61999J0310

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 7 de Março de 2002. - República Italiana contra Comissão das Comunidades Europeias. - Auxílios de Estado - Orientações relativas aos auxílios ao emprego - Acções destinadas a favorecer o emprego dos jovens e a transformação dos contratos a prazo em contratos sem prazo - Redução dos encargos sociais. - Processo C-310/99.

Colectânea da Jurisprudência 2002 página I-02289


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1. Auxílios concedidos pelos Estados Exame pela Comissão Poder de apreciação da Comissão Possibilidade de adoptar orientações Fiscalização jurisdicional Alcance

(Artigo 87.° , n.os 2 e 3, CE)

2. Auxílios concedidos pelos Estados Proibição Derrogações Auxílios que podem ser considerados compatíveis com o mercado comum Auxílios para desenvolvimento de determinadas regiões Casos excepcionais

[Artigo 87.° , n.° 3, alínea a), CE]

3. Auxílios concedidos pelos Estados Afectação das trocas comerciais entre Estados-Membros Prejuízo da concorrência Critérios de apreciação

(Artigo 87.° CE)

4. Auxílios concedidos pelos Estados Decisão da Comissão que declara a incompatibilidade de um programa de auxílios com o mercado comum Dever de fundamentação Indicações necessárias

(Artigos 87.° CE e 253.° CE)

5. Auxílios concedidos pelos Estados Decisão da Comissão que declara a incompatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado comum e que ordena a sua supressão Obrigação de recuperação daí resultante Restabelecimento da situação anterior Poder discricionário da Comissão Ausência de reembolso Justificação Circunstâncias excepcionais Mecanismo de direito laboral Exclusão

(Artigo 88.° , n.° 2, primeiro parágrafo, CE)

6. Auxílios concedidos pelos Estados Projectos de auxílios Entrada em execução antes da decisão final da Comissão Decisão da Comissão ordenando a restituição do auxílio Dever de fundamentação Alcance

(Artigo 88.° , n.° 3, CE)

Sumário


1. As condições para que um auxílio de Estado possa ser compatível com o mercado comum são definidas pelas excepções previstas no artigo 87.° , n.os 2 e 3, CE. A este respeito, a Comissão pode impor a si mesma orientações para o exercício dos seus poderes de apreciação através de actos como as orientações, na medida em que os referidos actos contenham regras indicativas sobre a orientação a seguir pela mesma instituição e não se afastem das normas do Tratado. Daqui resulta que, embora seja certo que estas regras indicativas, que definem as linhas de conduta que a Comissão entende seguir, contribuem para garantir a transparência, a previsibilidade e a segurança jurídica da sua acção, não podem vincular o Tribunal de Justiça. No entanto, podem constituir uma base de referência útil.

( cf. n.° 52 )

2. O uso dos termos «anormalmente» e «grave» na derrogação prevista no artigo 87.° , n.° 3, alínea a), CE demonstra que esta apenas abrange regiões em que a situação económica é particularmente desfavorável em relação ao conjunto da Comunidade.

Daqui resulta que os auxílios à manutenção do emprego, que se assemelham aos auxílios ao financiamento, são em princípio proibidos e só podem ser autorizados em casos excepcionais e para regiões que cumpram determinados critérios específicos. Esses auxílios devem igualmente ser degressivos e limitados no tempo.

( cf. n.os 77-78 )

3. Quando um auxílio concedido pelo Estado reforça a posição de uma empresa relativamente a outras empresas concorrentes nas trocas comerciais comunitárias, devem estas últimas ser consideradas como influenciadas pelo auxílio. Para o efeito, não é necessário que a própria empresa beneficiária participe nas exportações. De facto, quando o Estado-Membro concede um auxílio a uma empresa, a produção interna pode ser mantida ou aumentada, daí resultando que as hipóteses de as empresas estabelecidas noutros Estados-Membros exportarem os seus produtos para o mercado deste Estado-Membro são diminuídas.

De igual modo, quando um Estado-Membro concede auxílios a empresas que operam no sector dos serviços e da distribuição, não é necessário que as empresas beneficiárias exerçam, elas próprias, as suas actividades fora do referido Estado-Membro para que os auxílios influenciem as trocas comunitárias, especialmente quando se trata de empresas estabelecidas perto das fronteiras entre dois Estados-Membros.

A importância relativamente fraca de um auxílio ou a dimensão relativamente modesta da empresa beneficiária não impedem a priori a eventualidade de as trocas entre Estados-Membros serem afectadas.

( cf. n.os 84-86 )

4. Na fundamentação da sua decisão sobre a compatibilidade de um programa de auxílios com o mercado comum, a Comissão pode limitar-se a estudar as características do programa em causa para apreciar nos fundamentos da sua decisão se, em razão das modalidades previstas por este programa, este assegura uma vantagem sensível para os beneficiários em relação aos seus concorrentes e se é de molde a beneficiar essencialmente empresas que participam nas trocas comerciais entre Estados-Membros.

( cf. n.° 89 )

5. A supressão de um auxílio estatal ilegalmente concedido mediante recuperação é a consequência lógica do reconhecimento da sua ilegalidade e a obrigação que incumbe ao Estado de suprimir um auxílio considerado pela Comissão como incompatível com o mercado comum visa o restabelecimento da situação anterior.

Através da restituição do auxílio, o beneficiário perde a vantagem de que tinha beneficiado no mercado relativamente aos seus concorrentes e a situação anterior à concessão do auxílio é reposta. Resulta também desta função do reembolso que, regra geral, salvo circunstâncias excepcionais, a Comissão não pode ignorar o seu poder discricionário, reconhecido pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, quando pede ao Estado-Membro que recupere os montantes concedidos a título de auxílios ilegais, uma vez que apenas restabelece a situação anterior.

A este respeito, tal como o carácter social das intervenções estatais não é suficiente para estas deixarem de ser, à partida, qualificadas de auxílios, o argumento de que estamos perante um «mecanismo de direito laboral» não constitui uma circunstância excepcional susceptível de justificar uma ausência de reembolso.

( cf. n.os 98-99, 101 )

6. Em matéria de auxílios de Estado, sempre que, contrariamente às disposições do artigo 88.° , n.° 3, CE, o auxílio projectado já tiver sido pago, a Comissão, que tem o poder de impor às autoridades nacionais que exijam a sua restituição, não é obrigada a fornecer razões específicas para justificar o seu exercício.

( cf. n.° 106 )

Partes


No processo C-310/99,

República Italiana, representada por U. Leanza, na qualidade de agente, assistido por O. Fiumara, vice avvocato generale dello Stato, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por G. Rozet e P. Stancanelli, posteriormente por G. Rozet e V. Di Bucci, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

que tem por objecto a anulação da Decisão 2000/128/CE da Comissão, de 11 de Maio de 1999, relativa ao regime de auxílios concedidos pela Itália para intervenções a favor do emprego (JO 2000, L 42, p. 1),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção),

composto por: N. Colneric (relatora), presidente da Segunda Secção, exercendo funções de presidente da Sexta Secção, C. Gulmann, R. Schintgen, V. Skouris e J. N. Cunha Rodrigues, juízes,

advogado-geral: D. Ruiz-Jarabo Colomer,

secretário: L. Hewlett, administradora,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 4 de Abril de 2001,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 17 de Maio de 2001,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 13 de Agosto de 1999, a República Italiana pediu, nos termos do artigo 230._, primeiro parágrafo, CE, a anulação da Decisão 2000/128/CE da Comissão, de 11 de Maio de 1999, relativa ao regime de auxílios concedidos pela Itália para intervenções a favor do emprego (JO 2000, L 42, p. 1, a seguir «decisão impugnada»), e, subsidiariamente, a anulação desta decisão na medida em que prevê a recuperação das quantias que constituem um auxílio incompatível com o mercado comum.

Direito comunitário

2 O artigo 87._, n.os 1 e 3, CE, e o ex-artigo 92._, n.os 1 e 3, do Tratado determinam:

«1. Salvo disposição em contrário do presente Tratado, são incompatíveis com o mercado comum, na medida em que afectem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções.

[...]

3. Podem ser considerados compatíveis com o mercado comum:

a) Os auxílios destinados a promover o desenvolvimento económico de regiões em que o nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista grave situação de subemprego.

[...]»

3 O artigo 88._, n._ 2, primeiro parágrafo, CE dispõe:

«Se a Comissão, depois de ter notificado os interessados para apresentarem as suas observações, verificar que um auxílio concedido por um Estado ou proveniente de recursos estatais não é compatível com o mercado comum nos termos do artigo 87._, ou que esse auxílio está a ser aplicado de forma abusiva, decidirá que o Estado em causa deve suprimir ou modificar esse auxílio no prazo que ela fixar.»

As comunicações da Comissão

Orientações relativas aos auxílios ao emprego

4 A Comissão publicou em 1995 orientações relativas aos auxílios ao emprego (JO C 334, p. 4, a seguir «orientações relativas aos auxílios ao emprego»). O seu ponto 2 salienta que a intensificação das acções dirigidas para o emprego de categorias desfavorecidas no mercado de trabalho, tal como os desempregados de longa duração, os jovens e os trabalhadores mais velhos, constam entre os domínios prioritários definidos pelos Estados-Membros nas suas orientações em matéria de emprego. As orientações da Comissão indicam, no ponto 3, que as medidas que visam melhorar a situação dos trabalhadores no mercado de trabalho não devem prejudicar os esforços paralelos que a Comissão desenvolve para reduzir as distorções artificiais de concorrência no âmbito dos artigos 92._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87._ CE) e 93._ do Tratado CE (actual artigo 88._ CE).

5 As orientações relativas aos auxílios ao emprego indicam igualmente, no ponto 3, que têm por objectivo, designadamente, clarificar a interpretação dos artigos 92._ e 93._ do Tratado no que se refere aos auxílios estatais aplicáveis no domínio do emprego, a fim de assegurar uma maior transparência na decisão de notificação nos termos do artigo 93._ do Tratado.

6 Os pontos 16 e 17 das orientações relativas aos auxílios ao emprego dispõem:

«16. Por auxílio à manutenção de emprego, entende-se o apoio dado a uma empresa com o objectivo de a incitar a não despedir os trabalhadores que nela estão empregados; o subsídio é normalmente calculado relativamente ao número total de trabalhadores empregados no momento da concessão do auxílio.

17. O auxílio à criação do emprego, em contrapartida, tem por efeito conseguir um emprego para trabalhadores que o não obtiveram ainda ou que perderam o seu emprego anterior e será concedido em função do número de postos de trabalho criados. De referir que, por criação de emprego, se entende criação líquida de emprego, ou seja, um posto de trabalho suplementar relativamente aos efectivos (média num determinado período) da empresa em causa. A simples substituição de um trabalhador sem um aumento dos efectivos e, consequentemente, sem criação de novos postos de trabalho, não constitui uma verdadeira criação de emprego.»

7 O ponto 21 das orientações relativas aos auxílios ao emprego prevê:

«A Comissão procederá à apreciação destes auxílios ao emprego segundo os seguintes critérios:

- A Comissão reserva uma atitude em princípio favorável no que se refere aos auxílios destinados à criação de novos postos de trabalho nas PME [...] e nas regiões elegíveis para os auxílios com finalidade regional [...]. Esta atitude em princípio favorável é também extensível, para além destas duas categorias, aos auxílios destinados a promover a contratação de certas categorias de trabalhadores que registam dificuldades específicas de inserção ou de reinserção no mercado de trabalho. Neste último caso, não é necessário exigir que exista uma criação líquida de emprego, desde que o posto de trabalho fique vago na sequência de uma saída normal e não de despedimento.

- [...]

- Por forma a apreciar favoravelmente os auxílios incluídos nas categorias anteriores, a Comissão tomará também em consideração as modalidades do contrato de emprego, tais como, nomeadamente, a obrigação de realizar a contratação no âmbito de um contrato com duração indeterminada ou com uma duração suficientemente longa, e a obrigação de manter o novo posto de trabalho criado durante um lapso de tempo mínimo após a sua criação; estas condições constituem uma garantia no que se refere a estabilidade do emprego criado. Serão também tomadas em consideração todas as outras garantias quanto à duração do novo posto de trabalho criado, nomeadamente as modalidades de pagamento do auxílio.

- A Comissão assegurar-se-á que o nível do auxílio não ultrapassa o que é necessário para promover a criação de empregos, tendo em conta, se for caso disso, as dificuldades registadas pelas PME e/ou as limitações da região em causa. O auxílio deverá ser temporário.

- Por outro lado, o facto de a criação de emprego que é objecto do auxílio ser acompanhada de uma formação ou de uma reciclagem do trabalhador em causa constituirá um elemento particularmente positivo para uma apreciação favorável por parte da Comissão.»

8 Além disso, o ponto 22 das orientações relativas aos auxílios ao emprego dispõe:

«Os auxílios à manutenção do emprego, que são semelhantes a auxílios ao funcionamento, apenas poderão ser autorizados nos seguintes casos:

[...] Mediante determinadas condições, estes auxílios à manutenção do emprego poderão também ser autorizados nas regiões susceptíveis de beneficiar da derrogação prevista no n._ 3, alínea a), do artigo 92._ do Tratado CE, relativa ao desenvolvimento económico de regiões em que o nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista grave situação de subemprego [...].

[...]»

Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional

9 A Comissão publicou igualmente, em 1998, as orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional (JO C 74, p. 9, a seguir «orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional»), que prevêem o seguinte, nos pontos 3.5 e 4.17:

«3.5 A alínea a) do n._ 3 do artigo 92._ estabelece que podem ser considerados compatíveis com o mercado comum os auxílios destinados a promover o desenvolvimento económico das regiões em que o nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista uma situação grave de subemprego. Como sublinha o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, `a utilização, na derrogação constante da alínea a), dos termos 'anormalmente' e 'grave' demonstra que essa derrogação apenas abrange as regiões em que a situação económica é particularmente desfavorável relativamente ao conjunto da Comunidade [...]'.

[...]

[...]

4.17 [...] os auxílios ao funcionamento devem ser limitados no tempo e degressivos. Além disso, os auxílios ao funcionamento destinados a promover as exportações [...] entre os Estados-Membros ficam excluídos.»

Comunicação da Comissão relativa aos auxílios de minimis

10 Na sua comunicação de 1996 relativa aos auxílios de minimis (JO C 68, p. 9), a Comissão indicou que, se é um facto que qualquer intervenção financeira a favor de uma empresa é susceptível de falsear a concorrência, nem todos os auxílios têm, contudo, uma repercussão sensível nas trocas comerciais e na concorrência entre Estados-Membros, sendo isto o que acontece em especial com os auxílios de montante muito reduzido que são concedidos, na maioria dos casos, às pequenas e médias empresas. Com uma preocupação de simplificação administrativa e no interesse das PME, a Comissão adoptou uma regra dita «de minimis» que estabelece um limiar de auxílio, abaixo do qual o n._ 1 do artigo 92._ pode ser considerado inaplicável, estando o auxílio isento da condição de notificação prévia.

11 Para que a regra de minimis possa ser aplicada, devem ser respeitadas as seguintes modalidades:

«- o montante máximo total do auxílio de minimis é de 100 000 ecus [...] para um período de três anos, com início no momento da concessão do primeiro auxílio de minimis,

- este montante abrange todos os auxílios públicos concedidos a título de auxílio de minimis e não afecta a possibilidade de o beneficiário receber outros auxílios com base em regimes aprovados pela Comissão,

- este montante cobre todas as categorias de auxílios, independentemente da sua forma e objectivo, à excepção dos auxílios à exportação [...] que não podem beneficiar desta medida.

Os auxílios públicos a considerar para efeitos do respeito do limite máximo de 100 000 ecus são os auxílios concedidos pelas autoridades nacionais, regionais ou locais, independentemente de os recursos provirem inteiramente dos Estados-Membros ou de as medidas serem co-financiadas pela Comunidade através dos fundos estruturais [...].»

Quadro legislativo nacional

12 A República Italiana introduziu, pela Lei n._ 863/84, de 19 de Dezembro de 1984 (GURI n._ 351, de 22 de Dezembro de 1984, p. 10691, a seguir «Lei n._ 863/84»), o contrato de formação e trabalho (a seguir «CFT»). Tratava-se de um contrato a prazo, que incluía um período de formação, para a admissão de desempregados de idade não superior a 29 anos. As admissões com base neste tipo de contrato beneficiavam de uma isenção dos encargos sociais devidos pela entidade empregadora por um período de dois anos. Esta redução era aplicada de forma geral, automática, não selectiva e uniforme em todo o território nacional.

13 As modalidades de aplicação dos CFT foram sucessivamente alteradas pela Lei n._ 407/90, de 29 de Dezembro de 1990 (GURI n._ 303, de 31 de Dezembro de 1990, p. 3, a seguir «Lei n._ 407/90»), que introduziu uma modulação regional do auxílio, pela Lei n._ 169/91, de 1 de Junho de 1991 (GURI n._ 129, de 4 de Junho de 1991, p. 4, a seguir «Lei n._ 169/91»), que aumentou para 32 anos a idade máxima dos trabalhadores a admitir, e pela Lei n._ 451/94, de 19 de Julho de 1994 (GURI n._ 167, de 19 de Julho de 1994, p. 3, a seguir «Lei n._ 451/94»), que introduziu o CFT limitado a um ano e fixou um limiar mínimo de horas de formação a respeitar.

14 Nos termos destas leis, o CFT pode ser definido como um contrato a prazo para a admissão de jovens de idade compreendida entre os 16 e os 32 anos, podendo este limite de idade ser elevado por decisão das autoridades regionais. As autoridades elevaram o limite de idade para 35 anos para o Lácio, 38 anos para a Calábria, 40 anos para a Campânia, os Abruzo e a Sardenha, e 45 anos para a Basilicata, o Molise, a Apúlia e a Sicília.

15 São previstos dois tipos de CFT:

- o primeiro, que se refere a actividades que requeiram um nível de formação elevado. Este contrato tem uma duração máxima de 24 meses e deve prever, pelo menos, 80 a 130 horas de formação a ministrar no local de trabalho durante o período do contrato;

- o segundo, que não pode exceder 12 meses e que comporta uma formação de 20 horas.

16 A característica principal do CFT consiste em prever um programa de formação do trabalhador destinado a fornecer-lhe uma qualificação específica.

17 As admissões através do CFT beneficiam de reduções dos encargos sociais durante todo o período do contrato e são as seguintes:

- redução de 25% dos encargos normalmente devidos, para as empresas estabelecidas em zonas diferentes do Mezzogiorno;

- redução de 40% desses encargos para as empresas do sector comercial e turístico com menos de 15 trabalhadores estabelecidas em zonas diferentes do Mezzogiorno;

- isenção total para as empresas de artesãos e para as empresas estabelecidas em zonas que registam uma taxa de desemprego superior à média nacional.

18 Para obter estes benefícios, as entidades empregadoras não devem ter procedido a despedimentos nos 12 meses anteriores, salvo se a admissão disser respeito a trabalhadores com uma qualificação diferente. A possibilidade de aceder a estes benefícios está, além disso, sujeita ao facto de terem mantido em serviço, com um contrato sem prazo, pelo menos 60% dos trabalhadores cujo CFT terminou nos 24 meses anteriores.

19 No que respeita ao CFT do segundo tipo, de duração de um ano, a concessão destes benefícios é também sujeita à transformação do contrato de trabalho a prazo num contrato sem prazo. As reduções aplicam-se apenas após esta transformação e por um período correspondente ao do CFT.

20 O artigo 15._ da Lei n._ 196/97, de 24 de Junho de 1997, que contém disposições em matéria de promoção do emprego (GURI n._ 154, de 4 de Julho de 1997, a seguir «Lei n._ 196/97»), prevê que as empresas estabelecidas nas regiões do objectivo 1, que, no final do contrato, transformem os CFT do primeiro tipo, com uma duração de dois anos, em contratos sem prazo, beneficiam de uma isenção dos encargos sociais por um período suplementar de um ano. Este artigo prevê a obrigação de reembolsar os auxílios recebidos em caso de despedimento do trabalhador durante os 12 meses posteriores ao fim do período de referência do auxílio.

O procedimento que levou à adopção da decisão impugnada

21 Em 7 de Maio de 1997, as autoridades italianas notificaram à Comissão, nos termos do n._ 3 do artigo 93._ do Tratado, um projecto de lei sobre auxílios de Estado, que foi posteriormente aprovado pelo Parlamento e deu origem à Lei n._ 196/97. Este projecto de lei foi regularmente inscrito no registo dos auxílios notificados, sob o número N 338/97.

22 Com base em informações transmitidas pelas autoridades italianas, a Comissão examinou outros regimes de auxílios relativos a este sector, a saber, as Leis n.os 863/84, 407/90, 169/91 e 451/94. Visto que já estavam a ser aplicadas, estas leis foram inscritas no registo dos auxílios não notificados, sob o número NN 164/97.

23 Por carta de 17 de Agosto de 1998, publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias (JO C 384, p. 11), a Comissão informou o Governo italiano da sua decisão de dar início ao procedimento previsto no n._ 2 do artigo 93._, do Tratado, no que diz respeito aos auxílios para a admissão mediante CFT a prazo previstos pelas Leis n.os 863/84, 407/90, 169/91 e 451/94 e concedidos a partir de Novembro de 1995. Nessa carta, a Comissão informava também o Governo italiano da sua decisão de dar início ao mesmo procedimento em relação aos auxílios para a transformação dos CFT em contratos sem prazo, nos termos do artigo 15._ da Lei n._ 196/97.

24 O Governo italiano apresentou as suas observações por carta de 4 de Novembro de 1998 e, a pedido da Comissão, forneceu esclarecimentos e informações complementares por carta de 5 de Março de 1999.

25 No termo do procedimento de exame, a Comissão adoptou a decisão impugnada. Esta decisão foi regularmente notificada à República Italiana pelo ofício n._ SG(99) D/4068 de 4 de Junho de 1999.

A decisão impugnada

26 A decisão impugnada examina em separado, por um lado, o conteúdo das Leis n.os 863/84, 407/90, 169/91 e 451/94, não notificadas, e, por outro, o da Lei n._ 196/97, regularmente notificada na fase de projecto.

27 Quanto ao regime de auxílios estabelecido pelas quatro primeiras leis, o artigo 1._ da decisão impugnada dispõe o seguinte:

«1. Os auxílios ilegalmente concedidos pela Itália a partir de Novembro de 1995 a favor da admissão de trabalhadores mediante os contratos de formação e trabalho, previstos pelas Leis n.os 863/84, 407/90, 169/91 e 451/94, são compatíveis com o mercado comum e com o Acordo EEE na condição de dizerem respeito:

- à criação de novos postos de trabalho na empresa beneficiária a favor de trabalhadores que não obtiveram ainda um emprego ou que perderam o anterior, na acepção das orientações relativas aos auxílios ao emprego,

- à admissão de trabalhadores que registam dificuldades específicas de inserção ou de reinserção no mercado de trabalho. Para efeitos da presente decisão, por `trabalhadores que registam dificuldades específicas de inserção ou de reinserção no mercado de trabalho' entendem-se os jovens com menos de 25 anos, os licenciados até aos 29 anos inclusive e os desempregados de longa duração, ou seja, as pessoas desempregadas há, pelo menos, um ano.

2. Os auxílios concedidos mediante contratos de formação e trabalho que não cumpram as condições mencionadas no n._ 1 são incompatíveis com o mercado comum.»

28 No que respeita ao regime de auxílios estabelecido pela Lei n._ 196/97, o artigo 2._ da decisão impugnada prevê o seguinte:

«1. Os auxílios concedidos pela Itália ao abrigo do artigo 15._ da Lei n._ 196/97 a favor da transformação de contratos de formação e trabalho em contratos por tempo indeterminado são compatíveis com o mercado comum e com o Acordo EEE, desde que respeitem a condição da criação líquida de emprego, tal como definida nas orientações comunitárias relativas aos auxílios ao emprego.

O número de trabalhadores das empresas é calculado deduzindo os postos de trabalho que beneficiam da transformação e os postos criados por meio de contratos a prazo ou que não garantem uma certa estabilidade do emprego.

2. Os auxílios a favor da transformação de contratos de formação e trabalho em contratos por tempo indeterminado que não cumprem a condição estabelecida no n._ 1 são incompatíveis com o mercado comum.»

29 Nos termos do artigo 3._ da decisão impugnada:

«A Itália tomará todas as medidas necessárias para a recuperação junto dos beneficiários dos auxílios que não cumprem as condições previstas nos artigos 1._ e 2._ e que foram ilegalmente concedidos.

A recuperação deverá verificar-se em conformidade com as regras do direito nacional. Os montantes a recuperar vencem juros a partir da data em que foram postos à disposição dos beneficiários até à data da sua recuperação efectiva. Os juros são calculados com base na taxa de referência utilizada para o cálculo do equivalente-subvenção no quadro dos auxílios com finalidade regional.»

30 Nos pontos 62 e 63 dos fundamentos da decisão impugnada, a Comissão declarou que os CFT, tal como regidos pela Lei n._ 863/84, não eram considerados um auxílio na acepção do n._ 1 do artigo 87._ CE, mas sim uma medida de carácter geral. A Lei n._ 407/90 modificou, porém, a natureza das disposições relativas aos CFT ao modular as reduções concedidas em função da localização da empresa beneficiária e do sector a que esta última pertence.

31 Os pontos 64 a 66 dos fundamentos da decisão impugnada têm o seguinte enunciado:

«(64) As reduções selectivas que favorecem determinadas empresas em relação a outras do mesmo Estado-Membro, independentemente de a selectividade se verificar a nível individual, regional ou sectorial, constituem, na medida do diferencial da redução, auxílios estatais na acepção do n._ 1 do artigo 87._ do Tratado, falseando a concorrência e sendo susceptíveis de ter efeitos sobre as trocas comerciais entre os Estados-Membros.

De facto, este diferencial é uma vantagem para as empresas que operam em determinadas zonas do território italiano, favorecendo-as em virtude de o mesmo auxílio não ser concedido às empresas localizadas noutras zonas.

(65) Este auxílio falseia a concorrência, dado que reforça a posição financeira e as possibilidades de acção das empresas beneficiárias em relação aos seus concorrentes. Na medida em que este efeito se verifica no quadro do comércio intracomunitário, tal comércio é prejudicado pelo auxílio.

(66) Em especial, estes auxílios falseiam a concorrência e têm efeitos sobre o comércio entre Estados-Membros na medida em que as empresas beneficiárias exportam uma parte da sua produção para outros Estados-Membros; mesmo que as empresas não exportem, a produção nacional é favorecida porque o auxílio reduz a possibilidade de as empresas localizadas noutros Estados-Membros exportarem os seus produtos para o mercado italiano [...].»

32 Depois de ter verificado a natureza de auxílio de Estado das medidas em causa, na acepção do artigo 87._, n._ 1, CE, a Comissão examinou, nos pontos 70 e seguintes dos fundamentos da decisão impugnada, se elas podiam ser declaradas compatíveis com o mercado comum, nos termos do artigo 87._, n.os 2 e 3, CE.

33 A este respeito, a Comissão recordou, no ponto 71 dos fundamentos da decisão impugnada, que «[a]s orientações relativas aos auxílios ao emprego [...] precisam que a Comissão é em princípio favorável aos auxílios:

- a favor de desempregados,

e

- destinados à criação de novos postos de trabalho (criação líquida) nas pequenas e médias empresas (PME) e nas regiões elegíveis para os auxílios com finalidade regional,

ou

- destinados a promover a contratação de certas categorias de trabalhadores que registam dificuldades específicas de inserção ou de reinserção no mercado de trabalho em todo o território; neste caso, é suficiente que o posto de trabalho tenha ficado vago na sequência de uma saída normal e não de despedimento».

34 No ponto 72 dos fundamentos da decisão impugnada, a Comissão indicou que «[est]as orientações estabelecem além disso que a Comissão se assegurará que `o nível do auxílio não ultrapasse o que é necessário para promover a criação de emprego' e que seja garantida uma certa estabilidade dos postos de trabalho criados».

35 Com base na análise efectuada, a Comissão considerou, no ponto 91 dos fundamentos da decisão impugnada, que o montante do auxílio não ultrapassava o necessário para incentivar a criação de novos postos de trabalho, mas apenas no caso dos auxílios para a admissão mediante CFT de trabalhadores que registam dificuldades específicas de inserção ou de reinserção no mercado de trabalho - isto é, os jovens com menos de 25 anos, os jovens licenciados até 29 anos e os desempregados de longa duração (mais de um ano de desemprego) - ou que são destinados à criação de novos postos de trabalho.

36 Nos pontos 93 a 96 dos fundamentos da decisão impugnada, a Comissão examinou os auxílios à manutenção do emprego e enumerou as condições em que estes podem ser autorizados.

37 Quanto às medidas relativas à transformação dos CFT em contratos sem prazo, a Comissão expôs, nos pontos 97 e 98 dos fundamentos da decisão impugnada, que aquelas estavam abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 87._, n._ 1, CE, e do artigo 62._, n._ 1, do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, de 2 de Maio de 1992 (JO 1994, L 1, p. 3, a seguir «Acordo EEE»).

38 No que concerne à avaliação da compatibilidade destas medidas com o mercado comum, a Comissão declarou, nos pontos 99 a 111 dos fundamentos da decisão impugnada, que só os auxílios para a transformação de CFT em contratos sem prazo que respeitavam a obrigação de realizar um aumento dos postos de trabalho em relação aos postos existentes na empresa, determinado como média num determinado período anterior à transformação, estavam em conformidade com o disposto nas orientações relativas aos auxílios ao emprego e podiam portanto beneficiar da derrogação prevista a favor deste tipo de auxílios.

39 A Comissão indicou ainda, no ponto 115 dos fundamentos da decisão impugnada, que as medidas que satisfaziam a regra de minimis não estavam abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 87._ CE. Explicou que, em aplicação desta regra, o montante global de todas as intervenções efectuadas a favor das empresas que admitiram trabalhadores por meio de CFT não devia ultrapassar o limite de 100 000 euros num período de três anos.

O recurso

40 A República Italiana interpôs um recurso de anulação da decisão impugnada e, subsidiariamente, de anulação do seu artigo 3._

41 Em apoio do seu recurso, o Governo italiano alega, de modo geral, que a Comissão adoptou a decisão impugnada tendo unicamente em conta considerações económicas, sem ter em consideração o valor dos CFT como instrumento fundamental de intervenção no mercado de trabalho.

42 Em apoio do seu recurso, invoca ainda oito fundamentos específicos:

- excesso de poder e falta de fundamentação relativamente à definição da categoria dos jovens;

- violação do direito comunitário, desvio de poder e falta de fundamentação relativamente à determinação da parte do auxílio considerada legal;

- falta de fundamentação quanto à determinação da parte do auxílio considerada inadmissível;

- violação do direito comunitário, desvio de poder e falta de fundamentação relativamente à transformação dos CFT em contratos sem prazo;

- violação e aplicação incorrecta do artigo 87._, n._ 3, alínea a), CE, e falta de fundamentação;

- violação do artigo 87._ CE ou, em todo o caso, falta de fundamentação relativamente à incidência dos auxílios considerados incompatíveis sobre as trocas comunitárias e a concorrência;

- aplicação incorrecta da regra de minimis;

- falta de fundamentação quanto à necessidade ou, pelo menos, à oportunidade de obter o reembolso dos auxílios considerados incompatíveis.

43 A Comissão pede que seja negado provimento ao presente recurso.

Fundamentos invocados pela República Italiana e apreciação do Tribunal de Justiça

Observações preliminares

44 Dado que vários fundamentos invocados pelo Governo italiano se referem a desvio de poder e a falta de fundamentação, importa recordar, a título preliminar, algumas regras gerais aplicáveis a este respeito.

45 Em primeiro lugar, cabe recordar que a Comissão goza, nos termos do artigo 87._, n._ 3, CE, de um amplo poder de apreciação cujo exercício envolve apreciações de ordem económica e social que devem ser efectuadas num contexto comunitário (v., nomeadamente, acórdãos de 21 de Março de 1991, Itália/Comissão, C-303/88, Colect., p. I-1433, n._ 34, e de 19 de Setembro de 2000, Alemanha/Comissão, C-156/98, Colect., p. I-6857, n._ 67).

46 Em segundo lugar, quando a Comissão goza de uma liberdade de apreciação significativa, como é o caso da aplicação do artigo 87._ CE, o Tribunal de Justiça, ao controlar a legalidade do exercício dessa liberdade, não pode substituir a sua apreciação na matéria à da autoridade competente, devendo limitar-se a examinar se esta última está viciada por erro manifesto ou por desvio de poder (v., nomeadamente, acórdãos de 14 de Janeiro de 1997, Espanha/Comissão, C-169/95, Colect., p. I-135, n._ 34, e de 5 de Outubro de 2000, Alemanha/Comissão, C-288/96, Colect., p. I-8237, n._ 26).

47 Em terceiro lugar, no que respeita ao desvio de poder, importa lembrar que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., nomeadamente, acórdãos de 12 de Novembro de 1996, Reino Unido/Conselho, C-84/94, Colect., p. I-5755, n._ 69, e de 14 de Maio de 1998, Windpark Groothusen/Comissão, C-48/96 P, Colect., p. I-2873, n._ 52), há desvio de poder quando uma instituição exerce as suas competências com a finalidade exclusiva ou, pelo menos, determinante de atingir fins diversos dos invocados ou de iludir um processo especialmente previsto pelo Tratado para fazer face às circunstâncias do caso em apreço.

48 Em quarto lugar, quanto à questão de saber se a Comissão violou o dever de fundamentação, importa salientar que este dever constitui uma formalidade essencial que deve ser distinguida da questão da procedência da fundamentação, relevando essa procedência da legalidade quanto ao fundo do acto em litígio. A fundamentação exigida pelo artigo 253._ CE deve ser adaptada à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do acto, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer o seu controlo. Esta exigência deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente do conteúdo do acto, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas a quem o acto diga directa e individualmente respeito podem ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um acto satisfaz as exigências do artigo 253._ CE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor, mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v., designadamente, acórdão de 22 de Março de 2001, França/Comissão, C-17/99, Colect., p. I-2481, n.os 35 e 36).

Quanto ao fundamento de ordem geral: não consideração do valor dos CFT enquanto instrumento de intervenção no mercado de trabalho

49 A título preliminar, o Governo italiano alega que a Comissão não podia limitar-se a apreciar a medida em litígio unicamente em abstracto, de um ponto de vista estritamente económico. A Comissão deveria igualmente tê-la apreciado no plano da política de emprego, enquanto instrumento que permite uma intervenção eficaz simultaneamente nos domínios da formação e da promoção do emprego relativamente à categoria dos jovens, categoria que experimenta dificuldades particulares no mercado de trabalho.

50 Importa, a este respeito, recordar que o carácter social das intervenções estatais não é suficiente para estas deixarem de ser, à partida, qualificadas de auxílios na acepção do artigo 87._ CE.

51 De acordo com uma jurisprudência constante, o conceito de auxílio compreende as intervenções das autoridades públicas que, sob formas diversas, atenuam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa. Um desagravamento parcial dos encargos sociais que recaem sobre empresas de um determinado sector industrial constitui um auxílio na acepção do artigo 87._, n._ 1, CE se esta medida se destinar a isentar parcialmente as empresas dos encargos financeiros que resultam da aplicação normal do sistema geral de previdência social, sem que essa isenção encontre justificação na natureza ou estrutura desse sistema (v., designadamente, acórdão de 5 de Outubro de 1999, França/Comissão, C-251/97, Colect., p. I-6639, n.os 35 a 37).

52 As condições para que um auxílio possa ser compatível com o mercado comum são definidas pelas excepções previstas no artigo 87._, n.os 2 e 3, CE. A este respeito, deve salientar-se que a Comissão pode impor a si mesma orientações para o exercício dos seus poderes de apreciação através de actos como as orientações, na medida em que os referidos actos contenham regras indicativas sobre a orientação a seguir pela mesma instituição e não se afastem das normas do Tratado (v., nomeadamente, acórdão de 5 de Outubro de 2000, Alemanha/Comissão, C-288/96, Colect., p. I-8237, n._ 62; v. também, neste sentido, acórdãos de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C-313/90, Colect., p. I-1125, n.os 34 e 36, e de 22 de Março de 2001, França/Comissão, já referido, n._ 45). Daqui resulta que, embora seja certo que estas regras indicativas, que definem as linhas de conduta que a Comissão entende seguir, contribuem para garantir a transparência, a previsibilidade e a segurança jurídica da sua acção, não podem vincular o Tribunal de Justiça. No entanto, podem constituir uma base de referência útil (v., neste sentido, acórdão de 4 de Julho de 2000, Comissão/Grécia, C-387/97, Colect., p. I-5047, n.os 87 e 89).

53 O Governo italiano não contestou nem pôs em dúvida a compatibilidade das orientações relativas aos auxílios ao emprego com o artigo 87._ CE.

54 As referidas orientações definem os instrumentos que, segundo a Comissão, são particularmente eficazes para promover o emprego no âmbito das orientações definidas pelos Estados-Membros. Nada indica que as apreciações da Comissão nesta matéria estejam viciadas por erro manifesto ou desvio de poder.

55 Nestes termos, não se pode acolher este fundamento de ordem geral.

Quanto ao primeiro fundamento específico: excesso de poder e falta de fundamentação relativamente à definição da categoria dos jovens

56 O Governo italiano alega que a definição da categoria dos jovens que consta da decisão impugnada resulta de um excesso de poder e que, na medida em que carece de lógica, está viciada por falta de fundamentação. Apesar de esta decisão ter retomado os dados estatísticos e as observações das autoridades italianas que atestam que, dadas as características particulares do desemprego dos jovens em Itália e, em especial, na região do Mezzogiorno, este fenómeno afecta a faixa etária até aos 32 anos de idade, a Comissão decidiu, pelo contrário, só integrar nessa categoria os jovens com menos de 25 anos ou, quando titulares de um diploma universitário, com menos de 29 anos. Segundo o Governo italiano, a afirmação deste critério pela Comissão, de forma apodíctica e geral, introduz um elemento de rigidez na noção de «jovens». Ora, as orientações relativas aos auxílios ao emprego não fixaram nenhum limite. É evidente que se pretendeu este carácter geral precisamente porque o limite de idade no âmbito do qual se situa esta categoria varia em função das características específicas dos diversos mercados de trabalho. Demonstra-se que, em Itália, e sobretudo no sul do país, por uma série de razões, nomeadamente sociais e económicas, o limite de idade da categoria dos jovens ultrapassa, sem qualquer dúvida, os 25 anos fixados pela Comissão.

57 A este respeito, o Tribunal de Justiça indicou, na sua jurisprudência, como se recordou no n._ 45 do presente acórdão, que as apreciações de ordem económica e social da Comissão devem ser efectuadas num contexto comunitário.

58 Daqui resulta que os critérios de derrogação da incompatibilidade estabelecida no artigo 87._, n._ 1, CE devem ser formulados, interpretados e aplicados de forma tão uniforme quanto possível, de modo a manter uma certa coerência e assegurar uma igualdade de tratamento no contexto dos auxílios de Estado.

59 A categoria dos jovens é visada pelas orientações relativas aos auxílios ao emprego, não sendo, porém, aí definida de modo preciso. A Comissão tinha o direito de interpretar esta noção no exercício do seu poder de apreciação. Utilizou uma interpretação universal, ao apoiar-se nas observações realizadas no contexto das acções dirigidas aos jovens a nível comunitário e pelos Estados-Membros e nos documentos da Organização Internacional do Trabalho, nomeadamente no relatório elaborado por esta organização para a Conferência dos Ministros da Juventude, que se realizou em Lisboa (Portugal) de 8 a 12 de Agosto de 1998. Nestes termos, nada indica que a Comissão tenha violado os limites do seu poder discricionário ou incorrido em desvio de poder.

60 No que respeita ao dever de fundamentação, como salientou o advogado-geral nos n.os 23 e 24 das suas conclusões, a Comissão expôs exaustivamente, na decisão impugnada, os critérios que a levaram a fixar em 25 anos, ou em 29, para as pessoas com grau universitário, os limites de idade para definir a categoria dos jovens. A decisão impugnada não padece pois, quanto a esta questão, de falta de fundamentação.

61 Por conseguinte, há que rejeitar o primeiro fundamento específico.

Quanto aos segundo e terceiro fundamentos específicos: violação do direito comunitário e desvio de poder relativamente à determinação da parte do auxílio considerada legal e falta de fundamentação quanto à determinação da parte do auxílio considerada legal e da parte do auxílio considerada inadmissível

62 Importa examinar em conjunto os segundo e terceiro fundamentos específicos.

63 Através do seu segundo fundamento específico, o Governo italiano sustenta que a decisão impugnada assenta em elementos apodícticos, violando, por isso, o direito comunitário, resulta de um desvio de poder e está insuficientemente fundamentada, quando define a parte do auxílio considerada legal expondo no ponto 91 dos seus fundamentos que, «apenas no caso dos auxílios para a admissão mediante contrato de formação e trabalho de trabalhadores que registam dificuldades específicas de inserção ou de reinserção no mercado de trabalho - isto é, os jovens com menos de 25 anos, os jovens licenciados até 29 anos e os desempregados de longa duração (mais de um ano de desemprego) - ou que são destinados à criação de novos postos de trabalho [...] o montante do auxílio não ultrapassa o necessário para incentivar a criação de novos postos de trabalho».

64 Através do seu terceiro fundamento específico, o Governo italiano alega que a Comissão adopta uma atitude pouco coerente e criticável, na medida em que, na sua apreciação das formas de incitação e de apoio ao emprego, não se inspirou em critérios claros. A Comissão recusou, excepto em casos restritivamente definidos, qualificar os CFT de intervenções destinadas a criar novos empregos para, uma vez chegada a esta conclusão, declarar uma incompatibilidade com o regime de auxílios ao emprego. Por conseguinte, a Comissão admitiu, no ponto 86 dos fundamentos da decisão impugnada, que a condição a que está sujeita a isenção dos encargos sociais - ou seja, manter em serviço pelo menos 60% dos trabalhadores cujo CFT tenha terminado nos dois anos anteriores - «parece constituir mais um estímulo para as empresas no sentido de garantirem a manutenção dos postos de trabalho por um período mais longo».

65 A este respeito, cumpre salientar que a decisão impugnada, na medida em que se refere à parte do auxílio considerada compatível, não prejudica, enquanto tal, a República Italiana. No entanto, uma vez que a parte considerada compatível é o contraponto da parte considerada incompatível, o segundo fundamento específico deve ser julgado admissível e examinado no contexto do terceiro fundamento específico.

66 Os critérios utilizados pela Comissão no ponto 91 dos fundamentos da decisão impugnada para chegar à sua conclusão constam do ponto 71 dos referidos fundamentos, que se refere, por seu turno, às orientações relativas aos auxílios ao emprego.

67 Foram os critérios destas últimas que serviram de inspiração à decisão impugnada. A Comissão não violou, a este respeito, o direito comunitário nem incorreu em desvio de poder.

68 Nos pontos 71 a 90 dos fundamentos da decisão impugnada, a Comissão, apoiando-se em diversas considerações, especificou os elementos que lhe permitem definir a parte do auxílio considerada legal. Importa constatar que esta fundamentação está integralmente de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., a este respeito, a jurisprudência recordada no n._ 48 do presente acórdão).

69 O mesmo se passa com a fundamentação relativa à parte do auxílio considerada inadmissível, que é constituída, por um lado, por considerações relativas à parte do auxílio considerada legal e, por outro, por explicações adicionais formuladas nos pontos 93 a 96 dos fundamentos da decisão impugnada.

70 No que respeita mais concretamente ao ponto 86 dos fundamentos da decisão impugnada, este não introduz qualquer incoerência na fundamentação. No referido ponto, a Comissão sublinhou, como elemento positivo, que uma das condições do regime em causa se apresenta como um incentivo suplementar para as empresas no sentido de garantirem a manutenção dos postos de trabalho por um período mais longo. No entanto, tal não implica que o regime em causa seja, de modo geral, qualificado de intervenção destinada a criar e manter novos empregos.

71 Daqui deriva que o segundo e terceiro fundamentos específicos devem ser rejeitados.

Quanto ao quarto fundamento específico: violação do direito comunitário, desvio de poder e falta de fundamentação relativamente à transformação dos CFT em contratos sem prazo

72 O Governo italiano sustenta ainda que a decisão impugnada viola o direito comunitário, resulta de um desvio de poder e está insuficientemente fundamentada, ao expor no ponto 103 dos seus fundamentos, a propósito das medidas previstas no artigo 15._ da Lei n._ 196/97, que «a transformação de contratos de formação e trabalho a prazo em contratos sem prazo não cria postos suplementares, na medida em que os postos de trabalho estão já criados, embora não tenham um carácter estável». Segundo o Governo italiano, o regime em causa cria uma reacção em cadeia: destina-se a admitir trabalhadores no âmbito de CFT, prevendo uma vantagem temporária igualmente para a continuação da relação laboral sob a forma de contrato sem prazo, o que levaria as empresas a criar novos postos de trabalho regidos por um CFT e a transformá-los posteriormente em contratos sem prazo.

73 A este respeito, cumpre recordar que a Comissão acrescenta, nos pontos 104 a 109 dos fundamentos da decisão impugnada, que reserva uma atitude em princípio favorável aos auxílios para a transformação de postos de trabalho a prazo em postos de trabalho sem prazo se implicarem «[a] criação líquida de postos de trabalho estáveis que não existiam anteriormente». Não violou, a este respeito, nem o direito comunitário nem incorreu em desvio de poder.

74 O dever de fundamentação também foi respeitado. Com efeito, nos pontos 97 a 110 dos fundamentos da decisão impugnada, a Comissão apresenta em detalhe as razões que servem de base à posição que adoptou na referida decisão a respeito dos auxílios à transformação dos CFT em contratos sem prazo.

75 Daqui resulta que o quarto fundamento específico deve igualmente ser rejeitado.

Quanto ao quinto fundamento específico: violação e aplicação incorrecta do artigo 87._, n._ 3, alínea a), CE, e falta de fundamentação

76 O Governo italiano defende que, mesmo na lógica dos auxílios à manutenção do emprego, a Comissão não examinou em profundidade se a medida de auxílio em causa podia, nos termos do artigo 87._, n._ 3, alínea a), CE, ser considerada compatível com o mercado comum, na medida em que favorecia o desenvolvimento económico de regiões com um nível de vida anormalmente baixo ou com uma grave situação de subemprego. A Comissão limitou-se a formular, no ponto 96 dos fundamentos da decisão impugnada, afirmações gerais sobre esta questão. Ora, não pode simplesmente afirmar que as vantagens resultantes da medida se aplicam a todo o território nacional, não estando limitadas às regiões susceptíveis de beneficiar da derrogação constante da referida disposição do Tratado, como por exemplo o Mezzogiorno. A Comissão devia ter analisado a medida de auxílio específico a fim de apreciar a sua compatibilidade com o quadro comunitário, e não declará-la automaticamente incompatível enquanto «auxílio à manutenção do emprego».

77 Cumpre recordar que, a este respeito, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o uso dos termos «anormalmente» e «grave» na previsão da derrogação prevista no artigo 87._, n._ 3, alínea a), CE demonstra que esta apenas abrange regiões em que a situação económica é particularmente desfavorável em relação ao conjunto da Comunidade (acórdão de 14 de Outubro de 1987, Alemanha/Comissão, 248/84, Colect., p. 4013, n._ 19).

78 À luz desta jurisprudência, importa constatar que a apreciação da Comissão formulada nos pontos 95 e 96 da decisão impugnada, que corresponde, de resto, ao ponto 22 das orientações relativas aos auxílios ao emprego e aos pontos 3.5 e 4.17 das orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional, não é contrária à letra nem ao espírito do artigo 87._, n._ 3, alínea a), CE, não estando, assim, viciada por erro de direito. Com efeito, a Comissão considera acertadamente que os auxílios à manutenção do emprego, que se assemelham aos auxílios ao financiamento, são em princípio proibidos e só podem ser autorizados em casos excepcionais e para regiões que cumpram determinados critérios específicos. Foi também acertadamente que a Comissão salientou que esses auxílios devem ser degressivos e limitados no tempo.

79 No caso em apreço, como também sublinhou o advogado-geral no n._ 45 das suas conclusões, é manifesto que os auxílios previstos pela legislação italiana não se limitavam às regiões que podiam beneficiar da referida excepção. Acresce que não eram nem degressivos nem limitados no tempo. Por esta razão, são igualmente ilegais os auxílios concedidos nas regiões susceptíveis de beneficiar de auxílios com finalidade regional.

80 A decisão impugnada também não padece de falta de fundamentação. Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça recordada no n._ 48 do presente acórdão, o respeito do dever de fundamentação deve ser apreciado não só em relação ao teor do acto impugnado, mas também ao seu contexto e ao conjunto de regras jurídicas que regulam a matéria em causa. No caso em apreço, a Comissão, no raciocínio exposto nos pontos 93 a 96 dos fundamentos da decisão impugnada, apresentou suficientemente as considerações em que se baseou para apreciar a compatibilidade com o mercado comum dos auxílios à manutenção do emprego previstos na legislação italiana.

81 Daqui resulta que o quinto fundamento específico deve também ser rejeitado.

Quanto ao sexto fundamento específico: violação do artigo 87._ CE ou, em todo o caso, falta de fundamentação relativamente à incidência dos auxílios considerados incompatíveis sobre as trocas comunitárias e a concorrência

82 O Governo italiano sustenta que a decisão impugnada violou o artigo 87._ CE ou que, em todo o caso, não está suficientemente fundamentada, na medida em que não toma em consideração a incidência dos auxílios considerados compatíveis sobre as trocas comunitárias e sobre a concorrência.

83 Segundo este governo, uma vez que o regime de auxílios em causa tem por único objectivo favorecer o emprego e assim contribuir para a resolução de um problema bastante grave que está no centro das preocupações da Comunidade e de todos os Estados-Membros, era necessário consagrar pelo menos algumas palavras da decisão impugnada quanto à justificação concreta da apreciação da Comissão relativa à incidência efectiva do referido regime sobre as trocas comunitárias e ao seu impacto potencial sobre a concorrência.

84 A este respeito, importa acentuar que decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, quando um auxílio concedido pelo Estado reforça a posição de uma empresa relativamente a outras empresas concorrentes nas trocas comerciais intracomunitárias, devem estas últimas ser consideradas como influenciadas pelo auxílio. Para o efeito, não é necessário que a própria empresa beneficiária participe nas exportações. De facto, quando o Estado-Membro concede um auxílio a uma empresa, a produção interna pode ser mantida ou aumentada, daí resultando que as hipóteses de as empresas estabelecidas noutros Estados-Membros exportarem os seus produtos para o mercado deste Estado-Membro são diminuídas (acórdão de 14 de Setembro de 1994, Espanha/Comissão, C-278/92 a C-280/92, Colect., p. I-4103, n._ 40).

85 De igual modo, quando um Estado-Membro concede auxílios a empresas que operam no sector dos serviços e da distribuição, não é necessário que as empresas beneficiárias exerçam, elas próprias, as suas actividades fora do referido Estado-Membro para que os auxílios influenciem as trocas comunitárias, especialmente quando se trata de empresas estabelecidas perto das fronteiras entre dois Estados-Membros.

86 A importância relativamente fraca de um auxílio ou a dimensão relativamente modesta da empresa beneficiária não impedem a priori a eventualidade de as trocas entre Estados-Membros serem afectadas (acórdão de 14 de Setembro de 1994, Espanha/Comissão, já referido, n._ 42).

87 O artigo 87._ CE não foi, portanto, violado pela decisão impugnada.

88 No que se refere ao dever de fundamentação, a Comissão explicou, em termos gerais, no ponto 65 dos fundamentos da decisão impugnada, que o auxílio falseia a concorrência e que, na medida em que este efeito se verifica no quadro do comércio intracomunitário, tal comércio é prejudicado pelo auxílio. No ponto 66 dos referidos fundamentos, a Comissão ilustrou esta tese recorrendo ao exemplo do sector da produção. No ponto 97 dos referidos fundamentos, relativo à transformação dos CFT em contratos sem prazo, a Comissão remete para esta análise, explicando por que razão é ainda mais pertinente em relação às medidas previstas para esta transformação.

89 A Comissão não tinha a obrigação de ir mais ao pormenor quanto a esta questão. No caso de um programa de auxílios, a Comissão pode limitar-se a estudar as características do programa em causa para apreciar nos fundamentos da sua decisão se, em razão das modalidades previstas por este programa, este assegura uma vantagem sensível para os beneficiários em relação aos seus concorrentes e se é de molde a beneficiar essencialmente empresas que participam nas trocas comerciais entre Estados-Membros (v., nomeadamente, acórdão de 14 de Outubro de 1987, Alemanha/Comissão, já referido, n._ 18).

90 No caso em apreciação, as leis italianas relativas ao CFT constituem um programa de auxílios. A decisão impugnada contém a análise exigida deste programa e dos seus efeitos.

91 A decisão impugnada não devia conter uma análise dos auxílios concedidos individualmente com base neste regime. É apenas ao nível do reembolso dos auxílios que é necessário verificar a situação individual de cada empresa em causa.

92 Daqui resulta que o sexto fundamento deve igualmente ser rejeitado.

Quanto ao sétimo fundamento específico: aplicação incorrecta da regra de minimis

93 O Governo italiano defende que, uma vez que o regime em questão só parcialmente foi considerado incompatível com o mercado comum e com o Acordo EEE, a Comissão não podia, para aplicar a regra de minimis, considerar todas as intervenções efectuadas a favor das empresas que admitiram trabalhadores mediante CFT. O limite de 100 000 euros por empresa por um período de três anos só deveria, pelo contrário, ter valido para a parte das isenções considerada incompatível.

94 A este respeito, cumpre lembrar que a regra de minimis responde a exigências de simplificação administrativa tanto para os Estados-Membros como para os serviços da Comissão, a qual deve poder concentrar os seus recursos nos casos realmente importantes a nível comunitário. Se, para aplicar a regra de minimis, fosse necessário apreciar, em cada caso, se os auxílios são ou não compatíveis, o volume de trabalho dos Estados-Membros, obrigados a notificar os projectos de auxílio, e da Comissão, que tem de examiná-los, não seria de modo algum reduzido.

95 Foi, portanto, acertadamente que a Comissão não fez qualquer distinção na aplicação da regra de minimis entre a parte considerada compatível e a parte considerada incompatível do regime de auxílios em causa.

96 Daqui resulta que o sétimo fundamento específico deve também ser rejeitado.

Quanto ao oitavo fundamento específico: falta de fundamentação quanto à necessidade ou, pelo menos, à oportunidade de obter o reembolso dos auxílios considerados incompatíveis

97 A título subsidiário, o Governo italiano sustenta que, no caso em apreço, estão preenchidas todas as condições para que as empresas não tenham de restituir os montantes de que beneficiaram a título de redução dos encargos sociais no âmbito do regime em causa. Em primeiro lugar, este regime instituiu e regulamentou um mecanismo de direito laboral de âmbito geral e não uma intervenção motivada por razões de ordem sectorial e económica. Tendo igualmente em conta o princípio do respeito da confiança legítima dos operadores económicos interessados, deve observar-se, em segundo lugar, que as orientações comunitárias em matéria de auxílios ao emprego nem sempre se caracterizaram pela sua clareza. Em terceiro lugar, o regime em causa está em vigor em Itália desde há muito, tendo, por conseguinte, produzido efeitos que se consolidaram com o tempo e cuja eliminação, apesar do limite temporal imposto pela Comissão, justamente em razão dos aspectos ligados às especificidades das situações individuais das empresas beneficiárias, se afigura extremamente complexa e dificilmente verificável. Em quarto lugar, este regime sempre se caracterizou pela sua vasta difusão, na medida em que abrangeu todo o tecido produtivo nacional, em especial as regiões do Mezzogiorno, que são as mais afectadas pelos pedidos de restituição.

98 Deve recordar-se, a este respeito, que a supressão de um auxílio estatal ilegalmente concedido mediante recuperação é a consequência lógica do reconhecimento da sua ilegalidade (acórdão de 21 de Março de 1990, Bélgica/Comissão, dito «Tubemeuse», C-142/87, Colect., p. I-959, n._ 66) e que a obrigação que incumbe ao Estado de suprimir um auxílio considerado pela Comissão como incompatível com o mercado comum visa o restabelecimento da situação anterior (acórdãos de 4 de Abril de 1995, Comissão/Itália, C-350/93, Colect., p. I-699, n._ 21, e de 17 de Junho de 1999, Bélgica/Comissão, C-75/97, Colect., p. I-3671, n._ 64).

99 Através da restituição do auxílio, o beneficiário perde a vantagem de que tinha beneficiado no mercado relativamente aos seus concorrentes e a situação anterior à concessão do auxílio é reposta (acórdão Comissão/Itália, já referido, n._ 22). Resulta também desta função do reembolso que, regra geral, salvo circunstâncias excepcionais, a Comissão não pode ignorar o seu poder discricionário, reconhecido pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, quando pede ao Estado-Membro que recupere os montantes concedidos a título de auxílios ilegais, uma vez que apenas restabelece a situação anterior (acórdão de 17 de Junho de 1999, Bélgica/Comissão, já referido, n._ 66).

100 Nada indica, no caso em apreço, a existência de circunstâncias excepcionais que justifiquem uma solução diferente.

101 No que respeita ao argumento de que o regime em causa instituiu e regulamentou um mecanismo de direito laboral, há que mencionar a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a que já se aludiu no n._ 51 deste acórdão. Tal como o carácter social das intervenções estatais não é suficiente para estas deixarem de ser, à partida, qualificadas de auxílios, o argumento de que estamos perante um «mecanismo de direito laboral» não constitui uma circunstância excepcional susceptível de justificar uma ausência de reembolso.

102 Quanto ao princípio do respeito da confiança legítima, há que recordar que, por comunicação publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias (JO 1983, C 318, p. 3), a Comissão informou os beneficiários potenciais de auxílios de Estado do carácter precário dos auxílios que lhes são concedidos ilegalmente, no sentido de que os mesmos podem ser obrigados a restituí-los (v. acórdão de 20 de Setembro de 1990, Comissão/Alemanha, C-5/89, Colect., p. I-3437, n._ 15).

103 A possibilidade de um beneficiário de um auxílio ilegal invocar circunstâncias excepcionais, que podem legitimamente fundamentar a sua confiança no carácter regular desse auxílio, e de se opor, em consequência, ao seu reembolso não pode, certamente, ser excluída. Nesse caso, compete ao tribunal nacional, a quem eventualmente seja submetida a questão, apreciar, sendo caso disso após ter colocado ao Tribunal de Justiça questões prejudiciais de interpretação, as circunstâncias da causa (acórdão Comissão/Alemanha, já referido, n._ 16).

104 Em contrapartida, um Estado-Membro, cujas autoridades concederam um auxílio em violação das normas de processo previstas no artigo 88._ CE, não pode invocar a confiança legítima dos beneficiários para se subtrair à obrigação de tomar as medidas necessárias com vista ao cumprimento de uma decisão da Comissão que lhe ordena a recuperação do auxílio. Admitir tal possibilidade significaria, com efeito, privar os artigos 87._ e 88._ CE de qualquer efeito útil, na medida em que as autoridades nacionais poderiam basear-se no seu próprio comportamento ilegal para anular a eficácia das decisões tomadas pela Comissão ao abrigo dessas disposições do Tratado (acórdão Comissão/Alemanha, já referido, n._ 17).

105 Quanto ao argumento de que o reembolso seria complexo e dificilmente verificável, assim como o relativo à vasta difusão do regime de auxílios no tecido produtivo nacional, basta salientar, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, que o receio de dificuldades internas, mesmo insuperáveis, não pode justificar que um Estado-Membro não respeite as obrigações que lhe incumbem por força do direito comunitário (v., nomeadamente, acórdão de 27 de Junho de 2000, Comissão/Portugal, C-404/97, Colect., p. I-4897, n._ 52). No caso em apreço, não tendo o Governo italiano feito qualquer tentativa para recuperar os auxílios em questão, não fica demonstrada a impossibilidade de executar a decisão de recuperação (v. acórdão de 19 de Maio de 1999, Itália/Comissão, C-6/97, Colect., p. I-2981, n._ 34).

106 No que concerne ao dever de fundamentação, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, em matéria de auxílios de Estado, sempre que, contrariamente às disposições do artigo 88._, n._ 3, CE, o auxílio projectado já tiver sido pago, a Comissão, que tem o poder de impor às autoridades nacionais que exijam a sua restituição, não é obrigada a fornecer razões específicas para justificar o seu exercício (acórdãos de 14 de Setembro de 1994, Espanha/Comissão, já referido, n._ 78, e de 17 de Junho de 1999, Bélgica/Comissão, já referido, n._ 82). No entanto, nos pontos 120 e 121 dos fundamentos da decisão impugnada, a Comissão explicou as razões da sua decisão de exigir a restituição. Importa, assim, declarar que a decisão impugnada não padece, a este respeito, de qualquer falta de fundamentação.

107 Daqui resulta que o oitavo fundamento específico deve igualmente ser rejeitado.

108 Tendo em conta o conjunto das considerações precedentes, deve ser negado provimento ao recurso.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

109 Por força do artigo 69._, n._ 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a República Italiana sido vencida e tendo a Comissão pedido a sua condenação, há que condená-la nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção)

decide:

1) É negado provimento ao recurso.

2) A República Italiana é condenada nas despesas.