62000C0411

Conclusões do advogado-geral Mischo apresentadas em 18 de Abril de 2002. - Felix Swoboda GmbH contra Österreichische Nationalbank. - Pedido de decisão prejudicial: Bundesvergabeamt - Áustria. - Contratos públicos de serviços - Directiva 92/50/CEE - Âmbito de aplicação material - Mudança de um banco central - Contrato que tem por objecto simultaneamente serviços enumerados no anexo I A da Directiva 92/50 e serviços enumerados no anexo I B da mesma directiva - Predominância, em termos de valor, dos serviços enumerados neste anexo I B. - Processo C-411/00.

Colectânea da Jurisprudência 2002 página I-10567


Conclusões do Advogado-Geral


1. Por despacho de 29 de Setembro de 2000, a Quarta Secção do Bundesvergabeamt (Áustria) apresentou ao Tribunal de Justiça quatro questões prejudiciais referentes à interpretação da Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços .

2. A Directiva 92/50 opera uma distinção entre os concursos de serviços «prioritários», aos quais se aplica toda a directiva (títulos III a VI), e os concursos de serviços «não prioritários», que só estão sujeitos aos artigos 14.° e 16.° da directiva. Os concursos de serviços não prioritários, que se considera terem pouco impacto nas trocas transfronteiriças, só são, assim, tidos em consideração pelo mecanismo de controlo aplicado pela directiva .

3. Os serviços prioritários são enumerados no anexo I A da directiva, enquanto os serviços não prioritários o são no anexo I B da mesma. A classificação dos serviços faz referência à Classificação Central de Produtos das Nações Unidas (a seguir «CPC»).

4. No caso de concursos que têm por objecto, simultaneamente, os serviços referidos no anexo I A e os serviços referidos no anexo I B, a directiva dispõe, no seu artigo 10.° , que:

«Os contratos [...] serão celebrados de acordo com o disposto nos títulos III a VI sempre que o valor dos serviços referidos no anexo I A seja superior ao valor dos serviços referidos no anexo I B. Caso contrário, serão celebrados de acordo com o disposto nos artigos 14.° e 16.° »

5. A Directiva 92/50 foi transposta para o direito austríaco através da Bundesvergabegesetz (lei federal austríaca sobre a adjudicação de contratos públicos, a seguir «BVergG») . O anexo III desta lei federal corresponde, essencialmente, ao anexo I A da Directiva 92/50, enquanto o anexo IV corresponde ao seu anexo I B. O artigo 3.° , n.° 4, da BVergG transpõe, por sua vez, a regra enunciada no artigo 10.° , da Directiva 92/50.

6. No processo principal, a recorrente, Felix Swoboda GmbH (a seguir «Swoboda»), põe precisamente em causa a regularidade de um processo de adjudicação de um contrato público de serviços, tendo em conta este artigo 3.° , n.° 4, da BVergG. Pede ao órgão jurisdicional nacional que verifique a violação da lei federal, por o concurso não ter sido adjudicado ao concorrente que apresentou a melhor proposta. Segundo as observações da entidade adjudicante, a Swoboda não participou no processo de adjudicação em causa.

7. O Österreichische Nationalbank (Banco Central austríaco, a seguir «OeNB»), entidade adjudicante, procedeu, no âmbito da sua mudança de instalações para um novo local, situado a cerca de 200 metros do seu endereço inicial, à adjudicação de um contrato «relativo a serviços de mudanças e de transportes».

8. Além da mudança física (desmontagem, embalagem, transporte e desembalagem) que, segundo o OeNB só representava 6,94% do valor do concurso, o essencial dos serviço a fornecer consistia na logística informatizada, na coordenação de todas as actividades de mudança, na colocação à disposição de um depósito e na planificação da armazenagem. Por isto, a OeNB considerou que o concurso consistia principalmente em «serviços de transporte de apoio e auxiliares», que constam do anexo IV do BVergG, e não em «serviços de transporte terrestre» que, na sua opinião, constam do anexo III do BVergG e estão, consequentemente, sujeitos a todas as disposições desta lei federal. Só procedeu, por isso, à publicação do aviso de adjudicação do concurso.

9. A Swoboda considera que a adjudicação do concurso se deveria ter realizado em conformidade com todas as disposições da BVergG, uma vez que o valor dos serviços referidos no seu anexo III é, no caso em apreço, superior ao valor dos que constam do anexo IV.

10. O Bundesvergabeamt considerou, assim, necessário, para resolver o litígio que lhe foi submetido, colocar ao Tribunal de Justiça, por força do artigo 234.° CE, as questões prejudiciais seguintes:

«1) Com base na sistemática da Directiva 92/50/CEE e, em especial, nas categorias de serviços referidas nos anexos I A e I B, deve uma prestação de serviços com um objectivo unitário, mas susceptível de ser subdividida em prestações parciais, ser qualificada como prestação unitária, constituída por uma prestação principal e por prestações acessórias, e enquadrada, com base no seu objectivo principal, nas disposições dos anexos I A e I B da directiva, ou deve antes analisar-se separadamente cada uma das prestações parciais para averiguar se a prestação está sujeita à aplicação de todas as disposições da directiva enquanto prestação de serviços prioritária, ou apenas a disposições isoladas da mesma, enquanto prestação de serviços não prioritária?

2) Até que ponto é lícito, no sistema da Directiva 92/50/CEE, subdividir em prestações isoladas uma prestação de serviços cuja designação corresponde a um conjunto específico de prestações (por exemplo, serviços de transportes), sem assim violar disposições em matéria de contratos públicos de serviços ou prejudicar o efeito útil da directiva relativa aos contratos públicos de serviços?

3) As prestações adiante referidas na exposição da matéria de facto (tendo em conta o artigo 10.° da Directiva 92/50/CEE) devem ser classificadas como prestações de serviços abrangidas pelo anexo I A da Directiva 92/50/CEE (categoria 2, Serviços de transporte terrestre) devendo, consequentemente, os contratos que tenham por objecto essas prestações ser adjudicados com base nas disposições dos títulos III a VI da directiva, ou devem antes ser classificadas como prestações de serviços abrangidas pelo anexo I B da Directiva 92/50/CEE (designadamente, categoria 20, Serviços de transporte de apoio e auxiliares, e categoria 27, Outros serviços), devendo, consequentemente, os contratos que têm por objecto prestações desse tipo ser adjudicados nos termos dos artigos 14.° e 16.° , e em que referência do CCP devem ser incluídas as referidas prestações de serviços?

4) No caso de a apreciação das prestações isoladamente consideradas levar a concluir que determinada prestação, por si só inteiramente sujeita ao disposto na Directiva 92/50/CEE em conformidade com o anexo I A da directiva, não está, a título excepcional, sujeita a todas as disposições da referida directiva por força do princípio do maior valor constante do artigo 10.° da mesma directiva, deve a entidade adjudicante destacar e adjudicar separadamente as prestações parciais não prioritárias, para preservar o carácter prioritário da prestação de serviços?»

Quanto à admissibilidade das questões prejudiciais

11. Tendo sido formuladas objecções pela Comissão e pela recorrida no processo principal quanto à admissibilidade das questões prejudiciais, cabe, antes de mais, dar-lhes resposta.

12. A Comissão, numa observação prévia, pergunta-se se o Bundesvergabeamt constitui efectivamente um órgão jurisdicional na acepção do artigo 234.° CE, sendo esta qualidade condição de admissibilidade das questões prejudiciais.

13. A este propósito, remeto directamente para o acórdão Mannesmann Anlagenbau Austria e o. . Neste acórdão, o Tribunal de Justiça reconheceu, implícita mas necessariamente, o carácter de órgão jurisdicional do Bundesvergabeamt, uma vez que aceitou responder às questões que este lhe dirigiu. Este reconhecimento é, aliás, tanto menos contestável que o advogado-geral P. Léger abordou, nas suas conclusões, o problema da qualificação de órgão jurisdicional do Bundesvergabeamt. No fim da sua argumentação, que subscrevo, concluiu que o Bundesvergabeamt deve ser considerado um órgão jurisdicional na acepção do artigo 234.° CE. Ulteriormente, ao responder várias vezes a questões prejudiciais colocadas pelo mesmo organismo , o Tribunal de Justiça confirmou este reconhecimento da sua qualidade de órgão jurisdicional.

14. A Comissão refere a jurisprudência do Tribunal de Justiça que exige que os órgãos jurisdicionais nacionais que lhe submetem questões com base no artigo 234.° CE tomem decisões com «carácter jurisdicional». O Bundesvergabeamt, como reconhece no seu despacho de reenvio, datado de 9 de Agosto de 2001, relativo ao processo Siemens e ARGE Telekom, pendente no Tribunal de Justiça , não tem capacidade para adoptar medidas de intimação. A Comissão conclui que estas decisões não se revestem do carácter jurisdicional requerido .

15. A este título, verifico que uma instância pode tomar decisões de carácter jurisdicional, mesmo que não disponha de um poder de intimação. A melhor prova é que o próprio Tribunal de Justiça também não dispõe, salvo quando decide sobre medidas provisórias, de tal poder de intimação . Ninguém se arriscou, no entanto, pelo menos até hoje, a pôr em causa a sua qualidade de órgão jurisdicional.

16. O Bundesvergabeamt, embora não disponha desta capacidade de dirigir intimações às autoridades adjudicantes, tem contudo, pelo menos até à adjudicação do concurso, um poder de anulação das suas decisões, que basta para lhe conferir a qualidade de órgão jurisdicional na acepção do artigo 234.° CE. Com efeito, as decisões do Bundesvergabeamt revestem-se de «carácter obrigatório, como o demonstra, nomeadamente, o poder de anulação de que dispõe nos termos da lei» .

17. Certamente, tendo o concurso aqui em causa sido já adjudicado, o Bundesvergabeamt não pode ser levado, no processo principal, a decidir uma anulação. Efectivamente, o presente processo situa-se no âmbito do artigo 113.° , n.° 3, da BVergG, que dispõe:

«Após a adjudicação do concurso, ou depois de terminado o processo de adjudicação, o Bundesvergabeamt é competente para determinar se um concurso não foi adjudicado da melhor forma, por exemplo, devido a uma entorse da presente lei federal ou dos seus regulamentos. Num processo deste tipo, o Bundesvergabeamt é, por outro lado, competente para determinar, a pedido da autoridade adjudicante, se um candidato ou um proponente excluído não teria tido uma hipótese real de lhe ser adjudicado o concurso com uma aplicação correcta das disposições da presente lei federal e dos seus regulamentos.»

18. Isto não significa que o Bundesvergabeamt não tomará uma decisão obrigatória com força de caso julgado. Com efeito, segundo o artigo 125.° , n.° 2, da BVergG, um pedido de indemnização por parte de um proponente excluído só é admissível se, logo à partida, o Bundesvergabeamt tiver verificado uma adjudicação irregular do concurso com base no artigo 113.° , n.° 3, da BVergG. O órgão jurisdicional civil, chamado a decidir este pedido de indemnização, bem como, além disso, as partes em causa, estão vinculados por esta declaração.

19. De facto, parece que as dúvidas expressas pela Comissão têm a sua origem numa lamentável confusão. Como o Bundesvergabeamt se interroga, no processo que deu lugar ao reenvio prejudicial no processo Siemens e ARGE Telekom, já referido, sobre o ponto de saber se dispõe de poderes suficientes à luz da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras de fornecimentos , a Comissão pensou, erradamente, poder concluir que o Bundesvergabeamt tem dúvidas quanto à sua qualidade de órgão jurisdicional.

20. Considero, portanto, que, seja como for, no processo iniciado pela Swoboda, o Bundesvergabeamt possui, na acepção do artigo 234.° CE, a qualidade de órgão jurisdicional, que lhe permite dirigir questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça.

21. O OeNB põe, por sua vez, em causa a capacidade da Swoboda para dar início ao processo principal, alegando que a qualidade de proponente ou de candidato excluído, necessária segundo o direito nacional para intentar tal acção, lhe falta. Não podendo a Swoboda pretender uma indemnização, a verificação de uma eventual violação da Directiva 92/50 teria somente carácter declaratório, sem qualquer efeito material no processo principal.

22. A este propósito, verifico simplesmente que a questão da legitimação da recorrente no processo principal é regulada pelas regras de processo nacionais. Ora, não cabe ao Tribunal de Justiça decidir tais questões. Só ao juiz nacional incumbe, efectivamente, resolver os problemas de puro direito nacional e apreciar a necessidade de um pedido de decisão prejudicial. As únicas questões de interpretação do direito comunitário a que o Tribunal se pode recusar a dar resposta, apesar de um pedido do juiz nacional, são as hipotéticas ou as nascidas de litígios em processos principais construídos de forma artificial . No caso em apreço, não estamos, manifestamente, perante um tal caso excepcional.

23. O OeNB afirma também que o Tribunal de Justiça já se pronunciou, no acórdão Tögel, já referido, sobre questões semelhantes às que lhe são agora colocadas e que pode, simplesmente, responder às questões apresentadas através de um despacho fundamentado fazendo a referência a este acórdão.

24. Cabe sublinhar que o artigo 104.° , n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça dá, precisamente, a este último a possibilidade de responder a questões prejudiciais através de despacho fundamentado. Não se trata, de modo algum, de uma obrigação.

25. Além disso, os factos no processo principal bem como as questões colocadas ao Tribunal de Justiça no caso Tögel, já referido, são sensivelmente diferentes dos que me ocupam aqui. O Tribunal não teve, designadamente, de responder, neste acórdão, à questão principal colocada hoje pelo Bundesvergabeamt, que se destina a saber se um concurso que tenha um objectivo unitário, mas que comporte vários serviços parciais, deve ser submetido ao regime da celebração de contratos correspondente ao do seu objecto principal ou se, pelo contrário, deve ser submetido ao regime dos serviços parciais que representem, em termos de valor, a parte preponderante do concurso.

26. Por fim, o OeNB afirma que o concurso em questão não comporta qualquer elemento transfronteiriço nem apresenta qualquer interesse por uma empresa estrangeira. Consequentemente, o direito comunitário não é aplicável ao processo em causa, pois a situação não apresenta elementos de ligação a uma situação transfronteiriça. O OeNB faz, designadamente, referência, em apoio desta argumentação, ao acórdão RI. SAN. , no qual o Tribunal de Justiça decidiu que um processo de adjudicação não está sujeito à aplicação do direito comunitário quando não apresente elementos de estraneidade.

27. Trata-se de uma interpretação manifestamente errada do acórdão do Tribunal de Justiça. No acórdão RI. SAN., já referido, o Tribunal decidiu que o artigo 55.° do Tratado CE (actual artigo 45.° CE) não é aplicável a uma situação no processo principal em que todos os elementos se confinam no interior de um Estado-Membro. Em contrapartida, não se pronunciou sobre a aplicabilidade da Directiva 92/50 face a esta exigência de estraneidade.

28. Ora, as directivas comunitárias relativas à adjudicação de concursos públicos visam o estabelecimento de processos coordenados a nível comunitário, e isto independentemente da presença ou da ausência de elementos transfronteiriços nos concursos em causa. Que o concurso na origem do litígio tenha somente um interesse limitado para o proponente estrangeiro não constitui razão suficiente para afastar a aplicação da Directiva 92/50. Além disso, exigir que o ponto de partida e o ponto de chegada do serviço a fornecer se situem nos dois lados de uma fronteira é uma exigência excessiva relativamente ao objectivo da directiva, que é a abertura dos concursos, mesmo totalmente localizados no interior de um só Estado-Membro, a potenciais concorrentes estabelecidos noutros Estados-Membros.

29. Cabe, então, analisar as questões colocadas pelo órgão jurisdicional de reenvio. A fim de preservar a coerência do meu raciocínio, responderei à quarta questão antes de responder à terceira.

Quanto à primeira questão

30. A fim de evitar qualquer redundância nas respostas dadas ao órgão jurisdicional de reenvio e para assegurar uma interpretação útil da Directiva 92/50, considero que o Bundesvergabeamt, através da sua primeira questão pergunta ao Tribunal de Justiça, essencialmente, como se determina o regime de adjudicação de um concurso público de serviços, quando este concurso visa um objectivo unitário que pode, no entanto, ser subdividido em serviços parciais. A classificação do concurso nos anexos I A ou I B da Directiva 92/50 deve fazer-se em função do objecto principal do concurso, ou em função dos serviços parciais que representem, em termos de valor, a parte preponderante do concurso?

31. No seu despacho de reenvio, o Bundesvergabeamt faz referência ao acórdão Gestión Hotelera Internacional e nota que este acórdão consagra o princípio da preponderância, por força do qual o objecto principal do concurso absorve, perante a determinação da directiva de adjudicação dos concursos públicos aplicável a um dado concurso, os serviços de apoio que lhe estão associados.

32. Não me parece que a referência a este acórdão seja pertinente para a resolução da questão aqui colocada ao Tribunal de Justiça.

33. No acórdão Gestión Hotelera Internacional, já referido, o Tribunal de Justiça devia pronunciar-se sobre a aplicabilidade da Directiva 71/305/CEE do Conselho, de 26 de Julho de 1971, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas , a um concurso cujo objecto consistia, principalmente, numa cessão de bens. O Tribunal de Justiça considerou então, efectivamente «[...] que um contrato misto que incida simultaneamente sobre a execução de obras e uma cessão de bens não é abrangido pelo âmbito de aplicação da Directiva 71/305, se a execução das obras apresentar natureza meramente acessória em relação à cessão de bens» .

34. Esta solução jurisprudencial é, designadamente, corroborada pelo décimo sexto considerando da Directiva 92/50:

«Considerando que resulta da Directiva 71/305/CEE que um contrato só poderá ser considerado um contrato de empreitada de obras públicas se tiver por objecto a execução de uma obra; que os contratos públicos de serviços, nomeadamente no domínio dos serviços de gestão de propriedades, poderão, em certos casos, incluir a execução de obras; que, se essas obras forem acessórias e não constituírem o objecto do contrato, não poderão justificar a classificação do contrato como contrato de empreitada de obras públicas.»

35. Ora, a questão aqui colocada ao Tribunal de Justiça parece sensivelmente diferente. Não se trata de saber que directiva é aplicável à adjudicação do concurso em causa. O conjunto das observações escritas apresentadas ao Tribunal de Justiça reconhecem a aplicabilidade da Directiva 92/50. O problema diz respeito à determinação, no âmbito da mesma directiva, do regime aplicável ao concurso. Impõe-se dizer que esta não contém qualquer disposição por força da qual o objecto principal do concurso possa determinar o anexo da directiva a aplicar, e, logo, o regime associado ao processo em causa.

36. Pelo contrário, a Directiva 92/50 enuncia, no seu artigo 10.° , um princípio específico de determinação do regime aplicável. Este corresponde ao anexo associado aos serviços preponderantes, em termos de valor, na totalidade do concurso. O referido artigo 10.° não faz qualquer referência ao objecto principal do concurso. A directiva parece, assim, suficientemente clara a este respeito. Não, cabe, portanto, introduzir um critério suplementar, com base no objecto principal do concurso, para determinar o regime a que se sujeitará a adjudicação.

37. As observações apresentadas pelo Governo austríaco a este propósito não põem em causa, na minha opinião, esta constatação.

38. O Governo austríaco considera que só a nomenclatura CPC é determinante para a classificação dos serviços . Ora, a CPC cria, na sua opinião, uma classificação por tipos de actividades e não por serviços isolados, pormenorizados de maneira precisa. Um serviço que pretenda obter um objectivo unitário deve ser qualificado de serviço único, uma vez que todas as directivas relativas a concursos públicos partem de um tipo de serviço único que inclui os diversos serviços de apoio. O artigo 10.° da Directiva 92/50 é, na sua opinião, de aplicação excepcional, limitada aos casos em que o concurso em causa tenha por objecto vários tipos de serviços.

39. Embora concorde com o Governo austríaco quando afirma que só a nomenclatura CPC é determinante para a classificação dos serviços, parece-me, em contrapartida, que esta classificação é suficientemente precisa para permitir uma plena aplicação do artigo 10.° da Directiva 92/50, sem qualquer necessidade de fazer referência a um eventual objecto principal do concurso. Um concurso pode, perfeitamente, pretender obter um objectivo unitário e ser subdivisível, para fins da determinação do regime que lhe é aplicável, em diversos serviços parciais que o componham e que correspondam a outros tantos códigos da CPC.

40. A afirmação segundo a qual todas as «directivas relativas a concursos públicos partem de um tipo de serviço unitário» equivale, de facto, à negação de qualquer razão de ser e efeito útil do artigo 10.° da Directiva 92/50.

41. Cada vez que um concurso visa um objecto unitário, mas reagrupa diversos serviços correspondentes a vários códigos da CPC, associados por alguns ao anexo I A e por outros ao anexo I B da Directiva 92/50, o artigo 10.° desta tem aplicação.

42. Em resposta à primeira questão considero, portanto, que cabe, a fim de determinar o regime aplicável a um concurso de serviços que visa um objectivo unitário mas que pode ser subdividido em serviços parciais, verificar a que anexo da Directiva 92/50 se associa cada serviço parcial. Nos termos do artigo 10.° da referida directiva, a adjudicação do concurso far-se-á em conformidade com as disposições dos títulos III a VI da mesma se o valor dos serviços referidos no seu anexo I A ultrapassarem o dos serviços referidos no anexo I B. Inversamente, se o valor dos serviços referidos no anexo I B ultrapassarem o dos serviços referidos no anexo I A, a adjudicação do concurso far-se-á somente em conformidade com os artigos 14.° e 16.° da mesma directiva. Assim, a determinação do regime aplicável será feita independentemente do objectivo principal do concurso.

Quanto à segunda questão

43. Tendo em conta as explicações do Bundesvergabeamt na fundamentação do seu despacho de reenvio, parece-me que, através da sua segunda questão, o órgão de jurisdição nacional procura saber em que medida a Directiva 92/50 permite, com a finalidade de determinar o regime aplicável a um tipo de concurso, a subdivisão do mesmo em vários serviços parciais.

44. O Bundesvergabeamt afirma que tal subdivisão conduziria, no caso em apreço, a que um concurso tendo por objecto principal um transporte não fosse sujeito ao regime correspondente à classificação «Transporte», a saber o regime dos serviços prioritários. Com efeito, a subdivisão em serviços parciais levaria à aplicação do artigo 10.° da Directiva 92/50 e, consequentemente, a que o regime aplicável fosse o correspondente aos serviços de transporte de apoio, que são preponderantes em termos de valor. Ora, estes «Serviços de transporte de apoio e auxiliares» são objecto de uma classificação própria na CPC e constam do anexo I B da Directiva 92/50.

45. O órgão jurisdicional nacional sublinha, a este propósito, que a prestação destes serviços de apoio, ainda que preponderante em termos de valor, só é necessária na medida em que o serviço que considera principal, a saber o transporte, esteja presente. Além disso, sublinha que tal subdivisão teria como consequência fazer da distância do transporte o elemento determinante do regime a que se deveria submeter a totalidade do concurso, uma vez que influenciaria directamente o valor do transporte no concurso. Isto seria prejudicial para a segurança jurídica dos proponentes, pois a qualificação do concurso dependeria de um elemento exterior e dificilmente determinável.

46. Parece-me que esta segunda interrogação encontra resposta nos desenvolvimentos anteriores relativos à primeira questão.

47. Efectivamente, cada vez que um concurso é constituído por diversos serviços parciais, que correspondem a códigos diferentes da classificação CPC, cabe subdividir o concurso a fim de determinar o regime que lhe é aplicável.

48. Esta verificação resulta directamente, por um lado, da natureza coerciva da referência à classificação CPC e, por outro lado, da própria existência do artigo 10.° da Directiva 92/50.

49. Com efeito, não se pode, sob pretexto de querer aplicar todas as disposições da directiva a um dado concurso, ignorar que esse concurso é composto por serviços que correspondem a vários códigos diferentes na classificação CPC. Tanto mais que a Directiva 92/50, devido à existência do artigo 10.° , oferece uma solução precisa para tal situação.

50. Assim, como a OeNB justamente sublinha, no processo Tögel, já referido, que diz respeito a um serviço de transporte de doentes, o Tribunal de Justiça não considerou que só o transporte determinava o regime aplicável ao concurso, sob pretexto de que os serviços de saúde só eram necessários na medida em que o transporte tinha efectivamente lugar. Pelo contrário, decidiu nos n.os 39 e 40 do acórdão:

«[...] o número de referência CCP 93, que consta da categoria 25 (Serviços de saúde e de carácter social) do Anexo I B, indica claramente que esta categoria incide exclusivamente sobre os aspectos médicos dos serviços de saúde que são objecto de um contrato público como o que está em causa no processo principal, com exclusão dos aspectos de transporte, que pertencem à categoria 2 (Serviços de transporte terrestre), que indica a referência CCP 712.

[...] os serviços de transporte de feridos e doentes com acompanhamento de um enfermeiro enquadram-se simultaneamente no Anexo I A, categoria 2, e no Anexo I B, categoria 25, da Directiva 92/50, pelo que o contrato que tem como objecto esses serviços é abrangido pelo artigo 10.° da Directiva 92/50».

51. Parece-me, assim, que, tratando-se de serviços que correspondem a referências CPC diferentes, se impõe uma separação tendente à determinação do regime aplicável à totalidade do concurso, ainda que esta subdivisão tenha por consequência submeter um serviço prioritário somente a uma aplicação restrita da Directiva 92/50. Isto, longe de retirar efeito útil a esta directiva, resulta directamente da vontade do legislador comunitário, expressa nos artigos 9.° e 10.° da mesma.

52. Longe de prejudicar a segurança jurídica dos operadores económicos, a aplicação mecânica deste sistema, bem como o respeito rigoroso pelas referências CPC como classificações contidas nos anexos I A e I B da directiva garantem a transparência e a estabilidade na determinação dos regimes de adjudicação dos concursos públicos de serviços.

Quanto à quarta questão

53. Ao colocar a quarta questão, o Bundesvergabeamt deseja saber se a directiva 92/50, com a finalidade de permitir a plena aplicação da directiva aos serviços parciais prioritários, impõe à autoridade adjudicante de um concurso cujo valor preponderante é representado pelos serviços parciais não prioritários a cisão do concurso em dois, ou seja, efectuar um concurso aos serviços prioritários e outro aos serviços não prioritários.

54. À luz das respostas dadas às questões anteriores, parece-me que o artigo 10.° da Directiva 92/50 exclui qualquer obrigação de cisão de um tal concurso.

55. Impor a separação dos concursos de serviços não prioritários do concurso de serviços prioritários significaria, fosse como fosse, privar o artigo 10.° da Directiva 92/50 de qualquer campo de aplicação. Com efeito, é precisamente o caso de um concurso que reagrupe ao mesmo tempo serviços prioritários e serviços não prioritários que a referida directiva prevê no seu artigo 10.° Este, longe de impor uma separação do concurso, institui um sistema de determinação de um regime comum ao conjunto dos serviços que o compõem, tanto prioritários como não prioritários.

56. Sou, contudo, da opinião de que tal cisão pode ser imposta à autoridade adjudicante se a unidade do concurso em causa for artificial ou incoerente e só se destinar, precisamente, a evitar a aplicação na íntegra da directiva aos serviços prioritários.

57. A Directiva 92/50 não prevê directamente tal situação. Contudo, o seu artigo 7.° limita a aplicabilidade da directiva aos concursos cujo montante total se estime em, pelo menos, 200 000 ecus e, a fim de impedir toda e qualquer manipulação desta condição de aplicabilidade da directiva, o n.° 3 deste mesmo artigo dispõe que:

«A selecção do método de avaliação não pode ser efectuada com o objectivo de subtrair os contratos à aplicação do disposto na presente directiva; de igual modo, nenhum projecto de compra de um determinado volume de serviços pode ser cindido a fim de o subtrair à aplicação do disposto no presente artigo.»

58. Se este artigo perspectiva um afastamento da directiva devido a uma avaliação desonesta do montante do concurso, parece-me possível alargar esta proibição de manipulação a uma situação na qual um poder adjudicante tenha, ao contrário, reagrupado artificialmente diferentes concursos, uns prioritários, outros não, com a finalidade de afastar a aplicação integral da directiva aos serviços prioritários.

59. Será o caso se a totalidade do concurso assim constituído não prosseguir um objectivo unitário e não corresponder, manifestamente, às exigências de unicidade técnica e económica.

60. No seu acórdão Comissão/Itália , o Tribunal de Justiça decidiu, assim, que, ao não dissociar os concursos de aquisição de um equipamento informático, por um lado, e de concepção e gestão de um sistema informático, por outro, a República Italiana não cumprira as suas obrigações. Estes dois elementos, aquisição de material, por um lado, e actividade de serviços informáticos, por outro, concorrem certamente para a realização de um objectivo único. Contudo, verificou o Tribunal que eram dissociáveis e que o Governo italiano procurava, na realidade, subtrair os contratos à aplicação da Directiva 77/62/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1976, relativa à coordenação dos processos de celebração dos contratos de fornecimento de direito público .

61. Seria, todavia, adoptar uma interpretação demasiado extensiva deste acórdão concluir que uma autoridade adjudicante é, de modo sistemático, obrigado a efectuar concursos separados para os serviços parciais prioritários e para os serviços parciais não prioritários que concorrem para a realização de um mesmo objectivo.

62. Efectivamente, este acórdão é anterior à adopção da Directiva 92/50. A regra que o artigo 2.° desta directiva enuncia, segundo a qual um contrato público misto de prestação de serviços e de produtos se integra no seu âmbito se os serviços forem preponderantes, em termos de valor, ainda não estava em vigor. Assim, tratava-se de um caso em que, ao proceder a tal reagrupamento artificial de concursos, a República Italiana afastava, totalmente, a aplicação do direito comunitário à totalidade do concurso. Tal situação já não poderia acontecer hoje, uma vez que o concurso, se ultrapassasse o limite de 200 000 ecus, cairia necessariamente no âmbito, ou da Directiva 77/62, ou da Directiva 92/50.

63. Quanto ao concurso em causa no processo principal, e tendo em conta os elementos disponíveis, não me parece que constitua um reagrupamento artificial de serviços prioritários e não prioritários. Com efeito, como explicaram, com argumentos sólidos, a recorrida e o Governo austríaco, pareceria incongruente, tanto a nível técnico como económico, adjudicar, no caso em apreço, dois concursos: um para o transporte propriamente dito e outro para todas as actividades logísticas da mudança. Isto implicaria, efectivamente, custos de coordenação suplementares. A apreciação da coerência da totalidade do concurso no processo principal enquadra-se, todavia, na competência do juiz nacional.

64. Assim, proponho que se responda à quarta questão da seguinte forma:

Quando a totalidade do concurso tem uma unicidade económica e técnica indubitável, as autoridades adjudicantes não têm, de forma alguma, de afastar a aplicação do artigo 10.° da Directiva 92/50 à adjudicação de concursos separados para, por um lado, os serviços parciais não prioritários e, por outro, os serviços parciais prioritários que concorrem para a realização de um mesmo objectivo.

Quanto à terceira questão

65. Através desta terceira questão, o Bundesvergabeamt procura saber em que anexo da directiva e em que referência da CPC se enquadram os serviços constitutivos do concurso em causa no processo principal.

66. Como o Tribunal de Justiça afirmou no acórdão Tögel, já referido , a classificação dos serviços nos anexos I A e I B da Directiva 92/50 deve fazer-se por referência à nomenclatura CPC.

67. Ainda que relacionar cada serviço do processo principal com uma referência CPC constitua uma questão de facto, cuja apreciação é da competência do juiz nacional, sou da opinião de que o Tribunal de Justiça pode fornecer, a este propósito, indicações susceptíveis de orientar o órgão jurisdicional de reenvio no exercício da sua competência própria.

68. Chamarei, portanto, a atenção do órgão jurisdicional nacional para certos números de referência CPC.

69. A armazenagem, que representa, segundo a OeNB, 23,91% do valor total do concurso, consta na divisão CPC n.° 74 «Serviços de transporte de apoio e auxiliares» sob a referência n.° 742 «Storage and warehousing services». No caso em apreço, a subclasse n.° 74290 «Other storage or warehousing services» parece-me pertinente. A divisão CPC n.° 74 consta do anexo I B da Directiva 92/50 (categoria 20).

70. Além disso, as actividades de coordenação e logística, a que o OeNB atribui 32,13% do valor total do concurso, devem, muito provavelmente, ser classificadas também na divisão CPC n.° 74, e mais precisamente na subclasse n.° 74800 «Freight transport agency services», cuja nota explicativa tem o seguinte teor:

«Freight brokerage services, freight forwarding services (primarily transport organization or arrangement services on behalf of the shipper or consignee), ship and aircraft space brokerage services, and freight consolidation and break-bulk services.»

71. A subclasse n.° 74900 «Other supporting and auxiliary transport services» parece-me aquela em que se enquadram, à excepção do transporte em si mesmo, as actividades de mudança propriamente dita, a que o OeNB atribui 5,55% do valor do concurso. Com efeito, esta subclasse corresponde aos elementos seguintes:

«Freight brokerage services; bill auditing and freight rate information services; transportation document preparation services; packing and crating and unpacking and de-crating services; freight inspection, weighing and sampling services; and freight receiving and acceptance services (including local pick-up and delivery).»

72. Para a Comissão, é mesmo a totalidade dos serviços constitutivos do concurso do processo principal que, formando uma prestação unitária e homogénea, se deve relacionar com esta subclasse. Efectivamente, a precisão final «including local pick-up and delivery» implicaria a inclusão de todas as prestações de serviços exigidas pelo OeNB ao seu co-contratante no número da subclasse n.° 74900.

73. Não concordo com a Comissão neste ponto. Com efeito, os «Serviços de transporte de apoio e auxiliares» não podem, para quem tenha lido atentamente as regras de interpretação da CPC, incluir o próprio transporte que, mesmo que só represente uma parte ínfima do concurso, não pode ser totalmente ignorado. As regras de interpretação da CPC sublinham, com efeito, que a classificação deve ser determinada em função dos termos que designam as categorias na redacção dos títulos. Ora, a expressão «serviços de transporte terrestre», título da divisão CPC n.° 71, não pode ser mais explícita, de modo que não restam dúvidas de que os serviços de transporte, como aqueles perante os quais nos encontramos, não podem ser classificados noutra categoria. Além disso, se dúvidas houvesse, aplicar-se-ia a regra segundo a qual a categoria mais específica deve ter prioridade sobre as categorias de alcance mais geral. Ora, não há dúvida de que a subclasse n.° 71234 «Transportation of furniture», por exemplo, corresponde de maneira mais específica às prestações de transporte propriamente dito do que a subclasse n.° 74900 «Other supporting and auxiliary transport services». A expressão «local pick-up and delivery», na qual se baseia a argumentação da Comissão, constitui somente uma precisão da noção de «Freight receiving and acceptance services». Só faz, portanto, referência às duas fases limite do transporte, a saber a da assunção do compromisso e a da entrega, que enquadram o transporte propriamente dito, que se pode efectuar, segundo os casos, por via aérea, marítima ou terrestre.

74. Esta interpretação encontra-se, além disso, confirmada pela nota explicativa relativa ao número de referência da subclasse n.° 71234 «Transportation of furniture» que cobre as prestações de serviços de transporte por estrada «over any distance». Assim, seja a distância do transporte curta ou longa, trata-se sempre de um serviço de transporte, que tem a sua própria referência CPC e não pode entrar na dos «Serviços de transporte de apoio e auxiliares».

75. Os serviços de transporte por estrada, sob a referência CPC n.° 712, estão classificados no anexo I A da Directiva 92/50 (categoria 2). É possível incluir os serviços de transporte realizados na execução do concurso em causa no processo principal nas subclasses n.° 71234 «Transportation of furniture», e n.° 71239 «Transportation of other freight».

76. Chamo, também, a atenção do órgão jurisdicional nacional para duas outras referências CPC, a que não são estranhos certos serviços descritos no despacho de reenvio:

- a referência CPC n.° 8129 «Non-life insurance services», cujas subclasses n.° 81294 «Freight insurance services», n.° 81295 «Fire and other property damage insurance services» e n.° 81299 «Other insurance services n.e.c.» me parecem pertinentes. Os serviços de seguros constam do anexo I A da Directiva 92/50 (categoria 6);

- a divisão CPC n.° 94, precisamente a subclasse n.° 94020 «Refuse disposal services», que engloba, designadamente, os serviços de recolha, de transporte e de eliminação dos resíduos industriais ou comerciais. Esta referência CPC enquadra-se, também, no anexo I A da Directiva 92/50 (categoria 16).

77. Por fim, sou da opinião de que a remuneração do pessoal dos prestadores de serviços deve incluir-se nos serviços a que corresponde e de que é parte integrante. Com efeito, dificilmente se concebe dissociar, por exemplo, a actividade de embalagem e a remuneração dos embaladores, sem esvaziar a referida actividade do seu conteúdo. Assim, quanto ao exemplo da remuneração dos embaladores, esta enquadra-se, como as próprias actividades de embalagem, na subclasse n.° 74900 «Other supporting and auxiliary transport services».

78. A este propósito, parece-me, de maneira geral, que uma subdivisão exagerada dos serviços faria correr o risco, por um lado, de esvaziar certos serviços da sua essência e, por outro, de ter como resultado uma descrição teórica do concurso muito complexa e desconforme com a sua realidade concreta.

79. Em resposta à terceira questão, considero, portanto, que os serviços referidos na exposição dos factos se enquadram, alguns no anexo I A da Directiva 92/50 e, outros, no anexo I B da mesma. Perante a repartição destes serviços, tal como descrita no despacho de reenvio, parece-me que os serviços que se enquadram na referência CPC n.° 74 «Serviços de transporte de apoio e auxiliares» representam, em termos de valor, a maior parte do concurso. Constando esta referência do anexo I B da Directiva 92/50 (categoria 20), o conjunto do concurso, segundo o artigo 10.° desta directiva, parece, sob reserva das apreciações que cabem ao órgão jurisdicional de reenvio, dever ser adjudicado de acordo com os artigos 14.° e 16.° da mesma directiva.

Conclusões

80. Tendo em conta as considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda da seguinte forma às questões prejudiciais apresentadas pelo Bundesvergabeamt:

«1) Cabe, a fim de determinar o regime aplicável a um concurso de serviços destinados a obter um objectivo unitário mas que pode subdividir-se em serviços parciais, verificar a que anexo da Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços, está ligado cada serviço parcial. Segundo o artigo 10.° da referida directiva, a adjudicação do concurso far-se-á de acordo com as disposições dos títulos III a VI desta directiva se o valor dos serviços que constam no anexo I A desta última ultrapassar o dos serviços que constam no anexo I B. Inversamente, se o valor dos serviços que constam no anexo I B ultrapassar o dos serviços que constam no anexo I A, a adjudicação do concurso far-se-á de acordo, somente, com os artigos 14.° e 16.° da mesma directiva.

2) Tratando-se de serviços que correspondam a referências CPC diferentes, impõe-se uma separação com vista à determinação do regime aplicável à totalidade do concurso, ainda que isso tenha por consequência submeter um serviço prioritário somente a uma aplicação restrita da Directiva 92/50/CEE.

3) Os serviços referidos na exposição dos factos enquadram-se, alguns, no anexo I A da Directiva 92/50/CEE e, outros, no anexo I B da mesma. Perante a repartição destes serviços, tal como descrita no despacho de reenvio, os serviços que se enquadram na referência CPC n.° 74 Serviços de transporte de apoio e auxiliares parecem representar, em termos de valor, a maior parte do concurso. Constando esta referência do anexo I B da Directiva 92/50/CEE (categoria 20), a totalidade do concurso, segundo o artigo 10.° desta directiva, e sob reserva das apreciações que cabem ao órgão jurisdicional de reenvio, deve ser adjudicado de acordo com os artigos 14.° e 16.° da mesma directiva.

4) Quando um concurso global apresenta uma unicidade económica e técnica indubitável, as autoridades adjudicantes não têm, de forma alguma, de afastar a aplicação do artigo 10.° da Directiva 92/50/CEE à realização de concursos separados para, por um lado, os serviços parciais não prioritários e, por outro, os serviços parciais prioritários que concorrem para a realização de um mesmo objectivo.»