62000J0242

Acórdão do Tribunal de 18 de Junho de 2002. - República Federal da Alemanha contra Comissão das Comunidades Europeias. - Auxílios de Estado - Projectos de auxílios - Decisão da Comissão que declara a compatibilidade de um auxílio com o mercado comum - Acto não lesivo - Auxílios com finalidade regional - Definição das regiões assistidas. - Processo C-242/00.

Colectânea da Jurisprudência 2002 página I-05603


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


Auxílios concedidos pelos Estados Exame pela Comissão Poder de adoptar orientações Medidas propostas aos Estados-Membros no âmbito do exame permanente dos regimes de auxílios abrangidos pelas orientações Aceitação pelos Estados-Membros Efeito vinculativo Decisões sobre o limite máximo dos auxílios que fazem parte integrante das orientações relativas aos auxílios regionais

(Artigos 87.° CE e 88.° CE)

Sumário


$$A Comissão pode, no exercício das competências de que dispõe por força dos artigos 87.° CE e 88.° CE, adoptar orientações que tenham por objecto indicar a forma como pretende exercer, ao abrigo dos mesmos artigos, o seu poder de apreciação relativamente a novos auxílios ou a regimes de auxílios existentes.

Uma vez que as orientações se baseiam no disposto no artigo 88.° , n.° 1, CE, representam um elemento da cooperação regular e periódica no âmbito da qual a Comissão procede, com os Estados-Membros, ao exame permanente dos regimes de auxílios existentes e lhes propõe medidas adequadas exigidas pelo desenvolvimento progressivo ou pelo funcionamento do mercado comum. Tal como resulta igualmente do artigo 19.° , n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999, quando estas propostas de medidas adequadas são aceites por um Estado-Membro, têm efeito vinculativo relativamente a esse Estado-Membro.

Em especial, no que diz respeito às orientações relativas aos auxílios regionais, decisões como a que fixa os limites máximos de cobertura dos auxílios e a que a actualiza constituem uma das etapas de um procedimento destinado a fixar as condições gerais do exame comunitário dos regimes de auxílios com finalidade regional. Assim sendo, estas decisões fazem parte integrante das referidas orientações, só tendo, por si próprias, força vinculativa se aceites pelos Estados-Membros.

( cf. n.os 27-29, 33-35 )

Partes


No processo C-242/00,

República Federal da Alemanha, representada por W.-D. Plessing, na qualidade de agente, assistido por R. M. Bierwagen, Rechtsanwalt,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por K.-D. Borchardt e J. Macdonald Flett, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

"que tem por objecto a anulação da Decisão 2001/272/CE da Comissão, de 14 de Março de 2000, relativa à nova demarcação das zonas assistidas da Alemanha no quadro do regime comum «Melhoria das estruturas económicas regionais» para o período entre 1 de Janeiro de 2000 e 31 de Dezembro de 2003 - Alemanha Ocidental e cidade de Berlim (JO 2001, L 97, p. 27),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, P. Jann, F. Macken e N. Colneric, presidentes de secção, C. Gulmann, D. A. O. Edward, J.-P. Puissochet (relator), M. Wathelet, R. Schintgen, V. Skouris e C. W. A. Timmermans, juízes,

advogado-geral: J. Mischo,

secretário: H. A. Rühl, administrador principal,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 22 de Janeiro de 2002,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 12 de Março de 2002,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 16 de Junho de 2000, a República Federal da Alemanha pediu, nos termos do artigo 230._ CE, a anulação da Decisão 2001/272/CE da Comissão, de 14 de Março de 2000, relativa à nova demarcação das zonas assistidas da Alemanha no quadro do regime comum «Melhoria das estruturas económicas regionais» para o período entre 1 de Janeiro de 2000 e 31 de Dezembro de 2003 - Alemanha Ocidental e cidade de Berlim (JO 2001, L 97, p. 27, a seguir «decisão recorrida»), uma vez que só considerou compatíveis com o mercado comum os auxílios regionais que diziam respeito às zonas correspondentes a 17,73% da população alemã.

As disposições comunitárias

2 O artigo 92._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87._ CE) diz respeito aos auxílios concedidos pelos Estados. Dispõe o seguinte no n._ 3, alíneas a) e c), primeiro período, cujo texto é idêntico ao do artigo 87._, n._ 3, alíneas a) e c), CE:

«Podem ser considerados compatíveis com o mercado comum:

a) Os auxílios destinados a promover o desenvolvimento económico de regiões em que o nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista grave situação de subemprego.

[...]

c) Os auxílios destinados a facilitar o desenvolvimento de certas actividades ou regiões económicas, quando não alterem as condições das trocas comerciais de maneira que contrariem o interesse comum.»

3 O artigo 93._ do Tratado CE (actual artigo 88._ CE) prevê, no n._ 1, cujo texto é idêntico ao do artigo 88._, n._ 1, CE:

«A Comissão procederá, em cooperação com os Estados-Membros, ao exame permanente dos regimes de auxílios existentes nesses Estados. A Comissão proporá também aos Estados-Membros as medidas adequadas, que sejam exigidas pelo desenvolvimento progressivo ou pelo funcionamento do mercado comum.»

4 A Comissão adoptou, em 16 de Dezembro de 1997, as orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional (JO 1998, C 74, p. 9, a seguir «orientações relativas aos auxílios regionais»), elaboradas em colaboração com os Estados-Membros. Estas precisam, no anexo III, a metodologia que é utilizada para determinar o limite máximo de população das regiões que podem beneficiar de tais auxílios.

5 A nível comunitário, a Comissão fixa um limite máximo global de cobertura deste tipo de auxílios, expresso em termos de população, que é posteriormente repartido entre os Estados-Membros. Para cada Estado é fixada assim uma percentagem máxima de população elegível.

6 Ao abrigo do artigo 92._, n._ 3, alínea a), do Tratado, estão automaticamente incluídas no limite máximo comunitário todas as regiões correspondentes a uma unidade geográfica do nível II da Nomenclatura das Unidades Territoriais Estatísticas (a seguir «NUTS»), que tenham um produto interno bruto (a seguir «PIB») por habitante, avaliado em termos de padrão de poder de compra (a seguir «PPC»), que não exceda 75% da média comunitária.

7 O valor total da população tido em consideração para efeitos do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado é obtido deduzindo do limite máximo global fixado para toda a população das regiões elegíveis nos termos da alínea a) da mesma disposição. Posteriormente, procede-se à repartição entre os Estados-Membros, em função da situação socioeconómica relativa das regiões em cada um dos Estados-Membros, avaliada no contexto da Comunidade.

8 Esta repartição do valor da população tido em consideração para efeitos do artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado é feita nas condições seguintes. Para cada região do nível III da NUTS, uma primeira chave de repartição permite calcular, relativamente a um período de três anos e a partir dos dados estatísticos fornecidos pelo Eurostat quanto à taxa de desemprego e ao PIB/PPC por habitante, o desvio verificado em relação aos limiares de base comunitários destes indicadores, a saber, 115 para a taxa de desemprego e 85 para o PIB. A este título, podem ser tidas em consideração as regiões que apresentem um desvio significativo em relação a, pelo menos, um dos dois limiares de base. As regiões dos Estados-Membros que ainda não foram consideradas a título do artigo 92._, n._ 3, alínea a), do Tratado e que preencham esta condição são adicionadas, o que permite determinar a parte relativa de cada Estado-Membro nesse total.

9 No entanto, há que notar que os resultados obtidos são objecto de correcções, «se necessário», a fim de ter em conta os imperativos seguintes: em primeiro lugar, a população abrangida pelo artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado deve ser, pelo menos, igual a 15% da população não abrangida ao abrigo da alínea a) da mesma disposição, sem poder ultrapassar 50% desta; depois, todas as regiões que perdem o benefício da elegibilidade ao abrigo da alínea a), bem como as zonas de reduzida densidade populacional, devem ser abrangidas ao abrigo da alínea c) do referido n._ 3; por fim, a redução da cobertura total ao abrigo das alíneas a) e c) não pode exceder 25%.

10 A aplicação destas correcções pode ter por efeito aumentar o limite máximo de população tido em consideração para cada Estado-Membro, o que implica ajustamentos finais entre os Estados para que o limite global de população a nível comunitário fixado ex ante não seja ultrapassado.

Factos do litígio

11 Por decisão de 16 de Dezembro de 1997, ou seja, no dia da adopção das orientações relativas aos auxílios regionais, a Comissão fixou os limites máximos de cobertura dos auxílios com finalidade regional, para os anos de 2000 a 2006, em 42,7% da população comunitária [19,8% ao abrigo do artigo 92._, n._ 3, alínea a), do Tratado e 22,9% ao abrigo da alínea c) da referida disposição], contra os anteriores 46,7% [22,7% ao abrigo da alínea a) e 24% ao abrigo da alínea c)].

12 Esta redução era justificada, por um lado, pela melhoria da situação económica e social de certas regiões, que deixaram de ser elegíveis ao abrigo do artigo 92._, n._ 3, alínea a), do Tratado, e, por outro, pela vontade de enquadrar com mais rigor os auxílios que podem ser abrangidos pela alínea c) do referido n._ 3, concentrando-os nas regiões onde se verificam as maiores dificuldades, por forma a garantir que estes auxílios não afectem desfavoravelmente as trocas comerciais intracomunitárias, mantendo, ao mesmo tempo, a sua eficácia e a sua coerência relativamente à acção dos fundos estruturais. A perspectiva do alargamento da Comunidade durante o período de 2000 a 2006 era também invocada para justificar a referida redução.

13 Esta decisão de 16 de Dezembro de 1997, que fixou os limites máximos de cobertura, foi comunicada à República Federal da Alemanha por carta de 24 de Fevereiro de 1998, na qual a Comissão indicou também que 35,7% da população alemã podia ser abrangida por auxílios com finalidade regional, em aplicação do n._ 3 do artigo 92._ do Tratado, ou seja, 17,4% ao abrigo da alínea a) do referido n._ 3 e 18,3% com base na sua alínea c). Nesta mesma carta, a Comissão pedia à República Federal da Alemanha, como fazia com todos os Estados-Membros, que adaptasse a sua regulamentação nacional relativa aos auxílios regionais a fim de a tornar compatível com as orientações relativas aos auxílios regionais, a partir de 1 de Janeiro de 2000, e que notificasse à Comissão, antes de 31 de Março de 1999, o mapa das regiões elegíveis a partir de 1 de Janeiro de 2000, bem como o montante dos auxílios e as taxas máximas de acumulação aplicáveis nas regiões elegíveis.

14 Por carta de 23 de Abril de 1998, o Governo alemão aprovou parcialmente estas «medidas adequadas», propostas pela Comissão ao abrigo do artigo 93._, n._ 1, do Tratado, mas contestou formalmente o modo de cálculo do limite máximo de população das regiões elegíveis.

15 Tendo em conta a possibilidade de abertura de um procedimento formal de investigação e o risco de não poder, na falta de autorização da Comissão, conceder temporariamente qualquer auxílio regional, o Governo alemão, por carta de 24 de Agosto de 1998, aprovou finalmente a medida adequada, que consistia no ajustamento, em 31 de Dezembro de 1999, dos regimes de auxílio existentes, manifestando de novo a sua oposição ao modo de cálculo do limite máximo das regiões elegíveis.

16 Mediante nova carta, de 30 de Dezembro de 1998, a Comissão informou a República Federal da Alemanha de que o limite máximo actualizado em 16 de Dezembro de 1998 para este Estado-Membro seria doravante fixado em 34,9% da sua população, sendo 17,3% ao abrigo do artigo 92._, n._ 3, alínea a), do Tratado e 17,6% com base na alínea c) do mesmo n._ 3. O anexo A desta carta revelava que a Comissão tinha inicialmente fixado este último valor em 23,4% e que a redução resultava de uma compensação das medidas de correcção adoptadas em favor de outros Estados-Membros.

17 Em 21 de Janeiro de 1999, foi publicado no Jornal Oficial das Comunidades Europeias um documento da Comissão intitulado «Limites máximos nacionais de cobertura dos auxílios estatais com finalidade regional ao abrigo das derrogações previstas nas alíneas a) e c) do n._ 3 do artigo 92._ do Tratado para o período 2000-2006 (JO C 16, p. 5)», no qual se prevê um limite máximo de 34,9% para a Alemanha. Este documento indica que os referidos limites máximos são fixados «[e]m aplicação das disposições das orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional».

18 Por carta de 30 de Março de 1999, o Governo alemão notificou à Comissão o projecto de mapa dos auxílios com finalidade regional, propondo regiões que representavam 17,6% da população alemã ao abrigo do artigo 92._, n._ 3, alínea a), do Tratado e 23,4% ao abrigo da alínea c) do referido n._ 3 (nos Länder da Alemanha Ocidental e em Berlim).

19 Por carta de 17 de Agosto de 1999, a Comissão admitiu a compatibilidade com o mercado comum dos projectos apresentados para as regiões abrangidas pelo artigo 92._, n._ 3, alínea a), do Tratado, mas colocou objecções e deu início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 93._, n._ 2 do Tratado para as regiões abrangidas pelo artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado no que respeita ao seu alcance e a várias características dos projectos de auxílios nos Länder da Alemanha Ocidental e em Berlim.

20 Na sequência da troca de abundante correspondência e tendo em conta a insistência da República Federal da Alemanha, a Comissão aceitou, no fim de 1999, considerar o encerramento do processo de investigação sobre a parte das regiões abrangidas pelo artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado, que representavam 17,7% da população alemã, devido à similitude entre esta percentagem e a acolhida pela Comissão na sua carta de 30 de Dezembro de 1998. Isto supunha, no entanto, uma delimitação precisa das regiões em causa, mais restrita do que a pretendida pela República Federal da Alemanha, pois excluía 5,7% da população e tinha em conta certas exigências da Comissão relativas à definição da unidade geográfica das circunscrições propostas.

21 Em 2 de Fevereiro de 2000, o Governo alemão informou a Comissão do andamento das medidas necessárias a este fim e notificou uma lista de regiões que representavam 17,73% da população alemã, confirmando ao mesmo tempo que mantinha a sua posição jurídica relativa ao valor de 23,4%.

22 A decisão recorrida de 14 de Março de 2000 foi adoptada com base nestes últimos elementos. Dispõe, no artigo 1._, que «[o] mapa das regiões assistidas para o período entre 1 de Janeiro de 2000 e 31 de Dezembro de 2003 relativo às regiões ao abrigo da alínea c) do n._ 3 do artigo 87._ do Tratado CE é compatível com o mercado comum nas condições previstas no artigo 2._». O artigo 2._ desta decisão precisa, designadamente, que «[a] Alemanha introduz medidas à escala nacional, que permitam diferenciar manifestamente as regiões que se inscrevem no âmbito de aplicação da alínea a) do n._ 3 do artigo 87._ do Tratado CE das regiões abrangidas pela alínea c) do n._ 3 do artigo 87._ do Tratado CE e estabelecer claramente que apenas estas regiões poderão beneficiar de auxílios ao desenvolvimento regional à luz das orientações».

Quanto à admissibilidade do recurso

23 A Comissão suscita na sua contestação, a título principal, uma questão prévia de admissibilidade. Considera que o recurso, que se destina, essencialmente, a impugnar o montante do limite máximo de população abrangido pelo artigo 92._, n._ 3, alínea c), do Tratado é inadmissível por duas razões.

24 Defende, em primeiro lugar, que a decisão impugnada, que declarou compatível com o mercado comum a lista das regiões notificada pela República Federal da Alemanha em 2 de Fevereiro de 2000, é na realidade favorável a este Estado-Membro e não o prejudica. O recurso é, nestas condições, desprovido de objecto.

25 Afirma, em segundo lugar e a título subsidiário, que a decisão recorrida deve ser analisada como um indeferimento tácito do pedido complementar da República Federal da Alemanha sobre a tomada em consideração adicional de 5,67% da sua população. Esta parte da decisão recorrida é puramente confirmativa da decisão anterior da Comissão que fixava os limites máximos de cobertura, adoptada em 16 de Dezembro de 1997 e actualizada em 16 de Dezembro de 1998, que não foi objecto de recurso contencioso, tornando-se, portanto, definitiva. O presente recurso é, assim, intempestivo.

26 A análise desta questão prévia de admissibilidade implica que o Tribunal de Justiça se pronuncie sobre a natureza e o alcance exactos da decisão recorrida.

27 Há que recordar, liminarmente, que a Comissão pode, no exercício das competências de que dispõe por força dos artigos 87._ CE e 88._ CE, adoptar orientações que tenham por objecto indicar a forma como pretende exercer, ao abrigo dos mesmos artigos, o seu poder de apreciação relativamente a novos auxílios ou a regimes de auxílios existentes.

28 Uma vez que as orientações se baseiam no disposto no artigo 88._, n._ 1, CE, representam um elemento da cooperação regular e periódica no âmbito da qual a Comissão procede, com os Estados-Membros, ao exame permanente dos regimes de auxílios existentes e lhes propõe medidas adequadas exigidas pelo desenvolvimento progressivo ou pelo funcionamento do mercado comum (acórdãos de 15 de Outubro de 1996, IJssel-Vliet, C-311/94, Colect., p. I-5023, n.os 36 e 37, e de 5 de Outubro de 2000, Alemanha/Comissão, C-288/96, Colect., p. I-8237, n.os 62 a 65). Quando estas propostas de medidas adequadas são aceites por um Estado-Membro, têm efeito vinculativo relativamente a esse mesmo Estado-Membro (acórdão IJssel-Vliet, já referido, n.os 42 e 43).

29 Por outro lado, há que observar que o legislador comunitário adoptou os princípios emanados da jurisprudência referida no número anterior, introduzindo no Regulamento (CE) n._ 659/1999 do Conselho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 93._ do Tratado CE (JO L 83, p. 1), o artigo 19._, n._ 1, com a seguinte redacção: «Quando o Estado-Membro em causa aceitar as medidas propostas e disso informar a Comissão, esta registará esse facto e informará o Estado-Membro. Por força dessa aceitação, o Estado-Membro fica obrigado a aplicar as medidas adequadas».

30 A Comissão adoptou, em 16 de Dezembro de 1997, as orientações relativas aos auxílios regionais, a título das «medidas adequadas» referidas no artigo 93._, n._ 1, do Tratado. No mesmo dia fixou, numa outra decisão, os limites máximos de cobertura dos auxílios com finalidade regional em percentagem de população para toda a Comunidade e para cada Estado-Membro, no que diz respeito ao período de 2000 a 2006. As referidas orientações e o conteúdo desta decisão foram comunicados à República Federal da Alemanha por carta de 24 de Fevereiro de 1998, a fim de permitir a este Estado-Membro iniciar o exame dos seus regimes de auxílios existentes e de propor à Comissão um mapa dos auxílios regionais, tendo em conta, a partir de 1 de Janeiro de 2000, os novos limites máximos assim definidos. O limite máximo de cobertura fixado para a República Federal da Alemanha, como para os outros Estados-Membros, foi objecto de actualização em 16 de Dezembro de 1998, permitindo garantir que as condições de atribuição dos auxílios para o período de 2000 a 2006 assentem nos indicadores estatísticos mais recentes. Assim, os limites máximos dos Estados-Membros só foram fixados com certeza a partir desta actualização. Foram notificados aos Estados-Membros por carta de 30 de Dezembro de 1998 e foram publicados no Jornal Oficial das Comunidades Europeias em 21 de Janeiro de 1999. Por conseguinte, os Estados tiveram de adaptar o conteúdo das suas propostas e a República Federal da Alemanha pôde, em 30 de Março de 1999, proceder à notificação destes projectos de auxílios regionais, precisando a sua importância e o seu alcance geográfico.

31 A Comissão defende que a decisão de 16 de Dezembro de 1997, relativa aos limites máximos de cobertura, e a decisão de actualização contida na carta de 30 de Dezembro de 1998 são decisões juridicamente autónomas e não se incluem nas «medidas adequadas» a que se refere o artigo 93._, n._ 1, do Tratado. Tomadas em aplicação das orientações relativas aos auxílios regionais, mas distintas destas, resultam do poder de apreciação da Comissão sobre a compatibilidade dos regimes de auxílios regionais com o mercado comum. Diferentemente das referidas orientações, que constituem um elemento da cooperação entre a Comissão e os Estados-Membros, o carácter vinculativo destas decisões não depende do consentimento dos Estados-Membros.

32 A República Federal da Alemanha sustenta, pelo seu lado, que estas decisões apenas podiam apresentar, a seu respeito, carácter preparatório e constituíam medidas intermédias. Parte integrante das orientações relativas aos auxílios regionais foram constantemente objecto de reservas expressas do Governo alemão, de modo que não puderam adquirir, por si, carácter vinculativo.

33 A este respeito, há que sublinhar, por um lado, que as referidas «decisões» constituíram o complemento necessário das orientações relativas aos auxílios regionais, embora sejam materialmente distintas e a segunda tenha sido tomada quase um ano depois. A República Federal da Alemanha só teve conhecimento útil deste critério essencial de apreciação da Comissão, que constitui o limite máximo de população elegível, resultante das referidas orientações, no momento da notificação dos números que lhe diziam respeito, por carta de 30 de Dezembro de 1998. Só quando da recepção desta carta e do seu anexo A, que precisa o modo de cálculo dos limites máximos e, em especial, o efeito das «correcções» previstas no anexo III das referidas orientações, é que este Estado-Membro pôde conhecer o verdadeiro alcance destas em relação a si e preparar a notificação do mapa das regiões elegíveis.

34 Por outro lado, como reconhece a própria Comissão, as referidas «decisões» não foram precedidas de qualquer procedimento formal de adopção. Na realidade, não têm por objecto apreciar a compatibilidade com o mercado comum de medidas de auxílios já notificadas à Comissão. Constituem uma das etapas de um procedimento destinado a fixar as condições gerais do exame comunitário dos regimes de auxílios com finalidade regional.

35 Nestas condições, há que analisar estas «decisões» como fazendo parte integrante das orientações relativas aos auxílios regionais e só tendo, por si próprias, força vinculativa se aceites pelos Estados-Membros (v. acórdão IJssel-Vliet, já referido, n.os 42 e 43).

36 Ora, resulta da correspondência trocada entre a Comissão e o Governo alemão no presente processo, designadamente das cartas deste de 23 de Abril e 24 de Agosto de 1998, que a República Federal da Alemanha exprimiu constantemente reservas sobre o método de cálculo e o valor do limite máximo de cobertura que lhe dizia respeito. Manifestou a sua oposição à fixação de um limite de 17,7% da sua população, notificando à Comissão, em 30 de Março de 1999, um mapa das regiões elegíveis que representavam 23,4% da sua população. Esta recusa foi reiterada ao longo das conversações de 12 de Novembro e 2 de Dezembro de 1999 entre representantes da Comissão e do Ministério das Finanças alemão e foi também confirmada na carta do Governo alemão de 2 de Fevereiro de 2000. Por conseguinte, a parte das orientações relativas aos auxílios regionais relacionada com o método de cálculo do limite máximo de cobertura e o valor que daí resulta não eram, por si só, directamente oponíveis à República Federal da Alemanha.

37 Contrariamente ao que sustenta a Comissão, a primeira decisão dotada de efeito vinculativo relativamente à República Federal da Alemanha é, portanto, a decisão recorrida no âmbito do presente recurso, pela qual a Comissão declarou compatível com o mercado comum um mapa das regiões que representavam 17,7% da população alemã, e não as medidas intermédias de 16 de Dezembro de 1997 e de 30 de Dezembro de 1998.

38 Nestas condições, há que afastar a questão prévia de admissibilidade do recurso baseada no facto de este ter sido interposto de uma decisão confirmativa de actos anteriores da Comissão que, não tendo sido eles próprios objecto de recurso da República Federal da Alemanha, se teriam tornado definitivos.

39 A Comissão defende, contudo, que o recurso é inadmissível por outra razão, na medida em que se destina a obter a anulação de uma decisão que declarou incompatível com o mercado comum a lista das regiões notificada em 2 de Fevereiro de 2000 e que não causa, portanto, prejuízo à República Federal da Alemanha. O Governo alemão, pelo contrário, afirma que manteve ao longo de todo o processo de investigação a sua notificação inicial, de 30 de Março de 1999, que tem por objecto um mapa de regiões que representam 23,4% da população alemã, e que a decisão recorrida, na medida em que declara compatível com o mercado comum um mapa de regiões que representam somente 17,73% da população, se pronuncia tácita mas necessariamente de forma desfavorável sobre esta notificação.

40 Há que sublinhar, por um lado, que a decisão recorrida se baseia efectivamente, como salienta a Comissão, na lista de regiões que o Governo alemão transmitiu à Comissão em 2 de Fevereiro de 2000.

41 O n._ 15 dos fundamentos da decisão recorrida enuncia assim que, «[e]m 2 de Fevereiro de 2000, no decurso do processo de investigação, a Alemanha forneceu uma lista de 41 bacias de emprego, incluindo a cidade de Berlim», e que «[c]om 14 546 097 habitantes, estas regiões representam 17,7% da população total da República Federal da Alemanha [...] e são classificadas pela Alemanha como regiões com máxima prioridade na perspectiva das políticas de desenvolvimento regional». O n._ 35 destes fundamentos refere «[a] notificação modificada pela Alemanha, de 2 de Fevereiro de 2000, referente às regiões abrangidas pela alínea c) do n._ 3 do artigo 87._ do Tratado». O n._ 49 dos mesmos fundamentos precisa que, «[p]or forma a adaptar a sua notificação ao disposto nas orientações, a Alemanha notificou no decurso do processo de investigação uma lista de regiões revista, que foi reduzida para a percentagem máxima de habitantes definida pela Comissão». O n._ 50 dos referidos fundamentos acrescenta que «[a] Alemanha dispõe de uma percentagem máxima de habitantes de 17,7% para as regiões assistidas nos termos da alínea c) do n._ 3 do artigo 87._ do Tratado» e que «[a]s regiões propostas correspondem [...] a 17,7% da população global da República Federal da Alemanha e poderão ser declaradas compatíveis com o mercado comum». O dispositivo da decisão recorrida, referido no n._ 22 do presente acórdão, pronuncia-se, portanto, sobre o estado dos elementos de que a Comissão dispunha em 2 de Fevereiro de 2000 e reconhece a compatibilidade com o mercado comum do mapa regional conforme modificado nessa data.

42 Por outro lado, se a República Federal da Alemanha defende que a lista notificada em 30 de Março de 1999 só podia ser alterada por uma decisão do Comité de Planificação Bund-Länder, que em 2 de Fevereiro de 2000 ainda não tinha sido adoptada, esta circunstância não tem qualquer incidência sobre o alcance da decisão recorrida.

43 Resulta, efectivamente, dos autos que a República Federal da Alemanha, após ter mantido a sua notificação inicial nas cartas de 17 de Setembro e 4 de Outubro de 1999, propôs ao longo das conversações do fim do ano de 1999 com os serviços da Comissão, ela mesma enviar a esta última uma lista de regiões modificada, representando 17,7% da população alemã. O Governo alemão desejava obter assim uma decisão que reconhecesse a compatibilidade com o Tratado desta primeira lista, reservando-se a possibilidade de propor, num segundo momento, uma lista complementar que fosse além do limite máximo de 17,7%. A carta de 2 de Fevereiro de 2000 indica, de resto, que a proposta enviada trata, «num primeiro momento», de uma lista de regiões que tem em conta este limite máximo. Como recorda a Comissão, a República Federal da Alemanha expunha-se, se não tivesse apresentado esta nova proposta, a uma decisão que declarasse a incompatibilidade global de um mapa relativo a regiões que abrangiam 23,4% de população, pelo facto de a Comissão não poder, ela própria, fixar a ordem das prioridades regionais de intervenção respeitando o limite máximo resultante das orientações relativas aos auxílios regionais. O Governo alemão não pode, portanto, validamente afirmar que o seu pedido relativo ao limite de cobertura se traduzira, até à adopção da decisão recorrida, pela manutenção dos termos da notificação feita em 30 de Março de 1999.

44 Contudo, uma vez que a Comissão nunca se pronunciou, nem nos actos, que não têm efeito vinculativo, de 16 de Dezembro de 1997 e de 30 de Dezembro de 1998, nem na decisão recorrida, sobre o pedido inicial da República Federal da Alemanha destinado a poder conceder auxílios a regiões que representavam 23,4% da sua população, este Estado-Membro podia ainda notificar uma lista complementar das regiões que abrangessem 5,67% da sua população. Cabe, pois, à Comissão analisar a compatibilidade desta proposta com o Tratado.

45 Resulta, por isso, tanto do conteúdo da decisão recorrida como do contexto em que foi adoptada que não teve por objecto nem por efeito o indeferimento tácito do pedido da República Federal da Alemanha relativo a uma lista complementar de regiões que representavam 5,67% da sua população.

46 Nestas condições, o recurso interposto desta decisão, que, em si, não tem alcance desfavorável para a República Federal da Alemanha e não a prejudica, deve ser considerado inadmissível.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

47 Nos termos do artigo 69._, n._ 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas, se tal tiver sido pedido. Tendo a República Federal da Alemanha sido vencida e a Comissão pedido a sua condenação nas despesas, devem estas ser suportadas pela primeira.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

decide:

1) É negado provimento ao recurso.

2) A República Federal da Alemanha é condenada nas despesas.