância agravante.
377 A esse respeito, há que lembrar que, segundo a jurisprudência, a análise da gravidade da infracção cometida deve ter em conta uma eventual reincidência (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 128, supra, n.° 91, e acórdão do Tribunal Geral de 25 de Outubro de 2005, Groupe Danone/Comissão, T‑38/02, Colect., p. II‑4407, n.° 348).
378 O conceito de reincidência, tal como entendido num certo número de ordenamentos jurídicos nacionais, implica que uma pessoa tenha cometido novas infracções após ter sido punida por infracções semelhantes (acórdão do Tribunal Geral de 11 de Março de 1999, Thyssen Stahl/Comissão, T‑141/94, Colect., p. II‑347, n.° 617).
379 As orientações para o cálculo das coimas, mesmo não sendo aplicáveis na presente lide, vão no mesmo sentido quando se referem a uma «infracção do mesmo tipo».
380 Ora, há que observar que as infracções pelas quais, por várias vezes, foram aplicadas coimas substanciais à recorrente por colusão na indústria química estão todas ligadas ao artigo 81.° CE. Com efeito, como afirma a Comissão, estão em causa a sua Decisão 69/243/CEE, de 24 de Julho de 1969, relativa a um processo nos termos do artigo [81.° CE] (IV/31.149 – Materiais corantes) (JO 1969, L 195, p. 11), a sua Decisão 86/398/CEE, de 23 de Abril de 1986 relativa a um processo para aplicação do artigo [81.° CE] (IV/31.149 – Polipropileno) (JO L 230 p. 1), e, por último, a Decisão 89/190/CEE, de 21 de Dezembro de 1988, relativa a um processo de aplicação do artigo [81.° CE] (IV/31.865 – PVC) (JO 1989, L 74, p. 1). Por outro lado, as práticas objecto das decisões referidas no número anterior são muito diferentes das que estão aqui em causa.
381 Portanto, a Comissão imputou erradamente à recorrente uma circunstância agravante, pelo que deve a decisão recorrida ser alterada, reduzindo‑se em 5% o montante da coima que lhe foi aplicada.
382 Em quinto lugar, o argumento da recorrente de que não sofreu qualquer condenação por violação dos artigos 81.° CE e 82.° CE desde a adopção da Decisão 91/300 não colhe, pois a decisão recorrida é relativa unicamente a factos anteriores a 1990.
383 Em sexto lugar, não colhem os argumentos da recorrente de que, ao fixar o montante da coima no caso presente, a Comissão deveria ter tido em conta, por um lado, as despesas efectuadas com a constituição das garantias relativas à coima aplicada na Decisão 91/300 e à coima aplicada na Decisão 91/297 e, por outro, os custos internos irrecuperáveis devidos às acções que teve que empreender para demonstrar que a Decisão 91/300 era ilegal e com o recurso de segunda instância supérfluo e sem objecto interposto pela Comissão. Com efeito, resulta da jurisprudência que, na determinação do montante das coimas por infracção ao direito da concorrência, a Comissão deve não só ter em consideração a gravidade da infracção e as circunstâncias específicas do caso concreto, mas também o contexto em que a infracção foi cometida e zelar pelo carácter dissuasivo da sua acção, sobretudo para os tipos de infracção particularmente nocivos para a realização dos objectivos da Comunidade (acórdãos Musique diffusion française e o./Comissão, referido no n.° 354, supra, n.° 106, e Degussa/Comissão, referido no n.° 354, supra, n.° 272). Ora, no caso, mesmo admitindo que a recorrente tivesse efectuado despesas com a constituição das garantias para o pagamento das coimas aplicadas nas decisões que vieram a ser anuladas e para demonstrar que uma dessas decisões era ilegal, a Comissão não pode ser criticada por não as ter tido em conta, pois a recorrente podia pedir o seu reembolso em sede de acção de indemnização.
384 Em sétimo lugar, na análise do primeiro fundamento invocado pela recorrente, o Tribunal Geral julgou improcedente a alegação de violação do princípio do prazo razoável pela Comissão. Portanto, a jurisprudência do acórdão Baustahlgewebe/Comissão, referido no n.° 115, supra, relativa a uma violação do princípio do prazo razoável, não é invocável na presente lide.
385 Em conclusão, visto a Comissão ter imputado erradamente uma circunstância agravante à recorrente, há que alterar a decisão recorrida, reduzindo o montante da coima em 5%, isto é, no montante de 500 000 euros.
Quanto ao terceiro fundamento, apreciação errada da duração da infracção
Argumentos das partes
386 Quanto ao fim da infracção, a recorrente alega que as conclusões da Comissão são contraditórias e não são corroboradas por provas.
387 Com efeito, no considerando 2 da decisão recorrida indica‑se que a infracção decorreu até ao «até ao final de 1990». Em contrapartida, nos considerandos 160 e 161 da decisão recorrida, esclarece‑se que a infracção «continuou, pelo menos, até finais de 1989» e que a recorrente abandonou o sistema dos descontos «top slice» com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1990. Do mesmo modo, no artigo 1.° da decisão recorrida, a Comissão refere‑se «até, pelo menos, ao final de 1989» como o momento em que a infracção teve o seu termo. A recorrente afirma igualmente que a Comissão não faz qualquer prova da existência de um comportamento ilícito depois de 1989.
388 Quanto ao início da infracção, a recorrente alega que a Comissão não dispõe de qualquer prova de que a infracção tivesse começado em 1983 ou da identidade dos clientes a quem se destinavam os descontos sobre a parte superior. Assim, na comunicação de acusações, a Comissão fixou o ano de 1984 como data do início da infracção. De qualquer forma, nenhum dos documentos invocados pela Comissão tem data anterior a 1de Janeiro de 1985.
389 Segundo a recorrente, uma vez que se verifica que o montante da coima foi fixado com base em oito anos, isto é 1983 a 1990, apesar de a Comissão apenas apresentar provas de uma duração de cinco anos, de 1985 a 1989, há que reduzir esse montante em 35 a 40%, sem prejuízo das outras considerações expostas.
390 Quanto ao fim da infracção, a Comissão assinala que a incoerência referida pela recorrente se limita ao considerando 2 da decisão recorrida, onde se indica que os descontos sobre a parte superior concedidos pela recorrente tinham cessado no final de 1990, quando resulta claramente das outras disposições da decisão recorrida que a infracção teve o seu termo em 1989. Entende que o colégio dos comissários adoptou a decisão recorrida no seu conjunto e que não existe aí qualquer confusão.
391 Quanto à data de início da infracção, a Comissão reconhece que não sabe exactamente em que data foram celebrados os acordos relativos aos descontos sobre a parte superior, em 1983 ou 1984, mas afirma ser incontestável que duraram mais de cinco anos, que começaram antes de 1985 e que só foram abandonados no final de 1989. Assim, a coima aplicada à recorrente não é excessiva para uma infracção com essa duração.
Apreciação do Tribunal Geral
392 A título preliminar, refira‑se que, embora este fundamento se dirija formalmente à anulação ou redução da coima, deve ser lido também como um pedido de anulação parcial da decisão recorrida, na medida em que o seu artigo 1.° refere que a recorrente violou as disposições do artigo 82.° CE em 1983.
393 Nos termos da decisão recorrida, quanto à duração da infracção:
«2) Desde aproximadamente 1983 até ao final de 1990, a [recorrente] abusou da posição dominante que detinha no mercado do carbonato de sódio no Reino Unido, ao aplicar aos seus principais clientes um sistema de descontos de fidelidade e de descontos relativos à tonelagem marginal ‘top slice rebates’, ao concluir acordos de natureza contratual tendentes a assegurar à [recorrente] uma exclusividade de fornecimento e ao recorrer a outros mecanismos que têm tido como objecto e efeito a vinculação dos referidos clientes à [recorrente] em relação à totalidade das suas necessidades e, ainda, a exclusão dos concorrentes.
[…]
160) A infracção teve início por volta de 1983, pouco depois das negociações com a Comissão e de esta ter encerrado o processo, e continuou, pelo menos, até finais de 1989.
161) A Comissão toma em consideração o facto de a [recorrente] ter abandonado o sistema dos descontos ‘top slice’ com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1990.»
394 Seguidamente, o artigo 1.° da decisão recorrida refere:
«[…] A [recorrente] violou o disposto no artigo [82.° CE] desde aproximadamente 1983 até, pelo menos, ao final de 1989 através de um comportamento destinado a excluir ou a limitar seriamente a concorrência […].»
395 Por conseguinte, quanto à data do termo da infracção, existe uma contradição entre as disposições da decisão recorrida, pois uma menciona o «final de 1990» e as outras indicam o final de 1989.
396 A esse respeito, há que considerar que, como refere o artigo 1.° da decisão recorrida, a infracção não cessou pelo menos antes do «final de 1989», o que também é referido no considerando 160 relativo à duração da infracção, pelo que é um erro de escrita a referência ao «final de 1990», no considerando 2 da decisão recorrida, que mais não é do que um resumo da infracção cometida pela recorrente.
397 Quanto à data de início da infracção, a recorrente alega que a Comissão não dispõe de qualquer elemento de prova sobre os anos 1983 e 1984, apesar de a Comissão alegar que a recorrente celebrou os acordos relativos aos descontos sobre a parte superior antes de 1985, mesmo reconhecendo que ignora a data exacta em que esses acordos foram celebrados em 1983 ou em 1984.
398 Em resposta a uma questão escrita do Tribunal Geral, a Comissão refere certos documentos contidos no processo que entende indicarem que as práticas imputadas à recorrente já tinham sido aplicadas em 1983 e em 1984.
399 A esse respeito, refira‑se, por um lado, que, na resposta à comunicação de acusações, a própria recorrente referiu o ano de 1984 e que, no considerando 60 da decisão recorrida, se refere que, segundo a recorrente, a partir de 1984, os descontos passaram a ser maioritariamente objecto de negociação individual.
400 Por outro lado, há que observar que os documentos invocados pela Comissão em resposta à questão escrita do Tribunal Geral não permitem considerar que a infracção imputada à recorrente já se tinha verificado em 1983. Por outro lado, a Comissão reconhece que não sabe exactamente em que data foram celebrados os acordos relativos aos descontos sobre a parte superior (v. n.° 391, supra).
401 Assim, há que anular a decisão recorrida na parte em que indica que a recorrente violou as disposições do artigo 82.° CE em 1983.
402 Consequentemente, há que reduzir o montante da coima aplicada à recorrente em 15%, isto é, em 1 500 000 euros.
Quanto ao quarto fundamento, existência de circunstâncias atenuantes
403 A recorrente alega que a Comissão deveria ter dado por provadas nove circunstâncias atenuantes na apreciação da gravidade da infracção.
Quanto à primeira parte, cooperação da recorrente com a Comissão
404 A recorrente alega que foi cooperante ao ajudar plenamente a Comissão em todas as fases do inquérito e ao comparecer na audição com as testemunhas que mais contribuíram para a compreensão dos factos. Assinala que, no seu acórdão de 10 de Março de 1992, ICI/Comissão (T‑13/89, Colect., p. II‑1021), o Tribunal Geral aplicou por essa razão uma redução suplementar do montante da coima em um milhão de ecus.
405 Nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17, intitulado «Pedido de informações»:
«4) São obrigados a fornecer as informações pedidas os titulares das empresas ou seus representantes e, no caso de pessoas colectivas, de sociedades ou de associações sem personalidade jurídica, as pessoas encarregadas de as representar, segundo a lei ou os estatutos.
5) Se uma empresa ou associação de empresas não prestar as informações pedidas no prazo fixado pela Comissão ou se as fornecer de modo incompleto, a Comissão, mediante decisão, exigirá que a informação seja prestada. A decisão especificará as informações pedidas, fixará um prazo conveniente no qual a informação deve ser prestada e indicará as sanções previstas no n.° 1, alínea b), do artigo 15.° e no n.° 1, alínea c), do artigo 16.°, bem como a possibilidade de recurso da decisão para o Tribunal de Justiça.»
406 É jurisprudência assente que a cooperação no inquérito que não vá além das obrigações que para as empresas resultam do artigo 11.°, n.os 4 e 5, do Regulamento n.° 17 não justifica uma redução da coima (acórdãos do Tribunal Geral de 10 de Março de 1992, Solvay/Comissão, T‑12/89, Colect., p. II‑907, n.os 341 e 342, e de 18 de Julho de 2005, Scandinavian Airlines System/Comissão, T‑241/01, Colect., p. II‑2917, n.° 218). Em contrapartida, essa redução justifica‑se quando a empresa tiver fornecido informações que vão bastante além daquelas cuja apresentação a Comissão pode exigir nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17 (acórdão do Tribunal Geral de 9 de Julho de 2003, Daesang e Sewon Europe/Comissão, T‑230/00, Colect., p. II‑2733, n.° 137).
407 No acórdão de 10 de Março de 1992, ICI/Comissão, II, referido no n.° 404, supra (n.° 393), o Tribunal Geral tinha referido o grande pormenor da resposta da recorrente ao pedido de informações, que respeitava não só à sua actuação, mas também à actuação de todas as empresas envolvidas, resposta sem a qual teria sido muito mais difícil a Comissão dar por provada e pôr fim à infracção objecto da Decisão 91/300.
408 Contudo, no caso presente, a recorrente limita‑se a afirmar, sem juntar qualquer elemento, que ajudou plenamente a Comissão em todas as fases do inquérito e que compareceu na audição com as testemunhas que mais contribuíram para a compreensão dos factos.
409 De qualquer forma, o comportamento da recorrente não pode ser qualificado de cooperação no inquérito que vá além das obrigações impostas às empresas pelo artigo 11.°, n.os 4 e 5, do Regulamento n.° 17. Por outro lado, também não se pode considerar que a recorrente tenha fornecido informações que fossem muito além das que lhe podiam ser exigidas pela Comissão por força desse mesmo artigo.
410 Uma vez que a conduta da recorrente não pode ser considerada uma circunstância atenuante, há que julgar improcedente a primeira parte do quarto fundamento.
Quanto à segunda parte, relativa ao carácter não deliberado dos acordos de fixação de preços
411 Segundo a recorrente, os acordos em matéria de fixação de preços no sector do carbonato de sódio não constituíam uma política deliberada dos envolvidos no sentido de violar as normas da concorrência. Para esse efeito, refere uma nota interna de 29 de Novembro de 1988, redigida pelo responsável comercial da divisão «Carbonato de sódio», que tinha sido transmitida à Comissão no procedimento administrativo, segundo a qual, «à luz dos encontros entre os produtores de carbonato de sódio com a [Direcção Geral da Concorrência] há alguns anos, não [acreditava] que a natureza dos [seus] contratos [fosse] um problema de maior». Nessa nota, indica‑se também que existe muitas vezes uma fronteira muito ténue entre, por exemplo, a optimização de uma posição no mercado e um abuso de posição dominante nesse mercado. De qualquer forma, a recorrente alega que a sua conduta não foi qualificada de abusiva em nenhum acórdão anterior do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Geral. Portanto, a ter existido infracção, deve ser tratada como uma «infracção técnica».
412 Resulta de jurisprudência assente que, para se poder considerar que uma infracção às normas de concorrência do Tratado foi cometida deliberadamente, não é necessário que a empresa tenha tido consciência de infringir uma proibição aprovada por essas normas, sendo suficiente que não pudesse ignorar que essa conduta tinha por objecto restringir a concorrência no mercado comum (acórdãos do Tribunal Geral de 1 de Abril de 1993, BPB Industries e British Gypsum/Comissão, T‑65/89, Colect., p. II‑389, n.° 165, e de 27 de Julho de 2005, Brasserie nationale e o./Comissão, T‑49/02 a T‑51/02, Colect., p. II‑3033, n.° 155).
413 Ora, como acertadamente refere a Comissão no considerando 137 da decisão recorrida, o Tribunal de Justiça já proferiu vários acórdãos de condenação de práticas destinadas a impedir o acesso de concorrentes aos clientes vinculando‑os ao fornecedor dominante. A esse respeito, o acórdão Hoffmann‑Laroche/Comissão, referido no n.° 216, supra, declarou nomeadamente que o facto de uma empresa em posição dominante num mercado vincular compradores – ainda que a seu pedido – através de uma obrigação ou uma promessa de se aprovisionarem na totalidade ou em parte considerável das suas necessidades exclusivamente junto dessa empresa constitui uma exploração abusiva de uma posição dominante na acepção do artigo 82.° CE, quer essa obrigação seja estipulada sem mais, quer tenha como contrapartida a concessão de descontos.
414 Além disso, resulta do considerando 108 da decisão recorrida que a recorrente redigiu uma «nota com o título ‘Assuntos e objectivos para 1989’ […] ‘considerar a legalidade do 'top slicing' e alternativas’».
415 De resto, como refere a Comissão no considerando 158 da decisão recorrida:
«[A recorrente] tinha pleno conhecimento, devido às longas negociações com a Comissão entre 1980 e 1982, dos requisitos do artigo 82.° [CE]. A introdução dos descontos ‘top slice’ por volta de 1983 ocorreu pouco depois de a [recorrente] ter prestado garantias à Comissão de que não oferecia quaisquer incentivos especiais aos seus clientes no sentido de [lhe] comprarem a totalidade, ou a quase totalidade, das quantidades correspondentes à satisfação das suas necessidades em carbonato de sódio […].»
416 Assim, a recorrente não podia ignorar que as práticas referidas na decisão recorrida tinham por objectivo ou por efeito restringir a concorrência no mercado comum.
417 A nota interna do responsável comercial da divisão «Carbonato de sódio» da recorrente de 29 de Novembro de 1988 não é susceptível de pôr essa conclusão em causa, uma vez que a jurisprudência já tinha efectivamente declarado a ilicitude de práticas semelhantes às que a Comissão imputa à recorrente.
418 Consequentemente, há que julgar improcedente a segunda parte do quarto fundamento.
Quanto à terceira parte, existência de medidas preventivas
419 A recorrente alega ter tomado medidas aprofundadas para garantir o respeito pelas normas da concorrência. Essas medidas abrangiam um programa de formação global e contínuo instituído por advogados internos e externos. Para o efeito, foram utilizados uma cassette de vídeo, realizada profissionalmente, vendida a mais de 170 outras empresas, e um folheto explicativo. Segundo a recorrente, essas medidas foram eficazes, como demonstra a inexistência de qualquer denúncia de violações do direito da concorrência no período de dez anos posterior à adopção da Decisão 91/300.
420 A esse respeito, embora seja importante que uma empresa tenha tomado medidas para impedir que sejam cometidas futuramente novas infracções ao direito comunitário da concorrência por membros do seu pessoal, este facto em nada altera a realidade da infracção verificada. O simples facto de, em determinados casos, a Comissão ter tido em conta, na sua prática decisória anterior, a aplicação de um programa de alinhamento como circunstância atenuante não implica que tenha a obrigação de proceder da mesma forma em cada caso concreto (v. acórdão do Tribunal Geral de 15 de Março de 2006, BASF/Comissão, T‑15/02, Colect., p. II‑497, n.° 266 e jurisprudência aí referida).
421 Daí resulta que, na presente lide, não se pode criticar a Comissão por não ter tido em conta na análise da existência das circunstâncias atenuantes as medidas preventivas que a recorrente alega ter adoptado.
422 Portanto, há que julgar improcedente a terceira parte do quarto fundamento.
Quanto à quarta parte, abandono dos descontos sobre a parte superior
423 A recorrente alega que, muito antes do envio da comunicação de acusações, os seus acordos em matéria de fixação de preços do carbonato de sódio foram voluntariamente renegociados, para evitar os descontos sobre a tonelagem marginal, adoptando um preço negociado único, sem qualquer abatimento ou desconto. Invoca a Comunicação da Comissão sobre a não aplicação ou a redução de coimas nos processos relativos a acordos, decisões e práticas concertadas (JO 1996, C 207, p. 4). Entende que essa comunicação dispõe que o abandono voluntário de práticas numa fase precoce é um factor de redução substancial do montante da coima. De igual modo, por força do ponto 3 das orientações para o cálculo das coimas, é um facto que justifica uma redução muito substancial da coima.
424 A esse respeito, refira‑se que, segundo o ponto 3 das orientações para o cálculo das coimas, constitui uma circunstância atenuante o facto de «ter posto termo às infracções desde as primeiras intervenções da Comissão (nomeadamente verificações)».
425 Contudo, tal como acima resulta dos n.os 366 a 369, as orientações para o cálculo das coimas não são aplicáveis no caso presente.
426 De qualquer forma, mesmo admitindo que as orientações fossem aplicáveis no caso presente, não se pode deixar de observar que as condições previstas no ponto 3 das orientações não estão preenchidas no caso presente. Com efeito, não se pode considerar que a recorrente deixou de cometer qualquer infracção logo depois das primeiras intervenções da Comissão, como exigem as orientações para que a cessação da infracção constitua uma circunstância atenuante. A esse respeito, resulta do n.° 3, supra, que a Comissão procedeu às primeiras verificações em Abril de 1989, quando a recorrente abandonou o sistema de descontos sobre a tonelagem marginal a partir de 1 de Janeiro de 1990, tal como resulta do considerando 161 da decisão recorrida.
427 Refira‑se, aliás, que o ponto 3 das orientações não pode ser interpretado no sentido de que o simples facto de um infractor cessar todas as infracções logo com as primeiras intervenções da Comissão constitui de uma forma geral e sem reserva uma circunstância atenuante. Com efeito, essa interpretação desse ponto 3 diminuiria o efeito útil das disposições que permitem a manutenção de uma concorrência eficaz, pois enfraqueceria quer a sanção eventualmente aplicável por uma infracção ao artigo 81.° CE, quer o seu efeito dissuasor. Por conseguinte, há que interpretar essa disposição no sentido de que só as circunstâncias específicas do caso concreto, nas quais se concretize a hipótese do termo da infracção logo com as primeiras intervenções da Comissão, podem justificar que essa circunstância seja tomada em conta como circunstância atenuante (acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Archer Daniels Midland/Comissão, T‑59/02, Colect., p. II‑3627, n.os 335 e 338).
428 No caso, há que lembrar que a Comissão acusa a recorrente de ter abusado da sua posição dominante no mercado do carbonato de sódio no Reino Unido ao aplicar aos seus principais clientes um sistema de descontos de fidelidade e de descontos ligados à tonelagem marginal, condições contratuais destinadas a garantir‑lhe uma exclusividade efectiva de aprovisionamento e outras medidas que tinham por objectivo e por efeito vincular clientes pela totalidade ou quase totalidade das suas necessidades e excluir os concorrentes. A este respeito, refira‑se nomeadamente que a recorrente não impugna a existência nem o conteúdo dos documentos invocados pela Comissão na decisão recorrida, dos quais resulta que os descontos sobre a parte superior não assentavam numa contrapartida economicamente justificada e que visavam impedir o aprovisionamento dos clientes junto de produtores concorrentes. Refira‑se ainda, como acima se observa nos n.os 370, 373 e 374, que as infracções imputadas à recorrente têm particular gravidade.
429 Portanto, há que considerar que, mesmo admitindo que as orientações eram aplicáveis e que a recorrente tinha deixado de oferecer descontos sobre a parte superior aos seus clientes logo com as primeiras intervenções da Comissão, isso não pode ser considerado uma circunstância atenuante no caso presente.
430 Consequentemente, há que julgar improcedente a quarta parte do quarto fundamento.
Quanto à quinta parte, âmbito limitado dos descontos
431 Segundo a recorrente, as tonelagens afectadas pelos descontos sobre a parte superior apenas representam 8% das suas vendas totais de carbonato de sódio.
432 A esse respeito, há que lembrar que, na apreciação da gravidade de uma infracção, a Comissão deve ter em consideração numerosos elementos cuja natureza e importância variam consoante o tipo e as circunstâncias particulares da infracção. Entre esses elementos podem figurar o volume e o valor das mercadorias objecto da infracção, bem como a dimensão e o poder económico da empresa e, portanto, a influência que ela pôde exercer no mercado (acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, referido no n.° 354, supra, n.° 120).
433 No caso presente, quanto à gravidade da infracção, a Comissão referiu o seguinte:
«156) No presente caso, a Comissão considera que as infracções ao artigo 82.° [CE] foram especialmente graves. Faziam parte de uma política deliberada destinada a consolidar o controlo da [recorrente] sobre o mercado [em causa] numa medida que estava em absoluto conflito com os objectivos fundamentais do Tratado. Além disso, tinham especificamente por objectivo restringir ou prejudicar a actividade de certos concorrentes.
(157) Ao excluir durante um longo período oportunidades de vendas para os seus concorrentes, a [recorrente] causou um prejuízo duradouro à estrutura do mercado em causa, em detrimento dos consumidores.»
434 Consequentemente, há que observar que a Comissão teve efectivamente em conta a influência que a infracção pôde exercer no mercado, a qual, nas circunstâncias do caso presente, não pode ser limitada unicamente ao montante das quantidades de carbonato de sódio afectadas pelos descontos sobre a tonelagem marginal.
435 De qualquer forma, resulta de jurisprudência assente que os elementos que integram o objecto de um comportamento podem ter mais importância para efeitos de fixação do montante da coima do que os relativos aos seus efeitos (acórdãos Thyssen Stahl/Comissão, referido no n.° 378, supra, n.° 636, e Michelin/Comissão, referido no n.° 295, supra, n.° 259).
436 Portanto, a quinta parte do quarto fundamento deve ser julgada improcedente.
Quanto à sexta parte, inexistência de críticas sobre os outros elementos dos contratos de venda
437 A recorrente alega que a Comissão não formula qualquer crítica quanto à duração dos seus contratos de venda de carbonato de sódio, quanto à presença de cláusulas de concorrência, quanto aos contratos relativos à totalidade das necessidades dos clientes ou quanto aos descontos sobre o volume central ou ainda quanto a quaisquer outros descontos relativos aos 92% restantes da sua produção.
438 A esse respeito, basta referir que essas práticas não são referidas na decisão recorrida.
439 O facto de a Comissão não formular críticas a outros elementos de contratos de venda não pode constituir uma circunstância atenuante no que respeita à infracção objecto da decisão recorrida.
440 Há que julgar improcedente, portanto, a sexta parte do quarto fundamento.
Quanto à sétima parte, inexistência de lucro com a infracção
441 Segundo a recorrente, a Comissão não faz qualquer prova de que ela tivesse lucrado com qualquer uma das práticas que lhe são imputadas. Afirma que as suas vendas tinham caído no início dos anos 80 e que tinha que racionalizar a sua capacidade de produção encerrando a sua unidade de produção em Wallerscote (Reino Unido). A situação melhorou depois, mas os seus lucros globais foram sempre moderados ao longo dos anos 80.
442 Contudo, a recorrente não apresenta qualquer elemento de facto nem junta provas em suporte da sua alegação de inexistência de lucro.
443 Além disso, mesmo admitindo que a recorrente não tivesse lucrado com as práticas que lhe são imputadas, há que lembrar que, embora o montante da coima aplicada deva ser proporcionado à duração da infracção e aos outros elementos que influem na apreciação da gravidade da infracção, tais como o proveito que a empresa em causa possa ter retirado das suas práticas, o facto de uma empresa não ter retirado qualquer benefício da infracção não pode obstar à aplicação de coimas, sob pena de as mesmas perderem a sua natureza dissuasora. Daí resulta que a Comissão não é obrigada, para fixar o montante das coimas, a tomar em consideração a inexistência de benefícios decorrentes da infracção. Além disso, a inexistência de benefícios financeiros ligados à infracção não pode ser considerada uma circunstância atenuante (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 29 de Novembro de 2005, Heubach/Comissão, T‑64/02, Colect., p. II‑5137, n.os 184 a 186 e jurisprudência aí referida).
444 Consequentemente, a sétima parte do quarto fundamento deve ser julgada improcedente.
Quanto à oitava parte, inexistência de carácter secreto da infracção
445 A recorrente alega que, na presente lide, não existe a característica agravante do segredo no que respeita aos descontos sobre a parte superior. Resulta das medidas antidumping adoptadas pela Comissão que o mercado do carbonato de sódio era transparente e sensível aos preços e que os consumidores operavam numa base comunitária ou mundial nos seus contratos anuais.
446 A esse respeito, refira‑se que a Comissão pode qualificar o carácter secreto como circunstância agravante na apreciação da gravidade da infracção (v. neste sentido, quanto a um acordo, acórdão do Tribunal Geral de 14 de Maio de 1998, Mayr‑Melnhof/Comissão, T‑347/94, Colect., p. II‑1751, n.° 213).
447 Não é por isso que se pode inferir que a inexistência de carácter secreto constitui uma circunstância atenuante.
448 Nestas condições, a oitava parte do quarto fundamento deve ser julgada improcedente.
Quanto à nona parte, natureza dos concorrentes
449 Segundo a recorrente, os descontos sobre a parte superior só afectaram os seus concorrentes estabelecidos fora da Comunidade, os quais por sua vez se dedicaram nos anos 80 a políticas de fixação de preços inequitativas.
450 A esse respeito, basta referir que, mesmo admitindo que os descontos sobre a parte superior só tivessem afectado os seus concorrentes estabelecidos fora da Comunidade, a recorrente não explica de que modo o facto de eles serem empresas estabelecidas fora da Comunidade deve constituir uma circunstância atenuante no caso presente.
451 Portanto, há que julgar improcedente a nona parte do quarto fundamento.
452 Em conclusão, há que anular a decisão recorrida na medida em que indica que as infracções decorreram entre aproximadamente 1983 e o final de 1989, e não entre 1984 e o final de 1989, e alterá‑la na parte em que dá erradamente por provada a circunstância agravante de reincidência da recorrente.
453 Em consequência, fixa‑se em 8 milhões de euros o montante da coima aplicada à recorrente.
Quanto às despesas
454 Nos termos do disposto no artigo 87.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas.
455 No caso presente, os pedidos da recorrente foram julgados parcialmente procedentes. O Tribunal entende que será feita uma justa apreciação das circunstâncias do caso decidindo que a recorrente suportará quatro quintos das suas despesas e quatro quintos das despesas da Comissão e que esta suportará um quinto das suas próprias despesas e um quinto das despesas da recorrente.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)
decide:
1) O artigo 1.° da Decisão 2003/7/CE, relativa a um processo nos termos do artigo 82.° [CE] (COMP/33.133 D: Carbonato de sódio – ICI), é anulado na parte em que declara que a Imperial Chemical Industries Ltd violou as disposições do artigo 82.° CE em 1983.
2) Fixa‑se em 8 milhões de euros o montante da coima aplicada à Imperial Chemical Industries no artigo 2.° da Decisão 2003/7.
3) É negado provimento ao recurso quanto ao restante.
4) A Imperial Chemical Industries suportará quatro quintos das suas despesas e quatro quintos das despesas da Comissão Europeia.
5) A Comissão suportará um quinto das suas despesas e um quinto das despesas da Imperial Chemical Industries.
Meij |
Vadapalas |
Dittrich |
Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 25 de Junho de 2010.
Assinaturas
Índice
Factos na origem do litígio
Tramitação do processo
Pedidos das partes
Questão de direito
1. Quanto ao pedido de anulação da decisão recorrida
Quanto ao primeiro fundamento, relativo a incompetência da Comissão para adoptar a decisão recorrida
Quanto à primeira parte, aplicação errada das regras da prescrição
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal
Quanto à segunda parte, violação do princípio do prazo razoável
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal Geral
Quanto ao segundo fundamento, preterição de formalidades essenciais
Quanto à primeira parte, ilegalidade das fases preparatórias da Decisão 91/300
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal Geral
Quanto à segunda parte, excesso de tempo entre o procedimento administrativo e a adopção da decisão recorrida
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal Geral
Quanto à terceira parte, violação do dever de proceder a novas diligências processuais
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal Geral
Quanto à quarta parte, relativa a uma violação do direito de acesso ao processo
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal Geral
Quanto à quinta parte, violação do artigo 253.° CE
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal Geral
Quanto ao terceiro fundamento, má apreciação do mercado em causa
Argumentos das partes
Apreciação do Tribunal Geral
Quanto ao quarto fundamento, inexistência de posição dominante
Argumentos das partes
Apreciação do Tribunal Geral
Quanto ao quinto fundamento, inexistência de abuso de posição dominante
Quanto à primeira parte, relativa aos descontos sobre a tonelagem marginal
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal Geral
Quanto à segunda parte, relativa às cláusulas de fornecimento exclusivo e às restrições às compras a concorrentes
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal Geral
Quanto à terceira parte, relativa aos outros incentivos financeiros
– Argumentos das partes
– Apreciação do Tribunal Geral
Quanto ao sexto fundamento, inexistência de afectação do comércio entre Estados‑Membros
Argumentos das partes
Apreciação do Tribunal Geral
2. Quanto ao pedido de supressão ou redução da coima
Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao decurso do tempo
Argumentos das partes
Apreciação do Tribunal Geral
Quanto ao segundo fundamento, apreciação errada da gravidade da infracção
Argumentos das partes
Apreciação do Tribunal Geral
Quanto ao terceiro fundamento, apreciação errada da duração da infracção
Argumentos das partes
Apreciação do Tribunal Geral
Quanto ao quarto fundamento, existência de circunstâncias atenuantes
Quanto à primeira parte, cooperação da recorrente com a Comissão
Quanto à segunda parte, relativa ao carácter não deliberado dos acordos de fixação de preços
Quanto à terceira parte, existência de medidas preventivas
Quanto à quarta parte, abandono dos descontos sobre a parte superior
Quanto à quinta parte, âmbito limitado dos descontos
Quanto à sexta parte, inexistência de críticas sobre os outros elementos dos contratos de venda
Quanto à sétima parte, inexistência de lucro com a infracção
Quanto à oitava parte, inexistência de carácter secreto da infracção
Quanto à nona parte, natureza dos concorrentes
Quanto às despesas
* Língua do processo: inglês.