62000C0444

Conclusões do advogado-geral Alber apresentadas em 4 de Julho de 2002. - The Queen, a pedido da Mayer Parry Recycling Ltd, contra Environment Agency e Secretary of State for the Environment, Transport and the Regions, e Corus (UK) Ltd e Allied Steel and Wire Ltd (ASW). - Pedido de decisão prejudicial: High Court of Justice (England & Wales), Queen's Bench Division (Administrative Court) - Reino Unido. - Directiva 75/442/CEE, alterada pela Directiva 91/156/CEE e pela Decisão 96/350/CE - Directiva 94/62/CE - Conceito de resíduo - Conceito de reciclagem - Tratamento de resíduos de embalagens metálicas. - Processo C-444/00.

Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-06163


Conclusões do Advogado-Geral


I - Introdução

1. A High Court of Justice de Londres submeteu ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial pelo qual solicita que se proceda à interpretação da Directiva 75/442/CEE do Conselho, de 15 de Julho de 1975, relativa aos resíduos (a seguir «directiva relativa aos resíduos»), e da Directiva 94/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Dezembro de 1994, relativa a embalagens e resíduos de embalagens (a seguir «directiva relativa a embalagens»). Trata-se, no essencial, de saber se o tratamento (separação, limpeza, corte, trituração, triagem e/ou compactação) de resíduos de embalagens de metal efectuado pela Mayer Parry Recycling Ltd (a seguir «MPR»), demandante no processo que deu origem aos presentes autos, constitui ou não um ciclo completo de reciclagem («recycling»), de modo a que essa sucata de metal, depois do tratamento, deixe de ser considerada um resíduo.

2. A MPR pretende vir a ser autorizada como empresa de valorização habilitada a emitir certificados de aproveitamento de resíduos de embalagens (Packaging Waste Recovery Notes, a seguir «PRN»; quanto ao seu significado, v., infra, n.° 19). A Environment Agency, territorialmente competente em Inglaterra e no País de Gales (a seguir «autoridade ambiental»), demandada no processo que deu origem aos presentes autos, atribuiu esse direito aos produtores de aço que fundem o material preparado pela MPR e produzem, a partir dele, lingotes, chapas ou bobinas de aço.

II - Enquadramento jurídico

A - Direito comunitário

1) Directiva relativa aos resíduos

3. O artigo 1.° desta directiva determina:

«Na acepção da presente directiva entende-se por:

a) resíduo: quaisquer substâncias ou objectos abrangidos pelas categorias fixadas no anexo I de que o detentor se desfaz ou tem a intenção ou a obrigação de se desfazer.»

4. No anexo I da mencionada directiva, referem-se, na posição Q 5, «[m]atérias contaminadas ou sujas na sequência de actividades deliberadas (por exemplo, resíduos de operações de limpeza, materiais de embalagem, recipientes, etc.)». O anexo, para além disso, contém outras duas posições, que são a posição Q 1, «[r]esíduos de produção ou de consumo não especificados adiante», e a posição Q 16, «[q]ualquer substância, matéria ou produto que não esteja abrangido pelas categorias acima referidas».

5. O artigo 1.° , alínea f), remete, no que tange à definição de aproveitamento, para as operações previstas no anexo II B. A categoria R 3 prevê aí a «[r]eciclagem ou [a] recuperação de metais ou compostos metálicos».

6. O artigo 3.° , n.° 1, da directiva relativa aos resíduos impõe aos Estados-Membros as seguintes medidas:

«a) Em primeiro lugar, a prevenção ou a redução da produção e da nocividade dos resíduos através, nomeadamente [...]

b) Em segundo lugar:

i) o aproveitamento dos resíduos por reciclagem, reemprego, reutilização ou qualquer outra acção tendente à obtenção de matérias-primas secundárias ou

ii) a utilização de resíduos como fonte de energia.»

2) Directiva relativa a embalagens

7. O artigo 3.° da directiva relativa a embalagens contém, entre outras, as seguintes definições:

«2. Resíduos de embalagem, qualquer embalagem ou material de embalagem abrangido pela definição de resíduo na Directiva 75/442/CEE, excluindo os resíduos de produção;

[...]

6. Valorização, qualquer das operações aplicáveis previstas no anexo II B da Directiva 75/442/CEE;

7. Reciclagem, o reprocessamento, num processo de produção, dos resíduos para o fim inicial ou para outros fins, incluindo a reciclagem orgânica, mas não a valorização energética.»

8. O artigo 6.° , n.° 1, da directiva relativa a embalagens prevê os seguintes objectivos no âmbito da valorização de resíduos de embalagens:

«A fim de dar cumprimento aos objectivos da presente directiva, os Estados-Membros tomarão as medidas necessárias para atingir os seguintes objectivos no conjunto do seu território:

a) O mais tardar cinco anos a contar da data de aplicação da presente directiva, serão valorizados um mínimo de 50% e um máximo de 65%, em peso, dos resíduos de embalagens;

b) Dentro deste objectivo global, e no mesmo prazo, serão reciclados entre um mínimo de 25% e um máximo de 45%, em peso, da totalidade dos materiais de embalagem contidos nos resíduos de embalagens, com um mínimo de 15% para cada material de embalagem;

[...]»

9. Os Estados-Membros, para atingirem as aludidas quotas de valorização, têm, nos termos do artigo 7.° , de criar sistemas de recuperação, recolha e valorização dos resíduos de embalagens.

3) Quanto às divergências resultantes da existência de diferentes versões linguísticas

10. No cerne deste litígio está o conceito de reciclagem (em alemão, «stoffliche Verwertung» ou «Rückführung»), na acepção da directiva relativa a embalagens e da directiva relativa aos resíduos. Cumpre chamar já aqui a atenção para a existência de diferenças de ordem terminológica nas diferentes versões linguísticas de ambas as directivas.

11. Na versão inglesa, utiliza-se, seja no artigo 3.° , n.° 1, alínea b), i), da directiva relativa aos resíduos, seja no artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens, o termo «recycling». Também nas línguas românicas, bem como no neerlandês, utiliza-se, nessas duas disposições, palavras derivadas de «Recycling» («recyclage», «reciclado», «riciclo», etc.). Noutras versões linguísticas, ainda que não tenham sido escolhidos termos da família de «recycling», são utilizados, em ambas as directivas, palavras iguais.

12. Apenas nas versões alemã, sueca e finlandesa é que se encontram termos diferentes nas mencionadas disposições da directiva relativa aos resíduos e da directiva relativa a embalagens. Assim, na versão alemã da directiva relativa aos resíduos, refere-se «Rückführung», sendo que, na directiva relativa a embalagens, se menciona «stoffliche Verwertung». Na proposta da Comissão para a directiva relativa a embalagens, constava, logo a seguir à expressão «stoffliche Verwertung», a palavra «Recycling» entre parênteses; este aditamento, porém, foi eliminado durante o processo legislativo.

13. Na Directiva 2000/53/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Setembro de 2000, relativa aos veículos em fim de vida (a seguir «Directiva 2000/53») , que não tem interesse directo para o presente caso, mas que é referida por algumas das partes para efeitos de comparação, fala-se também, em definitivo, na versão alemã, de «Recycling».

14. Uma vez que só num pequeno número de versões linguísticas é que se faz uso de expressões diferentes em ambas as directivas, do facto de a terminologia utilizada nessas versões ser diferente não se pode concluir que aos conceitos em causa devam ser atribuídos significados distintos. Vai-se, assim, de ora em diante, em termos linguísticos, utilizar as expressões «stoffliche Verwertung», «Rückführung» e «Recycling» como se fossem sinónimos. Isto, porém, não impede que «Recycling», «Rückführung» e «stoffliche Verwertung» tenham, na directiva relativa aos resíduos e na directiva relativa a embalagens, consoante as respectivas definições, um significado distinto, como iremos examinar.

B - Legislação nacional

15. As Producer Responsibility Obligations (Packaging Waste) Regulations 1997 (a seguir «Regulations») transpuseram para o direito interno o artigo 6.° , n.° 1, da directiva relativa a embalagens. As Regulations impõem que os produtores de resíduos de embalagens reciclem ou que, de qualquer forma, valorizem determinadas quantidades de resíduos de embalagens. O sentido das expressões «recovery» (valorização) e «recycling» (reciclagem), utilizadas nas Regulations, corresponde àquele que foi adoptado na directiva relativa a embalagens.

16. De acordo com as Regulations, o produtor tem de estar registado, tem de tomar medidas destinadas a permitir a valorização e a reciclagem de determinadas quantidades de resíduos de embalagens e tem de apresentar um certificado comprovativo de que cumpriu com os seus deveres de valorização e de reciclagem («certificate of compliance»). A violação destes deveres é punível.

17. O produtor também pode satisfazer as suas obrigações, aderindo a uma estrutura acreditada, o que, na prática, constitui a regra.

18. As autoridades britânicas para o ambiente publicaram orientações no que diz respeito à prova do cumprimento das obrigações e à acreditação voluntária das empresas de valorização («Producer Responsibility Obligations 1997: Guidance on evidence of compliance and voluntary accreditation of reprocessors»), mais conhecidas por «Orange Book» (Livro Laranja). Neste documento, estabelecem-se pormenorizadamente as exigências das autoridades para o ambiente, no que diz respeito à prova do cumprimento das obrigações de valorização e de reciclagem por parte dos produtores, e estabelece-se um sistema voluntário de acreditação para empresas de valorização, ao abrigo do qual estes últimos podem emitir PRN.

19. Uma PRN inclui a indicação, pela empresa de valorização, da quantidade de resíduos de embalagens proveniente do Reino Unido por ela aceite, a referência ao modo de valorização desses resíduos, designadamente se os mesmos vão ser reciclados, e a indicação da operação de valorização à qual o material deve ser sujeito. Mediante a apresentação das PRN, o produtor pode fazer prova, junto da autoridade ambiental, de que os resíduos de embalagens por ele entregues (ou entregues em seu nome) a uma empresa de valorização acreditada, foram devidamente valorizados ou reciclados. As PRN são transmissíveis e têm valor comercial (no caso dos resíduos de embalagens de metal em apreço nos presentes autos, esse valor foi, no ano de 2000, de 10 GBP a 15 GBP por tonelada).

20. A autoridade ambiental autoriza as empresas enumeradas no anexo D, n.° 3, do Orange Book; no que diz respeito a metais (alumínio e aço), reconhece-se como empresa de valorização a empresa que produz lingotes, chapas ou bobinas a partir de resíduos de embalagens.

21. O momento do ciclo em que é concedida a acreditação é aquele em que é produzido um produto novo que não se distingue de outro produzido a partir de matérias-primas primárias. O sistema foi concebido de modo a facilitar a aplicação administrativa e a garantir que não sejam emitidas duas PRN no decurso do tratamento dos mesmos materiais.

III - Matéria de facto do processo principal

22. A MPR obtém sucata - geralmente contra pagamento -, nomeadamente resíduos de embalagens, proveniente da indústria e de outras fontes. A MPR processa a sucata segundo a especificação de classe industrial 3 B. No essencial, são necessárias, para o efeito, as seguintes etapas de tratamento: inspecção visual, testes de radiação, trituração (fragmentação), vários processos de triagem destinados a separar matérias estranhas (por exemplo, plásticos, metais não ferrosos, vidros ou pedras), nova inspecção visual. O material 3 B contém cerca de 4,1% de metal proveniente de resíduos de embalagens. O material 3 B é vendido em seguida pela MPR a siderurgias, que a partir dele produzem lingotes, chapas, ou bobinas de aço. O material 3 B tem um elevado rendimento, em virtude do seu elevado teor em ferro, da sua grande densidade e da sua grande superfície. O preço do material 3 B é de cerca de 60 GBP por tonelada.

23. As partes no processo principal não estão de acordo quanto à determinação da quantidade de impurezas orgânicas e inorgânicas contida no material 3 B produzido pela MPR; os valores oscilam entre 2%-3% (MPR - impurezas não livres) e 7% (autoridade ambiental). São impurezas, por exemplo, resíduos de revestimentos de superfície, tais como tinta ou óleo, materiais não metálicos e elementos químicos indesejáveis. O material 3 B, uma vez que pode conter elementos potencialmente danosos, deve ser armazenado a coberto, num local estável que disponha de um sistema de drenagem para uma fossa. A remoção das impurezas só tem lugar no processo de produção de aço.

24. Os produtores de aço estão sujeitos ao «Integrated Pollution Control», regulamentado pelo Environment Protection Act 1990. Os processos de produção que utilizam têm de respeitar certas normas de protecção do ambiente e carecem de autorização. Em contrapartida, não precisam de obter a autorização prevista pelas disposições nacionais em matéria de gestão de resíduos.

25. A MPR requereu, em Novembro de 1998, a acreditação como empresa de valorização habilitada a emitir PRN. A autoridade ambiental, por ofício de 15 de Novembro de 1999, indeferiu o requerimento. A MPR recorreu para a High Court, pedindo, inter alia, a anulação desta decisão e a declaração de que desenvolve actividades de valorização e de reciclagem, na acepção da directiva relativa a embalagens.

IV - Questões prejudiciais

26. Por decisão de 9 de Novembro de 2000, a High Court suspendeu a instância e, nos termos do artigo 234.° CE, submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«Quando uma empresa trata materiais de embalagem que incluem metais ferrosos que (quando são recebidos por essa empresa) constituem resíduos na acepção do artigo 1.° , alínea a), da Directiva 75/442/CEE do Conselho, relativa a resíduos, na redacção dada pela Directiva 91/156/CEE do Conselho e pela Decisão 96/350/CE da Comissão, procedendo a operações de triagem, limpeza, corte, trituração, separação e/ou compactação, de forma a tornar esses materiais susceptíveis de serem utilizados como matéria-prima num forno para a produção de lingotes, chapas e bobinas de aço:

1) Esses materiais foram reciclados e deixam de ser resíduos para efeitos da Directiva 75/442:

a) quando se tornaram utilizáveis como matéria-prima, ou

b) quando foram utilizados por um fabricante de aço na produção de lingotes, chapas e bobinas de aço?

2) Esses materiais foram reciclados para efeitos da Directiva 94/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa a embalagens e resíduos de embalagens:

a) quando se tornaram utilizáveis como matéria-prima, ou

b) quando foram utilizados por um fabricante de aço na produção de lingotes, chapas e bobinas de aço?»

V - Alegações das partes

27. Tomaram posição, perante o Tribunal de Justiça, a MPR, a autoridade ambiental, a Corus UK Limited (a seguir «Corus») - um produtor de aço que apoiou, no processo que originou os presentes autos, os pedidos da autoridade ambiental -, os Governos do Reino Unido, neerlandês, dinamarquês e austríaco e, ainda, a Comissão.

A - Mayer Perry Recycling Limited

28. A MPR coloca a tónica na interpretação da directiva relativa aos resíduos e argumenta, no essencial, que valoriza resíduos de embalagens e que produz sucata de ferro de qualidade 3 B, que não é um resíduo, mas sim uma matéria-prima secundária. A directiva relativa a embalagens tem de ser interpretada de modo conforme à directiva relativa aos resíduos. Uma vez que a sucata de ferro 3 B não é resíduo, o tratamento realizado pela MPR tem também de ser considerado uma reciclagem completa na acepção da directiva relativa a embalagens.

29. A MPR refere, a propósito do direito comunitário, que é possível deduzir quatro características que são comuns à directiva relativa aos resíduos e à directiva relativa a embalagens.

30. Em primeiro lugar, os termos resíduo, valorização e reciclagem teriam, em ambos os diplomas, o mesmo significado. A reciclagem é um tipo específico de valorização. Na acepção da directiva, só os resíduos podem ser objecto de medidas de valorização. Em segundo lugar, o conceito de resíduo pressupõe que o seu detentor se desfaça dele. Em terceiro lugar, ambas as directivas têm por objectivo economizar matérias-primas mediante a valorização de resíduos. Em quarto lugar, distingue-se a reciclagem da valorização energética.

31. A MPR menciona, ainda, a importância económica do direito de se poder emitir PRN, que é atribuído àqueles que efectuam reciclagens. O material 3 B da MPR não é resíduo, mas sim matéria-prima secundária, o que decorre do facto de a MPR processar a sucata de modo a que esta possa ser utilizada pelos produtores de aço como se de matéria-prima primária se tratasse. Os produtores de aço não valorizam quaisquer resíduos, pelo que, consequentemente, também não podem ser considerados empresas de reciclagem.

32. No âmbito das suas observações sobre a primeira questão prejudicial, a MPR refere as seguintes linhas de orientação plasmadas na jurisprudência comunitária ou apresentadas nas conclusões dos advogados-gerais: é ao juiz nacional que compete, depois de consideradas todas as circunstâncias, decidir se certo material é um resíduo . A questão decisiva para a qualificação de resíduo é saber se o detentor se desfaz da substância . Deve distinguir-se entre a valorização de resíduos e o tratamento industrial normal de produtos . A valorização só deve ser tida por concluída quando o material valorizado puder ser empregue directamente num processo de produção como matéria-prima secundária .

33. Em contrapartida, a MPR opõe-se à tese da autoridade ambiental, nos termos da qual a valorização só está concluída num momento posterior, que é aquele em que, analisado o produto final, não se consegue apurar se o mesmo foi elaborado a partir de resíduos ou de matérias-primas primárias. Esta argumentação, assente na definição de reciclagem («recycling») contida na directiva relativa a embalagens, não é susceptível de ser sustentada com êxito. A directiva relativa a embalagens constitui uma regulamentação subordinada à directiva relativa aos resíduos e não pode definir o conceito de reciclagem de forma divergente desta última.

34. O facto de o artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens referir, no âmbito da definição de reciclagem, o reprocessamento no contexto de um processo de produção, apenas serve o propósito de permitir fazer a distinção com a valorização energética. De qualquer modo, o processo utilizado pela MPR consubstancia um processo de produção nos termos do qual se obtém uma matéria-prima secundária, que é a sucata 3 B. Este material não é resíduo, pois tem um valor económico e não apresenta o perigo de o seu detentor se desfazer dele.

35. A MPR sugere que se diferencie matéria-prima secundária de resíduo, com base nos seguintes critérios: aptidão do material para ser utilizado, com ou sem a realização de outros pré-tratamentos; valor económico e perigos que o material comporta para o ambiente. Segundo a MPR, é ao tribunal que submeteu o presente pedido de decisão prejudicial que cabe esclarecer em que medida estes requisitos estão ou não preenchidos.

36. Porém, para o caso de o Tribunal de Justiça entender dever debruçar-se sobre esta questão, a MPR sustenta que o material 3 B preenche efectivamente os requisitos para ser considerado matéria-prima secundária. Aquele material, tal como o minério de ferro, pode ser utilizado directamente na produção de aço, sem sujeição a quaisquer tratamentos adicionais. O material 3 B não está sujeito a medidas especiais destinadas a proteger o ambiente, seja no momento do armazenamento, seja no momento do transporte, seja ainda no do seu emprego na produção de aço.

37. A MPR alega, quanto à segunda questão prejudicial, que um material que foi integralmente valorizado e que já não é resíduo na acepção da directiva relativa aos resíduos tem também de ser considerado reciclado na acepção da directiva relativa a embalagens.

B - Autoridade ambiental

38. A autoridade ambiental, tal como a MPR, entende que ambas as directivas assentam num mesmo entendimento dos conceitos de «resíduo» e de «valorização». Contudo, ao invés daquilo que é defendido pela MPR, considera que o tratamento que é levado a cabo pela MPR não constitui uma reciclagem completa. Só após a fundição do material 3 B e do fabrico, pelos produtores, de aço, de lingotes, chapas e bobinas, é que está concluída a valorização e o produto deixa de ser qualificado de resíduo.

39. No que toca à relação entre as duas questões prejudiciais, a autoridade ambiental entende que ambas as directivas têm de ser interpretadas num mesmo contexto. Na directiva relativa a embalagens apenas se explicita de forma mais pormenorizada o que se deve entender por reciclagem, enquanto forma específica de valorização. O artigo 2.° , n.° 2, da directiva relativa aos resíduos admite expressamente a possibilidade de existirem directivas específicas para categorias especiais de resíduos, tais como os resíduos de embalagens. Uma vez que ambas as directivas têm por objectivo incentivar a valorização dos resíduos, há que tomar por base a mesma definição de «valorização». Findo o processo de reciclagem completo, tal como este é entendido na directiva relativa a embalagens, o material valorizado já não pode ser considerado resíduo à luz da directiva relativa aos resíduos.

40. A autoridade ambiental entende que deve ser o próprio Tribunal de Justiça a responder à primeira questão. Ao contrário do pretendido pela MPR, não devem ser os Estados-Membros a ajuizar qual o momento em que se deve considerar que os resíduos estão totalmente valorizados, pois tal seria contrário ao objectivo da aproximação das legislações a nível comunitário. Os conceitos de resíduo e de valorização são suficientemente concretos, não necessitando de quaisquer medidas de execução do direito nacional para serem directamente aplicáveis.

41. A autoridade ambiental remete ainda para a jurisprudência nos termos da qual o conceito de resíduo deve ser interpretado em sentido lato e, ainda, para os objectivos da directiva relativa aos resíduos, que são a limitação da produção de resíduos, a promoção da valorização e a proibição da eliminação não controlada de resíduos.

42. A directiva relativa aos resíduos não prevê em que momento é que certo material perde a qualidade de resíduo. Em todo o caso, não basta que o resíduo chegue às mãos daquele que vai valorizar o material ou que pretende proceder a outro tratamento. O facto de os resíduos serem sujeitos a uma das operações de aproveitamento descritas no anexo II B da directiva relativa aos resíduos pode efectivamente conduzir à perda da qualidade de resíduo; no entanto, isto não tem forçosamente de ser assim, como o declarou o Tribunal de Justiça .

43. A MPR não efectua reciclagens, mas apenas um pré-tratamento, que consiste na triagem e na alteração da composição dos resíduos. A MPR é, consequentemente, um produtor de resíduos na acepção do artigo 1.° , alínea b), da directiva relativa aos resíduos. O tratamento que a MPR efectua não consubstancia um reprocessamento num processo de produção, nos termos do artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens. Também na Directiva 2000/53 o correspondente processamento de veículos em fim de vida é considerado um pré-tratamento e não uma reciclagem.

44. A autoridade ambiental contesta o argumento da MPR, nos termos do qual a sucata 3 B seria matéria-prima secundária e teria, assim, sido objecto de reciclagem. Nem toda a valorização se destina à obtenção de matérias-primas secundárias. Da jurisprudência do Tribunal de Justiça também não resulta que todo o material transformado em matéria-prima secundária tenha perdido a qualidade de resíduo. A aptidão para se ser utilizado como matéria-prima não exclui a qualificação como resíduo.

45. A autoridade ambiental impugna, ainda, a afirmação da MPR, nos termos da qual não é necessário tomar medidas especiais para a protecção do ambiente no âmbito da manipulação de material 3 B. Os produtores de aço, que utilizam material 3 B, estão sujeitos ao «Integrated Pollution Control».

46. Além disso, o Tribunal de Justiça - ao contrário de alguns advogados-gerais - não tem considerado que, para efeitos da qualificação de certo material como resíduo, seja determinante saber se existe ou não a necessidade de se tomarem medidas especiais para a protecção do ambiente quando da manipulação desse material, ou se do mesmo advêm ou não perigos para o ambiente .

47. A autoridade ambiental propõe que à segunda questão prejudicial seja respondido, com base no exposto a propósito da primeira questão, que os resíduos de embalagens só devem ser considerados reciclados no momento em que são produzidos lingotes, chapas ou bobinas de aço.

C - Corus UK Limited

48. Segundo a Corus, só interessa responder à segunda questão prejudicial. Cabe ao Estado-Membro escolher o momento a partir do qual se considera que o material foi objecto de uma reciclagem completa e decidir se ainda se trata de resíduo ou não, desde que sejam respeitados os objectivos constantes da directiva relativa a embalagens.

49. O Reino Unido, ao considerar concluído o ciclo da reciclagem quando são produzidos lingotes, chapas e bobinas pelos produtores de aço, escolheu um momento preciso e identificável com toda a exactidão. O material 3 B deve, consequentemente, ser considerado resíduo.

50. É exclusivamente à luz da directiva relativa a embalagens que se deve determinar se certo material foi ou não reciclado. O essencial é saber se o material pode ou não ser utilizado de novo na produção de embalagens ou para outros fins produtivos. Só os produtos da Corus preenchem este pressuposto, sendo que o mesmo não se passa com os anteprodutos da MPR. O modo de se realizar a prova da reciclagem pode - na falta de regras comunitárias a este propósito - ser determinado por cada Estado-Membro.

51. As empresas de valorização canalizam as receitas provenientes da emissão de PRN para a construção de novas instalações. Contribuem, assim, para o aumento da taxa de reciclagem de resíduos de embalagens de metais, a qual é ainda muito baixa. A MPR, ao invés, não tem o mesmo interesse económico na valorização de resíduos de embalagens, pois estes só constituem uma ínfima parte do material por ela processado. Se a MPR estivesse autorizada a emitir PRN, existiria o perigo de processar material 3 B em grandes quantidades, que depois se limitaria a armazenar.

D - Governo dinamarquês

52. O Governo dinamarquês partilha, no essencial, do entendimento da autoridade ambiental. Entende que o conceito de resíduo deve ser interpretado de forma ampla, de modo a garantir a fiscalização do fluxo de resíduos, bem como a eliminação e a valorização de resíduos. Logo que um material tenha perdido a qualidade de resíduo, deixa de estar sujeito aos correspondentes controlos. Assim, deixa de ser aplicável, designadamente, o disposto no Regulamento (CEE) n.° 259/93 do Conselho, de 1 de Fevereiro de 1993, relativo à fiscalização e ao controlo das transferências de resíduos no interior, à entrada e à saída da Comunidade Europeia (a seguir «Regulamento n.° 259/93») . De acordo com a jurisprudência, o valor económico ou a capacidade de valorização de um material não desempenham nenhum papel para efeitos da definição de resíduo.

53. A sucata de metal processada pela MPR constitui um resíduo. O reprocessamento referido na definição de reciclagem pressupõe uma alteração da composição que permite que o produto seja de novo directamente utilizado. Só os produtos fabricados pelos produtores de aço preenchem este pressuposto.

54. Na Dinamarca, a recolha e a triagem não são consideradas aproveitamento, mas sim pré-tratamento. Este pré-tratamento pode e deve, em determinadas circunstâncias, anteceder a eliminação de resíduos, como resulta, por exemplo, do disposto no artigo 6.° da Directiva 1999/31/CE do Conselho, de 26 de Abril de 1999, relativa à deposição de resíduos em aterros , e no artigo 6.° da Directiva 2000/76/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Dezembro de 2000, relativa à incineração de resíduos .

55. Se nem mesmo a valorização completa de um material conduz necessariamente à perda da qualidade de resíduo, como já foi decidido pelo Tribunal de Justiça , então, o mero pré-tratamento, por maioria de razão, também não conduz a esse resultado.

E - Governo neerlandês

56. O Governo neerlandês, a propósito da primeira questão prejudicial, alega que o momento em que um material é tido por valorizado coincide com o momento em que perde a qualidade de resíduo. O Tribunal de Justiça, no acórdão ARCO Chemie Nederland e o., sublinhou a importância do significado do termo «desfazer-se» para a definição do conceito de resíduo . O conceito de resíduo, de acordo com os objectivos da directiva relativa aos resíduos, tem de ser interpretado de modo extensivo.

57. De acordo com a directiva relativa aos resíduos, existe reciclagem não apenas quando os resíduos são utilizados num processo de produção mas também quando os mesmos são aproveitados para efeitos de obtenção de matéria-prima secundária. A questão de saber se os resíduos se transformaram ou não em matéria-prima secundária com as mesmas características que a matéria-prima primária depende da questão de saber se o dono dessas substâncias pretende ou não desfazer-se delas.

58. Têm, assim, de ser cumulativamente considerados os seguintes requisitos: o material tem de ter uma composição tal que permita que o mesmo possa ser aplicado do mesmo modo que a matéria-prima primária correspondente. Não deve conter mais impurezas que a matéria-prima primária. O material deve poder ser utilizado sem que tenha de ser sujeito a mais pré-tratamentos. Dessa utilização não podem advir maiores perigos ambientais do que aqueles que resultariam da utilização de matéria-prima primária. A utilização não pode limitar-se a consistir num mero processo de aproveitamento. Por último, o material não pode ter um valor económico negativo.

59. Consequentemente, cumpre responder à primeira questão prejudicial que os resíduos de embalagens de metais devem ser considerados aproveitados na acepção da directiva relativa aos resíduos, e não resíduos, quando os acima mencionados requisitos estiverem preenchidos e o material puder, portanto, ser utilizado como matéria-prima primária.

60. O Governo neerlandês considera, quanto à segunda questão prejudicial, que o conceito de reciclagem plasmado na directiva relativa a embalagens diverge daquele que consta da directiva relativa aos resíduos. Nos termos da directiva relativa a embalagens, só se considera que se procedeu a reciclagem de resíduos quando estes foram reutilizados no âmbito de um processo de produção, ou seja, no presente caso, quando os mesmos foram utilizados na produção de lingotes, chapas e bobinas de aço. Só com o efectivo emprego num processo de produção é que são atingidos os objectivos da economização de energia e de matérias-primas primárias. Além do mais, só assim se garante que, no âmbito da análise do respeito das quotas de reciclagem previstas no artigo 6.° da directiva relativa a embalagens, não se esteja a proceder a uma duplicação na contabilização.

F - Governo austríaco

61. O Governo austríaco, no âmbito da sua análise da primeira questão prejudicial, faz notar que o conceito de reciclagem não se encontra regulamentado na directiva relativa aos resíduos, mas sim na directiva relativa a embalagens. A Directiva 2000/53 contém também uma definição semelhante. Estes conceitos assentam numa ideia de utilização num processo de produção e são mais restritivos do que o conceito de aproveitamento contido na directiva relativa aos resíduos.

62. O Governo austríaco, no que diz respeito ao conceito de resíduo, remete para as constatações contidas no acórdão do Tribunal de Justiça, ARCO Chemie Nederland e o. . Para efeitos de apuramento do momento em que se considera completada a operação de aproveitamento, relevam os seguintes requisitos: a matéria ser normalmente utilizada para um certo fim, existindo um mercado para ela; existirem critérios de qualidade que tenham em consideração as características próprias de resíduo; por fim, não resultar da matéria um risco para o meio ambiente maior do que aquele que resulta de matérias-primas comparáveis.

63. O Governo austríaco, no que toca à segunda questão, refere que a reciclagem não tem de ocorrer num único momento. Deve-se, assim, analisar, em cada fase da operação, se da mesma resulta uma valorização ou apenas uma valorização fictícia.

64. Resumindo, o Governo austríaco considera que a MPR realiza uma valorização de resíduos que apenas constitui uma fase preliminar da reciclagem na acepção da directiva relativa a embalagens.

G - Governo do Reino Unido

65. O Governo do Reino Unido entende que a resolução do litígio depende apenas da resposta que for dada à segunda questão prejudicial, à qual dedica, portanto, o essencial das suas observações.

66. Salienta que os resíduos de embalagens só podem ser reciclados uma única vez, ainda que tal possa suceder em várias fases. Há que evitar que o processo de valorização do mesmo material seja contabilizado mais do que uma vez no âmbito das contagens para efeitos do controlo das quotas de reciclagem previsto no artigo 6.° , n.° 1, alínea b), da directiva relativa a embalagens. No presente caso, a reciclagem é efectuada pelos produtores de aço.

67. O tratamento de resíduos feito pela MPR não corresponde à definição de reciclagem prevista no artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens. A separação, a limpeza, a trituração e a compactação não constituem um processo de produção.

68. Também não se trata de um reprocessamento, pois os resíduos mantêm as suas características essenciais, não sendo transformados num novo produto. Um reprocessamento implica uma utilização semelhante à utilização inicial, ou seja, a fundição do material em substituição de matéria-prima primária e a produção de lingotes, chapas e bobinas de aço. O tratamento preliminar efectuado pela MPR para permitir essa utilização não é, em si mesmo, um reprocessamento. Só este entendimento se coaduna com o objectivo plasmado no artigo 6.° , n.° 2, da directiva relativa a embalagens, de fabricar, na medida do possível, a partir de material proveniente de resíduos de embalagens reciclados, novas embalagens ou outros produtos.

69. O Governo do Reino Unido alicerça esta interpretação procedendo a uma comparação com o disposto na Directiva 2000/53, que, segundo o mesmo, contém um regime jurídico idêntico ao da directiva relativa a embalagens.

70. O Governo do Reino Unido opõe-se à interpretação conjunta da directiva relativa a embalagens e da directiva relativa aos resíduos, proposta pela MPR. A directiva relativa aos resíduos não contém definições vinculativas para todas as demais regulamentações relacionadas com esta matéria; pelo contrário, as definições contidas no artigo 1.° da directiva relativa aos resíduos destinam-se expressamente a ser utilizadas neste diploma.

71. O legislador comunitário, quando pretende adoptar noutros diplomas os conceitos previstos na directiva relativa aos resíduos, faz expressa menção desse facto. A directiva relativa a embalagens contém, em algumas passagens, esse tipo de menção; no demais, devem os conceitos adoptados ser autonomamente interpretados.

72. O artigo 2.° , n.° 2, da directiva relativa aos resíduos prevê expressamente a adopção de disposições específicas - como é, por exemplo, o caso da directiva relativa a embalagens. A directiva relativa a embalagens define autonomamente o conceito de «reciclagem» e de «valorização». O artigo 3.° , n.° 6, faz apenas referência às operações aplicáveis («applicable operations») previstas no anexo II B da directiva relativa aos resíduos .

73. Resulta do anexo II B da directiva relativa aos resíduos que um mesmo resíduo pode passar por várias fases no âmbito da operação de aproveitamento. Os resíduos metálicos podem, por exemplo, ser armazenados num primeiro momento (R 12), sendo apenas recuperados num segundo momento (R 3). Por estas razões, a reciclagem só pode ocorrer uma única vez. Só as medidas previstas na lista do anexo II B da directiva relativa aos resíduos, as quais constituem uma reciclagem, podem consubstanciar uma operação aplicável, na acepção do estatuído no artigo 3.° , n.° 6, da directiva relativa a embalagens.

74. A directiva relativa a embalagens contém definições autónomas dos conceitos de «reciclagem», «valorização energética» e «reciclagem orgânica» (artigo 3.° , n.os 7 a 9). Não são mencionadas outras formas de valorização. Só as formas de valorização expressamente referidas consubstanciam processos de valorização aplicáveis no âmbito da directiva relativa a embalagens. Entre essas formas e valorização só a reciclagem é que pode ser aplicada a metais.

75. Não basta que a MPR execute uma operação de aproveitamento prevista no anexo II B da directiva relativa aos resíduos; o que tem de fazer é aplicar um processo previsto na directiva relativa a embalagens - ou seja, a reciclagem.

76. Para garantir que os resíduos de embalagens valorizados sejam quantificados segundo critérios uniformes a nível comunitário, impõe-se adoptar um critério claro e definido que permita determinar em que momento devem os materiais ser considerados completamente valorizados. Assim sendo, não é atribuída aos Estados-Membros qualquer margem de apreciação. O momento mais indicado é aquele em que a sucata de metal é novamente fundida.

77. A directiva relativa a embalagens tem por objectivo o efectivo reprocessamento. Sempre que os resíduos de embalagens apenas tenham sido preparados para efeito de reprocessamento, não está garantida a sua utilização efectiva, a saber, a sua fundição.

78. Uma substância deve ser considerada material de embalagem reciclado, para efeitos do disposto no artigo 6.° , n.° 1, alínea b), da directiva relativa a embalagens, quando preencha dois requisitos: o material de embalagem tem de ter sido resíduo de embalagem e ter sido objecto de reciclagem. É irrelevante saber se esse material, em algum momento, deixou de ser resíduo na acepção da directiva relativa aos resíduos.

79. Nestes termos, o Governo do Reino Unido conclui que, uma vez que a directiva relativa a embalagens não contém qualquer referência nesse sentido, não há que proceder a uma interpretação conjugada de ambas as directivas.

80. O Governo do Reino Unido apenas se pronuncia a título subsidiário sobre a primeira questão prejudicial. A directiva relativa aos resíduos, ao contrário da directiva relativa a embalagens, concede aos Estados-Membros margem para apreciar o que é ou não uma medida de aproveitamento . O facto de um material ter sofrido uma valorização na acepção da directiva relativa aos resíduos não permite concluir que houve uma operação de valorização aplicável no quadro da directiva relativa a embalagens.

81. O Tribunal de Justiça confirmou a necessidade de concretização do conceito de valorização mediante regras nacionais de transposição . A directiva relativa a embalagens, ao invés, apenas admite a existência de três tipos de valorização (reciclagem, valorização energética e reciclagem orgânica), não concedendo, a este respeito, aos Estados-Membros, qualquer margem de apreciação.

82. A directiva relativa a embalagens também não alterou retroactivamente a interpretação da directiva relativa aos resíduos, que é mais antiga. Seria contrário ao princípio da segurança jurídica atribuir à directiva relativa aos resíduos, após a adopção da directiva relativa a embalagens, um significado que não tinha antes.

H - Comissão

83. A Comissão defende, no essencial, a mesma posição que a autoridade ambiental. Os conceitos de «resíduo» e de «valorização» têm o mesmo significado na directiva relativa aos resíduos e na directiva relativa a embalagens. A definição específica de reciclagem, contida na directiva relativa a embalagens, serve os objectivos previstos na mesma (primazia da reciclagem sobre a valorização energética).

84. A actividade da MPR consubstancia uma fase no processo de valorização, sendo que esta só fica completa com a fundição nos fornos. Só neste momento é que deixa de existir resíduo. O que não se altera minimamente pelo facto de os produtos da MPR disporem de valor económico. O material processado, mesmo após a valorização completa, pode continuar a ser resíduo. Por maioria de razão, será assim quando a valorização consiste na simples separação e sujeição a pré-tratamento para posterior emprego como matéria-prima secundária.

85. A Comissão conclui das alegações apresentadas pelas partes perante o tribunal nacional que o material 3 B ainda contém impurezas que só são eliminadas no momento da sua fundição e que o seu manuseamento requer a tomada de medidas especiais de protecção do ambiente. O que demonstra que ainda se trata de resíduo.

86. A Comissão, por fim, coloca a tónica na necessidade de uma definição clara de resíduo, designadamente para efeitos de aplicação do Regulamento n.° 259/93, ainda que este não tenha, para o presente caso, relevância directa.

VI - Apreciação jurídica

A - A relação entre a directiva relativa aos resíduos e a directiva relativa a embalagens

87. As partes defendem posições diferentes quanto à questão de saber qual a relação que existe entre as duas directivas e os conceitos de resíduo, de valorização e de reciclagem que elas contêm.

88. A maioria entende que as directivas devem ser interpretadas de forma conjugada e que os mencionados conceitos nelas contidos têm o mesmo significado. Os defensores desta tese consideram, deste modo, ser primordial responder a ambas as questões prejudiciais. Uma vez que, em seu entender, os conceitos contidos em ambas as directivas têm o mesmo significado, existe coincidência entre as respostas sugeridas para as duas questões submetidas ao Tribunal de Justiça. Com a excepção da MPR, entendem que a actividade por esta exercida não consubstancia um processo de reciclagem completo, mas sim um pré-tratamento ou qualquer outra operação de valorização. O material 3 B produzido é um resíduo. A MPR conclui o contrário.

89. O Governo do Reino Unido e a Corus, por seu turno, consideram que a directiva relativa a embalagens deve ser interpretada e aplicada de forma autónoma e que apenas a segunda questão prejudicial importa para a resolução do litígio no processo principal.

90. A este respeito, há que observar antes de mais que foi a directiva relativa aos resíduos que introduziu, em 1975, a primeira regulamentação de base destinada a obter uma harmonização da legislação dos vários Estados-Membros em matéria de eliminação de resíduos. A Comunidade Europeia limitou-se, no início do desenvolvimento desta área do direito, a estabelecer nessa directiva umas poucas e vagas disposições-quadro.

91. Sobretudo, não definiu com precisão o que são resíduos. A directiva relativa aos resíduos foi profundamente revista em 1991 . Porém, a definição de resíduo manteve-se praticamente inalterada, o que colocou frequentemente o Tribunal de Justiça perante difíceis questões de interpretação, às quais nem sempre se conseguiu responder de forma satisfatória.

92. Em 1991 foi, com efeito, introduzido o actual artigo 2.° , n.° 2, que prevê expressamente a adopção de disposições específicas ou complementares, noutras directivas, tendo em vista a gestão de determinadas categorias de resíduos. A directiva relativa a embalagens constitui uma tal regulamentação específica complementar.

93. O artigo 2.° , n.° 2, da directiva relativa aos resíduos parece efectivamente conter uma autorização legislativa. Na realidade, não existe necessidade dessa autorização. A competência para adoptar directivas em matéria de gestão de resíduos resulta directamente do Tratado CE, sendo que, no caso da directiva relativa a embalagens, essa competência resulta do estatuído no artigo 100.° -A do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 95.° CE). Ou seja, também sem a previsão do artigo 2.° , n.° 2, da directiva relativa aos resíduos, teria a Comunidade Europeia poderes para adoptar outras directivas específicas sobre resíduos.

94. Não existe, assim, nenhuma hierarquia de normas entre as duas directivas, no sentido de que a directiva relativa aos resíduos tem primazia sobre a directiva relativa a embalagens. Trata-se, isso sim, de dois actos legislativos de igual valor fundados directamente no Tratado. A directiva relativa a embalagens constitui, a este respeito, uma lei especial quanto à categoria de resíduos nela referida, e, em caso de colisão de normas, prevalece sobre a directiva relativa aos resíduos.

95. Contudo, isto não significa que a directiva relativa aos resíduos não tenha importância para a manipulação de resíduos de embalagens. Por um lado, muitas disposições da directiva relativa a embalagens remetem para a directiva relativa aos resíduos. As remissões para as definições contidas na directiva relativa aos resíduos tornam-nas aplicáveis também no âmbito da directiva relativa a embalagens. Deste modo, tem-se em consideração o objectivo, previsto no terceiro considerando da Directiva 91/156 (que altera a directiva relativa aos resíduos ), de se recorrer a uma terminologia comum para a legislação comunitária em matéria de resíduos.

96. Existem remissões deste tipo a propósito da definição de resíduos de embalagens, no artigo 3.° , n.° 2, da directiva relativa a embalagens, e a propósito da definição de valorização, no artigo 3.° , n.° 6, dessa mesma directiva. Porém, o conceito de reciclagem é definido no artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens, sem qualquer referência à directiva relativa aos resíduos.

97. Por outro lado, os resíduos de embalagens são, eles próprios, resíduos no sentido do exposto na directiva relativa aos resíduos, tal como resulta do próprio artigo 3.° , n.° 2, da directiva relativa a embalagens. Salvo disposição em contrário da directiva relativa a embalagens, todas as outras disposições pertinentes em matéria de resíduos aplicam-se, portanto, também aos resíduos de embalagens. A Comunidade não quis, com a directiva relativa a embalagens, criar uma regulamentação exaustiva para os resíduos de embalagens, retirando esta categoria de resíduos do âmbito de aplicação de outras disposições relativas a resíduos.

98. Assim, a directiva relativa a embalagens contém regras pormenorizadas sobre a valorização de resíduos de embalagens, mas já não contém regras sobre, por exemplo, a sua eliminação ou a sua passagem nas fronteiras. Ou seja, as regras contidas nos artigos 4.° e 5.° da directiva relativa aos resíduos e no Regulamento n.° 259/93 devem também ser respeitadas na manipulação dos resíduos de embalagens.

99. Por fim, devem ainda, no âmbito da interpretação da directiva relativa a embalagens, ser respeitados os princípios contidos na directiva relativa aos resíduos, uma vez que é esta que contém a estratégia global da Comunidade para a gestão de resíduos . A própria directiva relativa a embalagens insere-se nessa estratégia global.

100. Consequentemente, ambas as directivas prosseguem, no essencial, os mesmos objectivos, que são, em primeiro lugar, a prevenção e a redução da produção dos resíduos e, em segundo lugar, a sua valorização em vez da eliminação . O que, no final, visa servir a prossecução do objectivo da utilização prudente e racional dos recursos naturais, tal como previsto no artigo 174.° , n.° 1, terceiro travessão, CE.

101. No entanto, a directiva relativa a embalagens vai mais longe do que a directiva relativa aos resíduos, visto determinar objectivos quantificados quanto à quota de resíduos de embalagens que devem ser valorizados e reciclados.

B - Relação entre o conceito de resíduo e a reciclagem

102. Um elemento de importância decisiva para a resolução do litígio é a relação entre a qualificação como resíduo e a execução de um processo de reciclagem. É facto assente que a MPR processa resíduos de embalagens. Se a reciclagem conduzisse à perda desta qualidade, então o importante seria exclusivamente a interpretação da directiva relativa a embalagens, a qual contém disposições específicas quanto à reciclagem de resíduos de embalagens.

103. Entende o Tribunal de Justiça que a execução completa de uma operação de aproveitamento, tal como prevista no anexo II B, não retira necessariamente a um material a sua qualidade de resíduo . Essa execução apenas constitui um dos elementos que deve ser tomado em consideração para determinar se se trata ou não de um resíduo. Contudo, esta afirmação não é, sem mais, aplicável à reciclagem.

104. Não é teoricamente de excluir que o material obtido no final de um processo de reciclagem seja, ainda assim, um resíduo. Caso não existisse, dentro de um determinado período de tempo, procura para o material reciclado, e caso os custos de armazenamento ultrapassassem o previsível valor de uma sua hipotética venda, então seria pensável que a empresa de valorização se quisesse desfazer do seu produto. Na prática, porém, deve ser extremamente raro o caso em que o detentor se queira desfazer do material reciclado, que necessariamente lhe acarretou custos.

105. Inclusivamente, seria contrário ao sentido e à finalidade da directiva relativa a embalagens considerar que resíduos de embalagens reciclados ainda são resíduos. O objectivo principal da directiva relativa a embalagens é que seja atingida uma quota de valorização devidamente quantificada. Se os resíduos de embalagens não perdessem, em regra, através da reciclagem, a sua qualidade de resíduo, então poderiam ser sujeitos, uma segunda vez, a um processo de valorização. O mesmo material seria então valorizado duas vezes e, na óptica do preenchimento da quota de valorização, seria contabilizado duas vezes.

106. A maioria das partes alega que ambas as directivas devem ser lidas «de forma conjugada» e defende que os resíduos perdem a qualidade de resíduo após a sujeição ao processo de reciclagem. Em especial, a MPR relaciona a manutenção ou a perda da qualidade de resíduo do material processado com a conclusão de um processo de valorização. A definição de reciclagem é, assim, determinada a partir do seu resultado.

107. Este princípio ignora que a directiva relativa a embalagens contém uma definição de reciclagem que é lei especial quanto ao disposto na directiva relativa aos resíduos. Ao concluir-se pela existência ou inexistência da qualidade de resíduo de certo material em função da sua sujeição a um processo de reciclagem, não se está a tomar devidamente em conta essa relação. No âmbito da tese ora defendida acerca dessa mesma relação, cabe, pelo contrário, analisar se foi ou não executado um processo de reciclagem. Se foi esse o caso, então há, em regra, que concluir que o material valorizado perdeu a sua qualidade de resíduo.

108. Há aqui que ter em linha de conta que, de acordo com jurisprudência constante, a questão de saber se certo material é ou não resíduo tem sido respondida não com base nas qualidades que o material evidencia, mas sim em virtude do comportamento que o seu detentor adopta, nomeadamente, se quer ou não desfazer-se do material . O Tribunal de Justiça tem assim recusado fazer depender a classificação de resíduo do seu valor económico, da sua aptidão para vir a ser reutilizado ou dos riscos que ele apresenta para o meio ambiente.

109. A avaliação do comportamento do detentor só pode ter lugar caso se tenham em conta as suas intenções, o que coloca perante dificuldades consideráveis quem quer que tenha de fazer aplicação do direito. O Tribunal de Justiça resolve este problema deduzindo de elementos objectivos a intenção de se desfazer da substância; para tal, considera não só todas as circunstâncias do caso concreto como os objectivos da directiva relativa aos resíduos .

110. Assim, para se poder responder à questão de saber se o material 3 B deve ser classificado como resíduo, devem ser tidas em conta todas as circunstâncias que possam indiciar que o detentor do material vai ou não desfazer-se dele. Neste contexto, é essencial determinar se o material já foi sujeito a reciclagem. Se não foi esse o caso, então outro ponto de referência poderá ser determinar se o material vai ser sujeito a tal processo de valorização. Nestes termos, analisar as operações executadas pela MPR e pelos produtores de aço à luz do artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens consubstancia uma questão prévia da qualificação do material 3 B como resíduo, e não o contrário.

111. É verdade que o Tribunal de Justiça declarou que a execução de uma das operações previstas no anexo II A ou no anexo II B da directiva relativa aos resíduos não permite por si só concluir que o detentor do material em causa queira desfazer-se dele, uma vez que o processo de valorização ou de eliminação de resíduos por vezes só dificilmente se distingue do tratamento de outros produtos .

112. Estas conclusões, porém, não são contraditórias com a tese ora defendida. Ao contrário do que sucedia nos casos julgados através dos acórdãos citados, o material a reciclar era (pelo menos originariamente) resíduo de embalagens. Trata-se apenas de apurar se o material mantém a qualidade de resíduo. A classificação das operações que já foram levadas a cabo ou que ainda vão ser executadas tem, no presente caso, um significado diferente do que nos casos em que cumpre apurar primeiro se o material a tratar é ou não resíduo.

113. Além do mais, não se pode deduzir a qualidade de resíduo de uma operação de aproveitamento prevista no anexo II B da directiva relativa aos resíduos, mas sim da execução de uma operação de reciclagem, que é definida de modo mais pormenorizado no artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens do que as operações previstas no anexo II B.

114. A tese ora defendida não implica uma alteração retroactiva do conceito de resíduo. A classificação de um material, à luz da directiva relativa aos resíduos, sempre dependeu de saber se o seu detentor se quer desfazer dele. A directiva relativa aos resíduos não estabelece quais os critérios que devem ser utilizados para que se apure a vontade do detentor . Há aqui que atender - como já foi referido - ao conjunto de circunstâncias do caso concreto. Neste quadro podem relevar não apenas circunstâncias factuais mas também todo o contexto normativo, ainda que as regras aplicáveis tenham sido adoptadas só após a directiva relativa aos resíduos.

C - Ordem de análise das duas questões prejudiciais

115. Resulta do alegado em A e em B que a questão de saber qual o processo que consubstancia um processo de reciclagem completo tendente à transformação de resíduos de embalagens em aço não depende de saber se os materiais que são o resultado de cada um desses processos devem ou não ser ainda classificados como resíduos à luz da directiva relativa aos resíduos. Pelo contrário, a perda da qualidade de resíduo resulta precisamente da qualificação da operação executada.

116. Consequentemente, não parece ser necessário responder à primeira questão prejudicial, atendendo às questões levantadas no âmbito do processo que deu origem aos presentes autos. De qualquer modo, cumpre analisar primeiro a segunda questão.

D - Quanto à segunda questão prejudicial

117. O artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens determina o que deve ser entendido por reciclagem («recycling») na acepção dessa directiva. Esta disposição é a peça essencial para se poder responder à segunda questão prejudicial. Tanto quanto se sabe, o Tribunal de Justiça ainda não se pronunciou acerca do conceito de reciclagem. Antes de se proceder a uma interpretação do texto daquela norma, cabe analisar sucintamente o contexto do direito comunitário, o significado do conceito à luz dos objectivos da directiva relativa a embalagens e o desenvolvimento do conceito de reciclagem no processo legislativo que deu lugar à adopção desta directiva.

1) Notas preliminares

a) A reciclagem no direito comunitário

118. Foi na directiva relativa a embalagens que surgiu, pela primeira vez, uma definição completa do conceito de reciclagem («Recycling»), que, sucintamente, se descreveu como a recuperação, para nova aplicação, dos materiais de que a embalagem é feita. Este método de valorização de resíduos de embalagens apresenta duas vantagens. Em primeiro lugar, o material reciclado já não tem de ser eliminado como resíduo. Em segundo lugar, poupa-se energia e matérias-primas.

119. Este princípio já é referido numa série de actos legislativos mais antigos. Assim, o conceito de reciclagem («recycling») - embora não aconteça na versão alemã - já é mencionado no artigo 3.° , n.° 1, alínea b), i), da directiva relativa aos resíduos. A MPR baseia-se decisivamente nesta disposição, na qual a reciclagem está directamente relacionada com a obtenção de matérias-primas secundárias. Também o tribunal nacional menciona, na alternativa a) de ambas as questões prejudiciais, o aspecto da obtenção de matérias-primas secundárias.

120. A ideia de reciclagem surgiu também no artigo 2.° , alínea e), da Directiva 85/339/CEE do Conselho, de 27 de Junho de 1985, relativa a embalagens para líquidos alimentares , que foi revogada pela directiva relativa a embalagens . Cabe também mencionar o artigo 3.° da Directiva 75/439/CEE do Conselho, de 16 de Junho de 1975, relativa à eliminação de óleos usados .

121. Abstraindo do facto de estas regulamentações específicas terem pouca relevância no âmbito dos resíduos de embalagens, sucede ainda que delas não se retira nenhuma indicação precisa quanto ao conceito de reciclagem. O mesmo se passa com os diplomas posteriores à directiva relativa a embalagens, que adoptaram a definição de reciclagem contida nesta última .

b) A reciclagem no contexto legislativo da directiva relativa a embalagens

122. O artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens não pode ser analisado isoladamente. Pelo contrário, no momento da interpretação dessa disposição, há que ter em consideração os objectivos da directiva e o próprio contexto legislativo.

123. Há que salientar que a directiva relativa a embalagens, por um lado, tem por objectivo evitar ou reduzir o impacte dos resíduos de embalagens no ambiente e, assim, garantir um elevado nível de protecção do mesmo, e, por outro lado, assegurar o funcionamento do mercado interno .

i) Elevado nível de protecção do ambiente

124. O objectivo de atingir um elevado nível de protecção do ambiente está em consonância com os propósitos plasmados no artigo 174.° , n.° 2, CE. Nos termos do artigo 6.° CE, as exigências em matéria de protecção do ambiente devem ser integradas também na adopção de medidas de aproximação das legislações. Deste objectivo, o qual também é prosseguido pela directiva relativa aos resíduos, o Tribunal de Justiça deduziu que o conceito de resíduo deve ser interpretado extensivamente .

125. Isto significa, transposto para a directiva relativa a embalagens, que o conceito de reciclagem não pode ser interpretado de modo a que se admita que um material perde prematuramente a sua natureza de resíduo e deixe de estar sujeito ao controlo específico dos resíduos numa fase em que esse controlo ainda seria necessário para assegurar um elevado nível de protecção do ambiente.

126. Há principalmente que garantir que as embalagens já utilizadas não representem perigo para o ambiente e que - caso não possam ser reutilizadas - sejam, sempre que possível, valorizadas e não eliminadas .

127. Entre as várias formas de valorização, deve ser dada preferência à reciclagem . Esta contribui para a protecção do ambiente, na medida em que permite economizar energia e matérias-primas primárias e reduzir os resíduos que têm de ser definitivamente eliminados .

ii) Ausência de distorções da concorrência no mercado interno

128. A directiva relativa a embalagens estabelece objectivos concretos de valorização, ao contrário do que se passa na directiva relativa aos resíduos. Assim sendo, o artigo 6.° , n.° 1, alínea b), impõe aos Estados-Membros que respeitem determinadas quotas mínimas de reciclagem de resíduos de embalagens. De acordo com a directiva relativa a embalagens, que assenta no artigo 100.° -A do Tratado CE, devem harmonizar-se as disposições legislativas dos Estados-Membros e devem evitar-se distorções da concorrência.

129. Ainda que, depois de estudados todos os factores, a reciclagem permita efectuar poupanças a nível económico , comporta custos para as empresas que têm de responder pela reciclagem das embalagens que colocam no mercado. Em última análise, tais despesas encarecem os seus produtos e influenciam o seu posicionamento no mercado.

130. A Comunidade, ao não ter estabelecido quotas de valorização mínimas determinadas com exactidão, tendo antes deixado uma certa margem de apreciação, aceitou em certa medida que as indústrias dos Estados-Membros fossem oneradas de forma distinta. Os desequilíbrios poderão acentuar-se se os Estados-Membros adoptarem definições de reciclagem significativamente divergentes umas das outras e se os custos do respeito das quotas de valorização forem, por isso, diferentes.

131. O Tribunal de Justiça deveria portanto dar uma interpretação definitiva do conceito de reciclagem, para garantir o objectivo da harmonização da legislação. Essa interpretação deve, além disso, garantir que o mesmo material de embalagem não seja considerado várias vezes no âmbito do cálculo da quota para a reciclagem, tal como o Governo do Reino Unido observou acertadamente.

c) Evolução do conceito de reciclagem no processo legislativo

132. Contrariamente à versão em vigor (v., supra, n.° 7), a definição de reciclagem, na proposta da Comissão , tinha originariamente a seguinte redacção:

«Reciclagem: a valorização dos resíduos para os fins originais ou para outros fins, com exclusão da recuperação de energia, e também regeneração e a compostagem;»

133. Na exposição de motivos, esta definição não é aprofundada. Faltam-lhe alguns elementos, que foram posteriormente incluídos na versão em vigor. Segundo a versão alemã da proposta desta definição, podiam ser sujeitos a reciclagem simples «materiais». Ficaria, pois, por apurar se tais materiais tinham ou não de ser resíduos de embalagens. Para além disso, o processo caracteriza-se apenas em função do objectivo do reaproveitamento do material para o fim inicial ou para outros fins. O projecto não incluía nenhuma descrição mais pormenorizada do processo de reciclagem.

134. Só com a posição comum (CE) n.° 13/94 do Conselho, de 4 de Março de 1994 , é que surgiu uma versão que, no essencial, corresponde à actual. Esta alteração não foi fundamentada. Tanto quanto se sabe, não foi comentada no decurso do processo legislativo, nem pela Comissão nem pelo Parlamento Europeu. Verifica-se que a definição de reciclagem que acabou por ser adoptada descreve com maior exactidão o processo de reciclagem, possibilitando assim uma distinção clara entre reciclagem e outras medidas de valorização, o que tem especial importância na perspectiva das quotas de valorização previstas no artigo 6.° , n.° 1.

d) Evolução posterior

135. A reciclagem adquiriu, entretanto, uma importância considerável e, no futuro, ocupará um lugar ainda mais importante no âmbito da valorização de resíduos de embalagens.

136. Resulta do relatório intercalar previsto no artigo 6.° , n.° 3, que a Comissão apresentou em 1999 , que quase todos os Estados-Membros atingiram os valores mínimos logo ao fim de quatro anos depois da data da entrada em vigor da directiva, tendo uma parte deles, inclusivamente, ultrapassado os objectivos máximos. O Reino Unido, que atingiu uma quota de reciclagem de 30% do peso, ocupava um lugar no fim da lista; no que toca ao aço, atingiu uma quota de reciclagem de um valor médio de 26% do peso .

137. A Comissão apresentou, entretanto, uma proposta de alteração da directiva relativa a embalagens . A proposta prevê um aumento substancial da quota de valorização (de 60% a 75% do peso para a valorização e de 55% a 70% do peso para a reciclagem). A Comissão, para além disso, adoptou o novo princípio, que é introduzir quotas separadas de reciclagem para vários tipos de materiais. A quota de reciclagem de metais deve, assim, atingir, no futuro, 50% do peso.

138. Em especial, no que toca às matérias plásticas, faz-se uma distinção entre a valorização mecânica, a valorização química e a valorização das matérias-primas. Estas outras definições poderiam ser elucidativas, caso fossem consideradas subespécies de reciclagem. Subsistem, porém, sérias dúvidas quanto à possibilidade de se retirarem conclusões quanto à interpretação da directiva relativa a embalagens, na redacção em vigor, a partir de uma proposta da Comissão para alteração da mesma.

2) Interpretação do artigo 3.°, n.° 7, da directiva relativa a embalagens

139. A definição de reciclagem constante do artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens contém três elementos de facto relevantes para o presente caso: o objecto da reciclagem são «materiais de resíduos» (a). Estes são reprocessados para o fim inicial ou para outros fins (b). O reprocessamento ocorre num processo de produção (c). A inclusão da reciclagem orgânica e a exclusão da valorização energética não têm significado no âmbito do presente processo.

a) Materiais de resíduos

140. A MPR defende que os produtores de aço não efectuam qualquer reciclagem, porque o material por eles utilizado (material 3 B), que é fornecido por ela, já não é resíduo.

141. Sucede que, na definição de reciclagem, não se utiliza o termo resíduo, mas sim materiais de resíduos, que é uma expressão que não surge em mais nenhuma parte da directiva relativa a embalagens ou da directiva relativa aos resíduos. Poder-se-ia deduzir desta opção terminológica que os materiais susceptíveis de serem reciclados provêm de resíduos (de embalagens), mas que, no momento da reciclagem, já não têm necessariamente de ser resíduos na acepção da directiva relativa aos resíduos. Então não teria importância saber, para efeitos de classificação da actividade dos produtores de aço, se o material 3 B por eles fundido é ou não resíduo.

142. A título prévio, há que assinalar que algumas versões linguísticas da directiva relativa a embalagens utilizam também, no artigo 3.° , n.° 7, simplesmente, o termo «resíduo» (é o caso das versões francesa, espanhola, portuguesa e finlandesa). Pelo contrário, a maioria das versões linguísticas introduz um termo semelhante ao «Abfallmaterialen» (materiais de resíduos) da versão alemã (é o caso das versões inglesa, dinamarquesa, sueca, neerlandesa e italiana). Assim, não é de excluir que, através da utilização do termo «Abfallmaterialen», se pretendesse dar a ideia de que não são só os resíduos que podem ser objecto de reclicagem.

143. Porém, esta interpretação é contrariada pela já referida função da definição de reciclagem, no que toca à prossecução dos objectivos da valorização. Se os materiais que provêm de resíduos, mas que já não têm essa qualidade, pudessem ser ainda objecto de um processo de reciclagem, então existiria o perigo de os materiais que já tivessem sido reciclados serem sujeitos a uma segunda reciclagem. Esta situação poderia conduzir a várias contabilizações do mesmo material para efeitos do cálculo da quota de valorização.

144. Para além disso, a definição de resíduos de embalagens, contida no artigo 3.° , n.° 2, da directiva relativa a embalagens, abrange os materiais de embalagens, uma vez que estão cobertos pela definição de resíduo da directiva. Assim sendo, dificilmente se poderá entender que a expressão «materiais de resíduos» queira designar materiais que não sejam resíduos.

145. Na verdade, poder-se-ia questionar se os materiais utilizados na reciclagem podem sequer ser resíduos. Uma vez que a reciclagem é definida como a utilização de materiais num processo de produção, poder-se-ia admitir que falta o elemento da vontade do detentor do material de se desfazer dele, que é um elemento central do conceito de resíduo.

146. Contudo, pode-se invocar contra esta ideia que toda e qualquer valorização consubstancia uma aplicação útil de um resíduo, sem que os materiais utilizados nessa valorização percam as suas características de resíduo. De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o facto de se desfazer de um material implica, pelo contrário, a sua valorização ou eliminação . Uma vez que a reciclagem deve ser encarada como uma forma especial de valorização , um material que vai ser sujeito a um correspondente processo de produção não pode, por essa simples razão, perder a sua qualidade de resíduo.

147. O conceito de «materiais de resíduos» sublinha antes a ligação entre a reciclagem e o material. É que à reciclagem subjaz a ideia segundo a qual a partir de resíduos se obtêm certos materiais, que são novamente empregues, de modo a que seja criado um ciclo de materiais, como aliás a expressão inglesa «re-cycling» deixa entender.

148. A partir desta ideia, a expressão «materiais de resíduos» precisa que os vários materiais e substâncias que compõem as embalagens devem ser tratados de forma separada, tendo em vista a reciclagem. O vidro, o metal, o plástico, o papel, etc., só podem ser empregues em processos de produção específicos, próprios para o tipo de material em causa. Distingue-se, assim, a reciclagem - e também a valorização orgânica - da valorização energética, na qual podem ser utilizadas misturas de substâncias.

149. Concluindo, há que reconhecer que, com a utilização da expressão «materiais de resíduos», não se pretende transmitir a ideia de que os materiais que são objecto da reciclagem já devam ser resíduo. Este conceito leva em conta a circunstância de que a recuperação se deve realizar após a separação dos vários materiais.

b) Reprocessamento para o fim inicial ou para outros fins

150. O conceito reprocessamento significa que os materiais de resíduos, através do tratamento a que são submetidos, voltam ao estado que tinham antes de se terem transformado em resíduos de embalagens. Este processo deve tornar os materiais reutilizáveis para o fim inicial ou para outros fins.

151. O Governo do Reino Unido, bem como a Corus, na audiência, defenderam que a expressão «outros fins» se refere a fins semelhantes à produção de novas embalagens. No entanto, o texto da directiva não contém nenhuma indicação de que assim seja. Mas também não é disso que se trata. O sentido e a finalidade da directiva são meramente excluir que o material seja reciclado com o fim de continuar a ser tratado como resíduo, isto é, seja novamente sujeito a processos de valorização ou mesmo eliminado.

c) Processo de produção

152. É característico de um processo de produção que, com um certo dispêndio de meios de produção e com o emprego de energia, uma ou mais matérias-primas de base sejam transformadas ou combinadas de tal modo que, no final, surja um novo produto. Essas matérias-primas de base podem ser substâncias primárias ou produtos já objecto de tratamento. O novo produto caracteriza-se por um grau de transformação superior à matéria-prima de base.

3) Classificação do processo que a MPR executa

153. Cabe analisar se a actividade da MPR deve ser considerada reciclagem, à luz da interpretação, que preconizamos, do artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens.

154. O material tratado pela MPR contém uma certa parte de resíduos de embalagens de metal, que são incontestavelmente materiais de resíduos, na acepção da definição supra-exposta.

155. O que já é controvertido é saber se a MPR executa um reprocessamento para o fim inicial ou para outros fins. Para tal, seria necessário que a MPR devolvesse ao material o estado que era o seu antes de ser transformado em embalagens ou resíduos de embalagens.

156. Não é possível proceder a uma reconversão para minério de ferro. Mesmo que se admita que no fabrico das embalagens já foi utilizada sucata de ferro 3 B, a verdade é que a MPR não repõe o material no seu estado anterior. A sucata de ferro 3 B é uma mistura que, além de conter aço, também contém outras substâncias em determinadas proporções. A sucata de ferro 3 B anteriormente transformada, por um lado, e a sucata de ferro 3 B obtida pela MPR a partir de resíduos de embalagens, por outro, não têm a mesma composição. O material só adquire exactamente as mesmas características que antes possuía no momento em que é transformado em aço puro.

157. A sucata de ferro 3 B também não é susceptível de ser directamente utilizada para o fim inicial, que é a produção de novas embalagens. Quando muito, poderia ser utilizada para «outros fins», a saber, o seu emprego como carga para fornos de fundição.

158. O objectivo da reciclagem é, porém, a recuperação do material inicial. Enquanto existir uma mistura de materiais que tem de ser limpa e liberta de impurezas em processos posteriores, não existe reprocessamento completo. Os subsequentes processos de limpeza e separação é que devem ser considerados processos de valorização. Não se pode entender que se produz material para «outros fins», na acepção do artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens, quando o mesmo ainda tem de ser sujeito a outros processos de valorização.

159. Resulta do despacho de reenvio que a sucata de ferro 3 B contém impurezas que têm de ser removidas antes da reutilização do aço. Essas impurezas são removidas do aço puro apenas no momento da fusão, através de processos químicos ou físicos, na medida em que são removidas com a escória que se deposita no metal líquido, ou se evaporam.

160. Por último, os processos levados a cabo pela MPR não podem ser considerados processos de produção. É incontestável que a MPR emprega máquinas e despende energia. Também a trituração é uma espécie de transformação. Porém, o resultado do processo não é nenhum produto que apresente um grau de transformação superior ao material inicial. O que a MPR faz é produzir matéria-prima secundária. Esta matéria-prima secundária até poderá corresponder às normas da indústria para o material 3 B e, por isso, servir para a utilização num processo de produção. Porém, ainda se trata de uma matéria-prima que - como o próprio nome indica - ainda não foi trabalhada.

161. O exposto acerca do conceito de aproveitamento, no artigo 3.° , n.° 2, alínea b), i), da directiva relativa aos resíduos (v., supra, n.° 6), não contradiz este resultado. De acordo com a leitura que a MPR fez desta disposição, a reciclagem («Recycling») tem precisamente como objectivo a obtenção de matérias-primas secundárias.

162. Por um lado, não é completamente claro se o excerto «tendente à obtenção de matérias-primas secundárias» se refere ao aproveitamento ou apenas ao último elemento da enumeração, ou seja, a «qualquer outra acção». Tal como salienta - e bem - a autoridade ambiental, pelo menos no caso da «reutilização» de um objecto (que também é referida na enumeração) não se obtém qualquer matéria-prima secundária.

163. Chama ainda a atenção o facto de o conceito de reciclagem («Recycling») não constar do artigo 1.° da directiva relativa aos resíduos, no qual, de resto, constam as definições relevantes no âmbito dessa directiva. É, por isso, duvidoso que esta disposição da directiva relativa aos resíduos pretendesse dar uma definição de reciclagem.

164. Por outro lado, há ainda que considerar a relação entre ambas as directivas. De acordo com a interpretação da directiva relativa a embalagens ora defendida, a produção de uma matéria-prima secundária não é ainda a verdadeira reciclagem. O que é tanto mais verdade quanto essa matéria-prima secundária ainda contém matérias estranhas que têm de ser removidas em processos subsequentes. Caso a directiva relativa aos resíduos contivesse outra definição de reciclagem, então a directiva relativa a embalagens sempre se lhe sobreporia, uma vez que é, relativamente a ela, lei especial.

165. Esta interpretação também está de acordo com os objectivos da directiva relativa a embalagens. Segundo esta, a reciclagem deve conduzir à poupança do consumo de matérias-primas primárias. Essa poupança só se realiza no momento em que se produz aço a partir de sucata de ferro 3 B e não a partir de minério de ferro.

166. Cabe ainda proceder a uma interpretação restritiva, de modo a que os resíduos de embalagens tratados pela MPR não percam a sua qualidade de resíduo num momento em que é ainda necessário fiscalizá-los enquanto resíduos. Conclui-se do despacho de reenvio que o material, mesmo após ter sido processado pela MPR, ainda contém impurezas que impõem medidas especiais de armazenagem, como as que são aplicáveis aos resíduos, de modo a evitar-se a contaminação dos solos. Além disso, os produtores de aço estão sujeitos ao «Integrated Pollution Control», quando dos subsequentes processamentos da sucata de ferro 3 B.

167. O tratamento dos resíduos de embalagens efectuado pela MPR não é, portanto, reciclagem, na acepção da directiva relativa a embalagens, porque o metal não é completamente recuperado, necessitando, pelo contrário, que sejam eliminadas impurezas, e porque não existe nenhum processo de produção do qual resultem novos produtos.

4) Qualificação do processo que os produtores de aço executam

168. O material 3 B que os produtores de aço fundem deve ser composto de materiais de resíduos provenientes de embalagens. O material processado pela MPR continha originariamente resíduos de embalagens. O facto de o processo executado pela MPR não dever ser considerado reciclagem é um indício de que a qualidade de resíduo se mantém.

169. É, em todo o caso, de apurar se a MPR, de algum modo, valorizou o material e se, por isso, ele perdeu a qualidade de resíduo. O tratamento levado a cabo pela MPR poderá consubstanciar «[r]eciclagem ou recuperação de metais ou compostos metálicos», nos termos da categoria R 3 do anexo II B da directiva relativa aos resíduos.

170. Cabe, porém, relembrar que o Tribunal de Justiça já declarou que a execução completa de uma operação de aproveitamento, efectuada nos termos do anexo II B, não retira necessariamente a um material a sua qualidade de resíduo . O que é especialmente verdade quando está em causa um pré-tratamento como uma operação de selecção ou de trituração, em que não se eliminam do material todas as matérias estranhas indesejadas .

171. Uma vez que só os produtores de aço é que sujeitam o material a outro processo de tratamento através do qual se eliminam do aço as últimas matérias estranhas, há que concluir que o material de embalagens não perdeu a qualidade de resíduo através do processo executado pela MPR. Há também que ter em conta, a este respeito, que os produtores de aço, no âmbito do processamento do material 3 B, estão sujeitos ao «Integrated Pollution Control».

172. O facto de o material 3 B ter valor económico e servir para ser empregue como matéria-prima não exclui que o mesmo mantenha a sua natureza de resíduo . Com efeito, no acórdão Palin Granit e Vehmassalon kansanterveystyön kuntayhtymän hallitus, o Tribunal de Justiça viu, no grau de probabilidade de um material ser reutilizado sem tratamento prévio, um critério pertinente para apreciar se existe ou não resíduo na acepção da directiva relativa aos resíduos .

173. No presente caso, não se sabe com exactidão qual é o grau de probabilidade de o material 3 B ser transformado pelos produtores de aço imediatamente após o tratamento pela MPR. Existem, porém, indícios de que o material 3 B é logo empregue nas siderurgias.

174. No acórdão Palin Granit e Vehmassalon kansanterveystyön kuntayhtymän hallitus, estava em causa determinar se a pedra residual, que é um subproduto resultante da actividade nas pedreiras, é, afinal, um resíduo. No âmbito desta questão, há que aplicar critérios diferentes dos do presente processo, no qual não há dúvidas de que o material em causa era um resíduo. Em consonância com o fim garantístico da directiva relativa aos resíduos e da directiva relativa a embalagens, há que presumir a manutenção da qualidade de resíduo pelo menos até se poder provar que o material foi completamente valorizado. Em regra, a reciclagem retira ao material a qualidade de resíduo , o que não se passa necessariamente com outros tipos de valorização .

175. O tratamento executado pelos produtores de aço também consubstancia um reprocessamento para o fim inicial ou para outros fins. Obtém-se aço puro através da fundição, sendo o material colocado no mesmo estado em que se encontrava antes de ter servido para o fabrico das embalagens. Pode-se produzir novas embalagens ou outros produtos a partir de lingotes, chapas ou bobinas de aço.

176. Por fim, a fundição também constitui um processo de produção. No processo de produção de aço fabricam-se (ante)produtos a partir do material 3 B, mediante a utilização de fornos de fundição e de energia, que apresentam um grau de transformação superior à matéria-prima de base.

177. Nestes termos, deve-se responder à segunda questão prejudicial que os materiais não devem ser considerados reciclados, na acepção do artigo 3.° , n.° 7, da directiva relativa a embalagens, no momento em que ficaram aptos a serem utilizados como matérias-primas, mas apenas quando foram utilizados por fabricantes de aço na produção de lingotes, chapas ou bobinas de aço.

E - Quanto à primeira questão prejudicial

178. Em virtude da resposta dada à segunda questão prejudicial, não é necessário responder à primeira. É exclusivamente à luz da directiva relativa a embalagens que há que decidir se os resíduos de embalagens foram reciclados.

179. A questão de saber se e quando perderam a qualidade de resíduo só tem alguma relevância no contexto da reciclagem na medida em que os materiais de resíduos são o material inicial da reciclagem. Uma vez que a MPR não efectua reciclagem, o material 3 B - tal como foi demonstrado - não perdeu a qualidade de resíduo e pode ser reciclado pelos produtores de aço.

180. A primeira questão também poderia ser entendida no sentido de o tribunal nacional pretender saber quando é que outros materiais, aos quais não seja aplicável a directiva relativa a embalagens, devem ser considerados reciclados.

181. De acordo com jurisprudência constante, é da exclusiva competência do tribunal nacional que vai decidir a questão apreciar, em face de cada caso concreto, a necessidade de um pedido de decisão prejudicial para poder decidir o litígio e a relevância das questões submetidas ao Tribunal de Justiça .

182. Porém, é igualmente verdade que o Tribunal de Justiça já se considerou incompetente para se pronunciar sobre uma questão prejudicial, quando é evidente que a interpretação ou a apreciação da validade de uma disposição de direito comunitário, solicitadas pelo tribunal nacional, não estão relacionadas com a matéria ou o objecto do litígio na causa principal, ou ainda quando o problema é meramente hipotético .

183. As partes no processo que corre termos perante o tribunal nacional litigam acerca do direito de emitir PRN para reciclagem de resíduos de embalagens. O despacho de reenvio não fornece qualquer indicação de que a questão de saber quando é que outros resíduos que não sejam resíduos de embalagens foram reciclados tem qualquer relevância para a decisão a proferir pela High Court no âmbito do litígio aí pendente.

184. A questão não deve, por isso, ser respondida.

VII - Conclusão

185. Pelos motivos precedentes, propõe-se ao Tribunal de Justiça que responda nos seguintes termos à segunda questão prejudicial:

«Os resíduos de embalagens em aço não devem ser considerados reciclados, na acepção do artigo 3.° , n.° 7, da Directiva 94/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Dezembro de 1994, relativa a embalagens e resíduos de embalagens, no momento em que ficaram aptos a serem utilizados como matérias-primas, mas apenas quando foram utilizados por fabricantes de aço na produção de lingotes, chapas ou bobinas de aço.»