Conclusões do advogado-geral Alber apresentadas em 10de Abril de2003. - Traunfellner GmbH contra Österreichische Autobahnen- und Schnellstraßen-Finanzierungs-AG (Asfinag). - Pedido de decisão prejudicial: Bundesvergabeamt - Áustria. - Directiva 93/37/CEE - Contratos de empreitada de obras públicas - Conceito de variante - Condições para a tomada em consideração e apreciação para efeitos de adjudicação de empreitadas. - Processo C-421/01.
Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-11941
I - Introdução
1. O pedido de decisão a título prejudicial do Bundesvergabeamt (Áustria) tem por objecto o tratamento dado às variantes nos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas. Um candidato não admitido propôs uma construção em asfalto (mais barata, embora, na sua opinião, equivalente) em vez dos revestimentos em betão previstos no anúncio do concurso. O caso vertente incide, por um lado, sobre as condições a que está sujeita a apresentação das variantes e à luz das quais estas últimas devem ser apreciadas (questões 1 a 3), e, por outro, sobre as possíveis repercussões de um eventual tratamento ilegal das variantes sobre o processo de adjudicação.
II - Enquadramento jurídico
A - Direito comunitário: a Directiva 93/37/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas (a seguir «Directiva 93/37»)
2. Artigo 19.°
«Quando o critério de atribuição do contrato for o da proposta economicamente mais vantajosa, as entidades adjudicantes podem tomar em consideração as variantes apresentadas por proponentes quando essas variantes preencham os requisitos mínimos exigidos pelas entidades adjudicantes.
As entidades adjudicantes indicarão, no caderno de encargos, as condições mínimas que as variantes devem respeitar, bem como as regras da sua apresentação. Se não forem autorizadas variantes, as entidades adjudicantes mencionarão esse facto no anúncio de concurso.
[...]»
3. Artigo 30.°
«1. Os critérios que a entidade adjudicante tomará como base para a adjudicação de contratos são os seguintes:
a) Ou unicamente o preço mais baixo;
b) Ou, quando a adjudicação se fizer à proposta economicamente mais vantajosa, vários critérios que variam consoante o contrato em questão: por exemplo, o preço, o prazo de execução, o custo de utilização, a rentabilidade e o valor técnico.
2. No caso referido no n.° 1, alínea b), as entidades adjudicantes mencionarão, no caderno de encargos ou no anúncio do concurso, todos os critérios de adjudicação que tencionam aplicar, se possível, por ordem decrescente da importância que lhes é atribuída.
[...]»
B - Direito nacional: a Bundesgesetz über die Vergabe von Aufträgen (Bundesvergabegesetz 1997) (lei federal sobre a adjudicação de contratos públicos, a seguir «BVergG»)
4. § 42
«(1) Sem prejuízo da aplicação do processo por negociação, o proponente deve, na elaboração da proposta, respeitar o anúncio do concurso. O texto do caderno de encargos não pode ser alterado ou completado.
[...]
(4) Só são admissíveis propostas alternativas [na terminologia da Directiva 93/37 devia ser utilizado o termo variante ] que garantam o fornecimento de uma prestação qualitativa equivalente. O ónus da prova da equivalência cabe ao proponente. A proposta alternativa pode referir-se à totalidade da prestação, a uma parte desta ou aos requisitos legais relativos à execução da prestação. As propostas alternativas devem ser designadas como tal e apresentadas de forma autónoma.
[...]»
5. § 117
«(1) O Bundesvergabeamt deve tomar uma decisão declarando nula a decisão da entidade adjudicante tomada no âmbito de um processo de adjudicação de um contrato, tendo em consideração o parecer da comissão de conciliação dado no mesmo processo, quando essa decisão
1. for contrária às disposições da presente lei federal ou dos seus decretos de execução e
2. for determinante para a solução do processo de adjudicação do contrato.
[...]
(3) Depois da atribuição do contrato, o Bundesvergabeamt deve apenas declarar, nas condições do n.° 1, se a pretensa violação existe ou não.»
III - Matéria de facto
6. Em 27 de Novembro de 1997, o Governo do Land da Baixa Áustria publicou em nome e por conta da Autobahnen- und Schnellstraßen Finanzierungs-AG (a seguir «AS») um anúncio do concurso relativo à empreitada das obras de renovação do troço de estrada «Neumarkt, direcção Viena, km 100,2 a 108,6», por concurso público a nível da União Europeia. O contrato tinha por objecto obras de construção de pontes e de estradas.
7. Sob o título «Projecto oficial», o concurso indicava, sem referir expressamente se se trata de um requisito mínimo, que o revestimento fora das pontes da auto-estrada deveria consistir em duas camadas de betão de qualidade superior. Quanto às exigências técnicas mínimas que as eventuais propostas alternativas deviam respeitar, também não foram fixadas indicações expressas. De acordo com o anúncio do concurso, eram autorizadas propostas alternativas. No entanto, estas só seriam consideradas se fossem acompanhadas por uma lista de todas as prestações (proposta principal) nos termos do anúncio do concurso. Não foram fixados critérios de adjudicação para apreciação da qualidade económica e técnica das propostas (nem para as propostas conformes com o anúncio do concurso nem para as propostas alternativas). O anúncio do concurso também não determinava que as propostas alternativas deviam garantir que as prestações a fornecer fossem equivalentes à variante oficial (também não foi feita referência ao § 42 da BVergG, que prescreve esta exigência) e também não foi indicado o que deve entender-se por «fornecimento de prestações equivalentes».
8. A autora no processo principal, a Traunfellner, apresentou uma proposta alternativa e uma oferta conforme com o anúncio do concurso. A sua proposta alternativa era, de todas, a proposta ao preço mais baixo e a sua oferta nos termos do anúncio do concurso ficou classificada em segundo lugar a seguir à proposta do consórcio Ilbau - LSH Fischer - Heilit & Woerner, ao qual foi atribuído o contrato.
9. A Traunfellner propôs na sua proposta alternativa a substituição do revestimento em betão por uma construção em asfalto fabricado a partir de materiais à base de betume. A título de explicação técnica desta proposta alternativa, apresentou um parecer técnico no qual se afirmava que, nas circunstâncias a ter em conta em matéria de trabalhos de construção, a construção em asfalto oferecia resistência suficiente à deformação para o período de referência de 20 anos.
10. No relatório de controlo técnico apresentado pelo Governo do Land por conta da AS, afirmava-se que tinha sido efectivamente efectuado em 1989 um estudo relativo à possibilidade de utilização de construções em asfalto, mas a experiência com adjudicações anteriores tinha demonstrado que, não obstante o cumprimento pontual do contrato, pouco tempo depois da construção em asfalto, tinham aparecido brechas de uma profundidade não despicienda e que tinham sido necessárias obras de reparação suplementares. Este relatório afirmava, além disso, que, para garantir a execução das prestações em conformidade com as exigências oficiais em caso de aceitação da proposta alternativa da Taunfellner, eram necessárias prestações suplementares no montante de cerca de 2,5 milhões de ATS, pelo que a vantagem relativa do preço era reduzida para 6,9 milhões de ATS. Considerava, além disso, que, no caso da construção de um revestimento em betão, as novas tecnologias permitiam partir de uma base de resistência à deformação do revestimento da estrada por um período de, pelo menos, 30 anos. Consequentemente, a construção do revestimento em betão, conforme previsto na variante oficial, oferecia uma duração 50% superior à qual correspondia um agravamento dos custos de apenas 8,5%. Além do mais, a proposta alternativa não teve em conta o objectivo (ideia de reciclagem) que consiste na utilização de betão velho existente para obter material fundido de elevada qualidade a aplicar nas placas de betão, na medida em que o betão existente recuperado apenas seria utilizado parcialmente neste troço para fins acessórios de terraplanagem. A maior parte do revestimento existente em betão seria utilizado para fins não determinados, fora do troço de construção. Consequentemente, a renovação geral da estrada em betão nos termos do anúncio do concurso devia ser preferida, em todo o caso, atendendo à duração e à resistência à deformação deste método de construção. Este implicava, com efeito, uma redução das obrigações de manutenção posterior, o que, por sua vez, provocaria menores perturbações na circulação, minimizando, desta forma, as repercussões negativas a nível da facilidade, da segurança e da fluidez da circulação. Consequentemente, a proposta alternativa não se deveria considerar equivalente às exigências do projecto oficial e deveria, portanto, ser eliminada. Com base neste relatório de controlo, a comissão de adjudicação de contratos decidiu, em 17 de Março de 1998, propor a adjudicação do contrato ao consórcio Ilbau - LSH Fischer - Heillit & Woerner.
11. A Traunfellner pediu ao Bundesvergabeamt que anulasse a decisão da entidade adjudicante de eliminar a sua proposta alternativa. Em 21 de Abril de 1998, o órgão jurisdicional de reenvio indeferiu o pedido alegando que a questão da equivalência técnica era irrelevante. Em seu entender, esta proposta afasta-se das obrigações impostas no aviso de concurso a tal ponto que deixou de ser admissível. Mesmo que se tratasse de uma proposta admissível não seria equivalente do ponto de vista técnico, uma vez que a entidade adjudicante pode optar entre várias soluções técnicas.
12. Após esta decisão, a empreitada foi adjudicada à proposta de preço mais baixo e os trabalhos foram, entretanto, executados.
13. Na sequência de um recurso interposto pela Traunfellner, o Verfassungsgerichtshof (Áustria) anulou a decisão do Bundesvergabeamt de 21 de Abril de 1998, com fundamento na violação do dever de fundamentação. Segundo o direito austríaco, na sequência da anulação de um acto administrativo pelo Verfassungsgerichtshof (neste caso, a anulação da decisão do órgão jurisdicional de reenvio de 21 de Abril de 1998), o processo retorna ao estado em que se encontrava antes da adopção da decisão anulada. O órgão jurisdicional de reenvio é, pois, obrigado a conhecer de novo o pedido da Traunfellner, de 17 de Abril de 1998, com vista à anulação da decisão de eliminar a proposta alternativa. Devido ao facto de o contrato já ter sido adjudicado nos termos do § 117, terceiro parágrafo, da BVergG, apenas resta decidir se a decisão de eliminação foi ilegal.
IV - As questões prejudiciais
14. O Bundesvergabeamt pretende saber quando é que é possível concluir pela existência de uma «variante», na acepção do artigo 19.° da Directiva 93/37, se o critério da «equivalência», à luz do qual são apreciadas as propostas alternativas, deve ser indicado no caderno de encargos e de que forma uma entidade adjudicante pública deve actuar quando se verifica a posteriori que o seu concurso sofre de um vício. Por conseguinte, submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões para decisão a título prejudicial:
«Questão 1: A proposta alternativa apresentada por um candidato que consiste em propor, em vez da realização prevista do revestimento do piso da estrada em betão, conforme indicado no concurso, a sua realização em asfalto, constitui uma variante, na acepção do artigo 19.° , primeiro parágrafo, da Directiva 93/37/CEE?
Questão 2: O critério de admissibilidade de uma variante, na acepção do artigo 19.° , primeiro parágrafo, da Directiva 93/37/CEE, fixado em normas nacionais, segundo o qual a proposta alternativa deve garantir a execução de uma prestação qualitativamente equivalente, pode ser legitimamente considerado um requisito mínimo imposto e indicado pela entidade adjudicante nos termos do artigo 19.° , primeiro e segundo parágrafos, da Directiva 93/37/CEE, quando o anúncio de concurso se limita a remeter para a norma nacional e não oferece outras indicações sobre os parâmetros concretos de comparação em que deve assentar a apreciação da equivalência?
Questão 3: O artigo 30.° , n.os 1 e 2, da Directiva 93/37/CEE, em conjugação com os princípios da transparência e da igualdade de tratamento, proíbe que a entidade adjudicante sujeite a aceitação de uma proposta alternativa, que se distingue de uma proposta correspondente aos termos do anúncio de concurso devido a uma qualidade técnica diferente, à apreciação favorável assente num critério fixado nas normas nacionais, segundo o qual a proposta alternativa deve garantir a execução de uma prestação qualitativamente equivalente, quando o anúncio do concurso se limita a remeter para a norma nacional e não oferece outras indicações sobre os parâmetros concretos de comparação em que deve assentar a apreciação da equivalência?
Questão 4a: Em caso de resposta afirmativa à questão 3, uma entidade adjudicante pode levar a cabo um processo de adjudicação conforme descrito na questão 3, procedendo à adjudicação da empreitada?
Questão 4b: Em caso de resposta afirmativa às questões 3 e 4 a, uma entidade adjudicante que inicia um processo de adjudicação conforme descrito na questão 3 deve, em todo o caso, recusar, sem examinar o conteúdo, as variantes apresentadas por alguns proponentes, quando essa entidade não fixou quaisquer critérios de adjudicação para a apreciação das divergências técnicas da variante em relação ao anúncio do concurso?
Questão 5: Em caso de resposta afirmativa às questões 3 e 4 a e de resposta negativa à questão 4 b, uma entidade adjudicante que inicia um processo de adjudicação conforme descrito na questão 3 deve aceitar uma variante cujas divergências técnicas em relação ao concurso não pode apreciar com base em critérios de adjudicação, por não constarem do concurso as especificações correspondentes, quando essa variante constitui a proposta de preço mais baixo e, por outro lado, não foram fixados critérios de adjudicação?»
15. Para fundamentar o reenvio, o Bundesvergabeamt afirma que a primeira questão se destina a esclarecer se a proposta de revestimento da estrada em asfalto em vez de betão, conforme previsto no concurso, constitui uma variante, na acepção do artigo 19.° , primeiro parágrafo, da Directiva 93/37 e se, consequentemente, devem aplicar-se a esta proposta as disposições da directiva que regulam as variantes.
16. Quanto à segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio explica que, nos termos do § 42.° , n.° 4, da BVergG, a possibilidade de admitir a variante depende do facto de estar garantida uma prestação qualitativa equivalente. Na prática das adjudicações, o exame da «equivalência» desempenha um papel importante. Também no caso presente a entidade adjudicante examinou a equivalência da variante e rejeitou-a. Os critérios aplicados a este propósito pela entidade adjudicante não foram, todavia, fixados no caderno de encargos ou no anúncio do concurso, de acordo com a prática constante das entidades adjudicantes de direito público na Áustria.
17. O Bundesvergabeamt considera que esta actuação é contrária ao artigo 30.° da Directiva 93/37, bem como aos princípios da transparência e da igualdade de tratamento. Esta contradição só poderia ser evitada se a condição da equivalência da prestação a executar, aplicável às propostas alternativas, fosse considerada um «requisito mínimo» na acepção do artigo 19.° , segundo parágrafo, da directiva. Neste caso, a necessidade de indicar os parâmetros de comparação concretos a título de critérios de adjudicação deixa de existir. No seu entendimento, tal interpretação é contrária aos princípios da directiva, desde logo porque o artigo 19.° , segundo parágrafo, da directiva exige, segundo a sua redacção clara e inequívoca, que as entidades adjudicantes mencionem no caderno de encargos os requisitos mínimos. A simples aplicação de uma disposição nacional que fixa o critério da equivalência não pode considerar-se uma exigência fixada pela entidade adjudicante no caderno de encargos.
18. Além disso, uma simples remissão para uma equivalência que não está pormenorizadamente concretizada não parece responder às exigências da transparência nem parece compatível com o significado do termo «Erläutern» (explicações). Entende-se por «explicações» o esclarecimento mais profundo e uma descrição mais precisa, o que não foi feito pela entidade adjudicante pública.
19. Relativamente à terceira questão, o Bundesvergabeamt afirma que a directiva deixa às entidades adjudicantes de direito público apenas a escolha entre o critério do preço mais baixo e o sistema de adjudicação à proposta economicamente mais vantajosa. No primeiro caso, as variantes são, à partida, excluídas pelo artigo 19.° , primeiro parágrafo, da directiva. No segundo caso, as entidades adjudicantes públicas são obrigadas, nos termos do artigo 30.° , n.° 2, da directiva, a referir no caderno de encargos ou no anúncio do concurso os critérios que presidirão à apreciação das propostas.
20. Desta comparação sistemática resulta que qualidades diferentes, quando podem ser propostas, devem ser examinadas à luz dos critérios de adjudicação fixados pela entidade adjudicante. Todavia, uma vez que a entidade adjudicante não fixou critérios de adjudicação, o Bundesvergabeamt é obrigado a concluir que as variantes não podem ser apreciadas e, consequentemente, também não podem ser aceites. A forma de actuação das entidades adjudicantes públicas na Áustria afigura-se contrária à economia da directiva.
21. Além disso, tal actuação é igualmente contrária ao princípio da transparência. Se a entidade adjudicante de direito público recorre a uma «equivalência da execução das prestações» não concretizada pela menção prévia de parâmetros de execução concretos, toma efectivamente em consideração critérios que não publicou previamente. Isto afigura-se contrário à jurisprudência constante do Tribunal de Justiça e priva os proponentes da possibilidade de apreciarem previamente, com base em critérios publicados, se a empreitada prevista ou a apresentação de variantes lhes interessa . Na prática, o recurso à noção não esclarecida de «equivalência», que apenas é concretizada pela entidade adjudicante a posteriori quando do exame das variantes, provoca uma maior insegurança e um aumento de situações litigiosas. A entidade adjudicante entra em conflito quer com os proponentes que apresentaram variantes que ela considera não equivalentes às suas próprias condições quer com os proponentes que não apresentaram variantes, mas que suspeitam da equivalência das variantes que a entidade adjudicante tem intenção de aceitar. Os candidatos apenas podem fazer conjecturas sobre o que será considerado equivalente pela entidade adjudicante. Isto provoca grande insegurança nos candidatos que preparam variantes de forma quase especulativa, mas igualmente naqueles que não apresentam variantes mas devem prever que as suas propostas serão afastadas por uma variante considerada equivalente pela entidade adjudicante depois da abertura das propostas.
22. A actuação da entidade adjudicante tem por efeito instituir um terceiro sistema «misto», ilegal, que se situa entre os critérios de adjudicação exclusivamente assentes no preço e o sistema da adjudicação à proposta economicamente mais vantajosa, o que é contrário à jurisprudência do Tribunal de Justiça . Além disso, a aplicação de um critério que assenta no simples reenvio para normas nacionais é ilegal .
23. Finalmente, o Bundesvergabeamt pretende esclarecer através da quarta e da quinta questões a forma como uma entidade adjudicante deve actuar quando se conclui no decurso de um processo de adjudicação que a prática de adjudicação austríaca é ilegal. Por um lado, afigura-se possível renunciar à adjudicação da empreitada e revogar o concurso. A favor desta posição abona o facto de o processo de adjudicação ter sido iniciado em condições que se revelaram ilegais e que não podem continuar a ser aplicadas. Por outro lado, é possível prosseguir o processo. Neste caso, porém, deve ser tido em conta que o processo é levado a cabo mediante restrições que não foram antecipadamente comunicadas aos proponentes. Os proponentes apresentaram propostas alternativas partindo do princípio de que era admissível a apresentação de variantes que seriam examinadas pela entidade adjudicante à luz de uma «equivalência» não pormenorizadamente concretizada. Ora, a impossibilidade de aplicar o critério de equivalência admitido pelo direito nacional conduz a uma alteração a posteriori das condições essenciais à elaboração das propostas. Tal modificação das condições que estavam na base do concurso poderia ser considerada uma nova violação do princípio da igualdade de tratamento .
24. Por conseguinte, a renúncia à adjudicação da empreitada e a realização de um novo concurso poderia constituir a única forma de proceder de forma regular. Nesse caso, a decisão efectivamente tomada pela entidade adjudicante de rejeitar a proposta alternativa dos demandantes por falta de equivalência e de adjudicar a empreitada a outro proponente seria, em todo o caso, ilegal. Por outro lado, a renúncia integral à adjudicação da empreitada e a obrigação de proceder a um novo concurso poderia considerar-se uma consequência demasiado severa para a violação de determinadas disposições de direito comunitário, sobretudo se as exigências comunitárias pudessem ser igualmente respeitadas através da simples abstenção da aplicação de um critério de «equivalência» não concretizada pormenorizadamente, contrário ao direito comunitário.
25. Se, ao invés, o processo devesse continuar, coloca-se a questão de saber quais são os critérios em que deve assentar a adjudicação da empreitada. Na opinião do órgão jurisdicional de reenvio podem-se configurar duas hipóteses nesta matéria: a entidade adjudicante rejeita a variante e adjudica a empreitada quer segundo o sistema do preço mais baixo quer segundo o sistema da proposta economicamente mais vantajosa, utilizando apenas os critérios por si fixados. Esta possibilidade responde às finalidades da directiva, pois segundo o sistema do artigo 30.° da directiva, as qualidades diferentes susceptíveis de ser propostas devem precisamente ser apreciadas com base em critérios de adjudicação. As diferenças relativas à qualidade, que não podem ser apreciadas com base nesses critérios, implicam que a proposta não é susceptível de comparação com as propostas dos concorrentes. Ora, se uma proposta não pode ser comparada deveria ser afastada em aplicação do princípio da igualdade de tratamento.
26. A outra possibilidade consiste em obrigar a entidade adjudicante a aceitar a variante e a ignorar as diferenças qualitativas que nela figuram. Trata-se, porém, de uma actuação pouco adequada, já que, nestas condições, a entidade adjudicante é obrigada a aceitar uma proposta que não corresponde às exigências qualitativas que ela própria fixou sem poder apreciar estas diferenças qualitativas à luz de um critério, seja ele qual for. Isto parece contrário ao objectivo da directiva, tal como já formulado pelo Tribunal de Justiça, uma vez que a entidade adjudicante não pode, neste caso, comparar as diferentes propostas e aceitar a proposta economicamente mais vantajosa, com base em critérios objectivos .
V - Observações dos intervenientes e apreciação
A - Admissibilidade
27. Nas suas observações escritas, a Comissão questiona a admissibilidade do pedido de decisão prejudicial. Remete para as observações que apresentou no processo C-314/01, no qual pôs em causa a qualidade do Bundesvergabeamt como órgão jurisdicional, na acepção do artigo 234.° CE, pelo facto de as suas decisões não serem vinculativas. Na audiência, retirou, porém, esta objecção, atendendo ao acórdão entretanto proferido no processo Swoboda . O pedido de decisão prejudicial é admissível.
B - A primeira questão
1. As observações dos intervenientes
28. A Traunfellner, a ASe os Governos austríaco e francês sustentam que a proposta de realização do revestimento em asfalto constitui uma variante, na acepção do artigo 19.° da Directiva 93/37, relativamente ao revestimento em betão previsto no anúncio do concurso.
29. Na opinião da Traunfellner, a existência de uma variante pressupõe a proposta de um novo processo de execução, de uma outra construção, de um outro material ou de outras alternativas que garantam que a prestação é executada de forma mais prática ou com custos mais reduzidos. O asfalto constitui uma alternativa técnica ao betão. A apreciação deve assim incidir sobre a equivalência técnica da proposta, nomeadamente, a resistência, o nivelamento e a aderência.
30. A ASpronuncia-se de uma forma mais abrangente e propugna a existência de uma variante quando numa proposta são substituídas partes das prestações previstas no anúncio do concurso.
31. O Governo austríaco invoca os trabalhos preparatórios da disposição. Na sua proposta de alteração da Directiva 71/305/CEE do Conselho, de 26 de Julho de 1971, relativa à coordenação dos processos de execução de empreitadas de obras públicas, a Comissão afirmou que só podia ser proposta uma alteração do plano de construção ou dos materiais de construção prescritos .
32. Segundo o Governo francês, o conceito de variante deve ser interpretado em sentido lato. Pelo facto de no concurso controvertido no processo principal o betão não ter sido indicado como uma especificação técnica impreterível, o asfalto devia ser considerado uma variante.
33. A Comissão refere que a questão submetida é uma questão de facto que é, em princípio, inadmissível, e à qual só é possível responder após a sua reformulação. No seu entender, a questão devia versar sobre as condições exigidas para que uma proposta alternativa possa ser considerada uma variante. A Comissão responde à questão assim reformulada que deve estar em causa um processo de adjudicação segundo o critério da proposta economicamente mais vantajosa, que não exclua propostas alternativas e que a proposta deve preencher os requisitos mínimos indicados.
2. Apreciação
34. Através da primeira questão, o Bundesvergabeamt pretende saber se a proposta de realização do revestimento em asfalto constitui uma variante relativamente à execução do revestimento em betão exigido no anúncio do concurso.
35. Esta questão diz respeito à subsunção de um caso concreto no conceito de «variante», previsto pelo direito comunitário no artigo 19.° da Directiva 93/37. No quadro da repartição de funções estabelecida pelo artigo 234.° CE, é, porém, da competência do órgão jurisdicional nacional aplicar as disposições de direito comunitário ao caso concreto. Com efeito, essa aplicação não pode ser efectuada sem uma apreciação dos factos da causa no seu conjunto . A primeira questão, tal como se encontra formulada no pedido prejudicial, é assim inadmissível.
36. No entanto, o Tribunal de Justiça pode fornecer ao órgão jurisdicional nacional os elementos de interpretação do âmbito do direito comunitário que lhe permitirão resolver o problema jurídico submetido à sua apreciação . A título subsidiário, para a hipótese de o Tribunal de Justiça decidir reformular a primeira questão, deve, por conseguinte, ser referido o seguinte:
37. Atendendo ao facto de o Verfassungsgerichtshof ter anulado a primeira decisão do órgão jurisdicional de reenvio neste processo, de 21 de Abril de 1998, a primeira questão deve ser entendida no sentido em que estão em causa os limites a que está sujeita a aceitação de uma «variante», na acepção do artigo 19.° da directiva. Quando é que ainda é possível falar de uma «variante» e a partir de que momento é que a prestação proposta diverge a tal ponto da prestação prevista no anúncio do concurso que a proposta alternativa se torna inadmissível?
38. Com efeito, a primeira questão assim reformulada transforma-se numa questão de direito, sobre a qual o Tribunal de Justiça pode, em princípio, pronunciar-se. Não obstante, há que considerar que o processo submetido ao Bundesvergabeamt se refere à fase de adjudicação e não à fase da apreciação da admissibilidade das variantes. Conforme foi descrito no despacho de reenvio, a entidade adjudicante não excluiu a proposta alternativa com fundamento na sua inadmissibilidade, mas pelo facto de não ser equivalente. Em rigor, a resposta à primeira questão não é, portanto, necessária para a resolução do litígio no processo principal e pode ser considerada uma questão hipotética, que é, segundo jurisprudência assente , inadmissível. O mesmo é válido, mutatis mutandis, para a segunda questão.
39. As duas primeiras questões apenas fazem sentido se for perfilhada a opinião do Bundesvergabeamt, segundo a qual o recurso das decisões da entidade adjudicante é inadmissível quando o processo de adjudicação já se encontrar viciado por um erro na aplicação do direito numa fase liminar (no caso vertente, a da indicação de requisitos mínimos no anúncio do concurso e do exame da admissibilidade das variantes) e este erro não tenha, porém, sido invocado (no presente caso, o recurso só foi interposto na fase da atribuição do contrato). A questão da compatibilidade deste entendimento jurídico com o direito comunitário, em especial, com a Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras de fornecimentos , constitui o objecto do processo C-315/01 (GAT Gesellschaft für Abfallentsorgungs-Technik GmbH). Nas suas conclusões apresentadas em 10 de Outubro de 2002, o advogado-geral L. A. Geelhoed considerou que esta prática era contrária à directiva relativa às vias de recurso . Neste processo, o acórdão ainda não foi proferido. A questão não deve ser decidida no caso em apreço, uma vez que não foi discutida durante o processo.
40. A título subsidiário, cumpre assim concluir que, de acordo com o artigo 19.° , primeiro parágrafo, da Directiva 93/37, as variantes que não correspondam aos requisitos mínimos fixados pela entidade adjudicante são inadmissíveis. A existência de uma variante depende, portanto, dos requisitos mínimos definidos pela entidade adjudicante no caso concreto e que devem ser mencionados no anúncio do concurso.
41. As declarações dos intervenientes a respeito da primeira questão confirmam a análise de que há que atender ao caso concreto. A Comissão põe sobretudo em relevo aspectos de direito processual, designadamente a adjudicação segundo o critério da proposta economicamente mais vantajosa e a não proibição das variantes. Adicionalmente, tem igualmente em consideração a observância dos requisitos mínimos indicados. Os outros intervenientes mencionam aspectos específicos da prestação prevista no anúncio do concurso, tais como novos processos de execução (de construções) ou novos materiais.
42. O artigo 19.° da directiva tem origem numa iniciativa da Comissão. A sua proposta de alteração da Directiva 71/305 previa que as propostas alternativas («variantes», na terminologia utilizada nessa altura) podem dizer respeito a uma alteração essencial do plano de construção ou dos materiais de construção prescritos, ou do método de trabalho ou das técnicas previstas . Os empresários devem ter a possibilidade de propor soluções técnicas mais avançadas . No decurso do procedimento legislativo, a Comissão alargou posteriormente esta proposta no sentido de que uma «variante» deve apenas satisfazer os requisitos mínimos exigidos pelas entidades adjudicantes . Esta formulação foi acolhida no artigo 20.° -A da Directiva 89/440/CEE do Conselho, de 18 de Julho de 1989, que altera a Directiva 71/305/CEE, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas , que corresponde literalmente ao artigo 19.° da Directiva 93/37. Resulta destes antecedentes legislativos que, em princípio, qualquer parte integrante do anúncio do concurso pode ser objecto de uma proposta alternativa. Na sua redacção actual, a disposição visa igualmente estimular o progresso técnico no sector da construção. A disposição tem intencionalmente uma configuração aberta e deixa à entidade adjudicante o poder de decidir se pretende autorizar ou proibir variantes e de definir o tipo de variantes que tomará em consideração . A única exigência imposta pelo artigo 19.° consiste, quanto aos limites da admissibilidade, na equivalência entre a prestação proposta na variante e a prestação prevista no concurso. A equivalência deve ser apreciada com base nos requisitos mínimos a indicar pela entidade adjudicante.
43. Decorre claramente destas observações que a apreciação da questão de saber se ainda está em causa uma proposta alternativa ou uma proposta inadmissível que deve ser eliminada só pode ser decidida, em última instância, pela entidade adjudicante. O controlo judicial terá de se restringir à verificação da observância das condições processuais estabelecidas na Directiva 93/37 e dos requisitos mínimos fixados pela entidade adjudicante, bem como à questão de saber se a entidade adjudicante não excedeu manifestamente os limites do poder de apreciação que lhe assiste no exame das propostas, portanto, nomeadamente, se não recorreu a considerações desajustadas no âmbito da apreciação da uniformidade. A apreciação em concreto da questão de saber se a prestação proposta corresponde ao anúncio do concurso incumbe à entidade adjudicante, uma vez que, por força da sua competência material, é a única que dispõe de condições para apreciar a equivalência entre a prestação proposta e a prevista no concurso.
44. Nestes termos, proponho a título subsidiário que se responda à primeira questão que a existência de uma variante, na acepção do artigo 19.° da Directiva 93/37, pressupõe que, num processo de adjudicação público que assente no critério da proposta economicamente mais vantajosa, não está excluída a apresentação de variantes, a proposta substitua uma parte da prestação prevista no anúncio do concurso e sejam respeitados os requisitos mínimos indicados.
C - A segunda e a terceira questões
45. A ASe os Governos austríaco e francês tratam conjuntamente a segunda e a terceira questões. As duas questões versam fundamentalmente sobre a obrigação de publicar os critérios de apreciação aplicados pela entidade adjudicante, pelo que este método deve ser seguido.
1. As observações dos intervenientes
46. Na opinião da Traunfellner, a condição da equivalência estabelecida no § 42, n.° 4, da BVergG deve ser considerada um requisito mínimo, na acepção do artigo 19.° da directiva, na medida em que não sejam indicados quaisquer requisitos mínimos no anúncio do concurso. A finalidade da prestação indicada no concurso e, nesta medida, do conhecimento de todos os proponentes, constitui o cerne da apreciação da equivalência.
47. Mesmo quando não são indicados quaisquer critérios no anúncio do concurso, as variantes devem ser apreciadas. Nestes casos, a entidade adjudicante pretende apenas garantir o fornecimento de uma prestação qualitativamente equivalente.
48. A ASe o Governo austríaco salientam que, na prática, é difícil estabelecer requisitos mínimos. A ASobserva que as empreitadas de obras integram sobretudo um grande número de elementos. A entidade adjudicante não pode saber antecipadamente relativamente a que elementos serão apresentadas propostas alternativas. No entanto, também não é necessário indicar critérios concretos para todos os elementos, sendo suficiente o critério geral da equivalência da prestação. Desde que se garanta que todas as propostas são apreciadas segundo os mesmos critérios de adjudicação, o princípio da transparência não é violado. O artigo 30.° da directiva não proíbe a sujeição da aceitação de uma proposta alternativa à garantia do fornecimento de uma prestação equivalente do ponto de vista qualitativo.
49. A título liminar, o Governo austríaco sublinha que, no seu entender, o órgão jurisdicional de reenvio confunde dois aspectos: os requisitos mínimos, na acepção do artigo 19.° da directiva, e os critérios de adjudicação, nos termos do artigo 30.° da directiva. O primeiro diz respeito à admissibilidade da variante e o segundo à apreciação de propostas admissíveis. A Comissão adere a esta posição.
50. A obrigação de estabelecer requisitos mínimos é independente da questão de saber se são admissíveis propostas alternativas. Os requisitos mínimos devem ser mencionados, ou seja, a entidade adjudicante deve indicar as condições que considera indispensáveis e nas quais se irá basear para a apreciação da equivalência de uma proposta.
51. O Governo austríaco sustenta ainda que, no caso de serem fixados requisitos mínimos, é permitida uma remissão no anúncio do concurso para normas gerais acessíveis ao público. O § 35, n.° 2, da BVergG impõe expressamente a menção no anúncio do concurso de que a BVergG lhe é aplicável. Os proponentes que tenham interesse podem informar-se sobre estas normas. A remissão para as disposições aplicáveis reduz a extensão dos textos do anúncio do concurso a publicar. Por outro lado, nos termos do artigo 23.° da directiva, pode igualmente ser indicada uma autoridade junto da qual podem ser obtidas as informações pertinentes sobre as condições legais do direito do trabalho que devem ser respeitadas. A remissão para uma disposição geral publicada assemelha-se a esta indicação.
52. Ao invés, o Governo francês e da Comissão defendem que uma remissão para disposições aplicáveis não satisfaz, segundo a jurisprudência, as exigências de transparência .
53. O Governo francês entende que, no processo principal, a forma de actuação conduziu a uma discriminação dos proponentes não sediados na Áustria. Além disso, os proponentes que pretendiam apresentar variantes foram prejudicados pelo facto de desconhecerem os critérios que iam presidir à avaliação das suas propostas.
54. A Comissão acrescenta que não é suficiente referir a equivalência da prestação quando é exigida a utilização de materiais específicos, devendo, pelo contrário, ser indicados critérios como a duração e a resistência à deformação.
55. Do seu ponto de vista, as variantes não devem ser aceites se não tiverem sido indicados requisitos mínimos. Nestes casos, o anúncio do concurso viola o direito comunitário, uma vez que nem foi proibida a apresentação de variantes nem foram indicados os requisitos mínimos a satisfazer. Por conseguinte, o processo de adjudicação não deve prosseguir.
2. Apreciação
56. A segunda questão incide sobre a questão de saber se é possível considerar que a regulamentação prevista no § 42 da BVergG, ao remeter para o caderno de encargos, fixa requisitos mínimos, na acepção do artigo 19.° da directiva, quando não são indicados os parâmetros de comparação em que deve assentar a apreciação da equivalência da prestação. Esta questão abrange dois aspectos: por um lado, saber se a remissão para uma disposição nacional pode satisfazer o princípio da transparência; por outro, saber se a regulamentação prevista no § 42, n.° 4, da BVergG pode ser considerada um requisito mínimo, na acepção do artigo 19.° da Directiva 93/37.
57. A terceira questão visa apurar se o artigo 30.° da directiva obsta a uma disposição nacional que sujeita a aceitação de uma proposta alternativa ao critério da equivalência da prestação proposta, quando este critério não é mencionado no anúncio do concurso e apenas decorre de uma disposição para a qual este último remete. Esta questão suscita igualmente o problema da compatibilidade de uma tal forma de procedimento com a exigência de transparência, sobrepondo-se nesta medida à segunda questão. Assim, deverão ser examinados em primeiro lugar os aspectos atinentes ao princípio da transparência.
58. Nos acórdãos Beentjes e Comissão/França, o Tribunal de Justiça decidiu que as entidades adjudicantes que, com vista à adjudicação do contrato, se baseiam em diversos critérios por forma a adjudicar a obra à proposta economicamente mais favorável, devem indicar esses critérios ou no anúncio do concurso, ou no caderno de encargos. A remissão geral para uma disposição da legislação nacional não pode satisfazer esta exigência de publicidade .
59. Estas decisões proferidas a respeito do artigo 30.° da Directiva 93/37 têm por fundamento os princípios da transparência e da igualdade de tratamento. Ambos são princípios basilares do sector público da construção, nos quais a Directiva 93/37 também assenta, tal como resulta dos seus décimo e décimo primeiro considerandos, e que, por conseguinte, também devem ser observados no quadro da interpretação do artigo 19.° da directiva. De igual modo, a indicação de condições mínimas não pode, por conseguinte, ser satisfeita através de uma remissão geral para uma disposição nacional.
60. Face ao exposto, proponho a seguinte resposta à segunda e à terceira questões: a remissão para uma disposição jurídica nacional não satisfaz nem a obrigação de estabelecer requisitos mínimos, nos termos do artigo 19.° da directiva, nem o dever de fixar critérios de adjudicação, na acepção do artigo 30.° da Directiva 93/37.
61. Desta forma, torna-se, em rigor, desnecessária uma resposta à segunda parte da segunda questão, designadamente o problema de saber se a regulamentação prevista no § 42, n.° 4, da BVergG pode ser considerada um requisito mínimo. A título subsidiário, para a hipótese de o Tribunal de Justiça defender uma outra opinião no que se refere à exigência de publicidade, será adoptada uma posição relativamente a esta questão.
62. O conceito de «requisitos mínimos», na acepção do artigo 19.° , não é definido na directiva. Tal como já foi referido no âmbito da primeira questão, a entidade adjudicante dispõe de uma margem de apreciação na fixação dos requisitos mínimos. Estes dizem respeito a qualidades ou resultados que caracterizam a prestação prevista no anúncio do concurso e que a prestação proposta deve satisfazer.
63. Como também se verificou no quadro da primeira questão, a entidade adjudicante tem o poder de decidir se autoriza ou não variantes. No caso de decidir proibi-las, o artigo 19.° , segundo parágrafo, da directiva impõe a menção deste facto no anúncio do concurso. Quando sejam admitidas variantes, não é obrigatório mencionar este facto no anúncio do concurso .
64. No entanto, conforme decorre do artigo 19.° , segundo parágrafo, primeira frase, da directiva, quando sejam admitidas variantes, a entidade adjudicante deve indicar no anúncio do concurso as condições mínimas que as mesmas devem respeitar . Este dever decorre da utilização do indicativo («indicarão [....] as condições mínimas»). Se a entidade adjudicante tivesse a faculdade de indicar ou não requisitos mínimos, teria supostamente sido utilizada a formulação «podem [....] indicar requisitos mínimos».
65. Esta interpretação de acordo com a letra da disposição corresponde, de igual modo, ao sentido da regulamentação. Quando são autorizadas variantes, os proponentes devem conhecer os critérios à luz dos quais as suas propostas serão apreciadas pela entidade adjudicante. Na apreciação são tidas em conta as condições mínimas que concretizam as expectativas da entidade adjudicante relativamente à prestação por si posta a concurso. Somente na hipótese de as propostas alternativas respeitarem as condições previamente fixadas - princípio da igualdade - e publicadas no anúncio do concurso - princípio da transparência - é que as ofertas apresentadas como variantes são admissíveis . Um concurso que, por falta de uma proibição expressa, autorize variantes, mas não estabeleça requisitos mínimos, não satisfaz, por conseguinte, as exigências da Directiva 93/37.
66. Por este motivo, há que rejeitar a objecção de que, na prática, é impossível indicar previamente todos os critérios, pelo facto de serem desconhecidos os pontos relativamente aos quais serão apresentadas variantes. A entidade adjudicante está em condições de formular o que espera da prestação prevista no anúncio do concurso e de descrever, ponto por ponto, as prestações, ou seja, por exemplo, a resistência de uma ponte ou o limite de carga e a durabilidade do revestimento de uma estrada. No anúncio do concurso para a execução de uma construção é, nomeadamente, possível formular o resultado esperado pela entidade adjudicante. Há que apurar com base em critérios objectivos que devem ser dados a conhecer aos proponentes, se a proposta, quer seja uma proposta conforme ao anúncio do concurso quer seja uma proposta alternativa, garante este resultado. É irrelevante se estão em causa critérios de admissibilidade, como no âmbito do artigo 19.° da Directiva 93/37, ou critérios de adjudicação, na acepção do artigo 30.° da Directiva 93/37. Os princípios da igualdade de tratamento dos proponentes e da transparência são válidos para ambas as disposições.
67. A regra do § 42, n.° 4, da BVergG exige que a prestação proposta na variante seja equivalente à prestação prevista no anúncio do concurso. Este critério não se refere às qualidades ou ao resultado que caracterizam a prestação, tendo, ao invés, por objecto o exame da prestação proposta em função da prestação prevista no anúncio do concurso.
68. O critério da equivalência está igualmente presente no artigo 19.° , primeiro parágrafo, parte final, no qual se afirma que as variantes podem ser tomadas em consideração, «[...] quando essas variantes preencham os requisitos mínimos exigidos pelas entidades adjudicantes.» A proposta da Comissão de 1986 era do seguinte teor: «As variantes podem ser tomadas em consideração quando forem, pelo menos, equivalentes em qualidade ao que está prescrito» . Esta formulação, que já sofrera alterações durante o processo que conduziu à adopção da Directiva 89/440 no sentido da versão actual, corresponde quase integralmente à redacção do § 42, n.° 4, da BVergG, no qual é afirmado que só são admissíveis propostas alternativas, «[...] que garantam o fornecimento de uma prestação qualitativamente equivalente.»
69. Resulta destas várias formulações que o critério da equivalência não pode constituir um «requisito mínimo», na acepção do artigo 19.° da Directiva 93/37, mas sim o resultado que uma variante deve atingir. Há que verificar se este resultado é alcançado com base nos requisitos mínimos através dos quais a entidade adjudicante concretizou as suas expectativas no que se refere à prestação prevista no anúncio do concurso. A equivalência não se traduz, por si só, num critério de apreciação, limitando-se antes a descrever o nível que a proposta alternativa deve alcançar.
70. Caso o Tribunal de Justiça ainda o considere necessário, proponho, por conseguinte, a seguinte resposta a este aspecto parcial da segunda questão: o critério da equivalência previsto para a apreciação da admissibilidade de uma variante não constitui um requisito mínimo fixado pela entidade adjudicante, na acepção do artigo 19.° da Directiva 93/37.
D - A quarta e a quinta questões
1. As observações dos intervenientes
71. Na opinião da ASe do Governo austríaco, a quarta e a quinta questões são inadmissíveis em virtude do seu carácter hipotético. A empreitada controvertida no processo principal tinha, entretanto, sido adjudicada e os trabalhos tinham sido executados. Ao órgão jurisdicional nacional resta apenas pronunciar-se acerca da legalidade da exclusão da proposta alternativa.
72. A título subsidiário, defendem, quanto à questão 4a, que o processo pode ser levado a cabo. A ASinvoca, para este efeito, o artigo 2.° da Directiva 89/665 . O Governo austríaco invoca o facto de não existir nenhum dever de proceder à adjudicação e deduz desta constatação a contrario que a entidade adjudicante tem, porém, a faculdade de concluir o processo.
73. Ao invés, a Traunfellner e a Comissão sustentam, relativamente à questão 4a, que a entidade adjudicante não pode concluir o processo, devendo abrir um novo concurso quando o processo de adjudicação não tiver sido realizado em conformidade com o direito comunitário. As variantes apenas podem ser proibidas sob condições muito estritas.
74. Quanto à questão 4b, a Traunfellner defende que, caso a entidade adjudicante autorize variantes, deve igualmente permitir que a sua equivalência seja apreciada. Atendendo à ampla possibilidade de apresentar variantes, o dever de a entidade adjudicante recusar as variantes, sem proceder ao seu exame, afigura-se inadequado. A AStambém chega, a título subsidiário, a esta conclusão.
75. Relativamente às questões 4b e 5, a Comissão sustenta, pelo contrário, que as variantes devem ser recusadas quando não tenham sido fixados critérios de adjudicação para apreciar as divergências técnicas.
76. Na perspectiva da Traunfellner, deve responder-se à quinta questão que o dever de aceitar a proposta de preço mais baixo é incompatível com o sentido da directiva. Na acção principal, a equivalência das variantes apresentadas também permite que as divergências técnicas sejam apreciadas. Além disso, pelo facto de a construção de estradas constituir um domínio de fácil concretização em termos empíricos, não é necessário indicar critérios de adjudicação para verificar a equivalência técnica sob o aspecto funcional.
2. Apreciação
77. Segundo jurisprudência assente, compete, em princípio, exclusivamente ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão, como a pertinência das questões que coloca ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões colocadas pelo juiz nacional sejam relativas à interpretação do direito comunitário, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a decidir .
78. No entanto, o Tribunal de Justiça também decidiu que, em casos excepcionais, lhe cabe examinar em que condições os pedidos lhe são submetidos pelos órgãos jurisdicionais nacionais para verificar a sua própria competência. A recusa de decisão sobre uma questão prejudicial submetida pelo órgão jurisdicional nacional é, assim, possível, quando é manifesto que a interpretação do direito comunitário solicitada não tem qualquer relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema é hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispõe dos elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são colocadas .
79. Tal como a ASe o Governo austríaco sublinham de forma pertinente, as questões 4a e 4b já não se põem no processo principal. O próprio órgão jurisdicional de reenvio reconhece que a empreitada para a construção das pontes e das estradas já foi adjudicada e que os trabalhos já foram executados. Por conseguinte, já só cabe ao Bundesvergabeamt pronunciar-se sobre a questão da ilegalidade da recusa da variante da Traunfellner, que foi decidida no processo de adjudicação. Deixou de ser necessário responder à questão de saber se e como é que o processo de adjudicação deve eventualmente prosseguir. Por conseguinte, a quarta e a quinta questões não apresentam qualquer relação com o objecto do litígio no processo principal e têm uma natureza hipotética. Segundo jurisprudência constante, estas questões não devem ser objecto de resposta .
80. No hipótese de o Tribunal de Justiça considerar que as questões são admissíveis, proponho, a título subsidiário, as seguintes respostas:
81. Questão 4a: Um processo de adjudicação que não concretize no anúncio do concurso os parâmetros concretos de comparação em que deve assentar a apreciação da equivalência não pode ser levado a cabo, pela adjudicação da empreitada. Nos termos do artigo 30.° , n.° 2, da Directiva 93/37, o anúncio do concurso deve mencionar todos os critérios de adjudicação que a entidade adjudicante tenciona aplicar. Tal como foi referido a respeito da segunda e da terceira questões, esta norma tem subjacente os princípios da igualdade de tratamento e da transparência. A utilização de critérios de adjudicação, não publicados no anúncio do concurso, na condução do processo de adjudicação afigura-se contrária a estes princípios. Nas suas conclusões apresentadas em 27 de Fevereiro de 2003 no processo EVN AG e Wienstrom GmbH , o advogado-geral J. Mischo também conclui neste sentido.
82. Questão 4b: Esta questão coloca-se apenas no caso de o processo de adjudicação poder ser concluído. A resposta a questão é desnecessária à luz das considerações precedentes. Constata-se apenas, a título adicional, que as variantes não podem ser apreciadas quando não tenham sido publicados no anúncio do concurso os critérios com base nos quais serão apreciadas. Uma apreciação nestas circunstâncias conduz a uma violação dos princípios da igualdade de tratamento e da transparência.
83. Questão 5: Quando uma entidade adjudicante decide adjudicar uma empreitada à proposta economicamente mais vantajosa, não pode optar no decurso do processo por uma adjudicação segundo o critério do preço mais baixo. A alteração dos critérios de adjudicação no decurso do processo de adjudicação é contrária à exigência de transparência . Consequentemente, uma variante cujas divergências técnicas em relação ao concurso não podem ser apreciadas com base em critérios de adjudicação, por não constarem do anúncio do concurso as especificações técnicas correspondentes, não pode ser aceite quando essa variante constitui a proposta de preço mais baixo e, por outro lado, não foram fixados critérios de adjudicação. Caso a adjudicação seja efectuada à proposta de preço mais baixo, devem ser indicados, nos termos do artigo 30.° , n.° 2, da Directiva 93/37, os critérios de adjudicação cuja aplicação está prevista. Um concurso que não respeite estas exigências é ilícito.
VI - Conclusão
84. Face às considerações precedentes, proponho:
1. que as questões 1, 4 e 5 sejam declaradas inadmissíveis e
2. que se responda às questões 2 e 3 da seguinte forma:
A remissão para uma disposição jurídica nacional não satisfaz nem a obrigação de estabelecer requisitos mínimos, nos termos do artigo 19.° da directiva, nem a de fixar critérios de adjudicação, na acepção do artigo 30.° da Directiva 93/37.
O critério da equivalência previsto para a apreciação da admissibilidade de uma variante não constitui um requisito mínimo fixado pela entidade adjudicante, na acepção do artigo 19.° da Directiva 93/37.