ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)
21 de Novembro de 2000
Processo T-214/99
Manuel Tomás Carrasco Benítez
contra
Comissão das Comunidades Europeias
«Funcionários — Recrutamento — Acesso aos concursos internos — Aviso de concurso — Condição relativa à antiguidade no serviço — Experiência profissional do candidato»
Texto integral em língua francesa II-1169
Objecto:
Pedido de anulação da decisão dos júris dos concursos internos COM/T/R/ADM/A/98, COM/R/5179/98, COM/R/5182/98, COM/R/5183/98, COM/R/5188/98 e COM/R/5190/98 de não admitir o recorrente às provas destes concursos.
Decisão:
É negado provimento ao recurso. Cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.
Sumário
Funcionários — Recurso — Reclamação administrativa prévia — Identidade de objecto e causa — Fundamentos e argumentos não constantes da reclamação — Questão pormenorizadamente examinada pela autoridade investida do poder de nomeação na decisão de indeferimento da reclamação — Admissibilidade
(Estatuto dos Funcionários, artigos 90.o e 91.o)
Funcionários — Concurso — Concursos internos — Concurso dito de «titularização» — Condições de admissão — Antiguidade no serviço de dez anos completos na qualidade de agente a que se refere o Regime aplicável aos outros agentes — Admissibilidade
(Estatuto dos Funcionários, artigos 27.o, primeiro parágrafo, e 29.o, n.o 1)
Funcionários — Concurso — Concurso documental e por provas — Condições de admissão — Estabelecimento no aviso de concurso — Apreciação pelo júri da experiência profissional dos candidatos — Controlo jurisdicional — Limites
(Estatuto dos Funcionários, anexo III, artigo 2.o)
Funcionários — Concurso — Concurso documental e por provas — Condições de admissão — Documentos justificativos — Pedido do júri de informações complementares — Mera faculdade — Obrigação de exigir a apresentação do conjunto de documentos exigidos — Inexistência
(Estatuto dos Funcionários, anexo III, artigo 2.o, segundo parágrafo)
Funcionários — Concurso — Concurso documental e por provas — Recusa de admissão às provas — Fundamentação — Obrigação — Alcance
(Estatuto dos Funcionários, artigo 25.o, segundo parágrafo; anexo III, artigo 5.o)
Quando, na decisão de indeferimento de uma reclamação, a autoridade investida do poder de nomeação toma posição, de forma pormenorizada, sobre uma questão não suscitada na reclamação, a argumentação desenvolvida pelo funcionário interessado sobre essa mesma questão, no recurso interposto para o órgão jurisdicional comunitário na sequência do indeferimento da sua reclamação, deve ser declarada admissível.
Uma vez que a instituição recorrida apresentou as suas observações sobre a questão no decurso do procedimento administrativo, não se pode entender que o silêncio da reclamação sobre esse ponto viola os princípios da segurança jurídica e do respeito dos direitos da defesa, que estão subjacentes à regra da concordância entre a reclamação administrativa e o recurso contencioso.
(cf. n.os 37 e 38)
Ver: Tribunal de Primeira Instância, 28 de Maio de 1998, W/Comissão (T-78/96 e T-170/96. ColectFP, pp. I-A-239 e II-745. n.o 66)
O exercício do amplo poder de apreciação que o Estatuto confere às instituições em matéria de organização de concursos deve ser compatível com as disposições imperativas do primeiro parágrafo do artigo 27.o do Estatuto, nos termos das quais qualquer procedimento de recrutamento tem em vista assegurar à instituição o serviço de funcionários que possuam as mais elevadas qualidades de competência, rendimento e integridade, bem como do n.o 1 do artigo 29.o do mesmo Estatuto. A faculdade de escolha decorrente do amplo poder de apreciação atribuído na matéria à autoridade investida do poder de nomeação deve, em consequência, ser sempre exercida em função das exigências relacionadas com os lugares a prover e, de forma mais genérica, com o interesse do serviço.
Ao exigir uma antiguidade de serviço de dez anos nas Comunidades Europeias como condição de admissão a um concurso visando a titularização de agentes temporários dos graus A 8 e A 3, a Comissão exerceu o seu poder de apreciação de forma compatível com o interesse do serviço. Com efeito, o facto de se dispor de uma antiguidade e, em consequência, de uma experiência significativa nas instituições comunitárias constitui indício seguro da existência das qualidades exigidas no primeiro parágrafo do artigo 27.o do Estatuto. Tendo em conta a natureza dos lugares a prover, todos eles correspondentes a funções elevadas de direcção, concepção e estudo, a Comissão manteve-se também dentro dos limites do exercício razoável do seu poder de apreciação.
(cf. n.os 52 a 56)
Ver: Tribunal de Primeira Instância, 8 de Novembro de 1990, Bataille e o./Parlamento (T-56/89, Colect., p. II-597, n.o 42); Tribunal de Primeira Instância, 6 de Março de 1997, de Kerros e Kohn-Bergé/Comissão (T-40/96 e T-55/96, ColectFP, pp. I-A-47 e II-135, n.o 39); Tribunal de Primeira Instância, 12 de Novembro de 1998, Carrasco Benítez/Comissão (T-294/97, ColectFP, pp. I-A-601 e II-1819, n.os 41 e 43, e jurisprudência aí citada)
O júri de um concurso documental e por provas tem a responsabilidade de apreciar, caso a caso, se os diplomas ou a experiência profissional apresentados por cada candidato correspondem ao nível exigido pelo Estatuto e pelo aviso de concurso. O júri dispõe de um poder discricionário na apreciação das experiências profissionais anteriores dos candidatos, tanto no que se refere à respectiva natureza e duração como à relação mais ou menos forte que possam apresentar com as exigências do lugar a prover.
No quadro do controlo da legalidade, o Tribunal deve limitar-se a verificar se o exercício desse poder não está viciado por erro manifesto.
(cf. n.os 69 a 71)
Ver: Tribunal de Primeira Instância, 13 de Dezembro de 1990, González Holguera/Parlamento (T-115/89. Colect., p. II-831, n.o 54); Tribunal de Primeira Instância, 7 de Fevereiro de 1991, Ferreira de Freitas/Comissão (T-2/90, Colect., p. II-103, n.o 56); Tribunal de Primeira Instância, 28 de Novembro de 1991, Van Hecken/CES (T-158/89, Colect., p. II-1341, n.o 23, e jurisprudênciaaí citada); Tribunal de Primeira Instância. 6 de Novembro de 1997, Wolf/Comissão (T-101/96. ColectFP, pp. I-A-352 e II-949, n.os 64 e 68); Tribunal de Primeira Instância. 11 de Fevereiro de 1999, Mertens/Comissão (T-244/97, ColectFP, pp. I-A-23 e II-91, n.o 44)
Um júri de concurso apenas está obrigado a atender aos documentos apresentados pelos candidatos para apreciar a respectiva experiência profissional à luz das exigências estabelecidas no aviso de concurso. De forma alguma é obrigado a convidar um candidato a apresentar documentos suplementares ou a ele próprio proceder a investigações para verificar se o candidato preenche o conjunto de condições do aviso de concurso.
A este respeito, as disposições do segundo parágrafo do artigo 2.o do anexo III do Estatuto oferecem uma mera faculdade ao júri de solicitar aos candidatos informações complementares, quando tenha dúvidas sobre o alcance de um documento apresentado, não podendo transformar-se em obrigação o que o legislador comunitário concebeu como mera faculdade do júri de concurso.
(cf. n.os 77 e 78)
Ver: Tribunal de Justiça, 31 de Março de 1992, Burban/Parlamento (C-255/90 P, Colect., p. I-2253, n.os 16 e 20); Tribunal de Primeira Instância, 21 de Maio de 1992, Almeida Antunes/Parlamento (T-54/91, Colect., p. II-1739, n.o 40); Tribunal de Primeira Instância, 17 de Setembro de 1998, Jouhki/Comissão (T-215/97, ColectFP, pp. I-A-503 e II-1513, n.o 58)
A obrigação de fundamentar uma decisão que causa prejuízo visa, por um lado, fornecer ao interessado os dados necessários para saber se a decisão é ou não fundada e, por outro, tornar possível o controlo jurisdicional. Tal obrigação deve, designadamente, permitir ao interessado conhecer as razões de uma decisão que lhe diz respeito, a fim de poder eventualmente recorrer às vias de recurso necessárias à defesa dos seus direitos e interesses. Tratando-se da decisão de um júri de concurso de não admitir um candidato a concurso, compete ao júri referir com exactidão as condições do aviso de concurso que, em sua opinião, não haviam sido preenchidas pelo candidato.
(cf. n.os 172 e 173)
Ver: Tribunal de Justiça, 21 de Junho de 1984, Lux/Tribunal de Contas (69/83, Colect., p. 2447, n.o 36); Burban/Parlamento (já referido, n.o 43); González Holguera/Parlamento (já referido, n.os 42 e 43, e jurisprudência aí citada); almeida Antunes/Parlamento (já referido, n.o 32)