62000J0035

Acórdão do Tribunal (Segunda Secção) de 24 de Janeiro de 2002. - Comissão das Comunidades Europeias contra Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte. - Incumprimento de Estado - Ambiente - Resíduos - Directivas 75/442/CEE, 91/689/CEE e 94/62/CE - Planos de gestão de resíduos. - Processo C-35/00.

Colectânea da Jurisprudência 2002 página I-00953


Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


Estados-Membros - Obrigações - Execução das directivas - Incumprimento não contestado

(Artigo 226.° CE)

Partes


No processo C-35/00,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por R. B. Wainwright e L. Ström, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por R. Magrill, na qualidade de agente, assistida por D. Wyatt, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandado,

que tem por objecto obter a declaração de que, ao não elaborar planos de gestão de resíduos em conformidade com todas as disposições respeitantes aos resíduos da Directiva 75/442/CEE do Conselho, de 15 de Julho de 1975, relativa aos resíduos (JO L 194, p. 39; EE 15 F1 p. 129), na redacção dada pela Directiva 91/156/CEE do Conselho, de 18 de Março de 1991 (JO L 78, p. 32), da Directiva 91/689/CEE do Conselho, de 12 de Dezembro de 1991, relativa aos resíduos perigosos (JO L 377, p. 20), e da Directiva 94/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Dezembro de 1994, relativa a embalagens e resíduos de embalagens (JO L 365, p. 10), e/ou ao não informar a Comissão desse facto, o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 7.° da Directiva 75/442, na redacção dada pela Directiva 91/156, 6.° da Directiva 91/689 e 14.° da Directiva 94/62,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: N. Colneric, presidente de secção, R. Schintgen e V. Skouris (relator), juízes,

advogado-geral: A. Tizzano,

secretário: R. Grass,

visto o relatório do juiz-relator,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 11 de Setembro de 2001,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 8 de Fevereiro de 2000, a Comissão das Comunidades Europeias intentou, nos termos do artigo 226.° CE, uma acção destinada a obter a declaração de que, ao não elaborar planos de gestão de resíduos em conformidade com todas as disposições respeitantes aos resíduos da Directiva 75/442/CEE do Conselho, de 15 de Julho de 1975, relativa aos resíduos (JO L 194, p. 39; EE 15 F1 p. 129), na redacção dada pela Directiva 91/156/CEE do Conselho, de 18 de Março de 1991 (JO L 78, p. 32, a seguir «Directiva 75/442 alterada»), da Directiva 91/689/CEE do Conselho, de 12 de Dezembro de 1991, relativa aos resíduos perigosos (JO L 377, p. 20), e da Directiva 94/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Dezembro de 1994, relativa a embalagens e resíduos de embalagens (JO L 365, p. 10), e/ou ao não informar a Comissão desse facto, o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 7.° da Directiva 75/442 alterada, 6.° da Directiva 91/689 e 14.° da Directiva 94/62.

Enquadramento jurídico

A Directiva 75/442 alterada

2 A Directiva 75/442 alterada tem por objectivo garantir a eliminação e a valorização dos resíduos, bem como incentivar a adopção de medidas destinadas a limitar a produção de resíduos, nomeadamente através da promoção de tecnologias limpas e de produtos recicláveis e reutilizáveis.

3 O artigo 7.° , n.os 1 e 2, da Directiva 75/442 alterada, que resulta de uma alteração introduzida na Directiva 75/442 pela Directiva 91/156, prevê:

«1. Para realizar os objectivos referidos nos artigos 3.° , 4.° e 5.° , a ou as autoridades competentes mencionadas no artigo 6.° devem estabelecer, logo que possível, um ou mais planos de gestão de resíduos. Esses planos incidirão nomeadamente sobre:

- o tipo, a quantidade e a origem dos resíduos a aproveitar ou a eliminar,

- normas técnicas gerais,

- disposições especiais relativas a resíduos específicos,

- locais ou instalações apropriados para a eliminação.

Esses planos podem abranger, por exemplo:

- as pessoas singulares ou colectivas habilitadas a proceder à gestão dos resíduos,

- as estimativas dos custos das operações de aproveitamento e eliminação,

- as medidas susceptíveis de incentivar a racionalização da recolha, da triagem e do tratamento dos resíduos.

2. Se necessário os Estados-Membros colaborarão com os outros Estados-Membros interessados e com a Comissão na elaboração desses planos e comunicá-los-ão à Comissão.»

4 De acordo com o artigo 2.° , n.° 1, primeiro parágrafo, da Directiva 91/156, os Estados-Membros deviam pôr em vigor as medidas necessárias para lhe dar cumprimento o mais tardar em 1 de Abril de 1993.

A Directiva 91/689

5 A Directiva 91/689 tem por objectivo, segundo o seu artigo 1.° , n.° 1, a aproximação das legislações dos Estados-Membros sobre a gestão controlada dos resíduos perigosos.

6 O artigo 6.° da Directiva 91/689 dispõe:

«1. Em conformidade com o disposto no artigo 7.° da Directiva 75/442/CEE, as autoridades competentes deverão elaborar e tornar públicos planos para a gestão dos resíduos perigosos, quer separadamente quer no quadro dos respectivos planos gerais de gestão de resíduos.

2. A Comissão procederá a uma avaliação comparativa desses planos, nomeadamente no que respeita aos métodos de eliminação e de valorização. A Comissão porá essas informações à disposição das autoridades competentes dos Estados-Membros que as solicitarem.»

7 O artigo 10.° , n.° 1, primeiro período, da Directiva 91/689 previa que os Estados-Membros deviam pôr em vigor as medidas necessárias para lhe dar cumprimento antes de 12 de Dezembro de 1993. Este prazo foi adiado para 27 de Junho de 1995 pelo artigo 1.° , n.° 1, da Directiva 94/31/CE do Conselho, de 27 de Junho de 1994, que altera a Directiva 91/689 (JO L 168, p. 28).

A Directiva 94/62

8 A Directiva 94/62 tem por objectivo, nos termos do seu artigo 1.° , n.° 1, harmonizar as disposições nacionais respeitantes à gestão de embalagens e de resíduos de embalagens a fim de, por um lado, prevenir e reduzir o seu impacte no ambiente, em todos os Estados-Membros, assim como em países terceiros, assegurando desta forma um elevado nível de protecção do ambiente, e, por outro, garantir o funcionamento do mercado interno e evitar entraves ao comércio e distorções e restrições de concorrência na Comunidade.

9 O artigo 14.° da Directiva 94/62, com a epígrafe «Planos de gestão», dispõe:

«Para realizar os objectivos e as medidas previstos na presente directiva, os Estados-Membros incluirão, nos planos de gestão de resíduos exigidos no artigo 7.° da Directiva 75/442/CEE, um capítulo específico sobre gestão de embalagens e resíduos de embalagens [...]»

10 Nos termos do artigo 22.° , n.° 1, da Directiva 94/62:

«Os Estados-Membros porão em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente directiva antes de 30 de Junho de 1996. Desse facto informarão imediatamente a Comissão.»

Enquadramento factual e fase pré-contenciosa

11 Por cartas de 7 de Abril e 28 de Julho de 1995, a Comissão pediu ao Governo do Reino Unido que lhe comunicasse os seus planos de gestão de resíduos então em vigor, em conformidade com o disposto no artigo 7.° da Directiva 75/442 alterada. Pediu igualmente informações quanto à validade de planos elaborados antes de 1991 que lhe tinham sido já comunicados.

12 Por carta de 21 de Setembro de 1995, o Governo do Reino Unido informou a Comissão de que os planos comunicados em 1990 e em 1991 continuavam válidos, salvo nos casos em que tinham sido substituídos por novos planos de eliminação dos resíduos. Encontrava-se anexa a esta carta uma lista dos novos planos.

13 Por cartas de 26 de Outubro de 1995 e 24 de Outubro de 1996, as autoridades do Reino Unido comunicaram à Comissão um exemplar do plano de gestão de resíduos para Gibraltar.

14 Considerando, com fundamento nos planos que tinha recebido, que o Reino Unido não tinha adoptado as medidas necessárias para dar cumprimento às obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 7.° da Directiva 75/442 alterada, 6.° da Directiva 91/689 e 14.° da Directiva 94/62, a Comissão deu início ao processo por incumprimento. Depois de ter notificado o Reino Unido para este lhe apresentar as suas observações, dirigiu, por carta de 23 de Abril de 1999, um parecer fundamentado a este Estado-Membro convidando-o a tomar as medidas necessárias para dar cumprimento às referidas obrigações no prazo de dois meses a contar da notificação desse parecer.

15 As autoridades do Reino Unido responderam ao parecer fundamentado por carta de 12 de Agosto de 1999. Não tendo ficado satisfeita com esta resposta, a Comissão decidiu intentar a presente acção.

O incumprimento imputado e a apreciação do Tribunal de Justiça

16 A Comissão alega, antes de mais, que os planos de gestão de resíduos em vigor que foram comunicados à Comissão não parecem abranger a totalidade do território do Reino Unido. Assinala, a título de exemplo, que apenas 29 dos 34 County Councils de Inglaterra apresentaram planos. De igual modo, segundo a Comissão, só três London Boroughs, além das autoridades de gestão de resíduos de East London e de West London, apresentaram planos e que só 19 District Councils da Irlanda do Norte o fizeram. Por outro lado, haveria uma certa disparidade entre o número de autoridades locais de Inglaterra, do País de Gales, da Escócia e da Irlanda do Norte e, por outro, o número das que apresentaram planos de gestão de resíduos. De tal facto resultaria portanto que os planos de gestão de resíduos comunicados pelo Reino Unido não abrangiam a totalidade do seu território.

17 Em seguida, a Comissão sustenta que, depois de ter procedido a uma avaliação das informações fornecidas pelo Governo do Reino Unido, verificou que dos planos comunicados só 53 satisfazem todas as condições impostas pelas Directivas 75/442 alterada, 91/689 e 94/62.

18 No que respeita mais especialmente à Directiva 91/689, a Comissão alega que 21 dos planos comunicados não contêm as informações exigidas quanto aos resíduos perigosos. Ora, por força do artigo 6.° desta directiva, as autoridades do Reino Unido são obrigadas a elaborar planos para a gestão dos resíduos perigosos.

19 Quanto às obrigações resultantes da Directiva 94/62, a Comissão sustenta que só um plano parece conter um capítulo sobre embalagens e resíduos de embalagens. Ora, por força do artigo 14.° desta directiva, as autoridades do Reino Unido estavam obrigadas a consagrar à gestão de embalagens e de resíduos de embalagens um capítulo específico nos planos de gestão de resíduos previstos no artigo 7.° da Directiva 75/442 alterada.

20 Por último, quanto a um certo número de colectividades territoriais, a Comissão só recebeu breves extractos que não podem ser considerados planos de gestão de resíduos na acepção do artigo 7.° da Directiva 75/442 alterada.

21 Assim, exceptuada a questão da aplicação da Directiva 94/62 a Gibraltar, que seria objecto de discussões entre a Comissão e o Reino Unido no âmbito de outro processo, a Comissão conclui que o Reino Unido ainda não adoptou as medidas necessárias para dar cumprimento às Directivas 75/442 alterada, 91/689 e 94/62 e/ou que não informou a Comissão desse facto.

22 O Governo do Reino Unido não contesta o incumprimento imputado. Admite que, durante o período considerado, não adoptou e/ou não comunicou planos de gestão de resíduos susceptíveis de abranger a totalidade do território do Reino Unido e, no que respeita apenas às Directivas 75/442 alterada e 91/689, de Gibraltar. Reconhece que é acertadamente que a Comissão pede a declaração do incumprimento nos termos utilizados na petição e alega que as autoridades competentes se ocupam da rectificação desta situação substituindo os planos locais por estratégias nacionais que devem constituir o meio adequado para cumprir as exigências das Directivas 75/442 alterada, 91/689 e 94/62.

23 Resulta dos elementos que precedem que, no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, o Reino Unido não tinha adoptado e/ou comunicado planos de gestão de resíduos susceptíveis de abranger a totalidade do seu território. Dos mesmos resulta igualmente que alguns dos planos de gestão de resíduos adoptados e comunicados à Comissão antes dessa data não satisfaziam as condições impostas pelas Directivas 75/442 alterada, 91/689 e 94/62.

24 Daqui resulta que o Reino Unido não cumpriu todas as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 7.° da Directiva 75/442 alterada e 6.° da Directiva 91/689 bem como, exceptuado o caso de Gibraltar, por força do artigo 14.° da Directiva 94/62.

25 Assim, verifica-se que, ao não elaborar planos de gestão de resíduos abrangendo todo o seu território e conformes a todas as disposições das Directivas 75/442 alterada, 91/689 e 94/62 e/ou ao não informar a Comissão de tal facto, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 7.° da Directiva 75/442 alterada e 6.° da Directiva 91/689 bem como, exceptuado o caso de Gibraltar, por força do artigo 14.° da Directiva 94/62.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

26 Por força do artigo 69.° , n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do Reino Unido e tendo este sido vencido, há que condená-lo nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

decide:

1) Ao não elaborar planos de gestão de resíduos abrangendo todo o seu território e conformes a todas as disposições da Directiva 75/442/CEE do Conselho, de 15 de Julho de 1975, relativa aos resíduos, na redacção dada pela Directiva 91/156/CEE do Conselho, de 18 de Março de 1991, da Directiva 91/689/CEE do Conselho, de 12 de Dezembro de 1991, relativa aos resíduos perigosos, e da Directiva 94/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Dezembro de 1994, relativa a embalagens e resíduos de embalagens, e/ou ao não informar a Comissão desse facto, o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 7.° da Directiva 75/442, na redacção dada pela Directiva 91/156, e 6.° da Directiva 91/689 bem como, exceptuado o caso de Gibraltar, por força do artigo 14.° da Directiva 94/62.

2) O Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte é condenado nas despesas.