62000C0398

Conclusões do advogado-geral Alber apresentadas em 21 de Fevereiro de 2002. - Reino de Espanha contra Comissão das Comunidades Europeias. - Auxílios de Estado - Projectos notificados - Ausência de decisão da Comissão no prazo de dois meses - Prazo de quinze dias úteis para início do procedimento formal de exame - Regras para cálculo do prazo - Condições de notificação da informação prévia do Estado-Membro e da decisão da Comissão - Transmissão por telecópia. - Processo C-398/00.

Colectânea da Jurisprudência 2002 página I-05643


Conclusões do Advogado-Geral


I - Introdução

1 O Reino de Espanha impugna, mediante o presente recurso de anulação, a decisão da Comissão, de 17 de Agosto de 2000, de iniciar um procedimento formal de investigação, em conformidade com o actual artigo 88._, n._ 2, do Tratado CE, (ex artigo 93._), a fim de examinar um auxílio de Estado a favor de Santana Motor SA (a seguir «decisão impugnada») (1).

2 No cerne do litígio encontra-se o prazo de 15 dias úteis, previsto no artigo 4._, n._ 6, do «Regulamento (CE) n._ 659/1999 do Concelho, de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 93._ do Tratado CE» (a seguir «Regulamento n._ 659/1999») (2) durante o qual a Comissão pode, se for necessário, após ter recebido a informação de um Estado-Membro de que este vai executar as medidas de auxílio, iniciar um procedimento formal de investigação. As partes litigam, por um lado, sobre a questão de saber se para o início da contagem do prazo, atendendo a que a comunicação foi enviada por telecópia, é determinante a data da recepção (no caso vertente, sexta-feira, dia 28 de Julho de 2000) ou a data do registo da telecópia (no caso vertente, segunda-feira, dia 31 de Julho de 2000. Por outro lado, discute-se a questão de saber se já é determinante, para efeitos de observância de prazo, a adopção da decisão, por parte da Comissão, referente à abertura do procedimento formal de investigação (no caso vertente comunicada em 17 de Agosto de 2000) ou se é decisiva a data da notificação da correspondente decisão (no caso presente, em 23 de Agosto de 2000).

3 Os novos auxílios devem ser notificados à Comissão pelo respectivo Estado-Membro. Após essa notificação, a Comissão pode, em caso de dúvida, dar início a um procedimento formal de investigação, no prazo de dois meses. Na ausência dessa decisão, considera-se o auxílio autorizado e o Estado-Membro em causa pode executá-lo, excepto se a Comissão, decidir, no prazo de 15 dias - após a necessária informação subsequente por parte do Estado-Membro de que vai executar as medidas - dar início a um procedimento formal de investigação. A consequência do termo do prazo consiste, assim, em as medidas de auxílio notificadas passarem a ser consideradas auxílios existentes.

II - Enquadramento jurídico

4 O artigo 88._ do Tratado CE rege o procedimento relativo ao exame e autorização, pela Comissão, dos auxílios de Estado. No Regulamento n._ 659/1999, adoptado com base no artigo 89._ do Tratado CE, o dito procedimento é descrito mais detalhadamente. O seu artigo 4._ dispõe:

«[...]

1. A Comissão procederá à análise da notificação imediatamente após a sua recepção. Sem prejuízo do disposto no artigo 8._ [Esta disposição diz respeito à retirada da notificação.], a Comissão tomará uma decisão nos termos dos n.os 2, 3 ou 4 do presente artigo.

2. Quando [...], a Comissão considerar que a medida notificada não constitui um auxílio, fará constar esse facto por via de decisão.

3. Quando [...], a Comissão considerar que não há dúvidas quanto à compatibilidade da medida notificada com o mercado comum [...] decidirá que essa medida é compatível com o mercado comum [...]

4. Quando, após análise preliminar, a Comissão considerar que a medida notificada suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum, decidirá dar início ao procedimento formal de investigação nos termos do n._ 2 do artigo 93._ do Tratado, adiante designada `decisão de início de um procedimento formal de investigação'.

5. As decisões previstas nos n.os 2, 3 e 4 devem ser tomadas no prazo de dois meses. Esse prazo começa a correr no dia seguinte ao da recepção de uma notificação completa. A notificação considerar-se-á completa se, no prazo de dois meses a contar da sua recepção ou da recepção de qualquer informação adicional, a Comissão não solicitar mais nenhuma informação.

6. Quando a Comissão não tomar uma decisão nos termos do n.os 2, 3 ou 4 no prazo fixado no n._ 5, considerar-se-á que o auxílio foi autorizado pela Comissão. O Estado-Membro em causa pode então executar as medidas em questão após informação prévia à Comissão, excepto se esta tomar uma decisão nos termos do presente artigo no prazo de 15 dias úteis a contar da recepção da informação.»

III - Factos na origem do litígio

5 Desde 2 de Julho de 1998 que as autoridades espanholas estavam em contacto com a Comissão devido à concessão de uma garantia à sociedade Santana Motor SA em Junho de 1998. Por ofício de 1 de Julho de 1999, o Governo espanhol participou à Comissão o seu propósito de conceder mais auxílios à dita empresa. Esses auxílios - tratava-se de uma injecção de capital e de auxílios regionais - foram notificados por ofícios de 30 de Julho e 17 de Novembro de 1999, em conformidade com o n._ 3, do artigo 88._ CE. A Comissão considerou a notificação incompleta e solicitou mais informações, que recebeu a 24 de Maio de 2000.

6 Por ofício de sexta-feira, dia 28 de Julho de 2000, que foi transmitido por telecópia à Direcção-Geral competente nesse mesmo dia às 17.49, as autoridades espanholas comunicaram à Comissão, invocando o artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999, que a Junta de Andalucía ia executar as medidas notificadas. A telecópia foi registada na Comissão na segunda-feira, 31 de Julho de 2000.

7 A 17 de Agosto 2000 a Comissão decidiu dar início ao procedimento formal de investigação em conformidade com o artigo 88._, n._ 2, CE. Nesse mesmo dia, foi comunicado por telecópia à Representação Permanente do Reino de Espanha que a Comissão havia tomado a correspondente decisão. A 18 de Agosto de 2000, a Comissão enviou um outro ofício à Representação Permanente, no qual se remetia para a decisão adoptada no dia anterior e para a proibição de execução dela decorrente, que se mantinha, nos termos do artigo 88._, n._ 3, CE. A decisão propriamente dita, contra a qual foi interposto o presente recurso, só foi todavia comunicada ao Reino de Espanha - por ofício de 22 de Agosto 2000 - a 23 de Agosto de 2000.

IV - Tramitação processual e pedidos das partes

8 O Reino de Espanha interpôs recurso em 30 de Outubro de 2000.

O recorrente pretende que o Tribunal se digne,

1) anular a decisão da Comissão de 22 de Agosto 2000 relativamente a todas as medidas objecto da mesma, excepto quanto à garantia concedida em Junho de 1998;

2) condenar a Comissão nas despesas do processo.

9 A Comissão solicita ao Tribunal de Justiça que se digne,

1) negar provimento ao recurso;

2) condenar o recorrente nas despesas do processo.

Não houve lugar a audiência.

V - Argumentos das partes

A - Reino de Espanha

10 O Governo espanhol sustenta, liminarmente, que a decisão impugnada é um acto passível de recurso de anulação. Ele produz efectivamente efeitos jurídicos na medida em que qualificou os auxílios controvertidos como novos auxílios.

11 Mas na verdade, trata-se aqui de auxílios existentes, aos quais não é aplicável o artigo 88._, n._ 2, CE.

12 Sustenta o dito Governo que as medidas foram devidamente notificadas. Desde a recepção, a 24 de Maio de 2000, das informações adicionais solicitadas pela Comissão decorreram mais de dois meses, pelo que há lugar à aplicação do artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999. O prazo de 15 dias úteis nele estabelecido já havia expirado quando a decisão da Comissão foi notificada às autoridades espanholas.

13 A Comissão recebeu nesse mesmo dia, via telecópia, o ofício das autoridades espanholas, de 28 de Julho de 2000, no qual anunciavam a execução das medidas. Com isto começou a correr o prazo. A circunstância de os serviços da Comissão só em 31 de Julho de 2000 terem procedido ao registo de entrada da carta não tem qualquer interferência sobre o início do prazo. Em princípio, só pode ser decisiva a data na qual a correspondência é recebida no destinatário e não a data na qual o funcionário responsável dela tomou conhecimento.

14 Tal já resulta das Regras Aplicáveis aos Auxílios Estatais, publicadas pela Comissão (3). Foi aí estabelecido, no anexo I do «Guia dos procedimentos aplicáveis aos auxílios estatais», que os prazos se iniciam a partir da data da recepção da correspondência. A nota de rodapé n._ 106 do dito Guia explicita que, em caso de envio de correspondência por telecópia, o prazo se inicia na data de transmissão da telecópia.

15 Por conseguinte, o prazo começou a correr na segunda-feira, 31 de Julho de 2000 - primeiro dia útil subsequente à recepção da correspondência - e expirou a 21 de Agosto de 2000. A notificação da decisão ocorreu portanto posteriormente à expiração do prazo.

16 Ainda segundo aquele Governo, para efeitos de observância do prazo, só pode ser determinante a data da notificação. O momento em que a Comissão tomou a decisão, a nível interno, não é determinante. Uma decisão não pode produzir quaisquer efeitos jurídicos na esfera do destinatário antes de lhe ser notificada. É o que resulta do n._ 3 do artigo 254._ CE, segundo o qual as decisões apenas produzem efeitos mediante a notificação aos destinatários.

17 Aliás, se fosse determinante a data da adopção, tal poderia gerar uma grande insegurança jurídica. A data em que a Comissão toma uma decisão, a nível interno, só dificilmente é perceptível por quem lhe é alheio. A Comissão podia, após ter adoptado uma decisão, adiar discricionariamente a notificação ao Estado-Membro - de modo que este, eventualmente no desconhecimento dessa decisão, executasse as medidas relativas aos auxílios, - e não obstante, invocar posteriormente o prazo ainda em curso.

18 A notificação tão-pouco pode ser substituída pela telecópia enviada às autoridades espanholas em 17 de Agosto de 2000. Por aquela via, apenas se lhes comunicava que a Comissão havia tomado uma decisão em conformidade com o n._ 2 do artigo 88._ CE. Esta comunicação deve contudo ser distinguir-se da própria decisão adoptada, a qual se encontra contida, incluindo a necessária fundamentação, no ofício da Comissão de 22 de Agosto de 2000, que só foi notificado no dia 23 de Agosto de 2000.

19 A decisão adoptada a 17 de Agosto de 2000 tinha mero carácter preparatório e não deve ser considerada um acto jurídico na acepção do artigo 249._ CE. A verdadeira decisão só foi adoptada a 22 de Agosto de 2000 e portanto só após o prazo ter expirado.

20 A título subsidiário, o Governo espanhol sustenta que a Comissão não fundamentou suficientemente a decisão impugnada. A decisão não reflecte a convicção, por parte da Comissão, da incompatibilidade das medidas com o Tratado. Entende outrossim aquele Governo que ela apenas foi adoptada para impedir o termo do prazo estabelecido no artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999.

B - Comissão

21 Contra este entendimento, a Comissão sustenta que a decisão impugnada foi adoptada ainda dentro do prazo do artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 e que daí decorre que as medidas em causa não constituem auxílios existentes.

22 O prazo começou a correr apenas no dia 1 de Agosto de 2000, o dia seguinte ao registo. O envio por telecópia de uma comunicação na acepção do artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 é inadmissível. A comunicação carece, por motivos de segurança jurídica, de ser efectuada pela mesma forma do que a notificação de auxílios. A passagem do Guia dos procedimentos aplicáveis aos auxílios estatais mencionada pelo recorrente só é relevante para correspondência de menor importância. Por razões de ordem formal, uma comunicação desse tipo deve ser também enviada ao Secretariado-Geral e não à Direcção-Geral competente. Além disso, a telecópia foi recebida na sexta-feira, às 17h49m, fora das horas de expediente, de forma que nesse dia já não foi possível tomar conhecimento dela.

23 Acresce que o decurso do prazo foi interrompido pela decisão de 17 de Agosto de 2000. Determinante para a interrupção é a adopção e não a notificação da decisão. Tal já resulta da redacção do artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999. Segundo esta disposição, o Estado-Membro pode executar as medidas de auxílio, excepto se a Comissão «tomar uma decisão... no prazo de 15 dias úteis [...]» O Regulamento n._ 659/1999 distingue expressamente entre a adopção e a notificação de uma decisão. Neste sentido aponta o facto de, por força do artigo 25._ a Comissão ficar expressamente obrigada a notificar imediatamente o Estado-Membro interessado das decisões tomadas no âmbito deste Regulamento.

24 Se a decisão devesse ser comunicada ao Estado-Membro no prazo de 15 dias úteis, o regime estabelecido no artigo 25._ do Regulamento n._ 659/1999 seria desnecessário. Não faria sentido vincular a Comissão a uma notificação imediata de uma decisão se ela devesse, de qualquer modo, ser notificada ao Estado-Membro dentro de um determinado prazo.

25 A invocação do artigo 254._, n._ 3, CE, também não pode ser acolhida. Deste preceito não é possível extrair a conclusão de que uma decisão não notificada é ineficaz ou inexistente. E isto porque o artigo 254._, n._ 3, CE, não diz respeito à validade de uma decisão, mas apenas à sua eficácia perante os destinatários.

26 Além do mais, a decisão foi tomada a 17 de Agosto e não, como o recorrente pretende fazer valer, a 22 de Agosto de 2000. Nos termos do artigo 12._, 4._ parágrafo, do Regulamento interno da Comissão (4), considera-se que uma decisão é adoptada, em processo escrito, quando no termo do prazo estabelecido nenhum membro da Comissão tiver formulado ou mantido qualquer reserva. No presente caso isto veio a verificar-se a 17 de Agosto de 2000.

27 A objecção, aduzida a título subsidiário, de que a Comissão não fundamentou suficientemente a decisão impugnada, é considerada inadmissível pela dita instituição. Mediante a abertura do procedimento previsto no artigo 88._, n._ 2, CE, não é tomada qualquer decisão definitiva sobre a compatibilidade dos auxílios com o direito comunitário, de forma que não se verifica qualquer lesão dos direitos do requerente a este respeito.

VI - Apreciação jurídica

A - Admissibilidade

28 A Comissão não levantou, com efeito, qualquer questão prévia de inadmissibilidade. Todavia, por força do artigo 92._, n._ 2, do Regulamento de Processo, o Tribunal de Justiça pode, a todo o tempo e oficiosamente, verificar se faltam pressupostos processuais essenciais, designadamente se a medida controvertida constitui um acto jurídico impugnável (5).

29 Segundo do artigo 230._ CE, uma decisão só é impugnável se produzir efeitos jurídicos. Anteriormente à vigência do Regulamento n._ 659/1999, o Tribunal de Justiça declarou que a decisão da Comissão de dar início ao procedimento formal de investigação, nos termos do artigo 88._, n._ 2, CE, é susceptível de recurso. A dita decisão produz efectivamente efeitos jurídicos autónomos ao qualificar a medida como novo auxílio e não como auxílio existente (6).

30 A esta qualificação estão associados procedimentos distintos. Enquanto que os auxílios existentes são examinados pela Comissão em cooperação com os Estados-Membros, nos termos do artigo 88._, n._ 1, CE, os novos auxílios estão sujeitos aos requisitos dos n.os 2 e 3 do artigo 88._ CE e, de harmonia com os mesmos, não podem ser executados até à sua autorização pela Comissão.

31 Aliás, segundo a jurisprudência proferida anteriormente à adopção do Regulamento n._ 659/1999 (7), uma decisão deste tipo não constitui uma mera medida preparatória contra cujos efeitos só o recurso da decisão definitiva garantiria uma protecção jurídica suficiente. Este recurso não permitiria, designadamente, eliminar com efeitos retroactivos eventuais consequências de um adiamento da execução das medidas de auxílio - baseado no artigo 8._, n._ 3, terceira frase - aquando do pagamento posterior de auxílios.

32 A advogada-geral C. Stix-Hackl questionou, recentemente, a pertinência da aludida jurisprudência após a adopção do Regulamento n._ 659/1999 (8). Em sua opinião, os efeitos jurídicos da decisão de dar início ao procedimento formal não são irreversíveis (9). Como constituía uma medida preparatória de natureza processual, deixaria de ser admissível recurso de anulação da decisão (10). O Tribunal de Justiça não acolheu esta tese (11). Consequentemente, é admissível o recurso de anulação da decisão impugnada, nos termos do artigo 230._ CE.

B - Fundamentação

33 O recurso terá êxito se a decisão impugnada não tiver sido notificada no prazo do artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999. A verificar-se, tal significa que a decisão enferma de erro de direito, pois as medidas a favor da Santana Motor SA deviam ser qualificadas como auxílios existentes após o decurso do prazo de 15 dias úteis e a Comissão já não teria legitimidade para dar início imediato ao procedimento formal de investigação.

1) Início do prazo

34 A título liminar, cabe referir que a argumentação da Comissão relativamente à comunicação transmitida por telecópia pelo Governo espanhol a 28 de Julho de 2000 informando que as medidas iam ser executadas é, em si, contraditória. A Comissão considera, por um lado, que a comunicação devia ter sido enviada ao Secretariado-Geral, por correio, com aviso de recepção, nos termos o artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999. Considera inadmissível a via escolhida pelo Governo espanhol de enviar a carta controvertida por telecópia, para a competente Direcção-Geral. Por outro lado, não contesta que essa mesma telecópia tenha dado início à contagem do prazo após ter sido registada a 31 de Julho. Se a transmissão por telecópia não fosse admissível, a comunicação não produziria quaisquer efeitos jurídicos e não poderia, designadamente, dar início à contagem do prazo.

35 O Regulamento n._ 659/1999 não contém todavia quaisquer disposições relativas a formalidades, nem para a notificação nem para outras comunicações a enviar à Comissão no âmbito do processo de auxílios de Estado. O artigo 2._, n._ 2, do Regulamento n._ 659/1999 estipula simplesmente que o Estado-Membro, na sua notificação, deve fornecer todas as informações necessárias. Do Regulamento n._ 659/1999, per se, não é possível, portanto, inferir se a telecópia é um meio de transmissão admissível ou não.

36 Do anexo I do Guia dos procedimentos aplicáveis aos auxílios estatais (12) resulta em contrapartida, que a própria Comissão considera a telecópia um meio de transmissão admissível, visto que nele está contida uma regulamentação para a contagem de prazos segundo a qual para o início do prazo é determinante a recepção da correspondência pertinente e, no caso especial do envio por telecópia, a data da transmissão. Esta regulamentação seria despicienda se a correspondência a endereçar à Comissão não pudesse ser enviada por telecópia.

37 A objecção levantada pela Comissão segundo a qual esta regulamentação apenas se aplica a correspondência de menor importância e não, designadamente, à correspondência geradora de efeitos jurídicos, não encontra qualquer suporte no Guia. O anexo I do Guia diz respeito a todas regras relativas a prazos em matéria de procedimentos de controlo de auxílios, tal como resulta da frase introdutória do título «Contagem de prazos» («São estabelecidos prazos para diversos tipos de medidas no âmbito dos processos de auxílios estatais.»). Esta asserção relativa à determinação do início do prazo constante da nota de rodapé n._ 106 do Guia, é igualmente aplicável, em termos gerais, às transmissões por telecópia. Não se vislumbra uma diferenciação entre acções ou prazos «importantes» e «menos importantes».

38 Segundo a argumentação expendida pela Comissão no presente processo, a importância de um acto depende do facto de ele produzir efeitos jurídicos e, sendo esse o caso, a transmissão por telecópia deve ser excluída. Todavia, qualquer documento escrito que desencadeie ou interrompa um prazo já tem, só por isso, consequências jurídicas. Seguindo a premissa da Comissão até às últimas consequências, resultaria que os documentos escritos que interferem com a contagem dos prazos não poderiam, regra geral, ser transmitidos por telecópia. Fica sem resposta a questão de saber qual o sentido que deve então ser dado às explicações constantes do Guia relativas à contagem do prazo em caso de transmissão por telecópia.

39 O envio de correspondência via telecópia é actualmente um expediente tecnicamente aperfeiçoado e muito divulgado. A telecópia é um meio de comunicação seguro e gerador de economia de tempo. Desde que não existam regras especiais relativas à forma que imponham quer a apresentação dos documentos originais ou com a aposição de uma assinatura original quer determinadas formas de envio (com registo, com aviso de recepção, inter alia) a telecópia deve ser considerada, em princípio, um meio admissível para a transmissão de comunicações à Comissão.

40 Não obstante, deve ser tido em consideração que o envio de correspondência por telecópia nem sempre decorre sem problemas a nível local. Em casos pontuais, avarias no aparelho emissor ou receptor podem ter por consequência anomalias no processo de transmissão. Uma transmissão imperfeita pode conduzir a que o documento não seja entregue ao seu destinatário ou que o seu conteúdo seja incompreensível. Uma telecópia deste tipo não poderá, no mínimo, desencadear a contagem de um prazo quando o erro tenha origem na esfera do emissor. O facto de, pontualmente, poderem ocorrer problemas quando da transmissão não implica, ainda assim, uma inadmissibilidade geral da utilização da telecópia como meio de transmissão. Pois, tal como o Guia dos procedimentos aplicáveis aos auxílios estatais (13) evidencia, a Comissão reconheceu, apesar destes conhecidos riscos gerais, ser possível, em princípio, a transmissão por telecópia.

41 No presente caso, não se descortinam quaisquer indícios de que a comunicação do Reino de Espanha de 28 de Julho de 2000 não tenha sido integralmente transmitida. É certo que o relatório de transmissão não fornece, por norma, qualquer prova de que um documento chegou na íntegra ao destinatário, dado que apenas pode representar um comprovativo de que a telecópia saiu do aparelho emissor. Porém, no caso concreto, a transmissão integral da carta não foi contestada pela Comissão. O documento que a Comissão registou a 31 de Julho de 2000 é precisamente a carta enviada por telecópia. É pouco credível que a Comissão procedesse ao registo de uma comunicação que não tivesse recebido cabalmente, sem qualquer pedido de mais ampla informação.

42 Na verdade, a telecópia poderia ser um meio de transmissão inadequado se a autenticidade de um documento tivesse de ser comprovada através da assinatura do emissor no original. Neste sentido, por exemplo o artigo 37._, n._ 6, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça permite o envio de peças escritas por telecópia, a fim de que a data seja tomada em consideração para efeitos do respeito dos prazos processuais. A sua validade depende, contudo, do envio do original do acto assinado o mais tardar, dez dias depois. Este regime especial do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça é necessário porque permite uma derrogação à regra geral do artigo 37._, n._ 1, segundo a qual os originais de todos os actos processuais devem ser assinados pelo agente ou pelo advogado da parte.

43 Dos autos não resulta, e no caso em apreço tal é também desprovido de relevância, quando e se foi posteriormente expedida por correio a comunicação do Governo espanhol de 28 de Julho de 2000. Na ausência de regras pertinentes relativas à forma, não devem ser impostos à comunicação efectuada nos termos do artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 requisitos mais exigentes comparativamente aos previstos no Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça quanto à prova da sua autenticidade.

44 Segundo o regime do n._ 1.2.2 das Regras Aplicáveis aos Auxílios Estatais (14), a notificação de novos auxílios deve ser sempre feita ao Secretariado-Geral da Comissão. Tal como já é manifesto pela sua redacção, este regime é todavia, apenas aplicável directamente à própria notificação e não a outra correspondência a dirigir à Comissão.

45 Não há motivos para estender o âmbito de aplicação deste regime a outras comunicações. O sentido e o objectivo desta disposição consistem em concentrar a recepção das notificações num serviço central - neste caso, no Secretariado-Geral - porquanto os novos auxílios têm de ser primeiro registados no registo central de todos os processos de auxílios estatais pendentes e afectados à respectiva direcção-geral competente (15). Se tal já se verificou, deixa de haver qualquer necessidade de dirigir a correspondência a um serviço central. Pelo contrário, é mesmo do interesse da Direcção-Geral competente receber rapidamente a correspondência dos Estados-Membros isto é, sem desvio através do Secretariado-Geral. Isto é válido especialmente quando estão associadas consequências jurídicas à correspondência, tal como, por exemplo, no caso vertente o início de um prazo curto.

46 Quanto à notificação, a própria Comissão determinou, no n._ 1.2.2 do Guia dos procedimentos aplicáveis aos auxílios estatais (16), que ela fosse directamente enviada à Direcção-Geral responsável, por forma a permitir uma economia de tempo a nível do seu tratamento. É óbvio que a dita economia de tempo é alcançada através da transmissão directa à Direcção-Geral competente de todas as comunicações e não apenas da notificação.

47 O facto de a telecópia ter sido recebida na Comissão fora das horas de expediente não tem qualquer consequência para o início do prazo. Por norma, não é determinante o momento em que o funcionário competente toma conhecimento da correspondência. É o que desde logo resulta do anexo I do Guia dos procedimentos aplicáveis aos auxílios estatais (17). Nele se refere que o prazo se inicia a partir da data de recepção da correspondência ou da data de envio se a correspondência for enviada por telecópia, ou seja, independentemente do momento da tomada de conhecimento pelo respectivo destinatário. Além disso, deve ser tido em consideração que esse momento é frequentemente aleatório e de modo algum previsível para o emissor. Tomar como referência o momento da tomada de conhecimento teria como consequência uma considerável insegurança jurídica.

48 O artigo 3._ do Regulamento (CEE/Euratom) n._ 1182/71 do Conselho, de 3 de Junho 1971, relativo à determinação das regras aplicáveis aos prazos, às datas e aos termos (18) (a seguir «Regulamento n._ 1182/71») estabelece qual é o momento determinante para o início de um prazo calculado em dias. Segundo este preceito, o dia em que o evento ocorreu ou o acto foi praticado não é incluído na contagem do prazo. No caso vertente, a transmissão da telecópia é determinante para o início do prazo.

49 Este regime assegura que a contagem do prazo não depende da hora em que se verificou o facto a partir do qual o prazo começa a correr (19). Por conseguinte, a circunstância de, no caso em apreço, a comunicação do governo espanhol só ter dado entrada na Comissão após o encerramento dos serviços, não conduziu a uma redução do prazo de 15 dias úteis.

50 Assim, o prazo começou a correr no primeiro dia útil subsequente a 28 de Julho de 2000 - dias úteis são, nos termos do artigo 2._, n._ 2 do Regulamento n._ 1182/71, todos aqueles que não sejam dias feriados, domingos e sábados - portanto, na segunda-feira, dia 31 de Julho de 2001. Atendendo ao artigo 3._, n._ 2, alínea b), do Regulamento n._ 1182/71, o prazo terminou no final do dia 21 de Agosto de 2000. Na contagem não foram tomados em consideração os dias 5/6, 12/13 e 19/20 de Agosto de 2000 porque coincidiram com sábados e domingos, bem como o dia 15 de Agosto, que foi feriado para a Comissão (20), visto que não se tratava de dias úteis.

2) Quanto à questão da interrupção do prazo

a) Data da adopção da decisão

51 A decisão adoptada pela Comissão a 17 de Agosto de 2000 não possui mero carácter preparatório - contrariamente ao entendimento do Reino de Espanha - constitui outrossim um acto jurídico com efeitos jurídicos próprios, ao qual são aplicáveis os artigos 249._ e 254._ CE. O processo de adopção de uma decisão é regulado em pormenor no Regulamento interno da Comissão.

52 Nos termos do artigo 4._ do seu Regulamento interno (21), as decisões da Comissão são adoptadas sempre em reunião ou por processo escrito, ou mediante delegação. O processo escrito utilizado na decisão ora impugnada encontra-se descrito no artigo 12._ do Regulamento interno. Nos termos do seu quarto parágrafo, considera-se que uma proposta é adoptada pela Comissão quando nenhum dos seus membros tiver formulado ou mantido qualquer reserva até ao termo do prazo estabelecido. Com o termo do prazo fica concluído o processo de decisão no interior da Comissão. Nesse momento, verificou-se a deliberação e a decisão é adoptada. Não existe contradição no facto de a carta notificada às autoridades espanholas ser datada com uma data posterior, concretamente de 22 de Agosto de 2000, pois essa carta destina-se meramente à efectivação e transmissão da decisão já adoptada a 17 de Agosto de 2000. Além do mais - e como seguidamente explicaremos, a solução depende exclusivamente da notificação - ambas as datas são irrelevantes para a decisão.

53 Dado que a decisão adoptada em 17 de Agosto de 2000 só foi notificada ao Reino de Espanha a 23 de Agosto de 2000 e portanto, após o termo do prazo, cabe esclarecer através da interpretação do artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999, qual é a ocorrência relevante para uma eficaz interrupção do prazo.

b) Interpretação do artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999

54 Segundo a redacção do artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 é relevante a data da tomada da decisão, pois «O Estado-Membro em causa pode [...] executar as medidas em questão após informação prévia à Comissão, excepto se esta tomar uma decisão nos termos do presente artigo no prazo de 15 dias úteis a contar da recepção da informação [itálico nosso]».

55 Além disso, do contexto geral do Regulamento n._ 659/1999 é possível concluir que o legislador sempre procedeu efectivamente a uma distinção entre a adopção e a notificação de uma decisão. Nesse sentido aponta o facto de o artigo 25._ do Regulamento n._ 659/1999, por força do qual a Comissão fica vinculada a notificar as suas decisões, uma vez tomadas, imediatamente ao Estado-Membro em causa, contemplar expressamente uma regulamentação sobre a notificação.

56 Não obstante, não é possível daí concluir - contrariamente ao entendimento da Comissão - que o regime do artigo 25._ do Regulamento n._ 659/1999 seria supérfluo se a Comissão já estivesse sujeita à obrigação de notificar as decisões ao respectivo destinatário dentro de um determinado prazo. E isto porque, por um lado, este regime geral é aplicável a todas as decisões a adoptar com base no Regulamento n._ 659/1999, incluindo aquelas que não estão sujeitas a prazo. Por outro lado, pelo artigo 25._ é imposto à Comissão que aja «imediatamente» e, portanto, que tenha uma actuação mais rápida do que aquela que por norma a observância de um prazo exige.

57 O artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 deve todavia ser interpretado à luz dos Tratados. Na esteira da jurisprudência constante, as disposições do direito comunitário derivado devem ser interpretadas, na medida do possível, no sentido da sua conformidade com as disposições do Tratado (22).

58 O Tratado CE contém no artigo 254._, n._ 3, uma regra segundo a qual, as decisões (só) produzem efeitos mediante a sua notificação. Diversamente do que se verifica quanto aos regulamentos, o artigo 254._, n._ 2, CE, não impõe a publicação das decisões no Jornal Oficial. A notificação é portanto uma formalidade indispensável para que uma decisão possa produzir efeitos (23).

59 Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, um acto emanado das autoridades públicas não é oponível aos cidadãos antes de existir a possibilidade de estes dele tomarem conhecimento (24). Este princípio tem igualmente de ser válido quando os destinatários do acto jurídico não são cidadãos mas sim Estados-Membros.

60 Tendo em atenção o artigo 254._, n._ 3, CE, o artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 deve por conseguinte, ser interpretado no sentido de que para a interrupção do prazo não é decisiva a data da tomada da decisão pela Comissão, mas sim a sua notificação.

61 A Comissão discorda, sustentando que se deve proceder à distrinça entre a validade da decisão enquanto tal (validité intrinsèque), que se verifica com a sua adopção por parte da Comissão, e a eficácia perante terceiros. Esta última encontra-se regulamentada no artigo 254._, n._ 3, CE. O artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 diz respeito todavia, à validade propriamente dita.

62 Não podemos subscrever esta análise. É verdade que um acto jurídico adoptado mas ainda não notificado comporta porventura uma validade latente ou sujeita à condição suspensiva da sua notificação. Nesta fase já não pode ser modificado (25).

63 Contudo, para produzir efeitos perante os destinatários - e é esse o cerne da questão no caso que nos ocupa - o acto jurídico tem de ser-lhes notificado. A decisão de proceder à abertura do procedimento formal destina-se precisamente a interromper o prazo previsto no artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 e proibir assim ao Estado-Membro a execução do auxílio. Se o Estado-Membro não tiver conhecimento da decisão, este efeito não lhe pode ser oposto.

64 Esta interpretação corresponde igualmente ao sentido e objectivo da regulamentação relativa aos prazos constante do artigo 4, do Regulamento n._ 659/1999. Tal como sucede para a generalidade dos prazos, os prazos aí regulamentados prosseguem igualmente o objectivo de garantir, após o seu termo, a segurança e a harmonia jurídicas. Neste preceito, foram transpostos para o direito positivo os princípios desenvolvidos pelo Tribunal de Justiça pela primeira vez no acórdão Lorenz (26). No acórdão Siemens (27), o Tribunal de Justiça fundamentou mais amplamente estes princípios.

65 Embora as considerações do Tribunal de Justiça nesse processo, e seguidamente reproduzidas, sejam referentes ao prazo de dois meses dentro do qual a Comissão deve dar início ao procedimento formal, podem todavia ser transpostas para o prazo de 15 dias úteis que decorre após a comunicação do Estado-Membro de que irá dar início à execução do auxílio. O Tribunal de Justiça afirmou então (28):

«Inspirando-se nos artigos 173._ e 175._ do Tratado e avaliando assim em dois meses a duração máxima do prazo, O Tribunal de Justiça pretendeu [no acórdão Lorenz] evitar uma insegurança jurídica manifestamente contrária ao objectivo da fase de pré-exame dos auxílios de Estado instituída pelo n._ 3 do artigo 93._ do Tratado. Com efeito, tal objectivo, que consiste em fazer beneficiar o Estado-Membro da segurança jurídica necessária, determinando rapidamente a compatibilidade com o Tratado de um auxílio que pode revestir natureza urgente, estaria comprometido se o prazo fosse considerado indicativo. Além disso, a segurança jurídica daí decorrente podia agravar-se em caso de prolongamento artificial da fase de pré-exame».

66 É certo que a Comissão não questionou que o prazo de 15 dias úteis tem carácter vinculativo. Se, contudo, para efeitos de interrupção do prazo, fosse relevante a deliberação da Comissão e não a notificação da decisão aos Estados-Membros, esse prazo prolongar-se-ia em relação ao Estado-Membro.

67 O Estado-Membro em causa não consegue, normalmente, saber se e quando é que a Comissão tomou uma decisão a nível interno. Regra geral, as medidas relativas aos auxílios podem ser executadas decorridos os prazos previstos no artigo 4._ do Regulamento n._ 659/1999. Se para a interrupção do prazo fosse determinante a adopção (a nível interno) da decisão, isso conduziria a que o Estado-Membro, embora já tivesse aguardado, no mínimo dois meses, pela decisão da Comissão e já tivesse decorrido o prazo de 15 dias úteis, nem mesmo assim poderia confiar na ficção de autorização prevista no artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999. O Estado-Membro teria de retardar ainda mais a execução das medidas a fim de não correr o risco de, posteriormente, ter de proceder à recuperação do auxílio. Numa tal hipótese, não seria claro quanto tempo mais teria de aguardar para ter a certeza de já não lhe seria notificada, em qualquer momento, uma decisão sobre a qual a Comissão havia deliberado dentro dos 15 dias úteis. O objectivo de garantir a segurança jurídica, prosseguido pelo artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 ficaria comprometido se a adopção da decisão fosse determinante e não a sua notificação.

68 Deve também ser tido em atenção que, neste contexto, não são apenas os interesses dos Estados-Membros que são afectados por uma decisão da Comissão mas também, sempre, os dos destinatários dos auxílios. Para estes, a concessão ou a denegação do auxílio assume, regra geral, importância extrema ou mesmo essencial. Mesmo não sendo os destinatários directos da decisão, é igualmente digna de tutela a sua confiança criada pela ficção da autorização após o decurso dos 15 dias úteis.

69 Finalmente, deve ser tido em conta que a decisão de abertura do procedimento formal constitui um acto susceptível de recurso de anulação (29). O prazo para a interposição do recurso inicia-se, segundo o artigo 230._ CE, quinto parágrafo, por norma, com a notificação ou com a publicação do acto em causa. Se, para a interrupção do prazo previsto no artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999, fosse determinante a adopção, a decisão já produziria efeitos jurídicos em relação aos destinatários mesmo antes do prazo para interpor recurso ter começado e, consequentemente, de o acto jurídico ser impugnável. Constitui uma exigência da coerência do ordenamento jurídico comunitário e do princípio da plena protecção jurídica não tomar por base momentos distintos para a produção dos efeitos jurídicos de uma decisão e para o início do prazo de interposição de recurso.

c) Aplicação ao caso em apreço

70 Consequentemente, cabe analisar se a decisão impugnada foi levada ao conhecimento do Reino de Espanha antes do termo do prazo ocorrido em 21 de Agosto de 2000.

71 Uma decisão considera-se notificada a partir do momento em que é comunicada ao seu destinatário e este está em condições de dela tomar conhecimento (30). Uma decisão considera-se recebida assim que entre regularmente na esfera pessoal do destinatário (31).

72 A notificação não foi efectuada mediante as telecópias de 17 e 18 de Agosto 2000. Estas continham unicamente a breve comunicação de que a Comissão havia tomado uma decisão nos termos do artigo 88._, n._ 2, CE, mas não a própria decisão vertida em 14 páginas. Por um lado, uma decisão na acepção do artigo 249._ CE carece de fundamentação, por força do artigo 253._ CE, que, porém, não estava contida nas comunicações de 17 e 18 de Agosto de 2000. Por outro lado, em momento algum a Comissão sustentou que as ditas comunicações devem ser consideradas como a decisão prevista no n._ 2 do artigo 88._ CE. O mero conhecimento do facto de que havia sido tomada a decisão correspondente não pode substituir a notificação da própria decisão (32).

73 A notificação só se deu com a comunicação da decisão impugnada em 23 de Agosto 2000 e, por isso, após o termo do prazo. A decisão impugnada não podia, assim, interromper o prazo no presente caso. Assim sendo, as medidas devem ser consideradas auxílios existentes, o que implica que o procedimento formal nos termos do artigo 88._, n._ 2, CE, só seria aplicável se não houvesse acordo entre a Comissão e o Reino de Espanha sobre as medidas adequadas, em conformidade com o n._ 1 do mesmo artigo. A decisão de abertura do procedimento formal enferma, pois, de ilegalidade.

3) Objecção relativa à fundamentação insuficiente

74 Para o caso de o Tribunal de Justiça não acolher estes argumentos, cabe ainda analisar a objecção aduzida a título subsidiário pelo Governo espanhol.

75 O recorrente sustentou que a decisão impugnada não reflecte que a Comissão estivesse convencida da incompatibilidade dos auxílios com o direito comunitário. A decisão padecia, portanto, do vício de falta de fundamentação.

76 Tal como já foi referido supra, a decisão prevista no artigo 88._, n._ 2, CE, só é impugnável na medida em que proceda à qualificação das medidas de auxílio em causa como novo auxílio ou auxílio existente. Relativamente à compatibilidade do auxílio com o direito comunitário, ela só constitui uma medida preparatória. Contra a sua invalidade - incluindo a formal - o destinatário encontra-se suficientemente protegido através da possibilidade de impugnação da decisão definitiva. Não pode portanto ser suscitada a objecção da fundamentação insuficiente da decisão.

77 No processo que nos ocupa, essa objecção pode contudo ser entendida como uma alegação de desvio de poder, pois, no essencial, o Governo espanhol sustenta que a Comissão apenas adoptou a decisão impugnada para evitar o decurso do prazo de 15 dias estabelecido no artigo 4._, n._ 6, do Regulamento n._ 659/1999 e não porque - como o artigo 4._, n._ 4, do Regulamento n._ 659/1999 prevê - após uma análise preliminar da medida, fossem suscitadas dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum.

78 Mas, mesmo assim entendida, esta alegação não pode ser acolhida pois, por um lado, a decisão também não é recorrível com base nesse fundamento, dado que o recurso da decisão definitiva já proporciona tutela suficiente ao destinatário nesta matéria. Por outro lado, o Governo espanhol não apresentou quaisquer indícios concretos sobre os quais se possa apoiar a acusação de desvio de poder.

VII - Despesas

79 Por força do disposto no n._ 2 do artigo 69._ do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se tal tiver sido requerido.

VIII - Conclusão

80 Propomos, por isso, ao Tribunal de Justiça que decida nos seguintes termos:

«1) É anulada a Decisão da Comissão de 17 de Agosto 2000 (notificada a 23 de Agosto de 2000, por carta de 22 de Agosto de 2000) relativamente a todas as medidas objecto da mesma, com excepção da garantia concedida em Junho de 1998.

2) A Comissão das Comunidades Europeias é condenada nas despesas.»

(1) - JO 2000, C 328, p. 18.

(2) - JO L 83, p. 1.

(3) - Comissão ed.: Direito da Concorrência nas Comunidades Europeias, volume II A, 1999.

(4) - JO 1999, L 252, p. 41.

(5) - Acórdãos de 11 de Julho de 1990, Neotype e Techmashexport/Comissão e Conselho (C-305/86 e C-160/87, Colect., p. I-2945, n._ 18), e de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão (C-313/90, Colect., p. I-1125, n._ 23).

(6) - Acórdãos de 30 de Junho de 1992, Espanha/Comissão, dito «Cenemessa» (C-312/90, Colect., p. I-4117, n.os 19 e segs.), e, Itália/Comissão, dito «Italgrani» (C-47/91, Colect., p. I-4145, n.os 27 e segs.).

(7) - Já referida na nota 7.

(8) - Conclusões no processo Itália/Comissão (acórdão de 29 de Março de 2001, C-400/99, Colect., pp. I-7303, I-7306).

(9) - Conclusões no processo Itália/Comissão, citado na nota 9, n.os 42 e segs., em especial, n._ 52.

(10) - Conclusões apresentadas no processo Itália/Comissão, citado na nota 9, n._ 77 (em resumo).

(11) - Acórdão Itália/Comissão, citado na nota 9.

(12) - Já referido na nota 4, p. 49.

(13) - Já referido na nota 4.

(14) - Já referido na nota 4, p. 28; v. especificamente para o sector dos veículos automóveis: Enquadramento comunitário dos auxílios estatais no sector dos veículos automóveis (JO 1997, C 279, p. 1).

(15) - V. anexo I do Guia dos procedimentos aplicáveis aos auxílios estatais. Disposições de carácter administrativo da Comissão, já referido na nota 4.

(16) - Já referido na nota 4, p. 30.

(17) - Já referido na nota 4.

(18) - JO L 124, p. 1; EE 01 F1 p. 149.

(19) - Quanto ao regime correspondente no Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, v. acórdão de 15 de Janeiro de 1987, Misset/Conselho (152/85, Colect., p. 223, n._ 7).

(20) - JO 1999, C 379, p. 26.

(21) - JO 1999, L 252, p. 41.

(22) - Acórdãos de 25 de Novembro de 1986, Klensch e o. (C-201/85 e C-202/85, Colect., p. 3477, n._ 21), e de 21 de Março de 1991, Rauh (C-314/89, Colect., p. I-1647, n._ 17).

(23) - V. conclusões do advogado-geral G. Van Gerven no processo Comissão/BASF AG e o. (acórdão de 29 de Junho de 1993, C-137/92 P, Colect., pp. I-2555, 2559, n._ 62).

(24) - Acórdão de 25 de Janeiro de 1979, Racke (98/78, Recueil, p. 69, Colect., p. 53, n._ 15).

(25) - Acórdão de 23 de Fevereiro de 1988, Reino Unido/Conselho, dito «Galinhas poedeiras» (131/86, Colect., p. 905, n.os 34 e segs.).

(26) - Acórdão de 11 de Dezembro de 1973, Lorenz (120/73, Recueil, p. 1471, Colect., p. 553).

(27) - Acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Fevereiro de 2001, Áustria/Comissão, dito «Siemens» (C-99/98, Colect., p. I-1101, n._ 73).

(28) - Acórdão Siemens, já referido na nota 28, n._ 73.

(29) - V. supra, n.os 29 e segs.

(30) - Acórdãos de 21 de Fevereiro de 1973, Europemballage e Continental Can/Comissão (6/72, Recueil, p. 215, n._ 10, Colect. 1973, p. 109), e de 13 de Julho de 1989, Olbrechts/Comissão (C-58/89, Colect., p. 2643, n._ 10).

(31) - Neste sentido, o Tribunal de Justiça em relação às declarações de vontade, acórdão de 10 de Dezembro de 1957, ALMA/Alta Autoridade (8/56, Recueil, pp. 186, 200, Colect., p. 163).

(32) - V. acórdão de 9 de Janeiro de 1997, Comissão/Socurte e o. (C-143/95 P, Colect., p. I-1, n._ 31).