62001C0448

Conclusões do advogado-geral Mischo apresentadas em 27 de Fevereiro de 2003. - EVN AG et Wienstrom GmbH contra Republik Österreich. - Pedido de decisão prejudicial: Bundesvergabeamt - Áustria. - Directiva 93/36/CEE - Contratos administrativos de fornecimento - Conceito de proposta economicamente mais vantajosa - Critério de adjudicação que privilegia a electricidade produzida por fontes de energia renováveis - Directiva 89/665/CEE - Processos de recurso em matéria de contratos administrativos - Decisões ilegais - Possibilidade de anulação apenas em caso de influência determinante no resultado do processo de adjudicação - Ilegalidade de um critério de adjudicação - Obrigação de revogar o anúncio do concurso. - Processo C-448/01.

Colectânea da Jurisprudência 2003 página 00000


Conclusões do Advogado-Geral


1 Tendo-lhe sido submetido um recurso interposto por um concorrente cuja proposta não foi aceite pela entidade adjudicante e que invoca a ilegalidade de um critério de adjudicação do contrato relativo ao fornecimento de electricidade ecológica, o Bundesvergabeamt (Áustria) solicita ao Tribunal de Justiça que interprete o artigo 26._ da Directiva 93/36/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de fornecimento (1), bem como os artigos 1._ e 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras e de fornecimentos (2).

I - Enquadramento jurídico

A - A regulamentação comunitária

2 A Directiva 93/36, no artigo 26._, intitulado «Critérios de atribuição», dispõe:

«1. Os critérios que a entidade adjudicante tomará como base para a adjudicação de contratos são:

[...]

b) Ou, quando a adjudicação contemplar a proposta economicamente mais vantajosa, vários critérios que variam consoante o contrato em questão: por exemplo, o preço, o prazo da entrega, o custo de utilização, a rentabilidade, a qualidade, o carácter estético e funcional, o valor técnico, o serviço após venda e a assistência técnica.

2. No caso referido na alínea b) do n._ 1, as entidades adjudicantes mencionarão, nos cadernos de encargos ou no anúncio de concurso, todos os critérios de adjudicação que tencionam aplicar, se possível, por ordem decrescente da importância que lhes é atribuída».

3 O artigo 1._, n._ 3, da Directiva 89/665, prevê:

«3. Os Estados-Membros garantirão que os processos de recurso sejam acessíveis, de acordo com as regras que os Estados-Membros podem determinar, pelo menos a qualquer pessoa que esteja ou tenha estado interessada em obter um determinado contrato de fornecimento público ou de obras públicas e que tenha sido ou possa vir a ser lesada por uma alegada violação. Os Estados-Membros podem em particular exigir que a pessoa que pretenda utilizar tal processo tenha informado previamente a entidade adjudicante da alegada violação e da sua intenção de interpor recurso.»

4 O artigo 2._, n.os 1, alínea b), e 6, da Directiva 89/665 estabelece:

«1. Os Estados-Membros velarão por que as medidas tomadas para os efeitos dos recursos referidos no artigo 1._ prevejam os poderes que permitam:

[...]

b) Anular ou fazer anular as decisões ilegais, incluindo suprimir as especificações técnicas, económicas ou financeiras discriminatórias que constem dos documentos do concurso, dos cadernos de encargos ou de qualquer outro documento relacionado com o processo de adjudicação do contrato em causa;

[...]

6. Os efeitos do exercício dos poderes referidos no n._ 1 sobre o contrato celebrado na sequência da atribuição de um contrato de direito público serão determinados pelo direito nacional.

Além disso, excepto se a decisão tiver de ser anulada antes da concessão de indemnizações, os Estados-Membros podem prever que, após a celebração do contrato na sequência da atribuição de um contrato de direito público, os poderes da instância de recurso responsável se limitem à concessão de indemnizações a qualquer pessoa que tenha sido lesada por uma violação».

5 O artigo 3._, n._ 2, da Directiva 96/92/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Dezembro de 1996, que estabelece regras comuns para o mercado interno da electricidade (3), dispõe:

«Tendo plenamente em conta as disposições pertinentes do Tratado, nomeadamente do artigo 90._, os Estados-Membros podem impor às empresas do sector da electricidade, no interesse económico geral, obrigações de serviço público relativas à segurança, incluindo do abastecimento, regularidade, qualidade e preço dos fornecimentos, e à protecção do ambiente. Essas obrigações devem ser claramente definidas, transparentes, não discriminatórias e controláveis; devem, assim como a sua eventual revisão, ser publicadas e prontamente comunicadas pelos Estados-Membros à Comissão. A fim de cumprirem as referidas obrigações de serviço público, os Estados-Membros que assim o desejarem poderão instaurar um sistema de planeamento a longo prazo».

6 O segundo considerando da Directiva 2001/77/CE do Parlamento e do Conselho, de 27 de Setembro de 2001, relativa à promoção da electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis no mercado interno da electricidade (4), refere:

«A promoção da electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis é uma alta prioridade comunitária, tal como foi destacado no livro branco sobre fontes de energia renováveis[...], por razões de segurança e diversificação do abastecimento de energia, de protecção ambiental, bem como de coesão social e económica. O Conselho, na resolução de 8 de Junho de 1998, sobre fontes de energia renováveis, e o Parlamento Europeu, na resolução sobre o livro branco, aprovaram o referido propósito».

7 O décimo segundo considerando da Directiva 2001/77 refere:

«A necessidade do apoio público às fontes de energia renováveis é reconhecida nas orientações comunitárias em matéria de auxílios estatais à protecção do ambiente, que, entre outras opções, têm em conta a necessidade de internalizar os custos externos da produção de electricidade. Todavia, as regras do Tratado, nomeadamente os artigos 87._ e 88._, continuam a aplicar-se no que respeita ao referido apoio público.»

8 Nos termos do décimo oitavo considerando da Directiva 2001/77:

«É importante utilizar o poder das forças de mercado e o mercado interno e tornar a electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis um produto competitivo e atraente para os cidadãos europeus.»

9 Resulta do artigo 1._ da Directiva 2001/77 que o objectivo desta é:

«promover o aumento da contribuição das fontes de energia renováveis para a produção de electricidade no mercado interno da electricidade e criar uma base para um futuro quadro comunitário neste sector.»

10 O artigo 3._, n._ 1, da Directiva 2001/77, intitulado «Metas indicativas nacionais», estabelece:

«Os Estados-Membros devem tomar as medidas apropriadas para promover o aumento do consumo de electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis em conformidade com as metas indicativas nacionais referidas no n._ 2. Essas medidas devem ser proporcionais ao objectivo a atingir.»

11 O artigo 3._, n._ 2, da Directiva 2001/77 refere que os Estados-Membros devem definir as metas indicativas nacionais.

12 De acordo com o n._ 4 do artigo 3._ da Directiva 2001/77, a Comissão, com base nos relatórios dos Estados-Membros, avalia até que ponto as metas indicativas nacionais são compatíveis com a meta indicativa global de 12% do consumo nacional bruto de energia em 2010 e, em especial, com a quota indicativa de 22,1% de electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis no consumo total de electricidade da Comunidade em 2010.

13 O artigo 5._, n._ 1, da Directiva 2001/77, intitulado «Garantia de origem da electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis», dispõe:

«Os Estados-Membros devem, até 27 de Outubro de 2003, assegurar que a origem da electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis possa ser garantida como tal, na acepção da presente directiva, de acordo com critérios objectivos, transparentes e não discriminatórios, estabelecidos por cada Estado-Membro. Para o efeito, estes devem assegurar que, em resposta a um pedido, sejam emitidas garantias de origem.»

B - Regulamentação nacional

14 Na Áustria, o regime dos concursos públicos de adjudicação de contratos públicos consta do Bundesvergabegesetz (Osterreichisches Bundesgesetzblatt I-56/1997, a seguir «BVergG»).

15 O artigo 117._ do BVergG dispõe:

«1. O Bundesvergabeamt deve anular uma decisão da entidade adjudicante tomada no âmbito de um processo de adjudicação de contrato, por meio de decisão, tendo em conta o parecer da Comissão de Conciliação dado no mesmo processo, quando essa decisão

1) for contrária às disposições da presente lei federal ou dos seus decretos de execução e

2) for determinante para a solução do processo de adjudicação do contrato.

2. A anulação de uma decisão ilegal pode, em especial, assumir a forma de uma supressão das condições discriminatórias para alguns concorrentes quanto às especificações técnicas, económicas ou financeiras constantes dos cadernos de encargos ou de qualquer outro documento do concurso.

3. Após a adjudicação do contrato, o Bundesvergabeamt, respeitando as condições do n._ 1, verifica unicamente se a ilegalidade alegada é ou não real».

II - O litígio no processo principal e as questões prejudiciais

16 A República da Áustria, na qualidade de entidade adjudicante (a seguir «recorrida no processo principal») abriu um concurso público para o fornecimento de electricidade. O concurso tinha por objecto a celebração de um contrato-quadro, seguido de contratos de execução, para o abastecimento em electricidade de todos os serviços da administração federal situados no Land da Caríntia. A duração do contrato foi fixada entre 1 de Janeiro de 2002 e 31 de Dezembro de 2003. O anúncio de concurso, que foi publicado no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, em 27 de Março de 2001, mencionava sob a rubrica «Critérios de atribuição»:

«Oferta economicamente mais vantajosa segundo os seguintes critérios: incidência das prestações sobre o ambiente de acordo com o caderno de encargos.»

17 A oferta devia indicar o preço do Kilowatt horário em ATS. Este preço devia ser válido durante todo o período de vigência do contrato e não podia ser sujeito a revisão nem ajustamentos. Além do fornecimento de electricidade, o fornecedor de energia devia comprometer-se a executar outras prestações acessórias (por exemplo, a medição da electricidade consumida pelos serviços federais, a facturação do consumo anual, etc.). O fornecedor de energia devia comprometer-se a fornecer aos serviços federais, na medida em que isso lhe fosse tecnicamente possível, electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis, não podendo, em nenhuma circunstância, fornecer deliberadamente electricidade produzida através de cisão nuclear. No entanto, não foi exigido que o fornecedor de energia se comprometesse a dar conta das suas fontes de abastecimento. Em caso de violação da obrigação de fornecimento de energia proveniente de fontes de energia renováveis ou da de não fornecer electricidade produzida por cisão nuclear, previa-se que a entidade adjudicante teria o direito de denunciar o contrato, bem como uma cláusula penal.

18 Na introdução do anúncio de concurso indicava-se que a entidade adjudicante estava consciente de que, por razões técnicas, nenhum fornecedor podia garantir que a electricidade que fornecia a determinado cliente fosse efectivamente produzida a partir de fontes de energia renováveis. A entidade adjudicante estava, no entanto, determinada a contratar com concorrentes que dispusessem de, pelo menos, 22,5 Gwh por ano de electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis. O consumo anual dos serviços da administração federal objecto de concurso era calculado em cerca de 22,5 Gwh. Eventuais diferenças entre a quantidade efectivamente fornecida e este valor indicativo não deviam, porém, influenciar o preço acordado do Kilowatt horário.

19 Como motivo específico de eliminação indicava-se que seriam afastadas as propostas que não contivessem documentos comprovativos de que «nos dois últimos anos e/ou nos dois próximos anos, o concorrente produziu ou comprou e/ou produzirá ou comprará por ano pelo menos 22,5 Gkw de electricidade proveniente de fontes de energia renováveis e a forneceu e/ou fornecerá a consumidores finais». Os critérios de adjudicação fixados eram o preço líquido por KWh, ao qual foi atribuído um coeficiente de 55% e o critério «energia produzida a partir de fontes de energia renováveis», com um coeficiente de 45%. Relativamente a este último critério de atribuição, estabelecia-se que «só será tomada em conta a quantidade anual que exceda os 22,5 KWh de energia produzida a partir de fontes de energia renováveis que o concorrente esteja em condições de fornecer».

20 As propostas foram abertas em 10 de Maio de 2001. No total, foram apresentadas quatro propostas. A apresentada pelo consórcio de concorrentes Kärntner Elektrizitäts-Aktiengesellschaft / Stadtwerke Klagenfurt (a seguir «KELAG»), que indicou um preço de 0,44 ATS/KWh e, apresentando um quadro sobre as quantidades de electricidade por eles produzidas ou fornecidas e respectiva proveniência, afirmou que estava em condições de fornecer uma quantidade total de energia renovável de 3 406,2 GWh. Outra proposta foi feita pela Energie Oberösterreich AG, que propunha um preço de 0,4191 ATS/kWh a partir de um consumo anual de 1 milhão de GWh e, num quadro relativo aos anos de 1999 a 2002, indicava as diferentes quantidades de energia produzida a partir de fontes de energia renováveis que estava em condições de fornecer em cada ano do referido período. A maior quantidade indicada era de 5 280 GWh por ano. Outra proposta foi submetida pela BEWAG, que propôs um preço de 0,465 ATS/KWh e juntou um quadro relativo à proporção da energia renovável no conjunto da electricidade por si produzida ou fornecida, quadro a partir do qual a entidade adjudicante concluiu que a concorrente indicava um valor de 449,2 GWh.

21 A última proposta foi apresentada pelo consórcio constituído pelas empresas EVN AG e Wienstrom GmbH (a seguir, ambos, «recorrentes no processo principal»), que apresentou um preço de 0,52 KWh e não indicou nenhum valor concreto em relação à quantidade de energia produzida a partir de fontes de energia renováveis que estaria em condições de fornecer, afirmando apenas, a este propósito, que dispunha das sua próprias instalações de produção nas quais produzia electricidade a partir de fontes de energia renováveis em quantidade que representava várias vezes o consumo anual indicado no anúncio de concurso, que era de 22,5 GWh. Além disso, afirmou ter direitos de opção sobre a electricidade produzida por centrais hidroeléctricas da Österreichische Elektrizitätswirtschafts-Aktiengesellschaft e outras centrais hidroeléctricas austríacas, sendo a energia adicional comprada proveniente, na sua maior parte, de contratos de coordenação de longa duração celebrados com o mais importante produtor de energia homologada proveniente de fontes de energia renováveis. Afirmou que, em 1999 e 2000, só comprou energia hidráulica produzida na Suiça e assim continuaria a fazer. No total, a quantidade de energia fornecida que seria produzida a partir de fontes de energia renováveis era muitas vezes superior à quantidade objecto do concurso, remetendo, para mais informações, para os seus relatórios anuais.

22 Das quatro propostas apresentadas, a recorrida no processo principal classificou a proposta da KELAG como a mais favorável, tendo obtido o máximo de pontos em cada um dos dois critérios de adjudicação. À proposta das recorrentes no processo principal foi atribuído o número de pontos mais reduzido em ambos os critérios.

23 Depois de ter informado a entidade adjudicante, em 9 e 30 de Maio de 2001, de que consideravam que várias disposições do anúncio de concurso, entre as quais o critério de adjudicação «energia renovável», eram ilegais, as recorrentes no processo principal solicitaram, em 12 de Junho de 2001, a abertura de um processo de conciliação na Bundes-Vergabekontrollkommission (comissão federal de controlo das adjudicações de empreitadas, a seguir «comissão federal»). A comissão federal recusou instaurar um processo de conciliação, com o fundamento de que tal processo não tinha possibilidades de dar resultados.

24 As recorrentes no processo principal interpuseram então recurso para o Bundesvergabeamt, pedindo a anulação das várias decisões, entre as quais a de prever como fundamento de eliminação a falta de informações sobre a produção e compra de energia produzida a partir de fontes de energia renováveis ao longo de um dado período, de exigir, como critério de qualificação, a prestação de informações sobre a produção e compra de electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis numa certa quantidade e durante um dado período, bem como a de exigir como critério de adjudicação a disponibilidade de uma quantidade que ultrapassasse 22,5 GWh por ano de energia produzida a partir de fontes de energia renováveis. Além disso, solicitaram que fosse decretada uma medida provisória por força da qual a entidade adjudicante fosse proibida de adjudicar o contrato.

25 Por decisão de 16 de Julho de 2001, o Bundesvergabeamt deferiu este pedido e proibiu a adjudicação do contrato, numa primeira fase, até 10 de Setembro de 2001. Com base em novo pedido das recorrentes no processo principal, por decisão de 17 de Setembro de 2001, através de uma medida provisória, autorizou a entidade adjudicante a adjudicar o contrato, na condição de a adjudicação ser anulada e o contrato rescindido se nem que fosse apenas um dos pedidos principais das recorrentes para o Bundesvergabeamt viesse a obter vencimento ou se a ilegalidade da decisão de adjudicar o contrato em causa a um dos outros concorrentes viesse a resultar de outras conclusões a que chegasse o Bundesvergabeamt.

26 Em 24 de Outubro de 2001, com as condições resolutivas exigidas na decisão, foi celebrado o contrato-quadro com a KELAG.

III - Questões prejudiciais

27 Para poder responder aos pedidos constantes do processo de recurso, que tem por objecto a anulação de algumas decisões da entidade adjudicante, o Bundesvergabeamt, por despacho de 13 de Novembro de 2001, solicita ao Tribunal de Justiça que se pronuncie a título prejudicial sobre as seguintes questões:

«1) As disposições de direito comunitário aplicáveis à adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665/CEE, proíbem a entidade adjudicante de estabelecer, para a adjudicação de um contrato de fornecimento de electricidade, um critério, ao qual é atribuído o coeficiente de 45%, nos termos do qual o concorrente deve indicar - sem imposição de uma data de fornecimento determinada - a quantidade de electricidade proveniente de fontes de energia renováveis que pode fornecer a uma clientela não delimitada, atribuindo ao concorrente que indique a quantidade mais elevada o número máximo de pontos, indicando-se que só são tomados em conta os fornecimentos que excedam o volume do consumo previsível no quadro do concurso?

2) As disposições de direito comunitário aplicáveis à adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665/CEE, proíbem que se sujeite a anulação de uma decisão ilegal no âmbito do processo de recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665/CEE à condição de se provar que essa decisão teve influência determinante no resultado do processo de adjudicação?

3) As disposições de direito comunitário aplicáveis à adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 26._ da Directiva 93/36/CEE, proíbem que se sujeite a anulação de uma decisão ilegal no âmbito do processo de recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665/CEE à condição de se provar que essa decisão teve influência determinante no resultado do processo de adjudicação, no caso de essa prova resultar da verificação pela instância de recurso de que a classificação das propostas efectivamente apresentadas seria diferente no caso de estas serem objecto de nova avaliação sem ter em conta o critério de adjudicação ilegal?

4) As disposições de direito comunitário aplicáveis à adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 26._ da Directiva 93/36/CEE, impõem à entidade adjudicante que revogue o anúncio de concurso se, no quadro do processo de recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665, um dos critérios de adjudicação estabelecidos for considerado ilegal?»

IV - Análise

A - Quanto à competência do Tribunal de Justiça para responder às questões prejudiciais

28 Nas suas observações escritas, a Comissão questiona-se sobre a competência do Tribunal de Justiça para responder às questões prejudiciais, tendo em conta que, em seu entender, as decisões do Bundesvergabeamt não têm carácter jurisprudencial.

29 A este propósito, remeto para os n.os 18 a 26 das minhas conclusões de 25 de Fevereiro de 2003, no processo Hackermuller (5), nas quais, depois de ter analisado esta mesma questão, manifestei a opinião de que o Bundesvergabeamt deve ser considerado como um órgão jurisdicional na acepção do artigo 234._ CE se exercer, como no caso em apreço, as suas competências antes da adjudicação do contrato.

30 Considero por isso que este Tribunal tem competência para responder às questões apresentadas pelo Bundesvergabeamt.

B - Quanto à primeira questão prejudicial

31 Pela primeira questão prejudicial, o Bundesvergabeamt pergunta se as disposições de direito comunitário aplicáveis aos concursos públicos de empreitadas, em especial o artigo 26._ da Directiva 89/665/CEE, proíbem a entidade adjudicante de estabelecer, para a adjudicação de um contrato de fornecimento de electricidade, um critério, ao qual é atribuído o coeficiente de 45%, nos termos do qual o concorrente deve indicar - sem imposição de uma data de fornecimento determinada - a quantidade de electricidade proveniente de fontes de energia renováveis que pode fornecer a uma clientela não delimitada, atribuindo ao concorrente que indique a quantidade mais elevada o número máximo de pontos, indicando-se que só são tomados em conta os fornecimentos que excedam o volume do consumo previsível no quadro do concurso.

32 Resulta das explicações no despacho de reenvio que esta questão constitui o resumo de diversos problemas com que o Bundesvergabeamt se confronta. Proponho que sejam tratados pela ordem seguida no despacho.

1. Quanto à admissibilidade de critérios destinados a obter benefícios insusceptíveis de avaliação financeira imediata

33 Em primeiro lugar, o Bundesvergabeamt pergunta-se se o direito comunitário dos concursos públicos autoriza a entidade adjudicante a fixar critérios destinados a obter benefícios insusceptíveis de avaliação financeira imediata, como, por exemplo, o respeito pelo ambiente. Tem certas dúvidas a este respeito, tendo em conta que, segundo verificou, a Comissão defende a posição segundo a qual um critério de adjudicação deve conferir à entidade adjudicante um benefício económico directo.

34 Cabe referir que, depois de o Bundesvergabeamt ter formulado a sua questão e de os intervenientes terem apresentado as suas observações escritas, o Tribunal de Justiça se pronunciou a este propósito no acórdão de 17 de Setembro de 2002, Concordia Bus Finland (6).

35 Nele, o Tribunal considerou, no n._ 69, que «quando [...] a entidade adjudicante decide adjudicar um concurso ao proponente que apresente a proposta economicamente mais vantajosa, pode tomar em consideração critérios ecológicos [...] desde que esses critérios estejam relacionados com o objecto do concurso, não confiram à referida entidade adjudicante uma liberdade de escolha incondicional, estejam expressamente mencionados no caderno de encargos ou no anúncio de concurso e respeitem os princípios fundamentais do direito comunitário, designadamente o princípio da não discriminação».

36 Por outro lado, no n._ 55 desse mesmo acórdão, o Tribunal de Justiça afirmou que o artigo 36._, n._ 1, alínea a), da Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (7), «[...] não pode ser interpretado no sentido de que cada um dos critérios de adjudicação tomados em consideração pela entidade adjudicante a fim de identificar a proposta economicamente mais vantajosa tenha necessariamente que ser de natureza puramente económica [...]».

37 Sem prejuízo das condições formuladas pelo Tribunal de Justiça e atrás citadas, é pois lícito à entidade adjudicante inserir num anúncio de concurso critérios de adjudicação de carácter ambiental. Que o fornecimento de electricidade ecológica seja analisado como um desses critérios não suscita qualquer dúvida, como nos confirma, aliás, a leitura do acórdão de 13 de Março de 2001, PreussenElektra (8), segundo o qual «[...] cabe referir que a utilização de fontes de energia renováveis para a produção de electricidade [...] é útil para a protecção do ambiente, na medida em que contribui para a redução das emissões de gases com efeito de estufa que se encontram entre as principais causas das alterações climáticas que a Comunidade Europeia e os seus Estados-Membros se comprometeram a combater» (9).

2. Quanto à verificação pela entidade adjudicante da questão de saber se a proposta de um concorrente responde ao critério de adjudicação formulado no anúncio de concurso

38 Em segundo lugar, coloca-se, segundo o Bundesvergabeamt , um problema devido ao modo como o critério «energia renovável» foi formulado em concreto. Este explica que a própria entidade adjudicante admitiu não estar em condições de controlar do ponto de vista técnico se a electricidade fornecida foi efectivamente produzida a partir de fontes de energia renováveis. Nestas condições, há que suscitar a questão de saber se a entidade adjudicante pode estabelecer um critério de adjudicação relativamente ao qual é impossível verificar se permite alcançar o objectivo pretendido.

39 Só o Governo neerlandês analisa explicitamente este problema suscitado pelo Bundesvergabeamt. Em seu entender, as disposições de direito comunitário aplicáveis aos processos de adjudicação de contratos impõem que uma entidade adjudicante recorra unicamente a critérios de adjudicação que permitam um controlo efectivo da exactidão das informações prestadas pelos fornecedores quanto aos referidos critérios.

40 Partilho desta posição adoptada pelo Governo neerlandês.

41 Com efeito, como este refere, «se fosse permitido a uma entidade adjudicante estabelecer critérios de adjudicação indicando que não está disposta ou em condições de verificar se os fornecedores apresentaram na sua proposta informações correctas a este respeito, o processo de tomada de decisão da entidade adjudicante deixaria de poder decorrer com objectividade e transparência. [...] Um tal método de adjudicação seria contrário aos princípios gerais do regime jurídico dos concursos públicos de adjudicação de contratos, tais como são reconhecidos pelo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência, designadamente aos princípios de igualdade e de transparência, bem como à proibição da arbitrariedade».

42 A este propósito, recorde-se o acórdão de 22 de Junho de 1993, Comissão/Dinamarca, dito «Storebaelt» (10), no qual o Tribunal de Justiça considerou, no n._ 37, que «[...] convém declarar [...] que o respeito do princípio de igualdade de tratamento dos proponentes exige que todas as propostas sejam conformes com as prescrições do caderno de encargos, a fim de garantir uma comparação objectiva entre as propostas apresentadas pelos diferentes proponentes» (11).

43 Neste mesmo sentido, o Tribunal de Justiça considerou, no n._ 44 do acórdão de 18 de Outubro de 2001, SIAC Construction (12), que «[...] aquando da avaliação das propostas, os critérios de adjudicação devem ser aplicados de maneira objectiva e uniforme a todos os proponentes [...]» (13).

44 Ora, parece-me que não existe qualquer garantia de que um critério de adjudicação seja aplicado de maneira objectiva e uniforme a todos os proponentes se a entidade adjudicante deixar entender no anúncio que não verificará se os concorrentes cumprem efectivamente esse critério.

45 É certo que não é fácil saber qual a fonte da electricidade fornecida, no sentido de que um consumidor não dispõe de qualquer meio de ver se a electricidade da sua tomada eléctrica é produzida a partir de fontes de energia renováveis ou não.

46 Esta dificuldade foi reconhecida pelo Tribunal de Justiça no acórdão PreussenElektra, onde referiu, no n._ 79, que «[...] a natureza da electricidade é tal que, uma vez admitida na rede de transporte ou de distribuição, é difícil determinar a sua origem e, designadamente, a fonte de energia a partir da qual foi produzida.»

47 No entanto, o Tribunal acrescentou, no n._ 80 deste mesmo acórdão, que «[a] este propósito, a Comissão considerou, na sua proposta de Directiva 2000/C 311 E/22 do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à promoção de electricidade produzida a partir de fontes renováveis de energia no mercado interno da electricidade (JO 2000, C 311 E, p. 320), apresentada em 31 de Maio de 2000 [entretanto transformada na Directiva 2001/77], que a criação, em cada Estado-Membro, de um sistema de certificados de origem da electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis, susceptíveis de serem objecto de reconhecimento mútuo, é indispensável a fim de tornar as trocas deste tipo de electricidade simultaneamente fiáveis e possíveis na prática».

48 Em consequência, ainda que não seja fácil determinar a origem da electricidade fornecida, existem meios para o fazer, por exemplo, exigindo certificados ou, como assinala o Governo neerlandês, «exigindo dos concorrentes a prova da quantidade de electricidade produzida ou comprada por eles e proveniente de fontes renováveis, bem como da quantidade de electricidade que destina, segundo os contratos que celebrou, a clientes diferentes da entidade adjudicante».

3. Quanto à relação entre o critério de adjudicação e o objectivo estabelecido pela entidade adjudicante

49 Em terceiro lugar, segundo o Bundesvergabeamt, «o critério de adjudicação estabelecido suscita, neste contexto, outro problema. Dado que apenas é tomada em consideração a quantidade de electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis que poderá ser fornecida e que não é verificado em que medida o adjudicatário concreto do contrato contribui efectivamente, através das suas estruturas de produção, para o aumento das quantidades de electricidade produzidas a partir de fontes de energia renováveis, podemos igualmente interrogar-nos sobre a questão de saber em que medida este critério de adjudicação pode permitir alcançar o objectivo estabelecido pela entidade adjudicante. Com efeito, é perfeitamente possível que a quantidade de electricidade produzida a partir de energia renovável em nada seja influenciada por este critério de adjudicação, uma vez que compete inteiramente ao adjudicatário decidir se produz essa electricidade ou se se abastece noutras fontes» (14).

50 A este propósito, como sublinha, com razão, o Governo neerlandês, que é o único interveniente a tomar posição sobre este problema suscitado pelo Bundesvergabeamt, quanto à natureza da prestação a executar, ou seja, no caso em apreço, o fornecimento de electricidade produzida a partir de fontes renováveis, é indiferente que o próprio fornecedor tenha fornecido esta electricidade ou a tenha comprado a outros fornecedores de electricidade do mesmo tipo. A electricidade de fonte renovável fornecida é de natureza comparável, quer tenha sido produzida pelo fornecedor quer por terceiro.

51 Além disso, considero que o facto de o critério de adjudicação, de acordo com as observações do Bundesvergabeamt, não permitir alcançar o objectivo fixado pela entidade adjudicante, ou seja, o aumento das quantidades de energia eléctrica produzidas a partir de fontes de energia renováveis, não é, por si só, um indicador de que este critério seja contrário à regulamentação comunitária em matéria de contratos públicos.

52 Mesmo que os objectivos em matéria de protecção do ambiente que a entidade adjudicante fixou ao inserir este critério não sejam alcançados, não decorre daí que o critério de natureza ambiental, inserido num anúncio de concurso seja irregular.

4. Quanto à relação entre o critério de adjudicação e o objecto do concurso

53 Em quarto lugar, segundo o Bundesvergabeamt, «[n]a medida em que o critério em causa apenas exige que se indique a quantidade total que poderá ser fornecida, sem ter em conta a que poderá ser fornecida à entidade adjudicante - a entidade adjudicante, de qualquer modo, optou exclusivamente por electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis - podemos interrogar-nos se um critério de adjudicação deste tipo proporciona vantagens económicas directas para a entidade adjudicante».

54 Esta questão da relação entre o critério de adjudicação e o objecto do concurso foi amplamente debatida pelas intervenientes.

55 A recorrida no processo principal e o Governo austríaco consideram que, devido ao facto de, para determinar a oferta mais vantajosa no processo de adjudicação em causa, se ter tido em conta, além do preço, a quantidade de electricidade ecológica que cada concorrente tinha a possibilidade de fornecer além da quantidade de 22,5 GWh que devia ser assegurada em quaisquer circunstâncias, a entidade adjudicante elegeu como critério de adjudicação a segurança de fornecimento de electricidade de uma qualidade específica.

56 A este propósito, o Governo austríaco explica que, quanto mais elevada for a quantidade de energia de que uma empresa dispõe, maior será a garantia de fornecimento, permitindo assegurar o fornecimento com a prestação solicitada em picos de carga da rede eléctrica ou em caso de significativo aumento temporário do consumo do comprador de electricidade.

57 Ora, segundo este mesmo Governo, apoiado pela recorrida no processo principal, a garantia de fornecimento enquanto tal não é, em nada, um critério alheio à prestação, mas antes um critério económico: quanto mais eficaz for um fornecedor, mais reduzido é o risco para a entidade adjudicante de o seu pedido não poder ser satisfeito e de ter eventualmente que encontrar a curto prazo uma alternativa onerosa.

58 Segundo o Governo sueco, não resulta nem da letra da directiva nem da jurisprudência que a própria entidade adjudicante deva retirar um benefício económico dos critérios de adjudicação que adopta. Os critérios estabelecidos no anúncio eram, em seu entender, aptos para promover a produção de electricidade a partir de fontes de energia renováveis, o que implica vantagens sob a forma de um menor impacto no ambiente e, deste modo, um melhor ambiente para todos. Segundo este mesmo Governo, criam-se assim as condições de um desenvolvimento duradouro.

59 Em contrapartida, os recorrentes no processo principal, o Governo neerlandês e a Comissão consideram que o critério de adjudicação, na medida em que estipula que só é tomada em conta a fracção de energia produzida a partir de fontes de energia renováveis além de 22,5 GWh por ano, o que corresponde à estimativa do consumo anual dos serviços federais referidos pelo concurso, é contrário à Directiva 93/36, uma vez que não existe relação suficiente entre este critério e o objecto do concurso.

60 Segundo os recorrentes no processo principal, o critério de adjudicação em questão avalia, na realidade, a capacidade dos concorrentes para fornecerem a maior quantidade possível de electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis e assim, em definitivo, os próprios concorrentes. Em seu entender, o critério de adjudicação é, pois, na realidade, um critério de selecção dissimulado.

61 O que devemos pensar destes argumentos?

62 Em primeiro lugar, como adequadamente observam a recorrida no processo principal e o Governo austríaco, é efectivamente verdade que o Tribunal de Justiça afirmou, no n ._ 44 do acórdão de 28 de Março de 1995, Evans Medical e Macfarlan Smith (15), que «[...] a segurança dos abastecimentos pode fazer parte dos critérios a ter em consideração [...] para determinar a proposta economicamente mais vantajosa [...]».

63 No entanto, a questão de saber se o critério de adjudicação em causa no presente caso visa garantir a segurança de abastecimento constitui uma questão de facto a dirimir pelo órgão jurisdicional de reenvio.

64 Ora, o Bundesvergabeamt não faz qualquer alusão no seu despacho de reenvio ao facto de este critério dever efectivamente ser entendido como destinado a garantir a segurança de abastecimento. Parto, pois, na análise que se segue, da hipótese de o critério em questão não ter esse objectivo.

65 Coloca-se, em seguida, a questão de saber se a Directiva 93/36 exige que haja uma relação entre o critério de adjudicação e o objecto do concurso.

66 Nas minhas conclusões de 13 de Dezembro de 2001, no processo Concordia Bus Finland, já referido, ao referir-me ao acórdão de 26 de Setembro de 2000, Comissão/França (16), em que o Tribunal de Justiça considerou válido, na sua origem, um critério de adjudicação relativo ao emprego, associado a uma acção local de luta contra o desemprego, indiquei que essa exigência não era clara (17).

67 No entanto, no acórdão Concordia Bus Finland, já referido, o Tribunal de Justiça tomou explícita e claramente posição sobre esta questão ao considerar, no n._ 69, que «(...) a entidade adjudicante (...) pode tomar em consideração critérios ecológicos (...) desde que esses critérios estejam relacionados com o objecto do concurso (...)» (18).

68 Ora, como adequadamente observam as recorrentes no processo principal, o Governo neerlandês e a Comissão, um critério de adjudicação que consiste em atribuir pontos para a quantidade de energia eléctrica produzida a partir de fontes de energia renováveis que o concorrente esteja em condições de fornecer a uma clientela não delimitada, especificando-se que só é tida em conta a fracção que exceda o consumo previsível no âmbito do concurso, não está relacionado com o objecto do concurso.

69 Também considero que este critério é contrário às exigências decorrentes da Directiva 93/36.

70 Por outro lado, parece-me, no presente caso, susceptível de criar uma discriminação entre os concorrentes e, mais especificamente, entre os fornecedores de pequena dimensão, por um lado, e os de grande dimensão, por outro.

71 Imaginemos dois fornecedores que estão em condições de fornecer a electricidade objecto do concurso, ou seja, cerca de 22,5 GWh por ano em electricidade ecológica. Um é um fornecedor de pequena dimensão especializado no fornecimento de electricidade ecológica, para quem o concurso em questão é importante. O outro é um fornecedor de muito grande dimensão para quem a electricidade ecológica constitui apenas uma pequena parte da sua actividade mas que, pela sua dimensão, é capaz de fornecer mais electricidade ecológica do que o outro fornecedor. Por definição, o concurso em questão é apenas um pequeno concurso para este fornecedor de grande dimensão.

72 Ora, resulta deste exemplo, ainda que hipotético, que, entre os dois fornecedores que são perfeitamente capazes de responder às condições do concurso, o critério de adjudicação em questão mais não faz do que beneficiar o grande fornecedor em razão da sua dimensão. Ora, a dimensão da empresa não constitui, por si, uma razão objectiva que justifique uma diferença de tratamento entre dois concorrentes que podem satisfazer as condições relativas ao objecto de um concurso.

5. Quanto à omissão da entidade adjudicante de determinar, no anúncio de concurso, para que período de fornecimento as propostas dos concorrentes devem indicar a quantidade de electricidade de fontes renováveis que podem fornecer

73 Em quinto lugar, o Bundesvergabeamt observa que «a entidade adjudicante não fixou a data concreta de fornecimento para a qual havia que indicar a quantidade que poderia ser fornecida». Daí deduz que «[se] afigura [...] que o critério fixado não pode ser objecto de verificação pormenorizada e dá à entidade adjudicante um poder de adjudicação demasiado amplo, contrário ao princípio da comparação das propostas decorrentes do princípio da transparência».

74 Tal como sublinha, justamente, o Governo neerlandês, que é o único interveniente a tomar explicitamente posição sobre este aspecto, os concorrentes devem ser antecipadamente informados dos critérios de adjudicação adoptados pela entidade adjudicante. Estes critérios devem ser formulados de modo a tornar possível uma comparação honesta e objectiva das diferentes propostas.

75 A este propósito, podemos reportar-nos ao acórdão SIAC Construction, já referido, no qual o Tribunal de Justiça considerou, no n._ 42, que «[...] os critérios de adjudicação devem ser formulados, no caderno de encargos ou no anúncio de concurso, de forma a permitir que todos os proponentes razoavelmente informados e normalmente diligentes os interpretem da mesma maneira».

76 Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar se, face a todos os elementos do processo principal, os critérios de adjudicação do concurso em causa respondem a esta exigência.

6. A ponderação do critério de adjudicação em 45%

77 Finalmente, segundo o Bundesvergabeamt, «a ponderação do critério em causa em 45% afigura-se igualmente problemática, uma vez que se poderia objectar que a entidade adjudicante está proibida de dar a um elemento insusceptível de avaliação financeira directa uma tão grande influência sobre a decisão da adjudicação».

78 A este propósito, considero que, na medida em que adopte critérios de adjudicação válidos, a entidade adjudicante é, como observa a recorrida no processo principal, em princípio, livre de decidir sobre a ponderação destes critérios.

79 Com efeito, o Tribunal de Justiça especificou, no n._ 42 do acórdão Evans Medical e Macfarley Smith, que «[...] a escolha da proposta economicamente mais vantajosa deixa às entidades adjudicantes a escolha dos critérios de adjudicação do contrato que entendam fixar, apenas podendo essa escolha, no entanto, fazer-se entre critérios para a identificação da proposta economicamente mais vantajosa».

80 Ora, se a entidade adjudicante é livre de escolher os critérios de adjudicação, parece-me igualmente livre de escolher a ponderação destes critérios, na medida em que eles se destinem a identificar a oferta economicamente mais vantajosa.

7. Conclusão relativa à primeira questão

81 Tendo em conta o que precede, proponho que se responda à primeira questão suscitada pelo Bundesvergabeamt que as disposições de direito comunitário que regulam a adjudicação de contratos públicos, em particular o artigo 26._ da Directiva 93/36, proíbem a entidade adjudicante de estabelecer, para a adjudicação de um contrato de fornecimento de electricidade, um critério, ao qual é atribuído o coeficiente de 45%, nos termos do qual o concorrente deve indicar - sem imposição de uma data de fornecimento determinada - a quantidade de electricidade proveniente de fontes de energia renováveis que pode fornecer a um conjunto de utilizadores indeterminados, atribuindo ao concorrente que indique a quantidade mais elevada o número máximo de pontos, indicando-se que só são tomados em conta os fornecimentos que excedam o volume do consumo previsível no quadro do concurso.

C - Quanto à segunda questão prejudicial

82 Através da segunda questão prejudicial, o Bundesvergabeamt pergunta se as disposições de direito comunitário aplicáveis à adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665, proíbem que se sujeite a anulação de uma decisão ilegal no âmbito do processo de recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665 à condição de se provar que essa decisão teve influência determinante no resultado do processo de adjudicação.

83 Sobre esta questão, o Bundesvergabeamt explica que «a disposição nacional que o Bundesvergabeamt tem que aplicar no processo de recurso não lhe permite anular uma decisão da entidade adjudicante apresentando como único fundamento o facto de a considerar ilegal. Pelo contrário, a disposição aplicável na matéria, o artigo 117._, n._ 1, ponto 2, do BVergG, exige que a decisão impugnada no quadro do processo de recurso tenha também uma influência decisiva para o resultado do processo de adjudicação». Pergunta-se se esta condição é conforme com o direito comunitário.

84 A este respeito, cabe observar, em primeiro lugar, com o Governo austríaco, que a norma nacional em causa se refere, não à questão, regulada pelo artigo 1._, n._ 3, da Directiva 89/665, de saber em que condições pode um concorrente interpor um recurso, mas à questão de saber em que condições uma decisão da entidade adjudicante pode ser anulada.

85 Em seguida, como adequadamente observa o Governo austríaco, a Directiva 89/665 e, muito particularmente, o seu artigo 2._, n._ 1, alínea b) (19), não estabelece as condições para proceder à anulação. Concretamente, não contém qualquer disposição quanto a saber se a anulação de uma decisão ilegal no âmbito de um processo de recurso ao abrigo do artigo 1._ desta directiva pode ser sujeita à condição de que se prove que a decisão ilegal tenha tido uma influência decisiva sobre o resultado do processo de adjudicação.

86 Ora, como resulta dos acórdãos recentes de 18 de Junho de 2002, HI (20), e de 12 de Dezembro de 2002, Universale-Bau e o. (21), o direito comunitário não se opõe, em princípio, a que o direito interno regule aspectos do processo de recurso não definidos pela directiva «desde que as normas nacionais aplicáveis não sejam menos favoráveis do que as respeitantes aos recursos análogos de natureza interna (princípio da equivalência) e não tornem praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (princípio da eficácia) (v., por analogia, acórdãos de 20 de Setembro de 2001, Banks, C-390/98, Colect., p. I-6117, n._ 121, e Courage e Crehan, C-453/99, Colect., p. I-6297, n._ 29)» (22).

87 Incumbe, pois, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, tendo em conta as especificidades do caso em apreço, se a condição referida não é menos favorável do que a respeitante a recursos análogos de natureza interna e não torna praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária.

88 Em consequência, proponho que se responda à segunda questão prejudicial que as disposições de direito comunitário aplicáveis à adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665, não proíbem que se sujeite a anulação de uma decisão ilegal no âmbito do recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665 à prova de que essa decisão teve influência determinante no resultado do processo de adjudicação, desde que essa condição não seja menos favorável do que a aplicável a recursos análogos de natureza interna (princípio de equivalência) e não torne praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (princípio da eficácia).

D - Quanto à terceira questão prejudicial

89 Na terceira questão prejudicial, o Bundesvergabeamt pergunta se as disposições de direito comunitário aplicáveis à adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 26._ da Directiva 93/36, proíbem que se sujeite a anulação de uma decisão ilegal no âmbito do recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665 à prova de que essa decisão teve influência determinante no resultado do processo de adjudicação, no caso de essa prova resultar da verificação pela instância de recurso de que a classificação das propostas efectivamente apresentadas seria diferente no caso de estas serem objecto de nova avaliação sem ter em conta o critério de adjudicação ilegal.

1. Comentários do Bundesvergabeamt

90 Sobre esta questão, o Bundesvergabeamt explica que «os trabalhos preparatórios do processo legislativo, que os princípios da hermenêutica jurídica austríacos mandam ter em conta [...] a instância de recurso a decidir a questão de saber se a decisão da entidade adjudicante impugnada é essencial para o resultado do processo de adjudicação, verificando se haveria que adjudicar o contrato a outro concorrente se a entidade adjudicante tivesse actuado regularmente».

91 Concretamente, isto significa, segundo o Bundesvergabeamt, que «a instância de recurso deveria ignorar o critério de adjudicação julgado ilegal e examinar as propostas efectivamente apresentadas utilizando os demais critérios de adjudicação e verificar se daí resulta uma modificação da classificação relativamente à apreciação efectuada pela entidade adjudicante».

92 O Bundesvergabeamt tem, no entanto, dúvidas quanto à conformidade deste procedimento com o direito comunitário. Sublinha, designadamente, que, «ao proceder deste modo, manifestamente imposto pelo direito nacional, a decisão de adjudicação da empreitada seria tomada no quadro do recurso e as propostas seriam avaliadas através de uma ponderação de critérios de que os concorrentes não foram informados e que, portanto, não puderam tomar em consideração ao redigirem as suas propostas. Esta consequência afigura-se [...] contrária ao artigo 26._, n._ 2, da directiva, tanto mais que um concorrente poderia, justificadamente, alegar que teria redigido a sua proposta de forma diferente se tivesse sabido que seria aplicada outra ponderação dos critérios (neste caso, que o preço teria um coeficiente de ponderação de 100% e não de 55%)».

93 Se esta interpretação for acolhida, a única solução parece ser, segundo o Bundesvergabeamt, «a anulação do anúncio do concurso, uma vez que, de contrário, o processo de adjudicação prosseguiria aplicando uma ponderação de critérios não fixada pela entidade adjudicante nem conhecida dos concorrentes».

2. Argumentos das partes

94 A recorrida no processo principal e o Governo austríaco, nas suas observações escritas, não partilham as dúvidas expressas pelo Bundesvergabeamt sobre a conformidade do procedimento descrito com o direito comunitário.

95 A recorrida no processo principal argumenta que o não cumprimento de disposições aplicáveis à realização dos concursos públicos que não implique uma classificação diferente das propostas não modifica em nada a determinação da melhor proposta. Ora, segundo esta mesma interveniente, se a determinação da melhor proposta não for afectada, o proponente que interponha recurso jurisdicional não obterá nem o contrato nem uma indemnização.

96 Por outro lado, observa que o facto de abstrair do critério de adjudicação em causa, em seu entender,nada teria modificado quanto ao processo de adjudicação. Efectivamente, indica que a KELAG tinha igualmente proposto o preço de longe mais baixo.

97 O Governo austríaco alega que seria incompreensível que um processo de recurso devesse ter lugar a pedido de um concorrente classificado numa posição que não deixa qualquer esperança, quando a ilegalidade que ele considera afectar o processo de adjudicação não significa, em circunstância alguma, que ele ou outros terceiros eventualmente afectados teriam sido melhor classificados, mesmo que o processo de adjudicação tivesse decorrido correctamente.

98 Na audiência, no entanto, o Governo austríaco referiu que o Bundesvergabeamt suscitou a terceira questão prejudicial tendo em conta uma regulamentação austríaca revogada há vários anos e que, quanto ao mérito, partilha a posição expressa pela Comissão.

99 Esta última, tal como os recorrentes no processo principal, considera o procedimento descrito pelo Bundesvergabeamt contrário ao direito comunitário.

100 As recorrentes no processo principal argumentam que abstrair de um critério de adjudicação previsto, ainda que ilegal, viola princípios basilares do direito comunitário em matéria de concursos de adjudicação de contratos públicos, como a publicidade e a transparência.

101 A Comissão observa que a terceira questão prejudicial não deveria colocar-se porque nem a entidade adjudicante nem a instância de recurso podem modificar os critérios de adjudicação depois de estes terem sido notificados.

102 Os Governos sueco e neerlandês não tomaram posição sobre esta questão prejudicial.

3. Apreciação

103 Refira-se, em primeiro lugar, que a observação do Governo austríaco de que o Bundesvergabeamt, ao suscitar a terceira questão prejudicial, se inspirou numa regulamentação nacional revogada há vários anos, não nos deve impedir de responder a esta questão.

104 Com efeito, é jurisprudência constante que compete apenas ao juiz nacional apreciar a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça (23).

105 Em seguida, tendo em conta as explicações do Bundesvergabeamt, bem como a resposta que proponho para a segunda questão prejudicial, considero que há que compreender a terceira questão prejudicial como destinada, substancialmente, a saber se uma norma de direito interno, como a do artigo 117._ do BVergG, que sujeita a anulação de uma decisão ilegal no âmbito do recurso à condição de se provar que essa decisão teve influência determinante no resultado do processo de adjudicação, colide com o princípio de eficácia, na medida em que a referida norma obriga o órgão jurisdicional nacional a verificar se a classificação das propostas efectivamente apresentadas difere quando estas são objecto de nova avaliação que abstraia do critério de adjudicação ilegal.

106 Considero que a resposta a esta questão é positiva.

107 Com efeito, como adequadamente sublinha a Comissão, o Tribunal de Justiça considerou no acórdão SIAC Construction, já referido, que:

«41 [...] o princípio da igualdade de tratamento implica uma obrigação de transparência, a fim de permitir a sua observância (v., por analogia, acórdão de 18 de Novembro de 1999, Unitron Scandinavia e 3-S, C-275/98, Colect., p. I-8291, n._ 31).

42 Isto significa, mais especificamente, que os critérios de adjudicação devem ser formulados, no caderno de encargos ou no anúncio de concurso, de forma a permitir que todos os proponentes razoavelmente informados e normalmente diligentes os interpretem da mesma maneira.

43 Esta obrigação de transparência implica igualmente que a entidade adjudicante se deve cingir à mesma interpretação dos critérios de adjudicação durante todo o processo (v., neste sentido, acórdão Comissão/Bélgica, já referido, n.os 88 e 89)» (24).

108 Daí resulta, a fortiori, que, para respeitar o princípio de igualdade de tratamento, há que cingir-se aos mesmos critérios de adjudicação durante todo o processo.

109 Na medida em que se baseia no princípio de igualdade de tratamento, esta interpretação não pode ser posta em causa por uma referência, efectuada pelo Governo austríaco nas suas observações escritas, às versões francesa e inglesa do artigo 26._, n._ 2, da Directiva 93/36 (25), das quais, em seu entender, decorre que uma modificação dos critérios de adjudicação durante o processo não poderá, à partida, ser excluída.

110 Esta condição segundo a qual os critérios de adjudicação não podem ser modificados durante todo o processo não está preenchida se a instância de recurso, chamada a verificar se as condições de anulação estão reunidas, efectua uma nova avaliação das propostas, abstraindo de um dos critérios de adjudicação.

111 De facto, tal procedimento equivale, na realidade, a modificar os critérios de adjudicação relativamente aos fixados pela entidade adjudicante, o que não pode, aliás, considerar-se como não tendo efeitos sobre a situação dos diversos proponentes.

112 A este propósito, como observam, justamente, o Bundesvergabeamt e as recorrentes no processo principal, se os critérios de adjudicação formulados no anúncio de concurso tivessem sido diferentes dos que efectivamente constam dele, tanto o proponente que interpôs o recurso como os outros teriam podido apresentar uma proposta diferente. No caso vertente, como adequadamente indica o Bundesvergabeamt, seria perfeitamente concebível que um concorrente que pretendesse obter pontos no critério da energia renovável tivesse proposto um preço menos elevado se soubesse que o critério do preço era afinal o único a ser aplicado.

113 Proponho, pois, que se responda à terceira questão prejudicial que as disposições de direito comunitário aplicáveis aos concursos de adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 26._ da Directiva 93/36, proíbem que se sujeite a anulação de uma decisão ilegal no âmbito do recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665 à prova de que essa decisão teve influência determinante no resultado do processo de adjudicação, se essa prova resultar da verificação pela instância de recurso de que a classificação das propostas efectivamente apresentadas seria diferente no caso de estas serem objecto de nova avaliação sem ter em conta o critério de adjudicação ilegal.

E - Quanto à quarta questão prejudicial

114 Na quarta questão prejudicial, o Bundesvergabeamt pergunta se as disposições de direito comunitário aplicáveis aos concursos de adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 26._ da Directiva 93/36, impõem à entidade adjudicante que revogue o anúncio de concurso se, no quadro do recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665, um dos critérios de adjudicação estabelecidos for considerado ilegal.

115 Decorre das explicações do Bundesvergabeamt sobre a terceira questão prejudicial que a quarta questão está intimamente associada à terceira, no sentido de que, na opinião daquele, uma resposta positiva à terceira questão implica automaticamente uma resposta positiva à quarta.

116 As intervenientes que tomaram posição sobre esta questão também propuseram uma resposta que vai no mesmo sentido da que respectivamente propuseram para a terceira questão prejudicial.

117 Pela minha parte, considero necessário reformular a quarta questão para lhe poder responder utilmente.

118 Com efeito, não se pode deduzir apenas do facto de, no âmbito do recurso ao abrigo do artigo 1._ da Directiva 89/665, um dos critérios de adjudicação estabelecidos ser considerado ilegal, que a entidade adjudicante deve revogar o anúncio do concurso.

119 Tal como observaram, e bem, na audiência, a recorrida no processo principal e o Governo austríaco, se o recurso for interposto depois da celebração do contrato e se um Estado-Membro utilizar a faculdade prevista pelo artigo 2._, n._ 6, segundo parágrafo, da Directiva 89/665 (26), a verificação, no processo de concurso, de que um critério de adjudicação é ilegal não impõe uma revogação do anúncio do concurso mas apenas a indemnização do proponente excluído.

120 A questão que se coloca consiste em saber se as disposições do direito comunitário aplicáveis aos concursos de adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 26._ da Directiva 93/36, impõem à entidade adjudicante que revogue o anúncio de concurso se, no processo de recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665, um dos critérios de adjudicação estabelecidos for considerado ilegal e, em consequência disso, for anulado pela instância de recurso.

121 Formulada deste modo, em minha opinião, a questão deve ter uma resposta positiva.

122 Com efeito, como resulta da análise da terceira questão prejudicial, os critérios de adjudicação devem permanecer os mesmos durante todo o processo de concurso. Em consequência, uma entidade adjudicante não pode continuar o processo em caso de anulação de um critério de adjudicação pela instância de recurso.

123 Em conformidade, proponho que se responda à quarta questão prejudicial que as disposições do direito comunitário aplicáveis aos concursos de adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 26._ da Directiva 93/36, impõem à entidade adjudicante que revogue o anúncio de concurso se, no quadro do recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665, um dos critérios de adjudicação estabelecidos for considerado ilegal e, em consequência disso, for anulado pela instância de recurso.

V - Conclusão

124 Tendo em conta as considerações precedentes, proponho que se responda:

- à primeira questão prejudicial:

«As disposições de direito comunitário que regulam os concursos de adjudicação de contratos públicos, em particular o artigo 26._ da Directiva 93/36/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de fornecimento, proíbem a entidade adjudicante de estabelecer, para a adjudicação de um contrato de fornecimento de electricidade, um critério, ao qual é atribuído o coeficiente de 45%, nos termos do qual o concorrente deve indicar - sem imposição de uma data de fornecimento determinada - a quantidade de electricidade proveniente de fontes de energia renováveis que pode fornecer a um conjunto de utilizadores indeterminados, e que atribui ao concorrente que indique a quantidade mais elevada o número máximo de pontos, indicando-se que só são tomados em conta os fornecimentos que excedam o volume do consumo previsível no quadro do concurso»;

- à segunda questão prejudicial:

«As disposições de direito comunitário aplicáveis aos concursos de adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 2._, n._ 1, alínea b), da Directiva 89/665, não proíbem que se sujeite a anulação de uma decisão ilegal no âmbito do recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665 à condição de se provar que esta decisão teve influência determinante no resultado do processo de adjudicação, desde que essa condição não seja menos favorável do que a aplicável a recursos análogos de natureza interna (princípio da equivalência) e não torne praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (princípio da eficácia);»

- à terceira questão prejudicial:

«As disposições de direito comunitário aplicáveis aos concursos de adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 26._ da Directiva 93/36, proíbem que se sujeite a anulação de uma decisão ilegal no âmbito do recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665 à condição de se provar que essa decisão teve influência determinante no resultado do processo de adjudicação, se essa prova resultar da verificação pela instância de recurso de que a classificação das propostas efectivamente apresentadas seria diferente no caso de estas serem objecto de nova avaliação sem ter em conta o critério de adjudicação ilegal»;

- à quarta questão prejudicial:

«As disposições do direito comunitário aplicáveis aos concursos de adjudicação de contratos públicos, em especial o artigo 26._ da Directiva 93/36, impõem à entidade adjudicante que revogue o anúncio de concurso se, no quadro do recurso previsto no artigo 1._ da Directiva 89/665, um dos critérios de adjudicação estabelecidos for considerado ilegal e, em consequência disso, anulado pela instância de recurso».

(1) - JO L 199, p. 1.

(2) - JO L 395, p. 33.

(3) - JO L 27, p. 20.

(4) - JO L 283, p. 33.

(5) - C-249/01, pendente no Tribunal de Justiça.

(6) - C-513/99, ainda não publicado.

(7) - JO L 209, p. 1.

(8) - C-379/98, Colect., p. I-2099.

(9) - Acórdão PreussenElektra, já referido, n._ 73.

(10) - C-243/89, Colect., p. I-3353.

(11) - Sublinhado nosso. V. também o acórdão de 25 de Abril de 1996, Comissão/Bélgica (C-87/94, Colect., p. I-2043, n._ 70).

(12) - C-19/00, Colect., p. I-7725.

(13) - Sublinhado nosso.

(14) - Sublinhado nosso.

(15) - C-324/93, Colect., p. I-563.

(16) - C-225/98, Colect., p. I-7445.

(17) - N.os 110 a 112 das conclusões referidas. A análise era relativa à Directiva 92/50 cujas disposições pertinentes são substancialmente idênticas às da Directiva 93/36. V. o n._ 36 supra.

(18) - Sublinhado nosso.

(19) - «1.Os Estados-Membros velarão por que as medidas tomadas para os efeitos dos recursos referidos no artigo 1._ prevejam os poderes que permitam:

[...]

b) anular ou fazer anular as decisões ilegais, incluindo suprimir as especificações técnicas, económicas ou financeiras discriminatórias que constem dos documentos do concurso, dos cadernos de encargos ou de qualquer outro documento relacionado com o processo de adjudicação do contrato em causa;

[...]».

(20) - C-92/00, Colect., p. I-5553.

(21) - C-470/99, ainda não publicado.

(22) - Acórdão HI, já referido, n._ 67.

(23) - V., designadamente, acórdãos de 15 de Dezembro de 1995, Bosman (C-415/93, Colect., p. I-4921, n._ 59); de 25 de Junho de 2002, Bigi (C-66/00, Colect., p. I-5917, n._ 18), e de 10 de Dezembro de 2002, der Weduwe (C-153/00, ainda não publicado, n._ 31).

(24) - Sublinhado nosso.

(25) - «Dans le cas visé au paragraphe 1 point b), le pouvoir adjudicateur mentionne, dans le cahier des charges ou dans l'avis de marché, tous les critères d'attribution dont il prévoit l'utilisation, si possible dans l'ordre décroissant de l'importance qui leur est attribuée» e «In the case referred to in point (b) of paragraph 1, the contracting authority shall state in the contract documents or in the contract notice all the criteria they intend to apply to the award, where possible in descending order of importance». Sublinhado nosso.

(26) - «[...] os Estados-Membros podem prever que, após a celebração do contrato na sequência da atribuição de um contrato de direito público, os poderes da instância de recurso responsável se limitem à concessão de indemnizações a qualquer pessoa que tenha sido lesada por uma violação».