CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

SIEGBERT ALBER

apresentadas em 24 de Outubro de 2002 ( 1 )

I — Introdução

1.

O presente pedido de decisão prejudicial apresentado pela High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division (Reino Unido), suscita questões de interpretação e de aplicação das directivas relativas ao seguro de responsabilidade civil automóvel. Trata-se, concretamente, de saber se a indemnização de um prejuízo causado por um veículo não identificado, que é paga por um organismo designado pelo Estado para este fim, deve também incluir o pagamento de juros e de despesas. Há, além disso, que precisar se a solução adoptada na Grã-Bretanha satisfaz as exigências de direito comunitário em matéria de protecção jurisdicional efectiva, se o organismo responsável pela indemnização pode ser considerado devidamente autorizado na acepção da directiva em causa, e se eventuais lacunas na transposição da directiva constituem uma violação suficientemente grave das obrigações que lhe incumbem para fundamentar um direito a indemnização contra o Estado-Membro em falta de acordo com os princípios do direito comunitário.

II — Quadro jurídico

A — As disposições de direito comunitário

A Directiva 72/166/CEE do Conselho, de 24 de Abril de 1972, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis e à fiscalização do cumprimento da obrigação de segurar esta responsabilidade ( 2 ) (a seguir «Primeira Directiva»).

2.

O artigo 3, n.° 1, desta directiva estipula:

«Cada Estado-Membro, sem prejuízo da aplicação do artigo 4.°, adopta todas as medidas adequadas para que a responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos com estacionamento habitual no seu território esteja coberta por um seguro. Essas medidas devem determinar o âmbito da cobertura e as modalidades de seguro.»

Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis ( 3 ) (a seguir «Segunda Directiva»)

3.

O artigo 1.°, n.°s 1 e 4 da Segunda Directiva dispõe:

«1.

O seguro referido no n.° 1 do artigo 3.° da Directiva 72/166/CEE, deve, obrigatoriamente, cobrir os danos materiais e os danos corporais.

2.

[...] ( 4 )

[...]

4.

Cada Estado-Membro deve criar ou autorizar a criação de um organismo que tenha por missão reparar, pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro, os danos materiais ou corporais causados por veículos não identificados ou relativamente aos quais não tenha sido satisfeita a obrigação de seguro referida no n.° 1. Esta disposição não prejudica o direito que assiste aos Estados-Membros de atribuírem ou não à intervenção desse organismo um caracter subsidiário, nem o direito de regulamentarem os sistemas de recursos entre este organismo e o ou os responsáveis pelo sinistro e outras seguradoras ou organismos de segurança social obrigados a indemnizar a vítima pelo mesmo sinistro.

A vítima pode, em qualquer caso, dirigir-se directamente ao organismo que, com base nas informações fornecidas a seu pedido pela vítima, é obrigado a dar-lhe uma resposta fundamentada quanto à sua intervenção.

Os Estados-Membros podem, todavia, determinar que este organismo não intervenha, relativamente a pessoas que, por sua livre vontade, se encontrassem no veículo causador do sinistro, sempre que o organismo possa provar que elas tinham conhecimento de que o veículo não estava seguro.

Os Estados-Membros podem limitar ou excluir a intervenção deste organismo, relativamente a danos materiais causados por um veículo não identificado. Podem igualmente autorizar, relativamente aos danos materiais causados por um veículo não seguro, uma franquia oponível à vítima não superior a 500 ecus.

Além disso, cada Estado-Membro pode aplicar à intervenção do referido organismo as respectivas disposições legislativas, regulamentares e administrativas, sem prejuízo de qualquer outra prática mais favorável às vítimas.»

B — As disposições nacionais

4.

Devido às lacunas na cobertura dos danos corporais causados pelos condutores sem seguro ou não identificados, as companhias de seguros encarregadas de segurar a responsabilidade civil dos veículos automóveis criaram na Grã-Bretanha em 1946, de acordo com o Ministério dos Transportes, o Motor Insurers Bureau (a seguir «MIB»), Trata-se de uma entidade de direito privado cujos sócios são companhias de seguros de direito privado que propõem apólices de seguro automóvel.

5.

A obrigação de indemnizar os prejuízos causados pelos condutores sem seguro ou não identificados resulta dos acordos entre o MIB e o Secretary of State for the Environment, Transport and the Regions ( 5 ). Estes acordos foram várias vezes alterados ou adaptados. Referir-se-á aqui, por um lado, o Motor Insurances' Bureau Agreement «Compensation of Victims of Uninsured Drivers» (acordo relativo à indemnização das vítimas de condutores sem seguro) ( 6 ), de 21 de Dezembro de 1988, bem como o Motor Insurers' Bureau Agreement «Compensation of Victims of Untraced Drivers» (acordo relativo à indemnização das vítimas de condutores não identificados), de 22 de Novembro de 1972, na versão alterada de 1977, acordo controvertido no processo em causa. Este último também será, a seguir, designado por «acordo relativo aos condutores não identificados» ou simplesmente «acordo».

6.

O acordo de 1972 pertinente no caso em apreço contém as seguintes disposições:

O acordo aplica-se em todos os casos em que é apresentado um pedido ao MIB tendo em vista a obtenção de uma indemnização por morte de uma pessoa ou por um dano corporal sofrido por uma pessoa com origem na utilização de um veículo automóvel numa estrada do Reino Unido quando, sem prejuízo de certas condições sem interesse no caso em apreço, o requerente da indemnização não consegue encontrar a pessoa responsável pela morte ou pelo dano corporal (cláusula 1).

O MIB é obrigado, quando lhe é apresentado um pedido ao qual se aplique o acordo, a pagar uma indemnização que deve ser determinada nas mesmas condições que um órgão jurisdicional aplicaria para fixar, de acordo com as disposições em vigor na matéria no Reino Unido, o montante dos prejuízos que o requerente teria direito de exigir à pessoa responsável não identificada (cláusula 3)

O MIB é obrigado a examinar qualquer pedido que lhe seja apresentado para a obtenção de uma indemnização ao abrigo do acordo e a decidir se esta deve ser concedida (cláusula 7).

Quando houver lugar à atribuição de uma indemnização, o MIB tem a obrigação de notificar ao requerente o montante que propõe pagar-lhe, indicando o método segundo o qual a indemnização foi calculada. Se o requerente decidir aceitar a indemnização, o MIB é obrigado a pagar-lhe esse montante (cláusula 9 e 10).

O requerente tem direito de recurso de qualquer decisão do MIB para um árbitro (cláusula 11).

O recorrente tem o direito, antes de interpor recurso, de apresentar ao MIB observações relativas à decisão e de apresentar outros elementos de prova relativos ao seu pedido. O MIB pode examinar estes novos elementos e deve comunicar ao requerente o resultado deste exame, bem como de qualquer alteração da decisão (cláusula 13).

Ao decidir o recurso, o árbitro decide se o MIB deve pagar uma indemnização nos termos do acordo e, na afirmativa, o montante a atribuir pelo MIB ao requerente (cláusula 16).

O árbitro é escolhido de entre uma lista de árbitros composta por advogados da Coroa (Queen's Counsels) designados pelo Lord Chancellor ou pelo Lord Advocate (cláusula 18).

O arbitro decide o recurso com base nos documentos que lhe são apresentados, embora possa convidar o MIB a proceder a qualquer exame complementar que considere necessário, e sobre cujos resultados o requerente tem o direito de apresentar observações (cláusula 17).

Cada uma das partes no recurso suporta as suas próprias despesas de arbitragem (cláusula 21). O MIB tem a obrigação de pagar os honorários do árbitro, excepto no caso de o árbitro entender que não há razões que justifiquem o recurso, caso em que o árbitro pode decidir que o requerente tem de lhe pagar os seus honorários (cláusula 22).

7.

O acordo não contém qualquer disposição expressa relativamente à atribuição de juros sobre a indemnização concedida nem sobre o reembolso das despesas relativas ao procedimento no MIB.

II — Factos e tramitação processual

8.

Em 25 de Dezembro de 1991, Samuel Sidney Evans (a seguir «demandante») foi vítima de um acidente que lhe causou um dano corporal. Foi atropelado quando, do lado da rua, se baixava para tirar um embrulho do seu veículo estacionado. O condutor do outro veículo implicado não foi identificado.

9.

Em 11 de Junho de 1992, o demandante apresentou ao MIB um pedido de indemnização nos termos do referido acordo. Em 11 de Janeiro de 1996, o MIB informou-o de que tinha decidido fixar a indemnização em 50000 GBP. O demandante interpôs recurso dessa decisão para o árbitro, nos termos do processo previsto no acordo.

10.

Em 27 de Agosto de 1996, o árbitro notificou a sua sentença. Entendeu que, com base na responsabilidade integral do autor do dano, a indemnização a pagar deveria ser de 58286 GBP. Mas para ter em conta a negligência concomitante da vítima — possivelmente porque descarregava o seu veículo do lado da rua — havia que reduzir a indemnização em 20%, fixando-a, portanto, em 46629 GBP. Tendo em conta determinados elementos de prova, a saber, um vídeo feito posteriormente por um detective privado — do qual parecia resultar que a doença do demandante não era tão grave —, o árbitro considerou que o demandante estava de má fé e, consequentemente, condenou-o a pagar os seus honorários (v. a este respeito a cláusula 22, referida no n.° 6). Não lhe concedeu juros sobre a indemnização fixada.

11.

O MIB pagou ao demandante o montante de 46629 GBP, acrescido de 770 GBP, correspondentes às despesas apresentadas pelo representante do demandante, de um montante de 150 GBP, atribuído a título voluntário, e do IVA.

12.

Em 16 de Setembro de 1996, o demandante requereu ao Comercial Court autorização para recorrer da sentença arbitral. Em 16 de Dezembro de 1996, o recurso foi autorizado quanto à questão de saber se o árbitro é competente para conceder juros. Em 29 de Julho de 1997, foi negado provimento a este recurso. Em 30 de Setembro de 1998, a Court of Appeal (England & Wales) negou provimento a outro recurso do demandante. Esse órgão jurisdicional expôs que a entidade que o Reino Unido instituiu para transpor a directiva não constitui «um órgão ou uma relação que permita aplicar a directiva contra qualquer pessoa (excepto possivelmente contra si próprio, na acepção da jurisprudência Francovich)». Em 18 de Janeiro de 1999, a House of Lords recusou ao demandante autorização para interpor novo recurso.

13.

Em 25 de Fevereiro de 1999, o demandante propôs uma acção de indemnização contra o Ministro dos Transportes, quer dizer, o ministério competente, pela não transposição ou transposição incorrecta da Primeira e da Segunda Directivas. Invocava, em primeiro lugar, que o Reino Unido não criou nem autorizou um organismo — em qualquer caso sob uma forma que respeitasse o princípio da segurança jurídica — que tivesse por missão atribuir indemnizações nos termos do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva. Se a directiva tivesse sido correctamente transposta, os juízes não teriam podido declarar que o MIB não é obrigado a atribuir indemnizações nos termos da Primeira ou da Segunda Directivas. O demandante alegava, além disso, que o acordo em causa entre o MIB e o Ministro dos Transportes não prevê uma indemnização «pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro» — como prevê a directiva —, não dá às vítimas de condutores não identificados o direito de recurso contra o MIB nem acesso aos órgãos jurisdicionais.

14.

O demandante parte do princípio de que as lacunas na transposição lhe causaram um prejuízo e que esses incumprimentos constituem uma violação suficientemente caracterizada do direito comunitário para ter direito a exigir uma reparação ao Ministro dos Transportes.

15.

Nestas circunstâncias, o órgão jurisdicional de reenvio, por despacho de 17 de Maio de 2000, submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

A correcta interpretação da Segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis (a seguir ‘Segunda Directiva sobre responsabilidade civil automóvel’) é de que:

a)

As disposições relativas à atribuição de uma reparação pelo organismo criado ou autorizado nos termos do artigo 1.°, n.° 4, devem incluir disposições prevendo o pagamento de juros sobre os montantes considerados devidos pelos prejuízos materiais ou corporais sofridos?

b)

Se a resposta à primeira questão, alínea a), for afirmativa, a partir de que data e em que base devem esses juros ser calculados?

2)

A correcta interpretação do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva de responsabilidade civil automóvel, quando o próprio organismo que tem a missão de pagar a reparação tem a obrigação de investigar os prejuízos materiais e corporais sofridos pela vítima (e suportar as respectivas despesas, incluindo o custo dos relatórios médicos e de outros relatórios) é de que:

a)

As disposições relativas à atribuição da compensação pelo organismo devem prever o pagamento das despesas suportadas pela vítima com a preparação e apresentação do seu pedido de compensação a esse organismo?

b)

Se a resposta à segunda questão, alínea a), for afirmativa, com que base é que as despesas devem ser calculadas quando esse organismo tenha proposto à vítima um montante superior ao montante da reparação finalmente conseguido, tendo a vítima recusado a aceitação dessa proposta?

3)

A interpretação correcta do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva relativa ao seguro de responsabilidade civil automóvel é de que, se o pedido da vítima de compensação for avaliado por um organismo que não seja um tribunal, deve esta dispor do direito de recurso dessa decisão para um tribunal, tanto sobre a matéria de facto como sobre a matéria de direito, em vez de recurso para um árbitro independente que tem as seguintes características principais:

i)

a vítima pode recorrer para o árbitro tanto sobre a matéria de facto como sobre a matéria de direito;

ii)

ao interpor recurso, a vítima pode fazer novas declarações e apresentar novas provas ao organismo competente para pagar a indemnização, face às quais o referido organismo pode alterar a sua decisão antes da apreciação do recurso;

iii)

é fornecida adiantadamente à vítima uma cópia de todos os documentos a serem entregues ao árbitro e é-lhe dada a oportunidade de juntar quaisquer documentos que deseje como resposta;

iv)

sem audiência, o árbitro profere a sua decisão, na qual estabelece que compensação o organismo a que incumbe a reparação deve pagar e fundamenta essa decisão;

v)

se a vítima não ficar satisfeita com essa decisão, tem direito a recorrer da decisão do árbitro para os tribunais, mas apenas o pode fazer com base em sérias irregularidades que afectem a decisão ou sobre uma questão de direito (destinado, nomeadamente, a determinar se há provas para apoiar alguma conclusão em especial do árbitro ou se o árbitro chegou a qualquer conclusão específica com base nos elementos de prova disponíveis) e, no caso de recurso que tem por objecto uma questão de direito, deve ser obtida autorização de recurso por parte da Court, que só será dada se a decisão do árbitro for obviamente errada e se à Court parecer justo e adequado, dadas todas as circunstâncias, que a Court decida a questão?

4)

Se a resposta à primeira questão, alínea a), e/ou à segunda questão, alínea a), e/ou à terceira questão for afirmativa, considera-se que um Estado-Membro autorizou devidamente um organismo, nos termos do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva, relativa à responsabilidade civil automóvel, quando um organismo existente tem por missão pagar indemnizações às vítimas apenas nos termos de um acordo celebrado com a autoridade competente do Estado-Membro, cujos termos, nesse aspecto, não preenchem as condições da Segunda Directiva relativa à responsabilidade civil automóvel, e:

a)

esse acordo cria uma obrigação legal para com a autoridade competente do Estado-Membro de pagar uma compensação às vítimas, que é directamente invocável pela autoridade competente e não confere a tais vítimas um direito legal directamente tutelado contra esse organismo, mas a vítima pode recorrer à Court pedindo-lhe que esta ordene à autoridade competente que faça executar o acordo, se aquela autoridade o não fizer; e

b)

o organismo cumpre essa obrigação aceitando e satisfazendo pedidos das vítimas nos termos desse acordo; e

c)

o Estado-Membro considerou de boa fé que a celebração desse acordo garantia às vítimas uma tutela pelo menos tão boa quanto a exigida pela Segunda Directiva relativa ao seguro de responsabilidade automóvel?

5)

Se a resposta à primeira questão, alínea a), à segunda questão, alínea a), ou à terceira questão for afirmativa, e/ou a resposta à quarta questão for negativa, a falta de cumprimento da Segunda Directiva, relativa ao seguro de responsabilidade automóvel, neste aspecto, constitui uma violação suficientemente grave por um Estado-Membro para implicar a sua responsabilidade pelos eventuais prejuízos nos termos de direito comunitário, se se provar a existência desse prejuízo?»

16.

Intervieram no processo no Tribunal de Justiça o demandante, o Governo do Reino Unido, representando também o demandado no processo principal, o MIB na qualidade de interveniente no processo principal em apoio do demandado e da Comissão.

IV — As posições das partes

17.

Na audiência, o representante do demandante sublinhou que, independentemente do conteúdo e da ordem das questões prejudiciais, entendia que o Reino Unido não tinha transposto para o direito nacional a Segunda Directiva, ou não o tinha feito correctamente. O problema central do processo é o de saber se um Estado-Membro deve atribuir uma indemnização a um particular que faz parte dos beneficiários da directiva, quando o Estado-Membro nada fez para lhes permitir invocar a directiva contra quem quer que seja.

18.

Por razões de clareza, importa, contudo, examinar as questões prejudiciais por ordem.

1. A questão do pagamento de juros e do reembolso das despesas — primeira e segunda questões

Tese das partes

19.

Uma vez que os argumentos apresentados relativamente à primeira e à segunda questões são amplamente paralelos, há que fazer uma exposição comum.

20.

O demandante defende a ideia de que uma interpretação literal do artigo 1.°, n.os 1 e 4, da Segunda Directiva, em conjugação com o artigo 3.°, n.° 1, da Primeira Directiva, demonstra que, em caso de danos corporais causados por um condutor não identificado, o organismo autorizado é obrigado a indemnizá-los —«pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro» — da mesma maneira e nas mesmas condições que as previstas no direito nacional no caso de dano causado por condutor identificado e segurado. Esta interpretação é apoiada pelo facto de, quando a directiva pretende reservar às vítimas de condutores não identificados um tratamento diferente do das vítimas de condutores não segurados, o dizer expressamente, como, por exemplo, em relação aos danos materiais.

21.

Embora a Segunda Directiva não imponha directamente a igualdade de tratamento entre vítimas de condutores não identificados e as de condutores segurados ou não, esta obrigação resulta, em qualquer caso, do princípio geral da igualdade de tratamento. Ora, no Reino Unido, as vítimas de condutores não identificados não são tratadas da mesma maneira que as vítimas de condutores segurados ou insuficientemente segurados. Contrariamente a estas últimas, e sem qualquer justificação objectiva, as vítimas de condutores não identificados não obtêm uma indemnização que inclua os juros e despesas e também não gozam das mesmas garantias processuais, incluindo o acesso aos tribunais.

22.

Remetendo para o acórdão do Tribunal de Justiça no processo Marshall ( 7 ), no qual o Tribunal tinha declarado, em relação a um despedimento discriminatório, que a condenação no pagamento de juros deve ser considerada uma componente indispensável de uma reparação, o demandante alega que este princípio deve também aplicar-se à indemnização das vítimas de condutores não identificados, prevista pela Segunda Directiva.

23.

Estas considerações aplicam-se também, em sua opinião, ao reembolso das despesas. É o que confirma, aliás, a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, segundo a qual a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (a seguir «CEDH») tem por finalidade proteger direitos concretos e efectivos ( 8 ).

24.

O Governo do Reino Unido entende que as disposições pertinentes das duas directivas demonstram que estas se destinavam a assegurar garantias mínimas, mas que não visavam a harmonização das ordens jurídicas dos Estados-Membros. Nenhuma das disposições destas directivas regula os elementos financeiros de uma indemnização, da mesma forma que também não prevêem que o organismo responsável pela indemnização deva atribuir o mesmo montante que o que seria atribuído pelos órgãos jurisdicionais nacionais à vítima de um condutor segurado. A diferença de tratamento dos dois grupos de pessoas em direito nacional justifica-se objectivamente, porque o organismo obrigado a indemnizar a vítima não é o autor do prejuízo e não pode, por maioria de razão, ser considerado o autor de um dano que retém de forma injustificada um montante devido ao demandante. Por seu lado, a directiva, no seu artigo 1.°, n.° 4, último parágrafo, deixa a porta aberta a uma diferença de tratamento.

25.

Remetendo para o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça no processo Sutton ( 9 ), o Governo do Reino Unido alega que em direito comunitário não existe um princípio geral segundo o qual a obrigação de pagar uma indemnização deve necessariamente incluir também o pagamento de juros. As mesmas considerações devem também aplicar-se ao reembolso de despesas.

26.

O MIB defende, no essencial, as mesmas posições que o Governo do Reino Unido. A título liminar, o MIB explica, contudo, que, em direito inglês, as indemnizações e juros são calculadas pelos tribunais à data do julgamento. Rompendo com este princípio da common law, a section 35 A do Supreme Court Act de 1981 veio, na verdade, atribuir-lhes a faculdade de conceder juros, em determinadas condições, no âmbito de pedidos de indemnização, mas esta faculdade apenas pode ser exercida no âmbito de processos judiciais.

27.

A Comissão sublinha, antes de mais, que nem a Primeira nem a Segunda Directiva contêm uma disposição expressa relativa à concessão de juros ou reembolso das despesas. Assim, também delas não resulta que estes fazem parte integrante da obrigação de seguro.

28.

A Comissão examina, a seguir, a questão de saber se o artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva permite que um Estado-Membro trate uma categoria de vítimas de forma menos favorável que uma outra. A este respeito, a Comissão entende que, sem prejuízo das excepções expressas, a Segunda Directiva, tendo em conta o seu objectivo geral, obriga a atribuir às vítimas de condutores não segurados ou não identificados o mesmo grau de cobertura que às vítimas cobertas pelo seguro obrigatório.

29.

A Comissão averigua, por último, se uma regulamentação nacional que não prevê a atribuição de juros às vítimas de condutores não identificados viola o conceito de «indemnização suficiente» que é o objectivo da Segunda Directiva. Sob este aspecto, refere-se, em primeiro lugar, à jurisprudência do Tribunal de Justiça, favorável à atribuição de juros, em matéria de responsabilidade extracontratual da Comunidade ( 10 ) e em matéria de igualdade de tratamento entre homens e mulheres ( 11 ). Refere-se, em segundo lugar, aos objectivos da Segunda Directiva, tal como são enunciados no seu preâmbulo, e observa que o seu artigo 1.°, n.° 4, precisa claramente os casos em que os Estados-Membros podem limitar o montante da indemnização, sem, no entanto, indicar que a atribuição de juros pode ser excluída. Tendo em conta todos estes elementos, a Comissão inclina-se no sentido de que a atribuição de juros, nos termos das normas nacionais aplicáveis, deve ser considerada uma componente essencial da indemnização prevista no artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva.

Apreciação

30.

Para verificar se os juros e as despesas fazem parte da prestação que, na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva, um organismo deve pagar pelos danos causados por um veículo não identificado ( 12 ), há que partir, antes de mais, do texto da Primeira e da Segunda Directivas. A Primeira e a Segunda Directivas não referem expressamente os juros ou as despesas. O artigo 1.°, n.° 1, da Segunda Directiva remete, em relação à definição do objecto do seguro, para o artigo 3.°, n.° 1 da Primeira Directiva. Ora, esta disposição nada acrescenta além de que cada Estado-Membro adopta todas as medidas adequadas para que a responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos com estacionamento habitual no seu território esteja coberta por um seguro. Enuncia que «[e]ssas medidas devem determinar o âmbito da cobertura e as modalidades de seguro».

31.

Quanto ao âmbito do direito à reparação contra o organismo a que se refere o artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva, diz-se neste artigo que o organismo tem por missão reparar, «pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro». No que respeita à extensão da obrigação de seguro, o quinto considerando da Segunda Directiva enuncia que: «os montantes até cujo limite o seguro é obrigatório devem permitir, em toda e qualquer circunstância, que seja garantida às vítimas uma indemnização suficiente, seja qual for o Estado-Membro onde o sinistro ocorra» ( 13 ). Importa, assim, verificar se, de acordo com o sentido e a finalidade das disposições, a «obrigação de seguro» inclui os juros e as despesas. Neste âmbito, há também que averiguar se a natureza do direito à reparação exige eventualmente a atribuição de juros e o reembolso das despesas.

32.

Antes de mais, deve considerar-se que incumbe em princípio aos Estados-Membros definir, com base na Primeira e na Segunda Directivas, a obrigação de cobertura ( 14 ). Na Primeira Directiva, esta missão era deixada unicamente aos Estados-Membros. Isto não resulta apenas do seu artigo 3.°, n.° 1, mas esta tendência desenha-se também no n.° 2 desta disposição segundo a qual cada Estado-Membro adopta todas as medidas adequadas para que o contrato de seguro abranja igualmente os prejuízos causados no território de um outro Estado-Membro, de acordo com a respectiva legislação nacional em vigor.

33.

As divergências quanto à extensão da obrigação de seguro nos Estados-Membros ( 15 ) levaram, no âmbito da Segunda Directiva, ao alargamento da obrigação de segurar à responsabilidade por danos materiais ( 16 ). Fixaram-se igualmente montantes mínimos para a cobertura de danos corporais e danos materiais ( 17 ). A Terceira Directiva ( 18 ) vai mais longe nesta direcção, na medida em que impõe exigências mínimas em relação ao círculo de pessoas a segurar ( 19 ).

34.

Para além destas exigências mínimas cada vez mais severas, é necessário, portanto, partir do princípio de que hoje em dia, como no passado, incumbe aos Estados-Membros determinar as características do direito de reparação. O artigo 1.°, n.° 4, último parágrafo, da Segunda Directiva estipula expressamente que, no que respeita à intervenção do organismo autorizado, cada Estado-Membro pode aplicar as respectivas disposições legislativas, regulamentares e administrativas, sem prejuízo de qualquer outra prática mais favorável às vítimas.

35.

Poderia fazer-se aqui um estudo de direito comparado das disposições dos Estados-Membros em matéria de responsabilidade civil, para verificar se a atribuição de juros e o reembolso das despesas estão habitualmente incluídos no seguro obrigatório. Mesmo que daí se conclua que os juros e as despesas estão geralmente incluídos neste seguro, este resultado não deve, no entanto, ser obrigatório para todos os Estados-Membros. Doutra forma, a remissão para as disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros ficaria sem objecto.

36.

É necessário, portanto, aprofundar a questão de saber se eventualmente a natureza do direito à reparação permite concluir que os juros devem ser atribuídos e as despesas reembolsadas. O seguro de responsabilidade civil automóvel assenta no princípio de um direito a reparação de direito civil. A obrigação de seguro prescrita pela lei está ligada a este direito e serve para a segurança económica de um direito a reparação fundamentado.

37.

Poderá questionar-se se a natureza jurídica do direito muda quando a reparação dos danos materiais ou corporais deve ser assegurada por um organismo na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva. Pode pensar-se em diferentes maneiras de um Estado-Membro cumprir a sua obrigação de criar ou de autorizar um organismo na acepção do mesmo artigo. Pode tratar-se quer de um serviço administrativo, de um órgão público quer, como no caso em apreço, de um organismo privado. Em qualquer caso, o Estado-Membro deve atribuirlhe a missão em causa. A natureza do direito poderia, portanto, alterar-se em função da entidade contra a qual este direito pode ser invocado.

38.

O artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva prevê, no entanto, expressamente que: «[e]sta disposição não prejudica o direito que assiste aos Estados-Membros de atribuírem ou não à intervenção desse organismo um caracter subsidiário, nem o direito de regulamentarem os sistemas de recursos entre este organismo e o ou os responsáveis pelo sinistro [...]».

39.

Esta formulação demonstra que a forma de agir contra o organismo não pode ser separada do direito inicial à reparação. Isto leva a considerar que também os direitos derivados são direitos de natureza civil. Esta opinião depara-se ainda com o facto de, no caso em apreço, o contexto jurídico ser um contexto de direito privado. Os acordos entre o MIB e o Ministro dos Transportes inserem-se no direito privado e o MIB é uma sociedade de direito privado. Para a sequência da análise, há que partir, antes de mais, da ideia de que se trata de um direito à reparação de direito privado.

40.

A jurisprudência do Tribunal de Justiça fornece algumas indicações à cerca da questão de saber em que medida os juros são uma componente indispensável de uma reparação. No processo Marshall ( 20 ), referido pelas partes, tratava-se de uma «reparação adequada» ( 21 ) do prejuízo sofrido em virtude de um despedimento discriminatório, portanto, de um direito à reparação de direito privado. O direito nacional previa um limite máximo para estas indemnizações. Além disso, parecia que os tribunais não eram competentes para condenar no pagamento de juros sobre os montantes em causa ( 22 ). O Tribunal de Justiça declarou a este respeito «que uma reparação integral do prejuízo sofrido em virtude de um despedimento discriminatório não pode ignorar elementos, como o decurso do tempo, que são susceptíveis de reduzir, de facto, o seu montante. A condenação no pagamento de juros, nos termos das normas nacionais aplicáveis, deve, portanto, ser considerada uma componente indispensável de uma reparação pecuniária que permite o restabelecimento de uma efectiva igualdade de tratamento» ( 23 ).

41.

No acórdão Ireks-Arkady ( 24 ), tratava-se de saber se um pedido de juros feito em conexão com a responsabilidade extracontratual da Comunidade ao abrigo do artigo 215.°, segundo parágrafo, do Tratado CE (actual artigo 288.° CE) é, em princípio, admissível. O Tribunal de Justiça deduziu dos princípios gerais comuns aos Estados-Membros a existência de um direito a juros resultante do acórdão que declara a obrigação de reparar o prejuízo ( 25 ).

42.

O Tribunal de Justiça chegou à mesma conclusão no processo Grifoni/CEEA ( 26 ). O facto danoso controvertido era uma acidente. O Tribunal de Justiça declarou: «a reparação do prejuízo tem por objecto reconstituir, na medida do possível, o património da vítima de um acidente. Segue-se que deve ser efectivamente tida em conta a depreciação monetária posterior ao facto danoso» ( 27 ). O Tribunal de Justiça reconheceu um direito a receber juros a contar da pronúncia do acórdão.

43.

Nos três acórdãos referidos, tratava-se de pedidos de indemnização por motivos diferentes. Estes três acórdãos tinham, no entanto, em comum o facto de que, em determinadas condições a precisar, o Tribunal de Justiça reconheceu em princípio que a atribuição de juros é uma característica do direito à reparação.

44.

Contudo, tendo em conta que os juros não fazem necessariamente parte integrante de um direito à reparação, remeteu-se, durante a fase escrita, para o acórdão Sutton ( 28 ). Este processo tratava da questão de saber se há lugar ao pagamento de juros sobre retroactivos de prestações atrasadas de segurança social, quando o atraso no pagamento for causado por uma discriminação em razão do sexo. Sobre este ponto, o Tribunal de Justiça afirmou: «os montantes pagos a título de prestação de segurança social não têm carácter indemnizatório ( 29 ), de modo que não pode ser exigido o pagamento de juros, quer com base no artigo 6.° da Directiva 76/207, quer no artigo 6.° da Directiva 79/7» ( 30 ). A questão de saber se um direito a receber juros resulta de urna eventual acção de responsabilidade conta o Estado-Membro foi deixada em aberto pelo Tribunal de Justiça, que remeteu sobre este aspecto para o direito nacional ( 31 ).

45.

Contudo, como no caso em apreço se trata em princípio de um direito à reparação e não de prestações da segurança social, o acórdão Sutton não pode ser invocado para excluir, à partida, um direito ao pagamento de juros. Da jurisprudência referida em matéria de direito à reparação ( 32 ) resulta que os juros são antes uma componente deste direito.

46.

Antes de aplicar este princípio ao caso em apreço, há que verificar se os objectivos da directiva estão de acordo com esta maneira de pensar.

47.

As directivas em matéria de responsabilidade civil automóvel estabelecem normas mínimas para a tutela das vítimas de acidente de viação. Na Primeira Directiva, a questão central é, antes de mais, a do alcance da protecção do seguro, tendo, em segundo plano, o objectivo declarado de «liberalizar o sistema de circulação de pessoas e de veículos automóveis no tráfego de viajantes entre os Estados-Membros» ( 33 ).

48.

As vítimas de veículos não identificados apenas foram tidas em conta pela regulamentação comunitária com a adopção da Segunda Directiva. Na medida em que é necessário criar ou autorizar um organismo que tenha por missão reparar, «pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro» ( 34 ), os danos causados, a obrigação regular de indemnização das vítimas de veículos seguros é claramente sublinhada. O critério para a extensão da reparação deveria, portanto, ser o montante habitual da reparação nos acidentes causados por veículos segurados. Quando a directiva prevê derrogações a esta regra, menciona-as expressamente e justifica-as materialmente.

49.

Só o artigo 1.°, n.° 4, quarto parágrafo, se refere aos danos causados por veículo não identificado. Os Estados-Membros podem limitar ou excluir a intervenção do organismo em caso de danos materiais. Como os considerandos expressamente enunciam ( 35 ), esta possibilidade é atribuída aos Estados-Membros para prevenirem os «riscos de fraude».

50.

Fora desta excepção, há que partir da ideia de que as vítimas de veículos não identificadas devem ser indemnizadas como as vítimas de veículos identificados e seguros. O facto de que se trata de uma exigência mínima, resulta, por um lado, da fórmula «pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro» ( 36 ). Por outro lado, a fórmula do artigo 1.°, n.° 4, último parágrafo, da Segunda Directiva — a saber, «sem prejuízo de qualquer outra prática mais favorável às vítimas» — evidencia o facto de que as vítimas de veículos não identificados devem beneficiar de uma tutela mínima segundo a directiva.

51.

Para poder responder à questão da atribuição de juros e do reembolso das despesas no caso em apreço, importa, assim, saber como se procede no caso de acidentes causados por veículos seguros. Se nestes casos, os juros e as despesas são normalmente pagos, a vítima de um veículo não identificado deve, então, também ter direito a estes.

52.

Contudo, o Governo do Reino Unido alegou que existem razões objectivas para a desigualdade de tratamento entre as vítimas de veículos seguros e as vítimas de veículos não identificados. Há que contra-argumentar que, mesmo que o processo para obter a indemnização seja fundamentalmente diferente, a extensão da indemnização não deve ser inferior à das vítimas de veículos devidamente seguros.

53.

Os termos do artigo 1.°, n.° 4, último parágrafo, da Segunda Directiva, segundo os quais «Além disso, cada Estado-Membro pode aplicar à intervenção do referido organismo as respectivas disposições legislativas, regulamentares e administrativas [...]», que o Governo do Reino Unido invoca, não levam a uma conclusão diferente. E verdade que esta disposição remete para as disposições dos Estados-Membros. Contudo, na aplicação do direito comunitário, no caso em apreço o da protecção mínima das vítimas de veículos não identificados, há que respeitar os princípios elaborados pelo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência consagrada.

54.

Trata-se, a este respeito, do princípio da equivalência e do princípio da efectividade. Estes princípios, que apenas receberam esta qualificação na jurisprudência mais recente do Tribunal de Justiça ( 37 ), apoiam-se numa jurisprudência assente que remonta a um passado longínquo ( 38 ). Segundo estes princípios as modalidades processuais das acções judiciais destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos que decorrem para os cidadãos do direito comunitário não podem ser menos favoráveis do que as das acções análogas de natureza interna e não podem tornar praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária ( 39 ).

55.

Um vez que em processos por responsabilidade civil nos órgãos jurisdicionais nacionais referentes a acidentes causados por veículos seguros, são pagos juros e despesas, deve verificar-se o mesmo, por aplicação dos princípios atrás referidos, nas acções de indemnização intentadas pelas vítimas de veículos não identificados. Esta obrigação resulta da Segunda Directiva, em conexão com os princípios de aplicação do direito comunitário.

56.

O facto de o MIB assim como o acordo entre o MIB e o Ministro dos Transportes relativo aos condutores não identificados já existirem antes da adopção da Segunda Directiva em nada altera a situação. A Segunda Directiva fala expressamente, no artigo 1.°, n.° 4, de se autorizar um organismo e parte, portanto, da ideia de que em certos Estados-Membros já existem eventualmente um organismo deste tipo e as correspondentes disposições. Contudo, isto não desvincula o legislador nacional da obrigação de prever as normas mínimas em matéria de indemnização prescritas pela directiva. Se as vítimas de veículos não identificados estão numa situação mais desfavorável que as dos veículos seguros, pode tratar-se de um problema de transposição correcta da directiva, matéria à qual voltaremos.

57.

Como conclusão intermédia em relação à primeira e à segunda questões, há que considerar que os juros e as despesas são um componente indispensável de um direito à reparação para as vítimas de veículos não identificados se e na medida em que estes elementos façam parte do direito à reparação das vítimas devidamente seguras e identificadas. Esta conclusão vale tanto do ponto de vista material como no que respeita às modalidades da liquidação.

58.

O Governo do Reino Unido e o MIB alegam que, em direito nacional, os juros e as despesas não fazem parte, na realidade, do direito à reparação, mas que os tribunais são legalmente competentes para condenar em juros.

59.

A este respeito observaremos que, na comparação do montante da indemnização pelos danos causados por veículos não seguros, por um lado, e os causados por veículos devidamente seguros, por outro, é necessário considerar as coisas sob o ângulo financeiro. O facto de por um mesmo dano o montante atribuído ser, em princípio, diferente segundo o seu autor não pode ser justificado, face às exigências do direito comunitário, por razões de economia das disposições de direito interno.

60.

A objecção do Governo do Reino Unido e do MIB, segundo a qual apenas os tribunais podem condenar em juros, implica, além do mais, que, para períodos anteriores à prolação de um acórdão, não há, em princípio, pagamento de juros.

61.

O cálculo de juros de uma indemnização depende, em princípio, do momento de que se parte. Este pode ser o facto danoso, mas também pode ser a prolação do acórdão, quando, por exemplo, a extensão dos danos, tendo em conta o decurso do tempo ( 40 ), é definida no acórdão. Os acórdãos já referidos ( 41 ) Ireks-Arkady ( 42 ) e Grifoni ( 43 ) podem também ser entendidos neste sentido. Podem-se aplicar as regras habituais em vigor no Estado-Membro em causa, na condição de que o resultado não seja desfavorável para as situações jurídicas que se baseiam no direito comunitário.

62.

Em relação ao caso em apreço, coloca-se, contudo, um problema, no caso de só os tribunais poderem condenar em juros, uma vez que o acesso ao tribunais é, efectivamente, tornado excessivamente difícil. O processo poderia, portanto, por si só ser problemático do ponto de vista do direito comunitário. Voltaremos a este ponto mais à frente.

63.

A cláusula 3 do acordo aplicável no caso em apreço (v. supra n.° 6) prevê, contudo, que a indemnização a pagar deve ser determinada nas mesmas condições que seriam fixadas por um tribunal. A objecção segundo a qual só os tribunais podem condenar em juros não pode, portanto, impedir um cálculo da indemnização em conformidade com o direito comunitário.

64.

A título complementar, sublinhe-se ainda que uma indemnização no âmbito do acordo relativo aos condutores não segurados pode também incluir juros e despesas. O facto de não ser chamado a intervir o seguro competente, mas um organismo colectivo não pode, portanto, ser considerado uma justificação objectiva do cálculo diferente da reparação segundo o acordo referente aos condutores não identificados.

2. O processo arbitral — terceira questão

Tese das partes

65.

O demandante alega que o processo arbitral previsto no acordo referente aos condutores não identificados não preenche as exigências de uma tutela jurisdicional efectiva, como foram enunciadas pelo Tribunal de Justiça no acórdão Johnston ( 44 ), nem as de um «processo equitativo» na acepção do artigo 6.° da CEDH ( 45 ) ( 46 ). Não há audiência e a sentença arbitrai apenas pode ser impugnada em caso de irregularidades graves do processo arbitrai ou com base em questões de direito, na condição de o recurso que lhes diz respeito ser autorizado.

66.

O tratamento diferente no plano processual constitui, em minha opinião, uma violação do princípio da igualdade de tratamento que exige que as vítimas de condutores não identificados no Reino Unido gozem da mesma tutela jurídica que as vítimas de condutores segurados ou não. O facto de a vítima de um condutor não identificado não poder intentar uma acção judicial contra este último não pode constituir uma justificação objectiva da desigualdade de tratamento. Além disso, a excepção em detrimento das vítimas de condutores não identificados apenas foi prevista por razões de economias de custos.

67.

O Governo do Reino Unido e o MIB alegam, antes de mais, que o artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva apenas impõe exigências mínimas de ordem processual. A vítima deve dirigir-se directamente ao organismo previsto. Por outro lado, a directiva remete para as disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Esta-dos-Membros.

68.

No que respeita ao princípio da tutela jurisdicional efectiva, o Governo do Reino Unido alega que o conjunto das vias de recurso oferecidas à vítima de um condutor não identificado, longe de tornar impossível ou excessivamente difícil a tutela jurisdicional, constituem um sistema com múltiplos graus de tutela. A inexistência de audiência perante o árbitro não impediu o demandante de apresentar a sua argumentação da maneira mais completa e de responder às alegações de negligência concorrente.

69.

Quanto ao princípio da igualdade de tratamento, a vítima de um condutor não identificado encontra-se, sob determinados aspectos, numa situação mais favorável que a vítima de um condutor não segurado. O processo instituído permite, muitas vezes, resolver o litígio de maneira mais rápida e menos onerosa do que através de um processo judicial.

70.

No que respeita ao artigo 6° da CEDH, tanto o Governo do Reino Unido como o MIB formularam dúvidas quanto à questão de saber se o litígio no processo principal é sobre «direitos e obrigações de natureza civil». Em qualquer caso, e também à luz da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem ( 47 ), o processo deve ser considerado na sua globalidade, incluindo as vias de recurso. Mesmo que o procedimento seguido pelo MIB não responda plenamente às condições impostas pelo artigo 6.° da CEDH, tal já não acontece, de qualquer maneira, com o processo perante o árbitro. A sua independência e a sua imparcialidade estão garantidas e o árbitro exerce a sua competência de plena jurisdição sob o controlo da High Court. Tendo em conta que não há audiência perante o árbitro, o representante do Governo Reino Unido apresentou, mesmo assim, dúvidas quanto à compatibilidade do processo arbitrai com o artigo 6.° da CEDH.

71.

A Comissão entende que o artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva confere o direito à reparação às vítimas de danos causados por condutores não identificados e que, consequentemente, compete aos Estados-Membros assegurar o controlo jurisdicional efectivo do respeito deste direito. A Comissão examina, a seguir, se o processo arbitral satisfaz as exigencias do artigo 6.° da CEDH. Com base em elementos constantes no despacho de reenvio e com reserva de precisões suplementares, entende que o processo apresenta lacunas em relação aos critérios desenvolvidos pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Estas dizem respeito, concretamente, ao estatuto do árbitro em relação à sua independência, à inexistência de audiência e ao alcance muito limitado do direito de interpor recurso da sentença arbitral.

Apreciação

72.

Com a terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o processo previsto no acordo para obter a indemnização preenche as exigências de direito comunitário em matéria de tutela jurisdicional efectiva. Contudo, a análise não se pode limitar unicamente ao processo no MIB que o acordo prevê para recorrer ao árbitro, mas também à possibilidade que lhe está ligada de impugnar a sentença arbitral dentro de certos limites nos tribunais comuns, como demonstra o ponto V da terceira questão prejudicial.

73.

Para apreciar esta questão, há, antes demais, que determinar os direitos atribuídos pelo direito comunitário para cuja aplicação é pedida a tutela jurisdicional. Importa partir do 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva. As passagens pertinentes são as seguintes:

«Cada Estado-Membro deve criar ou autorizar a criação de um organismo que tenha por missão reparar [...] os danos materiais ou corporais causados por veículos não identificados ou relativamente aos quais não tenha sido satisfeita a obrigação de seguro [...].

A vítima pode, em qualquer caso, dirigir-se directamente ao organismo que [...] é obrigado a dar-lhe uma resposta fundamentada quanto à sua intervenção.»

O sexto considerando enuncia que:

«Considerando que é necessário prever a existência de um organismo que garanta que a vítima não ficará sem indemnização, no caso do veículo causador do sinistro não estar seguro ou não ser identificado; que [...] é importante prever que a vítima de um sinistro ocorrido naquelas circunstâncias se possa dirigir directa e prioritariamente a esse organismo.»

74.

Independentemente da possibilidade deixada aos Estados-Membros de atribuírem à intervenção deste organismo um caracter subsidiário ( 48 ), a vítima tem um direito à reparação e isto pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro. Trata-se de uma situação jurídica claramente definida, atribuída pelo direito comunitário ao círculo de pessoas determinado pela directiva.

75.

A aplicação deste direito deve beneficiar de uma tutela jurisdicional efectiva. É certo que a directiva não menciona expressamente uma exigência de tutela jurisdicional deste direito. Isto resulta, contudo, dos princípios gerais de direito comunitário.

76.

O Tribunal de Justiça teve várias ocasiões de se pronunciar sobre o princípio da tutela jurisdicional efectiva enquanto princípio geral de direito comunitário. Assim, teve de tomar posição a este respeito nos processos Johnston ( 49 ) e no acórdão Coote ( 50 ) no âmbito da aplicação do artigo 6.° da directiva em matéria de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no plano do emprego ( 51 ). O Tribunal de Justiça declarou a este propósito no acórdão Johnston: «O controlo jurisdicional imposto por este artigo é a expressão de um princípio geral de direito que está na base das tradições constitucionais comuns dos Estados-Membros. Este princípio foi igualmente consagrado pelos artigos 6.° e 13.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, de 4 de Novembro de 1950. Como foi reconhecido [...] pela jurisprudência do Tribunal, convém ter em conta, no quadro do direito comunitário, os princípios em que se inspira essa convenção» ( 52 ).

77.

O Tribunal de Justiça prossegue no acórdão Johnston: «Cabe aos Estados-Membros assegurar um controlo jurisdicional efectivo do respeito das disposições aplicáveis do direito comunitário e da legislação nacional destinada a aplicar os direitos estabelecidos na directiva» ( 53 ).

78.

Estas considerações de princípio não são de forma alguma limitadas ao contexto da directiva relativa à igualdade de tratamento, mas o seu alcance é extensivo a outros domínios jurídicos, tal como a formulação geral das conclusões o demonstra. Neste contexto do direito comunitário fundamental do acesso ao emprego, o Tribunal de Justiça recordou, por exemplo, no acórdão Heylens ( 54 ) as suas declarações de princípio do acórdão Johnston.

79.

No que respeita às exigências do princípio da tutela jurisdicional, há que remeter, por um lado, ao artigo 6° da CEDH. O seu n.° 1, primeiro período, prevê: «Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá [...] sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de caracter civil [...].»

80.

Além disso, refira-se o artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais ( 55 ), que, embora ainda não tenha efeitos jurídicos vinculativos, pode, no entanto, servir de critério de comparação, pelo menos na medida em que aborda os princípios de direito reconhecidos de forma geral. Nos termos do seu artigo 51.°, a carta aplica-se também aos Estados-Membros quando aplicam o direito da União. Os n.°s 1 e 2 do artigo 17.° da Carta têm a seguinte redacção:

«Toda a pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União tenham sido violados tem direito a uma acção perante um tribunal.

Toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei. [...]»

81.

O princípio da tutela jurisdicional efectiva, assente no direito comunitário, inclui, portanto, por um lado, as exigências previstas nas disposições referidas e confere, por outro, aos órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros uma obrigação de cooperação para assegurar a tutela jurisdicional ( 56 ).

82.

Para averiguar agora detalhadamente se o processo que permite às vítimas de veículos não identificados obter uma indemnização preenche as exigências do direito comunitário, é necessário, antes de mais, examinar as exigências processuais previstas pela directiva e, em seguida, as condições adicionais por força do princípio da tutela jurisdicional efectiva.

83.

Há que considerar o artigo 1.°, n.° 4, segundo parágrafo, uma exigência processual mínima, quando este dispõe que a vítima pode, em qualquer caso, dirigir-se directamente ao organismo que é obrigado a dar-lhe uma resposta fundamentada quanto à sua intervenção. Um vez que a vítima pode, com base no acordo, dirigir-se directamente ao MIB ( 57 ), que deve examinar o pedido ( 58 ) e decidir ( 59 ), estas condições mínimas estão preenchidas. O Governo do Reino Unido defende que não se pode deduzir da directiva mais nenhuma outra exigência.

84.

Com já referimos mais atrás, o teor da directiva confere também à vítima um direito cuja tutela judicial resulta, eventualmente, do direito comunitário. Importa, assim, verificar se os critérios que caracterizam uma tutela jurisdicional efectiva estão preenchidos. O artigo 6.° da CEDH incorporado pelo direito comunitário e o artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais, que têm um conteúdo muito idêntico, devem constituir o fio condutor.

85.

Para pôr em causa esta forma de proceder, o Governo de Reino Unido referiu, no entanto, que, desde logo, é duvidoso que os direitos da vítima constituam «direitos de natureza civil» na acepção do artigo 6° CEHD. No exame da natureza do direito para eventualmente retirar consequências sobre um direito aos juros ( 60 ), tomámos posição sobre a natureza de direito civil do direito à indemnização. Com esta base, deveríamos, agora, partir do princípio de que se trata de um direito de natureza civil. Mas, mesmo que, por qualquer razão, se tratasse de um direito de natureza pública, isto não poderia justificar o facto de a vítima não beneficiar da tutela jurisdicional na sua aplicação. Não se pode, aliás, deduzir do artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais uma limitação comparável aos direitos de natureza civil. Basta, portanto, que se trate de um direito «garantido pelo direito da União». O direito à indemnização do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva deve incontestavelmente ser considerado como tal.

86.

O artigo 6.° da CEDH e o artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais têm em comum o facto de a tutela jurisdicional dever ser assegurada por um tribunal independente e imparcial, estabelecido previamente pela lei e de, além do mais, o julgamento dever ser público no âmbito de um processo equitativo.

87.

O direito de recurso para o MIB, que, antes de mais, apenas tem por objecto um controlo da decisão proposta tendo em conta eventuais elementos de prova suplementares carreados pela vítima, não responde às exigências de controlo jurisdicional assim definidas. A primeira fase do processo de oposição é comparável a um processo de reclamação administrativa. Não há nem independência completa nem imparcialidade do organismo de indemnização. O MIB toma uma decisão que — na medida em que a vítima a aceita — é aplicável à vítima e que tem para ela um caracter vinculativo. Mas, mesmo a previsão do direito de recurso no âmbito do acordo, que, como nós já referimos ( 61 ), tem um carácter privado, não pode ser considerado «estabelecido pela lei».

88.

Contudo, isto não teria qualquer consequência se um meio de recurso estivesse disponível contra esta decisão. A este respeito há que acolher a opinião do Reino Unido, segundo a qual importa ter em conta o conjunto das possibilidades de tutela jurisdicional. Num primeiro tempo, há, assim, que analisar o processo arbitral, mas não se pode ficar por aqui.

89.

A questão que se coloca, antes de mais, é a de saber se o processo arbitral previsto no acordo constitui um processo jurisdicional. Com base na jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre a definição das características de um órgão jurisdicional na acepção do artigo 177.° do Tratado CE (actual artigo 234.° CE), há que referir cinco critérios. Trata-se da origem legal do órgão, a sua permanência, o carácter obrigatório da sua jurisdição, a natureza contraditória do processo e a aplicação de regras de direito ( 62 ).

90.

Se partirmos da ideia de que o processo arbitral é criado pelo acordo entre o MIB e o Ministro dos Transportes, a origem legal do órgão é, desde logo, duvidosa. Por outro lado, o órgão não tem necessariamente de pertencer à organização judiciária do Estado-Membro ( 63 ). Se o árbitro agir no âmbito do Arbitration Act ( 64 ), isto poderia, contudo, ser um argumento a favor da origem legal do órgão.

91.

Com efeito, o árbitro num processo arbitral que resulta de um acordo entre o MIB e o Ministro dos Transportes é designado ad hoc. Ver nisto um «órgão permanente» é, portanto, problemático, a menos que se considere a manutenção de listas de árbitros potenciais dos advogados da Coroa uma instituição permanente, resultando o recurso às listas ou a submissão ao órgão apenas de necessidades práticas.

92.

Em contrapartida outro critério do carácter obrigatório da sua jurisdição deve ser considerado verificado — se admitirmos que se trata de um órgão jurisdicional enquanto tal — porque — de acordo com o que resulta da totalidade dos elementos constantes do presente litígio — não existe um outro meio de recurso judicial contra uma decisão do MIB ( 65 ).

93.

A natureza contraditória do processo arbitral parece, outra vez, muito duvidosa. É verdade que as duas partes, o MIB e a vítima, podem apresentar o seu ponto de vista tendo conhecimento da tese das outras partes. No decorrer do processo no Tribunal de Justiça, apurou-se que um comportamento de má fé na altura da interposição do recurso foi imputado ao demandante sem que este tenha tido a possibilidade de responder a esta acusação. Trata-se de uma lacuna do processo, que é, a vários títulos, problemática.

94.

Em aplicação das regra processuais de um processo de direito civil, ao qual se aplica o princípio da produção da prova pelas partes, o órgão jurisdicional não deve basear a sua decisão em nenhum elemento que não tenha sido carreado para o processo pelas partes e em relação ao qual a contra parte não tenha podido pronunciar-se. Mas mesmo que se queira atribuir ao processo arbitral, enquanto continuação do processo administrativo no MIB — sob reserva — um carácter de direito público, o direito de defesa ( 66 ) do demandante seria violado. Mesmo num processo ao qual se aplique o princípio do inquisitório ( 67 ), o direito de defesa deve ser salvaguardado, devendo uma parte ter a possibilidade de tomar posição sobre os factos que lhe são imputados.

95.

No que respeita, por último, ao quinto critério «aplicação de regras de direito», há que o considerar preenchido quando o órgão decide aplicando o direito e não em equidade. Para decidir definitivamente se este quinto critério está preenchido, é necessário aprofundar a questão. A decisão, na sentença arbitral, de imputar as despesas ao demandante, com fundamento na sua má fé — v., a este respeito a cláusula 22 do acordo, referido no n.° 6 — sem que o demandante tenha podido tomar posição a este respeito, leva a pensar que considerações de equidade podem estar na base da decisão.

96.

Como solução intermédia, há, portanto, que concluir que o órgão arbitral não preenche completamente os critérios relativamente estritos do artigo 177.° do Tratado CE (actual artigo 234.° CE), para constituir um órgão jurisdicional.

97.

No que respeita, agora, aos critérios de imparcialidade e de independência que decorrem do artigo 6.° da CEDH em conjugação com o artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais, segundo as declarações das partes no presente processo, há que partir do princípio de que os advogados da Coroa constantes das listas referidas oferecem toda a garantia de independência. Coloca-se, contudo, a questão de saber se, tendo em conta a sua posição no processo e a sua proximidade do MIB, oferecem a mesma garantia de imparcialidade. O árbitro pode exigir do MIB qualquer exame complementar que considere desejável. Existe, assim, uma margem de negociação entre este e o MIB. Depois de o árbitro proferir a decisão, esta é primeiro notificada ao MIB, que é, a seguir, responsável pela sua comunicação à vítima.

98.

Por outro lado, perante o árbitro não há discussão pública na acepção do artigo 6.° da CEDH, em conjugação com o artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais, uma vez que decide com base em documentos que lhe são submetidos (v. cláusula 17, referida no n.° 6). A colaboração prevista entre o árbitro e o MIB não pode ser considerada uma discussão pública. A vítima não está associada a estas discussões, como é exigido num processo contraditório. O princípio da oralidade no processo judicial é, nesta medida, próximo do da publicidade da audiência. Finalmente, a forma de notificação da decisão não pode considerar-se uma publicação na acepção do artigo 6° da CEDH. A natureza pública do processo não parece, portanto, assegurada de forma satisfatória.

99.

O processo arbitral previsto pelo acordo suscita, assim, várias interrogações.

100.

Nos termos do artigo 177.° (actual artigo 234.° CE), o Tribunal de Justiça teve de pronunciar-se, no acórdão Nordsee ( 68 ), sobre a natureza judicial de um órgão arbitral privado. O Tribunal de Justiça declarou que a solução depende das particularidades do processo arbitral no caso em apreço. Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça não reconheceu a qualidade de órgão jurisdicional à instância arbitral em causa, com o fundamento de que, por um lado, no momento da celebração do contrato, as partes contratantes eram livres de deixar a solução dos seus litígios aos órgãos jurisdicionais comuns ( 69 ) e, por outro, que as autoridades públicas não intervinham na escolha da via da arbitragem, e não eram, além disso, chamadas a intervir oficiosamente no decorrer do processo perante o árbitro ( 70 ).

101.

Se se apreciar o processo arbitral no presente caso à luz das considerações expostas, conclui-se que as autoridades públicas, através do Ministro do Transportes, intervinham decisivamente na escolha da via arbitral. Por outro lado, a vítima potencial é obrigada a procurar tutela no âmbito de um acordo no qual não participou e que foi celebrado entre partes que são completamente distintas dela e sobre as quais não tem qualquer influência.

102.

Face a todas as reservas já apresentadas quanto à criação e à forma de proceder da instância arbitral, é, portanto, decisivo saber como é organizada a tutela da vítima.

103.

Como deixa transparecer a terceira questão, ponto v), do despacho de reenvio, e como confirmam as afirmações concordantes a este respeito apresentadas pelas partes, a vítima pode recorrer da sentença arbitral para os órgãos jurisdicionais comuns. Não se trata, contudo, de um meio de recurso ilimitado, uma vez que o acesso aos tribunais e o âmbito do controlo jurisdicional estão sujeitos a várias condições restritivas.

104.

Segundo o que expôs o órgão jurisdicional de reenvio, as modalidades do recurso são as seguintes: A sentença arbitral pode ser impugnada por irregularidades graves que a afectem, ou por fundamentos de direito, incluindo-se nestes últimos o facto de saber se uma determinada conclusão é apoiada por provas ou se o árbitro, de maneira razoável, deveria ter tirado tal conclusão das provas apresentadas. Um recurso sobre as questão de direito deve ser autorizado pelo tribunal, autorização que apenas é dada se a sentença arbitral for manifestamente errónea e se, considerando as circunstâncias, uma decisão judicial no caso concreto parecer justa e equitativa.

105.

Estas condições restritivas para o acesso aos tribunais têm características de um mero controlo de direito ou da plausibilidade. O controlo de direito e a autorização de recorrer são, muitas vezes, reservados aos órgãos jurisdicionais superiores no processo de recurso jurisdicional. O controlo da interposição de um recurso destinado a saber se a sentença arbitral é manifestamente errónea e se uma decisão judicial é justa e equitativa face às circunstâncias tem um efeito mais restritivo. O acesso aos tribunais comuns para as vítimas de um veículo não identificado torna-se claramente mais difícil. Face às exigências de uma tutela jurisdicional efectiva, é extremamente problemático.

106.

Se tivermos em conta que durante esta fase do processo se trata de um processo em primeira instância num órgão jurisdicional comum, as exigências de uma tutela jurisdicional efectiva não estão preenchidas. A vítima deve ter a possibilidade de, pelo menos numa instância, obter uma tutela jurisdicional plena em relação às questões de facto e de direito.

107.

A comparação deste meio de recurso com a tutela atribuída às vítimas de condutores segurados ou não de veículos identificados — que dispõem de meios de recurso comuns — demonstra que a tutela atribuída às vítimas de condutores não identificados é muito inferior à tutela atribuída aos primeiros. As possibilidades de tutela das duas categorias de pessoas em direito comunitário não têm de ser necessariamente idênticas, mas a tutela deve ser qualitativamente equivalente. Aplicado ao caso em apreço, este princípio significa que o recurso aos órgãos jurisdicionais comuns deve estar garantido.

108.

Tendo em conta que se trata de um litígio de direito civil relativo a uma obrigação de indemnização, na qual a vítima se opõe à companhia de seguros, entendemos que é indispensável a apreciação dos factos por uma instância. O acórdão Upjohn ( 71 ) não é contrário a esta conclusão. Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que uma fiscalização de plena jurisdição não era indispensável. Mas o caso era muito diferente. As autoridades competentes para conceder ou retirar uma licença de colocação de medicamentos no mercado deviam proceder a apreciações complexas que são do domínio médico-farmacológico ( 72 ). Com efeito, existia um certo poder de apreciação, uma vez que a pessoa em questão continuava a ter a possibilidade de provocar uma nova apreciação da decisão administrativa, apresentando um novo pedido ( 73 ).

109.

O Governo do Reino Unido e o MIB sublinharam, para justificar as disposições existentes, que estas permitiam, regra geral, solucionar os casos mais céleremente e com menos custo.

110.

O facto danoso que está na origem do presente litígio ocorreu em 25 de Dezembro de 1991. Quase cinco anos depois, em 27 de Agosto de 1996, o árbitro pronunciou a sentença arbitral. Até esta data, não era ainda possível o recurso a um órgão jurisdicional comum.

111.

Mesmo que o processo previsto pelo acordo fosse mais célere e menos custoso do que os processos de responsabilidade civil nos órgãos jurisdicionais comuns, isto não justifica que se prive a vítima de uma tutela jurisdicional efectiva sob a forma de uma instância de plena jurisdição num órgão jurisdicional comum.

112.

Por último, compete ao órgão jurisdicional de reenvio avaliar as lacunas na tutela jurídica e daí tirar as consequências jurídicas. A este respeito, o órgão em questão deve ter em conta o facto de a inexistência de fiscalização jurisdicional, incluindo as questões de direito e de facto, relativamente às constatações do árbitro referentes a um direito resultante da Segunda Directiva, não preencher as exigências de direito comunitário em matéria de tutela jurisdicional efectiva.

3. A transposição correcta da directiva — quarta questão

Tese das partes

113.

O demandante defende que a Segunda Directiva não foi devidamente transposta, uma vez que o Estado-Membro não impôs ao órgão autorizado a obrigação de indemnizar a vítima de um condutor não identificado da mesma forma que o faria um seguro obrigatório na acepção da Primeira Directiva. No Reino Unido, a Segunda Directiva não foi transposta com carácter imperativo que preencha as exigências de segurança jurídica. Para além de a indemnização prevista no acordo não corresponder em todos os pontos à indemnização prevista na Segunda Directiva, as vítimas têm de se basear num acordo no qual não foram partes e de se conformar com a prática do MIB de não invocar nos tribunais o facto de a vítima não dispor de qualquer direito resultante do acordo.

114.

O Governo do Reino Unido e o MIB entendem que não há que tomar posição sobre a quarta questão. Recordam, contudo, que, no momento da transposição de uma directiva, a escolha da forma e dos meios é da competência do Estado-Membro. Se o direito nacional já preenche as exigências da directiva, não é necessária qualquer alteração. Este foi o caso da transposição da Segunda Directiva no Reino Unido: o acordo preenche as exigências de precisão, de clareza e de transparência, pelo que está em conformidade com o princípio da segurança jurídica.

115.

Segundo o que expôs a Comissão nas suas observações escritas, o MIB é um organismo autorizado na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva, uma vez que foi encarregado pelas autoridades do Estado-Membro em causa de realizar as missões definidas pela Segunda Directiva e que não só pode como é obrigado a indemnizar as vítimas. As vítimas podem igualmente dirigir-se directamente a este organismo, que lhes deve dar uma resposta fundamentada. Por outro lado, está previsto um processo legal quando a vítima não fica satisfeita com a indemnização proposta.

116.

Na audiência, o representante da Comissão expressou, contudo, dúvidas que se baseiam na jurisprudência do processo White/White ( 74 ), referida pelas partes, bem como no acórdão da Court of Appeal ( 75 ) que negou provimento aos recursos do demandante. Na medida em que o direito nacional considera o MIB um organismo exclusivamente privado e o acordo entre este e o Ministro dos Transportes de natureza privada, com a consequência de que este não tem qualquer obrigação de aplicar os critérios da Segunda Directiva, este organismo não está devidamente autorizado na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva.

Apreciação

117.

Com a quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o Reino Unido cumpriu a obrigação que lhe impõe o artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva, de autorizar um organismo que tenha por missão reparar os danos causados por um veículo não identificado ou não seguro. O órgão jurisdicional de reenvio questiona-se, a este respeito, se é este o caso quando um organismo que já existe deve reparar estes danos com base num acordo celebrado com a autoridade competente, mas no qual as vítimas não têm qualquer direito directo contra este organismo. Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se, para responder a esta questão, é determinante que o Estado-Membro tenha entendido de boa fé que o acordo protege as vítimas pelo menos tão bem como a Segunda Directiva.

118.

A criação do MIB remonta a 1946 e os acordos sobre a indemnização das vítimas de condutores não segurados ou não identificados datam, na sua primeira versão, desta época. O Reino Unido tinha, portanto, previsto, muito antes da adopção da Segunda Directiva, uma indemnização das vítimas de acidentes de viação cujos autores não estavam segurados ou não estavam identificados.

119.

Como resulta dos autos, depois da adopção da Segunda Directiva em 30 de Dezembro de 1983, o Governo do Reino Unido iniciou um procedimento de consulta sobre a questão de saber se a transposição da directiva necessitava de modalidades de execução autónomas. Estas reflexões levaram à conclusão de que a protecção existente da vítima preenchia plenamente as condições e que, portanto, não era necessário tomar outras medidas de transposição. Esta apreciação foi manifestamente partilhada pela Comissão, uma vez que não formulou qualquer acusação relativamente à transposição da Segunda Directiva. Uma vez que também na prática — como todas as partes no presente processo confirmam — o MIB tem sempre cumprido as obrigações que lhe impunham os acordos relativamente aos condutores não segurados e aos condutores não identificados, nada levava a duvidar da transposição correcta da Segunda Directiva.

120.

A ideia de que a transposição da directiva não necessitava de outras medidas era também confirmada pelo texto do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva, que prevê expressamente a possibilidade de autorizar um organismo existente. Foi assim que no Reino Unido não houve qualquer acto formal de transposição da Segunda Directiva, ainda que o prazo de transposição fixado no artigo 5.°, n.° 1, da Segunda Directiva tenha terminado em 31 de Dezembro de 1987 e sem que a Comissão tenha criticado esta circunstância em quase quinze anos.

121.

O facto de que, apesar de tudo, deve haver um problema com a transposição da Segunda Directiva resulta não só do presente processo mas também do acórdão, referido várias vezes, da House of Lords, de 1 de Março de 2001, no processo White//White ( 76 ), relativo ao acordo paralelo sobre os condutores não segurados. A House of Lords considerou que não estava em condições de interpretar o acordo, como exigia a jurisprudência Marleasing do Tribunal de Justiça ( 77 ), num sentido que teria contribuído para aplicar o conteúdo da directiva (v., infra, n.° 127). A House of Lords fundamentou esta atitude no facto de o acordo ser um contrato de direito privado, independentemente de uma das partes ser um organismo do Estado. As partes no contrato estão, portanto, apenas vinculadas ao que celebraram. A House of Lords declarou que os princípios do acórdão Marleasing deviam, portanto, ser afastados, ainda que noutra parte do seu acórdão tenha expressamente afirmado que o acordo MIB de 1988 tinha sido celebrado com a intenção de transpor a directiva ( 78 ).

122.

Podem também retirar-se vários ensinamentos do acórdão da Court of Appeal que negou provimento ao recurso do demandante, numa fase do processo anterior ao presente processo. Este órgão jurisdicional declarou que o que o Reino Unido tinha levado a cabo para implementar a directiva não constituía «um órgão ou uma relação» que permitisse aplicar a directiva contra qualquer pessoa (excepto, possivelmente, contra si próprio, na acepção da jurisprudência Francovich e o. ( 79 )).

123.

No presente caso, o demandante sustenta, portanto, que o Reino Unido não transpôs a Segunda Directiva.

124.

As obrigações dos Estados-Membros em matéria de transposição de uma directiva foram definidas por uma jurisprudência constante. Há que recapitular, aqui, as linha principais. O Tribunal de Justiça declarou o que se segue a propósito do artigo 189.°, n.° 3, do Tratado CE (actual artigo 249.° CE):

«Resulta desta disposição que a transposição de uma directiva não exige necessariamente uma actividade legislativa em cada Estado-Membro. Em particular, a existência de princípios gerais de direito constitucional ou administrativo pode tornar supérflua a transposição por medidas legislativas ou regulamentares específicas, desde que estes princípios garantam efectivamente a plena aplicação da directiva pela administração nacional e, no caso de a directiva se destinar a criar direitos a favor dos particulares, a situação jurídica decorrente destes princípios seja suficientemente clara e precisa e que os beneficiários tenham a possibilidade de conhecer todos os seus direitos e de os invocar, eventualmente, perante os tribunais nacionais. Esta última condição é particularmente importante quando a directiva em causa visa conceder direitos aos nacionais doutros Estados-Membros, pois estes nacionais não têm normalmente conhecimento destes princípios. ( 80

125.

Esta jurisprudência foi confirmada em vários acórdãos ( 81 ). Na realidade, noutro contexto, o Tribunal de Justiça foi levado a precisar que: «[...] a fim de garantir a plena aplicação das directivas, de direito, e não apenas de facto, os Estados-Membros devem prever um quadro legal específico no domínio em questão» ( 82 ).

126.

No que respeita às exigências de segurança jurídica, o Tribunal de Justiça declarou: «Assim, as disposições de uma directiva devem ser aplicadas com uma obrigatoriedade incontestável, com a especificidade, a precisão e a clareza necessárias para que seja satisfeita a exigência da segurança jurídica, a fim de que, no caso de a directiva se destinar a criar direitos a favor dos particulares, estes tenham a possibilidade de conhecer todos os seus direitos» ( 83 ). O Tribunal de Justiça reiterou esta opinião em termos equivalentes noutros acórdãos ( 84 ).

127.

No acórdão Marleasing ( 85 ), o Tribunal de Justiça confirmou que a obrigação dos Estados-Membros de alcançar o objectivo previsto por uma directiva se impõem «a todas as autoridades dos Estados-Membros», incluindo, «no âmbito das suas competências, as autoridades jurisdicionais. Concluiu daí que, ao aplicar o direito nacional, quer se trate de disposições anteriores ou posteriores à directiva, o órgão jurisdicional nacional chamado a interpretá-lo é obrigado a fazê-lo, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade da directiva para atingir o resultado por ela prosseguido e cumprir desta forma o artigo 189.°, terceiro parágrafo, do Tratado» ( 86 ).

128.

Como já sublinhámos no exame da terceira questão, o objectivo da directiva é o de atribuir às vítimas de veículos não seguros ou não identificados um direito contra um organismo do Estado-Membro em causa. Na medida em que o artigo 249.° CE deixa às instâncias nacionais a faculdade de escolherem a forma e os meios para alcançar o objectivo obrigatório da directiva, o facto de basear os direitos das vítimas num acordo entre uma autoridade e um organismo de direito privado não é si mesmo contestável. No entanto, os direitos devem poder ser reconhecidos e invocados com a clareza e a segurança necessárias.

129.

Na audiência, o representante do demandante chamou a atenção para as divergências de conteúdo entre a Segunda Directiva e o acordo, as quais não são, contudo, objecto do presente processo. Daremos, no entanto, uma importância fundamental às questões que dizem respeito ao direito das vítimas e à sua aplicação.

130.

Assim, segundo a descrição unânime da relação entre as vítimas e o MIB, as vítimas não têm qualquer direito contra o MIB. É certo que parece que o MIB não recusa a indemnização, apesar da inexistência de relação jurídica contratual com a vítima, porque está obrigado a indemnizar pelo acordo com o Ministro dos Transportes. Contudo, quando a vítima se considera lesada, deve, eventualmente, intentar uma acção contra o ministro para que este obrigue o MIB a respeitar o acordo.

131.

Esta forma de proceder comporta tantos imponderáveis que não respeita as exigências de segurança descritas. Esta conclusão é ainda reforçada pelos problemas de protecção jurisdicional examinados no quadro da terceira questão.

132.

Contudo, a situação torna-se completamente inaceitável face à atitude dos órgãos jurisdicionais nacionais. Teria sido pelo menos necessário que os órgãos jurisdicionais nacionais em todas as situações, tendo em conta o conteúdo dos direitos das vítimas no sentido da jurisprudência Marleasing, fizessem uma interpretação dos direitos decorrentes dos acordos entre o MIB e o Ministro dos Transportes à luz da Segunda Directiva, uma vez que a House of Lords partia da ideia de que o acordo de 1988 referente aos condutores não segurados tinha sido concluído com a intenção de transpor a Segunda Directiva.

133.

Como, devido à estrutura das relações jurídicas, os órgãos jurisdicionais britânicos não consideraram que podiam agir desta forma, fica claro que a Segunda Directiva não foi transposta no Reino Unido com a precisão e a clareza necessárias para o direito nacional. A obrigação de segurança jurídica não está, portanto, satisfeita.

134.

O órgão jurisdicional de reenvio pretende, por último, saber se, para responder à questão, é necessário saber se o Estado-Membro estava de boa fé quanto à transposição correcta da directiva. A apreciação da transposição de uma directiva para o direito nacional é, em princípio, um exame objectivo. A boa ou má fé de um Estado-Membro não tem importância para concluir que a transposição não preenche as exigências do direito comunitário. A questão pode, no entanto, ter importância no âmbito de um eventual direito à reparação.

135.

Há, portanto, que responder à quarta questão que a Segunda Directiva não foi devidamente transposta para o direito nacional, na medida em que a vítima não dispõe de um direito que possa invocar contra o organismo incumbido pelas autoridades nacionais de indemnizar as vítimas de veículos não identificados (ou não seguros).

4. O direito à reparação contra o Estado-Membro — quinta questão

Tese das partes

136.

O demandante alega que estão reunidas as condições exigidas para implicar a responsabilidade do Reino Unido pela não transposição da Segunda Directiva. O resultado previsto na directiva inclui manifestamente a atribuição de um direito a favor dos particulares, as vítimas de condutores não identificados ou não segurados, categoria da qual o requerente faz claramente parte. O conteúdo deste direito pode ser identificado com base nas disposições da directiva. Trata-se de obter uma indemnização de um organismo autorizado. O Tribunal de Justiça não tem que examinar a questão do nexo de causalidade cuja apreciação compete ao órgão jurisdicional nacional. Por último, a violação está suficientemente caracterizada, uma vez que o Reino Unido se absteve de adoptar qualquer medida para transpor a directiva.

137.

Para o Governo do Reino Unido, as violações alegadas em relação aos juros e às despesas suscitam uma série de interrogações. Mesmo que se recusasse a interpretação defendida pelo Governo britânico, a violação do direito comunitário não seria suficientemente caracterizada para implicar a responsabilidade do Reino Unido. Do mesmo modo, o Reino Unido podia razoavelmente considerar que o procedimento criado satisfazia a exigência de uma fiscalização jurisdicional efectiva. Por último, admitindo que o organismo não foi autorizado de uma forma conforme com a directiva, o demandante não sofreu, por esta razão, de forma alguma, qualquer prejuízo.

138.

O MIB entende que compete ao réu no processo principal responder à quinta questão.

139.

A Comissão entende que compete ao órgão jurisdicional nacional definir se existe no caso em apreço uma violação suficientemente caracterizada do direito comunitário. A este respeito, sublinha, contudo, que os conceitos de juros e de despesas não são mencionados como tais na Segunda Directiva e que não existe qualquer jurisprudência sobre estes aspectos. A Comissão acrescenta que anteriormente nunca os referiu a propósito da transposição da Segunda Directiva. A questão relativa à compatibilidade do processo arbitral com as exigências de uma tutela jurisdicional efectiva exigia precisões suplementares.

Apreciação

140.

Com a quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o incumprimento da Segunda Directiva constitui uma violação suficientemente caracterizada para implicar a responsabilidade pecuniária do Estado-Membro em causa.

141.

Como resulta das explicações que precedem, a transposição da Segunda Directiva ou a aplicação prática das medidas que se considera assegurarem a sua transposição suscitam dúvidas a vários níveis. Em primeiro lugar, o montante da indemnização corresponde à compensação a pagar geralmente no âmbito do seguro obrigatório, de forma que não é provavelmente adequado excluir o pagamento de juros e de despesas no momento do cálculo da indemnização com base no acordo. Além disso, as vias de recurso à disposição da vítima não preenchem, de qualquer forma, as exigências da tutela jurisdicional efectiva. Por último, existem lacunas na autorização do organismo nos termos do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva com a forma do MIB, na medida em que as vítimas não têm um direito directo contra este organismo que lhes permita também intentar uma acção judicial.

142.

Não se pode, portanto, partir da ideia de que estas lacunas constituem uma violação do direito comunitário em matéria de transposição de uma directiva. Pode, no entanto, questionar-se se esta violação pode implicar a responsabilidade do Estado-Membro em causa.

143.

A jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de responsabilidade de um Estado-Membro em direito comunitário remonta ao acórdão Francovich ( 87 ) (este acórdão tinha na origem a não transposição para o direito nacional, no prazo fixado, da directiva relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes à protecção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador ( 88 )). Quanto ao princípio da responsabilidade do Estado, o Tribunal de Justiça declarou essencialmente:

«Deve concluir-se que a plena eficácia das normas comunitárias seria posta em causa e a protecção dos direitos que as mesmas reconhecem estaria enfraquecida se os particulares não tivessem a possibilidade de obter reparação quando os seus direitos são lesados por uma violação do direito comunitário imputável ao Estado-Membro.

A possibilidade de reparação pelo Estado-Membro é particularmente indispensável quando, como no caso dos autos, o pleno efeito das normas comunitárias está subordinado à condição de uma acção por parte do Estado e, por conseguinte, os particulares não podem, na falta de tal acção, invocar perante os órgãos jurisdicionais nacionais os direitos que lhe são reconhecidos pelo direito comunitário» ( 89 ).

144.

As condições em que a responsabilidade confere um direito à reparação dependem «da natureza da violação do direito comunitário que está na origem do prejuízo causado» ( 90 ).

145.

Em caso de violação do artigo 189.°, terceiro parágrafo (actual artigo 249.°, terceiro parágrafo, CE), pressuposto em que o Tribunal de Justiça se baseou no processo Francovich, para instituir o direito à reparação devem estar preenchidas três condições:

«A primeira dessas condições é que o resultado prescrito pela directiva implique a atribuição de direitos a favor dos particulares. A segunda condição é que o conteúdo desses direitos possa ser identificado com base nas disposições da directiva. Finalmente, a terceira condição é a existência de um nexo de causalidade entre a violação da obrigação que incumbe ao Estado e o prejuízo sofrido pelas pessoas lesadas» ( 91 ).

146.

Posteriormente, o Tribunal de Justiça precisou várias vezes esta jurisprudência ( 92 ). No acórdão Brasserie du Pêcheur ( 93 ), tratava-se, antes de mais, de saber se a responsabilidade do Estado podia também ser provocada pela violação do direito primário pelo legislador nacional ( 94 ). O Tribunal de Justiça respondeu afirmativamente a esta questão ( 95 ). Neste acórdão, o Tribunal de Justiça declarou pela primeira vez que a violação devia ser suficientemente caracterizada.

147.

Quanto ao critério da «violação suficientemente caracterizada» o Tribunal de Justiça explicou que se trata «da violação manifesta e grave, [...] por um Estado-Membro [...], dos limites que se impõem ao seu poder de apreciação» ( 96 ).

«A este respeito, entre os elementos que o órgão jurisdicional competente pode ser levado a considerar, importa sublinhar o grau de clareza e de precisão da regra violada, o âmbito da margem de apreciação que a regra violada deixa às autoridades nacionais ou comunitárias, o caracter intencional ou involuntário do incumprimento verificado ou do prejuízo causado, o carácter desculpável ou não de um eventual erro de direito, o facto de as atitudes adoptadas por uma instituição comunitária terem podido contribuir para a omissão, a adopção ou a manutenção de medidas ou práticas nacionais contrárias ao direito comunitário» ( 97 ).

148.

À questão da culpa como critério de responsabilidade, o Tribunal de Justiça respondeu no sentido de que esta por si só não é necessária, «[a]lguns elementos objectivos e subjectivos que, no quadro de um sistema jurídico nacional, podem ser associados ao conceito de culpa, são assim relevantes para se determinar se uma violação do direito comunitário é ou não caracterizada» ( 98 ).

149.

O Tribunal de Justiça aplicou as condições comparativamente mais estritas do acórdão Brasserie du Pêcheur no acórdão British Telecommunications ( 99 ) igualmente num processo em que a transposição insuficiente de uma directiva constituía o facto ilícito.

150.

No acórdão Hedley Lomas ( 100 ), o Tribunal de Justiça chamou, contudo, a atenção para o facto de que a simples violação do direito comunitário podia satisfazer o critério de uma violação suficientemente caracterizada na hipótese de o Estado-Membro em causa «no momento em que cometeu a infracção, não estar confrontado com opções normativas e dispor de uma margem de apreciação consideravelmente reduzida, ou mesmo inexistente» ( 101 ).

151.

No acórdão no processo Dillenkofer e o. ( 102 ), que, como no processo Francovich, tinha na origem a não transposição de uma directiva no prazo fixado, de forma que o demandante considera estes acórdãos pertinentes no caso em apreço, o Tribunal de Justiça precisou que «a condição da existência de uma violação suficientemente caracterizada, embora, é certo, não seja mencionada no acórdão Francovich e o. [...] era, contudo, inerente às circunstâncias do caso» ( 103 ).

152.

Assim, tem de se considerar adquirido que todo o direito à reparação eventualmente instituído contra um Estado-Membro supõe uma violação suficientemente caracterizada.

153.

O Tribunal de Justiça, apoiando-se nos desenvolvimentos relativos a uma margem de apreciação consideravelmente reduzida ou mesmo inexistente no acórdão Hedley Lomas, declarou no acórdão Dillenkofer e o.: «Assim, um Estado-Membro que, como no processo Francovich e o., não adopte, em violação do artigo 189.°, terceiro parágrafo, do Tratado, qualquer das medidas necessárias para atingir o resultado prescrito numa directiva, no prazo nela estabelecido, viola, de forma manifesta e grave, os limites impostos ao exercício das suas competências» ( 104 ).

154.

Para responder à quinta questão, é necessário, portanto, saber se as violações demonstradas ao direito comunitário constituem, individualmente consideradas ou na sua globalidade, uma violação suficientemente caracterizada. Ao apoiar-se nos acórdãos Francovich e Dillenkofer, poderia partihar-se a opinião do demandante segundo a qual a inacção do Reino Unido constitui uma violação manifesta e grave dos limites que se impõem ao exercício das suas competências ( 105 ). Contudo, tendo em conta que o Estado-Membro em causa podia, em qualquer caso, invocar uma infra-estrutura existente, em parte expressamente em conformidade com a directiva, esta maneira de pensar parece um bocado curta. Coloca-se, portanto, a questão de saber em que medida era necessária uma intervenção do legislador nacional para alcançar o objectivo previsto na directiva ( 106 ).

155.

A criação de um organismo na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva já não era manifestamente necessária. No entanto, a directiva não atribui à vítima um direito à reparação contra este organismo, como atrás expusemos ( 107 ). Para criar e aplicar um direito, não basta que a vítima potencial possa dirigir-se de qualquer maneira a um organismo. A directiva é clara e precisa neste aspecto. Como os acordos MIB com o Ministro dos Transportes não atribuem à vítima um direito desta natureza, o legislador deveria ter intervindo. A sua intervenção era necessária para criar em benefício da vítima um direito que pudesse ser invocado em justiça, pelo menos dentro limites da obrigação de seguro. Que para isto seja necessário um acto legislativo ou uma adaptação do conteúdo do acordo é uma decisão que depende, em última análise, do poder de apreciação do Estado-Membro. A directiva deixa, a este respeito, uma certa margem de manobra ao Estado-Membro. Contudo, o Estado-Membro deveria ter previsto de forma imperativa a obrigação de resultado decorrente da directiva no que respeita aos direitos da vítima, quer quanto à substância quer quanto ao processo.

156.

Com já existia uma estrutura a funcionar, o problema não se colocou logo, e foi também a razão pela qual a Comissão não agiu contra o incumprimento do Reino Unido no que diz respeito à directiva. Estas circunstâncias não retiram, contudo, ao incumprimento o seu caracter de violação pelo Estado-Membro das suas obrigações de tomar as medidas necessárias decorrentes do artigo 249.°, terceiro parágrafo, CE.

157.

Compete ao juiz nacional apreciar se a demandante sofreu um prejuízo — e neste caso, em que medida — e se a violação pelo Estado-Membro das suas obrigações foi a causa deste prejuízo. Não tendo atribuído às vítimas de veículos não identificados um direito que possa ser invocado em juízo, pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro, contra o organismo a que se refere o artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva, o Reino Unido cometeu uma violação suficientemente caracterizada do direito comunitário na acepção da jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria do direito à reparação contra os Estados-Membros.

V — Conclusão

158.

Com base nas considerações que precedem, propomos a seguinte resposta às questões prejudiciais:

«1.

Os juros e despesas constituem uma componente indispensável de um direito à reparação para as vítimas de veículos não identificados se e na medida em que estes elementos fizerem parte do direito à reparação da vítimas de veículos devidamente seguros e identificados. Isto é válido quer quanto à substância do direito quer no que respeita às modalidades da liquidação.

2.

Nas circunstâncias descritas na terceira questão, por razões de tutela jurisdicional efectiva, a vítima deve ter o direito de recurso a uma órgão jurisdicional comum, que abranja as questões de facto e de direito.

3.

No que respeita aos direitos das vítimas, a Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis, não foi transposta para o direito nacional com a precisão e a clareza exigidas para satisfazer o princípio da segurança jurídica.

4.

Não tendo atribuído às vítimas de veículos não identificados um direito que possa ser invocado em juízo, pelo menos dentro dos limites da obrigação de seguro, contra o organismo a que se refere o artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva, o Reino Unido cometeu uma violação suficientemente caracterizada do direito comunitário.»


( 1 ) Língua original: alemão.

( 2 ) JO L 103, p. 1; EE 13 F2 p. 113.

( 3 ) JO 1984, L 8, p. 17; EE 13 F15 p. 244.

( 4 ) O n.° 2 fixa os montantes mínimos da cobertura.

( 5 ) A seguir «Ministro dos Transportes».

( 6 ) A seguir «acordo relativo aos condutores sem seguro».

( 7 ) Acórdão de 2 de Agosto de 1993 (C-271/91, Colect., p. I-4367, n.° 31).

( 8 ) V. TEDH, acórdão Aerey e Irlanda de 9 de Outubro de 1979, série A, n.° 32, § 24.

( 9 ) Acórdão de 22 de Abril de 1997 (C-66/95, Colect., p. I-2163).

( 10 ) Acórdãos de 4 de Outubro de 1979, Ireks-Aready/Consc-Iho e Comissão (238/78, Recueil, p. 2955, n.° 20), e de 3 de Fevereiro de 1994, Grifoni/CEEA (C-308/87, Colect., p. I-341, n.° 40).

( 11 ) Acórdão Marshall, já referido na nota 7, n.° 31.

( 12 ) Na sequência destas conclusões, trata-se quer de veículo não identificado quer de condutor não identificado. A terminologia diferente assenta no facto de que as directivas se referem ao veículo, ao passo que os acordos entre o MIB e o Ministro dos Transportes se referem ao condutor.

( 13 ) O sublinhado é meu.

( 14 ) V. acórdão de 14 de Setembro de 2000, Mendes Ferreira e o. (C-348/98, Colect., p. I-6711, n.° 32); v. também despacho de 14 de Outubro de 2002, Withers (C-158/01, Colect., p. I-8301, n.° 18).

( 15 ) V. terceiro considerando e artigo 1.°, n.° 1, da Segunda Directiva.

( 16 ) V. quarto considerando e artigo 1.°, n.° 1, da Segunda Directiva.

( 17 ) V. quinto considerando e artigo 1.°, n.° 2, da Segunda Directiva.

( 18 ) Terceira Directiva 90/232/CEE do Conselho, de 14 de Maio de 1990, relativa å aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil relativo à circulação de veículos automóveis (JO L 129, p. 33).

( 19 ) V. artigo 1.° da Directiva 90/232.

( 20 ) V. acórdão já referido na nota 7.

( 21 ) Ibidem, n.° 30

( 22 ) Ibidem, n.° 6.

( 23 ) Ibidem, n.° 31.

( 24 ) Acórdão já referido na nota 10.

( 25 ) Ibidem, n.° 20 c n.° 2 do dispositivo.

( 26 ) Acórdão já referido na nota 10.

( 27 ) Acórdão Grifoni/CEEA, já referido na nota 10, n.° 40.

( 28 ) Acórdão já referido na nota 9.

( 29 ) O sublinhado é meu.

( 30 ) Acórdão Sutton, já referido na nota 9, n.° 27.

( 31 ) Ibidem, n.° 33 c dispositivo.

( 32 ) V. supra, n.os 40 a 42.

( 33 ) V. quinto considerando da Primeira Directiva.

( 34 ) V. artigo 1,°, n.° 4, da Segunda Directiva.

( 35 ) V. sexto considerando da Segunda Directiva.

( 36 ) V. artigo 1.°, n.° 4, da Segunda Directiva (o sublinhado é meu).

( 37 ) V.. por exemplo, acórdãos de 15 de Setembro de 1998, Edis (C-231/96, Cole., p. I-4951, n.° 34); de 17 de Novembro de 1998, Aprile (C-228/96, Colect., p. 7141, n.° 18); c de 21 de Janeiro de 1999, Upjohn (C-120/97, Coiect., p. I-223, n.° 32).

( 38 ) V., por exemplo, acórdãos de 16 de Dezembro de 1976, Rewe (33/76, Colect., p. 813, n.° 5), e Comet (45/76, Colect., p. 835, n.°s 12 a 16).

( 39 ) V., acórdão de 14 de Dezembro de 1995, Peterbroeck (C-312/93, Colect., p. I-4599, n.° 12, e os outros acórdãos referidos).

( 40 ) V. acórdão Marshall, já referido na nota 7, n.° 31.

( 41 ) V. n.°s 41 e 42.

( 42 ) Já referido na nota 10.

( 43 ) Já referido na nota 10.

( 44 ) Acórdão de 15 de Maio de 1986 (222/84, Colect., p. 1651, n.°s 18 e 19).

( 45 ) Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada cm Roma a 14 de Novembro de 1950 (a seguir «CEDH»).

( 46 ) V. TEDH, acórdão Scarth c Reino Unido de 22 de Julho de 1999.

( 47 ) V. TEDH, acórdão Bryan e Reino Unido de 22 de Novembro de 1995, série A, n.° 335.

( 48 ) V. artigo 1.°, n.° 4, da segundo período.

( 49 ) Acórdão já referido na nota 44.

( 50 ) Acórdão de 22 de Setembro de 1998 (C-185/97, Colect., p. I-5199).

( 51 ) Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (JO L 39, p. 40; EE 05 F4 p. 35, a seguir «directiva relativa à igualdade de tratamento»).

( 52 ) V. acórdãos Johnston, já referido na nota 44, n.° 18, e Coote, já referido na nota 50, n.° 21.

( 53 ) V. acórdãos Johnston, já referido na nota 44, n.° 19, e Coote, já referido na nota 50, n.° 22).

( 54 ) Acórdão de 15 de Outubro de 1987 (222/86, Colect., p. 4097, n.° 14).

( 55 ) V. JO 2000, C 364, p. 1.

( 56 ) V. acórdão Peterbroeck, já referido na nota 39, n.° 12.

( 57 ) A cláusula 1 dispõe que «[...] this Agreement applies to any case in which an application is made to M.I.B. for a payment in respect of the death of or bodily injury to any person caused by or arising out of the use of a motor vehicle on a road in Great Britain [...]». V. também, supra, n.°6.

( 58 ) Segundo a cláusula 7: «M.I.B. shall cause any application made to them for a payment under this Agreement to be investigated [...].» V. também, supra, n.° 6.

( 59 ) Nos termos da cláusula 9: «M.I.B. shall notify their decision to the applicant [...].» V. também, supra, n.° 6.

( 60 ) V., supra, n.°s 36 e segs.

( 61 ) V., supra, n.° 39.

( 62 ) Acórdão de 6 de Outubro de 1981, Broekmeulen (246/80, Recueil, p. 2311).

( 63 ) V., por exemplo, o carácter judicial do conselho dos advogados, acórdão de 18 de Junho de 1980, Borker (138/80, Recueil, p. 1975).

( 64 ) Lei sobre a arbitragem; v., a este respeito, as indicações fornecidas pelo despacho de reenvio, n.°s 111 e 114.

( 65 ) V. acórdão de 17 de Setembro de 1997, Dorsch Consult (C-54/96, Colect., p. I-4961, n.os 28 e 29).

( 66 ) Sobre a protecção do direito de defesa corno critério a tomar em conta, v. acórdão de 14 de Dezembro de 1995, Van Schijndel e Van Veen (C-430/93 e C-431/93, Colect., p. I-4705, n.° 19).

( 67 ) Geralmente nos litígios de direito público e nos processos penais.

( 68 ) Acórdão de 23 de Marco de 1982 (102/81, Recueil, p. 1095).

( 69 ) Ibidem, n.° 11.

( 70 ) Ibidem, n.° 12.

( 71 ) Já referido na nota 37.

( 72 ) Ibidem, n.° 33.

( 73 ) Ibidem, n.° 40.

( 74 ) Acórdão da House of Lords de 1 de Março de 2001 [2001] UKHL 9.

( 75 ) V., supra, n.° 12.

( 76 ) Já referido na nota 74.

( 77 ) V. acórdão de 13 de Novembro de 1990 (C-106/89, Colect., p. I-4135).

( 78 ) «The MIB-Agreement was entered into with the specific intention of giving effect to the Directive.»

( 79 ) Acórdão de 19 de Novembro de 1991 (C-6/90 e C-9/90, Colect., p. I-5357).

( 80 ) V. acórdão de 23 de Maio de 1985, Comissão/Alemanha (29/84, Recueil, p. 1661, n.° 23). Neste sentido, v. também acórdão de 20 de Março de 1997, Comissão/Alemanha, C-96/95, Colect., p. I-1653, n.° 35).

( 81 ) Acórdão de 8 de Julho de 1987, Comissão/Bélgica (247/85, Colect., p. 3029, n.° 9); no mesmo sentido, v. também acórdãos de 20 de Maio de 1992, Comissão/Países Baixos (C-190/90, Colect., p. I-3265, n.° 17); e de 9 de Setembro de 1999, Comissão/Alemanha (C-217/97, Colect., p. I-5087, n.°s 31 c 32).

( 82 ) Acórdão de 15 de Março de 1990, Comissão/Países-Baixos (C-339/87, Colect., p. I-851, n.° 25), o sublinhado é meu.

( 83 ) Acórdão de 13 de Março de 1997, Comissão/França (C-197/96, Colect., p. I-1489, n.° 15).

( 84 ) Acórdão de 8 de Julho de 1999, Comissão/França (C-354/98, Colect., p. I-4927, n.° 11).

( 85 ) Já referido na nota 77.

( 86 ) Acórdão Marleasing, já referido na nota 77, n.° 8.

( 87 ) Acórdão já referido na nota 79, n.° 41.

( 88 ) Directiva 80/987/CEE do Conselho, de 20 de Outubro de 1980 (JO L 283, p. 23; EE 05 F4 p. 35).

( 89 ) Acórdão Francovich, já referido na nota 79, n.os 33 e 34.

( 90 ) Ibidem, n.° 38.

( 91 ) Ibidem, n.° 40.

( 92 ) V. acórdãos de 5 de Março de 1996, Brasserie du Pêcheur c Factortame (C-46/93 e C-48/93, Colect., p. I-1029); de 26 de Março de 1996, British Telecommunications (C-392/93, Colect., p. I-1631); de 23 de Maio de 1996, Hedley Lomas (C-5/94, Colect., p. I-2553); de 8 de Outubro de 1996, Dillenkofer e o. (C-178/94, C-179/94, C-188/94, C-189/94 e C-190/94, Colect., p. I-4845); de 24 de Setembro de 1998, Brinkmann (C-319/96, Colect., p. I-5255); de 1 de Junho de 1999, Konle (C-302/97, Colect., p. I-3099); de 4 de Julho de 2000, Haim (C-424/97, Colect., p. I-5123); e de 18 de Janeiro de 2001, Stockholm Lindöpark (C-150/99, Colect., p. I-493).

( 93 ) Já referido na nota 92.

( 94 ) Tratava-se da violação dos artigos 30.° e 52.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 28.° CE e 43.° CE). V. acórdão Brasserie du Pêcheur, já referido na nota 92, n.°s 23 e 36.

( 95 ) V. acórdão Brasserie du Pêcheur, já referido na nota 92, n.°s 40 c segs.

( 96 ) Ibidem, n.° 55.

( 97 ) Ibidem, n.° 56.

( 98 ) Ibidem, n.° 78.

( 99 ) Acórdão já referido na nota 92, n.° 40.

( 100 ) Já referido na nota 92.

( 101 ) V. acórdão Hedley Lomas, já referido na nota 92, n.° 28; no mesmo sentido, posteriormente, acórdão Stockholm Lindöpark, já referido na nota 92, n.° 40.

( 102 ) Já referido na nota 92.

( 103 ) Ibidem, n.° 23.

( 104 ) Ibidem, n.° 26, o sublinhado é meu.

( 105 ) Ibidem, n.° 26.

( 106 ) Ibidem, n.°s 26 e 47.

( 107 ) V. n.°s 74 e segs.